Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Disciplina: Currículo e Avaliação Institucional e Educacional (CAE) Sumário UNIDADE I – Dilemas e controvérsias no campo do currículo .......................................3 SUCESSO NA ESCOLA: SÓ O CURRÍCULO, NADA MAIS QUE O CURRÍCULO! ......6 UNIDADE II – Planejamento, Currículo e Avaliação .................................................... 30 O Planejamento Em Educação: Revisando Conceitos Para Mudar Concepções e Práticas ....................................................................................................................... 30 Avaliação Institucional e Educacional .......................................................................... 37 UNIDADE I – Dilemas e controvérsias no campo do currículo PROCAP: Projeto Político-Pedagógico da Escola. Minas Gerais: 2001 vol.3. Síntese feita por Sandra Maria Perpétuo Locatelli. PROBLEMATIZANDO: Currículo - Como é organizado e como é trabalhado nas escolas? Quais são as causas dos baixos rendimentos dos alunos? Por que as crianças não aprendem o que a escola ensina? Como Promover um Currículo Inclusivo? Como Construir A Escola Democrática? Atualmente, quais são os conteúdos curriculares mais adequados para o ensino, que saberes correspondem às necessidades e interesses dos estudantes que hoje frequentam a escola? EM BUSCA DE UMA DEFINIÇÃO: 1ª orientação: conjunto de conhecimentos trabalhados pela escola ou sob sua supervisão - o que aprender. 2ª orientação: experiências de aprendizagens construídas na escola - experiências mais significativas a ser ensinadas na escola. Tipos de Currículos CURRÍCULO ACADÊMICO X CURRÍCULO NÃO ACADÊMICO Currículo Acadêmico: Centrado nas disciplinas hierarquicamente organizadas, está associada à educação das crianças consideradas mais hábeis, e caracteriza-se pela ênfase na comunicação escrita em oposição à oral, no individualismo, na abstração e no afastamento da vida diária ou da experiência comum. Currículo Não Acadêmico: São aquelas propostas curriculares que rompem com a estrutura disciplinar e com a organização sequencial dos conteúdos, trabalhando com temas que integrem diferentes áreas do conhecimento, voltando-se para os processos de aquisição, e não para os processos de transmissão de saberes. É valorizada, nessa abordagem, a experiência de alunos e professores, suas vivências e inserção cultural. CURRÍCULO POR DISCIPLINAS X CURRÍCULO INTEGRADO Currículo Por Disciplinas: Os conteúdos escolares são considerados, geralmente, como uma transposição de campos ou disciplinas acadêmicas para a escola, sob forma de área de estudo, disciplinas ou matérias. Neste tipo de currículo, há pouco espaço para o desenvolvimento, nos estudantes, do espírito de iniciativa, do pensamento crítico e do gosto pela pesquisa autônoma. Currículo Integrado: Busca trabalhar com situações contextualizadas, integrando conhecimentos de diferentes áreas. A organização do currículo por projetos e o ensino por solução de problemas compartilham dessa visão. Permitem que os estudantes trabalhem os conteúdos culturais relevantes, enfrentando a discussão de questões que não podem ser abordadas nos limites de uma única disciplina. Tendências UNIVERSALISMO X MULTICULTURALISMO Universalismo Para a posição universalista existem saberes, conhecimentos e valores que são universais e transculturais, os quais fazem parte do patrimônio cultural da humanidade e devem ser socializados pela escola. Multiculturalismo Para o multiculturalismo, o currículo escolar deve englobar as experiências culturais dos diferentes grupos que integram a sociedade. Refuta- se a ideia de que exista conhecimento universal, uma vez que se designam como tais os conhecimentos que fazem parte da cultura de um grupo social específico. Aprender a conhecer: uso do próprio conhecimento para compreender o mundo, prazer de compreender, de conhecer e de descobrir. Aprender a aprender, o que requer estratégias de memória, atenção e pensamento. Aprender a fazer: mobilização e desenvolvimento de capacidades como a de adaptar-se em um novo contexto de trabalho mais participativo, de natureza mais intelectual e que exige uma sólida base tecnológica. Aprender a conviver: diálogo, espírito crítico e solidariedade - Aprender a ser: uma educação que contribua para o desenvolvimento total da pessoa: corporeidade, inteligência, sentido estético, responsabilidade pessoal e espiritualidade. Tornar-se capaz de agir frente aos diferentes desafios da vida. Currículo e Formação Humana A Formação do Cidadão deve ser o objetivo central da Educação Escolar. Para cumprir as finalidades da educação, deve-se promover um currículo que possibilite: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver, aprender a ser. Formas de Organização dos Conteúdos A escola atual precisa estar buscando novas formas de ensino porque as necessidades da sociedade atual exige novas metodologias de trabalho. INTERDISCIPLINARIDADE: Onde as disciplinas se cruzam, mas não perdem a sua identidade. É quando integram um ou mais conteúdos de disciplinas diferentes. TRANSDISCIPLINARIDADE: A disciplina perde sua identidade. Não há um conteúdo que pertence a disciplina A e B. É o grau máximo de relações entre as disciplinas, daí que se supõe uma integração global dentro de um sistema globalizador. TRANSVERSALIDADE: Elas perpassam em determinadas situações sem perder a identidade da disciplina em um trabalho típico dos blocos temáticos e temas transversais. MULTIDISCIPLINARIDADE: Várias disciplinas funcionando sem fazer ligação com a outra. SUCESSO NA ESCOLA: SÓ O CURRÍCULO, NADA MAIS QUE O CURRÍCULO! Artigo de Philippe Perrenoud - Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação Universidade de Genebra 2003 - Tradução: Neide Luzia de Rezende RESUMO O desenvolvimento e o caráter oficial das avaliações internacionais e de padrões nacionais de rendimento escolar favorecem a coexistência de uma dupla definição institucional de sucesso escolar. A definição habitual leva em conta o ensino efetivamente ministrado, adapta-se ao nível dos alunos e apresenta uma fidedignidade duvidosa. A segunda é mais objetiva, mas privilegia o que pode ser medido por testes padronizados: o cognitivo mais do que o sócio afetivo, as capacidades e conhecimentos mais que as competências e a relação com o saber. As duas avaliações entram em conflito. As regulações necessárias poderiam levar a uma aproximação do ideal: considerar, na avaliação do sucesso escolar, todos os componentes do currículo prescrito e tão somente eles. A ideia de sucesso escolar é entendida hoje em dois sentidos: - de modo muito geral, é associada ao desempenho dos alunos: obtêm êxito aqueles que satisfazem as normas de excelência escolar e progridem nos cursos; - com a moda das escolas efetivas e a publicação das "listas de classificação das escolas", o "sucesso escolar" acaba designando o sucesso de um estabelecimento ou de um sistema escolar no seu conjunto; são considerados bem-sucedidos os estabelecimentos ou os sistemas que atingem seus objetivos ou que os atingem melhor que os outros. Existirá uma relação entre esses dois "níveis de sucesso"? Acreditamos que sim. Não se poderia imaginar um estabelecimento que obtenha êxito enquanto a maioria de seus alunos fracassa. O sucesso de um estabelecimento poderia então estar associado à soma dos êxitos individuais de seus alunos. Da mesma forma que se pode classificar as nações em razão do número de medalhas olímpicas obtidas por seus atletas, as escolas poderiam ser classificadas segundo a proporção dos alunos que obtêm êxito nos estudos. No entanto, as coisas não são assim tão simples, em virtude de, pelo menos, três razões: a. A reputação de um estabelecimento se deve muitas vezes ao rigor da seleção que ele promove,no ingresso e no decurso da escolaridade. Não se pode desconsiderar as "racionalidades desiguais" (Grisay, 1988) dos sistemas escolares, que levam certos estabelecimentos a defender sua reputação rejeitando os alunos com dificuldade, em vez de instruí-los. b. Não podemos nos ater aos desempenhos de alto nível, nem mesmo aos de nível médio, e desconsiderar a dispersão. Um estabelecimento deveria levar todos seus alunos a um nível aceitável e não deveria se contentar em compensar graves fracassos individuais com êxitos brilhantes. c. Não se pode comparar estabelecimentos sem levar em conta o conjunto dos fatores que determinam o sucesso escolar de seus alunos: alguns desses fatores fogem ao controle dos estabelecimentos menos poderosos, como o nível inicial dos alunos ou seu contexto familiar e urbano. Um bom estabelecimento não pode, portanto se definir unicamente em função do número de bons alunos que possui. Há ainda outra complicação: o significado dos índices habituais de sucesso escolar dos alunos; taxas de promoção, notas, porcentagens; varia segundo o contexto. A mesma nota não corresponde às mesmas competências e competências iguais são avaliadas diferentemente de um estabelecimento e até de uma classe a outra, uma vez que as notas resultam em geral de uma comparação local entre alunos que seguem o mesmo programa. Assim um aluno médio pode parecer excelente numa classe muito fraca e medíocre numa classe muito forte. Para que uma comparação entre estabelecimentos seja rigorosa, as avaliações internacionais substituem esses índices de alcance local por dados padronizados, levando todos os alunos a se submeterem ao mesmo programa no sistema escolar. A escola só pode avaliar, no quotidiano, aquilo que ela grosso modo ensinou, enquanto que as avaliações externas em larga escala medem o nível de domínio daquilo que se reputa ter sido ensinado em todas as escolas a partir do currículo