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DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ESCOLAR Edinalva Oliveira E d u ca çã o D IF IC U L D A D E S D E A P R E N D IZ A G E M E S C O L A R E d in al va O liv ei ra Curitiba 2021 Dificuldades de Aprendizagem Escolar Edinalva Oliveira Ficha Catalográfica elaborada pela Editora Fael. O48d Oliveira, Edinalva Dificuldades de aprendizagem escolar/ Edinalva Oliveira. – Curitiba: Fael, 2021. 318 p. il. ISBN 978-65-86557-44-2 1. Distúrbios da aprendizagem I. Título CDD 370.15 Direitos desta edição reservados à Fael. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael. FAEL Direção Acadêmica Francisco Carlos Sardo Coordenação Editorial Angela Krainski Dallabona Revisão Editora Coletânea Projeto Gráfico Sandro Niemicz Imagem da Capa Shutterstock.com/ Batshevs Arte-Final Evelyn Caroline Betim Araujo Sumário Carta ao Aluno | 5 1. Bases biológicas de aprendizagem | 7 2. Neurociência e aprendizagem | 37 3. Dificuldades de Aprendizagem | 67 4. Fatores associados às dificuldades de aprendizagem | 95 5. Transtornos funcionais específicos | 123 6. Transtornos do Desenvolvimento e as Altas Habilidades/Superdotação | 151 7. Fracasso escolar e as práticas pedagógicas | 179 8. A família no processo de aprendizagem | 207 9. Fundamentos teóricos e práticos da aprendizagem | 235 10. Estratégias metodológicas para o atendimento dos estudantes | 263 Gabarito | 291 Referências | 305 Prezado(a) aluno(a), A prática pedagógica coloca o educador diante de amplos desafios. Cada estudante apresenta uma história de vida, que traz consigo implicações, as quais podem contribuir ou afetar o seu modo de aprender e o desempenho dos seus processos cogniti- vos. Nessa dimensão, os capítulos desta obra apresentam subsí- dios relevantes para a compreensão dos caminhos que embasam o processo de ensino-aprendizagem. Carta ao Aluno – 6 – Dificuldades de Aprendizagem Escolar Amparado nos aportes da neurociência contemporânea, são explo- radas as dificuldades da aprendizagem e os fatores a elas associados. Os transtornos funcionais (dislexia, disgrafia, disortografia e discalculia), os transtornos de comportamento (autismo e TDAH), a deficiência intelec- tual e as altas habilidades/superdotação são, entre outros contextos escola- res, interpretados, almejando mitigar seus efeitos sobre o fracasso escolar e ressignificar o papel do educador. A família e sua relação com a escola, na direção dos processos que buscam promover uma aprendizagem significativa, são trazidos em sua amplitude de relevância. Os pilares teóricos e práticos que contribuem para fundamentar as práticas pedagógicas são elencados. A cognição e os estilos de aprendizagem, o planejamento, as estratégias metodológicas e a avaliação são discutidas. Nessa caminhada, são apresentadas ferramentas essenciais para futuros educadores. A obra procura vencer os desafios com primazia, na arte de encantar, temperar e promover a aprendizagem signi- ficativa nos espaços escolares. Edinalva Oliveira 1 Bases biológicas de aprendizagem A aprendizagem é um processo complexo e necessário para que possamos garantir nossa sobrevivência. Uma amplitude de mecanismos está envolvida nela, e argumentações de inúmeros atores de vários ramos do conhecimento científico (pesquisado- res, educadores, biólogos, geneticistas, neurofisiologias, psicólo- gos) são extremamente úteis para reconhecer sua abrangência e relevância individual e social. No espaço educacional, o alicerce para o entendimento do processo de ensino e aprendizagem é o reconhecimento de suas bases ou fundamentos. Entre as áreas que oferecem subsídios para desvelar estes mecanismos está a Biologia Educacional. A compreensão de conceitos, teorias e princípios deste que- bra-cabeça nos dá as ferramentas necessárias para entender nossa essência biológica e como esta exerce papel expressivo em nosso estilo de vida, nossos comportamentos sociais e na determina- ção dos padrões de moralidade. Desta forma, a compreensão das bases anatômicas, fisiológicas, fundamentos da hereditariedade, da genética, do desenvolvimento físico, motor e mental, da nutri- Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 8 – ção, da saúde e do ritmo circadiano nos permitem fazer inferências sobre os mecanismos cognitivos que potencializam a aprendizagem. O propósito deste capítulo é elencar as bases biológicas do desenvol- vimento humano, almejando refletir sobre o papel destas no processo de ensino e aprendizagem. 1.1 Fatores biológicos relacionados ao crescimento e ao desenvolvimento infantil O corpo dos seres humanos, assim como dos demais seres vivos, é composto por milhares de células, que formam a unidade estrutural ana- tômica e fisiológica dos seres vivos. Estas células se agrupam e formam quatro padrões de tecido: o tecido epitelial, o tecido conjuntivo, o tecido muscular e o tecido nervoso. Cada um desses sistemas de células possui formas e funções especializadas, e a integração fisiológica destes tecidos mantém a homeostase ou equilíbrio do corpo. O tecido epitelial apresenta células cilíndricas, achatadas e cúbicas, as quais têm como função revestir diferentes partes do corpo, garantir a sen- sibilidade e secretar substâncias. Há dois tipos de tecido epitelial: tecido epitelial de revestimento e tecido epitelial glandular. No tecido epitelial de revestimento (pavimentoso, colunar ou cúbico) as células se organizam em camadas, podendo ser simples – quando existe uma única camada – ou estratificadas – quando há mais de uma camada. Há ainda células que apresentam diferentes tamanhos e se apoiam na membrana basal, neste caso a camada apresenta uma aparência de epitélio estratificado, sendo denominado tecido epitelial pseudoestratificado. Já o tecido epitelial glan- dular tem como função a formação das glândulas exócrinas e endócrinas do organismo. Como exemplo de glândulas exócrinas, temos as glândulas mamárias, sudoríparas e salivares. Já a tireoide, a hipófise, o pâncreas, as adrenais e as supradrenais são exemplos de glândulas endócrinas. O tecido conjuntivo apresenta uma grande quantidade de matriz extra- celular e é constituído de fibras com dois tipos de proteínas: o colágeno e a elastina. Entre as funções deste tecido destacam-se a sustentação, o