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MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA Julio C. Mendes Brandão César de Araujo Miranda Plínio da Cunha Leal Rogean Rodrigues Nunes Sérgio Luiz do Logar Mattos Maria Angela Tardelli Erick Freitas Curi Julio C. Mendes Brandão César de Araujo Miranda Plínio da Cunha Leal Rogean Rodrigues Nunes Sérgio Luiz do Logar Mattos Maria Angela Tardelli Erick Freitas Curi Originado no Comitê de Medicina Perioperatória da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, Medicina Perioperatória e Anestesia reúne profissionais a ela ligados e que se dedicam à especialidade em diferentes centros brasileiros. Para oferecer uma visão sólida desta área em constante atualização, conta com 20 capítulos, evidenciando temas relevantes e necessários frente aos avanços tecnológicos e aos desafios das abordagens clínicas. MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA ANESTESIOLOGIA Rua Professor Alfredo Gomes, 36 Botafogo - Rio de Janeiro - RJ | CEP 22251-080 Telefone: (21) 3528-1050 E-Mail: contato@sbahq.org Portal: https://www.sbahq.org Fanpage: https://www.facebook.com/ sociedadebrasileiradeanestesiologia YouTube: https://www.youtube.com/user/SBAwebtv Instagram: https://www.instagram.com/sba.sociedade Twitter: https://twitter.com/SbaSociedade CONHEÇA TAMBÉM Rua Professor Alfredo Gomes, 36 Botafogo - Rio de Janeiro - RJ | CEP 22251-080 Telefone: (21) 3528-1050 E-Mail: contato@sbahq.org Portal: https://www.sbahq.org Fanpage: https://www.facebook.com/ sociedadebrasileiradeanestesiologia YouTube: https://www.youtube.com/user/SBAwebtv Instagram: https://www.instagram.com/sba.sociedade Twitter: https://twitter.com/SbaSociedade CONHEÇA TAMBÉM 03765 BRANDAO Medicina_Perioperatoria.indd 1 08/07/2019 14:40:15 MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA Brandao_Iniciais_Impresso.indd 1 02/07/2019 17:09:19 Diretoria – Gestão 2019 DIRETOR PRESIDENTE Erick Freitas Curi DIRETOR VICE-PRESIDENTE Rogean Rodrigues Nunes DIRETOR SECRETÁRIO GERAL Gualter Lisboa Ramalho DIRETOR FINANCEIRO Augusto Key Karazawa Takaschima DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE DEFESA PROFISSIONAL Heber de Moraes Penna DIRETOR DO DEPARTAMENTO ADMINISTRATIVO Marcos Antonio Costa de Albuquerque DIRETORA DO DEPARTAMENTO CIENTÍFICO Maria Angela Tardelli VICE-DIRETORA DO DEPARTAMENTO CIENTÍFICO Ana Cristina Pinho Mendes Pereira Diretoria - Gestão 2018 PRESIDENTE Sérgio Luiz do Logar Mattos VICE-PRESIDENTE Erick Freitas Curi SECRETÁRIO GERAL Tolomeu Artur Assunção Casali TESOUREIRO Augusto Key Karazawa Takaschima DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE DEFESA PROFISSIONAL Armando Vieira de Almeida DIRETOR DO DEPARTAMENTO ADMINISTRATIVO Marcos Antonio Costa de Albuquerque DIRETOR DO DEPARTAMENTO CIENTÍFICO Rogean Rodrigues Nunes DIRETORIAS DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ANESTESIOLOGIA QUE CONTRIBUÍRAM COM ESTA OBRA Brandao_Iniciais_Impresso.indd 2 02/07/2019 17:09:19 MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA Julio C. Mendes Brandão César de Araujo Miranda Plínio da Cunha Leal Rogean Rodrigues Nunes Sérgio Luiz do Logar Mattos Maria Angela Tardelli Erick Freitas Curi Editores Rio de Janeiro 2019 Brandao_Iniciais_Impresso.indd 3 02/07/2019 17:09:19 Medicina perioperatória e anestesia Copyright© 2019, Sociedade Brasileira de Anestesiologia Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer sistema, sem prévio consentimento da SBA. Colaboraram nesta obra Editora: Mirian Raquel Fachinetto Preparação de originais: Heloísa Stefan Ilustrações: Gilnei Cunha Capa e projeto gráfico: Paola Manica Editoração: Kaéle Finalizando Ideias O conteúdo desta obra é de inteira responsabilidade de seu(s) autor(es). Produzido pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Material de distribuição exclusiva aos médicos anestesiologistas. Produzido em Junho/2019 Sociedade Brasileira de Anestesiologia Rua Professor Alfredo Gomes, 36 - Botafogo - Rio de Janeiro - RJ CEP 22251-080 - Tel.: (21) 3528-1050 - E-Mail: contato@sbahq.org - Portal: https://www.sbahq.org/ Fanpage: https://www.facebook.com/sociedadebrasileiradeanestesiologia YouTube: https://www.youtube.com/user/SBAwebtv Instagram: https://www.instagram.com/sba.sociedade/ Twitter: https://twitter.com/SbaSociedade S678m Medicina perioperatória e anestesia / Editores: Julio C. Mendes Brandão, César de Araujo Miranda, Plínio da Cunha Leal, Rogean Rodrigues Nunes, Sérgio Luiz do Logar Mattos, Maria Angela Tardelli, Erick Freitas Curi. – Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Anestesiologia, 2019. 252 p. ; 25 cm. ISBN 978-85-98632-45-2 1. Anestesiologia – Estudo e ensino. I. Sociedade Brasileira de Anestesiologia. II. Brandão, Julio C. Mendes. III. Miranda, César de Araujo. IV. Leal, Plínio da Cunha. V. Nunes, Rogean Rodrigues. VI. Mattos, Sérgio Luiz do Logar. VII. Tardelli, Maria Angela. VIII. Curi, Erick Freitas. CDU 616-089.5 Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin – CRB 10/2147 Brandao_Iniciais_Impresso.indd 4 02/07/2019 17:09:20 AUTORES Julio C. Mendes Brandão, MD, PhD, TSA – Doutor em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Postdoctoral Research Fellow pela Harvard Medical School. Presidente do Comitê de Medicina Perioperatória da Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA). César de Araujo Miranda, MD, TSA – Corresponsável pelo Centro de Ensino e Treinamento (CET) da Disciplina de Anestesiologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ). Professor de Anestesiologia da FMJ. Membro da Comissão Científica da Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo (SAESP). Plínio da Cunha Leal, MD, PhD, TSA – Mestre e Doutor em Ciências pela Unifesp. Professor adjunto da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Rogean Rodrigues Nunes, TSA – Professor Doutor do Curso de Graduação em Medicina da Unichristus, CE. Correspon- sável pelo CET/SBA do Hospital Geral de Fortaleza/CE. Mestre e Doutor em Anestesia. Diretor vice-presidente da SBA. Sérgio Luiz do Logar Mattos, TSA – Médico anestesiologista. Coordenador da Unidade Docente Assistencial do Hos- pital Universitário Pedro Ernesto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Maria Angela Tardelli, TSA – Professora associada da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Medicina Intensiva do Depar- tamento de Cirurgia da Escola Paulista de Medicina (EPM) da Unifesp. Instrutura corresponsável pelo CET/SBA da Disci- plina de Anestesiologia, Dor e Medicina Intensiva do Departamento de Cirurgia da EPM/Unifesp. Coordenadora geral do Núcleo SBA Vida. Diretora do Departamento Científico da SBA. Erick Freitas Curi, TSA – Médico anestesiologista. Professor de Anestesiologia do Departamento de Clínica Cirúrgica do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo. Corresponsável pelo CET da Afecc-Hospi- tal Santa Rita de Cássia. Doutor em Anestesiologia pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Presidente da SBA (gestão 2019). Cássio Campello de Menezes, TSA – Médico anestesio- logista do Serviços Médicos de Anestesia (SMA). Daieni Fernandes, MSc – Nutricionista. Coordenadora assistencial da Nutrição da ISCMPA. Danielle Maia Holanda Dumaresq, TSA – Médica anes- tesiologista. Responsável pelo CET do Instituto Dr. José Frota, Fortaleza, CE. Mestra pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Ed Carlos Rey Moura, MD, PhD – Professor adjunto da UFMA. Mestre e Doutor em Ciências pela Unifesp. Evaldo Marchi, Esp. – Professor associado e coordena- dor da Pós-Graduação e Pesquisa da Faculdade de Medi- cina de Jundiaí. Título de Especialista em Cirurgia Geral. Florentino Fernandes Mendes, TSA, MSc, PhD – Pro- fessor associado Doutor de Anestesiologia da UFCSPA. Doutor em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP). Francisco Ricardo Marques Lobo, TSA – Professor adjunto da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Responsável pelo Serviço de Aneste- sia em Cirurgias de Grande Porte do Hospital de Base,São José do Rio Preto. Mestre e Doutor em Ciências da Saúde: Coagulopatias. Adriana Érica Yamamoto Rabelo, TEA – Médica aneste- siologista do Serviço de Transplante de Fígado do Hospi- tal de Base, São José do Rio Preto. Airton Bagatini, TSA – Corresponsável pelo CET do SANE. Responsável pela Perspectiva Assistencial do Hos- pital Ernesto Dornelles, Porto Alegre, RS. Membro do Comitê de Segurança da Confederação Latino-Americana das Sociedades de Anestesiologia (CLASA). Presidente da SBA (gestão 2013). Bruna Müller Leão, MSc. – Fisioterapeuta líder de pes- quisa do Serviço de Fisioterapia da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (ISCMPA). Espe- cialista em Fisioterapia Cardiorrespiratória pelo Instituto de Cardiologia – Fundação Universitária de Cardiologia (IC-FUC), Porto Alegre. Mestra em Ciências da Reabilita- ção pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). Caio Marcio Barros de Oliveira, TSA – Professor adjunto de Medicina da UFMA. Responsável pelo Serviço de Dor do Hospital São Domingos, MA. Especialista em Dor pela EPM/Unifesp. Especialista em Cuidados Palia- tivos pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês. Mestre e Doutor em Ciências pela EPM/ Unifesp. Brandao_Iniciais_Impresso.indd 5 02/07/2019 17:09:20 Gabriela Tognini Saba – Médica residente de Anestesio- logia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Gastão F. Duval Neto, TSA, PhD – Professor de Aneste- siologia da Universidade Federal de Pelotas. Iana de Almeida Siqueira, TEA – Médica anestesiolo- gista do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC) e do Hospital Geral de Fortaleza (HGF). Especialista em Anestesiologia pelo HGF. Jennifer de Melo Rocha, TEA – Médica. Especialista em Anestesiologia pelo HGF. Juliano Pinheiro de Almeida, TEA – Médico assistente da UTI do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP)/HCFMUSP. Especialista