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1 
 
Caderno CRH 
Print version ISSN 0103-4979 
Cad. CRH vol.26 no.69 Salvador Sept./Dec. 2013 
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792013000300001 
Ciência e religião: Introdução 
João Carlos Salles 
Doutor em filosofia. Professor da Universidade Federal da Bahia com pesquisa apoiada pelo CNPq e pela 
FAPESB. Membro da Academia de Ciências da Bahia. Estrada de São Lázaro, 197. Cep: 40210-730. 
Federação - Salvador - Bahia - Brasil. jcsalles@ufba.br 
Ciência e religião parecem termos opostos e inconciliáveis. Não por acaso, procurando muitas vezes 
anular-se reciprocamente, os termos se conservam, em muitos sentidos, como complementares. Assim, 
suas dimensões se atraem e se repelem mutuamente, talvez por sua natureza, em ambos os casos, visar 
à universalidade, cobrando ambas dos praticantes uma adesão íntima. Em muitos momentos, parecem 
constituir visões de mundo incomensuráveis, cujos interesses e procedimentos levariam a respostas e 
problemas imiscíveis. Por vezes, porém, parecem conviver e, mesmo, se solicitar, como se, juntas, 
satisfizessem a necessidades da vida humana. Não raro, um campo almeja a suficiência por caminhos 
perigosos, como os que levam a idolatrar a razão, chamada, então, a proferir respostas científicas aos 
mistérios da vida, ou os que, ao contrário, pretendem limitar a investigação científica, em função de 
acordos que sequer passariam pela manifestação dos interesses da comunidade, pois firmados antes com 
o sagrado ou o divino. 
Também, conservadas suas dimensões, não deixa de ser de interesse científico o conjunto de 
manifestações religiosas, passíveis de análise exterior, nem deixa de ter interesse religioso a eventual 
conversão íntima de acadêmicos, que não parecem encontrar, na profissão de sua fé, um obstáculo a suas 
pesquisas. De modo mais radical, a tensão entre ciência e religião talvez dê testemunho do impasse 
outrora descrito por Wittgenstein, quando afirmou tanto a irrelevância do discurso científico (incapaz de 
tocar questões essenciais da vida e de referir-se ao mundo como um todo, do ponto de vista do altíssimo, 
pois situado no mundo), quanto a ausência de significado da adesão ao mais elevado, cuja relevância 
irrecusável não satisfaria, contudo, as condições de uma linguagem que esteja em ordem e, por isso, seja 
capaz de dizer o mundo, de enunciar o que é o caso. 
Em meio a essa tensão, este dossiê tem um interesse duplo. Em primeiro lugar, reúne um conjunto de 
trabalhos de membros da Academia de Ciências da Bahia, que, reconhecendo a importância do tema, se 
mobilizaram em reuniões, ao longo de 2012 e 2013, com debates e exposições, segundo perspectivas 
diversas. Aqui, portanto, é apresentada uma seleção dos estudos realizados segundo procedimentos 
característicos da comunidade científica, no grau elevado de sua inserção em uma Academia de Ciências. 
Vale, então, registrar a singularidade da Academia de Ciências da Bahia, que nada tem da modorra própria 
de outros centros, sendo hoje um espaço de interação acadêmica. Para esse seu traço contribui, decerto, 
a liderança do Dr. Roberto Santos, especialmente amparado no dinamismo de outros membros da 
Academia, a exemplo de Edivaldo Boaventura e Eliane Azevedo, cujos nomes destacamos como uma justa 
homenagem, pois esses três membros da Academia foram os primeiros a cobrar a continuidade dos 
nossos debates, que já geraram, anteriormente, uma publicação sobre ética e ciência. E, como podemos 
ver, há uma clara continuidade entre a investigação sobre ética e a investigação sobre a religião, ao menos 
no aspecto mais essencial de ambos os temas tocarem valores e o que, em suma, ressalvada sua iniludível 
relevância, não se deixa expressar, salvo pelo estudo de suas manifestações exteriores como práticas 
sociais. 
Outro aspecto da Academia de Ciências da Bahia merece ser destacado, pois, acreditamos, explica parte 
de seu dinamismo. A Academia de Ciências, reconhecendo-se baiana, não se calcou simplesmente em 
2 
 
modelos exógenos, que costumam restringir-se às "ciências duras", com raro espaço até para as ciências 
humanas, que, antes, neles figura por força de concessão magnânima. Nossa Academia de Ciências, ao 
contrário, abriga todas as dimensões que, na Bahia, atingiram excelência acadêmico-científica e, com isso, 
representatividade. Logo, em nosso caso, por nossa história e pelo rigor das contribuições científicas 
nesses campos, a Academia acolhe, inclusive, as artes e a filosofia. Acreditamos que tal acolhimento 
favorece e exige um clima de debates, bem como temas como o que ora constitui este dossiê. 
Em segundo lugar, além de comportar estudos, este dossiê tem o interesse próprio de uma amostra, 
sendo exemplar de como o tema da religião não deixa indiferentes pesquisadores dedicados ao trabalho 
científico. Esse vínculo manifestou-se, então, em arco amplo, como bem podem verificar os que 
apreciarem este dossiê. Com isso, têm aqui lugar tanto a manifestação mais distante, a análise sociológica 
de um tema religioso, como ainda a pauta mais íntima, aquela capaz de dispor o cientista a uma reflexão 
que, sem esperança de resposta, o mobiliza com todas suas forças intelectuais e lhe provoca o espanto. 
Como amostra, nós a julgamos, enfim, significativa em quantidade e qualidade, sobretudo por seu 
recorte, que apenas um olhar externo pode doravante estudar e julgar. 
Os autores principais são, portanto, membros da Academia de Ciências, com claro destaque acadêmico 
em suas respectivas áreas. Amílcar Baiardi, professor titular aposentado da Universidade Federal do 
Recôncavo Baiano (UFRB) e professor da Universidade Católica do Salvador, em seu trabalho sobre a 
percepção da ciência por líderes religiosos do Recôncavo Baiano (outrora o maior centro comercial da 
província), contou com a colaboração de doutorandos de seu grupo de pesquisa, Fabiana Mendes e 
Wellington Rodrigues. O Recôncavo Baiano (para mim, aliás, ainda o centro do universo) comporta uma 
diversidade de crenças, marcadas quer pela gênese cristã, quer pela origem africana. Convivendo sem 
conflito, são, contudo, bastante diversas as reações dessas matrizes religiosas a símbolos bem 
estabelecidos da ciência, reações que o trabalho pretende sistematizar. 
Dante Galeffi, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (UFBA), mostra seu 
refinamento filosófico na leitura cuidadosa de Henri Bérgson, que toma como ponto de partida. Escolhe, 
assim, um dos veios mais ricos na contemporaneidade para interpelar os caminhos diversos do conceito e 
da intuição. Com isso, com seu fôlego para percorrer o vasto acervo bergsoniano, pode dirigir-se com 
originalidade às dimensões da Mecânica e da Mística. 
O texto de Eliane Azevedo, professora emérita da Faculdade de Medicina da Bahia (UFBA) e uma de nossas 
mais destacadas cientistas, com reconhecido trabalho em genética, mostra bem como a temática da 
religião acompanha sua reflexão, a ponto de ela poder recuperar, na vasta tradição ocidental, a intrincada 
confluência entre saberes religiosos e os interesses da ciência, com o que pôde ainda refletir, de modo 
instigante, sobre o interesse atual em tal confluência de ciência e religião. 
Manuel Veiga, professor emérito da Escola de Música da UFBA, faz aproximar sua investigação de 
etnomusicólogo do mistério mesmo que faz coevas a religião, a língua e a música. Faz assim, a seu modo 
(e sem blasfêmia!), obra de genealogia no melhor sentido filosófico, qual seja, o de colher o sentido de 
um termo, uma ação, uma instituição, no desafio mesmo de sua gênese, quando as forças do tempo 
retiram um corpo qualquer do limbo da existência, com boas ou más razões. 
Pasqualino Magnavita, professor emérito da Faculdade de Arquitetura da UFBA, dialoga com pensadores 
contemporâneos (em especial, com Deleuze), desdobrando a reflexão no campo da tensão entre saber e 
poder, por cuja denúncia poderesistir à tirania da transcendência, por quaisquer razões com que ela se 
pretenda vindicar. Com isso, pode falar da perspectiva de um ateísmo, significando-o como uma prática 
existencial emancipatória. 
Enfim, Paulo Costa Lima, professor da Escola de Música da UFBA, serve-se do célebre texto "O futuro de 
uma ilusão", de Sigmund Freud, como ponto de partida de sua reflexão. A partir daí, como é usitado nos 
trabalhos de Paulo, tudo é surpresa, a começar do contraponto inicial com John Lennon e da fórmula da 
"libideme", tomada "como equivalente gozosa da episteme epocal proposta por Foucault". E assim, como 
é próprio do seu texto (e de cada um dos que compõem o Dossiê), podemos deliciar-nos com uma reflexão 
3 
 