formal. Fiéis aos textos, tais avaliações não levam em conta a realidade diversificada do ensino e do trabalho escolar. A escola deve, sob o risco de ser fortemente questionada, assegurar o sucesso do maior número de alunos, não importa em que classe e em que tipo de estabelecimento: a sociedade não pode hoje tolerar que três quartos dos alunos repitam o ano. A avaliação, inscrita no funcionamento "normal" do sistema escolar, é pois modulada em função dos contextos locais e dos contratos didáticos, de modo a manter-se psicologicamente sustentável e socialmente aceitável. Mas as avaliações de sistema, que permitem comparar dados, não possuem tais restrições e podem "levar a sério os objetivos de formação", o que supõe não somente construir outro quadro das desigualdades em razão da padronização das provas, como também estimar de modo menos favorável a eficácia do sistema. Outra contradição: enquanto o sucesso "rotineiro" é feito de uma miríade de avaliações que pontuam e reorientam a carreira escolar, referindo-se cada uma a um fragmento do currículo, as avaliações em larga escala voltam-se para as aprendizagens consolidadas no fim dos cursos, o que engendra outra representação das desigualdades e da eficácia do sistema educativo. Entende-se que os vieses, os efeitos de contexto e outras perversões docimológicas conduzem os especialistas a atribuir apenas uma confiança limitada às avaliações feitas pela escola, essa contabilidade opaca de onde provêm notas cujo significado é incerto em termos de aquisições reais. Parece lógico que quem concebe avaliações de sistema sucumba à tentação de ignorar as avaliações produzidas pelos professores ou outros examinadores dentro do funcionamento de rotina do sistema educacional. Essa dissociação entre as avaliações feitas pela escola e os dados de avaliações em larga escala, que visam, legitimamente, a neutralizar os efeitos do contexto local, pode entretanto introduzir outros vieses igualmente graves. As avaliações externas que permitem comparação podem se ater aos dados mais fáceis de definir e de medir, mas é difícil avaliar o raciocínio, a imaginação, a autonomia, a solidariedade, a cidadania, o equilíbrio corporal ou o ouvido musical através de provas padronizadas, que são, na maior parte do tempo, testes de lápis e papel. Avaliar aprendizagens complexas em larga escala exige uma criatividade metodológica considerável e induz a custos importantes de aplicação e tratamento dos dados. É mais rápido e mais barato ater-se a provas escritas, reduzindo, desse modo, as aprendizagens escolares às aquisições cognitivas, dando prioridade às disciplinas principais e às operações técnicas. Governos e especialistas que se deixam levar por tais simplificações em geral reconhecem lucidamente os vieses e a imperfeição de seus instrumentos. Curiosamente, isso não os impede de utilizá-los e de publicar as listas classificatórias. Esses limites, que deveriam invalidar o método, apenas provocam nele algumas arranhaduras, dentro de uma "cultura de avaliação" que exigem dados a todo custo. A prudência dos autores das avaliações em larga escala e os protestos dos leitores mais críticos são rapidamente esquecidos, os dados publicados sobrevivem e impressionam aqueles que não sabem ou não compreendem como tais avaliações foram elaboradas. Os indicadores mais duvidosos conquistam ao longo do tempo ares de medidas objetivas. Os sistemas educacionais correm, nesse caso, o risco de instalar-se progressivamente numa situação de dupla definição institucional do sucesso dos alunos: - Uma, mais tradicional, remete à avaliação corrente feita pelos professores e por outros examinadores, durante ou ao fim do ano escolar. Não se sabe bem o que essa avaliação abrange, o certo é que as normas e as formas de excelência valorizadas não são homogêneas. Em contrapartida, essa avaliação leva em conta o que foi ensinado. É ela que representa papel decisivo na determinação da carreira escolar. - Outra, que independe do funcionamento ordinário das classes e dos estabelecimentos, serve-se de instrumentos padronizados concebidos a partir do currículo formal e administrados em larga escala. As restrições metodológicas e econômicas levam a privilegiar os resultados mais facilmente mensuráveis mediante provas escritas. O objetivo dessa segunda forma de avaliação não é determinar o destino individual dos alunos, mas contribuir para o monitoramento do sistema. Se não há concordância entre os índices de sucesso obtidos rotineiramente na própria escola e as comparações internacionais, os pais e a opinião pública sentem-se perdidos. Em certos países, o Programa Internacional de Acompanhamento das Aquisições dos Alunos; Pisa (OCDE, 2001) revela falhas que a avaliação habitual mascarava. Por outro lado, no momento em que se deseja, mais que nunca na história da escola, medir e comparar resultados, toma-se paradoxalmente consciência da dificuldade de circunscrever de modo preciso e consensual as finalidades da escola, sua tradução, primeiro num currículo formal, depois real, e, finalmente, em formas e em normas de excelência. Paradoxalmente processos que visam racionalizar o sistema educacional exacerbam os conflitos ideológicos, filosóficos, políticos, como também as controvérsias didáticas e pedagógicas, uma vez que a avaliação se situa no cruzamento de duas lógicas frequentemente antagônicas, a da aprendizagem e a da medida. Essas contradições levam mais ou menos clara e rapidamente a atenuar a independência relativa dos dois modos de avaliação: os resultados das avaliações padronizadas serão progressivamente considerados nos julgamentos cotidianos de excelência escolar e intervirão, portanto nos boletins escolares e nas decisões referentes à seleção, orientação, certificação. Mais, as autoridades escolares exercerão uma forte pressão para que os professores aumentem seus esforços e endureçam suas exigênciasnos campos em que existam avaliações padronizadas, única maneira de garantir que o sistema ou os estabelecimentos façam boa figura nas classificações (listas dos melhores estabelecimentos ou nas avaliações internacionais). Esse efeito dominante da padronização vai possivelmente concentrar as prioridades curriculares naquilo que parece facilmente mensurável e comparável no interior de um sistema educacional, ou entre sistemas: operações, memorização, formas verbais ao invés de raciocínio, imaginação ou argumentação... Isso só vem contrabalançar a tendência; tímida; a uma autonomia curricular mais acentuada dos estabelecimentos e a uma profissionalização da profissão de professor. E, sobretudo, isso só pode retardar a evolução do currículo escolar rumo a objetivos de alto nível taxonômico e rumo às competências. É importante, pois, que aqueles que privilegiam a formação, e não a avaliação, acompanhem de muito perto a dialética da dupla definição institucional do sucesso, que pode vir a favorecer uma regressão das finalidades da escola. Hoje é crucial não abandonar aos técnicos da avaliação a definição do sucesso escolar e; portanto, indiretamente, a leitura predominante do currículo. UM SUCESSO DEFINIDO PELA INSTITUIÇÃO O que é a felicidade? “A essa questão cada um tem o direito de oferecer sua resposta pessoal, ligada a visão de mundo, sistema de valores, trajetória, posição na sociedade, projetos”. A sociedade não legisla sobre a felicidade, a não ser em regimes totalitários, nos quais isso se torna insustentável, como diz o título de um romance de Ira Levin. Numa cultura democrática, todas as definições da felicidade compatíveis com a lei são legítimas. Mesmo assim, não é possível evitar discussões entre o casal, na família ou em toda comunidade cujos membros são chamados a compartilhar a mesma definição de felicidade. Só um ser antissocial pode definir a felicidade segundo seu gosto, sem ter de negociá-la com seus próximos. Mesmo livre de toda influência, ninguém pensa sobre a felicidade sozinho. A cultura, a moral, a religião, a literatura, a filosofia ou o senso comum propõem concepções de felicidade. Entretanto, nenhuma instituição define ou regulamenta a felicidade. O mesmo ocorre com o sucesso na vida. Podemos buscar a segurança ou o risco, a integração ou a vida à margem, a opulência ou o despojamento, a solidão ou a fusão no grupo, o trabalho ou a preguiça, a planificação ou a improvisação. Não existe nenhuma definição institucional do sucesso na vida. Esse pluralismo se estende ao sucesso de um aprendizado desejado. Um aprendiz de violão ou um jogador de golfe fixam o nível de excelência ao qual aspiram. Alguns colocam o alvo bem alto e se sentem constantemente fracassando, outros se satisfazem com pouco e têm a impressão de obter plenamente êxito. Tudo muda quando se trata de sucesso escolar. É possível, mas vão, defini-lo independentemente das exigências, dos critérios e dos julgamentos do sistema educacional. Do mesmo modo que no direito penal a culpa ou a inocência são estabelecidas pela justiça, o sucesso ou o fracasso escolares são devidamente estabelecidos e proclamados pelo sistema educacional. Esse processo de "fabricação" da excelência escolar (Perrenoud, 1995, 1998) é um processo de avaliação socialmente situado, que passa por transações complexas e está de acordo com as formas e as normas de excelência escolar, ancoradas no currículo vigente e na visão da cultura da qual a avaliação faz parte. É por isso que não se pode confundir os conhecimentos e as competências "efetivas" de uma criança e o julgamento de excelência escolar do qual ela é objeto. Isso não significa que o julgamento da escola é sem fundamento, mas sim que entre a realidade e o julgamento se interpõe uma série de mecanismos que podem banalizar ou dramatizar