em Medicina Intensiva pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib). Doutor em Ciências pela FMUSP. Kátia Bezerra Veloso, TEA – Instrutora associada do CET/SBA do SEDARE-Complexo Hospitalar São Mateus, Cuiabá/MT. Médica anestesiologista do SEDARE. Lais Helena Navarro e Lima, M.D., Ph.D, TSA – Profes- sora assistente Doutora do Departamento de Anestesio- logia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Unesp. Vice-diretora científica da SAESP. Liana Maria Tôrres de Araújo Azi, TSA – Professora adjunta do Departamento de Anestesia e Cirurgia da Uni- versidade Federal da Bahia (UFBA). Mestra e Doutora em Anestesiologia pela USP-RP. Lígia Andrade da Silva Telles Mathias, TSA – Médica. Professora titular da FCMSCSP. Presidente da Latin Ame- rican Society of Regional Anesthesia. Membro do Corpo Editorial da Revista Brasileira de Anestesiologia. Lívia Pereira Miranda Prado, TSA – Médica anestesiolo- gista do Serviço de Transplante de Fígado do Hospital de Base, São José do Rio Preto. Mestra em Medicina Interna pela FAMERP. Ludhmila Abrahão Hajjar, Esp. – Professora associada da Disciplina de Cardiologia da FMUSP. Coordenadora das UTIs Cardiológicas do Hospital Sírio-Libanês. Especialista em Medicina Intensiva pela Amib. Especialista em Cardio- logia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). Marcelo Vaz Perez, TEA – Professor convidado do Curso de Pós-Graduação em Avaliação e Tratamento Interdisci- plinar de Dor da USP. Responsável pelo Serviço de Dor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Médico assis- tente da Unifesp. Coordenador do Curso de Intervencionista em Dor do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês. Especialista em Tratamento da Dor pela Associa- ção Médica Brasileira (AMB). Doutor em Medicina: Clínica Cirúrgica pela USP-RP. Membro do Comitê de Dor da SBA. Maria José Carvalho Carmona, TSA – Professora asso- ciada da Disciplina de Anestesiologia da FMUSP. Diretora da Divisão de Anestesia do Instituto Central do HCFMUSP. Marcos Adriano Lessa, TEA – Médico anestesiologista. Pesquisador titular do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/ Fiocruz). Especialista em Terapia Intensiva pela Amib. Pós-Graduado em Dor e Cuidados Paliativos pela Univer- sidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Doutor em Fisio- patologia Clínica e Experimental. Pós-Doutorado em Fisiologia Respiratória pela Harvard Medical School. Maurício Pires Ferreira Magalhães, TEA – Médico anes- tesiologista do Hospital Universitário Professor Alberto Antunes da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Mem- bro do Conselho Diretor da Operação Sorriso do Brasil/ Operation Smile, Inc. Diretor de Eventos da Latin Ameri- can Society of Regional Anesthesia. Instrutor na The New York School of Regional Anesthesia (Nysora). Oscar César Pires, TSA – Professor Doutor da Disciplina de Farmacologia da Universidade de Taubaté, SP. Res- ponsável pelo CET/SBA do Hospital Municipal de São José dos Campos, SP. Patrícia Schimanoski, Esp. – Fisioterapeuta da Unidade de Terapia Intensiva Cirúrgica do Hospital São Francisco da ISCMPA. Especialista em Fisioterapia Cardiorrespi- ratória pelo IC-FUC e em Terapia Intensiva: Adulto pela Faculdade de Ciências da Saúde Albert Einstein. Rafael Augusto Souza Rangel, TEA – Médico aneste- siologista da UERJ/Ministério da Saúde. Especialista em Medicina Intensiva pela Amib. Mestre em Ciências Bioló- gicas pela UERJ. Sara Lucia Ferreira Cavalcante, TSA-SBA – Médica anes- tesiologista. Corresponsável pelo CET-SBA do Hospital Geral de Fortaleza. Mestra em Farmacologia pela Facul- dade de Medicina da UFC. Doutora em Anestesiologia pela Unesp-Botucatu. Membro da Comissão de Ensino e Treinamento da SBA. Sérgio de Souza Oliveira, TSA – Professor adjunto da Disciplina de Anestesiologia do Departamento de Clínica Cirúrgica do Hospital Universitário Julio Müller da Uni- versidade Federal do Mato Grosso (UFMT). Responsável pelo CET/SBA do Hospital de Câncer de Mato Grosso. Médico anestesiologista do SEDARE, Cuiabá, MT. Mes- tre em Ciências da Saúde pela UFMT. Thiago Ramos Grigio, TEA – Médico anestesiologista. Supervisor da Residência de Anestesiologia da Santa Casa de São Paulo. Especialista em Dor pela AMB. Mes- tre em Pesquisa e Cirurgia pela Santa Casa de São Paulo. Doutorando em Anestesiologia na USP. Thiago Mamoru Sakae, TEA – Médico anestesiologista. Mestre em Saúde Pública pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Doutor em Ciências Médicas pela UFSC. Pós-Doutorado em Ciências da Saúde pela Univer- sidade do Sul de Santa Catarina. Valeria Viviana Blanco, TEA – Médica anestesiologista instrutora do Hospital Infantil Joana de Gusmão, Floria- nópolis, SC. Membro do corpo clínico Anestesiologia Pediátrica do Hospital Unimed Grande Florianópolis, SC. Vera Lúcia Fernandes de Azevedo, TSA – Responsável pelo CET/SBA OSID, Salvador, BA. Mestra e Doutora em Anestesiologia pela Unesp, Botucatu, SP. vi | AUTORES Brandao_Iniciais_Impresso.indd 6 02/07/2019 17:09:20 PREFÁCIO A Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA) continuamente desenvolve ações tendo como foco a medicina perioperatória, sempre com o objetivo de proporcionar maior segurança ao paciente. Apoiou esta destacada publicação, desenvolvida a partir do comitê de Medicina Perioperatória, evi- denciando temas atuais e necessários frente aos avanços tecnológicos e aos desafios das aborda- gens clínicas. Esta representa uma área de grande influência anestesiológica, considerando o perfil de qualidade e conhecimento que detém a nossa especialidade. O livro Medicina Perioperatória e Anestesia é uma primazia de obra e certamente irá compor mais um pilar de excelência científica da SBA. Rogean Rodrigues Nunes Diretor Vice-presidente da SBA Erick Freitas Curi Diretor Presidente da SBA Brandao_Iniciais_Impresso.indd 7 02/07/2019 17:09:20 Brandao_Iniciais_Impresso.indd 8 02/07/2019 17:09:20 SUMÁRIO Parte I – PRÉ-OPERATÓRIO 1. Identificação do paciente de alto risco cirúrgico ......................................................................1 Vera Lúcia Fernandes de Azevedo | Liana Maria Tôrres de Araújo Azi Danielle Maia Holanda Dumaresq 2. Otimização perioperatória do paciente de alto risco .............................................................. 21 Gabriela Tognini Saba | Maria José Carvalho Carmona 3. Seleção de fármacos anestésicos: do pré-anestésico à indução ........................................... 33 Thiago Mamoru Sakae | Julio C. Mendes Brandão 4. Avaliação do risco nutricional ....................................................................................................... 47 Daieni Fernandes | Florentino Fernandes Mendes 5. Abreviação do jejum pré-operatório e as novas soluções orais ............................................ 59 Kátia Bezerra Veloso | Sérgio de Souza Oliveira Oscar César Pires | Rogean Rodrigues Nunes 6. Tromboprofilaxia: do manejo pré-operatório dos anticoagulantes à prevenção da trombose pós-operatória ................................................................................. 69 Cássio Campello de Menezes Parte II – TRANSOPERATÓRIO 7. A resposta neuroendocrinometabólica à agressão cirúrgica e seu impacto nos desfechos ........................................................................................................ 78 Florentino Fernandes Mendes 8. Bloqueios do neuroeixo e bloqueios periféricos guiados por ultrassom ........................... 88 Maurício Pires Ferreira Magalhães | Valeria Viviana Blanco Ligia Andrade da Silva Telles Mathias | Marcelo Vaz Perez Julio C. Mendes Brandão | Thiago Ramos Grigio 9. A microcirculação e a avaliação da perfusão tecidual ............................................................. 95 César de Araujo Miranda | Evaldo Marchi | Julio C. Mendes Brandão Plínio da Cunha Leal 10. Monitoração estática e dinâmica da volemia e a terapia guiada por objetivos ...................................................................................................................... 105 Lais Helena Navarro e Lima Brandao_Iniciais_Impresso.indd 9 02/07/2019 17:09:20 11. Transfusão sanguínea perioperatória ......................................................................................... 121 Juliano Pinheiro de Almeida | Ludhmila Abrahão Hajjar 12. Distúrbios intraoperatórios da coagulação ................................................................................ 129 Francisco Ricardo Marques Lobo | Adriana Érica Yamamoto Rabelo Lívia Pereira Miranda Prado 13. Ventilação protetora no intraoperatório .................................................................................... 143 Marcos Adriano Lessa | Rafael Augusto Souza Rangel 14. Monitoração e reversão do bloqueio neuromuscular: implicações perioperatórias .......................................................................................................... 154 Caio Marcio Barros de Oliveira | Ed Carlos Rey Moura Plínio da Cunha Leal | Julio C. Mendes Brandão 15. Hipotermia acidental: implicações nos desfechos ................................................................... 171 Julio C. Mendes Brandão | Plínio da Cunha Leal | César de Araujo Miranda Parte III – PÓS-OPERATÓRIO 16. Avaliação e recuperação pós-anestésica: como otimizar? ...................................................... 184 Airton Bagatini 17. Fisioterapia no perioperatório ...................................................................................................... 194 Bruna Müller Leão | Patrícia Schimanoski | Florentino Fernandes Mendes 18. Realimentação precoce e prevenção do íleo adinâmico ........................................................ 202 Gastão F. Duval Neto 19. Analgesia pós-operatória: o papel dos analgésicos adjuvantes .......................................... 