original, capaz, em seu caso, de incidir sobre a vida e a arte, e também capaz, no caso de todos os textos, 
de produzir ou provocar "questões urgentes e aparentemente não resolvíveis". 
Recebido para publicação em 14 de agosto de 2013 
Aceito em 26 de agosto de 2013 
João Carlos Salles - Doutor em filosofia. Professor da Universidade Federal da Bahia. Sua experiência na 
área de filosofia volta-se, sobretudo, na perspectiva da epistemologia e da filosofia da linguagem, para a 
história da filosofia moderna e contemporânea, com ênfase no empirismo clássico e na obra de Ludwig 
Wittgenstein. Com bolsa do CNPq, desenvolve a pesquisa "A gramática da experiência: o anímico na 
filosofia da psicologia de Wittgenstein"; e, com recursos do PRONEX (FAPESB/CNPq), coordena o projeto 
Filosofia e Ciências. Além disso, coordena o Grupo de Pesquisa do CNPq Filosofia Moderna e 
Contemporânea, ao qual se vincula o Grupo de Estudos e Pesquisa Empirismo, Fenomenologia e 
Gramática. Publicações recentes: Conhecimento e Ação: entre laços teóricos e redes institucionais. 
Caderno CRH (UFBA. Impresso), v. 25, p. 9-11, 2012; Percepção e cor. Dois Pontos (UFPR), v. 9, p. 123-133, 
2012; Comportamento e Significação: uma nota sobre Wittgenstein e o Behaviorismo. Analítica (UFRJ), v. 
15, p. 49-60, 2011; O cético e o enxadrista: significação e experiência em Wittgenstein. 1. ed. Salvador: 
Quarteto, 2012. v. 1. 208p. 
 All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative 
Commons Attribution License 
Estrada de São Lázaro, 197 - Federação 
40.210-730 Salvador, Bahia Brasil 
Tel.: (55 71) 3283-5857 
Fax: (55 71) 3283-5851 
 
revcrh@ufba.br 
O DEBATE SOBRE RELIGIÃO E CIÊNCIA -- UMA INTRODUÇÃO* 
John Polkinghorne 
Resumo 
Ciência e teologia têm coisas a dizer uma à outra, uma vez que ambas se preocupam com a busca da 
verdade, alcançada por meio da crença fundamentada. Entre os tópicos importantes para tal diálogo 
estão a teologia natural, a criação, a providência divina e os milagres. Este artigo apresenta um breve 
panorama do estado atual do diálogo. 
Os participantes do debate entre ciência e religião empregam diversas estratégias, dependendo do que 
procuram -- confronto ou harmonia. Para uma introdução ao assunto, a primeira tarefa é resumir a 
agenda de discussão. 
O parceiro natural para o diálogo com a ciência é a teologia, a disciplina intelectual que descreve a 
experiência religiosa, da mesma forma como a ciência descreve a investigação humana do universo físico. 
Tanto a ciência como a teologia reivindicam explorar a natureza da realidade, mas claramente o fazem 
em níveis diferentes. O objeto de estudo das ciências naturais é o mundo físico e os seres vivos que nele 
habitam. As ciências tratam seus assuntos objetivamente, por meio de um modo impessoal de encontro, 
que emprega a ferramenta investigativa da interrogação experimental. A natureza é submetida a testes, 
4 
 
baseados em experimentos passíveis de repetição, tantas vezes quantas o pesquisador quiser. Mesmo as 
ciências históricas como a cosmologia física ou a biologia evolucionária apoiam muito de seu poder 
explanatório nas descobertas das ciências diretamente experimentais, como a física e a genética. O 
propósito da ciência é obter uma compreensão precisa de como as coisas acontecem. Sua preocupação é 
com os processos que ocorrem no mundo. 
A preocupação da teologia é com a questão da verdade sobre a natureza de Deus, daquele ao qual é 
próprio se aproximar com reverência e obediência, o qual não está disponível para ser posto sob teste 
experimental. Como ocorre em todas as formas de relacionamento, o encontro com a realidade 
transpessoal do divino tem de ser baseado na confiança, e seu caráter é intrinsecamente individual e 
único. Experiências religiosas não podem simplesmente ser provocadas pela manipulação humana. Em 
vez disso, a teologia se baseia nos atos revelatórios de auto desvelamento divino. Em particular, todas as 
tradições religiosas olham para o passado, para os eventos primordiais nos quais elas tiveram a sua 
origem, e que desempenham um papel único na constituição de sua compreensão da divindade. Em 
relação à história cósmica, o objetivo central da teologia é lidar com a questão de por que os eventos 
ocorreram. Sua preocupação é com temas de significado e propósito. A crença em Deus como Criador traz 
a implicação de que uma mente e vontade divinas existem por trás do que acontece no universo. 
O DEBATE SOBRE RELIGIÃO E CIÊNCIA -- UMA INTRODUÇÃO* 
Essas diferenças entre a ciência e a teologia levaram alguns a supor que elas seriam completamente 
desconectadas entre si, ocupadas com formas de discurso separadas e até mesmo incomensuráveis. Se 
isso fosse verdade, não poderia haver um debate verdadeiro entre ciência e religião. Essa imagem de duas 
linguagens sem conexão tem sido popular entre cientistas que não desejam ser desrespeitosos com a 
religião, entendida por eles como atividade cultural, mas que tampouco querem considerar seriamente 
as reivindicações cognitivas da religião quanto ao conhecimento de Deus. Quando essa posição é adotada, 
a comparação que se segue entre ciência e teologia é frequentemente posta em termos que, na verdade, 
são desfavoráveis para a religião. Muitas vezes, sustenta-se que a ciência lida com fatos, ao passo que a 
religião supostamente se funda apenas em opiniões. Há aqui um duplo erro. 
Análises produzidas pela filosofia da ciência no século 20 deixaram claro que a busca científica pela 
compreensão é baseada em algo muito mais sutil do que uma confrontação não-problemática entre fatos 
experimentais indubitáveis e predições teóricas inescapáveis. Teoria e experimentação se entretecem de 
formas intrincadas, e não há fatos científicos interessantes que não sejam simultaneamente fatos já 
interpretados. O apelo a teorias é necessário para se explicar o que realmente está sendo medido por um 
aparato sofisticado. Por sua vez, a teologia não se baseia na mera asserção de verdades inquestionáveis 
derivadas das declarações de alguma autoridade inquestionável. A crença religiosa tem as suas próprias 
motivações, e seu apelo à revelação ocupa-se da interpretação daquelas ocasiões singularmente 
significativas de desvelamento divino, e não de verdades proposicionais comunicadas de um modo 
misterioso. 
Uma série de considerações mostra que a hipótese da independência entre ciência e teologia é muito 
ingênua para ser convincente. “Como? ” e “Por quê? ” São questões que podem ser levantadas 
5 
 
