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Tendências da Sociologia Contemporânea

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Sociologia 
Sociologia III 
 
1 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS 
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS 
CURSO DE GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA 
 
 
 
 
SOCIOLOGIA III 
4º semestre 
 
 
Professora Responsável: Mari Cleise Sandalowski 
 
 
 
 
 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
2 
SUMÁRIO 
 
Objetivos ...........................................................................................................................03 
Programa ..........................................................................................................................04 
1. Principais tendências da sociologia contemporânea ............................................05 
1.1. Características da Sociologia Européia .....................................................07 
1.2. Características da Sociologia americana ..................................................10 
2. O construtivismo estruturalista ..............................................................................13 
2.1. Pierre Bourdieu ..........................................................................................14 
2.1.1. Bases teóricas e metodológicas ........................................................................15 
2.1.2. A noção de direito e campo jurídico ..................................................................19 
2.2. Anthony Giddens .......................................................................................26 
2.2.1. Elementos teóricos e metodológicos referentes à sociologia de Anthony 
Giddens .......................................................................................................................27 
2.2.2. O conceito de modernidade ..............................................................................32 
3. Depois de Marx: a perspectiva da sociologia crítica segundo Jürgen Habermas..........36 
3.1. Jürgen Habermas.......................................................................................36 
3.1.1 A colonização do mundo vivido...........................................................................36 
3.1.2. O que é ação comunicacional?..........................................................................39 
3.1.3. A técnica e a ciência como ideologia.................................................................42 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
3 
OBJETIVOS 
 
• Identificar as principais tendências sociológicas contemporâneas; 
• Estudar, sistematicamente, a obra de alguns dos principais autores 
contemporâneos; 
• Identificar as principais questões teóricas presentes e os fundamentos 
epistemológicos dessas teorias.
Sociologia 
Sociologia III 
 
4 
PROGRAMA 
 
UNIDADE 1 – PLURALISMO TEÓRICO NA SOCIOLOGIA CONTEMPORÂNEA 
 
1.1. O construtivismo estruturalista. 
1.2. Teoria crítica e teoria da ação social. 
1.3. Pós-estruturalismo. 
1.4. Marxismo analítico. 
1.5. Individualismo metodológico e teoria da escolha racional. 
1.6. Teoria pós-moderna. 
1.7. Contribuições à Teoria Social Contemporânea no Brasil. 
1.8. Outras referências à Teoria Sociológica contemporânea. 
Sociologia 
Sociologia III 
 
5 
CAPÍTULO I 
 
PRINCIPAIS TENDÊNCIAS DA SOCIOLOGIA CONTEMPORÂNEA 
 
 Sociologia surge em um contexto no qual a “questão social” emerge 
como elemento central para auxiliar na compreensão das mudanças 
desencadeadas pela Revolução Francesa e pela Revolução Industrial. Ancorada 
nos princípios da ciência moderna, esta nova disciplina marca, no século XIX, um 
momento de reflexão dos indivíduos sobre eles mesmos, isto é, observa-se a 
emergência do social como problema científico, pois os fatos observados não são 
mais explicados pela ordem divina, mas pelo racionalismo e pelo positivismo. 
 
Racionalismo → Descartes – tudo é posto em 
dúvida; prioriza sujeito em detrimento do objeto 
(penso, logo existo!); existência do ser que pensa; 
acentua caráter absoluto e universal da razão; 
dualismo psicofísico (dicotomia corpo/consciência); 
confiança na capacidade do homem de atingir 
verdades universais, eternas. 
 
Positivismo → ciência e técnica tornam-se aliadas; 
cientificismo das ciências naturais como único 
processo válido para organizar e compreender o 
mundo; oposição à explicação teológica e metafísica 
(simples descrição de como o fenômeno ocorre); o 
positivismo busca compreender como ele ocorre. 
 
 
Do mesmo modo, a Sociologia exprime uma tentativa de construção do 
conhecimento científico, cujo papel seria fornecer aos indivíduos daquele tempo o 
controle de sua sociedade e de sua história, assim como acontecia com as 
disciplinas da física e da química, que possibilitaram o controle das forças 
naturais. É por isso que inicialmente a Sociologia é denominada como física 
social, tendo por objetivo explicar a exatidão das práticas sociais. 
Por fim, pensadores como Saint-Simon, Auguste Comte, dentre outros, 
debatem sobre a possibilidade de colocar em prática os princípios de igualdade, 
liberdade e fraternidade proclamados pela Revolução Francesa. Como analistas e 
homens de ação declaram-se como sociólogos e formalizam as relações sociais. 
A 
Sociologia 
Sociologia III 
 
6 
Independente do sucesso e do desenvolvimento institucional da 
Sociologia, seu processo de consolidação, enquanto disciplina do conhecimento, 
não é neutro, linear e cumulativo. Ao contrário, da mesma forma que as 
transformações industriais, políticas e sociais desencadeadas no século XIX 
(Revolução Francesa e Revolução Industrial), as mudanças que se sucederam no 
século XX foram decisivas para moldar a sociologia contemporânea. Observe-se 
as interferências e conseqüências deixadas pelas duas guerras mundiais, além 
das constantes crises econômicas e sociais, da transformação dos regimes 
políticos, a globalização, etc. 
A Sociologia contemporânea, portanto, é caracterizada por dois traços 
principais: a extensão e a fragmentação. No que tange à extensão, pode-se dizer 
que a disciplina não está mais circunscrita ao continente europeu, mas conquistou 
espaço globalmente. Diante desta difusão, a mesma, contudo, sofreu um 
processo de fragmentação, que permitiu uma crescente especialização e uma 
maior competitividade entre as correntes teóricas e institucionais. Assim, 
 
“... os conflitos e as relações competitivas entre escolas, a luta 
pelo poder (no seio das universidades, das revistas 
especializadas...) as alianças com as autoridades políticas ou 
movimentos de contestação... são igualmente fatores 
determinantes da configuração do campo intelectual 
contemporâneo” (Lallement, 2004: 08). 
 
Levando-se em consideração as peculiaridades que marcaram o 
desenvolvimento da sociologia ao longo do século passado, é importante colocar 
em evidência não apenas a diversidade dos pontos de vista e de análises que a 
acompanham, mas, principal, torna-se salutar destacar o papel decisivo do 
contexto institucional e das estratégias utilizadas pelos próprios sociólogos para 
estruturar a disciplina. Deste modo, a Europa Ocidental e os Estados Unidos 
apresentam-se como dois pólos fundamentais para o desenvolvimento 
institucional e teórico da sociologia contemporânea. 
Embora apresentem diferentes perspectivas de análise, 
concomitantemente, é importante ressaltar que a sociologia contemporânea não 
pode evocar conjuntos rígidos com variáveis que se entrecruzam e muito menos 
territórios delimitados rigorosamente. Ao contrário, é preciso relativizar as 
Sociologia 
Sociologia III 
 
7 
oposições sistema/ator, ordem/conflito, objetivo/subjetivo, material/ideal. Estas 
abordagens dicotômicas que muitas vezes orientam as leituras e abordagens dos 
fenômenos sociais, embora úteis para realizar uma classificação, reduzem e 
empobrecem o olhar sociológico, visto que muitos trabalhos e obras encontram-se 
no entrecruzamento de paradigmas, não estando,portanto, vinculados 
exclusivamente a uma única tradição sociológica. 
 
1.1. Características da Sociologia Européia 
Embora a Sociologia tenha surgido na Europa apresentando-se, 
aparentemente, como coesa e sincrônica, ela apresenta peculiaridades 
epistemológicas e metodológicas dependendo da perspectiva de análise adotada. 
É por este motivo que se torna possível falar não sobre uma sociologia unívoca, 
mas sobre sociologias francesa, alemã e anglo-saxônica. 
Esta diversidade de tradições analíticas permitiu, desde o século XIX, 
abordagens que privilegiaram tanto a interação e a ação social, quanto um olhar 
crítico sobre a estrutura da sociedade. 
Mesmo que a sociologia européia tenha se edificado sobre bases 
sensivelmente diferentes, o que permitiu uma variedade de abordagens analíticas 
sobre os fenômenos sociais, enriquecendo, assim, o debate sociológico, a 
primeira metade do século XX provocou uma grave crise institucional na 
disciplina. Esta crise teve como motivação as conseqüências deflagradas pelas 
duas guerras mundiais e pela ascensão dos regimes totalitários como o nazismo 
e o fascismo. Tais fatos provocaram a emigração significativa de sociólogos 
europeus para outros países como pôde-se observar em relação à Sorokim, 
Malinowski, Lazarsfeld, Adorno, Horkheimer, Elias, Mannheim, Schütz, 
Schumpeter, dentre outros. É nesse período que se observa o declínio da escola 
francesa e a pulverização da escola alemã, devido à fuga de muitos intelectuais 
como, por exemplo, os autores da Escola de Frankfurt. 
É somente a partir de 1945 que ocorre o renascimento da sociologia 
européia. No entanto, observa-se que, a partir deste período, 
 
“... a desconfiança diante da ‘grande’ teoria predomina 
imediatamente na maioria dos países europeus e dá-se agora a 
primazia aos trabalhos especializados. Se, ulteriormente, a 
Sociologia 
Sociologia III 
 
8 
balança se inclina de novo para o pólo teórico, a sociologia não 
escapa à história. Tanto no seu arranjo institucional como nas 
pressuposições teóricas e metodológicas dominantes, a 
sociologia européia se forja aos sabores dos acontecimentos 
marcantes das décadas pós-guerra (desenvolvimentismo, guerra 
fria, emergência dos novos movimentos sociais, implosão do 
comunismo na Europa Oriental...)” (Lallement, 2004: 42). 
 