as diferenças reais. Em resumo, seria de bom senso considerar que o sucesso ou fracasso não são características intrínsecas dos alunos, mas o resultado de um julgamento feito pelos agentes do sistema educacional sobre a distância desses alunos em relação às normas de excelência escolar em vigor. Em certo momento da história, num sistema educacional e num determinado curso, a concepção instituída do fracasso escolar tem "força de lei". Por mais arbitrário que possa parecer, de uma perspectiva histórica ou comparativa, o fracasso escolar é definido segundo procedimentos fundados no direito. Por isso, essa definição se impõe, em princípio, a todos os atores. Cada um é levado a curvar-se diante dos julgamentos institucionais de sucesso e de fracasso, após ter esgotado os recursos, que a maioria dos sistemas educacionais prevê. De fato, um aluno que a escola declara insatisfatório pode não se considerar assim de acordo com seus próprios critérios, do mesmo modo que seus pais, parentes e amigos podem defender este mesmo ponto de vista. É, contudo, a definição institucional que prevalecerá pelo menos quando se trata de decisões como a repetência, a orientação, o encaminhamento para classes especiais ou para aulas de reforço, a outorga do certificado. Os atores podem preservar a liberdade "mental" de não aderir à definição institucional, mas eles serão, queiram ou não, submetidos a seus efeitos. Cada um, não importa qual seja sua convicção íntima, está "atrelado" à definição institucional quando se trata de progredir no curso, de ter acesso a carreira de formação exigente ou de obter um diploma. A resistência ao julgamento institucional mantém, entretanto certa influência no registro da autoestima. Assim como um indivíduo julgado culpado pela justiça pode "se sentir inocente", um aluno que a escola declara fracassado pode não se sentir inteiramente desvalorizado por esse julgamento. Acontece também de um aluno que a escola considera excelente não compartilhar o mesmo julgamento por se avaliar em função de exigências mais elevadas. Essa margem de autonomia na interpretação do veredicto escolar tem grande importância subjetiva. Os indivíduos e as famílias com fracasso igual, segundo critérios da escola têm capacidade desigual de distanciar-se do julgamento, de relativizá-lo, minimizá-lo, ou seja, de contestá-lo. Além do papel crucial na economia psíquica das pessoas e das famílias, esse distanciamento alimenta uma corrente permanente de contestação da norma institucional. Em nenhum sistema, as normas e as formas de excelência das quais depende o êxito escolar são objeto de unanimidade, assim como não o são os níveis de exigência e os limiares que separam um aluno com desempenho satisfatório de um aluno fracassado. A ESCOLA, CANTEIRO DE OBRAS E CAMPO DE LUTAS Os critérios padronizados de avaliação são às vezes abertamente combatidos. Mais frequentemente, ainda, eles são interpretados de modo parcial por seus opositores. Em todo lugar, uma parte dos alunos, pais, professores e gestores escolares pensam e afirmam que: -"verdadeiro sucesso" não coincide com a definição formal fornecida pelo sistema educacional; - essencial do valor intelectual de uma criança ou de um adolescente só guarda uma longínqua relação com o que medem as provas oficiais; - consequentemente, é preciso ignorar, relativizar ou modificar os critérios oficiais de sucesso escolar. A democracia autoriza contestar a lei, mas não dá o direito de fazê-lo o tempo todo em que ela está em vigor. Uma norma contestada incessantemente por aqueles que devem aplicá-la ou a ela se submeter perde sua força e legitimidade. Isso pode favorecer certa flutuação nas representações sociais das formas e das normas legítimas de excelência escolar. É preciso se interrogar sobre seus efeitos perversos: - para obter êxito na escola, um aluno precisa compreender o que se espera dele. Como consegui-lo se as exigências são mutáveis e as mensagens dos adultos contraditórias? - a diversidadedas concepções de sucesso impede todo debate racional sobre a eficácia da ação educativa, pois os objetivos efetivamente perseguidos por uns e por outros não são os mesmos; - para desenvolver um ensino estratégico e uma pedagogia diferenciada, para lutar eficazmente contra o fracasso escolar, é preciso ter objetivos claros e estáveis, de modo que os professores possam consagrar sua energia e inteligência a ajudar todos os alunos a alcançá-los. Poderíamos sonhar com um sistema educacional que construísse tranquilamente um amplo consenso sobre as finalidades da escola e portanto sobre a definição do sucesso, e que o mantivesse, de modo coerente, durante pelo menos dez anos. Ora, as coisas se passam via de regra de maneira menos harmoniosa. Os objetivos da escolaridade suscitam sempre representações antagônicas. Nenhuma visão das finalidades da escola reina sem divisão, sendo, independentemente de sua adoção legal, objeto de críticas e de contrapropostas. A contestação é às vezes metodológica ou teórica, mas em geral é filosófica, ideológica, política. Com esse pano de fundo, não surpreende que certos professores se sintam livres para não aderir às normas de excelência e aos procedimentos de avaliação em vigor e, sobretudo, os empreguem sem convicção, seja para amenizar, seja para endurecer as exigências oficiais. Com frequência valem-se deles para redirecionar as ponderações e privilegiar uma interpretação que, às vezes, é favorável aos alunos em dificuldade, às vezes aumenta indevidamente a seleção. Essa margem de interpretação e de redirecionamento das normas existe também entre os juízes e os policiais, por exemplo, mas surpreende sempre aqueles que pensam que a lei é a lei. Mesmo nas profissões que conferem certa autonomia aos profissionais, em princípio, não se chega ao ponto, de liberá-los das regras comuns. Nenhum sistema educacional estende, por exemplo, a liberdade dos professores à livre escolha das finalidades e dos conteúdos do ensino. É o programa curricular que deve ditar as formas e as normas de excelência escolar que definem o sucesso. Assalariados de uma organização seja ela privada ou pública, nacional ou local, os professores devem servir a seus objetivos, respeitar o currículo e aplicar os critérios que dele decorrem. Entretanto, o estatuto, a natureza de seu trabalho, a opacidade das práticas pedagógicas e o controle frágil dão aos profissionais, no cotidiano, uma grande abertura em relação à execução, tanto dos programas, quanto das exigências. A textos ambíguos e/ou contestados se aliam práticas de ensino e de avaliação que assumem a liberdade de, por vezes, negar-lhes a validade, por outras, insistir fortemente sobre seu sentido ou, ainda, ignorá-los. Em razão dessa distância entre currículo prescrito e currículo real, a maioria dos debates nacionais sobre os programas e os critérios de sucesso, independentemente de seu resultado, não tem nenhuma influência sobre as práticas. A tomada de consciência dessa discrepância entre as intenções e o funcionamento efetivo do sistema educacional conduz periodicamente a um endurecimento das regras, a estratégias de "reciclagem" dos professores, a um aumento do controle burocrático e a uma cobrança de responsabilidades. Essas tentativas suscitam oposições e avivam as tensões entre organizações profissionais e empregadores, mas também entre diversas frações do corpo de professores e entre os pais. Não esqueçamos jamais que: - os professores não possuem a mesma visão da escola, e vivenciam portanto muito diversamente as reformas sucessivas do currículo ou dos padrões de sucesso, bem recebidas por uns e odiadas por outros; - do mesmo modo, os pais não possuem as mesmas expectativas em relação ao sistema educacional, nem os mesmos interesses, tampouco as mesmas estratégias, em particular quanto a seu filho ser ou não bem-sucedido no sistema tal qual ele é. Voltar ao currículo não resolve portanto todos os dilemas quanto à definição do sucesso escolar, na medida em que ele próprio é objeto de controvérsias e interpretações divergentes. Ater-se ao currículo e às suas finalidades é, entretanto, a única maneira coerente de colocar o problema dos critérios de sucesso: só o currículo, nada mais que o currículo! SÓ O CURRÍCULO, NADA MAIS QUE O CURRÍCULO! O debate incessante e atualmente muito acalorado sobre os critérios de sucesso testemunha a seu modo a dificuldade das democracias quanto: • à adoção de textos precisos; não por ausência de rigor, mas pelo cálculo que textos abertos a interpretações diversas podem ser mais amplamente objeto de um relativo consenso; • ao limite da contestação pública e da crítica dissimulada das regras em vigor, mesmo sendo elas instituídas por procedimentos legítimos. O projeto do sistema escolar encarna-se no seu currículo, conjunto de objetivos e de conteúdos de formação. Apesar das controvérsias a respeito, nunca extintas, o currículo está inscrito em textos que têm força de lei e não podem ser inconsequentes, mesmo se subsiste certa margem de interpretação. Parece-me de bom senso tomar o currículo como a referência última à qual se reportam as formas e as normas de excelência escolar. Isso é mais ou menos óbvio. Na realidade, entre o enunciado do currículo formal e cada julgamento de excelência referente a um aluno particular, as etapas intermediárias são numerosas. Cada uma se presta a variações possíveis, com frequências pouco visíveis e difíceis de estabelecer. a. A definição das normas e das formas de excelência não aparece sempre explicitamente no currículo. É preciso então "deduzi-la" dos objetivos e dos programas. b. Há certa arbitrariedade na tradução das formas e das normas de excelência em provas, questões, problemas