simultaneamente e, muitas vezes, ambas devem ser consideradas se quisermos obter uma compreensão 
adequada da realidade. Um bule ferve tanto porque o gás em chamas aquece a água quanto porque 
alguém quer preparar um chá. As duas questões são, sem dúvida, logicamente distintas, e não há uma 
conexão inevitável ligando as duas respostas, embora deva existir um grau de consistência entre elas. 
Colocar o bule no refrigerador com a intenção de fazer chá não faz muito sentido. 
A teologia precisaouvir a explicação científica da história do universo e determinar sua relação com a 
crença religiosa de que o mundo é a criação de Deus. Se há um desajuste total, alguma forma de revisão 
pode ser necessária. Fundamentalistas religiosos creem que tal revisão sempre teria de ser do lado da 
ciência, enquanto fundamentalistas cientificistas creem que a religião é simplesmente irrelevante para a 
compreensão do cosmo. Essas posições extremas correspondem à imagem de um conflito entre a ciência 
e a religião, tendo cada lado a missão de obter a vitória total no debate: uma visão seriamente distorcida 
que falha em reconhecer a complementaridade entre as duas formas de busca da verdade. Uma visão 
mais equilibrada seria a de que ambas as explicações merecem ser escrupulosamente abordadas em seu 
relacionamento mútuo, o que nos dá uma agenda criativa para o debate entre ciência e religião. 
Tanto a ciência quanto a teologia têm sido rotuladas pelo pós-modernismo como metanarrativas 
lendárias, construídas e endossadas socialmente. Em resposta, ambas apelam às motivações experienciais 
de suas crenças e reivindicam o que foi denominado realismo crítico como a melhor descrição de suas 
realizações: embora não alcancem conhecimento exaustivo -- pois a exploração da natureza revela 
continuamente fatos novos e inesperados, e a realidade infinita de Deus sempre excederá a compreensão 
de seres humanos finitos -- ambas creem ser capazes de obter verossimilhança, ou seja, descrições de 
aspectos da realidade que são adequadas para alguns, embora nem todos os fins. Com suas reivindicações 
crítico-realistas, a ciência e a teologia exibem um grau de parentesco, e este fato por si só seria suficiente 
para encorajar o diálogo entre elas. 
O DEBATE SOBRE RELIGIÃO E CIÊNCIA -- UMA INTRODUÇÃO* 
A ciência tem obtido seu grande sucesso devido à modéstia de sua ambição, restringindo-se ao encontro 
impessoal e limitando-se a descrever os processos naturais. O fato é que as redes lançadas por ela são 
muito grosseiras para capturar o todo da realidade. Sua compreensão da música, por exemplo, é 
estruturada em termos de respostas do sistema nervoso ao impacto de ondas de ar no tímpano. O 
profundo mistério da música -- como uma sequência temporal de sons é capaz de descrever uma esfera 
eterna de beleza? -- escapa totalmente à sua compreensão. Um elemento importante no debate 
contemporâneo entre ciência e religião é o reconhecimento da importância de “questões de limite”, 
referentes a assuntos que emergem da prática científica, mas que vão além dos limites postos pela própria 
ciência a seu potencial explanatório. Essas questões de limite têm sido a base para um novo tipo de 
teologia natural, largamente desenvolvida pelos próprios cientistas, alguns dos quais não aderem a 
nenhuma tradição religiosa. 
Teologia Natural 
A Teologia Natural é a tentativa de aprender algo sobre Deus a partir de considerações gerais tais como 
o exercício da razão e a investigação do mundo. Sua forma clássica é associada a pensadores como Tomás 
6 
 
de Aquino (século 13) e William Paley (1743-1805). Eles falavam em termos de “provas” da existência de 
Deus e frequentemente buscavam explicações teológicas para a aptidão funcional dos seres vivos, 
compreendidos como havendo sido projetados pelo divino Artífice. A Teologia Natural contemporânea é 
mais modesta em seu caráter. Seu objetivo não é a inescapabilidade lógica, mas a compreensão 
iluminada, reivindicando que o teísmo explica mais do que o ateísmo. O relacionamento da Teologia 
Natural com a ciência é de complementaridade, em vez de rivalidade. Reconhecendo que as questões 
científicas devem receber respostas científicas, a nova Teologia Natural se concentra nas questões de 
limite que emergem da ciência, mas que escapam ao seu escopo explanatório. Duas dessas metaquestões 
têm se revelado particularmente importantes. 
A primeira diz respeito à razão porque a ciência é possível, na forma profunda e extensiva que 
conhecemos. Obviamente a necessidade evolucionária de sobrevivência pode explicar porque os 
humanos são capazes de compreender grosso modo os fenômenos do dia-a-dia. Ainda assim é difícil crer 
que nossa habilidade para compreender o mundo subatômico da física quântica e o mundo cósmico da 
curvatura espaço temporal -- ambos os domínios remotamente distantes do impacto direto sobre eventos 
do dia-a-dia, e ambos requerendo, para a sua compreensão, modos altamente contra intuitivos de 
pensamento -- seja meramente um bônus fortuito da necessidade de sobrevivência. Além disso, o mundo 
não é apenas racionalmente transparente em um grau profundo à inquirição científica, mas também é, 
em semelhante grau, racionalmente belo, concedendo repetidamente aos cientistas o senso de maravilha 
como uma recompensa pelo trabalho de pesquisa. Na física fundamental, uma técnica comprovada de 
descoberta é a busca por teorias cujas equações sejam matematicamente belas, desde que apenas estas 
teorias atingem a fertilidade de longo prazo capaz de nos persuadir de sua verossimilhança. Por que a 
ciência profunda é possível, e por que seus sucessos envolvem tão intimamente a disciplina 
aparentemente abstrata da matemática, são certamente questões significativas sobre a natureza do 
nosso mundo. A ciência, por si só, é incapaz de explicar este caráter profundo das leis da natureza. Ela é 
obrigada a tratá-lo simplesmente como a base inexplicável que tem de ser assumida para sua exposição 
dos detalhes do processo. Entretanto, parece intelectualmente insatisfatório abandonar a questão assim, 
como se a ciência fosse apenas um feliz acidente. Uma compreensão religiosa torna a própria 
inteligibilidade do universo inteligível, explicando que o mundo está cravejado de sinais de inteligência 
precisamente porque a Mente do seu Criador está por trás dessa ordem maravilhosa. 
O DEBATE SOBRE RELIGIÃO E CIÊNCIA -- UMA INTRODUÇÃO* 
Essa ordem não é apenas bela, mas também profundamente frutífera. O universo como nós o 
conhecemos começou a 13.7 bilhões de anos atrás, essencialmente como uma bola de energia quase 
uniforme, em expansão. Hoje o universo é rico e complexo, com santos e cientistas entre seus habitantes. 
Esse fato em si mesmo sugere que algo vem acontecendo na história cósmica que vai além do que a 
ciência pode dizer; mas além disso, a compreensão científica dos processos evolucionários dessa história 
tem mostrado que o cosmo era desde o início prenhe de potencial para a vida baseada em carbono. As 
leis básicas da natureza, em seu caráter atual, tiveram que assumir uma forma quantitativa específica 
para possibilitar a emergência da vida em algum local do universo. Esse ajuste-fino (fine-tuning) dos 
parâmetros fundamentais é usualmente denominado Princípio Antrópico.1 Um mundo capaz de produzir 
7 
 