preen- chimento, a cicatrização e o transporte de substâncias corporais. Além disso, esse tecido pode ser especializado na execução de determinada função: – 9 – Bases biológicas de aprendizagem a) tecido adiposo – composto de células capazes de acumular adipócitos (gordura), cuja principal função é garantir o isola- mento térmico do corpo e a reserva de energia; b) tecido cartilaginoso – flexível e de consistência firme, sua função é a sustentação e o revestimento de regiões como a orelha e o nariz; c) tecido ósseo – caracterizado por ser rígido e rico em sais mine- rais, cálcio e colágeno, o que lhe confere alta resistência; sua função é a sustentação do corpo; d) tecido sanguíneo – formado pela união de vários tipos celula- res (hemácias, leucócitos, plaquetas e plasma); é responsável por transportar nutrientes e defender o organismo; e) tecido hematopoiético – tem como função a produção da linfa e das células sanguíneas; está inserido no interior de alguns tipos de ossos, originando a medula óssea vermelha; f) tecido conjuntivo – exerce a função de preenchimento dos espaços entre os órgãos e os tecidos, oferece suporte a estrutu- ras como nervos, vasos sanguíneos e epitélios. g) tecido muscular – é inervado e vascularizado, formado por células especializadas na contração. Pode ser diferenciado em três tipos: 2 tecido muscular liso - executa os movimentos involuntá- rios; suas células são mononucleadas e alongadas; 2 tecido muscular esquelético - excuta os movimentos volun- tários; suas células apresentam miofibrilas, que são fibras contráteis responsáveis pela contração muscular; 2 tecido muscular cardíaco - encontrado nocoração, executa movimentos involuntários; suas células são longas e cilín- dricas, unidas entre si por discos intercalares, as quais são responsáveis pelas conexões elétricas, e estas possibilitam a contração cardíaca por meio de sinapses elétricas. h) tecido nervoso – é altamente especializado no processamento de informações; suas células são responsáveis pela recepção (afe- Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 10 – rência), interpretação (associação) e respostas (eferência) aos estímulos do organismo. Há, basicamente, dois tipos celulares: 2 neurônios - que transmitem as informações através de impul- sos elétricos e de mediadores químicos (neurotransmissores); 2 células da glia ou neuróglia - cuja função é proteger e nutrir todo o sistema nervoso, contribuindo ainda para a regulação das sinapses e para a transmissão de impulsos elétricos. Embora tenhamos apontado diferenças consistentes entre os tipos celulares presentes no corpo humano, há similaridades estruturais entre estas variedades. Todas as células são compostas por membrana, cito- plasma com várias organelas citoplasmáticas e o núcleo perfeitamente diferenciado e delimitado pela carioteca. No núcleo encontram-se os vinte e três pares de cromossomos, à exceção dos gametas (óvulos e espermatozoides), que apresentam apenas um dos pares de cromosso- mos. O conjunto destes cromossomos forma o genoma humano, também denominado de cariótipo, e este nos diferencia dos demais componentes da Biodiversidade do planeta. Além disso, essa é a herança genética herdada de nossos progenitores ao longo de inúmeras gerações. Desde o par número 1 até o par número 23, cada cromossomo apre- senta milhares de genes, sendo ainda a totalidade diferente em cada par. Um gene é formado pelo DNA (Ácido Desoxirribonucleico) e proteínas associadas no complexo cromatina e histona. Basicamente, os genes contêm um código de instruções para produzir uma proteína que exe- cuta uma função específica no corpo. Desta forma, todas as atividades desempenhadas pelo nosso corpo são realizadas com o amparo direto ou indireto de mecanismos codificados em bases genéticas. Noutras pala- vras, o que somos tem origem em nossos genes, e o nosso crescimento e desenvolvimento insere-se nesse contexto. Nesse entendimento, o crescimento tem nuances quantitativas, e o desenvolvimento tem nuances qualitativas. Entretanto, ambos são resul- tados da ação de determinados genes sobre o corpo. Portanto, cabe-nos distinguir adequadamente cada um destes para perceber sua extensão no organismo. Entender a amplitude desses processos nos possibilita com- preender a dinâmica do sujeito ao longo de sua história de vida. – 11 – Bases biológicas de aprendizagem O crescimento se refere à multiplicação celular. Por meio dele ocorre um aumento na dimensão das estruturas corporais, sendo possível men- surá-lo. Em nossa espécie, durante a infância e a adolescência, são maiores as evidências deste fenômeno no organismo, todavia é importante salientar que a multiplicação celular se estende ao longo de toda a vida do indiví- duo. O acompanhamento periódico do crescimento possibilita a avaliação do progresso da criança e permite o diagnóstico de alterações expressivas. Desta forma, pode-se reconhecer riscos à saúde, como morbimortalidade, e prevenir precocemente a desnutrição, entre outras patologias. O desenvolvimento se refere a alterações de nível funcional e adap- tativo na amplitude de determinadas habilidades. Estas capacidades ficam evidentes em diversas áreas das habilidades motoras - apropriação de movi- mentos, tais como andar, correr, pular, controle e destreza manual; habi- lidades cognitivas - capacidade de raciocínio e resolução de problemas; habilidades de linguagem - capacidade de reconhecimento e domínio da linguagem; habilidades psicossociais - capacidade de interação social. Há uma estreita relação entre a arquitetura cerebral, os processos interativos, a herança genética e as influências do meio ambiente e social no qual o indi- víduo se insere. Todas elas afetam de forma expressiva o desenvolvimento, salientando ainda que este processo é contínuo, dinâmico e progressivo. De acordo com Rodovalho et al. (2012), a partir da observação do crescimento e do desenvolvimento da criança e do adolescente, obtemos subsídios para o entendimento dos contextos relativos à sua atenção no que tange à sua saúde integral. Considerando os aspectos biológico, afe- tivo, psíquico e social, entendemos o papel do ambiente de vida na forma- ção do sujeito. Nesse entendimento, se reconhece que todo ser humano, ao nascer, apresenta uma formação genética, entendida