É nesse contexto que ocorre o renascimento da sociologia européia no 
período pós-guerra. Na França a disciplina ao mesmo tempo em que é 
depreciada pelos intelectuais personalistas, marxistas e existencialistas (que 
caracterizavam as formas de pensamento em vigor naquele período), recebe 
vários estímulos por parte do Estado, assim como apoio de instituições 
internacionais e de empresas e fundações como, por exemplo, a Unesco e as 
Fundações Ford, Rockefeller, etc. Tais estímulos estão diretamente ligados às 
preocupações planejadoras do Estado. 
Além disso, os sociólogos franceses dessa época recebem uma forte 
influência metodológica americana. Embora as referências teóricas, 
metodológicas e as técnicas de investigação sejam incorporadas da sociologia 
americana, pode-se observar um olhar bastante crítico por parte da sociologia 
francesa em relação à industrialização. Desse modo, os estudos sobre 
delinqüência, violência, comunicações de massa e industrialização cedem espaço 
para um objeto de investigação que se torna privilegiado entre os cientistas 
sociais franceses nos anos cinqüenta: a classe operária. 
O mesmo pode ser observado em relação à sociologia alemã. Embora, 
no período pós-guerra predomine ainda a ênfase metodológica dos “velhos” 
sociólogos (nascidos nas duas últimas décadas do século anterior e cujas raízes 
estão fortemente arraigadas na tradição liberal), cuja perspectiva de análise 
privilegiava uma reflexão sobre “... a evolução da sociedade com o auxílio de 
vastos painéis sócio-históricos e culturais” (Lallement, 2004: 58), lentamente 
delineia-se uma ruptura metodológica. A nova geração de cientistas sociais deixa 
transparecer uma forte desilusão e desconfiança em relação às grandes teorias 
gerais; ancorada em uma prática sociológica de corte americano, os novos 
estudos privilegiam o aspecto empírico, ao mesmo tempo em que também são 
caracterizados pelo idealismo humanitário. É diante desse quadro que temas 
Sociologia 
Sociologia III 
 
9 
como trabalho, família, estratificação, religião, mobilidade social, etc., surgem 
como objetos de investigação. 
Por outro lado, emergem também estudos sobre desemprego, as 
conseqüências da automação, sexualidade, diretamente ligados aos problemas 
da sociedade alemã no período pós-guerra. Estas pesquisas, vinculadas a nova 
escola de Frankfurt, pouco simpatizam com a corrente sociológica americana. 
Críticos da investigação positivista recorrem à Marx e a Freud para pensar os 
problemas que assolam a sociedade de seu tempo, dando ênfase a uma reflexão 
mais genérica sobre os fenômenos sociais, culturais e políticos. 
É somente a partir da década de sessenta que ocorre a 
profissionalização da sociologia. A sua consolidação institucional, alimentada 
em muitos países pelo crescimento do Estado de Bem-Estar Social, permite 
uma difusão da disciplina e dos profissionais da área de forma significativa. 
Paralelamente, vão se diversificando também as perspectivas de análise 
sobre os fenômenos sociais, assim como os objetos de estudo. Migração, cultura 
de massa, tempo livre, organizações, escola, constituem alguns dos temas 
emergentes nas pesquisas sociológicas. 
Do mesmo modo, observa-se uma pulverização metodológica. Se nos 
anos sessenta são retomadas as teorias do ator social, na década posterior 
dissemina-se uma “sociologia da suspeita”, isto é, instituições como as prisões, a 
escola, a fábrica, os hospitais passam a ser problematizadas, sendo a elas 
atribuídas ações que envolvem poder e dominação de um grupo social sobre 
outro. É esse o elemento central que sustenta o estruturalismo francês no período 
e a abordagem crítica da realidade social, cuja ênfase teórica e metodológica tem 
como base a obra de Karl Marx. 
O multiculturalismo, a globalização e os avanços tecnológicos, que 
caracterizam a sociedade a partir dos anos oitenta, apontam para o esgotamento 
da sociologia crítica e das perspectivas funcionalistas, não mais capazes de 
responder às mudanças sociais e suas conseqüências. Se até então 
predominavam no máximo duas correntes de investigação sociológica, 
geralmente dicotômicas, as quais se constituíam em modelos de análise, os anos 
oitenta e noventa, assim como a primeira década do século XXI, exige da 
sociologia uma postura mais eclética. Os diferentes modelos de organização 
Sociologia 
Sociologia III 
 
10 
social, e as peculiaridades políticas, culturais e econômicas de cada região 
estimulam os profissionais da área a recorrerem a várias formas de abordagem 
dos fenômenos sociais. Perspectivas como o pós-modernismo, a 
etnometodologia, o interacionismo simbólico, o construtivismo, etc., são utilizados 
recorrentemente nas academias, constituindo uma verdadeira “Torre de Babel” 
(Lallement, 2004). Esta pulverização metodológica e teórica enriquece a prática 
sociológica, visto que estimula olhares diferenciados sobre uma mesma realidade 
social. 
 
1.2. Características da Sociologia americana 
É apenas na primeira metade do século XX que a Sociologia ultrapassa 
as fronteiras do continente europeu, estabelecendo-se institucionalmente nos 
Estados Unidos. A presença das guerras de muitos estados dominados pelo 
totalitarismo são elementos determinantes para a fuga de pesquisadores e 
intelectuais, que passam a afluir para o continente americano, tornando, assim, os 
Estados Unidos um campo promissor da sociologia mundial. 
Esse afluxo de sociólogos permite uma aproximação e uma colaboração 
da disciplina com o estabelecimento tanto de políticas sociais, quanto de técnicas 
de avaliação e intervençãopara solucionar os problemas da sociedade. Isto 
contribui para legitimar a prática sociológica americana. 
Se, na primeira metade do século passado, a sociologia, como ciência, 
era percebida como uma disciplina que poderia e deveria contribuir tanto para o 
entendimento quanto para a gestão dos fenômenos sociais, mantendo-se ao 
mesmo tempo livre de qualquer tipo de interferência ideológica ou política, no 
período pós-guerra cresce o questionamento em torno da teoria sociológica, 
observando-se uma releitura crítica dos clássicos da área. Este movimento é 
devido ao crescimento expressivo da classe média e da burocratização nos 
Estados Unidos. Assim, a mobilidade social torna-se principal objeto de 
investigação sociológica e as sondagens empíricas perpetuam-se, embora a 
ênfase recaia na acumulação e no tratamento estatístico dos dados coletados 
(Riutotr, 2008). 
Dentre as principais correntes de pensamento sociológico que se 
desenvolvem ao longo do século XX nos Estados Unidos e que, por 
Sociologia 
Sociologia III 
 
11 
conseqüência, constituem balizas de conhecimento para a sociologia 
contemporânea, podem ser citadas a Escola de Chicago, o Culturalismo, a Escola 
de Harvard, o interacionismo simbólico e a etnometodologia. A partir dos anos 
oitenta emergem como objetos de investigação as reflexões entre o micro e o 
macrossocial, além de temas voltados para a sociologia dos gêneros, a sociologia 
histórica, a sociologia econômica (teoria das redes) e a sociologia da ciência. 
 
Escola de Chicago: 
• Surge na década de vinte, século XX; 
• Os autores afastam-se da tentação profética e das teorias gerais; 
• Os estudos dedicam atenção às comunidades ecológicas → objeto 
mais próximo dos fenômenos da industrialização e urbanização e suas 
conseqüências; 
• Ênfase nas comunidades; 
• Objeto → desorganização social → cidade, delinqüência, nomadismo 
operário; 
• Projetos: prevenir o desvio social (delinqüência urbana e a luta contra 
alcoolismo e drogas); 
• Vínculo entre sociologia e intervencionismo social. 
 
Escola de Columbia – Corrente culturalista: 
• Aparece na década de 30; 
• Objeto de investigação → a industrialização, o desaparecimento da 
pequena comunidade tradicional, disparidades entre as classes sociais, 
desenvolvimento das técnicas de propaganda e dos institutos de 
opinião pública, conseqüências da quebra da Bolsa em 1929. 
• Projetos: compreender como os indivíduos se apropriam de sua 
própria “cultura”; 
• Ênfase no relativismo e no determinismo; 
• Para alguns culturalistas existem processos concretos de aquisição das 
regras sociais, isto é, no espaço social podem ser encontradas formas 
de inculcar as normas sociais. 
 
Escola de Harvard: 
• Concomitante à corrente culturalista; 
• Fundadora da sociologia industrial; 
• Sociólogo como perito nas empresas; 
• Ênfase na oposição entre lógica racional (característica da direção 
empresarial/industrial) e lógica não racional (própria dos trabalhadores); 
• Objeto de investigação → industrialização; 
• “... longe de ser dominada por simples estímulos financeiros, a ação 
dos indivíduos se acha presa em uma rede muldimensional de lógicas 
(dos sentimentos, do custo, da eficiência, da ideologia) que não se 
reduz a pura e simples racionalidade econômica” (Lallement, 2004: 18-
19). 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
12 
 
 
 
Anos 70 
• Interacionismo/etnometodologia 
• Objetos → trabalhos sobre justiça, escola, hospital, 
organizações, ciência, criminalidade, etc. 
 
Garfinkel → “a realidade social é uma construção permanente 
que não tem nada de exterior aos indivíduos” (35-36) → 
perspectiva fenomenológica (Alfred Schütz). 
 
 
 
Anos 80 
• Estruturalismo concorre com a etnometodologia; 
• Objeto: reflexão entre o micro e o macrossocial; 
• Propõe-se como uma sociologia crítica → releitura de 
Marx. 
 
 
Anos 90 
• Objetos → sociologia dos gêneros, sociologia histórica, 
sociologia econômica (teoria das redes), sociologia da 
ciência. 
 
 
 
 
TEMAS DE REFLEXÃO 
 
• O que significam tradições sociológicas? 
• Sociologia européia 
• Sociologia norte-americana 
• Profissionalização da sociologia 
• Prática sociológica 
 
 
SUGESTÃO DE LEITURAS 
• CASTRO, Ana Maria de; DIAS, Edmundo Fernandes (org.). Introdução ao 
pensamente sociológico. Émile Durkheim (et al). São Paulo: Centauro, 2001, 
pg. 01-30. 
 