seres autoconscientes é um universo muito específico, de fato. Esta especificidade cósmica levanta a 
segunda metaquestão, sobre por que isto deveria ser assim. O ajuste-fino antrópico veio como um choque 
para muitos cientistas. Eles tendem a preferir o geral ao particular, sendo então inclinados a supor que 
não haveria nada de muito especial sobre o nosso mundo. 
A Teologia Natural enxerga o potencial antrópico como um dom que o Criador deu à criação. Aqueles que 
recusam esta ideia são levados, ou a considerar o ajuste-fino como outro acidente incrivelmente feliz, ou 
a abraçar a extraordinária suposição de que há, de fato, um vasto multiverso composto de muitíssimos 
universos bem diferentes, mas que apenas um é observável por nós, sendo o nosso universo, por puro 
acaso, aquele no qual as circunstâncias permitiram o desenvolvimento da vida baseada em carbono. 
Criação 
A doutrina da criação não diz respeito primariamentea como as coisas começaram, mas por que elas 
existem. Deus é visto como ordenador e sustentador do cosmo, sendo o seu Criador hoje, tanto quanto o 
era na época do Big Bang (o qual é cientificamente interessante, mas não é teologicamente crítico). Essa 
compreensão da realidade leva à visão de que a criação é um processo em contínuo desdobramento, no 
qual Deus age tanto por meio dos resultados do processo natural quanto por qualquer outro meio. Um 
diálogo frutífero entre a ciência e a religião deve ser baseado nessa compreensão da criação. 
A ciência tem muito a contribuir para o diálogo interdisciplinar, por meio do quadro que ela pode fornecer 
do processo e da história do universo. Sua contribuição mais importante é o conceito evolucionário da 
emergência de novidade em regimes onde regularidade regrada (antrópica) e especificidade acidental 
interagem. A interação de acaso e necessidade “na margem do caos” (um domínio de processos 
caracterizados pelo entrelaçamento de graus de ordem com sensibilidade a pequenas influências) tem 
operado em muitos níveis, da evolução cósmica das estrelas e galáxias, à familiar história biológica do 
aumento da complexidade da vida terrestre. 
O DEBATE SOBRE RELIGIÃO E CIÊNCIA -- UMA INTRODUÇÃO* 
Há uma forma distorcida de história intelectual que retrata a publicação de “A Origem das Espécies”, de 
Charles Darwin, em 1859, como a separação final entre os caminhos da ciência e da religião e o fim de 
qualquer debate verdadeiro entre elas. É fato histórico que nem todos os cientistas aceitaram as ideias 
de Darwin imediatamente e nem todos os teólogos as rejeitaram. Todos tiveram de se esforçar para 
aceitar o quanto o passado foi diferente do presente, e a necessidade, assim, de compreender esse 
presente à luz de suas origens passadas. Dois pensadores cristãos, Charles Kingsley e Frederick Temple, 
cedo cunharam uma frase que habilmente sintetiza como pessoas religiosas deveriam pensar sobre um 
mundo em evolução. Eles diziam que, sem dúvida, Deus poderia ter trazido à existência um mundo já 
pronto. Porém, descobrimos que o Criador fez algo mais inteligente do que isto, criando um mundo tão 
fértil que as criaturas que nele habitam tiveram a capacidade de “fazerem a si mesmas”, na medida em 
que o processo exploratório da evolução trazia este potencial à realidade. 
Uma ideia teológica muito importante está associada a este “insight”. Ela diz respeito ao modo como Deus 
pode ser compreendido em sua relação com a criação. A teologia cristã crê que o caráter fundamental de 
8 
 
Deus é o amor. Não se pode supor, portanto, que tal deidade aja como um tirano cósmico, manipulando 
as cordas numa criação que nada mais é do que um divino teatro de marionetes. O dom do amor concede 
sempre algum grau de independência a quem se ama. Uma das ideias mais iluminadoras da teologia do 
século 20 foi o reconhecimento de que o ato da criação foi um ato de autolimitação divina -- um ato de 
“kenosis”, como os teólogos dizem -- por parte do Criador, permitindo às criaturas ser e constituir a si 
mesmas. Isso implica que, embora sob a permissão divina, nem tudo o que acontece está de acordo com 
a vontade positiva de Deus. 
Uma compreensão “kenótica” do relacionamento de Deus com o mundo auxilia a teologia em sua luta 
com as perplexidades do mal e do sofrimento, que certamente são seu problema mais desafiador. Um 
mundo no qual as criaturas fazem a si mesmas é algo muito bom, mas tem o seu preço. A exploração 
exaustiva de todas as possibilidades (que é o que o “acaso” significa no contexto evolucionário) 
inevitavelmente terá bordas irregulares e levará a becos sem saída. O mecanismo que dirigiu a história da 
vida na Terra foi a mutação genética. Ora, se células de germes poderão sofrer mutações e produzir novas 
formas de vida, células somáticas poderão também sofrer mutações, mas se tornar malignas. A 
angustiante existência do câncer não é algo sem motivo, ou alguma coisa que um criador mais 
competente ou menos insensível poderia ter eliminado facilmente. É o lado sombrio e inevitável da 
produtividade da evolução. Longe de ser destrutivo para um debate útil entre a ciência e a religião, o 
ponto de vista evolucionista tem exercido uma influência muito positiva sobre o pensamento teológico. 
Finalmente, há ainda outra questão levantada pela ciência que deve ser considerada por teólogos que 
falam sobre o mundo como Criação. O prognóstico final da cosmologia para o futuro do universo é 
desanimador. As escalas de tempo são imensamente longas, mas eventualmente tudo acabará em uma 
futilidade cósmica, seja por meio de um colapso ou, mais provavelmente, por meio da interminável 
decadência de um universo em expansão e resfriamento eternos. A vida baseada em carbono deverá, por 
fim, desaparecer do cosmo. A teologia sempre se esforçou para manter uma visão realista da morte, tanto 
de indivíduos como do universo. Ela não se apoia em um otimismo evolucionário ilusório, mas baseia sua 
esperança de um destino além da morte unicamente na fidelidade do Criador do mundo. Um 
desdobramento recente no debate entre ciência e religião é o crescente interesse na exploração da 
coerência dessa esperança. O resultado tem sido significativos desenvolvimentos no pensamento 
escatológico, mas não temos espaço para dar os detalhes aqui. 
Ação Divina 
Pessoas religiosas oram a Deus, pedindo auxílio particular. Teólogos falam sobre a ação providencial de 
Deus na história. Mas a ciência fala sobre a regularidade dos processos causais no mundo. Poderia isto 
significar que os crentes estão enganados e Deus está restringido ao papel de manter o mundo existindo, 
mas contemplando-o como mero expectador? Todas as fés Abraâmicas (judaísmo, cristianismo e islã) 
falam de Deus agindo no mundo, causando consequências específicas em circunstâncias específicas. 
9 
 