como seu genoma e constituída por seus cromossomos. Esse potencial genético é um fator relevante para o crescimento e desenvolvimento. Esta percepção é reco- nhecível quando observamos similaridades entre pais e filhos. Entretanto, esse potencial poderá ou não ser alcançado, dependendo das condições de vida que são oportunizadas. Em muitos casos, a influên- cia dos fatores ambientais exerce preponderância sobre os fatores gené- ticos de cada sujeito. O nível socioeconômico, os aportes nutricionais, Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 12 – assim como as carências neste campo exercem influência direta no cresci- mento e no desenvolvimento do indivíduo. As oportunidades de interagir e manipular objetos podem ser ponto-chave no desenvolvimento neurop- sicomotor da criança e do adolescente. A aprendizagem é um processo mais intimamente relacionado ao desenvolvimento do que ao crescimento. Essencialmente, aprender implica na aquisição de novos comportamentos ou condutas. Nessa perspectiva, o comportamento pode ser compreendido como um con- junto de respostas motoras frente a determinado estímulo interno ou externo e, ainda, um contexto situacional. Desta forma, a aprendiza- gem sugere o reconhecimento de avanços na capacidade motora. Assim sendo, gradativamente, à medida que interagimos com o ambiente, vamos sendo capazes de resolver situações-problema cada vez mais elaboradas e complexas. A aprendizagem se dá de forma consciente e voluntária, com o sis- tema nervoso exercendo papel preponderante no desencadeamento de todos os comportamentos aos quais ela se refere. Uma das questões mais preponderantes do ato de aprender é sua relação com a cognição, que pode ser descrita como a apropriação de conhecimentos. Aprender vai muito além de executar atividades escolares, quaisquer que sejam estas (reconhecer símbolos de linguagem, aplicar adequada- mente códigos, memorizar informações). A capacidade de aprender está presente em toda nossa existência, ela nos permite interagir com nossos contextos cotidianos. A criança aprende a respirar, caminhar, falar, julgar, ter sentimentos, emoções e a controlá-los. Do mesmo modo, andar de bici- cleta, resolver problemas ou realizar cálculos complexos são facetas da aprendizagem perceptíveis no ser humano. Todos estes contextos afetam a vida do sujeito – seus gostos, medos, crenças, opiniões – e estão, de certa forma, associados ao seu aprender. Nessa interpretação, torna-se evidente que o processo de aprendiza- gem tem uma natureza individual, que se promove no contexto social e cultural no qual a criança cresce. De fato, o aprender resulta dos processos cognitivos de cada sujeito, mediante os quais ele se apropria de novas informações (fatos, conceitos, princípios, teorias, valores, procedimen- – 13 – Bases biológicas de aprendizagem tos), constrói novas representações mentais significativas e funcionais (cognição) aplicáveis a outros momentos ou situações. Nesse sentido, aprender não é somente memorizar informações, implica também em utilizar ou aplicar o que foi aprendido noutras rea- lidades ou operações cognitivas. Consequentemente, conhecer, com- preender, aplicar, analisar, sintetizar e valorizar são partes componen- tes da aprendizagem. Uma certeza em todas estas interpretações é a de que a aprendizagem é um processofuncional desenvolvido no nível de sistema nervoso, sendo o cérebro o órgão de maior significância na dimensão do aprender. Portanto, a aprendizagem afeta o comportamento, de forma a conso- lidar as condutas ou ações. Nossas experiências cotidianas influem sobre nossa aprendizagem, e esse processo gradualmente implica em modifica- ções nos nossos modos de interagir com nossa realidade. Nossas experi- ências de vida nos possibilitam armazenar informações, modificar nossa forma de perceber, pensar e planejar nossas ações. Esses referenciais são cruciais para o enfrentamento de nossas demandas presentes e futuras, em cada momento de nossa existência. Adicionalmente, é importante compreender que a aprendizagem é um processo dinâmico, e, desta forma, suscetível de ser revisado e reor- ganizado conforme as vivências que desencadeamos em nossa realidade. Basicamente, há quatro componentes fundamentais que podem interferir ou atuar como variáveis intervenientes no processo de aprendizagem. São estes: a atividade fisiológica do sistema nervoso, os dispositivos essenciais de aprendizagem, as funções cerebrais cognitivas superiores e o equilíbrio afetivo/emocional. A atividade fisiológica do sistema nervoso resulta de mecanismos anatomofisiológicos realizados por células nervosas, baseadas no desen- volvimento de sinapses elétricas e químicas, em diferentes áreas do sis- tema nervoso, com destaque especial para áreas do córtex. Dentre estes, citam-se os reflexos condicionados – que compreendem respostas parti- culares a certos estímulos – alimentar, de defesa e sexual, por exemplo. Nestes casos, nosso corpo se condiciona a produzir respostas biológicas, que correspondem, respectivamente, à salivação ao sentir olfativamente Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 14 – certo alimento ou ao nos lembrarmos de estar degustando-o; ao ato de nos esquivarmos quando eventualmente algo é jogado contra nosso corpo; ou ainda ao fato de nos excitarmos ao pensar na pessoa amada. Todavia, estes exemplos podem ser suprimidos pela atividade nervosa de inibição, que atua bloqueando o reflexo condicionado. Os dispositivos essenciais e indispensáveis à aprendizagem correspondem a capacidades como motivação, atenção, percepção, memória sensorial, procedimental e cognitiva. Entendem-se por fun- ções cerebrais cognitivas superiores três amplas capacidades cerebrais: gnosia ou conhecimento (aprendizagem sensorial e perceptiva), prá- xis (habilidade de apropriação ou aprendizagem motora) e linguagem (compreensão e domínio de códigos e símbolos). Estas funções são apropriadas por meio dos processos de aprendizagem. Eventualmente, podem ocorrer alterações nos mecanismos de apropriação, e este fato desencadeará transtornos específicos, capazes de comprometer o modo como o sujeito irá aprender. Nessa perspectiva, é ainda importante considerarmos que o equilí- brio afetivo e emocional desempenha papel relevante para que a