• CORCUFF, Philippe. As novas sociologias: construções da realidade social. 
Bauru, SP: Edusc, 2001. 
 
• LALLEMENT, Michel. História das idéias sociológicas: de Parsons aos 
contemporâneos. Petrópolis: Ed. Vozes, 2004, 2ª ed. 341 p. 
 
• RIUTORT, Philippe. Compêndio de Sociologia. São Paulo: Ed. Paulus, 2008. 
 
 
 
 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
13 
CAPÍTULO II 
 
O CONSTRUTIVISMO ESTRUTURALISTA 
 
O que é construtivismo? 
É uma “... abordagem que tem a tendência de 
acentuar os mecanismos pelos quais a realidade 
social ganha forma. Um dos seus postulados 
consiste em afirmar que a realidade não preexiste 
jamais à observação e que o observador, pela sua 
simples presença, age sobre o fenômeno 
estudado” (Riutort, 2008: 797) 
 
 
s sociologias construtivistas referem-se a uma dupla dimensão do 
social. Elas designam um conjunto de estudos na área das ciências 
sociais que definem a realidade social como um conjunto de produções cotidianas 
que podem ser elaboradas por agentes individuais ou coletivos em uma 
determinada situação e contexto. 
É por este motivo que a realidade, nesta perspectiva de análise, não 
pode ser apreendida em si ou como uma coisa, mas a partir de ações concretas, 
que levam em consideração a conduta da ação, os saberes necessários e as 
temporalidades. As ações sociais “... se inscrevem, portanto, em um mundo social 
que também ele, por sua vez, é uma construção cuja consistência resulta de 
ações anteriores” (Riutort, 2008: 295). 
As sociologias construtivistas agrupam várias teorias, que têm como 
principal particularidade a rejeição à oposição entre holismo e individualismo, 
entre objetivo e subjetivo, entre material e ideal. Contrapondo-se ao viés 
dicotômico para definir e compreender o mundo social, os pesquisadores desta 
corrente de pensamento expõem que os fenômenos sociais complexos, que 
marcam a segunda metade do século passado e a primeira década do século 
XXI, não podem ser mais explicados através de categorias de pensamento 
binárias. É preciso pensar de modo conjunto aqueles aspectos da realidade, 
definidos pela sociologia clássica como antagônicos (Corcouff, 2001). 
A 
Sociologia 
Sociologia III 
 
14 
Estabelecendo uma crítica tanto à perspectiva metodológica que 
privilegia apenas a importância do ator quanto àquela que enfatiza apenas as 
estruturas, os construtivistas partem do pressuposto de que estes dois elementos 
encontram-se imbricados, não existindo uns sem os outros. Assim como “... os 
indivíduos não significam muita coisa fora de uma sociedade na qual evoluem, da 
mesma forma, a sociedade não é nada sem os indivíduos que a compõem” 
(Riutort, 2008: 296). 
Embora posterior aos fundadores da sociologia, esta perspectiva 
metodológica tem fundamental importância na sociologia contemporânea, visto 
que rompe com as formas de pensamento binário que perpassavam os 
pressupostos teórico-metodológicos na sociologia até a primeira metade do 
século XX. 
 
2.1. Pierre Bourdieu 
Biografia: 
Pensador francês, Pierre Bourdieu tem origem familiar campesina. 
Nascido em 01 de agosto de 1930, na cidade de Denguin, foi um dos sociólogos 
mais relevantes e influentes da sociologia contemporânea. Filósofo de formação, 
formou-se na Escola Normal Superior, em Paris. Foi professor na École de 
Sociologie du Collège de France, consagrando-se em um dos mais importantes 
intelectuais do século passado, além de dirigir a revista Actes de la Recherche em 
Sciencies Sociales. 
A partir da segunda metade do século XX inicia suas pesquisas na 
Argélia,construindo as bases de seu referencial teórico-metodológico. Analisando 
temas relacionados à cultura, estilos de vida e educação, suas investigações são 
de grande relevância tanto para a teoria social quanto para a sociologia empírica, 
visto que realiza um trabalho denso e exaustivo sobre a dinâmica da vida social. 
Após décadas de intensas atividades intelectuais, morre em 23 de janeiro de 
2002, na cidade de Paris. 
 
Construtivismo estruturalista ou estruturalismo genético 
“Pierre Bourdieu define o ‘construtivismo estruturalista’ na junção do objetivo e do 
subjetivo: ‘Por estruturalismo ou estruturalista, eu quero dizer que existem, no próprio 
Sociologia 
Sociologia III 
 
15 
mundo social (...), estruturas objetivas independentes da consciência e da vontade dos 
agentes, que são capazes de orientar ou de limitar suas práticas ou suas 
representações. Por construtivismo, quero dizer que há uma gênese social dos 
esquemas de percepção, de pensamento e de ação constitutivos do que chamo de 
habitus, por um lado, e, por outro lado, das estruturas sociais e, em particular do que 
chamo de campo’. 
Nesta dupla dimensão, objetiva e construída, da realidade social, uma certa 
primazia continua, no entanto, a ser dada às estruturas objetivas. É o que leva Pierre 
Bourdieu a distinguir dois momentos na investigação, um primeiro momento objetivista e 
um segundo momento subjetivista: “por um lado, as estruturas objetivas que o sociólogo 
constrói no momento objetivista, ao afastar as representações subjetivistas dos agentes, 
são o fundamento das representações subjetivas e constituem as limitações estruturais 
que pesam sobre as interações; mas, por outro lado, estas representações devem 
também ser analisadas se quisermos dar conta sobretudo das lutas cotidianas, 
individuais e coletivas, que visam transformar ou conservar estas estruturas’. 
Esta prioridade cronológica e teórica dada à dimensão objetiva da realidade social 
retira uma parte de suas raízes de uma reflexão epistemológica, expressa por Pierre 
Bourdieu, Jean-Claude Chamboredon e Jean-Claude Passeron em 1968 em Le Métier 
de sociologie e reiterada desde então por Pierre Bourdieu. Encontramos no centro desta 
orientação, a noção de ‘ruptura epistemológica’, ruptura entre o conhecimento científico 
dos sociólogos e a ‘sociologia espontânea’ dos atores sociais; o que aproxima as 
ciências sociais das ciências da natureza. Ela encontra uma de sua fontes no imperativo 
sociológico de ruptura com as ‘pré-noções’ dos atores denunciados por Durkheim em 
Les Régles de la méthode sociologique. No entanto, apesar da reafirmação deste 
princípio,o procedimento de Pierre Bourdieu – ao menos no que se refere ao segundo 
momento subjetivista – aparece geralmente, no detalhe das análises, mais complexo 
que uma simples dicotomia entre conhecimento erudito e conhecimento comum” 
(Fonte: Corcuff, 2001: 48-50) 
 
 
2.1.1. Bases teóricas e metodológicas 
Ao contrário dos demais sociólogos de seu tempo, Pierre Bourdieu não 
recorre a um único referencial teórico e metodológico. Ao contrário, realiza 
concomitantemente uma reeleitura dos clássicos da sociologia, tradicionalmente 
colocados em oposição, incorporando elementos metodológicos e conceituais de 
Sociologia 
Sociologia III 
 
16 
Marx, Durkheim e Weber para pensar os fenômenos sociais da segunda metade 
do século XX. 
Intelectual engajado realiza críticas ao liberalismo, à globalização e à 
dominação, constituindo-se a última esfera em uma questão investigativa 
fundamental de todo o seu trabalho. Tendo por objetivo compreender os 
mecanismos da reprodução social que legitimam as várias formas de dominação, 
este tema perpassa toda a sua discussão sociológica, independente do objeto de 
estudo abordado, ou seja, a educação, a cultura, a mídia, a política, a lingüística 
são analisados à luz dos mecanismos de dominação existentes em um 
determinado grupo social. 
A sociologia desenvolvida por Pierre Bourdieu não focaliza como 
elemento central de suas análises os fatores econômicos. Compreendendo a 
sociedade como um grande espaço social, formado por diferentes campos e 
construído por relações de poder que lhe conferem sentido, o mundo social deve 
ser compreendido à luz de três conceitos fundamentais: o campo, o habitus e o 
capital. 
Desse modo, este espaço é organizado de acordo com os tipos de capital 
que cada agente ou grupos sociais possuem, sendo a realidade definida por 
agentes que vivem cotidianamente dentro desse mundo social, ou seja, o sentido 
daquilo que definimos como sendo uma realidade social é atribuído socialmente, 
tendo como fundamento as relações de poder que perpassam as práticas sociais, 
cujas experiências impõem aos indivíduos uma visão de mundo legítima 
(Bourdieu, 1983). É por este motivo que os agentes sociais executam suas ações 
de acordo com as representações sociais e as idéias da realidade social na qual 
estão situados. 
Se o meio social e a consciência dos indivíduos são o resultado da 
história de um determinado período, é preciso atentar para o fato da não 
naturalização daquilo que existe. Embora certas práticas sociais pareçam, em um 
primeiro momento, como ações inatas, isto é, produzidas pela natureza física e/ou 
genética, estas constituem, ao contrário, fenômenos sociais que são construídos 
socialmente. 
Tais elementos reforçam a necessidade de ruptura com a dicotomia 
indivíduo/estrutura. Para Bourdieu (2005) não há uma estrutura que se impõe aos 
Sociologia 
Sociologia III 
 