O DEBATE SOBRE RELIGIÃO E CIÊNCIA -- UMA INTRODUÇÃO* 
Se a ciência implicasse um mundo mecânico de maquinários cósmicos, como muitos interpretaram a física 
newtoniana, a teologia se limitaria à imagem deísta de um Deus que meramente põe o mundo em 
movimento e então deixa tudo acontecer. Entretanto, a imagem mecanicista sempre esteve sob suspeita 
porque os seres humanos não se veem como autômatos, mas antes como tendo liberdade para atuar 
como agentes intencionais. Se o futuro do mundo está aberto para a humanidade, certamente deve estar 
aberto também para o seu Criador. De fato, a ciência do século 20 testemunhou a morte da visão 
meramente mecanicista da física. Imprevisibilidades intrínsecas (uma incerteza inescapável que não pode 
ser superada por cálculos melhores ou observações mais exatas) vieram à luz, primeiro na teoria quântica 
ao nível subatômico, e então na teoria do caos ao nível dos fenômenos macroscópicos. O que essas 
descobertas implicam é matéria de debate filosófico. 
A natureza da causalidade é um tema de metafísica, influenciada pela física, mas não totalmente 
determinada por ela. Por exemplo, enquanto muitos físicos creem que as imprevisibilidades da teoria 
quântica são sinais de uma indeterminação intrínseca, há uma interpretação alternativa de igual 
adequação empírica que atribui tais imprevisibilidades à ignorância de um número de fatores inacessíveis 
(“variáveis ocultas”). A escolha entre estas interpretações tem de ser feita em bases metacientíficas, tais 
como julgamentos de economia e ausência de artificialidade. 
A imprevisibilidade é uma propriedade concernente ao que se pode ou não se pode conhecer sobre 
acontecimentos futuros. A relação entre o que sabemos sobre o mundo e o que mundo é realmente é 
matéria de animado debate filosófico. Mas para aqueles cuja filosofia se baseia no realismo, como é o 
caso de muitos cientistas, as duascoisas são inseparáveis. Para eles, é natural interpretar 
imprevisibilidades intrínsecas como sinais de que o futuro ainda não está definido. Isto não implica que o 
futuro seja algum tipo de loteria aleatória, mas simplesmente que as suas causas não se limitam à 
descrição científica convencional de trocas de energia entre os componentes do sistema. Um candidato 
plausível para fatores causais adicionais é o exercício da agência pessoal, tanto por indivíduos humanos 
como pela ação providencial divina. 
Uma discussão bastante ativa no debate de ciência e religião tem-se centrado na questão da ação divina. 
Sem entrar em detalhes sobre a variedade de posições que vem sendo advogadas, pode-se dizer que pelo 
menos está claro que a ciência não estabeleceu o fechamento causal do mundo físico em seus próprios 
termos. É inteiramente possível tomar de forma absolutamente séria o que a física tem a dizer e ainda 
crer na capacidade de agência, tanto humana como divina. 
Uma interpretação realista das imprevisibilidades leva à visão de um mundo de genuíno “vir-a-ser”, no 
qual o futuro não é uma consequência inevitável do passado. Em vez disso, muitos fatores causais o 
determinam: a lei natural, atos humanos intencionais e a providência divina. Se a fonte dessa liberdade 
no destino é compreendida como sendo baseada na nebulosidade de processos imprevisíveis, os eventos 
não podem ser analisados e classificados de uma forma transparente, como se fosse possível dizer que a 
natureza fez isto, a ação humana intencional fez aquilo, e a providência divina fez aquilo outro. 
10 
 
O DEBATE SOBRE RELIGIÃO E CIÊNCIA -- UMA INTRODUÇÃO* 
A reflexão sobre um mundo em genuíno “vir-a-ser” tem levado alguns teólogos a repensar a relação de 
Deus com o tempo. Deus não está aprisionado no tempo como as suas criaturas, e certamente deve haver 
uma dimensão atemporal na natureza divina. A teologia clássica considerou isto a história toda, e pintou 
Deus como totalmente fora do tempo, olhando “para baixo”, por assim dizer, com a história cósmica 
inteira exibida sob o seu vislumbre, “tudo de uma vez”. Mas o Deus da Bíblia é apresentado como aquele 
que continuamente se engaja na história, e isto é justamente o que poderia se esperar do Criador de um 
mundo com tal fertilidade em constante desdobramento. 
Milagre 
O tema do milagre frequentemente emerge no debate entre ciência e religião. É uma questão que o 
cristianismo tem de considerar com muita seriedade, pois no coração de sua própria narrativa teológica 
está a ressurreição de Cristo, a crença de que Jesus foi levantado dentre os mortos para uma vida de glória 
infindável. 
Reivindicações do miraculoso vão além de um conceito do Criador atuando no veio aberto da natureza, 
pois requerem a crença de que Deus algumas vezes age de formas únicas. A ciência supõe que o que 
usualmente acontece é o que sempre acontece; porém, esta hipótese não pode ser a base para excluir a 
possibilidade de eventos únicos e sem precedentes. Contudo, milagres criam um problema teológico, pois 
não se pode presumir que Deus atue como uma espécie de mago celestial, caprichosamente fazendo um 
uso exibicionista do seu poder divino. Se milagres acontecem, tem de ser porque circunstâncias únicas os 
tornam uma possibilidade racional e consistente, eventos nos quais aspectos mais profundos do caráter 
divino se manifestam além do que normalmente é revelado. No Evangelho de João, milagres são 
denominados “sinais” exatamente neste sentido revelatório. 
A presença do miraculoso deve ser associada a um novo regime na história da criação, muito similar à 
forma como a exploração de um novo regime no mundo físico pode manifestar propriedades totalmente 
inesperadas (como, por exemplo, a dualidade onda/partícula da luz). Os cientistas não levantam a 
pergunta “É razoável? ” Instintivamente, como se soubessem por antecedência a forma que a 
racionalidade deve tomar. O mundo físico tem demasiadas vezes se provado surpreendente para que tal 
pergunta seja apropriada. Em vez disso eles perguntam: “O que o faz pensar que este seja o caso? ”, uma 
inquirição ao mesmo tempo mais aberta e, por sua insistência em evidências, mais exigente. A abordagem 
à questão do milagre no debate de ciência e religião deve seguir linhas similares, não presumindo a sua 
impossibilidade a priori, mas exigindo a fundamentação adequada antes de aceitar a crença. 
Notas 
1. Para mais informações sobre o Princípio Antrópico, ver o Faraday Paper 3: “O Princípio antrópico e o 
debate de ciência e religião”, por J. C. Polkinghorne. 
2. Ver Polkinghorne, J. C., “The God of hope and the end of the world”, London: SPCK/New Haven: Yale 
University Press, 2002. 
Referências Bibliográficas 
Alexander, D.R., “Rebuilding Matrix ; science and faith in the 21st century”, Oxford: Lion, 2001. 
Barbour, I.G., “Quando a ciência encontra a religião”, São Paulo: Cultrix, 2004. 
Polkinghorne, J.C., “Science and theology”, London: SPCK, 1998. 
Polkinghorne, J.C., “Beyond science; the wider human context”, Cambridge: CUP, 1996. 
11 
 
Dr. John Polkinghorne trabalhou com física teórica de partículas elementares por 25 anos; foi professor 
de física matemática na Universidade de Cambridge e presidente do “Queens’ College”, em Cambridge. É 
membro da “Royal Society”, foi o presidente fundador da “International Society for Science and Religion” 
(2002-2004) e é autor de vários livros sobre ciência e religião. 
* Esse artigo é parte da série “Faraday Papers”, publicada pelo Instituto Faraday para Ciência e Religião, 
uma organização sem fins lucrativos para educação e pesquisa localizada em Cambridge, Reino Unido. 
Uma lista desses artigos está disponível em www.faraday-institute.org. Traduzido por Guilherme de 
Carvalho: http://www.ultimato.com.br/ 
S Á B A D O , 4 D E A B R I L D E 2 0 0 9 
INTRODUÇÃO AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO 
INTRODUÇÃO AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO 
Trabalho: Diferenciar Ciências da Religião e Teologia sob o prisma da Teologia Reformada. 
 
INTRODUÇÃO: 
 
1.0. DEFININDO CIÊNCIAS DA RELIGIÃO 
O homem desde os seus primórdios efetiva rituais para manter uma comunicação com o que ele chama 
de "sagrado". É no sentido de compreender esta "comunicação", os fenômenos que a religião introduz no 
seio da sociedade e a relação homem x sagrado que ciências e filosofias como a sociologia, antropologia, 
psicologia, teologia e outras utilizam de seus cabedais teóricos para cientificamente os analisarem. 
Ciência da Religião é a área de investigação sistemática que tem como base uma estrutura multidisciplinar 
formada a partir do enfoque ao fenômeno religioso, em aspectos gerais, por várias Ciências, como: a 
Antropologia, a Filosofia, a História, a Psicologia, a Fenomenologia da Religião, a Sociologia e a Teologia, 
entre outras. 
Ciência da Religião é a disciplina empírica que investiga sistematicamente religião em todas as suas 
manifestações. Um elemento chave é o compromisso de seus representantes com o ideal da neutralidade 
frente aos objetos de estudo. Não se questiona a “verdade” ou a “qualidade” de uma religião. Do ponto 
de vista metodológico, religiões são “sistemas de sentido formalmente idênticos”. É especificamente este 
princípio metateórico que distingue a Ciência da Religião da Teologia. Desta forma, as ciências da religião 
são na verdade um conjunto formado por várias outras com o intuito de estudarem a religião e suas 
consequências na mentalidade humana. 
Quanto à ciência da religião é ela um tipo de estudo em que se absorvem vários métodos das ciências que 
estudam a religião aglutinando-as num único trabalho. 
2.0. OBJETIVO DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO 
O objetivo da Ciência da Religião é fazer um inventário, o mais abrangente possível, de fatos reais do 
mundoreligioso, um entendimento histórico do surgimento e desenvolvimento de religiões particulares, 
uma identificação e seus contatos mútuos, e a investigação de suas inter-relações com outras áreas da 
12 
 
