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CAPÍTULO Organização o Genoma e Expressão Gênica Um fenótipo de uma planta é o resultado de três fatores principais: o seu genótipo (todos os genes, ou alelos, que determinam as características da planta), o padrão de modificações epigenéticas de seu DNA e o ambiente em que vive. No Capítulo 1, foram revisados a estrutura fundamenta l e a função do DNA, seu empacotamento dentro de cromossomos e as duas fases principais da expressão gênica: transcrição e tradução. Neste capítu lo, será discutido como a composição do genoma, além de seus genes, influencia a f isiologia e a evolução do organismo. Primeiro, serão exa- minados a organização do genoma nuclear e os elementos extragene que contém. Em seguida, volta-se para os genomas citoplasmáticos que estão contidos dentro das mitocôndrias e dos plastídeos. Também será discutido sobre a maquinaria ce- lular necessária para transcrever e traduzir os genes em proteínas funciona is e será visto como a expressão gên ica é regu lada tanto transcricional como pós-transcricio- nalmente. Finalmente, serão introduzidas algumas das ferramentas util izadas para estudar a função gênica, concluindo com uma discussão sobre o uso da engenharia genética na pesquisa e na agricultura. Organização do genoma nuclear Como d iscutido no Capítulo 1, o genoma nuclear contém a maioria dos genes necessários para as funções fis iológicas da planta . O primeiro genoma de uma espécie vegetal a ser completamente sequenciado foi o de uma pequena angios- perma d icotiledônea chamada Arabidopsis thaliana (arabidopse-do-tale ou erva- -estrelada), em 2000. 36 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger O genoma de A. thaliana é composto por cerca de 157 mi- lhões de pares de bases (157 Mpb ), que são distribuídos ao longo de cinco cromossomos. Em comparação, o geno- ma do lírio (Fritillaria assyriaca), a espécie vegetal com o maior genoma conhecido, contém 88.000 Mpb. Dentro de seu genoma nuclear, A. thaliana possui cerca de 27.400 ge- nes codificadores de proteínas e quase 5.000 genes que são pseudogenes (genes não funcionais) ou partes de transpo- sons (elementos de DNA móveis, a serem discutidos mais adiante, neste capítulo). Além desses genes, em A. thaliana são conhecidos mais de 1.300 genes que produzem RNAs não codificadores de proteínas (ncRNAs). Muitos desses RNAs são, provavelmente, envolvidos na regulação gêni- ca. Tanto os transposons quanto os ncRNAs serão descri- tos em mais detalhes, mais adiante, neste capítulo. O genoma vegetal, no entanto, consiste em muito mais do que genes. Nesta seção, será examinada a composição química do genoma. Em seguida, será visto como certas regiões do genoma correspondem a funções especificas. O genoma nuclear é compactado na cromatina O genoma nuclear é composto por moléculas de DNA que são enroladas em tomo de histonas, formando estru- turas em forma de contas, chamadas nucleossomos (ver Capítulo 1). DNA e histonas, juntamente com outras pro- teínas que se ligam ao DNA, são referidos como cromati- na (ver Figura 1.10). Dois tipos de cromatina podem ser distinguidos: eucromatina e heterocromatina. Historicamen- te, esses dois tipos foram distinguidos com base na sua aparência em microscopia óptica, quando corados com corantes específicos. A heterocromatina é, geralmente, bem mais compactada e, portanto, parece mais escura do que a eucromatina, menos condensada. A maioria dos ge- nes que são ativamente transcritos em uma planta está localizada dentro das regiões eucromáticas de um cromosso- mo, enquanto muitos genes localizados em regiões heterocromáticas não são transcritos - esses genes estão inati- vos ou silenciados. Comparada com a eucromatina, a heterocromatina é rela- tivamente pobre em genes. As regiões heterocromáticas incluem os centrô- meros, diversos knobs (saliências), e as regiões imediatamente adjacentes aos telômeros, ou extremidades dos cro- mossomos, conhecidas como regiões subteloméricas (Gill et al., 2008). t-\ 188 A632 B37 BSS B73 1 •• •• '-"-·' •• • .. ~ •• .. .. • • -•• •• 2 • • • como sequência simples repetida (SSR, Simple Sequence Repeats) ou microssatélites. Essas repetições são compos- tas por sequências tão curtas quanto dois nucleotídeos, que se repetem centenas ou mesmo milhares de vezes. Ou- tro grupo dominante de repetições dispersas encontrado na heterocromatina é o de "genes saltadores" ou transpo- sons (Heslop-Harrison e Schmidt, 2007). Centrômeros, telômeros e organizadores nucleolares contêm sequências repetitivas Os mais proeminentes marcadores estruturais nos cromos- somos são os centrômeros, os telômeros e os organizadores nucleolares. Essas regiões contêm sequências repetitivas de DNA que podem ser visíveis por fluorescência em hibridi- zação in situ (FISH - fluorescent in situ hybridization, Kato et al., 2005), uma técnica que utiliza sondas moleculares marcadas com fluorescência - normalmente fragmentos de DNA - que se ligam especificamente a uma sequência a ser identificada (Figura 2.1). Centrômeros são constrições dos cromossomos, onde cromátides-irmãs aderem-se umas às outras e onde as fibras do fuso ligam-se durante a divi- são celular. A ligação das fibras ao centrômero é mediada pelo cinetocoro, um complexo de proteínas que circunda o centrômero (ver Capítulo 1). Centrômeros consistem em regiões de DNA altamente repetitivas e elementos inativos transponíveis Giang et al., 2003; Ma et al., 2007). Telôme- ros são sequências localizadas nas extremidades de cada cromossomo. Os telômeros agem como "quepes" (caps) nas extremidades do cromossomo e impedem a perda de DNA durante a sua replicação. As moléculas de RNA que compõem os ribossomos (rRNA) são transcritos a partir de regiões organizadoras nucleolares (NORs, nucleolar organizer regions). Como os 4 10 • -- • • 'e. ;,. ,,. .. .... • • .. - ... . .. - ·- •• • .. • • • • • • .. • • ~ • • t;:I~ -· • • " • • .... - • .. • . -., - •• ••• ~ • • • • -- .. . . . ... ~· ••• -· •• 'iê~ •• • • •• .. -. • • •• -... ·- ... .. ... ~ tt.;~ • -~ • - .. -, •• .. • 1i .. • • -. ., • • • ! • • • • •• • ~··.,; • " .. ~ .. .. •• .. .. . . . ..... • • .. As estruturas heterocromáticas ge- ralmente são formadas por sequências de DNA altamente repetitivas ou repe- tições em série (tandem repeats): blocos de motivos de nucleotídeos com cerca de 150 a 180 pb, que se repetem várias vezes. Uma segunda classe de repeti- ções é a das repetições dispersas. Um tipo de repetição dispersa é conhecida FIGURA 2.1 Marcadores cromossômicos, incluindo centrômeros, telômeros e organiza- dores nucleolares, podem ser usados para identificar cromossomos individuais. Cada linha mostra os dez pares de cromossomos de uma diferente linhagem de milho (5 linhas co- muns são mostradas aqui, de A 188 a 873). As sequências de DNA (sondas), complementa- res para certos marcadores cromossômicos, foram marcadas com corantes f luorescentes e hibridizadas às preparações cromossômicas. Os centrômeros podem ser vistos como pontos verdes próximos da região mediana dos cromossomos, os organizadores nucleolares como uma área verde larga, sobre o cromossomo 6, e os telômeros como tênues pontos verme- lhos, mais claramente visíveis no topo dos cromossomos 2-4. As áreas maiores destacadas em azul são regiões heterocromáticas específicas (a partir de Kato et ai. , 2004). ribossomos são compostos principalmente de rRNA, e, já que muitos ribossomos são necessários para a tradução, não é surpresa que as NORs contenham centenas de có- pias repetidas de cada gene de rRNA. Dependendo da espécie vegetal, um ou vários organizadores nucleolares estão presentes no genoma (o milho tem um no cromosso- mo 6; ver Figura 2.1). Devido à sua natureza repetitiva e ao seu alto conteúdo GC, as NORs podem ser vistas por meio de um microscópio óptico (após coloração) e, portanto, po- dem servir como marcadores espeáficos de cromossomos. Esses marcadores podem ser usadospara mapear traços fenotípicos específicos para regiões cromossômicas. Ape- sar de sua natureza repetitiva, o rDNA (DNA que codifica rRNA) é ativamente transcrito. O rDNA do organizador nucleolar, junto com proteínas que transcrevem o rDNA e processam o transcrito primário do rRNA para montagem em ribossomos, formam uma estrutura nuclear proemi- nente chamada nucléolo (ver Figura 1.4). Transposons são sequências móveis dentro do genoma Um tipo dominante de DNA repetitivo dentro das regiões heterocromáticas do genoma é o transposon. Transpo- sons, ou elementos transponíveis, são também conhe- cidos como "genes saltadores" porque alguns deles têm a capacidade de inserir uma cópia de si mesmos em um novo local dentro do genoma. Existem duas grandes classes de transposons: os re- troelementos ou retrotransposons (Classe 1) e os trans- posons de DNA (Classe 2). Essas duas classes são distin- guidas por seu modo de replicação e de inserção em um novo local (Figura 2.2). Os retrotransposons fazem uma cópia de RNA de si mesmos, que é reversamente transcrita em DNA, antes de ser inserida em outras partes do ge- noma (ver Figura 2.2A). Como normalmente não deixam sua localização original, mas geram cópias adicionais de si mesmos, retrotransposons ativos tendem a se multiplicar dentro do genoma (Eickbush e Malik, 2002). Transposons de DNA, ao contrário, movem-se de uma posição para outra, usando um mecanismo de "corta-e-cola", catalisa- do por uma enzima que é codificada dentro da sequência do transposon. Esta enzima, transposase, corta e emenda (splicing) o transposon, inserindo-o em outras partes do genoma, em muitos casos mantendo constante o número total de cópias do transposon (ver Figura 2.2B). A transposição em um gene pode resultar em muta- ções. Se um transposon acopla-se dentro de uma região codificadora, o gene pode ser inativado. A inserção de um transposon próximo a um gene também pode alterar o pa- drão de expressão gênica. Por exemplo, o transposon pode perturbar os elementos reguladores normais do gene, im- pedindo a transcrição ou, já que muitas vezes carregam transposons promotores, aumentar a sua transcrição. A capacidade mutagênica dos transposons pode de- sempenhar um papel importante na evolução do genoma do hospedeiro. De uma perspectiva evolutiva, um baixo nível de mutagênese poderia ser vantajoso para uma espé- Fisiologia Vegetal 37 (A) Retrotransposons (elemento transponível da classe 1) DNA do genoma Retrotransposon t RNA intermediário ..