apren- dizagem se processe de forma integral, e a motivação e a memória estão associadas a este equilíbrio. A atividade cognitiva inclui diversos mecanismos de alta complexidade, e cada estrutura desses mecanismos atua como variável interveniente no processo de apropriação de conhe- cimentos, que se consolidam, a seguir, na memória. Buscando ampliar o entendimento, é fundamental compreender como a nutrição, o sono e a prática de atividades físicas podem atuar na dinâmica do crescimento e do desenvolvimento. Saiba mais Biologia educacional. Autora: Maria Ângela dos Santos (Editora Ática, 2009). Este livro apresenta fundamentos sobre a biologia humana, consi- derando aspectos como crescimento, desenvolvimento, nutrição e saúde, e importância da prevenção dos agravos à saúde, para que se possa obter o equilíbrio necessário para o favorecimento da aprendizagem.. – 15 – Bases biológicas de aprendizagem 1.2 Nutrição, sono e atividade física: pilares cognitivos A infância é um período importante da nossa vida; durante essa fase se desenvolve a maior parte de nossas capacidades e potencialidades, e, para que esta se estabeleça de forma adequada, é crucial que sejam atendidas as necessidades básicas do corpo: nutrição e sono, em especial. Além desses dois elementos, é extremamente relevante que o corpo seja diariamente estimulado à prática de atividades físicas. O conjunto des- tas bases oferece os subsídios para que o nosso corpo consiga dinamizar nossa sobrevivência e executar as tarefas do cotidiano. O entendimento do contexto relativo a estes pilares será discutido na sequência. Um primeiro esclarecimento a ser apresentado está relacionado aos termos alimentação e nutrição. O primeiro envolve hábitos culturais, regio- nais e familiares, os quais são perpetuados através dos tempos e sofrem influência midiática, de forma preponderante. É evidente que a falta de informação correta, a problemática da distribuição inadequada de alimen- tos, o bombardeio de marketing da indústria alimentícia por meio, prin- cipalmente, dos meios de comunicação, aliados à ansiedade e ao estresse da vida moderna, bem como o crescente tamanho das porções ingeridas, o advento dos fast foods, os processos de refinamento dos alimentos e a diminuição do consumo de alimentos in natura afetam sobremaneira a formação dos hábitos alimentares. O segundo termo, nutrição, é entendido como a dimensão dos pro- cessos pelos quais o organismo recebe, utiliza e elimina os nutrientes que ingere. Nesse sentido, a digestão, a absorção dos nutrientes, o transporte através da corrente sanguínea, a entrada no interior das células pelos mecanismos de seletividade de membrana, o armazenamento, a mobiliza- ção das reservas, as transformações, a utilização, e, por fim, a degradação e a eliminação, são diferentes etapas do ato de nutrição, desencadeados em nosso corpo. Simplificadamente, reconhecemos que a alimentação, em seu sentido estrito, é o processo pelo qual extraímos do mundo exterior os alimentos – o ato de comer. Já a nutrição é um processo primordialmente fisiológico e essencial para a manutenção da vida; envolve nossa capacidade de obter Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 16 – energia, metabolizá-la e aplicá-la na execução de nossas atividades, desde as mais simples até as mais complexas ou elaboradas. A base da nutrição é a obtenção da energia de que necessitamos e que consumimos continuamente, pois, diferentemente dos seres autotró- ficos – que são capazes de sintetizar energia de componentes inorgânicos –, somos organismos heterotróficos – precisamos ingerir componentes orgânicos e inorgânicos para obter energia. Nossa dieta é onívora, e, por isso, estamos numa posição privilegiada da cadeia alimentar, uma vez que contamos com uma variedade de ofertas capazes de nos servir como ali- mentos e de onde podemos obter nutrientes para nosso metabolismo. Consequentemente, é importante compreender a natureza total do metabolismo. O metabolismo inclui o conjunto de processos químicos que acontecem no nível celular e tecidual, responsável por transformar os nutrientes absorvidos dos alimentos em energia, ou por reparar as perdas do organismo. Duas etapas estão inseridas neste conjunto: o ana- bolismo por meio do qual os nutrientes são absorvidos dos alimentos e utilizados para a formação de substâncias necessárias ao crescimento ou para a reparação de perdas do organismo, e o catabolismo, por meio do qual os nutrientes absorvidos dos alimentos são utilizados e têm como resultado a liberação de energia necessária para que o organismo realize suas funções. Nesse contexto, os alimentos e nutrientes são processados metabo- licamente, resultando na formação da molécula ATP (Adenosina Trifos- fato), que corresponde ao nosso combustível de natureza biológica, funda- mental ao corpo durante toda a vida. Por exemplo: uma criança, ao nascer, tem, em média, 3,5 quilogramas de peso corporal, e o comprimento, em média, é de 45 centímetros. Com 12 meses, o peso médioé de cerca de 10 quilogramas, e o comprimento médio, de 75 centímetros. As diferenças nestas proporções são atribuídas aos ganhos e perdas obtidos durante esse espaço de tempo, em função do seu metabolismo. Além disso, diferen- tes fatores contribuem para acelerar ou diminuir o processo metabólico, inclusive a questão genética. Desta forma, é importante considerar a natu- reza dos alimentos e a quantidade destes em relação ao consumo diário. O crescimento e o desenvolvimento estão atrelados ao suporte oferecido pela alimentação. – 17 – Bases biológicas de aprendizagem Representamos os alimentos na Pirâmide Alimentar, na qual estão presentes todos os grupos alimentares, obtidos de procedência segura, consumidos nas refeições diárias, respeitando-se as diferenças individu- ais, emocionais e sociais (BRASIL, 2012). Deste modo, é fundamental que haja um planejamento para uma ali- mentação saudável, com variedade, equilíbrio e moderação. Por variedade entende-se o fornecimento de uma ampla diversidade de alimentos, dia- riamente, pois é evidente que não há um alimento completo, capaz de for- necer todos os nutrientes necessários para a boa nutrição e manutenção da saúde. O equilíbrio retoma a quantidade adequada nas diferentes refeições do dia, em porções recomendadas