213 Plínio da Cunha Leal | Ed Carlos Rey Moura | Caio Marcio Barros de Oliveira Julio C. Mendes Brandão | César de Araujo Miranda 20. Delirium no pós-operatório ........................................................................................................... 221 Rogean Rodrigues Nunes | Iana de Almeida Siqueira Jennifer de Melo Rocha | Sara Lucia Ferreira Cavalcante Índice ........................................................................................................................................................... 237 x | SUMÁRiO Brandao_Iniciais_Impresso.indd 10 02/07/2019 17:09:20 1 DADOS EPIDEMIOLÓGICOS No Reino Unido, cerca de 3 milhões de procedimentos cirúrgicos são realizados a cada ano, com a mortalidade cirúrgica dentro de 30 dias sendo estimada entre 0,7 e 1,7%.1 No entanto, um pequeno grupo de pacientes, cor- respondendo a apenas 12,5% dos procedimentos cirúrgi- cos, representa mais de 80% dessas mortes.2-4 A morbidade e a mortalidade perioperatórias são ele- vadas nesse subgrupo de pacientes considerados de alto risco,3 e o reconhecimento precoce de tais pacien- tes possibilita programar a melhor estratégia anestésico- -cirúrgica e otimização pré-operatória, bem como a ges- tão intra e pós-operatórias, podendo assim melhorar os resultados.5,6 A mortalidade pós-operatória em curto prazo (em até 30 dias) para esse grupo de alto risco é estimada em 6% para pacientes eletivos e próxima de 30% nos casos de cirurgia de urgência ou emergência.3 Concentrar- -se apenas na mortalidade subestima substancialmente a magnitude da cirurgia na população de alto risco. Isso torna muitas avaliações de risco pré-operatório associa- das à mortalidade/morbidade, incluindo a da American Society of Anesthesiologists (ASA)7 e o Physiological and Operative Severity Score for the enUmeration of Mortality and Morbidity (POSSUM),8 limitadas, subjetivas e sem sensibilidade/especificidade para a identificação pre- cisa de pacientes individuais em risco de complicações pós-operatórias. Tem havido considerável interesse nas formas de se identificar esses pacientes, bem como nas estratégias para reduzir sua mortalidade desproporcionalmente alta. A estratificação de risco no perioperatório é complexa e depende de interações entre fatores cirúrgicos, anestési- cos e fatores específicos do paciente.9,10 A cirurgia de alto risco relaciona-se a extensão, inva- sividade ou complexidade do procedimento (Quadro 1.1).11 Esses fatores estão associados a aumento na res- posta ao estresse devido ao trauma cirúrgico, aumento na demanda de oxigênio e aumento na taxa de compli- cações e morte.12 A história, o exame físico e o eletrocardiograma (EGC) de 12 derivações identificam fatores de risco específicos do paciente. Essa informação, combinada com o risco associado à cirurgia, é usada para estimar o risco perio- peratório de eventos cardíacos adversos que são os de IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO VERA LÚCIA FERNANDES DE AZEVEDO LIANA MARIA TÔRRES DE ARAÚJO AZI DANIELLE MAIA HOLANDA DUMARESQ Quadro 1.1 – Risco cirúrgico estimado relacionado à cirurgia ALTO RISCO (RISCO CARDÍACO > 5%) RISCO INTERMEDIÁRIO (RISCO CARDÍACO ENTRE 1 E 5%) BAIXO RISCO (RISCO CARDÍACO < 1%) • Aorta aberta • Vascular maior • Vascular periférica • Cirurgia de cavidade de • urgência • Abdominal eletiva • Carótida • Aneurisma endovascular • Cabeça e pescoço • Neurocirurgia maior • Artroplastia • Pulmonar eletiva • Urológica maior • Mama • Odontológica • Tireoide • Oftálmica • Ginecológica • Reconstrutiva • Ortopédica menor • Urológica menor Fonte: Stefani e colaboradores.10 PARTE I PRÉ-OPERATÓRIO Brandao_Cap_1.indd 1 27/06/2019 14:42:06 maior ocorrência neste período. A importância da insufi- ciência nutricional e renal como fatores de risco pré-ope- ratórios também deve ser considerada na caracterização do paciente de alto risco.13 Além da morbidade cardíaca preexistente, estudos em subespecialidades cirúrgicas específicas identificaram vários fatores de risco pré-operatórios ligados ao desfe- cho, e a grande maioria concentrou-se de forma predomi- nante na mortalidade hospitalar. A concentraçãosérica de albumina é um forte preditor de resultados,14,15 enquanto a insuficiência renal está recorrentemente associada à mor- talidade cardiovascular perioperatória, em especial em pacientes cirúrgicos vasculares, embora associações com outras morbidades sejam pouco exploradas.16-18 Anemia leve pré-operatória ou policitemia estão associadas a um aumento do risco de mortalidade no pós-operatório em 30 dias e eventos cardíacos em pacientes idosos e em homens submetidos a cirurgia não cardíaca.19,20 Comple- xidade cirúrgica21,22 e idosos extremos23-27 também estão associados a desfechos mais desfavoráveis. IDENTIFICANDO O PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Pacientes que possuem limitadas reservas orgânicas são pacientes considerados de “alto risco cirúrgico” e estão relacionados à maior morbimortalidade pós-operatória. A identificação precoce desses pacientes permite não apenas uma otimização melhor no pré-operatório, mas também uma programação adequada para o período pós-operatório.28 A reserva cardiopulmonar deficiente limita a capa- cidade do paciente de responder ao insulto estressante provocado pelo procedimento anestésico-cirúrgico, sendo incapaz de compensar essa demanda aumentada de oxigênio.29 Uma série de escores e classificações pode ser uti- lizada no perioperatório para identificar e classificar os pacientes de maior risco.30 O foco deste capítulo é a identificação pré-operatória dos pacientes (Quadro 1.2). A utilização de um protocolo hemodinâmico para manter a perfusão tecidual diminuiu a mortalidade e a falência de órgãos no pós-operatório, e a monitoração do débito cardíaco para cálculo do transporte e consumo de oxigênio ajudou a orientar a terapia.28 Inicialmente proposto por Shoemaker e colaboradores, os critérios considerados para definir paciente de alto risco envol- viam características intrínsecas ao paciente e ao perfil da cirurgia a ser realizada (Quadro 1.3).31 Identificar esses indivíduos precocemente por meio da estratificação do risco perioperatório é um desafio cons- tante, pois a maioria dos métodos de estratificação foi projetada para prever um determinado tipo de evento, sobretudo morte ou complicações específicas. A precisão de uma ferramenta de estratificação de risco não é neces- sariamente transferível entre diferentes eventos pós-ope- ratórios. A identificação do paciente de alto risco tem implicações no manejo durante todo o período periope- ratório. Definir paciente de alto risco pode ser subjetivo, e vários testes de triagem e escores são utilizados. Foi sugerido que um paciente com risco de mortalidade indi- vidual maior que 5% ou submetido a um procedimento com mortalidade de 5% seja definido como um paciente Quadro 1.2 – Quadro atual de estratificação de risco perioperatório PRÉ-OPERATÓRIOS INTRAOPERATÓRIOS PÓS-OPERATÓRIOS Índices dinâmicos Escore de risco ASA RCRI ACS-NSQIP POSSUM Escore cirúrgico de Apgar P-POSSUM Estado funcional DASI TECP Avaliação subjetiva – – Fragilidade CAF CFS mFI CSHA-FI – – Biomarcadores Tn/PN Hemodinâmica intraoperatória BIS baixo Tn/PN Índices estáticos Sistema inteligente perioperatório com feedback em tempo real ACS-NSQIP, calculadora de risco do Programa Nacional de Melhoria de Qualidade Cirúrgica do American College of Surgeons; ASA, índice de estado físico da American Society of Anesthesiologists; BIS, índice biespectral; CAF, avaliação abrangente da fragilidade; CFS, escala de fra- gilidade; CSHA-FI, Rockwood – Índice de Fragilidade do Estudo Canadense de Saúde e Envelhecimento; DASI, índice do estado de atividade de Duke; mFI, índice de Fragilidade modificado; PN, peptídeo natriurético; POSSUM/P-POSSUM, Portsmouth Physiological and Operative Severity Score for the enUmeration of Mortality and Morbidity; RCRI, índice de risco cardíaco modificado; TECP, teste de exercício cardiopulmo- nar; Tn, troponina. Fonte: Sankar, Beattie e Wijeysundera.30 2 | IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Brandao_Cap_1.indd 2 27/06/2019 14:42:07 cirúrgico de alto risco.32 Em termos de risco global, crité- rios clínicos relativamente simples podem ser usados para identificar um paciente de alto risco (Quadro 1.4). Outros critérios que também podem ser utilizados na identificação do paciente de alto risco são os esco- res POSSUM e P-POSSUM (Portsmouth Physiologic and Operative Severity Score enUmeration of Mortality and Morbity) (Quadro 1.5).34 Entre os vários sistemas de pontuação pré-operató- ria desenvolvidos para estimar os riscos de mortalidade ou complicações após a cirurgia, um índice comumente usado é a classificação do estado físico da American Quadro 1.3 – Critérios de Shoemaker para definição de paciente de alto risco cirúrgico 1. Doenças cardiorrespiratórias graves prévias (infarto agudo do miocárdio, doença pulmonar obstrutiva crônica, acidente vascular cerebral) 2. Cirurgia ablativa extensa planejada para carcinoma, por exemplo, esofagectomia e gastrectomia total, cirurgia prolongada (> 8 h) 3. Traumatismo múltiplo grave, por exemplo, > 3 órgãos ou > 2 sistemas, ou abertura de 2 cavidades corporais 4. Perda de sangue aguda maciça, volume sanguíneo < 1,5 L/ m2, hematócrito < 20% 5. Idade > 70 anos e evidência de reserva fisiológica limitada de ≥ 1 órgão vital 6. Choque, pressão arterial média < 60 mmHg, pressão venosa central < 15 cmH2O e débito urinário < 20 mL/h 7. Evento abdominal agudo com instabilidade hemodinâmica, por exemplo, pancreatite, intestino gangrenoso, peritonite, vesícula perfurada, sangramento gastrintestinal 8. Doença vascular tardia envolvendo aorta Fonte: Shoemaker e colaboradores.31 Quadro 1.4 – Critérios clínicos para pacientes cirúrgicos de alto risco 1. Doença cardíaca ou respiratória grave, resultando em limitação funcional grave 2. Cirurgia extensa planejada para carcinoma envolvendo anastomose intestinal 3. Perda de sangue maciça