--------. t Transcriptase o reversa t Nova cópia do retrotransposon Inserção (B) Transposons de DNA (elemento transponível da classe 2) DNA do genoma Transposon i Excisão Transposon ..--------. excisado (DNA) --- -- -- -- ----.. - -- -- -- --- Inserção Nova localização do transposon FIGURA 2.2 As duas classes principais de transposons diferem no seu modo de transposição. (A) Os retrotransposons movem-se por meio de um RNA intermediário. (B) Transposons de DNA movem-se usando um mecanismo de corte-e-cola (cut-and-paste). cie, uma vez que poderia criar a variação original necessá- ria para permitir que se adapte a um ambiente em mudan- ça. Se a taxa de transposição é alta, entretanto, resultando em indivíduos com muitas mutações, ao menos algumas dessas mutações provavelmente serão deletérias e pode- rão diminuir a aptidão <Jitness) geral da espécie. Plantas e outros organismos parecem ser capazes de regular a atividade de transposons por meio da metilação do DNA e histonas. Como será visto mais adiante neste ca- pítulo, esses mesmos processos são usados para reprimir ' a transcrição em regiões heterocromáticas do genoma. A medida que mais sequências de DNA genômico tomaram- -se disponíveis, os cientistas têm observado um grande número de transposons altamente metilados em regiões , heterocromáticas. E a metilação dos transposons que cau- sa a formação da heterocromatina em um determinado lo- cal? Ou os transposons tomam-se metilados porque estão presentes em regiões heterocromáticas? Estudos em mutantes, que são incapazes de manter a metilação do genoma, têm mostrado que uma lenta perda 38 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger f . B\ (B) *i >• Setor revertido FIGURA 2.3 A perda de metilagao pode levar a mutagoes, caso os transposons nao metiladados tornem-se ativos. Uma mutagao cha- mada diminuiqao na metilagao do DNA (ddm1) ocasiona hipometi- lagao (metilagao diminufda) de transposons end6genos. A mutagao dam, que surgiu em um mutante ddml , 6 o resultado da insergao de um transposon no gene DWARF4 (DWF4), que 6 necess^rio paraa biossfntese do hormbnio de crescimento brassinosteroide. (A) 0 mutante transposon-induzido dam (3 esquerda) ao lado do tipo sel- vagem, em Arabidopsis. (B) 0 mutante dam sem (esquerda) e com (direita) um setor que foi revertido para o fen6tipo do tipo selvagem, depois que o transposon "saltou para fora" do gene DWF4 (a partir de Miura et al ., 2001). de metilagao ao longo de geragoes pode ativar transposons dormentes e aumentar a frequencia de mutagoes transpo- sicionais (Miura et al., 2001) (Figura 2.3). Essa atividade de transposon pode diminuir consideravelmente a aptidao da prole. Portanto, a metilagao e a formagao de heterocroma- tina parecem desempenhar papeis importantes na estabili- dade do genoma. Poliploides contem copias multiplas de todo o genoma Nivel de ploidia - o numero de copias do genoma inteiro de uma celula - e outro aspecto importante da estrutura do genoma que pode ter implicagoes tanto para a fisiolo- gia quanto para a evolugao. Em muitos organismos, mas especialmente em plantas, todo o genoma diploide (2N) pode sofrer uma ou mais rodadas adicionais de replicagao, sem sofrer citocinese (ver Capitulo1), para tomar-se poli- ploide. A poliploidia nao e um fenomeno raro, restrito a algumas celulas ou organismos, nem e normalmente asso- ciado a mutagao ou doenga. Na verdade, a poliploidia e a forma preferida de vida para muitas plantas e algumas es- pecies de animais. A poliploidia em plantas e tao comum que pesquisadores agora acreditam que a grande maioria das plantas existentes e de origem poliploide (Leitch e Lei- tch, 2008). Essencialmente, todas as especies vegetais tive- ram um evento de duplicagao total de seu genoma em sua historia evolutiva. Duas formas de poliploidia sao distinguidas: autopo- liploidia e alopoliploidia. Autopoliploides contem multi- ples genomas completos de uma unica especie, enquanto alopoliploides contem multiplos genomas completos de- rivados de duas ou mais especies distintas. Ambos os tipos de poliploidias podem resultar da meiose incompleta durante a gametogenese. Durante a meiose, os cromossomos de uma celula reprodutiva diploi- de sofrem replicagao do DNA seguida por duas rodadas de divisao (meiose I e meiose II), produzindo quatro celulas haploides (Figura 2.4). Se a duplicagao de cromossomos nao e seguida por divisao celular durante a meiose, sao formados gametas diploides. Em uma especie, ou em um individuo formado por autofecundagao, se uma oosfera di- ploide e fecundada por uma celula espermatica diploide, o zigoto resultante contem quatro copias de cada cromos- somo e e dito ser autotetraploide (Figura 2.5A). Da mesma forma, se a divisao celular nao ocorre apos a duplicagao dos cromossomos durante a mitose, as celulas se tornam autotetraploides. Ambos os tipos de erro, durante a meio- se ou a mitose, ocorrem espontaneamente na maioria das plantas, embora a frequencia seja muito baixa. Alopoliploides geralmente se formam de duas ma- neiras: 1. Uma celula espermatica haploide de uma especie e uma oosfera haploide de outra especie podem formar um diploide hibrido interespecifico. A meiose nes- sas plantas geralmente falta, mas pode levar a raros gametas duplicados, o que pode produzir o alopoli- ploide. Alem disso,se celulas hfbridas acidentalmente omitirem a divisao celular, tomam-se alopoliploides (Figura 2.5B). Esse tipo de alopoliploidizagao pode acontecer em umzigoto hibrido ou mais tarde, nos te- cidos vegetativos ou reprodutivos da planta hfbrida. FIGURA 2.4 Meiose em plantas. Durante a an^fase I , cromosso-mos hom6logos separam-se e movem-se para polos opostos. As cromcitides separam-se durante a an^fase II . A meiose resulta emquatro c£lulas-filhas, cada qual com metade do numero de cromos- somos parentais. Se um par de cromossomos hom6logos acidental- mente deixar de se separar durante a an^fase I ("nao disjungao"), asc£lulas-filhas resultantes cont§m cromossomos extras ou ausentes e sao aneuploides ou poliploides. Repare que hci variagao, entre as especies vegetais, na telbfase I: nem todas as plantas formam novas paredes celulares nessa fase e, em alguns casos, cromossomos des- condensam-se levemente e podem permanecer em uma fase similar 3 interfase, por um perfodo de tempo antes de entrar em meiose II. MEIOSE 1 Parede celular ~ · --====- Membrana /, p lasmática --!..li/ J Núcleo --~(1_/f_4~~ ~- ~ Citoplasma --+R- §15 Y §E/ Cromossomos alinhados na placa metafásica do cinetocoro Microtúbulos polares Encurtamento dos microtúbulos do cinetocoro Cromosomos, separados, são puxados para polos opostos Retículo endoplasmático Um par de cromossomos homólogos em sinapse (quatro cromátides) Prófase 1 Metáfase 1 Anáfase 1 Telófase 1 MEIOSE li = Fisiologia Vegetal 39 Prófase li Metáfase li Anáfase li Citocinese Quatro célu las-f ilhas 40 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger (A) Autopol iploidia (por duplicação do genoma) Espécie A Gametas haploides normais Células vegetativas diploides Duplicação espontânea do genoma Autotetraploide (fértil) L_ :1~ (e==:::•!:::::> < • ' < m:> X ( ( Espécie A (B) Alopoliploidia (por duplicação do genoma) Gametas haploides Espécie A . normais Células vegetativas do híbrido AB Híbrido AB Alotetraplo ide durante a meiose Duplicação ~-........ espontânea ---1•~ < ~c::l::~ do genoma X Espécie B 1-~'Y!_ ) Cromossomos 1 desalinhados no t híbrido d ip lo ide (C) Alopoliploidia (a partir de gametas diploides) Formação acidental de gametas diploides por falha na meiose reducional Produção de gametas abortada Meiose com sucesso (fértil) Espécie A Célu las vegetativas alopoliploides Híbrido alopol iploide AABB ( .---=>< • )( ~ ( . )( . )( ~ Espécie B X---+- e• >< • > e• ic • > FIGURA 2.5 A poliploidia surge por duplicação do genoma. (A) Duplicação espontânea do genoma em diploides resulta em um au- totetraploide totalmente fértil. (B) Híbridos interespecíficos diploides são, geralmente, inférteis devido à incapacidade de os cromosso- mos se alinharem adequadamente durante a meiose. A dupl icação espontânea do genoma permite que cada cromossomo tenha um parceiro durante a meiose, levando à restauração da fertilidade. (C) A fusão de gametas diploides, a partir de duas espécies diferentes, resulta em um alopoliploide férti l. 2. Gametas d iploides de duas espécies diferentes po- dem se unir para formar um zigoto tetraploide. Os gametas d ip loides pode vir tanto de parentais tetra- p loides, que sofreram meiose normal, ou de parentais dip loides, em que faltou a meiose normal reducional (Figura 2.SC). Os diploides híbridos interespecíficos ocorrem na- turalmente, mas geralmente são estéreis, pois seus cro- Cromossomos alinhados no alopolip lo ide Meiose com sucesso (fértil) mossomos não podem emparelhar-se corretamente du- rante a prófase 1 meiótica (ver Figura 2.SB). A duplicação espontânea do genoma, em híbridos estéreis interespe- cíficos, pode levar à formação de um novo e fértil alo- poliploide - um fenômeno que tem sido observado em muitas espécies, como as de Brassicaceae (Figura 2.6). A falta de fertilidade em híbridos interespecíficos está em contraste gritante com o fenômeno conhecido como vi- gor híbrido ou heterose: o vigor aumentado, frequente- mente observado nos descendentes de cruzamentos en- tre duas variedades puras da mesma espécie de planta. A heterose pode contribuir para a formação de plantas maiores, maior biomassa e maior rendimento nas cultu- ras agrícolas. Fisiologia Vegetal 41 FIGURA 2.6 Três espécies comuns de plantas na família da mostarda (Brassicaceae) têm cruzado entre si, na natureza, para formar novas espé- cies alotetraploides. Suas relações estão retratadas no chamado "triângulo do U ", em homenagem ao cientista coreano Nagaharu U. Os três vértices do t riângulo mostram espécies diploides de Brassica . Cada uma das três espécies pode cruzar com as outras duas para formar novos alopoliploides. n= 9 + 8 Mostarda-preta n= 8 88 8rassica nigra •' n = 10 + 8 ' .