de cada um dos diferentes grupos ali- mentares, provendo calorias e nutrientes necessários. A moderação inclui o controle no consumo dos alimentos, em especial gorduras, açúcares, sal e quantidade de calorias. A composição da Pirâmide Alimentar pode ser didaticamente estru- turada em cinco níveis. Em cada um deles, seus constituintes devem ser ingeridos em porções reguláveis, conforme a idade, estrutura corporal, sexo, atividades físicas e condições gerais de metabolismo. A sistematiza- ção desta pirâmide tem a intencionalidade de prevenir excessos e carên- cias nutricionais. Além disso, busca-se essencialmente a proporcionali- dade nos três quesitos: variedade, equilíbrio e moderação (BRASIL, 2014; OMS 2020). A base da pirâmide está composta pela necessidade da água e outros líquidos, aliados à prática de atividades físicas. A água é um elemento essencial a todas as nossas células, sendo fundamental para a manuten- ção da saúde e para a nossa sobrevivência. Seu papel é funcionar como um solvente na dinâmica do metabolismo dos sistemas e órgãos, bem como de ser um meio de transporte e regular a temperatura corporal. A melhor forma de ingerir água é ao natural, porém ela também pode ser ingerida em outras bebidas, desde que sem adição de açúcar, álcool ou cafeína; nas sopas também temos boas quantidades de água. A quanti- dade de água consumida varia de acordo com as nossas atividades físicas e com a temperatura ambiental e do nosso corpo, pois, nos processos fisiológicos, ela auxilia no equilíbrio térmico; o volume diário recomen- dado é cerca de dois litros. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 18 – O segundo nível e constituído por cereais, raízes, tubérculos e os óleos vegetais. Os alimentos preparados com base nestes elementos são: pães, farinhas, massas, bolos, biscoitos, cereais matinais, arroz, feculentos e batatas. Por oferecerem nutrientes energéticos e serem fontes de carboi- dratos, seu consumo deve ser priorizado, pois fornecem energia ao orga- nismo, sendo ainda ricos em fibras e vitaminas do complexo B. A quanti- dade oscila entre cinco porções, no mínimo, e nove porções, no máximo. O terceiro nível está dividido em dois grandes grupos: hortaliças e frutas. As hortaliças e as verduras estão em um grupo cuja quantidade de consumo oscila entre quatro porções, no mínimo, e cinco porções, no máximo. O consumo de frutas oscila entre três porções, no mínimo, e cinco porções, no máximo. Um aspecto importante neste nível é a neces- sidade da diversidade de cores inseridas em nossa dieta. A representação variada de cores está associada às propriedades nutricionais, pois todos estes alimentos são fontes de proteínas, vitaminas e fibras. O quarto nível está dividido em três grupos: carnes, lacticínios e legu- minosas/oleaginosas. O primeiro inclui carne bovina, suína, de aves, peixes, ovos, miúdos e vísceras; seu consumo varia entre uma porção, no mínimo, e duas porções, no máximo. O segundo grupo corresponde aos laticínios, dentre os quais o leite merece atenção especial, por ser fonte de cálcio e outros micronutrientes fundamentais, na infância, para dar firmeza aos ossos. Todavia, o consumo dos lacticínios é fundamental em todas as fases da vida. Na infância, três porções diárias de leite, em média, resultam na assimilação de 800 mg de cálcio, suficientes para cobrir as necessidades exi- gidas. Em adolescentes e adultos, esse volume é também importante, mas, muitas vezes, outros lacticínios substituem o leite nessas fases; o consumo varia entre duas porções, no mínimo, e três, no máximo. O terceiro e último grupo é o das leguminosas e oleaginosas, e inclui feijões, soja, ervilha, grão- -de-bico, fava, amendoim, nozes e castanhas – todos com alto valor energé- tico. Têm seu consumo habitual limitado a 1 porção. O quinto e último nível está dividido em dois grupos: os óleos e gor- duras num extremo, e, no outro, os açúcares e doces. Ambos são alimentos energéticos extras, fontes importantes de vitaminas lipossolúveis A, D, E e K. Estas vitaminas são necessárias para as reações energéticas e ainda regulam as funções celulares, principalmente desencadeadas pelo sistema – 19 – Bases biológicas de aprendizagem imunológico, que protege o corpo de agentes infecciosos. Além disso, estes alimentos fornecem lipídeos e ácidos graxos essenciais. O consumo recomendável é de uma porção, no mínimo, e duas, no máximo, devido ao alto valor calórico total desses alimentos. Dentre os ácidos graxos, alguns são considerados essenciais ao meta- bolismo, e são necessários para certas etapas dos processos biológicos, uma vez que não são produzidos pelo nosso metabolismo, e, portanto, devem ser consumidos em nossa dieta. Fazem parte desse grupo os ácidos graxos ômegas 3, 6 e 9, os quais são encontrados principalmente em pei- xes e óleos vegetais. As principais funções biológicas destes ácidos graxos essenciais são relativas à produção de componentes estruturais das células, ação anti- -inflamatória, melhora do humor, além de ajudarem a regular os níveis de colesterol. Particularmente os ácidos graxos do tipo ômega 6 afetam a habilidade dos neurônios em utilizar a glicose. Baixos níveis de ômega 3 podem causar deficiências visuais e a sua ausência pode causar problemas no aprendizado, motores e de motivação. O ômega 9 é um ácido graxo não necessariamente essencial, pois é passível de ser produzido por nosso corpo. Todavia, sua produção depende da presença de boas quantidades de ômegas 3 e 6. É uma gordura monoin- saturada, também denominada ácido oleico. O principal papel biológico do ômega 9 está relacionado a níveis de triglicerídeos mais saudáveis, além de ajudar na diminuição dos níveis de colesterol total sanguíneo, LDL (colesterol ruim), e de aumentar o HDL (colesterol bom). Embora desempenhe um papel menor do que os ômegas 3 e 6, o ômega 9 é importante para o corpo. Ele produz um efeito positivo sobre a saúde, promovendo respostas saudáveis a inflamações no interior do corpo. Por fim, os ácidos graxos, em sua amplitude, afetam todo o nosso corpo. No sistema nervoso, a composição dos neurotransmissores dopamina e seroto- nina, desencadeada no córtex frontal, depende destes ácidos. O mecanismo de cognição e, em essência, de aprendizagem, ocorre no nível cerebral