aguda (> 2,5 L) 4. Paciente com mais de 70 anos de idade com limitação funcional moderada de um ou mais sistemas de órgãos 5. Sepse (hemocultura positiva ou foco séptico) 6. Insuficiência respiratória (PaO2 < 8 kPa na FiO2 > 0,4, ou seja, relação PaO2:FiO2 < 20 kPa ou ventilação mecânica > 48 h) 7. Catástrofe abdominal aguda (p. ex., pancreatite, vísceras perfuradas, sangramento gastrintestinal) 8. Insuficiência renal aguda (ureia > 20 mmol/L, creatinina > 260 µmol/L) 9. Cirurgia para aneurisma da aorta abdominal FiO2, fração inspirada de oxigênio; PaO2, pressão parcial arterial de oxigênio. Fonte: Pearse e colaboradores.33 Quadro 1.5 – Parâmetros fisiológicos incluídos na fórmula do cálculo do risco cirúrgico dos modelos POSSUM e P-POSSUM PARÂMETROS FISIOLÓGICOS 1 2 4 8 Idade (anos) < 61 61-70 > 70 – Sinais cardíacos Normal • Diuréticos • Digoxina • Angina • Hipertensão • Edema periférico • Cardiomegalia borderline • Varfarina • ↑ PVC • Cardiomegalia Sinais respiratórios Normal • Dispneia ao exercício • DPOC leve • Dispneia ao subir escadas • DPOC moderada • DPOC grave • Consolidação à radiografia • Fibrose ECG Normal – FA (60-90 bpm) Outras alterações PAS (mmHg) 110-130 131-170; 100-109 > 170; 90-99 < 90 FC (bpm) 50-80 81-100; 40-49 101-120 > 120; < 40 Escala de coma de Glasgow 15 12-14 9-11 < 9 Hb (g/dL) 13-16 11,5-12,9; 16,1-17 10-11,4; 17,1-18 < 10; > 18 Leucócitos x 1012/L 4-10 10,1-20; 3,1-3,9 > 20; < 3 – Ureia (mmol/L) < 7,5 7,6-10 10,1-15 > 15 Na (mEq/L) > 136 131-135 126-130 < 126 K (mEq/L) 3,5-5 3,2-3,4; 5,1-5,3 2,9-3,1; 5,4-5,9 < 2,9; > 5,9 (Continua) MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA | 3 Brandao_Cap_1.indd 3 27/06/2019 14:42:07 Society of Anesthesiologists (ASA-PS), que atribui uma pontuação de I a VI com base no estado geral de saúde de um paciente com um modificador baseado na natu- reza da emergência das cirurgias (Quadro 1.6).35 A atribuição de classe é independente do procedi- mento cirúrgico e se baseia unicamente na avaliação subjetiva do estado geral do paciente. Apesar desuas limitações, o ASA-PS tem demonstrado associações independentes com morbidade, mortalidade,36,37 reinter- nações38 e reabordagens no pós-operatório.39 A classificação ASA-PS na predição da mortali- dade pós-operatória, no entanto, não é tão fidedigna em pacientes de alto risco, nos quais o risco cirúrgico provavelmente predomina, sendo que a adição de um Quadro 1.6 – Classificação do estado físico segundo a ASA CLASSIFICAÇÃO DEFINIÇÃO EXEMPLOS INCLUEM, MAS NÃO SE LIMITAM A: ASA I Paciente normal Saudável, não fumante, sem ingestão de álcool ASA II Paciente com doença sistêmica leve Doenças leves, sem limitações funcionais expressivas. Exemplos incluem (mas não se limitam a) DM e HAS bem controlados, doença pulmonar leve, tabagista, etilista social, obesidade (IMC 30-40), gravidez ASA III Paciente com doença sistêmica grave Limitações funcionais significativas, uma ou mais doenças moderadas a graves. Exemplos incluem (mas não se limitam a) HAS ou DM descompensados, DPOC, obesidade mórbida (IMC > 40), hepatite ativa, dependência ou abuso de álcool, marcapasso implantado, redução moderada da fração de ejeção, doença renal em estágio terminal em diálise regular, prematuridade somada à idade gestacional < 60 semanas, história de IAM (> 3 meses), AVC, AIT, DAC com colocação de stent ASA IV Paciente com doença sistêmica grave que se constitui em ameaça constante à vida Exemplos incluem (mas não se limitam a) IAM recente < 3 meses, AIT, AVC, DAC/stent, isquemia cardíaca em curso ou disfunção valvar grave, redução grave da fração de ejeção, sepse, coagulação intravascular disseminada, insuficiência respiratória aguda, doença renal aguda ou doença renal crônica terminal sem diálise regular ASA V Paciente moribundo sem expectativa de sobrevida sem a cirurgia Exemplos incluem (mas não se limitam a) ruptura de aneurisma de aorta abdominal/torácica, trauma grave, HIC com efeito de massa, isquemia mesentérica em vigência de doença cardíaca significativa ou disfunção de múltiplos órgãos/sistemas ASA VI Paciente com morte cerebral declarada, cujos órgãos estão sendo removidos para fins de doação Nota: A adição da letra “E” significa cirurgia de emergência. ASA, American Society of Anesthesiologists; AIT, acidente isquêmico transitório; AVC, acidente vascular cerebral; DAC, doença arterial corona- riana; DM, diabetes melito; DPOC, doença pulmonar obstrutiva crônica; HAS, hipertensão arterial sistêmica; HIC, hipertensão intracraniana; IAM, infarto agudo do miocárdio; IMC, índice de massa corporal. Fonte: Saklad.35 Quadro 1.5 – Parâmetros fisiológicos incluídos na fórmula do cálculo do risco cirúrgico dos modelos POSSUM e P-POSSUM (Continuação) PARÂMETROS OPERATÓRIOS 1 2 4 8 Gravidade cirúrgica Menor Moderada Maior Maior + Número de procedimentos nos nos últimos 30 dias 1 2 > 2 – Perda sanguínea (mL) < 100 101-500 501-999 ≥ 1.000 Contaminação peritoneal Ausente Ligeira, serosa Conteúdo purulento localizado Peritonite fecal, purulenta ou hemoperitônio Malignidade Ausente Neoplasia primária Metástase ganglionar Metástase a distância Caráter da cirurgia Eletiva – Urgente < 24 h Emergência DPOC, doença pulmonar obstrutiva crônica; ECG, eletrocardiograma; FA, fibrilação atrial; FC, frequência cardíaca; Hb, hemoglobina; K, potássio; Na, sódio; PAS, pressão arterial sistólica; PVC, pressão venosa central. Fonte: Prytherch e colaboradores.34 4 | IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Brandao_Cap_1.indd 4 27/06/2019 14:42:07 modificador de risco cirúrgico tem sido sugerida para melhorar sua utilidade nesses cenários.40 Apesar de sua simplicidade, o esquema de classificação ASA-PS tem desempenho moderadamente bom em predizer morte40,41 e algumas complicações após a cirurgia.7,42-44 O esquema de classificação também tem limitações. Especificamente, apresenta moderada confiabilidade entre avaliadores,44 na melhor das hipóteses não incorpora ris- cos específicos de cirurgia e tem precisão diminuída em contextos com altas taxas de mortalidade geral.7 Mais recentemente, as calculadoras de risco on-line facilitaram a implementação de ferramentas de previsão de risco mais complexas na prática clínica, minimizando a necessidade de cálculos complicados adicionais à beira do leito. O principal exemplo desse grupo emergente de índices é a calculadora de risco do American College of Surgeons (ACS) (http://riskcalculator.facs.org).6 A calculadora de risco universal ACS-NSQIP6 consiste em 21 variáveis específicas do paciente, incluindo ASA- -PS, capacidade funcional, e mais de 1.500 processos e códigos de terminologia (CPT) que permitem chegar a uma estimativa de risco pós-operatório de procedimentos específicos. A inclusão de códigos CPT dentro do modelo de avaliação permite detalhes específicos do procedi- mento modificadores da estimativa de risco, facilitando a tomada de decisões informada durante a fase pré-opera- tória. Essa calculadora serve não somente para avaliação de risco pós-operatório, mas também para outros desfe- chos como taxas de readmissão e alta não domiciliar.45 Ela implementa uma série de modelos de previsão clí- nica desenvolvidos usando o registro do National Surgi- cal Quality Improvement Program (NSQIP). Esses mode- los têm precisão de moderada a boa na previsão de uma série de eventos pós-operatórios, como morte, complica- ções cardíacas, pneumonia e lesão renal aguda.6 As calcu- ladoras de risco NSQIP também possuem limitações. CARACTERIZAÇÃO ESPECÍFICA DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO SÍNDROME DA FRAGILIDADE A fragilidade é definida como um estado clinicamente reconhecível de vulnerabilidade decorrente do declí- nio da reserva fisiológica associado à idade. A avaliação da fragilidade pode complementar a avaliação de risco perioperatório englobando domínios funcionais que não são mensuráveis pelas tradicionais ferramentas de ava- liação de risco.46 Embora não haja um valor etário defi- nido para caracterização, a fragilidade está sendo cada vez mais reconhecida como indicador prognóstico de resultados pós-operatórios e destino da alta.47-52 O valor prognóstico adicionado por avaliação da fra- gilidade pode não apenas levar a uma tomada de deci- são compartilhada entre pacientes, familiares, mem- bros e equipes médicas, mas também pode limitar intervenções fúteis.53 As escalas comuns de fragilidade usadas no cenário perioperatório incluem fenótipo de fragilidade, Rockwood – Índice de Fragilidade do Estudo Canadense de Saúde e Envelhecimento (CSHA-FI, do inglês Rockwood – Canadian Study of Health and Aging – Frailty Index), Avaliação Abrangente da Fragilidade (CAF, do inglês Comprehensive Assessment of Frailt), Escala Clínica de Fragilidade (CFS, do inglês Clinical Frailty Scale) e Índice de Fragilidade modificado (mFI, do inglês Modified Frailty Index). No momento, não há um padrão- -ouro para avaliação da fragilidade.46 Medidas pré-ope- ratórias e pós-operatórias para minimizar a fragilidade continuam a ser uma área de pesquisa ativa. PACIENTE DE ALTO RISCO CARDIOLÓGICO Eventos cardíacos no perioperatório são uma preocupa- ção séria para os 234 milhões de pessoas que realizam cirurgias não cardíacas importantes em todo o mundo a cada ano.54 Esses eventos, responsáveis por um terço dos óbitos perioperatórios,55 estão associados ao aumento da permanência hospitalar56 e à mortalidade em longo prazo.57 A estratificação de risco pré-operatório que usa informações clínicas prontamente disponíveis no pron- tuário médico é um componente importante de qual- quer estratégia para prevenir esses eventos. As diretrizes do American College of Cardiology (ACC) e da American Heart Association (AHA)58 enfatizam o uso de fatores de risco clínicos para avaliação cardíaca pré-operatória.5 As escalas de risco mais preconizadas pela III Dire- triz da Sociedade Brasileira de Cardiologia, de 2017, são o algoritmo do American College of