- ·' ' - ' . \ ",,.*. ' • • • '( ,,. .. .. ~ ~ ,.,.:r ' ( ' ' ~- 88CC Mostarda-da-Etiópia 8rassica carinata AA88 8rassica juncea • • Mostarda-indiana com sementes oleaginosas, do tipo canola n= 9 cc 8rassica oleracea Couve-flor, brócolis, couve comum n = 10 + 9 AACC 8rassica napus Sementes de canola A poliploidia também pode ser artificialmente induzi- da por tratamento com uma toxina celular natural, chama- da colchicina, derivada do açafrão-do-outono (Colchicum autumnale). Acolchicina inibe a formação de fibras do fuso e impede a divisão celular, mas não interfere com a repli- cação do DNA. O tratamento com colchicina, portanto, resulta em um núcleo indivisível, contendo várias cópias do genoma. As respostas fenotípicas e fisiológicas à poliploidia são imprevisíveis A noção generalizada de que autopoliploides são maiores do que os seus progenitores diploides nem sempre é ver- dadeira. Por exemplo, quando exemplares de milho, com o mesmo padrão genético, mas diferente nível de ploidia, foram comparados, verificou-se que a altura das plantas aumentou do haploide para o diploide, mas diminuiu com novos aumentos no nível de ploidia (Figura 2.7A). Uma hipótese para explicar o maior vigor de alguns autopoli- ploides, comparados com os seus progenitores diploides, n = 10 AA 8rassica rapa Couve-chinesa, acelga-chinesa é que o vigor vegetal aumenta com o aumento da ploidia somente se o hibridismo (heterozigose) também aumenta. Se, ao contrário, o nível de homozigose aumenta em plantas com o aumento do nível de ploidia (por meio de endoga- mia), o seu vigor, na verdade, diminui (Figura 2.78) (Ridd- le et al., 2006; Riddle e Birchler, 2008). Pesquisas para testar essa hipótese estão em curso e, no futuro, poderiam ajudar a orientar os esforços de reprodução em plantas agronomi- camente importantes. Alopoliploides diferem dos seus progenitores diploi- des parentais em dois modos principais: 1. Seus genomas, como nos autopoliploides, são dupli- cados. 2. Eles são luôridos entre duas espécies diferentes. Portanto, ao comparar alopoliploides com seus pro- genitores, é difícil determinar se as diferenças fenotípicas observadas são atribuidas à duplicação do genoma ou à hibridização. Os dados atuais indicam que a hibridização tem uma contribuição maior do que a duplicação do ge- 42 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger (A) • Alterações em modificações epigenéticas (Madlung et (B) .... o Cl 5 Máxima heterozigosidade Máxima ~-------------- homozigosidade Diploide Incremento na ploidia (euploide) FIGURA 2.7 (A) Sucessão de ploidias no milho. Plantas com uma mesma idade são mostradas da esquerda para a direita : haploide, diploide, triploide e tetraploide. No mi lho de linhagem pura, auto- poliploidia resulta em vigor reduzido, em comparação com o diploi- de. Cada faixa preta ou branca, na escala, mede 20 cm. (B) Uma visão generalizada da relação entre o vigor da planta e o nível de ploidia. Com o aumento da ploidia, o vigor da planta aumenta ape- nas nas plantas cujo nível geral de heterozigosidade também au- menta, devido a um maior número de diferentes alelos por genoma (linha vermelha). Em contraste, o incremento na ploidia, em plantas homozigóticas ou puras, está correlacionado coma diminuição do vigor geral da planta (linha azul) (A, cortesia de E. Himelblau; B, adaptado de um diagrama cedido por J. Birchler). noma para a divergência da prole alopoliploide de seus parentais. Os alopoliploides são, em geral, mais vigorosos ou com maior rendimento do que as suas espécies paren- tais e são muito comuns entre plantas agronomicamente importantes. Exemplos desses alopoliloides incluem cano- la, cultivares de couve, café, algodão, trigo, centeio, aveia e cana-de-açúcar. Independentemente de como alopoliploides sur- gem, a fusão de dois genomas divergentes tem muitas consequências, embora ainda não esteja claro se existe um conjunto comum de respostas em todas as espécies durante ou imediatamente após alopoliploidização (Os- born et al., 2003; Chen, 2007). Algumas das mudanças genéticas que têm sido observadas em alopoliploides recém-formados, em comparação com seus progenitores, são as seguintes: • Reestruturação dos cromossomos, incluindo a perda de sequências de DNA (Feldman et al., 1997; Pires et al., 2004). al., 2002; Salmon et al., 2005; Parisod et al., 2009). • Mudanças na atividade transcricional do gene (Adams et al., 2003; Chen, 2007). • Ativação de elementos transponíveis previamente adormecidos, por meio da perda do silenciamento gê- nico (Kashkush et al., 2003; Madlung et al., 2005). Análise de microarranjos (microarray, que será discu- tida mais adiante, neste capítulo) também mostrou que a atividade transcricional de muitos genes, ao longo do ge- noma, é alterada em alopoliploides, em comparação com os mesmos genes em seus progenitores (Wang et al., 2006; , Rapp et al., 2009). E provável que modificações epigené- ticas, incluindo metilação de DNA e histonas e acetilação das histonas, sejam responsáveis por muitas dessas mu- danças. A poliploidia leva a cópias múltiplas redundantes dos genes no genoma. Como a evolução age sobre os ge- nes duplicados, uma cópia pode ser perdida ou funcio- nalmente alterada, enquanto a outra retém a sua função original. Esse processo é conhecido como subfunciona- lização (Lynch e Force, 2000). Análise do genoma mos- tra que, mesmo em muitas espécies diploides, há clara evidência de duplicação do genoma na história evolutiva da espécie. Nesses casos, uma subsequente perda gradu- al de DNA levou um retorno ao estado diploide (Figu- ra 2.8). Espécies que mostram sinais de duplicações do genoma ancestral, seguido pela perda de DNA, são co- nhecidas como paleopoliploides e incluem o milho e A . thaliana (Wolfe, 2001). A poliploidia está em forte contraste com uma con- dição chamada aneuploidia. Aneuploides são organismos cujos genomas contêm mais ou menos cromossomos indi- viduais (e não conjuntos de cromossomos inteiros) do que o normal. Esses estados são conhecidos como trissomias, se um tipo de cromossomo é triplicado, ou monossomias, se apenas um cromossomo de um dado tipo está presente. Em seres humanos e em muitos animais, aneuploidia nor- malmente leva à morte ou a graves problemas fisiológicos, como a síndrome de Down (trissomia 21). Plantas aneu- ploides, embora muitas vezes distintas fenotipicamente das plantas normais (euploides), são geralmente viáveis. Em poliploides, os efeitos de aneuploidia podem ser mas- carados por cromossomos adicionais no genoma. Genomas citoplasmáticos de plantas: mitocôndrias e cloroplastos Além do genoma nuclear, as células vegetais contêm dois genomas adicionais: o genoma mitocondrial, também presente em células animais, e o genoma cloroplastidial. Nesta seção, será visto de onde esses genomas procedem e que papéis desempenham. Após, detém-se em sua organi- zação e discute-se algumas diferenças importantes a partir do genoma nuclear, na maneira como sua informação ge- nética é transmitida. 1. Um ancestral comum origina duas espécies diploides diferentes, AA e BB. Fisiologia Vegetal 43 Diploide ancestral Especiação Espécie diploide AA Espécie diploide BB Formação --- acidental de gametas 2N 2. Fusão de gametas haploides normais A e B pode levar à formação de um híbrido interespecífico. Esses híbridos podem ser viáveis, mas geralmente são estéreis. Se sofrerem duplicação espontânea do genoma, podem dar origem a alotetraploides. / Formação normal \ de gametas 1 N Híbrido diploide AB -- - - / / I 1 \ ' ' - - - Duplicação espontânea do genoma ' " / / Gameta 2N \ / do tetraploide Formação acidental de gametas 2N o o -· e. -· D.I -· "C -o -· e. -· D.I Autotetraploide AAAA o 110 V' ra N ·-"C ·- º -e. ·-Cl 3. Formação acidental e fusão de gametas diploides pode levar à formação de auto ou alotetraploides. -- Alotetraploide AABB / 4. Perda de genes duplicados ao longo do tempo evolutivo pode resultar em lenta diplo id ização, na qual poliploides voltam a um estado diploide. Diploide / o o -· e. -· D.I FIGURA 2.8 Continuum na evolução das espécies poliploides. Diploides podem dar origem a autopoliploides ou alopoliploides pelos mecanismos descritos na Figura 2.5. Poliploides podem reverter para diploidia por meio da perda gradual de genes du- A teoria endossimbiótica descreve a origem dos genomas citoplasmáticos Os genomas citoplasmáticos são provavelmente os rema- nescentes evolutivos dos genomas de células bacterianas que foram "engolidas" por outra célula. A teoria endos- simbiótica, defendida por Lynn Margulis na década de 1980, postula que a mitocôndria original era uma bactéria usuária de oxigênio (aeróbia), a qual foi absorvida por um outro organismo procariótico. Ao longo do tempo, esse en- dossimbionte original evoluiu para uma organela que não era mais capaz de viver por conta própria. A célula hos- pedeira, juntamente com o seu endossimbionte, deu ori- gem a uma linhagem de células que eram capazes de usar oxigênio no metabolismo aeróbio; essas células, por sua vez, finalmente deram origem a todas as células animais. plicados ao