somente na presença desses neurotransmissores, entre outros. No segundo grupo do quinto nível estão os açúcares e os doces em variedades, os quais são considerados alimentos energéticos extras, e esta Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 20 – indicação ressalta o fato de que deles provêm muitas calorias e poucos nutrientes. Por conseguinte, devem ser consumidos com atenta modera- ção. Oconsumo exagerado destes alimentos pode conduzir ao aumento de gorduras trans no corpo, as quais aumentam o colesterol LDL (lipoprote- ína de baixa densidade, também chamado de colesterol ruim) e diminuem o colesterol HDL (lipoproteína de alta densidade, também chamado de colesterol bom) no sangue. Independentemente dos níveis ou grupos de alimentos, é importante considerar que seu consumo diário deve estar distribuído nas refeições ao longo do dia, principalmente na forma natural e integral. Noutras palavras, deve-se evitar o consumo de alimentos processados ou, ainda, os embu- tidos, pois, em grande parte desses alimentos ou daqueles ricos em aditi- vos alimentares são adicionados componentes especiais, visando ampliar odores, melhorar a aparência, adicionar sabor e aumentar sua longevidade para o consumo. Além disso, o elevado consumo destes alimentos pode gerar um acúmulo de gordura corporal, conduzindo à obesidade. Desse modo, é crucial o incentivo à alimentação saudável. O crescimento e o desenvolvimento recebem fortes influências da nutrição; os hábitos alimentares adequados na infância interferem dire- tamente na qualidade de vida do indivíduo ao longo de toda a sua vida. Um dos pontos de maior expressividade da alimentação em nosso meta- bolismo é o fato de o sistema nervoso e o cérebro, de forma preponde- rante, receberem, por meio da alimentação, os nutrientes necessários ao seu pleno desenvolvimento. A estruturação da memória (sensorial, motora, de longo prazo ou cognitiva) é o resultado de interações ativadas por conexões das redes neuronais. Nessa compreensão, os alimentos são convertidos, pelo meta- bolismo celular, no sistema nervoso, em neurotransmissores, e esses são responsáveis pela atividade cerebral – as interações neuronais ou sinapses que controlam nossas ações e pensamentos. Quando uma informação é recebida pelo sistema sensorial, e condu- zida até o nosso cérebro para que seja associada, interpretada e codificada, nossas células nervosas desempenham diferentes processos metabólicos. Nessa dimensão, neurotransmissores e proteínas são ativados nos neurônios – 21 – Bases biológicas de aprendizagem por meio de mecanismos amparados por genes. Proteínas são produzidas e encaminhadas para as conexões ou sinapses, que se estabelecem entre os neurônios. Essas proteínas servem ao reforço e à construção de novas sinap- ses, e o sistema, como um todo, mantém sua integridade estrutural. A ingestão de gorduras trans e outros aditivos químicos em excesso afetam o desencadeamento das sinapses. Há casos em que ocorre uma intoxicação das células nervosas, gerando inclusive a morte celular, tam- bém chamada de apoptose. A perda de neurônios e neuróglia certamente gera um comprometimento no desempenho do sistema nervoso, afetando os processos interativos com o meio ambiente. Em casos mais graves, pode causar demência, déficit de atenção, ansiedade e até depressão. A aprendizagem, sob o ponto de vista neuronal, compreende o desen- volvimento e a manutenção das conexões (sinapses) entre as células do sistema nervoso. O desencadeamento das memórias pretéritas e novas formam uma rede específica de neurônios, e a manutenção desta rede é elaborada em diversas estruturas do sistema nervoso, com maior destaque para o cérebro, principalmente no hipocampo e no córtex. Além de todos os elementos relativos à alimentação, outro contexto extremamente relevante em nossa rotina diária é o sono. Esse processo é fundamental para a consolidação de nossas memórias, entre outras ativi- dades de nossa dinâmica de vida. A visão binocular, a termorregulação, a conservação e restauração da energia, bem como os processos metabólicos na atividade cerebral estão todos correlacionados ao sono, na amplitude de nosso ritmo circadiano, na dimensão do ciclo sono/vigília (MAGA- LHÃES; MATARUNA, 2007). O corpo humano apresenta ritmos biológicos endógenos, os quais estruturam o que se denomina de mecanismos de relógio biológico interno. O funcionamento destes mecanismos permite que o organismo se adapte e até antecipe as respostas diante de estímulos externos. Os rit- mos biológicos ocorrem em todos os seres vivos e são desencadeados em diferentes períodos, podendo ou não apresentar uma relação com os ciclos ambientais induzidos pelos movimentos de rotação e translação da Terra, bem como pelos ciclos lunares, que se alternam nas diferentes fases de nosso satélite. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 22 – Ritmos biológicos com período de recorrência ligados à rotação terrestre são de aproximadamente 24 horas de duração e são designados por ritmos circadianos. Em nosso metabolismo, a concentração de hormônios como o cortisol apresenta sincronicidade com este evento. Por exemplo: o pico, ou o registro dos maiores índices de cortisol na corrente sanguínea ocorre nas pri- meiras horas da manhã e cai ao longo do dia. Este hormônio tem como função auxiliar o organismo no controle do estresse, reduzir inflamações, contribuir para o funcionamento do sistema imunológico e manter os níveis de açúcares na corrente sanguínea, assim como regular a pressão arterial. No nível celular, os ritmos circadianos são desencadeados por genes que respondem ao nosso relógio biológico, influenciando nas funções metabólicas. O temporizador ou oscilador circadiano central que regula o ciclo sono/vigília está presente no sistema nervoso central, mais especi- ficamente no núcleo supraquiasmático do hipotálamo, e este está relacio- nado de forma direta a outros temporizadores noutras regiões do corpo, como tecidos periféricos, fígado, intestino e tecido adiposo. Todos os ciclos circadianos estão sincronizados por fatores externos, sendo que o fotoperiodismo decorrente da alternância dia/noite ou a pre- sença da luminosidade (luz solar) é o principal indutor do sistema circa- diano, que auxilia na regulação do metabolismo