Physicians (ACP) (Quadro 1.7),59 do ACC/AHA, a escaladesenvol- vida pelo Estudo Multicêntrico de Avaliação Periopera- tória (EMAPO) (Quadro 1.8) e o índice cardíaco revisado de Lee. Todos esses algoritmos têm vantagens e des- vantagens que devem ser consideradas durante a sua utilização.60 Embora antigos, outros algoritmos ainda utilizados são os de Goldman e colaboradores61 (Quadro 1.9) e o de Detsky e colaboradores (Quadro 1.10).62 Ao avaliar o risco cardíaco pré-operatório, também pode ser usado o índice de risco cardíaco revisado (RCRI, do inglês revised cardiac risk index), também referido como índice de Lee (Quadro 1.11).63 O RCRI é mais simples e tem sido amplamente utili- zado e validado nos últimos 15 anos. Ele foi projetado para prever as principais complicações cardíacas após cirur- gia não cardíaca. Essa ferramenta já foi revisada diversas vezes e continua sendo bastante usada.63 Embora discri- mine moderadamente bem entre pacientes com riscos variados para complicações cardíacas, ela tem um desem- penho ruim na previsão da mortalidade pós-operatória.64 O RCRI foi projetado para prever eventos cardio- vasculares adversos maiores (MACE, do inglês major adverse cardiac events) após cirurgias não cardíacas.63 É uma revisão do índice proposto por Goldman e colabo- radores em 1977.61 Nele, os pacientes são divididos em MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA | 5 Brandao_Cap_1.indd 5 27/06/2019 14:42:07 Quadro 1.7 – Avaliação pelo algoritmo do American College of Physicians (ACP) IAM há menos e 6 meses 10 pontos IAM há mais de 6 meses 5 pontos Angina classe III 10 pontos Angina classe IV 20 pontos EAP na última semana 10 pontos EAP alguma vez na vida 5 pontos Suspeita de estenose aórtica grave 20 pontos Ritmo não sinusal ou RS com ESSV no ECG 5 pontos > 5 ESV no ECG 5 pontos PaO2 < 60 mmHg, PaCO2 > 50 mmHg, K+ < 3 mEq/L, U > 107 mg/dL, Cr > 3,0 mg/dL ou restrito ao leito 5 pontos Idade > 70 anos 5 pontos CLASSES DE RISCO Se > 20 pontos: alto risco (> 15%) Entre 0 e 15 pontos: avaliar número de variáveis de Eagle e Vanzetto para discriminar os riscos baixo e intermediário Variáveis de Eagle e Vanzetto: • Idade > 70 anos • História de angina • Diabetes melito • Ondas Q no ECG • História de insuficiência cardíaca • História de IAM • Alterações isquêmicas do segmento ST • HAS com HVE importante Se no máximo 1 variável: baixo risco (< 3%) Se > 2 variáveis: risco intermediário (3-15%) Cr, creatinina; EAP, edema agudo de pulmão; ECG, eletrocardio- grama; ESSV, extrassístole supraventricular; ESV, extrassístole ventri- cular; HAS, hipertensão arterial sistêmica; HVE, hipertrofia ventricular; IAM, infarto agudo do miocárdio; K+, potássio; PaO2, pressão parcial arterial de oxigênio; PaCO2, pressão parcial arterial de dióxido de car- bono; RS, ritmo sinusal; U, ureia. Fonte: Smetana, Lawrence e Cornell.59 Quadro 1.8 – Escore EMAPO HAS + hipertrofia ventricular + alteração de ST 4 pontos AVC isquêmico há menos de 3 meses 4 pontos DM com nefropatia/cardiopatia ou uso de insulina 4 pontos DAC com teste ergométrico negativo (< 3 meses) 4 pontos Cirurgia intraperitoneal, da aorta e de seus ramos, intratorácica ou ortopédica 4 pontos Presença de aneurisma aórtico assintomático, cirurgia não sugerida 4 pontos > 70 anos 5 pontos IAM há mais de 6 meses 5 pontos Edema agudo de pulmão secundário à insuficiência cardíaca congestiva (> 1 semana) 5 pontos Quadro 1.8 – Escore EMAPO (Continuação) Fibrilação atrial crônica, taquiarritmias atriais paroxísticas e taquicardia ventricular não sustentada documentada 5 pontos K < 3,0 mEq/L ou HCO3– < 20 mEq/L ou pO2 < 60 torr ou pCO2 > 50 torr ou U > 50 mg/dL ou Cr > 2,3 mg/dL ou AST elevada ou doença hepática ativa 5 pontos IAM há menos de 6 meses e não na fase aguda e angina pectoris atualmente estáveis 10 pontos Angina instável com episódio de peito há menos de 3 meses, mas atualmente ausentes 10 pontos EAP secundário à ICC (< 1 semana) 10 pontos Taquiarritmias supraventriculares sustentadas com resposta ventricular elevada 10 pontos História documentada de arritmia ventricular sustentada repetitiva/de fibrilação ventricular/de episódio de morte súbita abortada (> 3 meses)/ portador de desfibrilador implantável automático 10 pontos Classificação da Canadian Cardiovascular Society: angina – classe III 10 pontos Cirurgia de emergência 10 pontos Cirurgia de transplante. Receptores de órgãos vitais: fígado e rins 10 pontos Estenose mitral grave 10 pontos Classificação da Canadian Cardiovascular Society: angina – classe IV 20 pontos Estenose aórtica grave 20 pontos ICC classe IV 20 pontos IAM (fase aguda) 20 pontos Episódio recente de fibrilação ventricular ou morte súbita abortada com desfibrilador automático implantável 20 pontos Cirurgia de transplante. Destinatário de órgão vital: pulmão 20 pontos CLASSIFICAÇÃO DE RISCO (%) PARA ÓBITO* E/OU EVENTOS CARDÍACOS** Muito baixo 0 ponto (< 1%) Baixo 1-5 pontos (< 3%) Moderado 6-10 pontos (< 7%) Elevado 11-15 pontos (7-13%) Muito elevado > 15 pontos (> 13%) *Óbito ocorrido no período antecedente à alta hospitalar pós- -operatória. **Eventos cardíacos incluem eventos isquêmicos (angina instável e infarto do miocárdio), eventos embólicos e arritmias cardíacas. Cr, creatinina; HAS, hipertensão arterial sistêmica; AVC, acidente vascular cerebral; DM, diabetes melito; DAC, doença arterial coro- nariana; K, potássio; HCO3–, bicarbonato; pO2, pressão de oxigênio; pCO2, pressão de dióxido de carbono; AST, aspartato aminotrans- ferase; IAM, infarto agudo do miocárdio; EAP, edema agudo de pul- mão; ICC, insuficiência cardíaca congestiva; U, ureia. Fonte: Gualandro e colaboradores.60 (Continua) 6 | IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Brandao_Cap_1.indd 6 27/06/2019 14:42:07 4 classes de risco, compostas a partir de 6 predito- res independentes: 1) cirurgia de alto risco; 2) his- tória de doença cardíaca isquêmica; 3) insuficiência cardíaca congestiva; 4) doença cerebrovascular; 5) trata- mento pré-operatório com insulina; e 6) creatinina sérica (Continua) Quadro 1.9 – Índice de Goldman e colaboradores VARIÁVEIS PONTUAÇÃO Idade > 70 anos 5 Infarto do miocárdio há menos de 6 meses 10 Presença de 3ª bulha ou estase jugular 11 Estenose aórtica grave 3 Ritmo diferente do sinusal ou extrassístoles supraventriculares no ECG pré-operatório 7 Mais de 5 extrassístoles ventriculares documentadas em qualquer ECG, qualquer período 7 PaO2 < 60 ou PaCO2 > 50 mmHg; K < 3 ou HCO3– < 20 mEq/L; U > 50 ou Cr > 3 mg/dL; transaminases anormais; sinais de doença crônica hepática ou paciente acamado 3 Cirurgia intratorácica, intraperitoneal ou envolvendo a aorta 3 Cirurgia de emergência 4 CLASSE COMPLICAÇÕES NÃO FATAIS (%) COMPLICAÇÕES FATAIS (%) Classe I (0-5 pontos): baixo risco 0,7 0,2 Classe II (6-12 pontos): risco intermediário 5 2 Classe III (13-25 pontos): risco alto 11 2 Classe IV (> 26 pontos): risco alto 22 56 Cr, creatinina; ECG, eletrocardiograma; K, potássio; HCO3, bicarbo- nato; PaCO2, pressão parcial arterial de dióxido de carbono; PaO2, pressão parcial arterial de oxigênio; U, ureia. Fonte: Gualandro e colaboradores.60 Quadro 1.10 – Índice de Detsky VARIÁVEIS PONTUAÇÃO Idade > 70 anos 5 pontos IAM há menos de 6 meses 10 pontos IAM há mais de 6 meses 5 pontos Suspeita de estenose aórtica grave 20 pontos Arritmia não sinusal ou sinusal com contração atrial prematura em último ECG pré-operatório 5 pontos > 5 ESV/min em qualquer momento antes da cirurgia 5 pontos Quadro 1.11 – Avaliação do risco cardíaco pré-operatório pelo algoritmo de Lee VARIÁVEIS PONTUAÇÃO Cirurgia intraperitoneal, intratorácica ou vascular suprainguinal Sim = 1 ponto História de DAC (ondas Q, sintomas de isquemia, teste positivo para isquemia, uso de nitrato) Sim = 1 ponto História de ICC (clínica, radiografia de tórax com congestão) Sim = 1 ponto História de doença cerebrovascularSim = 1 ponto Diabetes melito com insulinoterapia Sim = 1 ponto Creatinina pré-operatória > 2,0 mg/dL Sim = 1 ponto CLASSES DE RISCO CLASSE VARIÁVEIS RISCO I Nenhuma 0,4% II 1 0,9% III 2 7% IV 3 ou mais 11% DAC, doença arterial coronariana; ICC, insuficiência cardíaca congestiva. Fonte: Goldman e colaboradores.61 Quadro 1.10 – Índice de Detsky (Continuação) VARIÁVEIS PONTUAÇÃO Mau estado clínico geral* 5 pontos Angina classe III 10 pontos Angina classe IV 20 pontos Angina instável nos últimos 6 meses 10 pontos EAP há menos de 1 semana 10 pontos EAP prévio 5 pontos Cirurgia de emergência 10 pontos CLASSIFICAÇÃO DE RISCO PONTUAÇÃO RISCO RELATIVO I 0-15 pontos 0,43 II 20-30 pontos 3,38 III > 30 pontos 10,6 *PaO2 < 60 mmHg ou PaCO2 > 50 mmHg; K+ < 3 mEq/L ou HCO3– < 20 mEq/L; BUN > 50 mg/dL (U > 107,5 mg/dL) ou Cr > 3 mg/dL; AST anormal, paciente acamado por causa não cardíaca. ECG, eletrocardiograma; EAP, edema agudo de pulmão; ESV, extrassístoles ventriculares; IAM, infarto agudo do miocárdio. Fonte: Goldman e colaboradores.61 MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA | 7 Brandao_Cap_1.indd 7 27/06/2019 14:42:07 pré-operatória acima de 2 mg/dL. As classes I, II, III e IV são divididas a partir do somatório dessas variáveis apresenta- das pelo paciente, totalizando 0, 1, 2 ou ≥ 3, respectivamente. O estudo que validou esse escore demonstrou que ele é um índice simples, de fácil aplicação e com boa capacidade para predizer risco de complicações cardíacas em cirurgias não cardíacas eletivas e de grande porte.63 Embora o RCRI discrimine moderadamente bem entre pacientes com alto e baixo risco de MACE após cirurgias não cardíacas, apre- senta baixo desempenho ao predizer eventos cardíacos após cirurgias vasculares ou mortalidade por todas as cau- sas após cirurgias não cardíacas.64 Isso acontece porque o RCRI se limita a prever MACE, o que dificulta estimativas precisas de morbidade e mortalidade perioperatória. Essas ferramentas ou diretrizes devem considerar a precisão do prognóstico, a simplicidade, a facilidade de