e tarefas destinadas a manifestar "objetivamente" os conhecimentos, as capacidades ou as competências dos alunos. c. A distinção dos diversos níveis de excelência e sua codificação em índices ordinais ou métricos (notas, conceitos, porcentagens de aquisição) abrem outra porta à arbitrariedade. d. A confecção de tabelas e a determinação do limiar que separa os alunos com desempenho satisfatório daqueles com desempenho insatisfatório são, por sua vez, o resultado de decisões nunca inteiramente ditadas pelos textos, mas com frequência tomadas em função da curva de desempenho efetivo dos alunos. e. Modula-se o sucesso e o fracasso ponderando e combinando de certa maneira os resultados obtidos em diversas provas múltiplas, e, mais ainda, ponderando diversas formas de excelência, para elaborar sínteses. f. Alguns sistemas adotam procedimentos como recursos ou modos informais de negociação, que fazem do julgamento final um produto dependente de transações com os alunos e as famílias, enquanto em outros sistemas predomina a lógica da medida não negociável. g. Em muitos sistemas educacionais são introduzidos procedimentos de "moderação" das avaliações feitas por certos professores e certos estabelecimentos muito severos ou muito complacentes. Muda-se a imagem do sucesso segundo os procedimentos de moderação, os pesos respectivos da avaliação feita em classe e os resultados das provas padronizadas. h. Mais recentemente, tem-se procurado harmonizar as avaliações correntes e os resultados das avaliações de sistema, de modo a reduzir a eventual defasagem entre a eficácia da escola apreendida no âmbito cotidiano e as apreciações externas. Nenhuma dessas escolhas é feita ao acaso, mas os desafios são muito complexos e diversos de modo que não convém perder o currículo de vista ou inventar normas que estão mais voltadas para a tradição escolar, para as obrigações de funcionamento, para as escolhas metodológicas ou as considerações político-estratégicas, do que para uma leitura rigorosa dos programas. Ao contrário, é mais importante que: 1. o currículotenha precedência e se fundamente naquilo que pareça essencial para ensinar e aprender, em vez de fundamentar-se na obsessão de avaliar de modo preciso ou na preocupação de fazer boa figura diante de uma concorrência que passa por tantas mediações; 2. o sucesso escolar se fundamente numa avaliação equitativa do conjunto das dimensões do currículo. Só o currículo e nada mais que o currículo. As dificuldades metodológicas e as preocupações táticas não justificam nenhuma renúncia. Os riscos, já presentes no cotidiano, de reduzir o currículo a um núcleo cognitivo tradicional, seriam fortemente acentuados pelas provas que privilegiam as aquisições mais facilmente mensuráveis e que não levam em consideração competências, atitudes, relação com o saber, desenvolvimento social ou dimensão reflexiva. SUCESSO ESCOLAR OU SUCESSO EDUCATIVO: UMA CONFUSÃO Torna-se discutível dissociar sucesso escolar e sucesso educativo. O sucesso escolar deveria coincidir com o conjunto das missões da escola, portanto cobrir uma parte da ação educativa, aquela que caberia à escola assumir. Seria desejável que essa expectativa fosse explicitada e remetesse a objetivos de formação, em sentido amplo, em vez de permanecer subentendida, o que impede a escola de construir os meios para suas ambições educativas, como se vê a propósito da cidadania. Seria conveniente também romper com uma distinção simplista entre uma instrução essencialmente cognitiva e uma educação essencialmente afetiva, social ou relacional. Todas as aprendizagens fundamentais associam, de uma parte, conceitos, conhecimentos e, de outra, uma relação com o mundo, um projeto, atitudes, valores. Quem poderia, por exemplo, dizer que trabalhar a relação com o saber, a curiosidade, o direito ao erro ou a capacidade de formular hipóteses depende da instrução ou da educação? A educação não é apenas física, musical, artística, cívica, moral, religiosa, ela é também matemática, linguística, científica, histórica, geográfica, epistemológica. O duplo sentido do conceito de "disciplina" deveria nos lembrar de que o conhecimento não está dissociado de uma relação com o mundo, consigo próprio e com os outros. Seria bom, portanto, não retomar uma oposição simplista e ultrapassada entre a educação e a instrução, e perceber que, se se persiste em estabelecer uma distinção, ela não corresponde e nunca correspondeu a uma estrita partilha de tarefas entre a escola e a família. Desde seu nascimento, a escola se definiu como uma empresa educativa, tanto do ponto de vista religioso quanto cívico. Ela de imediato interveio no mesmo terreno que as famílias, em parte para prolongar ou "redirecionar" sua ação educativa. Limitar a escola à transmissão de saberes é desconhecer sua missão de civilização, com toda a ambiguidade desse programa: liberar e normalizar. Em resumo, educativo e escolar não são antinômicos e não há razão alguma para limitar o sucesso escolar às aprendizagens mais tradicionalmente associadas à ideia de instrução. Por outro lado, a escola não tem o monopólio da instrução. Parte dos saberes e do saber-fazer aparentemente mais "escolares" são parcialmente construídos fora da escola, principalmente nas famílias, começando pelo saber ler. Quer se trate de educação ou de instrução, a escola não se deve furtar à obrigação de fazer a sua parte específica dentro de um conjunto de influências; favoráveis ou desfavoráveis; em relação às quais ela não pode ser considerada a única responsável. Seria portanto adequado definir um "sucesso educativo global", incluindo a ação da escola, mas também levando em conta o trabalho das outras instâncias, a família, a mídia, a rede de associações, a comunidade, os clubes esportivos etc.? O retorno do interesse pela educação do cidadão ou a voga da educação para a saúde parecem justificar essa ampliação. Notemos entretanto que não se poderia avaliar o sucesso educativo da sociedade sem normalizar a definição de uma educação bem-sucedida. Enquanto cada sociedade moderna fornece uma definição formal do sucesso escolar, concretizado no currículo e nas normas de excelência, nada existe de equivalente para o "sucesso educativo global". Tentar medi-lo colocaria em evidência a diversidade de concepções de vida e, portanto, de educação, que coexiste numa sociedade pluralista. Os profissionais da medicina preventiva, os higienistas, os ecologistas, os especialistas da segurança nas estradas ou da violência, os moralistas, os economistas, os psicólogos tentam todos definir a boa educação como aquela que preserva o que a eles importa: a saúde, o ambiente, a integridade, a paz, a justiça, o crescimento, o equilíbrio, a felicidade etc. Cada uma dessas normas é ou abertamente combatida ou negada na prática. Querer medir o sucesso educativo de uma sociedade ameaçaria o pluralismo dos valores, dos modos de vida, dos graus e estilos da integração. O "Melhor dos mundos" não estaria muito distante. A escolarização obrigatória e o desenvolvimento de uma legislação que definiu as finalidades e o currículo da escola produziram uma exceção histórica. Pode-se circunscrever o sucesso escolar porque a escola é uma instituição pública, à qual a sociedade designa, no quadro da constituição e da legislação, objetivos definidos de formação, educação, socialização, qualificação. Mergulhar o conceito relativamente claro de sucesso escolar no nebuloso "sucesso educativo" só pode misturar as cartas, colocando no mesmo plano uma vontade política explícita, decorrente de procedimentos democráticos e de empresas educativas plurais, que não possuem o mesmo estatuto jurídico. É também questionar a demarcação histórica entre o que advém da sociedade global e o que advém de comunidades mais específicas, sejam elas religiosas, linguísticas, étnicas, ou simplesmente familiares. Falar de sucesso educativo em vez de sucesso escolar poderia contribuir para privatizar ou para "comunitarizar", se não a escola, pelo menos sua missão. Talvez a existência de um sistema de educação que siga as finalidades designadas pela lei corresponda a um momento da história das sociedades modernas. Percebe-se a tendência a transformar a escola num simples serviço que ofereça às famílias ou a outras comunidades recursos baratos para, à sua maneira, educar suas crianças. Que se aceite então as implicações dessa escolha: haverá tantas concepções de sucesso educativo quantas forem as famílias ou as comunidades. A sociedade ocupar-se-á então de oferecer a cada um certos meios de realizar seu próprio projeto educativo, do mesmo modo que os transportes públicos facilitam os deslocamentos sem ditar o destino dos passageiros. Já que cada um viria procurar na escola o que quisesse e sairia quando julgasse oportuno, a noção de sucesso escolar não teria mais um "sentido comum"; designaria o sucesso das estratégias de escolarização de tal ou tal família, como o sucesso econômico designa o sucesso de uma pessoa ou de uma firma em face da concorrência. Ou então, variante totalitária ou integrista, os pais e os outros adultos se tornariam os agentes de um empreendimento educativo unificado. Num país que rompeu com todo e qualquer pluralismo, os educadores são levados a moldar os seres humanos na mesma fôrma. Pode-se então definir o sucesso educativo: é aquele que o partido, a junta militar ou a igreja no poder definem como tal. É preciso sublinhar que essa unanimidade autoritária na visão da educação está associada aos piores momentos da história humana? Em resumo, o sucesso escolar, na sua forma atual, só tem sentido se articulado a: a. uma definição coletiva e democrática dos objetivos da escolaridade; b. uma limitação desses objetivos, deixando um amplo espaço para a diversidade cultural. Pode-se compreender que sociedades minadas pelo individualismo, por conflitos étnicos ou por movimentosde contestação sejam tentadas a definir um sucesso educativo mais global que o da escola. Não se oculte então que se toca aí num difícil equilíbrio entre cultura comum e diversidade. A ideia de "sucesso educativo" tem um significado eminentemente político, deixemos de ser ingênuos a esse respeito! É de uma concepção de democracia que se trata. LEVAR TODOS A OBTEREM SUCESSO QUAISQUER QUE SEJAM OS CRITÉRIOS DE SUCESSO Os debates e combates a propósito do currículo, as normas de excelência e os critérios de sucesso são legítimos, mas se desviam muito e frequentemente do essencial: a procura de uma escola mais eficaz e mais justa. Enquanto pessoas discutem longamente sobre o que vão fazer juntas, sem chegar a um consenso, há sempre quem diga: "Façamos isso ou aquilo, não importa, mas chega de discussão". Esse mecanismo de regulação não funciona no âmbito do sistema educacional por duas razões: 1. O consenso buscado não é puramente prático, há questões ideológicas maiores e interesses divergentes, e ninguém está disposto a parar de combater. 