para manutenção a home- ostase corporal. O sono, por si só, é um estado comportamental complexo; essa condição fisiológica de atividade cerebral é natural e periódica. Além da luz, a melatonina, hormônio produzido pela glândula pineal, ajuda a regular o sono. O estado de sono é caracterizado pela modificação do estado de cons- ciência, redução da sensibilidade aos estímulos ambientais, acompanhados por características motoras e posturais próprias. O sono em sua dimensão normal apresenta duração variável ao longo do desenvolvimento humano. Na infância, as variações na quantidade de sono são maiores e dimi- nuem gradativamente ao longo de nosso ciclo de vida. Ao nascermos, pre- cisamos, em média, de 16 horas de sono por dia. Ao final de nosso primeiro mês, a média cai para 14 horas de sono, e, por volta do sexto mês, em torno de 12 horas é nossa média diária. Após este período, a média de horas de sono necessárias cai cerca de trinta minutos ao ano até os cinco anos. – 23 – Bases biológicas de aprendizagem Na vida adulta, a quantidade de sono igualmente decai e varia em função da idade e de fatores externos. O estresse das atividades diárias, dores, uso de medicações e diferentes condições de saúde são alguns dos fatores que podem afetar a quantidade e a qualidade do sono. É natural que, com o avanço da idade, ampliem-se as perdas na duração, manuten- ção e qualidade nosso sono. Basicamente, o sono é composto por grandes fases denominadas de sono REM e não REM, também conhecidas por sono paradoxal e não paradoxal. O termo REM é uma sigla ou abreviação de Rapid Eye Move- ment, de origem na língua inglesa, cujo significado corresponde à “Movi- mento Rápido dos Olhos”. Essa denominação se atribui ao fato de que nessa fase o sono é marcado por um intenso movimento ocular, acompa- nhado por uma atividade cerebral intensa. Além disso, nesta fase ocorre o descanso profundo, fundamental para a recuperação da energia física que o corpo consumiu durante a vigília. O termo não REM, equivalentemente refere-se a Not Rapid Eye Movement, ou seja, “MovimentoNão Rápido dos Olhos”. Nesta fase ocorre o relaxamento muscular, manutenção do tônus, progressiva redu- ção de movimentos do corpo, respiração e batimentos cardíacos regulares. Essa fase do sono é dividida em quatro estágios, e cada um deles é essen- cial para a qualidade do sono. O primeiro estágio é superficial e rápido. Mergulhados no sono, vol- tamos à vigília e podemos ser despertados com facilidade. Uma pessoa neste estágio de sono e examinada por um método de monitoramento por eletroencefalografia, demonstra atividade elétrica do cérebro, com ondas de baixa amplitude e frequência de 3 a 7 ciclos por segundos ou simples- mente Hertz; estas ondas são chamadas teta. O movimento ocular é muito lento e a atividade muscular torna-se gradualmente mais lenta. O segundo estágio induz ao cessar dos movimentos oculares e cor- poral, com o relaxamento dos músculos esqueléticos acompanhado por ondas cerebrais mais lentas. Ocasionalmente, estas ondas se distribuem em surtos de cinco a sete, com intervalo de frequência de ondas de 12 a 15 Hertz, que oscilam, crescendo-decrescendo. Estas variações marcam os chamados fusos de sono. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 24 – O terceiro estágio é marcado pelo aparecimento de ondas extrema- mente lentas, oscilando entre 0,3 e 2 Hertz, as quais são denominadas ondas delta e são intercaladas por ondas menores e mais rápidas. No quarto estágio, as ondas são quase que exclusivamente de frequência delta. Não há movimento ocular ou atividade muscular neste estágio do sono Não REM – é o sono profundo, de ondas mais lentas e está relacionado com a manutenção e restauração do sistema imunológico, havendo um aumento do fluxo sanguíneo na área do cérebro – o que desencadeia processos de memória e aprendizagem. Além disso, há um pico de liberação de hormô- nio do crescimento, leptina e cortisol para o fluxo sanguíneo. Diante do exposto, reconhecemos que o sono no ritmo circadiano não é um estado homogêneo. As fases REM e não REM se processam numa condição especial ativa, gerada por regiões específicas do sistema nervoso, especialmente o cérebro. Estas fases são de ocorrências cíclicas, alternando-se entre atividade menor (fase de sono não REM) e maior (fase de sono REM). A manutenção da vida é totalmente dependente deste ciclo de sono, pois passamos quase um terço de nosso ciclo de vida dormindo, e a qualidade de vida, a saúde e até a longevidade frequentemente depen- dem de boas noites de sono. Iniciamos o sono na fase não REM, seguindo-se o desenvolvimento dos quatro estágios. Posteriormente, se desenvolve o estabelecimento do sono REM. Durante a noite ocorre uma alternância destas fases, de modo que, ao final, a totalidade de horas de sono não REM corresponde a cerca de 75% da noite, ao passo que a fase de sono REM, em sua totalidade, preenche 25% da noite. Quando alguém, eventualmente, é privado de sono em seu ritmo cir- cadiano, muitos problemas ocorrem em razão deste fato. A insônia é um exemplo desta eventualidade, sendo caracterizada como um dos principais distúrbios da qualidade do sono. Os mecanismos pelos quais a privação do sono compromete diversas funções do organismo e desencadeiam diversas alterações cognitivas, psicológicas, hormonais e físicas são complexos. No contexto das alterações cognitivas, o armazenamento de infor- mações ou a memorização dos fatos, eventos e informações vivenciados durante a vigília sofrem muitos prejuízos no seu processo consolidativo. – 25 – Bases biológicas de aprendizagem Certamente que estes contextos comprometerão o aprendizado. Paralela- mente, o aumento na quantidade de sono REM favorece a consolidação do aprendizado e fixação da memória. Para além da alimentação e do sono, outro aspecto que exerce ampla influência sobre a nossa vida diária e pode afetar a aprendizagem é o contexto das atividades físicas. Estar em movimento é uma prerroga- tiva da vigília que promove a aprendizagem motora do corpo. Diferentes ações que acontecem conosco desde o nascimento, e que se estendem até a morte, estão ligadas ao desenvolvimento motor. Em nosso ciclo de vida ocorrem mudanças periódicas nestas ações, em harmonia com as exigências desencadeadas pelas