17 
indivíduos, mas o que se observa é uma história objetivada e incorporada, que se 
estrutura ao longo do tempo. Esta idéia de temporalidade indica que quanto mais 
uma noção ou um conceito comum perpetuam-se ao longo do tempo, maior é o 
seu enraizamento/cristalização social. 
Preocupado em compreender teoricamente os mecanismos sociais que 
legitimam as diferentes formas de dominação presentes na sociedade, o autor 
recorre ao conceito de violência simbólica, que é definida como não arbitrária da 
produção simbólica da vida social. Deste modo, é através da violência simbólica 
que ocorre o processo de produção e reprodução social que dá sentido ao 
mundo; representado o caráter legitimador daquilo que Bourdieu (2005) define 
como forças dominantes, a violência simbólica indica uma imposição de 
determinados significados que são incorporados pelos agentes sociais, fazendo 
com que estes percebam a realidade social de uma forma específica. 
Nesta perspectiva de análise, a violência simbólica é exercida através da 
dominação, impondo-se como legítima e universal através de mecanismos sociais 
que expressam os gostos de classe e estilos de vida dos grupos dominantes, 
gerando, por conseqüência, a distinção social (Bourdieu, 2007). 
Utilizando a perspectiva construtivista, esse autor parte do princípio de 
que há, de um lado, uma constituição social dos elementos de pensamento, 
percepção e ação dos sujeitos, elementos que constituem o habitus e, de outro, 
das estruturas sociais, ou seja, dos campos e grupos sociais, assim como das 
classes sociais (Bourdieu, 1990). 
A Sociologia, nesse sentido, é concebida como uma topologia social, na 
qual a realidade pode ser representada como um espaço determinado pelas 
bases de diferenciação e distribuição irregular de força e poder. Desse modo, o 
lugar do agente na estrutura social é definido pela posição que ele ocupa no 
espaço (Bourdieu, 1990), quer dizer, é nesse 
 
“... espaço social, no qual as distâncias se medem em quantidade 
de capital, [que se definem] proximidades e afinidades, 
afastamentos e incompatibilidades, em suma, probabilidades de 
pertencer a grupos realmente unificados (...); mas é na luta das 
classificações, luta para impor esta ou aquela maneira de recortar 
este espaço, para unificar ou dividir, etc., que se definem as 
aproximações reais. A classe nunca está nas coisas; ela também é 
representaçãoe vontade, mas que só tem possibilidade de 
Sociologia 
Sociologia III 
 
18 
encarnar-se nas coisas se ela aproximar o que está objetivamente 
próximo e afastar o que está objetivamente afastado” (BOURDIEU, 
1990: 95). 
 
As relações hierárquicas estabelecidas a partir da posse de bens, 
materiais e simbólicos, da mesma forma que as posições reconhecidas e 
legitimadas, constituem os campos1 profissionais, sociais e econômicos. 
Investigando as propriedades gerais dos campos, Bourdieu (1983) identifica e 
descreve as formas que assumem os conceitos mais gerais (interesse, capital, 
investimento) e os mecanismos que atuam em cada um desses campos, assim 
como a própria formação do habitus profissional. 
Desse modo, é o lugar ocupado pelo agente nos diversos campos, ou 
seja, a composição do capital e do poder que esse agente possui, que define a 
sua posição no espaço social, pois cada campo tem uma determinada forma de 
capital e uma hierarquia próprias. 
Considerando o conceito de capital social como determinante para 
apreender as relações e diferenciações entre os agentes dentro de cada campo, 
Bourdieu (2005) explica que esse capital pode ter valor distinto em cada campo. 
O modelo explicativo elaborado por Bourdieu (2001), portanto, concebe 
a ciência como resultado da ação dos sujeitos no mundo, cuja consequência é a 
necessidade de decisão. Defende, desse modo, a ideia de um saber embasado 
na ação. 
Contrapondo-se ao saber escolástico, que tem como fundamento o 
pensamento teleológico, por um lado, e o pensamento dedutivo, por outro, o autor 
ressalta a necessidade de superar o mecanicismo objetivista, que reduz a prática 
social à execução inconsciente de regras, de dispositivos ou de estruturas, 
analisando aquela como um “... produto da relação dialética entre uma situação e 
um habitus, isto é, o habitus enquanto sistema de disposições duráveis é matriz 
de percepção, de apreciação e de ação, que se realiza em determinadas 
 
1 Além dos campos econômicos, sociais e profissionais, Bourdieu ressalta a existência de outros 
campos como o político, o das instituições de ensino, o burocrático, o religioso, o jurídico, o da 
produção cultural, o jornalístico, o artístico, o universitário, entre outros. É importante ressaltar que 
sua perspectiva de análise não focaliza os fatores econômicos como elemento central na 
compreensão das práticas sociais. 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
19 
condições sociais” (BOURDIEU, 1983:19). Nessa perspectiva, há a necessidade 
de compreender o envolvimento do sujeito no mundo. 
Seu modelo argumentativo discorda das duas linhas de pensamento 
explicativas da ação do sujeito. Quanto ao estruturalismo contido na teoria 
funcionalista, Bourdieu (1996) caracteriza essa perspectiva como incapaz de 
elaborar uma teoria da ação, visto que o indivíduo encontra-se diluído na 
sociedade; por outro lado, discorda também da tese elaborada por Weber, na qual 
o sujeito teria a capacidade, através de sua ação, de mudar o curso da história, 
uma vez que ele é compreendido como um ser autônomo. Para o autor, essa 
autonomia individual, como sinônimo de ação, constitui-se em uma tessitura 
social, quer dizer, em um jogo social. 
 
O campo científico 
Para Bourdieu (2005), o campo científico é o espaço no qual se estabelece a luta 
concorrencial entre os atores sociais, cujas posições foram adquiridas em lutas 
anteriores. A questão que está em jogo é o monopólio de autoridade científica percebida 
como qualidade técnica e poder social, cuja capacidade de discursar e de agir são 
legitimadas socialmente. 
Nesse sentido, as práticas dos agentes estão orientadas na busca da autoridade, 
ou seja, na busca constante do reconhecimento, celebridade e prestígio social, meio no 
qual os títulos científicos têm um papel de grande importância. 
Diante da ideia de diferentes campos que interagem e disputam status social, assim 
como da noção de capitais desigualmente distribuídos, o autor parte do pressuposto de 
que o título universitário ou científico concorre com outros títulos para a aquisição de 
autoridade e prestígio. As profissões seriam, portanto, classes sociais ou grupos 
caracterizados pelas diferentes formas de mobilização e apropriação de um tipo de 
capital, nesse caso, o capital cultural, entendido como o responsável pela 
hierarquização, integrado ao capital social e ao capital econômico. 
(Fonte: BOURDIEU, PIERRE. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005). 
 
2.1.2. A noção de direito e campo jurídico 
Dentre os objetos de estudo abordados pela sociologia de Pierre 
Bourdieu, destaca-se sua análise sobre o campo jurídico e a definição da esfera 
do direito. 
Sociologia 
Sociologia III 
 
20 
Ao analisar o campo jurídico e as relações dos profissionais que 
aplicam as regras de direito e as relações daqueles que as elaboram, o autor 
estabele três objetivos: primeiro, propõe-se a estabelecer uma sociologia crítica 
das desigualdades e da despolitização; segundo, investiga as ambivalências do 
campo jurídico e do habitus dos juristas; por fim, busca apreender a razão jurídica 
entre as razões escolásticas. 
 
Escolástica: criticada severamente por Bourdieu 
devido à sua contemplação da verdade. Para o 
autor, o saber científico não está distanciado em 
relação ao mundo e à verdade e à prática, mas 
se entrelaça com o costume, a autonomia, a 
força, o corpo, a imaginação e a probabilidade, 
isto é, é influenciado por condições históricas e 
sociais. (Bourdieu, 1994). 
 
Influência escolástica → fundada na tradição → 
privilegia certas problemáticas em detrimento de 
outras → “... existem problemas que os 
sociólogos deixam de apresentar porque a 
tradição profissional não os reconhece como 
dignos de serem levados em consideração, ou 
não propõe as ferramentas conceituais ou as 
técnicas que permitiriam tratá-los de forma 
canônica; e, inversamente existem questões que 
eles se obrigam a formular porque as mesmas 
ocupam uma posição elevada na hierarquia 
consagrada dos temas de pesquisa” (Bourdieu, 
1994: 41). 
 
 
Ao contrário de autores clássicos do direito como Kelsen, para quem o 
direito representava uma esfera autônoma às pressões e reivindicações sociais, 
cuja história era entendida como um produto intrínseco ao desenvolvimento 
interno dos seus conceitos e métodos, configurando um sistema fechado e 
Sociologia 
Sociologia III 
 
21 
autônomo, e Althusser, que conferia uma abordagem economicista à prática 
jurídica, definindo o direito e a jurisprudência como um reflexo direto da relações 
de força existentes, responsáveis por exprimir as determinações econômicas e os 
interesses dos dominantes, Bourdieu (2005) atenta para a estrutura dos sistemas 
simbólicos, isto é, 
 
“... à existência de um universo social relativamente independente 
em relação às pressões externas, no interior do qual se produz e 
se exerce a autoridade jurídica, forma por excelência da violência 
simbólica legítima cujo monopólio pertence ao Estado e que se 
pode combinar com o exercício da força física” (Bourdieu, 2005: 
211). 
 
Assim, as práticas e discursos jurídicos são produtos do funcionamento 
de um campo (jurídico), definido a partir das disposições socialmente construídas 
e responsáveis por gerar um conjunto de práticas em relação a um grupo de 
agentes, fazendo surgir, por conseqüência, aquilo que o autor define como 
habitus. O campo jurídico, portanto, pode ser caracterizado tanto 
 
“... pelas relações de força específicas que lhe conferem a sua 
estrutura e orientam as lutas de concorrência” [quanto] “... pela 
lógica interna das obras jurídicas que delimitam em cada momento 
o espaço dos possíveis e, deste modo, o universo das soluções 
propriamente jurídicas” (Bourdieu, 2005: 211). 
 