2. O debate sobre a escola, suas finalidades e os critérios de sucesso não impedem seu funcionamento. Esse debate permanente capta imensas energias, desviadas de um outro problema, talvez mais importante: como fazer com que cada um obtenha sucesso não importa quais sejam os critérios de sucesso? Como tornar a escola mais justa e eficaz (Crahay, 2000)? Poderíamos nos perguntar se a paixão com a qual se debatem as finalidades da escola e os critérios de sucesso não é um modo de mascarar nossa impotência para atingi-los, ou de recusar todo questionamento dos métodos e da organização do trabalho, deslocando a discussão para questões ideológicas menos ameaçadoras ou desencorajadoras. A solução não consiste em separar os debates. O modo de definir as normas de excelência escolar, as exigências e os critérios de sucesso, pode favorecer ou emperrar a luta pela democratização do ensino e, mais amplamente, do acesso aos saberes. Pode-se dar três exemplos: 1. A democratização do ensino passa pelos currículos direcionados para o essencial, visando a objetivos de formação explícitos e sensatos. É importante que os critérios de sucesso sejam coerentes e sobretudo que deem prioridade às aprendizagens essenciais e duráveis, opondo-se à incorporação de desempenhos facilmente mensuráveis, que resultariam de uma aprendizagem decorada, de uma forma de repetição, ou seja, de uma pedagogia bancária que consideraria os saberes e as competências como aquisições isoladas, a serem trabalhadas e avaliadas uma após a outra. A abordagem por competências deveria estimular a ir nessa direção (Perrenoud, 2000; Roegiers, 2000). 2. Privilegiar didáticas construtivistas e dispositivos pedagógicos capazes de criar situações de aprendizagem fecundas não é compatível com critérios de sucesso que dão prioridade a tarefas simples, fechadas, individuais. Por que aprenderíamos a refletir, a formular hipóteses, a afrontar a complexidade do real no momento da aprendizagem se devemos responder corretamente a uma questão de múltipla escolha no momento da avaliação? 3. Desenvolver uma organização do trabalho escolar colocada prioritariamente a serviço de uma pedagogia diferenciada é sobretudo afastar as urgências avaliativas, trabalhar em ciclos de aprendizagem plurianuais (Perrenoud, 2000a, 2002). É preciso que a avaliação seja formativa ao longo do ciclo e leve, ao final do ciclo de aprendizagem, a aquisições essenciais e duráveis. Certos sistemas educacionais podem atualmente serem flagrados em verdadeiro delito de contradição: afirmam querer aumentar a eficácia da ação pedagógica tomando medidas; sobretudo relativas aos critérios de sucesso que resultam em fins contrários. É o caso, por exemplo, de quando se privilegiam as aquisições demonstráveis a curto prazo ou quando os estabelecimentos são levados a se desembaraçar o mais rápido possível dos alunos com dificuldade para melhorar seus indicadores de sucesso no exame final. No quadro da luta contra as desigualdades e o fracasso escolar, é pois necessário e urgente debater critérios de sucesso e sua relação com as estratégias mais promissoras. Quanto a isso, três observações merecem ser formuladas: 1. Critérios de sucesso que favoreçam pedagogias ativas, diferenciadas e construtivistas e uma avaliação formativa são condições absolutamente necessárias. Realizar essas condições não impede de trabalhar com o núcleo do problema: otimizar a organização do trabalho, as situações didáticas, a consideração das diferenças, as regulações formativas. É absurdo esperar que os critérios de sucesso sejam inteiramente satisfatórios para trabalhar com essas questões. 2. É importante trazer constantemente o debate sobre os critérios de sucesso para essa abordagem pragmática: eles permitem ou emperram as estratégias de formação eficazes? São ou não coerentes com as concepções mais promissoras da aprendizagem e do currículo? Na democracia, as finalidades da escola e os critérios de sucesso são escolhas políticas, às quais professores e pesquisadores devem se submeter. Eles podem, por sua vez, dizer em que e explicar por que certas orientações estão em contradição com a ambição declarada de tornar a escola mais justa e eficaz. 3. Uma parte das questões é igual em todos os sistemas, quaisquer que sejam os governos no poder, o currículo ou os critérios de sucesso. Pode-se pois visar uma certa continuidade na pesquisa e na inovação; por exemplo, em leitura ou em matemática; sem parar de refletir a cada mudança de ministério ou de programa. Os objetivos da formação são, em larga medida, muito parecidos. O problema maior é que não se consegue atingi-los em relação a todos os alunos. RECUSAR QUE A AVALIAÇÃO DEFINA O CURRÍCULO A questão política maior é continuar a democratizar o ensino. O problema teórico maior continua o de explicar as desigualdades de sucesso escolar, ou melhor, de compreender porque alguns obtêm êxito na escola e outros fracassam, em particular quando as condições de escolarização parecem as mesmas. Contudo, não se pode ignorar que o sucesso é um julgamento feito pela instituição, para distinguir rigorosamente o que sabem ou o que sabem fazer os alunos na realidade. Portanto, a explicação das desigualdades não pode ignorar essa construção social do sucesso e do fracasso. Se cada um é livre para definir o sucesso escolar "ideal" segundo seu interesse, a definição institucional tem força de lei e exerce, queiramos ou não, uma forte influência sobre o destino dos alunos (progressão, orientação, certificação, etc.). Como vimos, a definição institucional do sucesso e das formas e normas de excelência escolar varia segundo os sistemas educacionais e, no interior de cada um, segundo as épocas. Ela não é imutável, varia, ao contrário, segundo os parâmetros de ensino, os níveis e as disciplinas. Cada julgamento feito sobre o sucesso de um aluno se baseia em formas e normas de excelência institucionalmente definidas, mas resulta também de uma transação com armas desiguais entre os atores envolvidos, na qual intervém a representação que estes têm do sucesso e do fracasso. A definição institucional é não somente modulada na sua interpretação e na sua aplicação, mas aberta ou veladamente contestada por uma parte dos atores. São aqueles que recusam sejam as finalidades da escola, o currículo correspondente, sua tradução em formas ou normas de excelência, as exigências que fixam o limite entre o sucesso do fracasso, os procedimentos de avaliação, ou ainda as consequências de um fracasso (repetência, exclusão, seleção, orientação, não certificação ou estigmatização). Cada reforma do currículo, cada debate sobre as estruturas ou sobre a democratização aviva os confrontos sobre o que deveria ser a definição institucional do sucesso escolar.Passado um pouco mais de uma década, o debate sobre a eficácia ou eficiência dos sistemas educacionais, a instituição da prestação de contas sobre os resultados e o impulso das avaliações internacionais do tipo Pisa acrescentam a esse concerto discordante um elemento novo: uma dupla definição institucional do sucesso. De um lado, a que rege a avaliação escolar no cotidiano, provas e exames "normalmente" organizados pela escola. De outro, a definição a que se referem os organismos governamentais ou internacionais quando avaliam os estabelecimentos ou os sistemas educacionais. Por razões diferentes, cada uma dessas concepções deforma e empobrece o currículo. Não somente no momento de avaliar as aquisições, mas também no momento de ensinar, de fixar as prioridades e as exigências. Não se diz que "a avaliação é o verdadeiro programa"? A tensão e as contradições entre essas duas definições do sucesso são portadoras de efeitos perversos. Como, por exemplo, afastar a tentação de dar prioridade crescente àquilo que as avaliações internacionais ou as comparações entre estabelecimentos colocam em evidência? Em vez de fazer malabarismos com os indicadores e de salvar as aparências, os sistemas educacionais fariam melhor se esclarecessem seus objetivos de formação e se colocassem a avaliação de acordo com seus objetivos, e não o inverso. O currículo deveria vir em primeiro lugar e a avaliação deveria se encarregar de discernir se ele está sendo assimilado de maneira inteligente e duradoura, para além das rotinas escolares e sem se tornar estreitamente dependente de listas de classificação das escolas. Naufrágio Curricular CLÁUDIO DE MOURA CASTRO - Revista Espaço Acadêmico- ANO II. Nº 14. Julho de 2002 “Queremos continuar