vida. A partir de um estudo de fenômenos religiosos concretos, o material é exposto a uma análise 
comparada. Isso leva a um entendimento das semelhanças e diferenças de religiões singulares a respeito 
de suas formas, conteúdos e práticas. O reconhecimento de traços comuns do cientista da religião, 
permite uma dedução de elementos que caracterizam religião em geral, ou seja, como um fenômeno 
antropológico universal. 
A Ciência da Religião tem uma estrutura multidisciplinar. Trata-se de um campo de intersecção de várias 
subciências e ciências auxiliares. A História da Religião, a Sociologia da Religião e a Psicologia da Religião 
são as mais referidas. 
3.0. CIÊNCIA DA RELIGIÃO, CIÊNCIAS DA RELIGIÃO, CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES? 
Ao escrever o artigo “Ciências da Religião: de que mesmo estamos falando? ” Para a revista de Ciências 
da Religião da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o professor Antônio Gouvêa Mendonça explica esta 
diferença afirmando que Independentemente do nome que se dê a essa área de conhecimento, seja 
Ciência da Religião, Ciência das Religiões ou Ciências da Religião, o primeiro problema que se coloca é 
este: qual é seu objeto? O que se estuda mesmo sob esse ou aquele título? 
No Brasil, o problema se torna mais agudo por causa da pressão cultural da Teologia, essa entendida, 
antes, como formadora profissionalizante de agentes religiosos e, depois, como ciência normativa. Sendo 
assim, e por não se discutir o objeto, uma área de estudos que não forme profissionais e nem ao menos 
produza e reproduza normas de conduta, é desnecessária e mesmo perigosa, porque, eliminadas tanto 
uma coisa como outra, abre as portas para a reflexão e, consequentemente, para a crítica. 
Em uma entrevista à Revista de Estudos da Religião diz Edênio Valle da PUC de São Paulo, se digo “ciência”, 
afirmo que realmente as ciências têm um aparato teórico, metodológico e uma epistemologia comum 
[...]. Então, é voluntarista falar em “ciência”. Agora, minha dúvida vem mais da palavra “religião”, porque 
na realidade há um mosaico de religiões e, com a modernidade, com a crise da modernidade, aumenta o 
número de religiões, tanto que cada indivíduo, cada grupo está criando sua religião – fica difícil falar em 
“religião”. Mas, ao mesmo tempo, num olhar mais filosófico e teológico, também é possível falar na coisa 
fundante mais ou menos comum. Por isso, penso que ainda é melhor manter “Ciências da Religião”. 
Agora, o estudo científico não se faz sobre religião, esse é um universal abstrato, se faz sobre religiões. 
Então, há razão para falar em Ciências das Religiões. 
4.0. O OBJETO DE ESTUDO DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO E DA TEOLOGIA. 
Não tratam as Ciências da Religião e a Teologia do mesmo objeto, que é Deus? A resposta é não. Essa é a 
grande questão, causadora de mal-entendidos, receios e resistências. Tenta esclarecer esse ponto 
essencial O professor Antônio Gouvêa, ainda que não vá aqui a pretensão de dar um ponto final à questão. 
Apesar da longa tradição de estudos de religião que a Europa possui, ainda hoje lá se discute a relação 
entre Teologia e Ciências da Religião, às vezes ainda com paixão. 
13 
 
O objeto da Teologia e das Ciências da Religião não é o mesmo. O objeto da Teologia é, portanto, Deus. A 
Teologia é uma ciência de Deus. A tradição que nos veio trouxe consigo uma Teologia metafísica e, por 
consequência, dedutiva a partir dos grandes princípios da revelação escrita e mesma da natureza, embora 
às vezes esta seja considerada uma revelação secundária. Em resumo, a Teologia, seja ela dedutiva 
(metafísica) ou indutiva (empírica), é uma ciência de Deus. Seu objeto é Deus. O conceito de ciência 
aplicado à Teologia não é consensual, ao menos no sentido comum de ciência. 
Qual é o objeto das Ciências da Religião? As Ciências da Religião estudam não Deus, mas suas formas de 
expressão, em resumo, nas pessoas e na cultura. Nesse ponto, Ciências da Religião se distinguem da 
Teologia, porque não cogitam de questões a respeito de Deus, como sua existência e natureza. Estudam 
efeitos e não causa. 
Até a época moderna, a teologia apresentava-se como a única autoridade e fonte de normatividade em 
assuntos de religião. Essa pretensão foi colocada em xeque, primeiro pela filosofia iluminista, depois pelas 
ciências sociais, que recorreram ao famoso “princípio de exclusão da transcendência”, ou princípio de 
ateísmo metodológico. Contudo, para que a teologia seja assumida como um dos campos de 
conhecimento das ciências da religião, ela deve repensar o seu lado normativo. Fica claro que ela não 
pode mais instrumentalizar estudos de religião para “provar” a superioridade da fé cristã, e que ela deve 
renunciar a justificar e tornar plausível, racionalmente, uma revelação religiosa, a fortiori uma igreja como 
mediadora necessária da salvação. Uma das suas tarefas é a crítica dos sistemas interpretativos da religião 
– os sistemas teológicos -, enquanto hermenêutica da sua dimensão radical de sentido. Isso significa que 
o horizonte do trabalho teológico não é a Igreja como espaço próprio, mas o mundo de todos. O seu 
objeto é a realidade antropológica e social de todos. Os seus métodos de aproximação do objeto 
participam de uma racionalidade e desenvolvem uma argumentação de pertinência pública (voltadas para 
a opinião pública em geral e a comunidade acadêmica em particular), em interação com outras 
abordagens do mesmo objeto, como as ciências empírico-hermenêuticas e a filosofia da religião. O seu 
trabalho, centrado na significação social e cultural da religião, inscreve-se, em toda a sua extensão, na 
ordem ampla do humano e de suas produções socioculturais, as quais deverão sempre ser apreendidas 
em função de genealogias históricas. 
O objeto da teologia como ciência hermenêutica só pode ser a religião no sentido amplo da palavra, que 
inclui sempre como pressuposto (ou pré-compreensão) uma posição de fé indispensável para a 
compreensão do que é “dado”. A teologia encontra o seu ponto de partida, não nos dogmas oficiais e 
tampouco num modelo teológico normativo confessional, mas na experiência humana concreta, 
postulando a presença de uma dimensão religiosa em toda experiência autêntica. Apresenta-se como 
uma hermenêutica da dimensão radical de sentido ou da dimensão religiosa das culturas (incluindo a 
esfera especificamente religiosa das mesmas). Ela não investiga o fenômeno religioso a partir de fora, mas 
desenvolve um esforço de auto compreensão no interior da vida de fé. Enquanto visa uma compreensão 
sistematizante capaz de aprofundar-se a partir de recursos metodológicos próprios, merece ser 
considerada como “ciência”. Com Paul Tillich e Juan Luis Segundo, entendemos a “fé” como estrutura e 
14 
 