acesso e o custo ao selecionar uma abordagem especí- fica para a estratificação de risco, especialmente no caso de biomarcadores e testes especializados. O momento da avaliação é muito importante, uma vez que as infor- mações referentes ao risco perioperatório precisam estar disponíveis com antecedência suficiente para influenciar a tomada de decisão clínica.60 Existem muitas investigações para doenças cardía- cas e respiratórias, como a ecocardiografia sob estresse, mas, apesar da possibilidade de identificação de isque- mia miocárdica, a maioria é ruim como teste de triagem pré-operatória única com baixo valor preditivo positivo para eventos pós-operatórios.9 Para uma avaliação funcional do risco, as diretri- zes do ACC/AHA descrevem a estimativa dos equiva- lentes metabólicos (METs, do inglês metabolic equiva- lents) (Duke Activity Status Index [DASI])65 (Quadro 1.12). Essa avaliação da capacidade funcional ou capacidade de exercício é um fator determinante para a recomenda- ção de testes cardíacos pré-operatórios especializados.66 O estado ou capacidade funcional cardíaca, conforme determinado por médicos que avaliam pacientes com um conjunto de perguntas, tem sido considerado positi- vamente associado aos resultados pós-operatórios. Esta avaliação foi incluída em muitos modelos de risco.67 O estado funcional pode ser expresso em equivalen- tes metabólicos (1 MET é definido como 3,5 mL de cap- tação de O2/kg/min, que é o consumo de oxigênio em repouso na posição sentada). A capacidade de atingir 4 METs de atividade sem sintomas é considerada um bom indicador prognóstico, com 1 MET representando o con- sumo adulto de oxigênio em repouso (VO2) e 4 METs ou menos representando função cardiorrespiratória ruim e, portanto, alto risco. Para uma avaliação objetiva da função cardiopulmonar e subsequente estratificação de risco, o melhor método validado foi o teste de exercício cardiopul- monar (TECP) e a avaliação do limiar anaeróbico.67-70 Older e colaboradores mostraram que o TECP foi capaz de identificar o paciente cirúrgico de alto risco e per- mitiu a seleção adequada do tratamento pós-operatório (enfermaria, alta hospitalar ou unidade de terapia inten- siva). A identificação de um grupo de pacientes com limia- res anaeróbios < 11 mL/kg/min e a evidência de isquemia miocárdica levaram à pré-admissão em terapia intensiva e redução da mortalidade nesse grupo de 18 para 8,9%. Esse limiar e a presença de isquemia miocárdica induzí- vel foram preditivos de sobrevida pós-operatória; quase todos os pacientes que morreram no pós-operatório apre- sentaram limiares anaeróbios inferiores a 11 mL/kg/min.9 ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO PRÉ-OPERATÓRIO PARA EVENTOS MIOCÁRDICOS Existem diferentes maneiras de investigar a função car- díaca e a perfusão coronariana em pacientes cardio- patas. A maior parte dos métodos estratifica o risco para pacientes cirúrgicos submetidos à cirurgia não car- díaca.71,72 No entanto, há poucos trabalhos analisando se o desfecho é melhorado pelo conhecimento do risco.73,74 Entre os índices mais utilizados, alguns merecem destaque. O de Goldman e colaboradores foi publicado há mais de 40 anos61 e, apesar de ser um método bas- tante prático e com boa fidedignidade para eventos car- díacos intraoperatórios, com razão de chances de 0,642 (IC 95%, 0,588 a 0,695), não tem boa correlação com a mortalidade.75 O escore desenvolvido por Detsky e cola- boradores62 é um pouco mais recente e também um bom preditor de eventos cardíacos, com razão de chan- ces de 0,601 (IC 95%, 0,544 a 0,657). A ecocardiografia e a ecocardiografia sob estresse também podem ser usadas para estratificar o risco de Quadro 1.12 – Capacidade funcional CONSUMO DE OXIGÊNIO EM METS TIPOS DE ATIVIDADES 1 MET Comer, vestir-se, usar o banheiro Caminhar dentro de casa Pouca atividade Caminhadas curtas (2 quarteirões) com velocidade de no máximo 4,8 km/h 4 METs Subir escadas Caminhar 6,4 km/h Correr pequenas distâncias Limpar assoalhos ou móveis Atividades recreativas: dançar, jogar tênis em dupla > 10 METs Participar de esportes extenuantes: natação, tênis individual, basquete, futebol O consumo de oxigênio (VO2) de um homem de 40 anos com 70 kg em repouso é de 3,5 mL/kg/min ou correspondente a 1 MET METs, equivalentes metabólicos. Fonte: Hlatky e colaboradores.65 8 | IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Brandao_Cap_1.indd 8 27/06/2019 14:42:07 pacientes cirúrgicos. No entanto, quando se somou o resultado das informações ecocardiográficas a mode- los preditivos já estabelecidos, não houve mudança de sensibilidade ou especificidade de maneira relevante.76 Contudo, eventos cardíacos pós-operatórios podem ser preditos por ecocardiograma sob estresse com dobuta- mina que resulta em hipotensão,77 isquemia78 ou anor- malidades de movimentação da parede ventricular.79 A ecocardiografia com dipiridamol também tem sido usada com bons resultados preditivos.80 Mesmo a eco- cardiografia sem estresse farmacológico pode ser um teste de rastreamento útil no intraoperatório para for- necer informações atualizadas sobre o desempenho cardíaco.81 O teste de esforço também pode ser útil na estratifi- cação de risco. A depressão do segmento ST de 0,1 mV ou mais no ECG de esforço teve razão de chances de 5,2 (IC 95%, 1,5 a 18,5; p = 0,01) de predizer um infarto do miocárdio ou lesão no miocárdio pós-operatório em pacientes de cirurgia não cardíaca.82 Uma combinação de variáveis clínicas e eletrocardio- grafia de exercício melhorou a estratificação de risco pré- -operatória. Outros fatores como comorbidade e fatores intraoperatórios influenciam o resultado, porém nenhum sistema de avaliação pré-operatória parece ser ainda completamente preciso.83,84 As diretrizes do ACC/AHA têm recomendado ampla- mente a estratificação do risco clínico com o RCRI,63 um índice preditivo multivariado para asprincipais compli- cações cardíacas perioperatórias. O RCRI foi derivado de uma coorte prospectiva unicêntrica de 2.893 pacien- tes com 50 anos ou mais que realizaram cirurgias não cardíacas eletivas. Consiste em 6 componentes igual- mente ponderados: 1) doença arterial coronariana; 2) insuficiência cardíaca; 3) doença cerebrovascular; 4) diabetes melito que requer insulina; 5) insuficiên- cia renal (concentração de creatinina > 176,8 mmol/L [> 2 mg/dL]); e 6) cirurgias consideradas de alto risco (procedimentos vasculares suprainguinais, intratoráci- cos ou intraperitoneais). Esse esquema simplificado de pontuação tem sido amplamente adotado porque é mais fácil de usar do que os índices antes descritos.61,62 O RCRI parece discriminar bem entre os pacientes de alto risco versus baixo risco para eventos cardíacos perioperatórios (área sob a curva característica opera- tória do receptor [AUC] para predizer complicações car- díacas maiores em uma coorte de validação na descri- ção original, 0,80 [IC 95%, 0,74 a 0,86]).63 Uma revisão sistemática utilizando o RCRI para previsão de compli- cações cardíacas perioperatórias concluiu que ele apre- senta moderado nível na discriminação entre pacientes de baixo risco versus alto risco de eventos cardíacos após cirurgia não cardíaca. Ele não se saiu tão bem quando usado para prever eventos cardíacos após cirurgia vascu- lar não cardíaca ou para prever mortalidade por todas as causas após cirurgia não cardíaca. Dentro desse grupo de pacientes de alto risco para eventos cardiológicos no perioperatório, há um sub- grupo de pacientes com risco muito alto: pacientes com infarto do miocárdio (60 dias) ou angina instável, insufi- ciência cardíaca descompensada, arritmias de alto grau ou doença cardíaca valvar importante hemodinamica- mente (estenose aórtica em particular) apresentam um risco muito alto de infarto do miocárdio perioperatório, fibrilação ventricular ou parada cardíaca primária, blo- queio cardíaco completo e morte. Todos esses pacientes devem ser tratados de forma ideal, com possível encami- nhamento a um cardiologista para posterior avaliação e tratamento.85 A indicação para o uso generalizado e indiscrimi- nado de qualquer índice preditivo requer que ele per- maneça preciso usando diferentes conjuntos de dados e em diferentes locais e intervalos geográficos,86 o que infelizmente ainda não é o caso de nenhum dos índices recém-descritos. Após a avaliação pelos diversos algoritmos, o paciente considerado de alto risco deverá ser conduzido conforme mostra a Figura 1.1.60 BIOMARCADORES PRÉ-OPERATÓRIOS Os biomarcadores são marcadores de disfunção orgâ- nica que podem ser mensuráveis e predizer indepen- dentemente complicações pós-operatórias ou aumen- tar a informação prognóstica dos índices de risco clínicos. Dois biomarcadores pré-operatórios, em parti- cular, foram extensivamente examinados para prever o risco perioperatório: as troponinas cardíacas e os peptí- deos natriuréticos, que incluem o peptídeo natriurético tipo B (BNP) e o N-terminal-pró-BNP (NT pró-BNP). Figura 1.1 – Algoritmo para condução do paciente de alto risco. Baixo risco • Lee: classes I e II • ACP: baixo risco • EMAPO: até 5 pontos Realizar cirugia diretamente Risco intermediário • Lee: classe III • ACP: risco intermediário EMAPO: 6-10 pontos Solicitação de prova funcional se: • Cirurgia vascular arterial • Cirurgia de risco intermediário e baixa capacidade funcional • Otimização terapêutica conforme natureza do risco (isquêmica, insuficiência cardíaca, valvopatia, arritmia) • Monitoração em unidade semi- -intensiva/intensiva com ECG e troponina até 72 h Alto risco • Lee: classe IV • ACP: alto risco • EMAPO: 11 pontos MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA | 9 Brandao_Cap_1.indd 9 27/06/2019 14:42:08 Os peptídeos natriuréticos são secretados pelo mio- cárdio na circulação em resposta à isquemia87 e disten- são das paredes atriais ou ventriculares.88 Eles são pode- rosos marcadores de risco cardiovascular em pacientes não cirúrgicos, incluindo