com uma população que ouviu falar de todas as teorias mas não sabe usar nenhuma?" O rei Gustavo Adolfo da Suécia, para defender-se de seus inimigos, decidiu criar o mais poderoso navio de guerra. Importou os melhores construtores navais, e os cofres públicos foram sangrados para produzir um barco invencível. Mas o rei o queria ainda mais invencível e mandou instalar mais um de que superior, com mais peças de artilharia. O navio, com o nome de Vasa, enfunou as velas em 1628 e, sob um vento suave, singrou a baía de Estocolmo. Mas, subitamente, apenas deixando o porto, vira e afunda. Era instável, pelo excesso de canhões e pela falta de lastro. Nossos doutos educadores e autores de livros didáticos criam currículos invencíveis. Tudo que pode ser importante é nele anexado. E, como há cada vez mais coisas importantes, o currículo vai ficando mais pesado e mais invencível. Como o Vasa, os alunos afundam sob o peso de tantos conhecimentos e de tantas informações preciosas. E, nas profundezas ignotas dos oceanos intelectuais, naufraga sua educação. Os japoneses, contados dentre os campeões mundiais em educação, fazem seus currículos para que todos os alunos normais entendam tudo. O MEC até que enxugou os nossos, mas, no trajeto até a sala de aula, o terreno é minado. Para autores e professores, é um desdouro que até mesmo os alunos geniais possam entender tudo que se ensina. Ainda não foi enterrado o último professor que se vangloria de só dar 10 quem sabe mais que ele. O preço de um currículo entulhado de informações – que isoladamente podem ser úteis e até interessantes – é que não sobra tempo para ser educado. É preciso pisar no acelerador para conseguir ouvir falar de tudo. Como não há tempo para aprender, decora-se. Entre reis de França, afluentes do Amazonas e derivados de carbono, acumulam-se inutilidades memorizadas. E têm a mesma sina as leis, as teorias e os princípios científicos, que ajudariam a entender o mundo, se fossem entendidos. Richard Feynman, Prêmio Nobel de Física, veio ao Brasil em 1950 para dar um curso para professores. Ficou estarrecido e anotou em seu livro de memórias: "Os estudantes tinham decorado tudo, mas não sabiam o significado de nada." (...) Nada tinha sido traduzido para palavras com significado. (...) Eles podiam passar nos exames e 'aprender' todas aquelas coisas, e não saber nada". Após meio século, continuamos na mesma, sabendo as fórmulas e incapazes de usá-las. David Perkins (no livro Smart Schools) nos diz claramente que, se não entendermos o aprendido, ele não servirá para nada. Aprendemos ao pensar com e pensar sobre o que estamos estudando. Aprender é uma consequência de refletir a respeito do que está sendo apresentado na aula. A visão convencional é que adquirimos um conhecimento e depois aprendemos a usá-lo. Trágico engano. Aprendemos somente pelo ato de pensar no que estamos aprendendo. E o conhecimento só é realmente adquirido quando podemos pensar usando o que foi aprendido. Mas o nosso Vasa curricular não deixa tempo para que isso aconteça. Resta aos alunos a lembrança de haver ouvido falar de muitos fatos e muitas teorias. O preço da sobrecarga de informações é a falta de profundidade, é a incapacidade de usar o que parecia ter sido aprendido, mas que era um conhecimento inerte, inútil e que não pode ser mobilizado para entender o mundo e resolver problemas. É preciso coragem para dizer não à avalanche curricular. E muitas vezes um professor individualmente não pode fazê-lo, pois há provas e maratonas curriculares a ser cumpridas a ferro e fogo. Mas é aqui que se define o futuro de um país. Queremos continuar com uma população que ouviu falar de todas as teorias mas não sabe usar nenhuma? Que recite os ossos do pé e centenas de nomes da taxionomia de Lineu? Ou queremos que entendam um manual de instrução? Tudo está na internet. Mas decidir o que buscar e usar bem o que encontrou é para aqueles que aprenderam a articular seu raciocínio. Nossos alunos continuarão tendo o mesmo destino do Vasa, com currículos invencíveis e tendo sua educação afundada pelo excesso de peso? SAIBA MAIS! O que está no currículo é mais importante do que como se ensina. Acesse pelo endereço: http://porvir.org/esta-curriculo-e-mais-importante-como-se-ensina/ Dimensões e desenvolvimento das competências da BNCC (Disponível em seu ambiente virtual de aprendizagem) Currículo: Um instrumento educacional, social e cultural (Disponível em seu ambiente virtual e aprendizagem). http://porvir.org/esta-curriculo-e-mais-importante-como-se-ensina/ http://porvir.org/esta-curriculo-e-mais-importante-como-se-ensina/ UNIDADE II – Planejamento, Currículo e Avaliação Recortes da pesquisa de: Maria Adelia Teixeira Baffi Petrópolis, 2002. Pedagoga - PUC-RJ. Mestre em Educação - UFRJ Doutora em Pedagogia Social - UNED Profª Titular - FE/UCP. Por Sandra Locatelli. O Planejamento Em Educação: Revisando Conceitos Para Mudar Concepções e Práticas Planejamento é um processo de busca de equilíbrio entre meios e fins, entre recursos e objetivos, visando ao melhor funcionamento de empresas, instituições, setores de trabalho, organizações grupais e outras atividades humanas. “De reflexão, de tomada de decisão sobre a ação; Previsão de necessidades e racionalização de emprego de meios (materiais) e recursos (humanos) disponíveis, visando à concretização de objetivos, em prazos determinados e etapas definidas, a partir dos resultados das avaliações.” (PADILHA, 2001, p. 30). Planejar é um processo que visa dar respostas a um problema, estabelecendo fins e meios que apontem para sua superação, de modo a atingir objetivos antes previstos, pensando e prevendo necessariamente o futuro. Mas considerando as condições do presente, as experiências do passado, os aspectos contextuais e os pressupostos filosóficos, cultural, econômico e político de quem planeja e com quem se planeja. Por meio do planejamento, evita-se a improvisação, prevê-se o futuro, estabelece-se caminhos que possam nortear mais apropriadamente a execução da ação educativa,prevendo o acompanhamento e a avaliação da própria ação. Planejar e avaliar andam de mãos dadas. PLANEJAMENTO EDUCACIONAL É UM "PROCESSO CONTÍNUO QUE SE PREOCUPA COM O 'PARA ONDE IR' E 'QUAIS AS MANEIRAS ADEQUADAS PARA CHEGAR LÁ', TENDO EM VISTA A SITUAÇÃO PRESENTE E POSSIBILIDADES FUTURAS, PARA QUE O DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO ATENDA TANTO AS NECESSIDADES DA SOCIEDADE, QUANTO AS DO INDIVÍDUO". (PARRA APUD SANT'ANNA ET AL, 1995, P. 14). Para Vasconcellos (1995, p. 53), "o planejamento do Sistema de Educação é o de maior abrangência (entre os níveis do planejamento na educação escolar), correspondendo ao planejamento que é feito em nível nacional, estadual e municipal", incorporando as políticas educacionais. Planejamento Escolar é o planejamento global da escola, envolvendo o processo de reflexão, de decisões sobre a organização, o funcionamento e a proposta pedagógica da instituição. "É um processo de racionalização, organização e coordenação da ação docente, articulando a atividade escolar e a problemática do contexto social" (LIBÂNEO, 1992, p. 221). Planejamento Curricular é o "processo de tomada de decisões sobre a dinâmica da ação escolar. É previsão sistemática e ordenada de toda a vida escolar do aluno". Portanto, essa modalidade de planejar constitui um instrumento que orienta a ação educativa na escola, pois a preocupação é com a proposta geral das experiências de aprendizagem que a escola deve oferecer ao estudante, através dos diversos componentes curriculares (VASCONCELLOS, 1995, p. 56). Planejamento de Ensino é o processo de decisão sobre atuação concreta dos professores, no cotidiano de seu trabalho pedagógico, envolvendo as ações e situações, em constantes interações entre professor e alunos e entre os próprios alunos (PADILHA, 2001, p. 33). Na opinião de Sant'Anna et al (1995, p. 19), esse nível de planejamento trata do "processo de tomada de decisões bem informadas que visem à racionalização das atividades do professor e do aluno, na situação de ensino-aprendizagem". No Planejamento Operacional a preocupação é responder as perguntas "o quê", "como" e "com quê", tratando prioritariamente dos meios. Abarca cada aspecto isoladamente e enfatiza a técnica, os instrumentos, centralizando-se na eficiência e na busca da manutenção do funcionamento. Tem sua expressão nos programas e, mais especificamente, nos projetos, sendo sobretudo tarefa de administradores, onde a ênfase é o presente, momento de execução para solucionar problemas. Plano é um documento utilizado para o registro de decisões do tipo: o que se pensa fazer, como fazer, quando fazer, com que fazer, com quem fazer. É um guia e tem a função de orientar a prática, partindo da própria prática e, portanto, não pode ser um documento rígido e absoluto. É a formalização dos diferentes momentos do processo de planejar que, por sua vez, envolve desafios e contradições. Plano Nacional de Educação é "onde se reflete toda a política educacional de um povo, inserido no contexto histórico, que é desenvolvida a longo, médio ou curto prazo" (MEEGOLLA; SANT'ANNA, 1993, p. 48). Plano Escolar é onde são registrados os resultados do planejamento da educação escolar. "É o documento mais global; expressa orientações gerais que sintetizam, de um lado, as ligações do projeto pedagógico da escola com os planos de ensino propriamente ditos" (LIBÂNEO, 1993, p. 225). Plano de Curso é a organização de um conjunto de matérias que vão ser ensinadas e desenvolvidas em uma instituição educacional, durante o período de duração de um curso. Segundo Vasconcellos (1995, p. 117), esse tipo de plano é a "sistematização da proposta geral de trabalho