longo do tempo evolutivo. A cor púrpura-clara, deli- mitando as elipses, representa o núcleo de uma espécie; círculos coloridos dentro dos núcleos representam genomas inteiros (se- gundo L. Comai, 2005). As células vegetais, de acordo com essa teoria, surgiram quando ocorreu um segundo evento de endossimbiose. Desta vez, uma célula contendo mitocôndrias "engoliu" uma cianobactéria fotossintética, que, dentro da célula, evoluiu ao longo do tempo para o cloroplasto. Duas linhas principais de evidência são frequente- mente citadas em apoio à teoria endossimbiótica. Em primeiro lugar, tanto mitocôndrias quanto cloroplastos são delimitados por uma membrana externa e interna, e a membrana interna é contínua com compartimentos adicionais ligados à membrana, dentro da organela. Essa observação é compatível com a ideia de que o engolfa- mento da célula original aeróbia ou fotossintética, por in- vaginação da membrana plasmática da célula hospedeira procariótica, deixou uma membrana dupla em tomo da nova organela. Em segundo lugar, ambos os genomas or- 44 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger FIGURA 2.9 A estrutura complexa dos genomas mitocondrial e plastidial. Cada fotografia mostra uma única molécula ramificada de DNA contendo múltiplos genomas organelares conectados. (A) Mi- crografia do DNA mitocondrial, corado com brometo de etídio, da hepática Marchantia polymorpha. (B) Desenho da mesma molécula. A escala de 186 kb mostra o tamanho de um genoma. (C) Micro- grafia do DNA cloroplastial multigenômico do milho, estendido em agarose. A escala de 1 O µ,m é equivalente a uma sequência de DNA de 30 kb, o que é aproximadamente 20º/o do comprimento total do genoma (154 kb) (A e B, de Oldenburg e Bendich, 1998; C, de Oldenburg e Bendich, 2004). ganelares mostram sequência similar aos genomas p roca- rióticos. Os genomas organelares, como os de procariotos, não estão incluídos em envoltório nuclear e são chamados nucleoides. Os genomas organelares consistem principalmente de cromossomos linearesOs genomas de plastídeos geralmente variam em tama- nho, cerca de 120 a 160 kilobases (kpb), e codificam pre- dominantemente genes que são necessários para a fotos- síntese e para a expressão dos genes plastidiais. O genoma mitocondrial é muito mais variável em tamanho do que o genoma p lastidial. Os genomas mitocondriais vegetais variam entre, aproximadamente, 180 e cerca de 3.000 kpb - muito maior do que o genoma mitocondrial de animais ou fungos, muitos dos quais possuem apenas 15 a 50 kpb. O DNA mitocondrial de plantas contém genes que codi- ficam proteínas necessárias na cadeia de transporte de elétrons ou que estão envolvidos no fornecimento de co- fatores para o transporte de elétrons. Além disso, o DNA mitocondrial de plantas carrega genes para as proteínas necessárias para a expressão gênica da própria organela, como proteínas ribossômicas, tRNAs e rRNAs. Em ambas as organelas, muitos genes necessários para a adequada função do cloroplasto ou mitocôndria já não são codifica- dos no genoma organelar em si, mas, ao longo do tempo evolutivo, foram transferidos para o núcleo das plantas atuais. Essas proteínas são sintetizadas no citoplasma e, em seguida, importadas pela organela. Por muitos anos, tinha-se a ideia de que os cromos- somos organelares continham o seu genoma na forma de uma molécula de DNA circular, semelhante ao plasmí- 186 kb (C) • .. • 10 µm deos circulares de bactérias. Dados recentes, no entanto, mostram que a maioria do DNA de mitocôndrias e cloro- p lastos vegetais é encontrado em moléculas lineares que podem conter mais de uma cópia do genoma (Figura 2.9). Essas cópias são conectadas entre si em uma orientação cabeça-a-cauda ("head-to-tail"), e as moléculas de DNA cromossômico podem ser altamente ramificadas, pare- cendo um arbusto ou uma árvore (Oldenburg e Bendich, 1998, 2004), diferentemente das estruturas mais simples dos cromossomos nucleares lineares. Enquanto os cromos- somos nucleares são de tamanho constante, geração após geração, o tamanho do cromossomo em mitocôndrias e cloroplastos pode variar. No entanto, cada cromossomo organelar contém pelo menos um genoma completo. A genética organelar não obedece às leis de Mendel A genética dos genes organelares são regidas por dois princípios que a distingue da genética mendeliana. Em primeiro lugar, tanto mitocôndrias quanto plastídeos geralmente mostram herança uniparental, isto é, ades- cendência sexual (via pólen e oosferas) somente herdará organelas de um dos parentais. Entre as gimnospermas, as coníferas normalmente herdam seus plastídeos dopa- rental paterno. Para angiospermas, a regra geral é que os plastídeos vêm do parental matemo. No entanto, há al- gumas angiospermas em que os plastídeos são herdados biparenta! ou paternalmente. A herança mitocondrial é ge- ralmente materna na maioria das plantas, mas, novamen- te, algumas exceções podem ser encontradas, como, por exemplo, em alguns tipos de coníferas, como os ciprestes, que mostram herança paterna. Fisiologia Vegetal 45 (A) Setor verde produzindo variegação Nova célula, com todos os plastídeos do tipo selvagem (B) Setor branco CJÍ-- Plastídeo normal 0 º () () Segregação oº C) () º º º Nova célula, o~o \JO UD 00 t Núcleo ºº Dºº Oº CJº ºº com uma mistura de plastídeos selvagens e mutantes Nova célula, com todos os plastídeos mutantes (C) Setor tota lmente verde FIGURA 2.10 Segregação vegetativa pode levar à variegação. (A) Divisão celular em uma célula com cloroplastos normais (ver- de) e mutantes (branco) pode, ao acaso, resultar em uma prole com apenas organelas mutantes. (B) Células que contêm cloro- plastos exclusivamente brancos produzem apenas cloroplastos brancos, levando a um setor branco. (C) Setores em que ne- nhuma célula que surge contém apenas cloroplastos brancos permanecem totalmente verdes. Variegação também pode ser causada por mutações em genes mitocondriais e nucleares. Nas plantas em que os plastídeos são herdados ma- ternalmente, os plastídeos paternos são excluídos como consequência da maneira como o gametófito masculino (pólen) é formado. A formação do pólen envolve duas di- visões mitóticas do microgametófito. A primeira divisão resulta em uma célula vegetativa, que dá origem ao tubo polínico, e uma célula generativa muito menor, que poste- riormente produz as duas células espermáticas. Durante a primeira divisão, os plastídeos são excluídos da célula generativa e, assim, da linha germinativa masculina. Con- sequentemente, o zigoto herda todos os seus plastídeos da oosfera encontrada no megagametófito feminino, re- sultando em uma herança materna dos genes plastidiais (Mogensen, 1996). O mecanismo de herança paterna de plastídeos em algumas coníferas, como o abeto de Douglas (Pseudotsuga mensiesii) ou o pinheiro-chinês (Pinus tabulaeformis), é um pouco mais complicado e bem menos conhecido. Em mui- tas gimnospermas, a segunda divisão mitótica, que pro- duz os dois núcleos espermáticos, ocorre assim que o tubo polínico penetra no gametófito feminino. O citoplasma paterno, rico em plastídeos e em algumas mitocôndrias, se "agarra" ao núcleo espermático que entra na oosfera. No momento da fecundação, o núcleo da oosfera é cercado por mitocôndrias maternas, mas os plastídeos maternos estão localizados na periferia da oosfera. Após a fusão dos núcleos espermático e da oosfera e a formação do zigoto, a celularização segue de tal maneira que as paredes das novas células essencialmente excluem todos os plastídeos matemos e a maioria das mitocôndrias paternas do em- brião (Mogensen, 1996; Guo et al., 2005). A segunda principal característica da herança orga- nelar é o fato de que tanto cloroplastos como mitocôn- drias podem segregar vegetativamente. Isto significa que uma célula vegetativa (em oposição a um gameta) pode dar origem a outra célula vegetativa, por meio de mitose, geneticamente diferente. Por exemplo, durante a mitose, uma célula-filha pode receber plastídeos com um tipo de genoma, enquanto outros plastídeos com informações genéticas diferentes, talvez contendo uma ou mais mu- tações, são distribuídos por acaso na outra célula-filha. A segregação vegetativa, que também é referida como sorting-out, pode resultar na formação de setores fenoti- picamente diferentes dentro de um tecido (Figura 2.1 O). A presença desses setores em folhas pode resultar no que os horticultores, muitas vezes, se referem como variegação (ver Figura 16.31 para um exemplo). A variegação foliar pode ser causada por mutações nos genes nucleares, mi- tocondriais ou cloroplastidiais. Uma vez examinada a organização dos genomas nu- clear e citoplasmático nas plantas, a atenção será voltada para a estrutura do genoma nuclear e como ela influencia a expressão dos genes que contém. Os mecanismos bási- cos da transcrição de genes serão analisados em primeiro lugar, seguido por uma descrição da regulação transcricio- nal da expressão gênica. Regulação transcricional da expressão gênica nuclear O caminho entre o gene e a proteína é um processo de vá- rias etapas catalisadas por muitas enzimas (Figura 2.11). Cada etapa é objeto de regulação pela planta, para con- trolar a quantidade de proteína que é produzida por cada gene. A regulação da primeira etapa de transcrição deter- mina quando e se um mRNA é produzido. Este nível de 46 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger Transcrição AUG (tradução Tradução . começa aqui) termina aqui começa aqu i DNA Promotor 1 1 1 5' 1 Éxon fntron 1 Éxon l fntron Éxon 3' 1 Transcrição ocorre Transcrição + capeamento e poliadenilação Regulação transcricional Pré-mRNA Processamento do precursor mRNA Núcleo Citoplasma Polissomo Transporte para fora do núcleo (para o citoplasma) ºb 11 R1 ossomo Regulação pós-transcricional ! Tradução Polipeptídeos liberados Modificação da proteína ~~ Degradação - Regulação pós-traducional (modificação e estabilidadeda proteína ·-.. ······ da proteína) . . .. . ..... Proteassomo 265 . . . . ...... , ... . ••• • • ZJ ... , .. ····· • I • t •• • - . FIGURA 2.11 Expressão gênica em eucariotos. A RNA-polime- rase li liga-se aos promotores de genes que codificam proteínas. Ao contrário de genes procarióticos, genes eucarióticos não estão agrupados no óperon, e cada um é dividido em íntrons e éxons. A transcrição, a partir da fita-molde, segue na direção 3' - 5', no local de início da transcrição, e a cadeia de RNA se estende um nucleotídeo de cada vez, na direcção 5' - 3' . A tradução começa com o primeiro AUG codificando metionina, como em procario- tos, e termina com um códon de parada. A transcrição do pré- -RNAm é primeiramente " capeada" (recebe um quepe) pela adi- ção de 7-metilguanilato (M7G) na extremidade 5'. A extremidade 3' é encurtada ligeiramente, pela clivagem num local específico, e regulação, que é referido como a regulação transcricional, inclui o controle de iniciação de transcrição, manutenção e terminação. O próximo nível na regulação da expressão gênica, conhecida como regulação pós-transcricional, ocorre depois da transcrição. Esse nível, que será aborda- do mais adiante neste capítulo, inclui controles sobre a es- tabilidade do mRNA, eficiência da tradução e degradação. Finalmente, a estabilidade da proteína (regulação pós-tra- uma cauda poli-A é adicionada. O pré-RNAm, com quepe e polia- deni lado, é então emendado (spliced) por um complexo de espl i- ceossomos e os íntrons são removidos. O RNAm maduro deixa o núcleo, através dos poros nucleares, e inicia a tradução em ribos- somos no citoplasma. A medida que cada ribossomo progride em direção da extremidade 3' do RNAm, novos ribossomo prendem-se na extremidade 5' e iniciam a tradução, levando à formação de polissomos. Após a tradução, algumas proteínas são modificadas pela adição de grupos químicos à cadeia. Os pol ipeptídeos libera- dos têm meia-vida característica, que são reguladas pela rota de ubiqutina e por um largo complexo proteolítico, chamado proteas- somo 265 (ver Figura 2.15). ducional) desempenha um papel importante na atividade geral de um gene ou seu produto. RNA-polimerase li liga-se à região promotora da maioria dos genes codificadores de proteínas A transcrição gênica é facilitada por uma enzima chama- da RNA-polimerase, que se liga ao DNA a ser transcrito e produz um transcrito de mRNA complementar à sequência (A) Proteínas reguladoras de genes _---..._ / \ -----.... DNA GGGCGG Fatores gera is de transcrição Fisiologia Vegetal 47 RNA-polimerase li Gene X -100 GCbox -80 -25 (B) CAAT box Elementos de controle proximais Montagem da proteína reguladora de ativação TATA box Transcrição '-~-~ ~-~/ y Promotor-núcleo Pre-RNAm l ~\~---- Sítio de ligação para "- / a montagem da 1' proteína reguladora de inibição Proteínas reguladoras de genes \ \ GCbox CAAT box FIGURA 2.12 Organização e regulação de um típico gene eu- cariótico. (A) Características de um típico promotor-núcleo eu- cariótico e as proteínas que regulam a expressão gênica. RNA- -polimerase li situa-se no TATA box em associação com fatores de transcrição gerais a cerca de 25 pb a montante do sítio de início da transcrição. Duas sequências reguladoras cis-acting, que amplificam a atividade de RNA-polimerase li, são a CAAT box e a GC box, localizadas, respectivamente, a cerca de 80 e 100 pb de DNA. Existem vários tipos de RNA-polimerase. RNA- -polimerase II é a polimerase que transcreve a maioria dos genes que codificam proteínas. A região do gene que se liga à RNA-polimerase é chamada de promotor (Figura 2.12A). A estrutura do pro- motor eucariótico pode ser d ividida em duas partes: o promotor-núcleo ou promotor mínimo, que consiste na sequência mínima upstream (a montante) necessária para a expressão gênica, e as sequências reguladoras, que con- trolam a atividade do promotor-núcleo. Antes que a transcrição de um gene possa começar, várias etapas têm que ocorrer para permitir que a RNA- -polimerase tenha acesso à sequência de nucleotídeos do gene. Lembre-se de que o DNA nuclear é acondicionado em torno das histonas, formando estruturas em forma de contas, os nucleossomos. Como será discutido mais deta- lhadamente na p róxima seção, as histonas estão sujeitas a modificações, e, somente se essas modificações forem favoráveis à transcrição, a RNA-polimerase será capaz de se ligar ao DNA. Além disso, para ser funcional, as RNA- -polimerases de eucariotos requerem proteínas adicionais, RNA-polimerase li e fatores gerais de transcrição A (~-~~-~\ TATAAA TATAbox Gene X a montante do local de início da transcrição. A CAAT box e a GC box ligam proteínas de regu lação de genes. (B) Regulação da transcrição por sequências regu latórias distais e fatores trans- -acting. Os fatores trans-acting podem agir em conjunto com se- quências regulatórias distais, as quais estão vinculadas, para ativar a transcrição, mediante contato físico direto com o complexo de in iciação da transcrição. Os deta lhes desse processo ainda não são bem compreendidos. chamadas fatores gerais de transcrição, para posicionar a polimerase no sítio de início da transcrição. Esses fatores gerais de transcrição, juntamente com a RNA-polimerase, compõem uma grande multissubunidade chamada com- plexo de iniciação de transcrição (ver Figura 2.12A). A transcrição é iniciada quando o fator de transcrição final, que se liga ao complexo, fosforila a RNA-polimerase. A seguir, a RNA-polimerase separa-se do complexo de ini- ciação e prossegue ao longo da fita de DNA antisense, ou complementar, na direção 3'-5'. Além da RNA-polimerase e dos fatores gerais de transcrição, a maioria dos genes, especialmente aque- les que desempenham papéis importantes no desenvol- vimento, necessita de fatores de transcrição específicos (muitas vezes também chamados de proteínas regulado- ras de genes) para que a RNA-polimerase se torne ativa. Essas proteínas reguladoras ligam-se ao DNA e tomam-se parte do complexo de iniciação da transcrição. Um exemplo de um típico promotor de RNA-poli- merase II está representado esquematicamente na Figura 2.12A. O promotor-núcleo de genes transcritos pela RNA- 48 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger -polimerase II normalmente se estende a cerca de 100 pb a montante do sítio de iniciação de transcrição e inclui di- versos elementos de sequência denominados sequências promotoras proximais. A cerca de 25 a 35 pb a montante do sítio de iniciação de transcrição, está uma sequência curta chamada TATA box, consistindo de uma sequência TATAAA(A). A TATA box desempenha um papel crucial na transcrição porque serve como local da montagem do complexo de iniciação da transcrição discutido acima. Além da TATA box, os promotores-núcleo dos euca- riotos também contêm duas sequências reguladoras adi- cionais: a CAAT boxe a GC box (ver Figura 2.12A). Essas duas sequências são sítios de ligação de fatores de trans- crição específicos. As sequências de DNA em si são deno- minadas sequências de ação no eis (cis-acting), já que são adjacentes (eis) às unidades de transcrição que regulam. Os fatores de transcrição que se ligam às sequências eis- -aeting também são chamados de fatores de ação no trans (trans-acting), uma vez que os genes que codificam estão localizados em outras partes do genoma. Numerosas outras sequências de ação no eis, locali- zadas mais a montante das sequências promotoras proxi- mais, podem exercer controle positivo ou negativo sobre promotores eucarióticos. Essas sequências, denominadas sequências reguladoras distais, geralmente estão locali- zadas a cerca de 1.000 pb do sítio de iniciação da trans- crição. Os fatores de transcrição que se ligam a esses sí- tios, agindo positivamente, são chamados de ativadores, (A) (B) ~N H Citosina o Lisina HMT .. º~ 5' -Meti lcitosi na ~N H o HMT .. º~ Monometil-lisi na FIGURA2.13 (A) A adição de um grupo meti la no CS na citosina está associada à inatividade da transcrição. (B) O aminoácido lisina (K), que ocorre em diversas posições nas histonas, pode ser mono-, di-, ou trimetilado pela histona metiltransferase (HMT). (C) Histonas podem ser remodeladas para ativar a transcrição gênica (em cima) ou para reprimi-la (embaixo). A ativação está associada à aceti lação enquanto aqueles que inibem a transcrição são chamados repressores. Além de terem sequências reguladoras den- tro do próprio promotor, os genes eucarióticos podem ser regulados por elementos de controle localizados dezenas de milhares de pares de bases de distância do sítio de ini- ciação de transcrição. Sequências reguladoras distantes, com ação positiva, são denominadas intensificadoras (enhancers) . As sequências intensificadoras podem estar localizadas tanto a montante como downstream (a jusante) do promotor. Como todos os fatores de transcrição que se ligam a sequências de ação eis regulam a transcrição? Duran- te a formação do complexo de iniciação, o DNA entre o promotor-núcleo e as sequências reguladoras mais distais curva-se de tal forma que permite que todos os fatores de transcrição ligados a esse segmento de DNA façam contato físico com o complexo de iniciação (Figura 2.128). Por meio desse contato físico, cada fator de trans- crição exerce seu controle, positivo ou negativo, sobre a transcrição. Modificações epigenéticas ajudam a determinar a atividade gênica Como mencionado na seção anterior, a transcrição pode ser iniciada somente se o DNA é acessível para a RNA- -polimerase e outras proteínas de ligação necessárias. Para que o DNA esteja acessível, seu empacotamento tem que ~N H o Cadeia de aminoácidos da cauda da histona HMT .. º~ ~N H Cauda da histona Nucleossomo º~ o Dimetil-lisina Trimetil-lisina por histonas acetiltransferases (HATs) e a meti lação por HMT no resí- duo de lisina