É por este motivo que o autor explica que as pressões e os 
constrangimentos sociais fixam suasmarcas na cultura jurídica, caracterizada 
pela relação que o campo jurídico estabelece com o campo de poder e os demais 
segmentos da sociedade. 
O campo jurídico é um campo que coloca em prática procedimentos 
codificados de resolução de conflitos entre os profissionais da resolução regulada 
dos conflitos, podendo então o direito ser definido como um 
 
“... lugar de concorrência pelo monopólio do direito de dizer o 
direito, quer dizer, a boa distribuição (nomos) ou a boa ordem, na 
qual se defrontam agentes investidos de competência ao mesmo 
tempo social e técnica que consiste essencialmente na 
capacidade reconhecida de interpretar (de maneira mais ou 
menos livre ou autorizada) um corpus de textos que consagram a 
visão legítima, justa, do mundo social” (Bourdieu, 2005: 212). 
Sociologia 
Sociologia III 
 
22 
 
Em outras palavras, o que Bourdieu está afirmando é que a produção 
de um discurso lingüístico específico (linguagem jurídica) confere competência 
técnica, capacidade e legitimidade social para ser utilizado em situações 
determinadas (no tribunal). Este discurso específico também significa relações de 
poder simbólico por meio das quais se atualizam as relações de força entre os 
locutores e seus respectivos grupos. Desse modo, a concorrência pelo monopólio 
do acesso aos meios jurídicos separa e reforça constantemente a distinção entre 
os profanos, aqueles que não dominam a linguagem jurídica, e os profissionais, 
veredictos armados de direitos. 
É por este motivo que o espaço judicial requer uma distinção, ou 
fronteira, entre aqueles que estão preparados e capacitados para entrar no jogo 
concorrencial e os que dele são excluídos, apresentando a necessidade de um 
intermediário: o advogado. Isto gera a impossibilidade do campo jurídico ser 
acionado pelos personagens principais, quer dizer, pela vítima e acusado. 
O direito, portanto, ao mesmo tempo em que fabrica o mundo social, 
pelo fato de ser a forma por excelência do discurso atuante e capaz de produzir 
efeitos sociais, também é feito por ele, visto que os agentes que constituem o 
campo jurídico transitam por outros campos da sociedade como, por exemplo, o 
campo religioso, político, ético, social, etc. 
 
Espaço de possíveis: é um corpus de 
precedentes reconhecidos entre os quais a 
solução pode ser buscada → “... é o que 
fundamenta racionalmente uma decisão que se 
pode inspirar, na realidade, em princípios 
diversos, mas que ela faz aparecer como produto 
de uma aplicação neutra e objetiva de uma 
competência especificamente jurídica” (Bourdieu, 
2005: 231). 
 
Poder simbólico: é um poder invisível, exercido 
com a cumplicidade daqueles que não querem 
saber que a ele estão sujeitos ou mesmo que o 
Sociologia 
Sociologia III 
 
23 
exercem. Na prática, esta forma de poder é 
exercida quando aparentemente o agente social 
pode escolher livremente a ação a ser tomada, 
porém, ele tende a optar por aquilo que será 
mais aceito do ponto de vista do contexto no qual 
está situado naquele momento. 
 
Da mesma forma que os indivíduos que compõem o campo jurídico 
fazem parte de outros campos, também existe um poder simbólico que é definido 
na relação entre aqueles que exercem o poder (profissionais do mundo do direito) 
e aqueles que lhe são sujeitos (profanos - demais grupos sociais que 
desconhecem a técnica e a linguagem jurídica). São os magistrados e os demais 
operadores de direito que constroem a realidade estabelecendo, assim, uma 
ordem, cujo poder das palavras (da linguagem jurídica) somente é possível pela 
crença na sua legitimidade (isto é, pela crença que a sociedade possui no direito 
e no campo jurídico). 
 
 
A RUPTURA EPISTEMOLÓGICA 
→ “A vigilância epistemológica impõe-se, particularmente, no caso das ciências do 
homem nas quais a separação entre a opinião comum e o discurso científico é imprecisa 
do que alhures. Ao concedermos, com demasiada facilidade, que a preocupação com a 
reforma política e moral da sociedade levou os sociólogos do século XIX a abandonar, 
muitas vezes, a neutralidade científica e, até mesmo, que a sociologia do século XX 
renunciou , eventualmente, às ambições da filosofia social sem ter ficado isenta de 
contaminações ideológicas de outra natureza, dispensamo-no quase sempre de 
reconhecer, para tirar daí todas as conseqüências, que a familiaridade com o universo 
social constitui, para o sociólogo, o obstáculo epistemológico por excelência porque ela 
produz continuamente concepções ou sistematizações fictícias ao mesmo tempo que as 
condições de sua credibilidade. O sociólogo nunca conseguirá acabar com a sociologia 
espontânea e deve se impor uma polêmica incessante contra as evidências ofuscantes 
que proporcionam, sem grandes esforços, a ilusão do saber imediato e de sua riqueza 
insuperável. Sua dificuldade em estabelecer, entre a percepção e a ciência, a separação 
que, para o físico, exprime-se por uma oposição nítida entre o laboratório e a vida 
cotidiana, é tanto maior pelo fato de não conseguir encontrar, em sua herança teórica, os 
Sociologia 
Sociologia III 
 
24 
instrumentos que lhe permitiriam recusar radicalmente a linguagem corrente e as noções 
comuns (pg. 23). 
 
A TENTAÇÃO DO PROFETISMO 
→ “Na medida em que tem mais dificuldade do que qualquer outra ciência para se liberar 
da transparência e para realizar, (...). a ruptura com as pré-noções; na medida em que, 
muitas vezes, lhe é atribuída (...) a tarefa de responder às questões últimas sobre o 
futuro da civilização, a sociologia está, hoje, predisposta a manter com um público, que 
nunca se reduz completamente ao grupo dos pares, uma relação mal esclarecida que 
corre sempre o risco de voltar a encontrar a lógica da relação entre o autor de sucesso e 
seu público ou, até mesmo, por vezes, entre o profeta e sua audiência. Mais do que 
todos os outros especialistas, o sociólogo está exposto ao veredicto ambíguo e 
ambivalente dos não-especialistas que se sentem com a autoridade de dar crédito às 
análises propostas, com a condição de que estas despertem os pressupostos de sua 
sociologia espontânea, mas que são levados, por essa mesma razão, a contestar a 
validade de uma ciência que eles só aprovam na medida em que ela coincide com o 
bom senso” (pg. 36). 
Fonte: BOURDIEU, Pierre (et alli). El oficio de sociologo. 17ª ed. México: Siglo Veintiuno, 1994. 
 
 
TEMAS DE REFLEXÃO 
 
• O que é construtivismo? 
• Relação entre campo e habitus 
• Características do capital social 
• Ruptura epistemológica 
• Habitus jurídico e espaço de possíveis 
 
 
SUGESTÃO DE LEITURAS 
• CORCUFF, Philippe. As novas sociologias: construções da realidade social. 
Bauru, SP: Edusc, 2001. 
 
• BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Ed. 
Edusp; Porto Alegre, Ed. Zouk, 2007. 560 pg. 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
25 
• ______________. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. 
 
• ______________. Meditações pascalianas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 
2001. 320 p. 
 
• ______________. Novas reflexões sobre a dominação masculina. IN: LOPES, 
Marta J.; ESTRMANN, Dagmar M.; WALDOW, Regina (orgs). Gênero e saúde. 
Porto Alegre: Artes Médicas, 1996, p 28-40. 
 
• BOURDIEU, Pierre (et alli). El oficio de sociologo. 17ª ed. México: Siglo 
Veintiuno, 1994. 
 
• ______________. Coisas Ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990. 234 p. 
 
• ______________. Pierre Bourdieu – Sociologia. São Paulo, Ed. Ática, 1983. 
 
• RIUTORT, Philippe. Compêndio de Sociologia. São Paulo: Ed. Paulus, 2008. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
26 
2.2. Anthony Giddens 
Biografia: 
Anthony Giddens é um dos principais expoentes da sociologia 
contemporânea. Nascido em 1938, em Londres, Inglaterra, foi professor na 
Universidade de Cambridge e diretor da London School of Economics and 
PoliticalScience (LSE), entre os anos de 1997 e 2003. Apresenta como principal 
objeto de estudo a reflexão sobre a importância da sociologia contemporânea de 
ultrapassar determinados antagonismos clássicos do pensamento sociológico. 
Para a realização desta tarefa, recorre à teoria da estruturação. Ao contrário de 
Pierre Bourdieu, a obra de Giddens é, sobretudo, teórica. 
Neste sentido, seu interesse acadêmico está atrelado à idéia na 
necessidade de reformular a teoria social e re-estudar a forma como o 
desenvolvimento e a modernidade são compreendidos. Dentre os principais 
temas analisados por este autor, podem ser citados a história do pensamento 
social, a família, a estrutura de classes, as nações e os nacionalismos e a 
identidade pessoal e social. Além destes objetos de estudo, Giddens foi um dos 
primeiros pensadores das ciências sociais a analisar o fenômeno da globalização 
a partir de um ponto de vista sociológico. 
 
 
O que é estruturação? 
A estruturação pode ser “... definida como sendo o 
processo de relações sociais que se estruturam no 
tempo e no espaço, via (...) dualidade do estrutural” 
(Riutort, 2008: 396), ou seja, “... as propriedades 
estruturais de sistemas sociais são, ao mesmo 
tempo, meio e fim das práticas que elas 
recursivamente organizam” (Giddens, 20); ao mesmo 
tempo, ela restringe e possibilita as práticas dos 
agentes sociais. 
 