do professor naquela determinada disciplina ou área de estudo, numa dada realidade". Plano de Ensino “É o plano de disciplinas, de unidades e experiências propostas pela escola, professores, alunos ou pela comunidade". Situa-se no nível bem mais específico e concreto em relação aos outros planos, pois define e operacionaliza toda a ação escolar existente no plano curricular da escola. (SANT'ANNA, 1993, p. 49). Projeto é também um documento produto do planejamento porque nele são registradas as decisões mais concretas de propostas futuristas. Projeto Pedagógico é um instrumento teórico-metodológico que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, só que de uma forma refletida, consciente, sistematizada, orgânica e, o que é essencial, participativa. É uma metodologia de trabalho que possibilita resignificar a ação de todos os agentes da instituição (Vasconcellos 1995, p.143). Para Veiga (2001, p. 11) o projeto pedagógico deve apresentar as seguintes características: a) "ser processo participativo de decisões; b) preocupar-se em instaurar uma forma de organização de trabalho pedagógico que desvele os conflitos e as contradições; c) explicitar princípios baseados na autonomia da escola, na solidariedade entre os agentes educativos e no estímulo à participação de todos no projeto comum e coletivo; d) conter opções explícitas na direção de superar problemas no decorrer do trabalho educativo voltado para uma realidade específica; e) explicitar o compromisso com a formação do cidadão. f) nascer da própria realidade, tendo como suporte a explicitação das causas dos problemas e das situações nas quais tais problemas aparecem; g) ser exequível e prever as condições necessárias ao desenvolvimento e à avaliação; h) ser uma ação articulada de todos os envolvidos com a realidade da escola; i) ser construído continuamente, pois como produto, é também processo". Programa é "constituído de um ou mais projetos de determinados órgãos ou setores, num período de tempo definido. Dentro de um plano, é o espaço onde são registradas as propostas de ação do planejador, visando a aproximar a realidade existente da realidade desejada. Na elaboração de um programa é necessário considerar quatro dimensões: "a das ações concretas a realizar, a das orientações para toda a ação (atitudes, comportamentos), a das determinações gerais e a das atividades permanentes" (GANDIN, 1993, p. 36 e 1995, p. 104). Planejamento Político-Social tem como preocupação fundamental responder as questões "para quê", "para quem" e também com "o quê". A preocupação central é definir fins, buscar conceber visões globalizantes e de eficácia; serve para situações de crise e em que a proposta é de transformação, em médio prazo e/ou longo prazo. "Tem o plano e o programa como expressão maior" (GANDIN, 1994, p. 55). Recortes do artigo de: VASCONCELLOS, Celso. Planejamento, projeto de ensino-aprendizagem e projeto político pedagógico. São Paulo: Libertard,2002. Síntese elaborada por Sandra Maria Perpétuo Locatelli. Planejar implica em um processo de reflexão e mudança. No entanto, evidencia-se a descrença no planejamento. O que dizem os professores: • Não é possível planejar; • Do jeito que o planejamento vem sendo feito não funciona; • Não é necessário planejar. O planejamento educacional é da maior importância e implica enorme complexidade, justamente por estar em pauta a formação do ser humano. Falta clareza com relação à realidade em que se vive (dimensão sociológica, histórico cultural); falta clareza quanto à finalidade daquilo que ele faz: a educação para quê, a favor de quem, que tipo de homem e sociedade formar, etc. (dimensão política, filosófica), e, finalmente, falta clareza à sua ação mais específica na sala de aula (dimensão pedagógica). AFINAL, PARA QUE PLANEJAR? - Para antecipar mentalmente uma ação a ser realizada e agir de acordo com o previsto. - Para buscar fazer algo incrível, essencialmente humano: o real ser comandado pelo ideal. PLANEJAR REMETE-SE: 1. Querer mudar algo; 2. Acreditar na possibilidade de mudança da realidade; 3. Perceber a necessidade de mediação teórico-metodológica;4. Vislumbrar a possibilidade de realizar aquela determinada ação. O ponto de partida é uma pergunta básica: há algo em nossa prática que precisa ser modificado, transformado, aperfeiçoado? Se não há, não se precisa de projeto. A ausência de falta, a inapetência (física e/ou intelectual), a ausência de desejo é sinal de estagnação, e, portanto, de morte. (VASCONCELLOS,2002, p.36) O planejamento só tem sentido se o sujeito coloca-se numa perspectiva de mudança! PROJETO DE CURSO Sistematização da proposta geral de trabalho do professor naquela determinada disciplina ou área de estudo, numa dada realidade. Dimensões e Elementos dos Projetos de Ensino Dimensões Elementos Análise da Realidade Identificação Caracterização da Realidade • Sujeito • Objeto • Contexto • Realidades Projeção de Finalidades • Finalidade da Escola • Fundamentos da Disciplina Formas de Mediação • Quadro Geral de Conteúdos • Proposta geral metodológica • Proposta de avaliação • Fontes de pesquisa • Interação com outras disciplinas •Integração com atividades extra- classe • Normas estabelecidas • Observações TIPOS DE CONTEÚDO TIPOS DIMENSÃO SIGNIFICADO ABRANGÊNCIA CONCEITUAL “Saber” Representações ou conteúdos de consciência Conhecimento de fatos, fenômenos, princípios, leis, saberes, ideias, imagens, esquemas, informações. PROCEDIMENTAL “Saber fazer” Mecanismos operatórios Domínio de habilidades, competências, aptidões, procedimentos, destrezas, capacidades, pesquisa, desenvolvimento de operações mentais, hábitos de estudo ATITUDINAL “Ser/ Saber ser” Disposições do sujeito; modos de agir; sentir e se posicionar Envolvimento, interesses, atitude, postura, valores, posicionamento, convicções, preocupações, normas, regras, vontades. SAIBA MAIS! Planejamento da Prática Docente (disponível no AVA) PNE_Conhecendo as 20 metas (disponível no AVA) Avaliação Institucional e Educacional “Avaliar para promover” na perspectiva de Hoffman (2003) é avaliação atuando como estratégia pedagógica. Philippe Perrenoud (2004) defende a ideia de que a avaliação deve ser colocada a serviço da aprendizagem. O ato de avaliar envolve diferentes sujeitos e processos avaliativos: a) Relações entre as famílias e a escola; b) Organização das turmas, individualização ; c) Didática, métodos de ensino; d) Contrato didático, relação pedagógica, ofício do aluno ; e) Acordo, controle, política institucional; f) Planos de estudos, objetivos, exigências g) Sistemas de seleção e de orientação; h) Satisfações pessoais e profissionais; Quanto às funções, a avaliação é: Formativa: sustenta a regulação do ensino e da aprendizagem em realização; ela se desenvolve dentro de uma formação escolar. Certificativa: garante aquisições com vistas a terceiros, no mercado de trabalho, a rigor, ao final de um ciclo de estudo; ela intervém ao término de uma formação dada. Prognóstica: fundamenta decisões de seleção ou de orientação em função da aptidão presumida para seguir uma nova formação, por exemplo, uma determinada habilitação do secundário; ela se situa no início de uma formação e subentende uma escolha. A avaliação possui três categorias de usuários cujas necessidades e responsabilidades não são as mesmas: 1. Os que os profissionais precisam para regular as aprendizagens e orientar os percursos de formação. 2. O que se deve dizer aos alunos sobre isso, levando em conta o que eles podem compreender e o que os mobiliza. 3. O que se deve dizer sobre isso a destinatários externos às interações didáticas. Para a prática de avaliação formativa os professores necessitam de ferramentas profissionais avançadas que lhes permitam: 1. Acompanhar a progressão de cada aluno em relação aos objetivos e a sua própria trajetória. 2. Otimizar as palestras do professor, as atividades propostas a cada aluno, fazer parte de grupos de nível ou de necessidade; 3. Pilotar os percursos de formação a prazos mais longos numa lógica de ciclo plurianual. Na prática de avaliação formativa, o professor precisa usar estratégias para informar e mobilizar seus alunos: - Diálogo contínuo e mobilizador no âmbito das atividades de aprendizagens. - Trabalho metacognitivo. - Portfolio de produções e de trabalhos para avaliar o caminho percorrido. Os docentes necessitam de suportes e de modalidades de comunicação que permitam: 1. Dar uma informação regular e sintética sobre a avaliação do aluno, suas aquisições, a distância percorrida e a distância a ser percorrida; 2. De garantir ou de colocar em alerta os pais e responsáveis escolares, para preparar decisões. Em uma abordagem pragmática da avaliação formativa considera-se: - Uma avaliação é definida por seus efeitos. - Não há avaliação formativa sem diferenciação. - Uma concepção ampla da observação. - Uma concepção ampla da intervenção. - Uma concepção ampla da regulação. - Não dissocia a avaliação formativa da didática. - Uma avaliação diferenciada um função das necessidades. - Alia-se intuição e instrumentos. Na prática de observação formativa e regulação há: - A regulação do trabalho do aluno e de seu apoio pelo adulto no âmbito da atividade em curso; - A orientação do aluno a outro grupo e, por conseguinte, a atividades de um outro tipo ou de um outro nível; - A orientação dos percursos de mais longo prazo. A observação formativa passa por balanços provisórios dos conhecimentos, associados às vezes a uma avaliação “microssomativa”; esses balanços criam uma “regulação retroativa”, retomada das lacunas ou das dificuldades, por prognósticos parciais e revisáveis, na medida em que colocar um aluno em uma atividade ou em um grupo é levantar a hipótese de que aí ele terá seu lugar e poderá desenvolver-se aprender; é uma observação posta a serviço do que se chamará “regulação proativa” e por uma análise minuciosa das condições e das modalidades do processo de aprendizagem em curso, que subentende uma “regulação interativa”. AVALIAÇÃO AUTÊNTICA SEGUNDO WIGGINS 1. A avaliação não inclui só tarefas contextualizadas. 