indivíduos que estão em risco de doença arterial coronariana, portadores de doença arterial coronariana ou de insuficiência cardíaca.89 Várias revisões sistemáticas indicam que o BNP pré- -operatório e o NT pró-BNP são preditores independen- tes de complicações cardíacas (i.e., infarto do miocárdio não fatal e morte cardíaca) após cirurgia não cardíaca.90,91 Além disso, uma metanálise evidenciou que, quando analisado individualmente o BNP pré-operatório ou o NT pró-BNP em pacientes de cirurgia vascular, a medida desses marcadores pode melhorar significativamente a previsão de riscos.92 Níveis pré-operatórios elevados aju- dam a identificar pacientes com riscos pós-operatórios de morte em 30 dias ou infarto do miocárdio não fatal após cirurgia não cardíaca com base na medição de pep- tídeos natriuréticos.93 O outro biomarcador pré-operatório promissor, porém menos estudado, para predizer risco após a cirur- gia não cardíaca é a troponina cardíaca de alta sensibili- dade. A medida das troponinas cardíacas, que são libe- radas em resposta à lesão miocárdica, é essencial para o rápido diagnóstico de infarto do miocárdio.94 Ensaios de alta sensibilidade permitem a detecção de baixos níveis de troponinas circulantes em indivíduos sem manifestações de síndromes coronarianas agudas. No cenário não cirúrgico, níveis elevados de troponinas circulantes em repouso predizem o desenvolvimento de doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca e mortalidade.95,96 Pesquisas emergentes atuais demonstram que 20% dos pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas de grande porte têm concentrações elevadas de troponina de alta sensibilidade antes da cirurgia.97 Esses achados têm implicações importantes na interpretação de qual- quer concentração elevada de troponina no pós-opera- tório. Além disso, concentrações elevadas de troponina de alta sensibilidade no pré-operatório estão associadas a riscos aumentados de infarto do miocárdio pós-opera- tório ou mortalidade98,99 e aumentam a informação pre- ditiva do RCRI.100 FERRAMENTAS LABORATORIAIS E FUNCIONAIS PARA AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA Testes laboratoriais e diagnósticos não são rotineira- mente necessários, a menos que haja uma indicação específica devido a uma comorbidade do paciente ou em razão do tipo de procedimento. Exames especializados adicionais devem ser realizados antes da cirurgia com o intuito de fornecer informações importantes e estimar o risco de complicações perioperatórias. É fundamental reforçar que a indicação de exames adicionais só deve ser considerada se a mesma indicação persistir na ausên- cia da cirurgia proposta. TESTE DE ESTRESSE A cintilografia por dipiridamol-talium ou o ecocardio- grama de estresse com dobutamina são investigações dinâmicas para elucidar a possibilidade de isquemia mio- cárdica e a frequência máxima tolerada. São exames não invasivos e que melhoram a estratificação de risco no pré-operatório.101 O valor prognóstico da informação do teste de estresse cardíaco (ergometria) tem sido extensivamente estudado.102-106 Se o teste de esforço for realizado, e a capacidade for acima ou igual a 7 METs, é indicativo de baixo risco cardiovascular perioperatório, enquanto a inca- pacidade em atingir 4 METs prediz risco aumentado.105,107 ECOCARDIOGRAMA O ecocardiograma de repouso pré-operatório fornece prognóstico potencialmente importante sobre a fun- ção cardíaca sistólica e diastólica ventricular, anorma- lidades valvares, anormalidades fixas de movimento da parede e hipertensão pulmonar. A presença de dis- função sistólica ventricular esquerda significativa ou doença cardíaca valvar grave está associada a um des- fecho ruim, em particular o desenvolvimento de insu- ficiência cardíaca pós-operatória.108 Várias são as indi- cações para ecocardiografia transtorácica (ETT) na avaliação pré-anestésica (Quadro 1.13).109 A disfunção sistólica pré-operatóriaestá associada a risco elevado de morte perioperatória e complicações cardíacas.76,100,101 No entanto, os achados do ETT podem não melhorar a predição de risco além daquela alcan- çada com o exame clínico de rotina.101 Além disso, a fun- ção ventricular de repouso não é uma medida substi- tuta da capacidade funcional102,103 em indivíduos que não podem se exercitar devido à artrite, obesidade ou doença arterial periférica. Finalmente, a ecocardiogra- fia pré-operatória de rotina não tem sido associada à melhora da sobrevida após cirurgia não cardíaca eletiva importante,104 embora possa haver algum benefício para Quadro 1.13 – Indicações para realização de ecocardiograma de repouso • Presença de sopros • Diagnóstico ou acompanhamento de valvopatias • Avaliação da função ventricular • Instabilidade hemodinâmica • Dispneia • Hipoxemia • Capacidade funcional limitada Fonte: Jørgensen e colaboradores.106 10 | IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Brandao_Cap_1.indd 10 27/06/2019 14:42:08 pacientes com fatores de risco cardiovascular submeti- dos a reparo de fratura de quadril.108 A Society of Critical Care Anesthesiologists fez reco- mendações incluindo indicações clínicas, metas e com- petências de aprendizagem para o uso da ecocardiogra- fia pela anestesiologia e cuidados intensivos por meio de protocolos como o Focus Assessed Transthoracic Echocardiography (FATE) ou ecocardiografia transtorácica focada. O examinador deve ser apto a realizar as visualiza- ções padronizadas do exame básico e reconhecer as prin- cipais alterações nas doenças cardiopulmonares, especial- mente em pacientes críticos com instabilidade respiratória ou hemodinâmica (Fig. 1.2 e Quadro 1.14). Em um segundo passo, o protocolo FATE permite avaliar de forma rápida e à beira do leito a volemia e a fluidorresponsividade por meio do diâmetro da veia cava e das alterações determinadas pela respiração (Fig. 1.3). Deve-se enfatizar que o protocolo FATE não substi- tui a realização de um ecocardiograma transesofágico abrangente por um cardiologista, e a consulta pelo espe- cialista cardiologista deve ser considerada sempre que necessário.110 TESTE DE EXERCÍCIO CARDIOPULMONAR O TECP ou ergoespirometria é um teste que cria condi- ções de estresse e fornece uma medida da aptidão aeró- bica ou da capacidade funcional por meio da intolerância ao exercício. O TECP fornece uma estimativa individuali- zada do risco do paciente que pode ser usada para prever morbidade e mortalidade pós-operatórias,111 podendo ser um preditor de uma série de complicações periopera- tórias, além de eventos cardíacos, incluindo pneumonia, insuficiência respiratória e infecção. O TECP pré-operatório é indicado para fornecer uma avaliação objetiva da capacidade de exercício no pré- -operatório e identificar as causas da limitação ao exer- cício. Esta informação pode ser útil nas decisões sobre Figura 1.2 – Etapas da realização do FATE (focus assessed transthoracic echocardiography) ou cocardiografia transtorácica focada. AD, átrio direito; AE, átrio esquerdo; VD, ventrículo direito; VE, ventrículo esquerdo; Ao, aorta. Fonte: Jørgensen e colaboradores.106 3 - Janela paraesternal, eixo longitudinal2 - Janela apical, 4 câmaras Esquerda 44 1 3 2 Direita Diafragma 5 - Pós 4 - Pleural Fígado/Baço Pulmão AD AD VE VE 4 - Janela paraesternal, eixo curto VE VE VD VD AE 1 - Janela subcostal, 4 câmaras AD VE VD AE AE Ao Quadro 1.14 – Situações que podem ser diagnosticadas e tratadas pela ultrassonografia transtorácica utilizando a padronização de exame FATE CAUSAS EXEMPLOS Cardíacas Derrame pericárdico, tamponamento pericárdico, insuficiência cardíaca/edema pulmonar, isquemia miocárdica Pulmonares Pneumotórax, embolia pulmonar, derrame pleural Outras Hipovolemia, choque, aneurisma ou dissecção de aorta Fonte: Jørgensen e colaboradores.106 MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA | 11 Brandao_Cap_1.indd 11 27/06/2019 14:42:09 os procedimentos cirúrgicos e não cirúrgicos (Quadro 1.15) durante o período perioperatório em vários tipos de procedimentos ou situações com diferentes graus de recomendação.112 A ergoespirometria faz uma análise da troca gasosa durante o exercício e mede, por meio de sistemas moder- nos, o consumo de oxigênio (VO2) e o volume expirado de CO2 em resposta ao exercício (trabalho) desenvol- vido (Fig. 1.4). No exercício, o consumo de oxigênio está linearmente relacionado ao débito cardíaco. A medição da capacidade aeróbica é, portanto, um marcador indi- reto da função ventricular. Uma redução no pico do VO2 ou do limiar ventilatório pode demonstrar desde pouco condicionamento físico até limitações pulmonares, car- díacas, relacionadas à obesidade ou musculares.113 Várias medidas derivadas do TECP, incluindo a in- capacidade de se exercitar, o baixo limiar anaeróbio (< 11 mL/kg/min) ou o baixo consumo de oxigênio (pico de VO2), são preditivas de aumento do risco de mortali- dade e complicações pós-operatórias.114,115 Figura 1.3 – Exemplo de avaliação hemodinâmica por ecocardiografia transtorácica focada (FATE) utilizando modo bidimensio- nal e modo M da veia cava inferior. (A) Colapso total da veia cava inferior causado por choque hemorrágico. (B) Veia cava infe- rior distendida, neste caso devido a sobrecarga de volume. -3 -2 15 10 5 5 10 15 -2 -1 50 mm V VA B Figura 1.4 – Diagrama da resposta ao trabalho desenvolvido. VCO2, volume de dióxido de carbono expirado; VO2, consumo de oxigênio. Trabalho Limiar ventilatório Pico VO2 VCO2 VO2 VO 2 / V CO 2 Quadro 1.15 – Procedimentos com indicação de teste de exercício cardiopulmonar Estimar a probabilidade de morbidade e mortalidade perioperatória e contribuir com a avaliação de risco pré-operatório (Grau de evidência B): • Cirurgia vascular • Cirurgia bariátrica • Grandes cirurgias abdominais • Cirurgias urológicas • Cirurgia colorretal • Transplante hepático • Cirurgia torácica Informar e auxiliar os processos, tomada de decisão e consentimento compartilhado multidisciplinar do