 
 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
27 
2.2.1. Elementos teóricos e metodológicos referentes à sociologia de 
Anthony Giddens 
Anthony Giddens apresenta como proposta de investigação sociológica 
a necessidade de uma profunda renovação das análises estruturalistas. Nesta 
perspectiva, a prática sociológica pode apenas levar em consideração a idéia de 
que o ajuste “... entre as ações sociais e as estruturas é realizado a priori” 
(Riutort, 2008: 339), fato que leva o pesquisador a perceber a existência da 
sociedade a partir de dois níveis, que se reforçam mutuamente na prática, por 
meio das ações sociais desenvolvidas através de rotinas, as quais fazem com que 
estas práticas sociais adquiram solidez. Estes níveis, aos quais o autor se refere, 
correspondem às estruturas sociais e às representações dos agentes. 
Ao definir o conceito de estruturação sob o ângulo do movimento, uma 
vez que a estrutura é entendida como uma dualidade do estrutural pelo fato de 
que o processo de relações sociais é estruturado no tempo e no espaço, a 
construção do mundo social é percebida como circular. Tal visão tem como 
fundamento o pressuposto de que as dimensões estruturantes da vida social 
estão situadas concomitantemente, quer dizer, elas correspondem tanto às 
condições que antecipam a ação quanto aos produtos resultantes desta ação. 
Logo, 
 
“... a vida cotidiana, assim está estruturada por meio de um 
conjunto de regras codificadas que vão da fragmentação da 
jornada em seqüências temporais predefinidas (o emprego do 
tempo), até a previsibilidade das ações sociais em função da 
natureza de seu interlocutor (sabemos intuitivamente como nos 
comportar no trato com o carteiro, com a esposa, o vizinho...), o 
que permite ao indivíduo buscar referências no espaço e no 
tempo. O fato das interações sociais estarem situadas espacial e 
temporalmente marca profundamente as ações” (Riutort, 2008: 
340). 
 
Os agentes sociais, portanto, são dotados de competências, pois eles 
conhecem o mundo em que atuam e têm a capacidade de estabelecer ações 
racionais e intencionais, podendo, por conseqüência, explicar os atos realizados. 
Contudo, estas ações sociais cotidianas 
 
Sociologia 
Sociologia III 
 
28 
“... se vêem capturadas nas redes múltiplas e difíceis de dominar 
do inconsciente e das conseqüências não intencionais da ação. 
Além disso, (...) a atividade social mais corriqueira de todos os 
dias é menos determinada por motivações diretas do que pela 
rotina que é um meio de reduzir as fontes de angústia” 
(Lallement, 2004: 177). 
 
Ao definir que as regras sociais são ao mesmo tempo coercitivas e 
habilitantes, Giddens explica que a estrutura social ao mesmo tempo em que ela 
pode limitar a margem de ação dos atores, pode, também, autorizar outras 
práticas sociais. Para agir nestas situações específicas, os indivíduos recorrem as 
suas competências, as quais correspondem à existência de uma consciência 
prática, que tem a capacidade de agir e fundar uma ação com base em pontos de 
apoio, retirados tanto da realidade na qual estes indivíduos se encontram quanto 
de suas experiências passadas. 
Logo, as competências correspondem a tudo aquilo em que os 
indivíduos acreditam e conhecem sobre a sua própria ação e a ação dos outros; 
estas competências podem ser tácitas (rotineiras) ou discursivas (expressas de 
maneira verbal), sendo acionadas pelos agentes na produção e reprodução da 
ação. As competências correspondem às capacidades reflexivas dos 
agentes sociais, significando que estes têm a capacidade de compreender o que 
fazem, durante o ato da ação, isto é, enquanto o fazem. 
É por este motivo que Giddens (1987) define os indivíduos enquanto 
agentes sociais, imbuídos de agência. O agente, segundo o autor, é aquele 
sujeito que possui a capacidade de exercer algum tipo de poder, podendo, com 
isto, causar algum evento ou mudança. Desta forma, o sentido da agência 
corresponde à capacidade que as pessoas têm para realizar as coisas, podendo 
elas ter atuado de modo diferente, em qualquer fase de uma seqüência de 
comportamento. O indivíduo é percebido como perpetrador dos eventos sociais. A 
agência não se refere, portanto, às intenções que as pessoas possuem ao fazer 
as coisas. Para o autor, 
 
“Não é a experiência do ator individual nem a existência de 
qualquer forma de totalidade social, mas as práticas sociais 
ordenadas no espaço e no tempo. As atividades sociais humanas 
(...) são recursivas. Quer dizer, elas não são criadas pelos atores 
sociais, mas continuamente recriadas por eles através dos 
Sociologia 
Sociologia III 
 
29 
próprios meios pelos quais eles se expressam como atores. Em 
suas atividades, e através destas, os agentes reproduzem as 
condições que tornam possíveis essas atividades” (Giddens, 2). 
 
Crítico da sociologia funcionalista clássica, Giddens (1999) desconstrói 
o conceito de função apresentado por esta perspectiva metodológica. Para ele, a 
metáfora utilizada por autores como Durkheim, por exemplo, em comparar o 
sistema social a um organismo vivo (biológico), entendo a sociedade como uma 
extensão do corpo humano, negligencia a competência dos indivíduos e as suas 
atividades intencionais. 
Ao invés de situar o indivíduo passivamente perante os fenômenos 
sociais, este é definido pelo autor como um sujeito que apresenta capacidades de 
ação. Estas capacidades são adquiridas através da agência humana, quer dizer, 
não são os indivíduos quem criam os sistemas sociais (as sociedades humanas); 
ao contrário, 
 
“... eles os reproduzem ou transformam, refazendo o que já está 
feito na continuidade da práxis. (...) quanto maior for o 
distanciamento tempo-espaço de sistemas sociais – quanto mais 
suas instituições se fixam com firmeza no tempo e no espaço – 
tanto mais eles resistem à manipulação ou mudança por qualquer 
agente individual. (...) O distanciamento tempo-espaço fecha 
algumas possibilidade de experiência humana, ao mesmo tempo 
que abre outras” (140). 
 
Neste sentido, os agentes sociais são potencialmente capazes de 
produzir variações históricas em seus próprios comportamentos rotineiros, 
fazendo com que os sistemas sociais sejam expressos nas rotinas da vida social 
cotidiana, baseadas na consciência prática. A rotina, conforme o autor, faz parte 
da continuidade da personalidade do agente social. Isto ocorre na medida em que 
os caminhos das atividades cotidianas e das instituições, que compõem uma 
determinada sociedade, são continuamente reproduzidos. 
 
 
Motivação da ação:refere-se “... às necessidades 
que a instigam (...). Ela refere-se mais ao potencial 
para a ação do que propriamente ao modo como a 
Sociologia 
Sociologia III 
 
30 
ação é cronologicamente executada pelo agente” 
(5). 
 
Intencionalidade da ação – este conceito “... 
caracteriza um ato que seu perpetrador sabe, ou 
acredita, que terá uma determinada qualidade ou 
desfecho e no qual esse conhecimento é utilizado 
pelo autor para obter essa qualidade ou desfecho” 
(8). 
 
 
“A dualidade do estrutural: 
 
O estrutural, 
As estruturas 
Os sistemas sociais A estruturação 
Regras e recursos, ou 
conjunto de relações de 
transformação, 
organizados enquanto 
propriedades de sistemas 
sociais. 
Relações entre atores ou 
coletividades, reproduzidas 
e organizadas enquanto 
práticas socialmente 
regulares. 
Condições que regem a 
continuidade ou a 
transmutação das 
estruturas e, por via de 
conseqüência, a 
reprodução dos sistemas 
sociais. 
 
Em síntese, o estrutural, enquanto conjunto de regras e recursos organizados de 
modo recursivo, está fora do tempo e do espaço, à exceção da sua atualização e 
coordenação sob a forma de traços mnésicos. Além disso, o estrutural se caracteriza por 
uma ‘ausência do sujeito’. Enfim, está engajado de modo recursivo nos sistemas sociais 
que, contrariamente ao estrutural, se compõem de atividades espácio-temporalmente 
situadas dos agentes humanos que reproduzem estas últimas no tempo e no espaço. O 
estudo da estruturação dos sistemas sociais é o estudo dos modos pelos quais estes 
sistemas, que se baseiam nas atividades de atores competentes, situados no tempo e 
no espaço, lançando mão de regras e recursos em uma diversidade de contentos de 
ação, são produzidos e reproduzidos na interação desses atores, e por ela. No centro da 
idéia de estruturação encontramos a dualidade do estrutural que, no plano lógico, deriva 
das afirmações precedentes. A constituição de agentes e a constituição de estruturas 
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Sociologia III 
 
31 
não são dois fenômenos independentes, um dualismo: trata-se de uma dualidade. 
Segundo a dualidade do estrutural, as propriedades estruturais dos sistemas sociais são 
ao mesmo tempo o médium e o resultado das práticas que organizam de modo 
recursivo. O estrutural não é ‘exterior’ aos agentes: enquanto traços mnésicos e 
enquanto atualizado nas práticas sociais, é, no sentido durkheimiano, mais ‘interior’ que 
exterior a suas atividades. O estrutural não é apenas coerção; ele é ao mesmo tempo 
coercitivo e habilitante. Isso não impede que as propriedades estruturadas dos sistemas 
sociais se estendam, no tempo e no espaço, muito além do controle que pode exercer aí 
cada ator. O que procede não impede tampouco que possa haver sistemas sociais 
reificados em teorias produzidas por atores que, pelas suas atividades, contribuem para 
a constituição e a reconstituição destes mesmos sistemas. A reificação das relações 
sociais ou a ‘naturalização’, sob a forma de discurso, das circunstâncias e dos produtos 
historicamente contingentes da ação humana, constitui uma das principais dimensões da 
ideologia na vida social”. 
(Fonte: Giddens, Anthony. La constitution de la société. Paris: Ed. PUF, 1987, 74-75). 
 
O sistema social: 
“Mesmo permanecendo bastante crítico em relação ao funcionalismo, corrente à 
qual ele desaprova justamente o fato de desconhecer as capacidades cognitivas e 
estratégicas dos atores sociais, Giddens concebe, no entanto, o projeto de elaborar uma 
teoria capaz de dar conta da coerência do conjunto do sistema social. 
Giddens caracteriza, desta forma, o sistema social como sendo a formação, no 
espaço e no tempo, de modelos regularizados de relações sociais concebidas como 
práticas reproduzidas que ele religa à interação social: ‘A reciprocidade de práticas entre 
atores em circunstâncias de co-presença concebidas como encontros que se fazem e se 
desfazem’ (...). Essa perspectiva, que assim visa apreender cada interação concreta que 
se dá em um espaço-tempo específico e em relação com as características estruturais 
que a definem, tende a ultrapassar a segmentação entre micro e macrossociologia. 
Entretanto, é possível ver nesse procedimento, em parte, uma maneira de ressuscitar – 
ainda que renovando-a – a ‘suprema teoria’ que caracterizaria o estruturalismo 
funcionalista de Parsons e que constituiria em propor um esquema abstrato de realidade 
social de difícil operação no plano empírico”. 
(Fonte: Riutort, 2008: 341). 
 