dimensão antropológica parcialmente acessível a uma intuição e uma sistematização “racionais”. Ela 
inclui uma dimensão pré-racional, do ponto de vista da racionalidade empírico-formal, mas não pode ser 
de modo algum qualificada de “irracional”. Mesmo subsistindo um elemento irredutível à análise, este 
não deixa de ser accessível a uma certa forma de intuição. A experiência religiosa pode ser racionalmente 
elaborada com o auxílio da fenomenologia, da filosofia e das ciências humanas; atravessando 
sucessivamente uma série de níveis de análise, até identificar o “componente essencial e irredutível da fé 
religiosa”, que ainda pode ser reconhecido pela razão como transcendendo – sem negá-lo – seu próprio 
domínio (é o método adotado por Kant na “Religião dentro dos limites da simples razão”). A razão mostra-se capaz, com seus próprios recursos, da intuição de um “além da razão” que parte dela e a ultrapassa 
sem contradizê-la. Podemos discernir esse momento de autotranscendência da razão, como momento 
que pode ser chamado de ultra racional ou transacional, não de irracional. 
Aliás, o reconhecimento da autotranscendência da razão não prejudica de modo algum a possibilidade e 
obrigação para a teologia de submeter os momentos ou níveis preliminares, que constituem o entorno 
da dimensão irredutível da experiência religiosa, à crítica racional que lhes corresponde. Pertenceria a 
essa crítica – num certo sentido, “normativa” – a denúncia das perversões desumanas do religioso, de sua 
ambivalência congênita, das manipulações ideológicas e das legitimações sacralizantes de poderes 
opressores e de comportamentos antiéticos que ele autoriza ou até incentiva. A teologia cumprirá essa 
tarefa, muitas vezes já assumida pela filosofia e pelas ciências sociais críticas, a seu modo e na sua 
linguagem própria. Os juízos de valor emitidos sobre o religioso concreto deverão partir da experiência 
humana concreta e das valorações que derivam dessa experiência, como os princípios éticos. 
5.0. REVOLUÇÃO NAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
Em seu livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, Max Weber atribuiu consequências históricas 
mundiais a esta reviravolta nos conhecimentos. Inaugurando um dos maiores debates intelectuais das 
Ciências Sociais, afirmou que o capitalismo industrial moderno não poderia ter surgido sem o ascetismo 
espiritual, que contribuiu para formação da personalidade da classe média empresarial. Nessas camadas 
o trabalho vocacional sistemático foi religiosamente consagrado — o sucesso no trabalho era interpretado 
como indicação de que o indivíduo passara a fazer parte daqueles predestinados pela determinação 
inescrutável de um Deus misterioso. Desta forma, os temores religiosos, pela própria salvação foram 
mobilizados para autodisciplina consciente do homem profissional. Este se propõe a dirigir o mundo que 
ele ao mesmo tempo rejeita, com o objetivo de cooperar na criação do Reino que há de vir. 
O esquema de Weber para o surgimento do capitalismo entre a burguesia racional pode ser assim 
resumindo em detalhes: 
As doutrinas religiosas de Lutero, e principalmente as de Calvino, definiram, sob outra forma, a relação 
do cristão com seu trabalho diário. Tanto na língua inglesa, como na alemã — e nestas somente nas 
traduções protestantes da Bíblia — o termo chamado Calling, ou Beruf refere-se tanto na à ocupação 
profissional, como ao destino religioso. Segundo a doutrina calvinista da predestinação, cada homem será 
15 
 
salvo ou condenado pelo julgamento inescrutável de um senhor inflexível. Esta doutrina lança grandes 
ansiedades sobre o crente piedoso, que teme estar entre os condenados. E o que é mais grave, essas 
ansiedades não serão mitigadas pelo isolamento de uma vida monástica, nem por uma conduta religiosa 
exemplar, como a dos santos medievais. Estas vias foram bloqueadas pela teoria de que Deus colocou o 
homem no mundo de sua criação, junto a doutrina de que o Senhor já escolheu ou condenou todos os 
homens. Portanto, as obras piedosas, como donativos a igrejas, orações frequentes e peregrinações, 
tornaram-se tentativas sem sentido e inúteis para modificar a vontade impenetrável de Deus. Existe, de 
fato, somente um caminho para se obter os sinais do estado de graça, como um presságio da eleição 
divina: a adesão metódica ao código de conduta agradável a Deus seja qual for a condição em que se 
encontra o fiel. 
Weber denominou este código de conduta, na forma em que surgiu historicamente através de seitas 
puritanas, de espiritual ou ascetismo temporal, isto é, a renúncia ao gozo dos prazeres mundanos dentro 
do próprio mundo. O puritano procura realizar uma vida quase monástica sem, no entanto, tornar-se um 
monge, proclamando as normas desse ascetismo para, assim, conquistar o mundo, em lugar de abandoná-
lo. A realização deste intento requer uma auto-observação metódica e sistemática, e uma disciplina 
constante. A repressão dos impulsos da desobediência ao código religioso servia aos puritanos piedosos 
como uma indicação de sua condição de eleito aos olhos de Deus. No entanto, o código religioso, negando 
indulgência com relação às alegrias proporcionadas por festas e bailes, pela satisfação sexual e até pelo 
sono (o ideal de um longo dia de trabalho) deixava aos puritanos a concentração no trabalho como sua 
melhor técnica ascética. O homem piedoso deve renovar sempre seus esforços, pois não existe para ele 
qualquer garantia ou segurança de seu destino. Em face de uma possível condenação, quaisquer esforços 
e tribulações neste vale de lágrimas serão menos pesados. Deste modo, a culpa estimula-o a intensificar 
o seu trabalho: o homem profissional é, então, aquele que agrada a Deus. 
A ética religiosa do puritano o impede de investir os frutos de seu trabalho no consumo de ostentações, 
como cavalos e carruagens, mansões e propriedades feudais; mas por outro lado, ele acredita que aquele 
que não trabalha, também não deve comer. Por esta razão, despreza a prática de esmolas aos pobres, 
vagabundos e similares defendida pelo Catolicismo. As entidades filantrópicas dos puritanos em favor dos 
órfãos, mendigos vagabundos e dos velhos, consistem em instituições que abrigam essas pessoas, de 
forma organizada. Existe apenas um meio pelo qual o puritano pode usar a sua riqueza acumulada: investi-
la e reinvesti-la em empresas produtivas, pois isto permite a extensão das oportunidades de salvação a 
muitos outros pobres. O negociante puritano salva, desta forma as almas dos pobres, usando-os como 
sua mão de obras e eles, por sua vez, adquirem uma nova disciplina de trabalho, tornando-se confrades 
de seu empregador. Com vistas a salvação, eles renunciam a inúmeras festividades alegres, 
representações de peças teatrais, em dia que eram feriados para os trabalhadores católicos da Idade 
Média. Deste modo, o puritano torna-se um trabalhador incansável, assegurando seu estado de 
predestinado e, como um homem santificado, conquistando o respeito de seus companheiros de crença, 
quanto mais se expandem os seus negócios. 
16 
 