paciente (Grau de evidência C): • Risco versus Benefício Orientar as decisões clínicas sobre o nível mais apropriado de cuidados perioperatórios (Grau de evidência B): • Enfermaria • Cuidados intensivos Auxiliar na avaliação pré-operatória (Grau de evidência C): • Direcionar encaminhamentos especializados • Decidir por intervenções pré-operatórias • Otimizar comorbidades (Grau de evidência B): • Identificar doenças • Avaliar os efeitos das terapias neoadjuvantes contra o câncer, incluindo quimioterapia e radioterapia • Orientar programas de treinamento em reabilitação (Grau de evidência D): • Orientar a prática anestésica intraoperatória Fonte: Levett e colaboradores.112 12 | IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Brandao_Cap_1.indd 12 27/06/2019 14:42:10 Apesar desses dados iniciais promissores, perma- nece a necessidade de pesquisas de alta qualidade mais robustas nessa área, em especial de estudos que recru- tem grandes amostras generalizadas e heterogêneas, multicêntricos, randomizados e encobertos para melhor validação do TECP.115-118 ULTRASSONOGRAFIA DE CARÓTIDA COM DOPPLER Complicações neurológicas, variando desde sintomas transitórios até acidente vascular cerebral (AVC) esta- belecido, são conhecidas após grandes cirurgias como a cardíaca. Devido a esse fato, alguns serviços roti- neiramente utilizam a ultrassonografia carotídea com Doppler (UCD) pré-operatória para identificação de estenose.119 Apesar da prevalência relativamente ampla da doença arterial de carótida em pacientes portadores de doença arterial coronariana, mesmo que assinto- máticos, alguns estudos apontam benefício para rea- lização de rastreamento apenas em pacientes de alto risco (Quadro 1.16), quando a UCD pode detectar mais de 50% de estenose com 100% de sensibilidade.120 Algumas diretrizes também recomendam a avalia- ção pré-operatória por UCD somente em pacientes selecionados.121A ausência de relação causal direta entre estenose da artéria carótida e AVC ipsilateral e o aumento da morbi- dade associada à revascularização carotídea profilática são argumentos de que essa conduta pode não ser bené- fica em pacientes assintomáticos submetidos à revascu- larização miocárdica. PERFIL ENDÓCRINO E METABÓLICO Alguns fatores como a hiperglicemia e a resistência à insulina são bem estabelecidos como marcadores de complicações pós-operatórias no paciente diabético e mesmo no não diabético e com síndrome metabólica.122 A mensuração da hemoglobina glicada (HbA1c) em pacientes com hiperglicemia durante a hospitalização oferece a oportunidade de diferenciar os pacientes com hiperglicemia relacionada ao estresse daqueles com dia- betes que antes não eram diagnosticados.123 A HbA1c tem sido usada como uma medida de con- trole diabético, refletindo as concentrações de glicose em longo prazo (meses anteriores). O controle rígido pode estar associado com incidência reduzida de complicações relacionadas ao diabetes, infarto do miocárdio e AVC. É um teste prático e informativo também para a triagem de pacientes não diabéticos antes da cirurgia para disgli- cemia, pré-diabetes e diabetes não diagnosticado que estão em risco de desenvolver hiperglicemia pós-opera- tória. A associação de níveis subótimos de HbA1c (> 6%) com hiperglicemia e complicações pós-operatórias des- taca seu valor para a estratificação de risco antes da cirur- gia. Além disso, níveis subótimos de HbA1c podem iden- tificar pacientes que podem se beneficiar da monitoração mais intensiva e do tratamento da hiperglicemia periope- ratória. No entanto, ainda não é certo se a HbA1c pré-ope- ratória abaixo do ideal representa um fator de risco, sendo necessários estudos mais aprofundados. Uma das razões para essa incerteza é o fato de que os níveis de HbA1c de um paciente diabético que está recebendo tratamento far- macológico podem ser tão baixos quanto os níveis de um indivíduo não diabético, e, portanto, níveis semelhantes de HbA1c não refletem necessariamente o mesmo estado metabólico.123 Se nenhum exame de HbA1c foi feito nos últimos 3 meses ou os pacientes relataram controle inadequado da glicemia em testes domiciliares, um nível de HbA1c dá uma indicação de controle nos últimos 2 a 3 meses. Uma HbA1c elevada está associada à hiperglicemia periope- ratória, maiores valores de proteína C-reativa e compli- cações,124,125 devendo-se considerar adiar a cirurgia para buscar a otimização clínica. Existem práticas e protocolos específicos de cada ser- viço dependendo do tipo de procedimento cirúrgico, mas alguns autores consideraram um pior prognóstico em pacientes com uma HbA1c maior que 7%,126 8%127 ou 9%.128 O valor de glicemia a ser estabelecido no pré-opera- tório varia de acordo com a recomendação de várias dire- trizes (Quadro 1.17). AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO RESPIRATÓRIA Complicações pulmonares pós-operatórias variam de 5 a 70%, de acordo com o perfil da cirurgia e com o que é considerado nos estudos como “complicação pulmonar”. Os principais fatores de risco relacionados ao paciente são idade acima de 60 anos,59 presença de doença pul- monar obstrutiva crônica,135 tabagismo,135 insuficiência cardíaca congestiva,136 hipoalbuminemia,59,136 hipercap- nia137 e estado físico ASA > III.59,136 Pacientes com estado físico ASA > III possuem risco de complicações pulmona- res pós-operatórias > 10%.59,136 Entre os fatores de risco relacionados à cirurgia, destacam-se o local cirúrgico, Quadro 1.16 – Pacientes de alto risco de AVC perioperatório em cirurgia coronariana FATORES DE RISCO • Mulheres • Diabetes melito • Hipertensão • Doença vascular periférica • Doença carotídea (AVC ou AIT) • Doença arterial coronariana esquerda • Tabagismo AIT, acidente isquêmico transitório; AVC, acidente vascular cerebral. Fonte: Kurlansky,119 Sheiman e Janne d’Othee120 e Hillis e cola- boradores.121 MEDICINA PERIOPERATÓRIA E ANESTESIA | 13 Brandao_Cap_1.indd 13 27/06/2019 14:42:10 especialmente abdominal,138 torácico139 e cirurgias em caráter de emergência,59,139 utilização de bloqueador neuromuscular de longa duração ou sem reversão ade- quada durante a anestesia geral59,139,140 e duração cirúr- gica acima de 3 horas.140 De todos esses fatores de risco citados, a doença pul- monar obstrutiva crônica e a asma permanecem como os mais importantes.140 Na consulta pré-anestésica, devem-se avaliar a pre- sença de exacerbação ou descompensação de doença pulmonar preexistente ou a presença de infecção ativa e reprogramar a cirurgia eletiva após instituição do tratamento ou encaminhamento ao pneumologista, caso necessário.140 A estratificação do risco para complicações pulmo- nares após cirurgia torácica pode ser estabelecida com base nos achados clínicos e de exames de espirometria e laboratoriais (Quadro 1.18). O sistema respiratório é altamente afetado pelo ganho de peso (Fig. 1.5). Mesmo que o impacto possa variar de paciente para paciente, em geral, a função res- piratória é inversamente relacionada ao índice de massa corporal (IMC), com comprometimento significativo observado uma vez que o IMC excede 45 kg/m2. Quadro 1.17 – Objetivos glicêmicos no pré-operatório do paciente cirúrgico TIPO DE PACIENTE GLICEMIA-ALVO REFERÊNCIA Ambulatorial Glicemia < 180 mg/dL SAMBA129 Terapia intensiva Glicemia entre 140 e 180 mg/dL ADA/AACE130 Glicemia < 140 mg/dL se baixo risco de hipoglicemia < 150 mg/dL Critical Care Society131 Glicemia entre 140 e 200 mg/dL ACP132 Internado Glicemia pré-alimentação < 140 mg/dL e variação da glicemia < 180 mg/dL Endocrine Society133 Glicemia entre 108 e 180 mg/dL Joint British Diabetes Societies134 SAMBA, Society for Ambulatory Anesthesia; ADA/AACE, American Diabetes Association/American Association of Endocrinologists; ACP, Ameri- can College of Physicians. Fonte: Joshi e colaboradores,129 Moghissi e colaboradores,130 Jacobi e colaboradores131 e Qaseem e colaboradores.132 Quadro 1.18 – Parâmetro de risco para complicações pulmonares após cirurgias torácicas BAIXO RISCO ALTO RISCO VEF1 pré-operatório > 2 L ou 80% VEF1 pré-operatório < 1 L ou 40% VEF1 predito pós-operatório > 0,8 L e 40% VEF1 predito pós-operatório ≤ 0,8 L e 40% VVM > 50% VVM < 40% VO2 max predito pós-operatório > 20 mL/kg/min VO2 max predito pós-operatório < 10 mL/kg/min Ausência de doença cardíaca PaO2 < 60 mmHg PaCO2 > 45 mmHg VEF1, volume expiratório forçado em 1 segundo; VVM, ventilação voluntária máxima. Fonte: Dumaresq e colaboradores.140 Figura 1.5 – Efeito da obesidade sobre a função respiratória. Efeito restritivo da massa sobre a parede torácica Tendência a respirar a baixos volumes Efeito da distribuição de gordura sobre a pressão pleural Aumento do trabalho respiratório Aumento da resistência da via aérea Redução da complacência 14 | IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE DE ALTO RISCO CIRÚRGICO Brandao_Cap_1.indd 14 27/06/2019 14:42:11 Os distúrbios respiratórios relacionados ao sono nos pacientes obesos não são tão uniformes e nem sempre estão relacionados apenas à síndrome da apneia obs- trutiva do sono (SAOS), como se poderia supor. Existe um grupo heterogêneo que inclui, além da SAOS, a sín- drome da hipoventilação por obesidade (SHO), sendo que alguns autores descrevem a síndrome de hipoventi- lação da obesidade maligna (MOHS, do inglês malignant obesity hypoventilation syndrome), além de síndromes de sobreposição, como a SAOS com doença pulmonar obs- trutiva crônica (DPOC e SAOS).141 A MOHS é uma forma grave de SHO com envolvimento de disfunção de múlti- plos órgãos em indivíduos morbidamente obesos. É defi- nida como um paciente com um IMC superior a 40 kg/m2 com hipercapnia acordado (PaCO2 ≥ 45 mmHg) e sín- drome metabólica (obesidade central, hipertensão, hiperlipidemia e resistência à insulina). Existem fortes evidências sugerindo que a medi- ção sérica de HCO3– ≥ 28 mmol/L, juntamente com uma pontuação ≥ 3 do escore de STOP-Bang*,
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