H3K4. Essas modificações promovem remodelação da cromatina e estímulo da transcrição ATP-dependentes. Repressão da transcrição é conseguida por metilação da H3K9 e desacetilação por histona desaceti lases. ser "afrouxado", um processo mediado por modificações covalentes tanto do DNA como de histonas. Visto que po- dem mudar o comportamento de um gene sem mudar a sequência de DNA do gene em si, essas modificações são referidas como modificações epigenéticas (do grego epi, que significa sobre ou em cima). Um tipo comum de modificação do DNA é a metila- ção de resíduos de citosina (Figura 2.13A). As sequências de DNA que são frequentemente metiladas em plantas são CG, CHG e CHH (onde H pode ser qualquer nucleotídeo, exceto guanina). Por outro lado, a metilação de citosina em mamíferos ocorre principalmente em sequências CG. A metilação de citosina é catalisada por uma das várias metiltransferases, enquanto a desmetilação do DNA é ca- Fisiologia Vegetal 49 talisada pela glicosilases, as quais substituem metilcitosi- na por citosina não metilada. Modificações epigenéticas também podem ocorrer em histonas que, juntamente com o DNA enrolado em tomo delas, compõem os nucleossomos. Cada histona tem uma "cauda", que é composta da primeira parte da cadeia de aminoácidos da histona, e se projeta para fora do nucleos- somo. Modificações das histonas ocorrem nessas caudas, geralmente dentro de 40 ou mais aminoácidos externos. Essas modificações podem influenciar a conformação dos nucleossomos e, assim, a atividade dos genes no DNA as- sociado. Uma das modificações das histonas que influencia a atividade gênica é a metilação, especialmente em resíduos (C) Proteína remodeladora de cromatina ATP-dependente RNA-polimerase li e _ , \'--IL fatores de transcrição DNA INDUÇÃO DE GENES Histona desaceti lase ~ Nucleossomo REPRESSÃO DE GENES H3K9 histona metiltransferase \ 1 Transcrição Histona Modificações ativadoras de histonas (p. ex., grupos acetil ou H3K4 dimetilada) / \ aceti ltra nsferase Histona desmetilase? \ I Modificações desativadoras de histonas (p. ex., H3K9 dimetilada) 50 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger de lisina especificos (abreviado pela letra K) na cauda da histona do tipo H3. Estes resíduos são K4, K9, K27 e K36, contando a partir do aminoácido mais externo em direção ao centro da histona. Um, dois ou três grupos metila po- dem ser adicionados a uma única lisina (Figura 2.138). As histonas dimetiladas na posição H3K4 são geralmente as- sociadas com genes ativos, enquanto dimetilação na posi- ção H3K9 é frequentemente associada a genes e elementos inativos, como transposons silenciados. Em mamíferos e leveduras, grupos metila são removidos por histona des- metilases (Bannister e Kouzarides, 2005), e genes candida- tos, com função semelhante, foram identificados em plan- tas (Choi et al., 2007). Outra forma de modificação que ocorre na cauda das histonas é a acetilação, que é catalisada por enzimas cha- madas histona acetiltransferases (HATs). Geralmente, as histonas acetiladas estão associadas com genes que são ativamente transcritos. Histonas desacetilases (HDACs) podem reverter essa ativação por meio da remoção de gru- pos acetila. Tanto a metilação como a acetilação mudam a arqui- tetura do complexo da cromatina, que pode resultar em condensação ou relaxamento da cromatina. Essas mu- danças ocorrem quando os complexos multiproteicos de remodelação da cromatina ligam-se a histonas modifi- cadas. Usando a energia liberada pela hidrólise de ATP para acionar a reação, esses complexos abrem a cromatina deslocando ligeiramente os nucleossomos na direção 5' ou 3' do complexo de remodelação. O espaço resultante entre os nucleossomos é agora largo o suficiente para que a RNA-polimerase possa se ligar e iniciar a transcrição (Fi- gura 2.13C). Alternativamente, modificações das histonas podem apresentar novos sítios de ligação para proteínas reguladoras que afetam a atividade dos genes. Os cientis- tas estão apenas começando a compreender os efeitos das modificações químicas especificas sobre cada um dos pri- meiros 40 ou mais aminoácidos das caudas das histonas. A totalidade das modificações das histonas em um especifi- co nucleossomo é, às vezes, chamada de "código de histo- nas" para enfatizar a forte ligação entre a constituição dos nucleossomos e a atividade gênica. Regulação pós-transcricional de expressão gênica nuclear Imediatamente após a transcrição, os mRNAs resultantes são processados: seus íntrons são removidos por junção (splieing), e quepes e caudas poli-A são adicionados nas extremidades 5' e 3', respectivamente. As transcrições são, então, exportadas para o citoplasma para a tradução. Um organismo muitas vezes produz mRNA em res- posta a uma situação específica. A fim de permanecer útil como uma resposta específica a uma situação também es- pecífica, mRNAs individuais devem ter uma vida útil fini- ta. Por exemplo, para fazer frente a um estresse ambiental transitório, uma planta pode precisar produzir brevemen- te enzimas específicas. Após o fim do estresse, seria um desperdício, talvez até mesmo prejudicial, continuar a produzir essas enzimas. Assim, a produção, a atividade e a estabilidade de mRNAs são todas reguladas (Green, 1993). Foi discutida a regulação da transcrição (produção de mRNA) na seção anterior. Agora, serão abordados os mecanismos de regulação pós-transcricional (regulação da atividade e estabilidade). A estabilidade do RNA pode ser influenciada por elementos eis Um mecanismo pelo qual a estabilidade do mRNA é re- gulada depende da presença de certas sequências dentro da própria molécula de mRNA, chamadas elementos eis - uma escolha infeliz de termos, uma vez que o mesmo termo é usado para as regiões do DNA que influenciam a atividade transcricional. Esses elementos eis podem ser vinculados a proteínas de ligação com o RNA, que pode estabilizar o mRNA ou promover sua degradação por nu- cleases (Hollamset al., 2002). Dependendo dos tipos de elementos eis presentes, a estabilidade de uma molécula de mRNA pode variar muito. RNAs não codificantes regulam a atividade de mRNA por meio de rotas de RNA de interferência (RNAi) Outro mecanismo para regulação da estabilidade do mRNA é a rota de RNA de interferência (RNAi). Essa rota envolve vários tipos de pequenas moléculas de RNA que não codificam proteínas e são assim chamadas RNAs não codificantes (ncRNAs). A rota de RNAi tem um papel im- portante na regulação gênica e defesa do genoma. A rota de RNAi é um conjunto de reações celulares à presença de moléculas de cadeias duplas de RNA (dsR- NA). Lembre-se de que o mRNA é geralmente uma molé- cula de fita simples (ssRNA). Em células vegetais, dsRNAs geralmente ocorrem como resultado de um dos três tipos de eventos: 1. A presença de microRNAs (miRNAs), que estão en- volvidos em processos normais de desenvolvimento (Figura 2.14A). 2. A produção de RNAs de interferência curtos (siR- NAs), os quais silenciam certos genes (Figura 2.148). 3. A introdução de RNAs estrangeiros, por infecção virai ou via transformação por um gene estrangeiro (Figura 2.14C). Independentemente de como os dsRNAs são pro- duzidos, a célula ajusta a resposta de RNAi. Os dsRNAs são fragmentados ou "picados" em pequenos RNAs, com 21 a 24 nucleotídeos, que se ligam a RNAs complemen- tares de fita simples (p. ex., mRNAs) de genes endóge- nos, vírus ou transgenes e promovem a sua degradação ou inibição da tradução. Em alguns casos, a rota de RNAi também pode levar ao silenciamento gênico ou à hetero- cromatização do DNA endógeno ou de genes estranhos introduzidos. Para explorar os RNAi em mais detalhes, (A) Rota de microRNA RNA-polimerase li DNA Transcrição Fisiologia Vegetal 51 Pri-m iRNA .________, __ _._ _____ ___._ __ .____, t DCL 1, HYL1 i Núcleo Membrana nuclear AGO __.A-' RISC ~ ~==) Citoplasma EXPORTINS, HASTY/ Ribossomo \..-.... 1 \ mRNA-alvo - 5. O complexo miRNA-RISC pode inibir a tradução de um mRNA-alvo. FIGURA 2.14 Rotas de RNAi nas plantas. (A) MicroRNAs (miRNAs) são parte de muitas rotas genéticas durante o desenvolvimento da planta. (B) RNAs de interferência curtos (siRNAs) são requeridos para serão analisados, primeiramente, os eventos que levam à acumulação de dsRNA na célula. A seguir, serão discuti- dos os componentes moleculares e eventos a jusante do processo de RNAi. MicroRNAS REGULAM, PÓS-TRANSCRICIONALMENTE, MUITOS GENES DE DESENVOLVIMENTO Os microRNAs (miRNAs) estão envolvidos em muitos processos de de- senvolvimento, como a formação de folhas e flores, a divi- são celular e a orientação (polaridade) de órgãos vegetais (Kidner e Martienssen, 2005). Todos os miRNAs surgem da transcrição mediada por RNA-polimerase II de um 1. Transcrição no núcleo pela RNA- -polimerase li produz um autodobramento do pri-miRNA. 2. O pri-miRNA dobrado é processado pelo DCL 1 e HYL 1 em fragmentos de 21 a 24 nucleotídeos. 3. Os fragmentos associam-se com AGO, formando o complexos RISC. 4. O complexo RISC é exportado para o citoplasma pelas proteínas EXPORTINS e HASTY. 6. Alternativamente, RISC pode cortar o mRNA-alvo e iniciar sua degradação. manter heterocromatina e para silenciar genes não utilizados. A rota de siRNA, envolvendo RdRP2, está ilustrada aqui. (C) As células ve- getais podem montar uma resposta de RNAi à infecção por vírus. lócus específico, o qual codifica um miRNA transcrito primário (um pri-miRNA), o qual pode variar em com- primento (de centenas a milhares de nucleotídeos). Esse transcrito primário recebe um quepe na extremidade 5/, é poliadenilado na extremidade 3/ e forma uma linha de dupla-fita, cujos braços de bases pareadas confinam uma volta de fita simples. Em seguida, os pri-miRNAs são pro- cessados em pré-miRNAs, geralmente com 70 a 80 nucleo- tídeos em animais, mas que podem ter até várias centenas de nucleotídeos de comprimento nas plantas. Nas plan- tas, dentro do núcleo, os pri-miRNAs são convertidos em miRNAs pelas proteínas DICER-LIKE 1 (DCLl) e HYPO- 52 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger (B) Rota de RNA de interferência curto Núcleo Eucromatina DNA RNA- -polimerase IV ~------ Heterocromatina Transcrição Pré-siRNA .