 
 
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Sociologia III 
 
32 
2.2.2. O conceito de modernidade 
A partir da teoria da estruturação, Anthony Giddens (1987) investiga as 
conseqüências da modernidade, ou seja, procura compreender quais são os 
efeitos produzidos pelo distanciamento espacial e temporal entre os indivíduos, 
promovido pela evolução dos progressos tecnológicos. 
O conceito de modernidade é definido pelo autor como sendo um estilo 
de vida, um costume ou organização social que surgiu em um local específico 
(Europa), em uma época específica (século XVII-XVIII) e que, posteriormente, 
tornou-se mais ou menos mundial em sua influência. Desse modo, contrapondo 
alguns filósofos que definem a modernidade (pós-modernidade) como sendo uma 
fase inédita e bastante peculiar da história da humanidade, Giddens (1997) a 
associa à determinados traços históricos que surgiram com o capitalismo, 
entendido por ele como sistema social e econômico. 
Tal fenômeno social determinaria, a partir desse período histórico, em 
uma separação e distanciamento cada vez maior entre o espaço e o tempo, 
provocando, por conseqüência, o aparecimento de novas relações sociais. Tais 
relações se referem ao deslocamento que 
 
“... consiste, então, primeiramente em isolar essas relações de 
seu contexto de interação, depois em reestruturá-las em um 
campo espaço-temporal indefinido. Esse fenômeno envolve dois 
mecanismos: o desenvolvimento de avalistas simbólicos, isto é, 
de instrumentos de trocas que podem circular a todo o momento, 
tal como o dinheiro (...). e também o aparecimento de sistemas 
especializados, domínios técnicos ou de savoir-faire profissional 
que concernem vastos setores de nosso meio material e social, 
tais como objetos cotidianos que necessitam de um grau elevado 
de tecnologia, como um automóvel, um elevador ou um sistema 
elétrico” (Riutort, 2008: 343). 
 
Por conseqüência, os demais indivíduos, considerados pelo autor como 
profanos, isto é, pessoas que desconhecem as particularidades e especificidades 
de uma determinada técnica ou campo de saber, devem depositar confiança 
nesses sistemas complexos, devido a sua própria incapacidade de fabricá-los. 
Desse modo, as sociedades modernas apresentam como principal característica 
dependência em relação aos mecanismos abstratos, definidos por Giddens (1997) 
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Sociologia III 
 
33 
como instâncias que demandam uma reflexão constante por parte dos agentes 
sociais. 
Estes mecanismos requerem uma profunda transformação na 
organização social, ampliando significativamente o espaço e o tempo. As 
modificações dos recursos que se referem a estas instâncias da sociedade 
podem ser identificadas na leitura que o referido sociólogo faz em relação ao 
fenômeno da globalização, a qual apresenta quatro dimensões: o sistema do 
Estado-nação, a economia capitalista mundial, a ordem militar mundial e a divisão 
internacional do trabalho. 
Se outrora as relações sociais referiam-se a um determinado espaço e 
tempo, bastante (de)limitados, na contemporaneidade estas relações e interações 
ocorrem globalmente, isto é, em escala planetária, fator que afeta as 
subjetividades dos indivíduos. A confiança e a segurança, características da 
sociedade tradicional, não mais ocupam espaço central na modernidade; ao 
contrário, seus lugares são ocupados pela incerteza, que é cada vez mais 
crescente neste modelo de organização social.Tal sentimento de insegurança e 
incertezas constantes está associado aos sistemas sócio-técnicos, cada vez mais 
complexos e dificilmente controláveis. Ao referir-se à incerteza e ao medo, 
Giddens (1997) cita como exemplos os receios que as sociedades modernas têm 
de acidentes nucleares, do potencial de destruição produzido por armamentos 
cada vez mais sofisticados, etc. 
A modernidade, portanto, no seu atual contexto político, social, 
econômico e cultural, apresenta três aspectos, que radicalizam o seu dinamismo. 
O primeiro aspecto refere-se à separação tempo-espaço; para o autor a difusão 
do relógio e a padronização dos calendários tornaram o tempo uma construção 
social-artificial. Outro elemento que caracteriza o período analisado diz respeito 
aos mecanismos de desencaixe, quer dizer, observa-se um deslocamento das 
relações sociais de contextos locais de interação e sua reestruturação através de 
extensões indefinidas de tempo-espaço. As organizações modernas são capazes 
de conectar o local e o global de modo impensável nas sociedades mais 
tradicionais, afetando, por conseqüência, o cotidiano social e a vida de milhares 
de pessoas (como exemplo destas transformações é possível citar as mudanças 
desencadeadas pelo uso da internet na vida dos indivíduos, a qual permite com 
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que estes tenham acesso instantâneo à informação). Dentre os principais 
mecanismos de desencaixe, Giddens (1997) ressalta dois: as fichas 
simbólicas, que consistem em meios de troca impessoais (crédito) como, por 
exemplo, o dinheiro, que tem um valor padrão, e os sistemas peritos, definidos 
como sistemas especializados de conhecimento aos quais os leigos (ou profanos) 
não têm acesso e por isso confiam naqueles que detêm tal conhecimento. O 
terceiro aspecto refere-se à reflexividade; por reflexividade o autor entende que é 
necessário pensar e repensar as relações sociais, pois este processo permite a 
descoberta e o desenvolvimento de novos conhecimentos sobre essas relações, 
ou seja, a utilização cotidiana desses conhecimentos permite que os indivíduos 
ordenem e reordenem as suas relações sociais. 
Diante desse quadro, Giddens (1997) destaca que o ritmo de mudança 
acelerado, observado no último século principalmente, gera um dinamismo que é 
a essência da modernidade. A sociedade moderna torna-se mais reflexiva no 
contexto pós-tradicional, pois é o próprio indivíduo que reflete e reconstrói 
incessantemente o seu mundo. 
A perspectiva teórico-metodológica apresentada, ao contrário de 
abordagens mais clássicas, enfatiza o caráter ativo, isto é, reflexivo, da conduta 
humana. Ao rejeitar as tendências metodológicas, como as sociologias da 
interação social, pautadas na interiorização das normas sociais, por exemplo, que 
percebem o comportamento dos indivíduos como resultante de forças e situações 
que os atores sociais não controlem e nem compreendem, Giddens (1997) atribui 
um papel central para a linguagem e as capacidades de entendimento individuais 
na explicação da vida social. 
 
“As sociologias construtivistas que tentam 
ultrapassar a clássica oposição entre individualismo 
e holismo, hoje frequentemente são consideradas 
como sendo ‘novas sociologias’. Elas se esforçam, 
apesar de suas sensíveis diferenças, em considerar 
as duas pontas da análise social, estudando 
conjuntamente as representações e as estruturas 
sociais, sem privilegiar necessariamente umas em 
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Sociologia III 
 
35 
detrimento de outras. A amplitude da tarefa permite 
apreender ao mesmo tempo a predileção e os vivos 
debates que essas abordagens geralmente têm 
suscitado” (Riutort, 2008: 345). 
 
 
TEMAS DE REFLEXÃO 
 
• O que é modernidade para Anthony Giddens? 
• A dualidade do estrutural 
• Estruturação e sistemas sociais 
• Reflexividade 
• Fichas simbólicas e sistemas peritos 
• Mecanismos de desencaixe 
 
 
SUGESTÃO DE LEITURAS 
• CORCUFF, Philippe. As novas sociologias: construções da realidade social. 
Bauru, SP: Edusc, 2001. 
 
• GIDDENS, Anthony. Estruturalismo, Pós-estruturalismo e a Produção da Cultura. 
IN: GIDDENS, Anthony; TURNER, Jonathan (org.) Teoria social hoje. São Paulo, 
Ed. UNESP, 1999. 
 
• GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich; LASH, Scott. Modernização reflexiva: 
política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Ed. Da 
UNESP, 1997. 
 
• GIDDENS, Anthony. La constitution de la société. Paris: Ed. PUF, 1987. 
 
• LALLEMENT, Michel. História das idéias sociológicas: de Parsons aos 
contemporâneos. Petrópolis: Ed. Vozes, 2004, 2ª ed. 341 p. 
 
• RIUTORT, Philippe. Compêndio de Sociologia. São Paulo: Ed. Paulus, 2008. 
 
 
 
 
 
 
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36 
CAPÍTULO III 
 
DEPOIS DE MARX: A PERSPECTIVA DA SOCIOLOGIA CRÍTICA 
SEGUNDO JÜRGEN HABERMAS 
 
3.1. JÜRGEN HABERMAS 
Biografia: 
Jürgen Habermas nasceu na cidade de Düsseldorf, Alemanha, em 1929. 
É reconhecido internacionalmente pelo seu trabalho como filósofo e sociólogo. 
Formado na Universidade de Bonn, em 1954, foi assistente de Theodor Adorno 
no Instituto de Pesquisa Social em Frankfurt entre os anos de 1956 e 1959. É 
considerado como um dos principais herdeiros da Escola de Frankfurt, conhecida 
pelas discussões referentes à sociologia crítica. Contudo, diferencia-se de seus 
antecessores como Adorno, Marcuse, Horkheimer, por exemplo; ao contrário 
destes, que percebiam o projeto da modernidade como inexeqüível, Habermas 
parte do pressuposto de que a razão possui um potencial emancipatório, possível 
através do exercício da ação comunicacional. 
 