2. A avaliação se apoia em problemas complexos. 3. A avaliação deve contribuir para que os estudantes desenvolvam ainda mais suas competências. 4. A avaliação exige a utilização funcional de conhecimentos disciplinares. 5. A tarefa e suas exigências são conhecidas antes da situação de avaliação. 6. A avaliação exige uma certa forma de colaboração com seus pares. 7. A correção leva em consideração as estratégias cognitivas e metacognitivas utilizadas pelos estudantes. 8. A correção só leva em consideração os erros importantes na ótica da construção das competências. 9. A auto avaliação faz parte da avaliação AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO E INSTITUCIONAL “Quando se pensa educação como projeto humano, necessário se faz reconhecer como é importante que professores, pessoal técnico-administrativo e alunos descubram o sentido que as coisas têm para eles.” Joel Martins Avaliar é julgar algo ou alguém quanto ao seu valor. Avalia-se a ação por tudo que a concretiza: as ideias e conceitos, os meios, os instrumentos, os programas, os desempenhos e os resultados. Permanece, ainda, à volta da ideia da avaliação, um espaço ideológico estruturado por dois polos: um polo negativo, organizado em torno das noções de repressão, seleção, controle, e um polo positivo, organizado em torno das noções de progresso, de mudanças... Ao se analisar as profundas transformações ocorridas na avaliação educacional e sua crescente importância, torna-se necessário que os debates, descobertas e avanços extrapolem as suas certezas e sua suposta neutralidade, assumindo uma presença questionadora,não só do como fazer, mas do por que, sem perder de vista o para quem. É necessário, portanto, entender o que está por trás da avaliação que se pretende e a quem ela serve. Sintonizada com as mudanças sociais e com as pesquisas atuais no campo educacional, a avaliação assumo uma postura crítica, visando atender a uma sociedade, cuja organização envolve a cooperação e a reciprocidade. Esta abordagem traz à tona a concepção de espaço dialético, constituído pelo jogo de poder entre o educador e o educando, entre aquele e a escola, entre esta e o sistema de ensino. A avaliação constitui-se em uma janela, através da qual se vislumbra toda a complexa trama educativa e, apesar de seu importante papel, ela não poderá dar conta de todos os problemas do sistema educacional. Ela deverá vir acompanhada de uma série de outras medidas que criem condições que possibilitem o encaminhamento de uma melhoria da qualidade de ensino. Destaca-se uma ressignificação para avaliação, para o currículo, para o papel e significado do professor, da escola e da própria educação. Isso se traduz por pensar a avaliação de modo formativo, diagnóstico, contínuo, crítico, criativo, participativo, por ver o currículo em sua dimensão cultural, por ver o professor em uma atuação crítica, compartilhada, tolerante, valorizado em sua dimensão profissional e agindo em um coletivo, em equipe. AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL A avaliação institucional é o estudo feito para se conhecer as realidades internas e externas que influem no desempenho institucional e no seu posicionamento em relação a sua missão, objetivos propósitos e às instituições. Quanto aos Conceitos /características, a avaliação institucional é: 1 - Modo de estimular o aprimoramento da realização de uma atividade institucional e de evitar que a rotina descaracterize seus objetivos e finalidades. 2 - Instrumento que contribui para o aperfeiçoamento contínuo da instituição. Significa um balanço e um processo de identificação de rumos e de valores diferentes. 3 - Seu traço distintivo é a preocupação com a qualidade, tornando-se um processo contínuo e aberto, mediante o qual todos os setores da instituição e as pessoas que os compõem participem do repensar dos objetivos, modos de atuação e resultados de sua atividade, em busca da melhoria da instituição como um todo. Para avaliar adequadamente a instituição é importante saber o que ela é, o que faz e o modo peculiar como exerce suas funções. A natureza específica da instituição deve determinar o tipo de metodologia que lhe é adequado e coerente. Para realizar a avaliação institucional é necessário mobilizar comunidade de professores, estudantes e servidores da instituição, envolver agentes de toda a comunidade, respeitando a sua diversidade e seus modos diferenciados de inserção na vida profissional, buscar integração e totalidade. A avaliação institucional deve ter como princípios: 1. Respeito à diversidade institucional; 2. Globalidade; 3. Adesão voluntária; 4. Legitimidade; 5. Continuidade; 6. Não punição e premiação; 7. Comparabilidade. Deve resistir aos condicionantes do processo de avaliação institucional: - Medo de mudanças; - Desconfiança de que o projeto seja formalidade sem consequências; - Dificuldade de identificar metas anteriores; - Escassez de dados, de padronização e de organização dos mesmos; - Falta de corresponsabilidade por resultados, estruturas internas burocráticas, anárquicas; - Ceticismo; - Falta de planejamento e dificuldade inerente à instituição para enfrentar conflitos; A prática de avaliação institucional envolve: diagnóstico e auto avaliação, avaliação externa e reavaliação. TIPOS DE AVALIAÇÃO Pelo conteúdo: descritiva, crítica, construtiva e de levantamento. Pela produtividade: global/agregada com detalhamento de algumas áreas selecionadas e detalhadas. Pela dinâmica: 1. Formativa, que contribui para a formação desenvolvimento de um programa. 2. Somativa, que se realiza ao final do processo. 3. Responsiva, que permite descrever e julgar um programa educacional, a partir das informações dadas pelos referentes. Pelos referenciais: internos e externos. Pela iniciativa: interna ou autoavaliação, ou autoestudo e externa. DIMENSÕES E CATEGORIAS DE ANÁLISE CONTEXTUAL: características (missão e estrutura). Administração, políticas de pessoas, incentivos e benefícios. ORGANIZAÇÃO DIDÁTICA-PEDAGÓGICA: administração escolar, projeto- pedagógico, CORPO DOCENTE: formação acadêmica e profissional, condições de trabalho. INSTALAÇÕES: instalações gerais, biblioteca, instalações e laboratórios. ASPECTOS A SEREM AVALIADOS 1. Missão; 2. Ensino; 3. Pesquisa; 4. Relacionamento externo; 5. Corpo docente; 6. Corpo discente; 7. Corpo técnico-administrativo 8- Administração/Gestão Escolar 9- Controle de produto; 10. Organização e sistema; 11. Planejamento e avaliação; 12. Recursos de informação; 13. Recursos de infraestrutura física; 14. Recursos financeiros. PROCESSO E PRODUTOS A liderança institucional deve preparar-se e estabelecer agenda. A avaliação institucional possibilita autoconhecimento, tomada de decisão e construção de identidade institucional. CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AVALIAÇÃO NO COTIDIANO ESCOLAR Cipriano Carlos Luckesi1 1. Hoje, as provas tradicionais perderam espaço para novas formas de avaliação. Isso significa que elas devem deixar de existir ou devem dividir espaço com as novas atividades? A questão básica é distinguir o que significam as provas e o que significa avaliação. As provas são recursos técnicos vinculados aos exames e não à avaliação. Importa ter-se claro que os exames são pontuais, classificatórios, seletivos, antidemocráticos e autoritários; a avaliação, por outro lado, é não pontual, diagnóstica, inclusiva, democrática e dialógica. Como você pode ver, examinar e avaliar são práticas completamente diferentes. As provas (não confundir prova com questionário, contendo perguntas abertas e/ou fechadas; este é um instrumento; provas são para provar, ou seja, classificar e selecionar) traduzem a ideia de exame e não de avaliação. Avaliar significa subsidiar a construção do melhor resultado possível e não pura e simplesmente aprovar ou reprovar alguma coisa. Os exames, através das provas, engessam a aprendizagem; a avaliação a constrói fluidamente. 1 Entrevista concedida à Aprender a Fazer, publicada em IP – Impressão Pedagógica, publicação da Editora Gráfica Expoente, Curitiba, PR, nº 36, 2004, p. 4-6. 2. Li algumas reportagens que defendem que o estudante deve ser avaliado durante todo o processo de ensino-aprendizagem. Mas como é esse trabalho? O ato de avaliar a aprendizagem implica em acompanhamento e reorientação permanente da aprendizagem. Ela se realiza através de um ato rigoroso e diagnóstico e reorientação da aprendizagem tendo em vista a obtenção dos melhores resultados possíveis, frente aos objetivos que se tenha à frente. E, assim sendo, a avaliação exige um ritual de procedimentos, que inclui desde o estabelecimento de momentos no tempo, construção, aplicação e contestação dos resultados expressos nos instrumentos; devolução e reorientação das aprendizagens ainda não efetuadas. Para tanto, podemos nos servir de todos os instrumentos técnicos hoje disponíveis, contanto que a leitura e interpretação dos dados seja feita sob a ótica da avaliação, que é de diagnóstico e não de classificação. O que, de fato, distingue o ato de examinar e o ato de avaliar não são os instrumentos utilizados para a coleta de dados, mas sim o olhar que se tenha sobre os dados obtidos: o exame classifica e seleciona, a avaliação diagnostica e inclui. 3. Como efetivar um acompanhamento individualizado dos alunos diante das condições
Compartilhar