___ _______ _, 1. siRNAs são transcritos a partir de regiões de repetição na heterocromatina pela RNA-polimerase IV (pol IV). 2. O pré-siRNA é amplificado por RdRP2, obtendo-se dsRNAs longos que são processados por DCL3. DCL3 Transcrição dsRNA ~=======:::: 1 a. Alternativamente, dsRNA pode também ser gerado diretamente pela transcrição de promotores de oposição. ~I I C siRNA maduro e:3 :::1 ===:1 [ ]~ J L---"' 2a. RNAs de dupla-fita, produzidos por esta rota, são processados pela DCL 112. 3. Os fragmentos associam-se a AGO, formando o complexo RISC . AGO RISC Metilases e ~ modificad?res ov--. de cromatina Ô 4. O complexo siRNA-RISC pode recrutar metilases e complexos de remodelação de cromatina (CMT3, DRM1/2, DRD1 e KYP). • • •••• Grupos- . • meti la • • + grupos metila Y Sem transcrição 5. Complexos de remodelação da cromatina são guiados pelo siRNA para regiões de repetição no genoma, onde afetam a meti lação de DNA e histonas. NASTIC LEAVES 1 (HYLl), sendo que ambas estão envol- vidas no processamento dos transcritos primários. Após o processamento, os miRNAs maduros estão prontos para serem usado em rotas de RNAi (ver Figura 2.14A). RNAS DE INTERFERÊNCIA CURTOS ORIGINAM-SE DE DNA REPETITIVO RNAs de interferência curtos (siRNAs), ma- duros, são estrutural e funcionalmente similares aos miR- NAs e, também, levam à implementação de RNAi. No entanto, siRNAs diferem dos miRNAs na forma como são gerados. SiRNAs podem ser produzidos de duas maneiras. Primeiro, eles podem surgir a partir da transcrição de pro- motores opostos que produzem mRNA em fitas opostas e, assim, podem gerar duas moléculas de RNA de fita sim- ples (ssRNA), total ou parcialmente complementares, que podem posteriormente formar uma molécula de dupla-fita. Na segunda forma, siRNAs podem ser gerados a partir de ssRNAs que são convertidos em dsRNAs por uma classe especial de RNA-polimerases RNA-dependentes (RdRPs) (ver Figura 2.14B). Observe que a transcrição dos siRNAs é realizada pela RNA-polimerase IV, não pela RNA-polime- rase II, como em miRNAs (Ramachandran e Chen, 2008). Os siRNAs endógenos são transcritos a partir de re- giões cromossômicas que, de outra forma, não parecem Fisiologia Vegetal 53 (C) Rota de resposta de RNAi à infecção por vírus RISC AGO RISC AGO RISC AGO t t 7. O siRNA virai liga-se à RISC e marca o RNA virai para sua degradação. t 6. O dsRNA virai, independente de sua fonte, é convertido em siRNA virai pela DCL. i • f ocL ..------~ t DCL 1 ~ !=======:: dsRNA ds RNA ~E ----;:=:::::::....----. RdRP virai RdRP vegetal RdRP vegetal t ssRNA ~--~ Núcleo 4. Os RdRPs vegetais convertem ssRNA vira i em dsRNA. t ~ > < '· ~ Citoplasma ssRNA ...__ __ ___, o dsRNA vi rai 1. Um vírus que injeta um dsRNA pode desencadear imediata- mente uma resposta mediada por proteínas DICER-LIKE (DCL). Espaço extracelular o ssRNA virai 2. O vírus que injeta o ssRNA forma dsRNA como parte do seu ciclo de vida normal. suportar muita transcrição: DNA repetitivo, transposons e regiões centroméricas. De fato, siRNAs originários de re- giões de repetição são, por vezes, chamados de RNAs de silenciamento com repetições associadas (repeat-associated silencing RNAs ou rasiRNAs). Como será visto na próxima seção, pode não ser coincidência: parece que a formação de siRNAs e a indução de RNAi tomam essas regiões he- terocromáticas e, em grande parte, transcricionalmente silenciosas. Desde que uma dupla-fita de RNA é produ- zida, seja por transcrição de repetições invertidas, seja por RdRP2, ela é cortada em 21 a 24 pares de nucleotídeos de RNA por membros da famíliade proteínas DICER (ver Fi- gura 2.14B). Além desses siRNAs de origem endógena, RNAs exógenos também pode desencadear a formação de siRNAs. As fontes para esses RNAs exógenos incluem transgenes introduzidos artificialmente e RNA virai. Em ambos os casos, proteínas RdRPs e DICER-LIKE estão envolvidas na produção de siRNAs maduros (ver Figura 2.14C). DNA vegetal Ácido salicílico - Resposta de defesa vegetal o Infecção vi rai 3. O ataque virai induz respostas de defesa geral na p lanta via ácido sa licílico, uma molécula sinalizadora. dsDNA !=======:: o dsDNA vi rai 5. O genoma de um dsDNA virai é t ranscrito como parte do ciclo de v ida virai. Transcrição bidirecional do DNA v irai produz dsRNA. EVENTOS A JUSANTE DA ROTA DE RNAI ENVOLVEM A FORMAÇÃO DE UM COMPLEXO DE SILENCIAMENTO RNA- ·INDUZIDO Para os miRNAs, siRNAs e RNAs de origem exógena, o resultado final do processo de RNAi é similar: a inativação ou o silenciamento dos mRNAs complementares ou sequências de DNA. Depois que os 21 a 24 nucleotídeos de miRNAs ou siRNAs foram formados pelas proteínas DICER-LIKE, um curto RNA duplo associa-se a um com- plexo de ribonuclease chamado complexo de silenciamento RNA-induzido (RISC) (ver Figura 2.14). Tanto em animais como em plantas, RISC contém pelo menos uma proteína catalítica ARGONAUTE (AGO). Em alguns casos, RISC pode recrutar proteínas adicionais para o complexo. Em Arabidopsis, são conhecidos dez diferentes membros da fa- mília de genes AGO. O miRNA que se liga a AGO orienta a RISC até um mRNA complementar. Após a ligação com RISC, o mRNA-alvo é clivado pela AGO e os fragmentos resultantes são liberados para o citoplasma, onde são poste- riormente degradados. Moléculas de mRNA ligadas a RISC também podem ser traducionalmente inibidas pela RISC. 54 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger Moléculas de SiRNAs ligadas à RISC têm uma função adicional: eles facilitam a metilação do DNA e histonas associadas às sequências complementares ao siRNA. Em- bora RISC provavelmente não interaja diretamente com DNA-metilases ou histona-metilases, o siRNA guia, de al- guma forma, essas enzimas modificadas até uma sequên- cia genômica a ser silenciada. A estrutura da cromatina é, então, "remodelada" em uma reação ATP-dependente e, posteriormente, metilada, resultando em maior conden- sação e heterocromatização da região de DNA envolvida (ver Figura 2.13C) (Chapman e Carrington, 2007). PEQUENOS RNAS E RNAI COMBATEM A INFECÇÃO VIRAL Além do processamento dos miRNAs e siRNAs endóge- nos, as plantas também adotaram a rota de RNAi como um tipo de resposta imunológica molecular contra infec- ção por vírus (Mlotshwa et al., 2008). As estruturas genô- micas dos vírus de plantas são bastante diversificadas. Alguns vírus injetam DNA dupla-fita, outros usam RNA simples ou dupla-fita. No entanto, cada vírus produz dsR- NA (RNA de cadeia dupla) em algum momento de seu ci- clo de vida. Replicação do RNA viral na célula hospedeira requer a formação de um dsRNA intermediário, no cito- plasma. Vírus com DNA de cadeia dupla, por outro lado, muitas vezes produzem dsRNA por transcrição de qua- dros abertos de leitura (open reading frames), coincidentes em cadeias opostas de seu DNA. Independentemente de originar um RNA ou DNA viral, o dsRNA é produzido no núcleo da célula hospe- deira. Proteínas DCL de plantas reconhecem as molécu- las de dsRNA e iniciam a rota RNAi, que por fim leva à destruição do RNA viral. No processo de corte do RNA invasivo em 21 a 24 nucleotídeos de siRNAs, a planta gera um conjunto de moléculas de "memória" que po- dem trafegar via plasmodesmos por todo o corpo vege- tal, imunizando-o efetivamente antes que o vírus possa se espalhar. COSSUPRESSÃO É UM FENÔMENO DE SILENCIAMENTO GÊNICO MEDIADO POR RNA Uma das primeiras expe- riências que levaram à descoberta do RNAi envolveu uma resposta inesperada à introdução de transgenes. No início da década de 1990, Richard Jorgensen e seus colegas tra- balhavam com o gene da petúnia para a chalcona sintase, uma enzima-chave na rota que produz moléculas de pig- mento roxo nas suas flores. Quando eles inseriram uma cópia altamente ativa do gene, esperavam ver, na prole, uma intensificação na cor roxa nas flores. Para sua surpre- sa, as cores das pétalas variaram do roxo escuro (como es- perado) para o completamente branco (como se os níveis de chalcona sintase tivessem baixado, em vez de aumen- tar). Este fenômeno - diminuição na expressão de um gene quando cópias extras são introduzidas - foi denominado cossupressão. Com o entendimento atual do RNAi, sabe- -se que, em algumas células, a superexpressão de chalcona sintase desencadeou uma RNA-polimerase dependente de RNA a produzir moléculas de dsRNA, que iniciou a resposta RNAi. Essa resposta levou ao silenciamento pós- -transcricional e metilação, tanto das cópias de chalcona sintase introduzidas como das endógenas. Curiosamente, o silenciamento pós-transcricional não ocorreu em todas as células. As células em que o silenciamento do gene ocorreu deram origem a setores brancos, explicando por que algumas das plantas transgênicas de petúnia tinham flores variegadas roxas e brancas. Em resumo, RNAi é um processo em que dsRNA eli- cia uma resposta pós-transcricional que leva ao silencia- mento de transcrições específicas. Moléculas de miRNAs ajudam na regulação de genes - frequentemente genes de desenvolvimento - , enquanto siRNAs ajudam a manter a heterocromatina transcricionalmente inativa ou atuando como uma resposta molecular imune contra o vírus. Regulação pós-traducional determina a vida útil das proteínas Como visto, a estabilidade do mRNA desempenha um pa- pel importante na capacidade de um gene para produzir uma proteína funcional. Atente-se, agora, na estabilidade das proteínas e nos mecanismos que regulam a vida útil de uma proteína. Uma proteína, uma vez sintetizada, tem uma vida útil finita na célula, que vai desde alguns minu- tos a várias