3.1.1. A colonização do mundo vivido 
Os estudos de Habermas, considerado por muitos pensadores como 
membro da última geração da Escola de Frankfurt, representam uma reflexão e 
uma tentativa de reconstrução e/ou renovação da sociologia crítica 
contemporânea. 
Reconhecendo a influência da teoria marxista sobre sua perspectiva 
teórica-metodológica, o autor explica que a teoria crítica precisa realizar uma 
ruptura com Marx em três dimensões: a primeira delas consiste em deixar de lado 
a tentação evolucionista identificada nos trabalhos de Marx, isto é, de que as 
sociedades passariam por estágios de desenvolvimento bastante específicos, o 
qual teria início com o capitalismo e culminaria, impreterivelmente, em um modelo 
de organização social comunista. A segunda dimensão refere-se ao viés 
economicista observado na obra de Marx; se este consagra uma preeminência 
das forças produtivas e do trabalho em relação às outras esferas da sociedade, 
Habermas (2004) destaca o papel fundamental que o debate público possui no 
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37 
contexto social, visto que é através deste que se consolidam as regras e 
instituições sociais. Por fim, considera uma perspectiva reducionista a tendência 
de olhar o sistema social através da clivagem da dominação. 
Deste modo, ao contrário da perspectiva marxista, que percebia a 
possibilidade de mudança social através da revolução, Habermas (2004) sugere, 
ao longo de seus estudos, caminhos mais emancipatórios, quer dizer, destaca 
 
“... as virtudes libertadoras de um estado ideal de sociedade de 
comunicação pura e perfeita, situação de interação através do 
diálogo, onde não haveria dominação. Este ideal constitui, a 
seu ver, uma alternativa às outras formas de atividade 
(instrumental, estratégica) que, comandadas pela única 
esperança de sucesso, contribuíram para a perda do poder 
regulador próprio da tradição, dos costumes, dos valores” 
(Lallement, 2004: 217). 
 
Esta colonização do mundo da vida, isto é, a sobreposição da 
burocratização e da monetarização das esferas do cotidiano social em detrimento 
da argumentação e participação pública, interfere no processo de interações 
sociais. Logo, o mundo da vida refere-se ao mundo sociocultural, o qual se torna 
inteligível e descritível quando os atores sociais têm a capacidade deadquirir 
familiaridade com o mesmo, incorporando-o nas suas práticas de uso cotidianas. 
A colonização significa, portanto, a dominação crescente do sistema 
(econômico e administrativo) sobre o mundo da vida dos indivíduos, abrangendo 
as esferas públicas e privadas. Se o debate público, ou a opinião pública, são 
considerados como instâncias fundamentais para a consolidação da democracia 
moderna, Habermas (2004) observa que, na segunda metade do século XX, o 
que é visível é uma privatização e mercantilização do espaço público. A 
argumentação pública, central para o estabelecimento de um consenso, isto é, de 
regras sociais, cede lugar aos interesses administrativos e econômicos. O mesmo 
pode ser observado em relação às instâncias privadas, as quais são invadidas 
gradativamente e cada vez mais regulamentadas pelo Estado e/ou pelo dinheiro; 
as atividades artísticas, científicas, educacionais, etc., passam a ser mediadas por 
instrumentos e normas que desconstroem as formas tradicionais dos laços 
sociais. 
 
Sociologia 
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38 
Em que consiste a ética do discurso? 
Para Habermas (2003) “... as fundamentações morais dependem da efetiva 
realização de argumentações, não por razões pragmáticas relativas ao equilíbrio de 
poder, mas, sim, por razões internas relativas à possibilitação de discernimentos morais. 
A tentativa de fundamentar a ética sob a forma de uma lógica da argumentação 
moral só tem perspectiva de sucesso se também pudermos identificar uma pretensão de 
validez especial, associada a mandamentos e normas, e isso já no plano em que surgem 
os primeiros dilemas morais: no horizonte do mundo da vida (...). Se não for verdade que 
já aqui, nos contextos do agir comunicativo, logo antes de toda reflexão, surgem 
pretensões de validade no plural, não deveremos esperar uma diferenciação entre 
verdade e correção normativa no plano da argumentação. 
Não quero repetir a análise do agir orientado para o entendimento mútuo (...), mas 
gostaria de lembrar uma idéia fundamental. Chamo comunicativas às interações nas 
quais as pessoas envolvidas se põem de acordo para coordenar seus planos de ação, o 
acordo alcançado em cada caso medindo-se pelo reconhecimento intersubjetivo das 
pretensões de validez. No caso de processos de entendimento mútuo lingüísticos, os 
atores erguem com seus atos de fala, ao se entenderem uns com os outros sobre algo, 
pretensões de validez, mais precisamente, pretensões de verdade, pretensões de 
correção e pretensões de sinceridade, conforme se refiram a algo no mundo objetivo 
(enquanto totalidade dos estados de coisas existentes), a algo no mundo social comum 
(enquanto totalidade das relações interpessoais legitimamente reguladas de um grupo 
social) ou a algo no mundo subjetivo próprio (enquanto totalidade das vivências a quem 
têm acesso privilegiado). Enquanto que no agir estratégico um atua sobre o outro para 
ensejar a continuação desejada de uma interação, no agir comunicativo um é motivado 
racionalmente pelo outro para uma ação de adesão – e isso em virtude do efeito 
ilocucionário de comprometimento que a oferta de um ato de fala suscita”. 
Fonte: HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. RJ, Tempo Brasileiro, 2003, 
pg. 78-79). 
 
3.1.2. O que é ação comunicacional? 
O desenvolvimento da sociedade moderna implica, na perspectiva de 
Habermas, em um crescente domínio da racionalidade instrumental (burocrática) 
sobre as práticas e interações sociais. 
Observando os clássicos da sociologia observa-se um ponto em comum 
entre esses autores, embora cada um deles apresente suas especificidades 
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39 
teóricas e metodológicas. Tanto Marx, quanto Durkheim e Weber partem do 
pressuposto de que as instituições estruturantes da sociedade moderna e 
capitalista são o Estado racional burocratizado e o mercado competitivo. 
A esfera pública ou da sociedade civil, “negligenciados” como 
problemáticas sociológicas pelos cientistas sociais clássicos, são tardiamente 
incorporadas pelos estudos sociológicos. É neste sentido que Habermas se 
destaca enquanto pensador social. Para ele a esfera pública não pode ser 
confundida como a oposição clássica entre sociedade civil (espaço das 
possibilidades) e Estado; ao contrário, a esfera pública representa nesta 
perspectiva metodológica um terceiro momento das sociedades modernas, não 
podendo ser confundida nem com o Estado e nem com o mercado. Ela pode ser 
definida como “... uma esfera composta de sujeitos privados com opinião própria, 
o que assegura a possibilidade da contraposição coletiva a decisões 
discricionárias do poder público” (Souza, 2000: 60). 
É neste espaço que os atores sociais privados reunidos em um público 
têm a possibilidade de formar aquilo que o autor denomina como opinião pública 
crítica, capaz de discutir coletivamente a legitimidade discursiva do Estado. 
Assim, tudo aquilo que é definido como público, quer dizer, como instâncias de 
interesse geral, precisa ser provado argumentativamente como sendo um bem 
para todos. 
A comunicação assume, então, um papel fundamental. É devido à 
linguagem que as formas de sociabilidade são possíveis, pois é através dela que 
ocorre a reprodução cultural, a integração social e a socialização. O agir 
comunicacional representa todas aquelas interações em que os membros de 
uma determinada sociedade discutem coletivamente e publicamente questões 
relativas a seus planos de ação. Estas decisões, tomadas em conjunto, 
constituem aquilo que o autor define como princípio da universalização; para que 
isto ocorra é preciso a obtenção de um consenso, não no sentido de que todos os 
indivíduos pensem exatamente da mesma forma, mas com base na idéia de que 
todas as pessoas tiveram a possibilidade de participar de um debate público e, a 
partir dele, construir um conjunto de regras legitimadas socialmente. 
É com base nesta racionalidade comunicativa que Habermas (2003) 
aponta para a possibilidade de tornar efetiva nas sociedades modernas a 
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40 
competência potencial. Desse modo, a reflexão, a argumentação e a ação 
comunicativa são centrais para pensar o desenvolvimento das práticas e 
interações sociais. A deliberação não está baseada em princípios universalmente 
estabelecidos, mas em casos analisados, tendo por objetivo traçar uma política da 
ação (Habermas, 2004a). 
Diante de uma sociedade fragmentada, na qual não é possível constituir 
uma vida ética absoluta, Habermas (2004a) questiona se há alguma possibilidade 
de autonomia e moral nesse tipo de sociedade. É a partir desse quadro que ele 
procura entender o atual desenvolvimento da ciência e as suas conseqüências no 
cotidiano da sociedade. Partindo de uma discussão filosófica sobre a distinção 
entre a teoria kantiana da justiça e a ética de ser si mesmo, Habermas (2004a) 
procura entender as mudanças desencadeadas no século passado, 
especialmente. 
Se até o século XIX, o modelo de análise metafísico oferecia modelos de 
vida como, por exemplo, a ética e a política, as quais possuíam uma única base, a 
partir do século passado, a transformação social acelerada reconfigurou essas 
doutrinas; a partir dessa mudança, a Filosofia não conseguiu mais oferecer 
respostas absolutas às perguntas sobre as formas de se conduzir individual ou 
coletivamente. Nesse sentido, perguntas do tipo “o que devo fazer”, estão 
imbuídas de questões morais-práticas que, 
 
“... são afastadas da discussão racional na medida em que não 
podem ser respondidas do ponto de vista da racionalidade meio-
fim. Essa patologia da consciência moderna requer uma 
explicação no quadro de uma teoria da sociedade; a ética 
filosófica, que é incapaz de fornecê-la, tem que proceder 
terapeuticamente e mobilizar, contra o deslocamento 
dissimulador dos fenômenos morais fundamentais, as forças de 
auto-saneamento da reflexão” (HABERMAS: 2003:

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