A análise de Weber revela o impacto que um credo exerce sobre a formação de um tipo de caráter. A 
insegurança motivada pela religião, suas fugas, também determinadas por ela, estabelecem recompensas 
para atitudes e traços psíquicos específicos, como a poupança, o trabalho árduo, o controle de conversas 
ociosas, a humildade, o contínuo autocontrole a objetividade. Esta estrutura de caráter, por sua vez, 
torna-se economicamente importante pelo fato de garantir as vantagens da competição sobre os agentes 
econômicos tradicionais e menos frugais. 
6.0. DIFERENÇA ENTRE OS TEÓLOGOS DOS CIENTISTAS DA RELIGIÃO 
Os teólogos são especialistas religiosos. Os cientistas da religião são especialistas em religião. Essa 
diferença diz respeito a pontos essenciais: 
6.1. Enquanto os teólogos investigam a religião à qual pertencem, os cientistas da religião geralmente se 
ocupam de outra que não a sua própria. A tarefa do teólogo é proteger e enriquecer sua tradição religiosa. 
É sua religião que está no centro do seu interesse. A sede de saber teológico diminui à medida que se 
afasta desse centro. Os teólogos alemães, por exemplo, concentram-se na religião majoritária dos seus 
conterrâneos. Apenas poucos pesquisadores ocupam-se das religiões dos letões, escoceses ou sicilianos. 
Cristãos em Maláui, Luzon’ ou nas Ilhas Cook talvez sejam do interesse de uma ou outra academia alemã 
onde são formados missionários. 
Os cientistas da religião não prestam um serviço institucional como os teólogos. Não são comandadospor 
nenhum bispo, nem obrigados a dar satisfação a nenhuma instância superior. São autônomos quanto ao 
seu trabalho. Geralmente, seu campo de pesquisa está no exterior, longe da sua pátria, e não atinge 
interesses dos amigos ou da própria família. Todavia, os cientistas da religião também têm seus focos 
temáticos — portanto, quanto mais um assunto deles se afasta, menos acentuado é seu interesse 
acadêmico. Especialistas alemães em hinduísmo se voltam para a Índia. Poucos vão além e estudam a 
diáspora dos hindus na África do Sul, nas Ilhas Fiji ou em outras partes do mundo. Temas ainda mais 
periféricos nesse universo, como, por exemplo, os hindus não indianos na Ilha de Bali, são abordados por 
cientistas especificamente interessados por essa região, e não pela Índia. 
6.2. Os cientistas da religião optam pela pesquisa de uma determinada religião. Pode ser qualquer uma 
— potencialmente, a escolha é ilimitada em termos históricos, geográficos ou tipológicos. Há apenas um 
critério que reduz o espectro dos seus possíveis objetos de estudo: a própria incompetência. Quem não 
compreende a língua dos adeptos de uma religião, não suporta o clima da região onde ela se encontra ou 
pensa que a fé em questão não tem valor deveria optar pela pesquisa de um outro objeto. Os teólogos 
não têm essa liberdade, uma vez que apenas se ocupam de uma religião alheia quando existe a 
necessidade de urna comparação com a sua própria. Todavia, quando isso acontece, são obrigados a 
estudá-la. Especialistas no Antigo ou Novo Testamento precisam explicar textos bíblicos em que outras 
religiões são mencionadas. Historiadores da Igreja devem explicar eventos em que também religiões não 
cristãs tomaram parte. Teólogos sistemáticos e práticos têm de explicar conteúdos não cristãos quando 
17 
 
há seguidores de outras religiões vivendo entre eles, quando um elemento religioso alienígena está na 
moda ou, então, quando representantes de outra fé catequizam cristãos com sucesso. 
6.3. Quando os teólogos estudam uma religião alheia, partem da própria fé. Ao investigarem como os 
outros concebem seu deus, crença ou pecado, tomam a própria religião como referência. De acordo com 
seus critérios, avaliam os demais sistemas como “mais próximos” ou “mais distantes” de sua própria 
religião, ou, até mesmo, enquadram-nos em julgamentos que determinam categorias do tipo “o objeto 
traz algumas características religiosas” ou “apenas magia”. Todavia, se algo é natural e indubitavelmente 
visto como semelhante, criam facilmente pontes entre a própria religião e a outra. Procedimentos desse 
tipo geralmente não possibilitam um encontro com o outro, ou seja, não chegam a um verdadeiro 
conhecimento de outra fé. Em outras palavras: são estritos demais para aprofundar a relação com o 
objeto de estudo. 
Não é oportuno para os cientistas da religião avaliar outra fé com base na própria. Eles têm a liberdade 
de pesquisar uma crença alheia sem preconceitos. A questão é apenas saber o quanto dessa liberdade 
eles suportam. É mais fácil descobrir algo quando se sabe com antecedência o que procurar; por conta 
disso, há cientistas da religião que têm por costume apropriar-se de critérios já estabelecidos para 
classificar elementos ou universos como “animismo”, “magia” ou “politeísmo”. Isso significa que não 
apenas preconceitos religiosos, mas também atitudes intelectuais podem distorcer a compreensão de 
fenômenos pesquisados no âmbito da Ciência da Religião. 
6.4. Os fiéis de uma determinada crença é que vão informar se entendemos adequadamente uma fé 
alheia. Consultar adeptos de uma religião pesquisada é um teste de segurança que permite diferenciar 
descrições válidas e não válidas do ponto de vista da história da religião. Os teólogos têm meios próprios 
para distinguir o que é “verdadeiro” e o que é “falso” na área da religião. Para eles, a própria fé — e não 
a de outras pessoas — é a norma decisiva, uma vez que apenas ela é considerada verdadeira em oposição 
às outras, que são avaliadas como falsas. 
7.0. CALVINISMO INTEGRAL: UMA VISÃO COMPLETA DA VIDA E DO MUNDO 
Para o pensador calvinista, tudo na vida é religião. O calvinismo é uma biocosmovisão completa que 
envolve todos os aspectos da vida e todas as áreas do conhecimento humano. O calvinista não pode se 
satisfazer apenas com uma teologia reformada; ele busca uma filosofia igualmente reformada, uma 
ciência, uma arte, uma cultura, uma política reformada. Todas as áreas da ciência podem e devem ser 
exploradas a partir de pressupostos cristãos reformados, através da examinação pressuposicional (dos 
fundamentos teóricos) e estrutural segundo o motivo bíblico elementar da criação-queda redenção (18) 
(da sua ordem criada, das disfunções resultantes do pecado, e da restauração pós-lapsariana em Cristo). 
(19) Como dizia Van Til: “Não há um centímetro quadrado da vida da qual Cristo não diga ‘é meu’” (20) 
(Mt 28.18). Deus é absolutamente soberano sobre toda a criação bem como sobre todos os aspectos da 
realidade e todas as esferas da vida humana. A soberania absoluta de Deus (SI 139; Is 46.9-10; Ef 1.3-14) 
é o conceito central e fundamental do pensamento reformado. 
18 
 
O conceito de religião representa, na filosofia calvinista, não a noção popular de religiosidade, mas sim o 
verdadeiro sentido da palavra, isto é, a religação do indivíduo com o seu Criador. Ora, só há um caminho 
para a redenção e a reconciliação com Deus: a fé em Jesus Cristo. Para o pensador reformado, portanto, 
a religiosidade é uma função do ser humano, e todos os seres humanos são essencialmente religiosos, 
uma vez que todos os homens se posicionam em submissão ou em rebeldia contra Deus, respondendo 
positiva ou negativamente à salvação em Cristo oferecida pela graça divina, segundo a soberania do 
próprio Deus. O pensamento humano é controlado e guiado por princípios fundamentais que refletem 
uma atitude religiosa básica. Esta é, na verdade, uma noção básica da teologia do pacto: nós somos 
criaturas religiosas. Nós fomos criados para conhecer a Deus e ter comunhão com ele. Nós temos que 
depender de Deus. Quando não o fazemos, não é que deixamos de ser religiosos, mas sim que desviamos 
nossa fé em direção de algum Outro objeto, e tornamo-nos idólatras, infiéis para com Deus, adorando a 
criatura em lugar do Criador (Rm 1.25). O “coração” humano se dirige a Deus ou se afasta dele em rebeldia 
(Rm 3.10; 8.7-8; Ef 2.3). Ele é o centro da existência humana e do relacionamento com Deus. Do coração 
do homem procedem as fontes da vida (Pv 4.23), isto é, tudo na vida depende e é também resultado deste 
posicionamento religioso do coração em submissão ou em rebeldia contra Deus. 
BIBLIOGRAFIA: 
GOUVÊA, Ricardo Quadros. “Calvinistas Também Pensam: Uma Introdução à Filosofia Reformada”. Fides 
reformata (Revista do Seminário José Manoel da Conceição). Volume 1. 1996. pp. 48 a 59. 
 
MENDONÇA, Antônio Gouvêa. Ciências da Religião: de que mesmo estamos falando? Revista Ciências da 
Religião: História e Sociedade (Universidade Presbiteriana Mackenzie) – Ano 2. Nº 02. 2004, pp. 17 a 34. 
 
WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Editora Martin Claret, 2006. 
 
GRESHAT, Hans-Junger. O Que é Ciência da Religião? São Paulo: Paulinas, 1998. 
 
- Acessado no dia 26/11/08 
-Acessado no dia 23/11.08 
- Acessado no dia 23/11/08

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