horas, ou mesmo mais. Assim, níveis estáveis de enzimas celulares refletem um equilíbrio entre a sínte- se e a degradação das proteínas, conhecido como recicla- gem ou turnover. Em células vegetais e animais, existem duas rotas distintas de reciclagem de proteínas: uma em vacúolos líticos especializados (chamados de lisossomos em células animais) e outro no citoplasma (ver também Capítulo 1). A rota citoplasmática de reciclagem proteica envolve a formação de uma ligação covalente ATP-dependente entre a proteína que está a ser degradada e um pequeno polipeptídeo de 76 aminoácidos, chamado ubiquitina. A adição de uma ou mais moléculas de ubiquitina a uma proteína é chamada de ubiquitinação. Ubiquitinação dire- ciona uma proteína para a sua destruição por um grande complexo proteolítico ATP-dependente, chamado proteas- somo 26S, que reconhece especificamente essas moléculas "marcadas" (Figura 2.15) (Coux et al., 1996). Mais de 90o/o das proteínas de vida curta em células eucarióticas são de- gradadas pela rota de ubiquitina (Lam, 1997). A ubiquitinação é iniciada quando a enzima ativadora de ubiquitina (El) catalisa a adenilação ATP-dependente da porção C-terminal da ubiquitina. A ubiquitina adeni- lada é então transferida para um resíduo de cisteína em uma segunda enzima, a enzima conjugadora de ubiquiti- na (E2). As proteínas destinadas à degradação são ligadas por um terceiro tipo de proteína, a ubiquitina ligase (E3). O complexo E2-ubiquitina, em seguida, transfere sua ubi- quitina a um resíduo de lisina na proteína ligada à E3. Esse processo pode ocorrer várias vezes, formando um políme- rode ubiquitina. A proteína ubiquitinada é, então, destina- da a um proteassoma para degradação. Há uma infinidade de ubiquitina-ligases proteína- -específicas que regulam a reciclagem de proteínas-alvo Fisiologia Vegetal 55 1. ATP é requerido para a ativação in icia l da ubiquitina pela E1. do tempo, muitas vezes referindo-se a certos tipos de mutantesque permitiram aos pesquisadores entender os genes e as rotas em discussão. Por que um gene mutante é uma ferramenta mais po- derosa para a elucidação da função dos genes do Ubiquitina o '-'--:: .... >--~-- 2. E1 transfere ubiquitina para E2. E1 ~O- E1 E3 3. E3 medeia a transferência final da ubiquitina para uma proteína-alvo, que pode ser ubiquitinada múltiplas vezes. que o próprio gene normal, do tipo selvagem? O uso de mutantes para a identificação de genes depende da capacidade de distinguir um mutante de um indivíduo normal; portanto, a al- teração na sequência de nucleotídeos do mutan- te deve resultar em um fenótipo alterado. Se um E2 ~ Proteína- -alvo ~ º~\ / ~ mutante pode ser restaurado ao fenótipo normal E2 ~ Poliubiquitinação com uma versão do tipo selvagem de um gene candidato, o pesquisador sabe que uma mutação 4. A proteína ubiquitinada é direcionada para o proteossomo 265, onde é degradada. Proteossomo 265 FIGURA 2.15 Diagrama geral da rota ci- toplasmática de degradação de proteínas. ~ • • •• • • • • .. , ... , •..• , ,, Peptídeos específicas (ver Capítulo 14). Será discutido um exemplo dessa rota, com mais detalhes, no Capítulo 19, quando co- brir a regulação do desenvolvimento pelo hormônio vege- tal auxina. Ferramentas para estudar a função gênica Os indivíduos que contêm alterações específicas em sua sequência de DNA são denominados mutantes. A aná- lise de mutantes é uma ferramenta extremamente pode- rosa que pode auxiliar os cientistas a inferir a função de um gene ou mapear a sua localização nos cromossomos. Nesta seção, será discutido como mutantes são gerados e como eles podem ser usados em análises genéticas. Tam- bém serão abordadas algumas ferramentas modernas da biotecnologia que permitem aos pesquisadores estudar ou manipular a expressão de genes. A análise de mutantes pode ajudar a elucidar a função gênica Ao longo deste livro serão discutidos os genes e as rotas genéticas envolvidos em funções fisiológicas no decorrer no gene foi responsável por conferir o fenótipo mutante originalmente observado. Este méto- do é chamado complementação. Por exemplo, supõe-se que uma planta com uma mutação de um único gene mostre um atraso na produção de flores em comparação com o tipo selvagem. Se a sequência e a localização do gene responsá- vel puderem ser determinadas, provavelmente aprende-se algo sobre os mecanismos envolvi- dos no desenvolvimento floral. Supõe-se que um pesquisador seja capaz de encontrar um gene no genoma mutante que difere do gene do tipo sel- vagem em sua sequência de DNA. Se o pesquisa- dor puder mostrar que a transferência do gene do tipo selvagem para o mutante restaura o fenótipo normal, pode-se estar razoavelmente certo de que o gene candidato desempenha um papel na ini- ciação do florescimento. Na década de 1920, HJ Muller e LJ Stadler, independentemente, testaram os efeitos dos raios X sobre a estabilidade de cromossomos em moscas e em cevada, respectivamente. Ambos os pesquisadores relataram mudanças hereditárias nos organismos tra- tados. Nos anos seguintes, outras técnicas para induzir mutações foram desenvolvidas. Essas técnicas incluem o uso de raios ultravioleta ou radiação com nêutrons rápi- dos e de produtos químicos mutagênicos. Por exemplo, o tratamento com etilmetanosulfonato (EMS) ocasiona a adição de um grupo etila em um nucleotídeo, geralmente guanina. Guanina etilada pareia com timina, em vez de citosina. A maquinaria de reparação do DNA celular, em seguida, substitui a guanina etilada com adenina, cau- sando uma mutação permanente do par G/C para A/T, naquele sítio. Mutagênese com radiação ou produtos químicos induz alterações nucleotídicas aleatoriamente ao longo do genoma. Existem várias formas de mapear uma mutação de seu cromossomo e, finalmente, clonar o gene afetado. O Tópico 2.1 na internet explica um método chamado clo- nagem baseada em mapa, que usa cruzamentos entre um mutante e uma planta do tipo selvagem e a análise gené- tica da prole para refinar a localização da mutação em um segmento curto do cromossomo, que é então sequenciado. 56 Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger Outro método de mutagênese é a inserção aleatória de transposons em genes. Essa técnica envolve o cruzamento de uma planta de interesse com uma planta carregando um transposon ativo e a triagem da sua prole para fenótipos mutantes causados por inserção aleatória do transposon em novos locais. Sendo a sequência do transposon co- nhecida, essas mutações são "marcadas"; assim, as sequências de DNA adjacentes ao transposon po- dem ser facilmente encontradas e analisadas para identificar o gene mutado. Essa técnica é chamada de transposon tagging e é explicada em detalhes no Tópico 2.2 na internet. Técnicas moleculares podem medir a atividade de genes Uma vez que um gene de interesse tenha sido iden- tificado, os cientistas estão geralmente interessados em onde e quando o gene é expresso. Por exemplo, um gene pode ser expresso apenas em tecidos re- produtivos, ou apenas em vegetativos. Da mesma forma, um gene pode codificar funções celulares em geral (chamadas funções de manutenção) e ser expresso de forma contínua, ou pode codificar fun- ções especiais e ser expresso apenas em resposta a um certo estímulo, como um hormônio ou uma alteração ambiental. No passado, a análise trans- cricional (a determinação da quantidade de mRNA produzido a partir de um gene em um determinado momento) era realizada principalmente em genes isolados. Ferramentas desenvolvidas para este tipo de análise incluem Northern blotting, reação em ca- deia da polimerase por transcriptase reversa (PCR) e hibridização in situ. Serão encontradas aplicações de cada uma dessas técnicas ao longo deste livro. Uma técnica recentemente desenvolvida, chamada microarranjo (microarray) ou tecnologia de chips de genes, faz uso da informação proveniente de projetos de sequenciamento massivo do genoma. Todas as técnicas de microarranjo usam um suporte sólido (matriz), como uma lâmina de vi- dro, sobre o qual sequências de DNA (pontos ou spots) são pingadas, as quais são representativas de um único gene de uma dada espécie. Esses arran- jos podem conter milhares de pontos, que podem ser investigados em conjunto, em um único expe- rimento, aumentando enormemente o rendimen- to da análise de genes sobre os métodos clássicos mencionados anteriormente. ORNA extraído de um dado tecido é primeiramente transformado por transcrição reversa em uma cópia mais estável de DNA (um cDNA) de cada molécula de RNA re- presentada no extrato (Figura 2.16). A mistura de cDNA é, então, marcada com um corante fluores- cente para permitir a sua posterior visualização no procedimento. Após a marcação, a mistura de cDNA é aplicada ao microarranjo. Planta- -controle Planta experimental (sob estresse hídrico) cDNA Microarranjo de DNA / Laser 1. Uma planta experimental e uma planta-controle são mantidas em condições idênticas, exceto que planta em tratamento não recebe água. 2. O RNA é extraído de cada planta, transcrito reversamente para cDNA, e marcado com um marcador f luorescente vermelho (controle) ou verde (tratamento). 3. Os cDNAs são misturados e mantidos no microarranjo para h ibrid izar. 4. Mi lhares de pontos na matriz, cada um representando um gene, são excitados separadamente por um laser, e um detector mede a quantidade de cDNAs, marcados com vermelho e verde, que foram hibridizados com cada ponto contendo DNA. Os dois sina is são sobrepostos d igitalmente para formar uma única imagem. 5. Neste exemplo, o vermelho signif ica que o gene representado pelo ponto foi expresso na p lanta-controle, mas não na planta em tratamento; verde sign if ica o contrário. Amarelo indica que o gene foi expresso igualmente em ambas as p lantas. Um ponto preto indica que o gene não foi expresso nem no controle nem no tratamento. Cores intermediárias