tarefas motoras de nossa rotina (OLI- VEIRA et al. 2017). A prática diária de atividades físicas assume magnitude ímpar em nossa vida, em vários aspectos e dimensões. O adequado desenvolvimento motor é um dos alicerces da vida, pois é por meio dos movimentos que interagimos com o ambiente ao nosso redor. À medida que uma criança interage com o meio, ela vai reconhecendo seu espaço, crescendo e domi- nando suas habilidades físicas. Nesse contexto, o ambiente deve ser esti- mulador e desafiador para promover o interesse e impulsionar as ações. Desta forma, o desenvolvimento motor inclui um conjunto de habili- dades, generalizações motoras e capacidades físicas, as quais são apresen- tadas, desenvolvidas e dominadas por cada sujeito em diferentes contextos e faixas etárias distintas. As bases neurológicas se aliam às potencialidades anatômicas e fisiológicas para que o corpo execute cada um dos movimen- tos. As capacidades perceptivo-visuais gradativamente vão se desenvol- vendo na infância, de modo a oportunizar que os movimentos, inicialmente rústicos, se tornem cada vez mais elaborados, coordenados e complexos. Adicionalmente, o desenvolvimento motor é reconhecido como um processo contínuo, sequenciado e relacionado à idade cronológica. Nou- tras palavras, o domínio motor apresenta um crescente potencial ao longo da vida. Somos capazes de executar uma variedade de habilidades moto- ras, que progridem de movimentos simples e desorganizados para a exe- cução de movimentos altamente organizados e complexos, à medida que o nosso corpo vai crescendo e se desenvolvendo. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 26 – Nessa dinâmica, atuam como bases estruturais promotoras do desen- volvimento motor a maturação do sistema nervoso central e periférico, bem como os processos interativos desencadeados e moldados pelos estí- mulos externos. Consequentemente, se reconhece o papel das atividades físicas no desenvolvimento e na aprendizagem do ser humano, desde a infância, como extremamente relevante. Diferentes fatores afetam a aquisição e o refinamento das habili- dades motoras. Desta forma, é importante ofertar à criança oportunida- des de praticar atividades físicas, pois estas são bases estruturais para seu desenvolvimento motor, o qual será relevante em sua memória pro- cessual. Praticar as habilidades motoras gerais, tais como caminhar, correr, saltar, chutar, arremessar, receber, entre outras, proporciona experiências motoras diversificadas. Com base nestas, vão se refinando as habilidades corporais, que potencializam os mais elevados níveis de desempenho motor, fundamental para a aprendizagem em diferentes contextos. Para que o corpo seja capaz de desempenhar estas ações sem dificuldades, este deve estar saudável. Consequentemente, a saúde é um fator a ser compreendido. Saiba mais Exercício e sono. Autores: Paulo José Forcina Martins; Marco Túlio de Mello; Sergio Tufik (Revista Brasileira de Medicina do Esporte, v. 7, n. 1, p. 28-36, 2001). Artigo de Revisão que discute como o sono de boa qualidade é fundamental para a restauração física e mental. A leitura traz reflexões importantes para o entendimento da dinâmica do sono, a atividade física e o equilíbrio da saúde mental, importantes elos para a aprendizagem.. 1.3 Saúde e sua relação com os processos de ensino e aprendizagem Para que se possa dimensionar a relação entre saúde e aprendizagem, é necessário que se busque, numa primeira reflexão, compreender o signi- – 27 – Bases biológicas de aprendizagem ficado do termo saúde. Essa tarefa exige um pensamento holístico, visto que o conceito relacionado a esse termo não está estacionado no tempo, ao contrário, sofre revisões ao longo da história. Além disso, a saúde é um direito humanofundamental, e a consecução do mais alto nível possível de saúde é a mais importante meta social mundial, cuja realização requer a ação de muitos setores sociais, econômicos e educacionais, de modo a se reconhecer que a saúde é a maior meta de qualquer governo (municipal, estadual e federal) e do cidadão, sendo a pedra angular do desenvolvi- mento sustentável. No passado, a interpretação para o termo saúde resgatava uma con- cepção ambientalista intimamente associada à medicina, que se baseava na hipótese da relação intrínseca entre doença, natureza e sociedade. O foco se amparava mais à situação de doença, e tinham-se duas percepções bem-marcadas sobre esta. Na primeira, a doença era transmitida do indi- víduo doente ao indivíduo sadio, por meio do contato físico, ou indireta- mente, por meio de objetos contaminados pelo doente ou pela respiração do ar circundante. A segunda reconhecia que a doença era adquirida no local de emanação dos miasmas (que correspondem à exalação pútrida que emana de animais ou vegetais em decomposição), sendo impossível a transmissão por contágio direto. Nessa lógica, a higiene pessoal e ambien- tal era um dos pontos-chave para a saúde. Na contemporaneidade compreende-se a saúde como um fenômeno dinâmico, de natureza biológica, psicológica e social, que pode mais especificamente ser reconhecida como um estado de completo bem-estar físico, mental e social. Nesse entendimento, torna-se evidente que a con- cepção em foco não se restringe à simples ausência de doença ou enfer- midade, mas corresponde a um estado multidimensional, com diferen- tes fatores atuando como partícipes na vida para gerenciar e imprimir a saúde. Desta forma, emergem cinco princípios articuladores para a saúde (PHAO, 2018): 2 a equidade, a partir da qual se busca a igualdade e justiça mediante a eliminação das diferenças desnecessárias e evitá- veis entre os indivíduos e as populações, para que todos parti- lhem da saúde; Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 28 – 2 a excelência, pela qual se procura chegar ao mais alto padrão de qualidade naquilo que fazemos em direção à saúde; 2 a solidariedade entre governos e cidadãos, promovendo interes- ses e responsabilidades comuns na direção de esforços coletivos para alcançar metas equivalentes da saúde; 2 o respeito mútuo, de forma a acolher com dignidade a diversi- dade de indivíduos, grupos e sociedades; e 2 a integridade, que busca garantir um desempenho transparente, ético e confiável na promoção da saúde para todos. Amparado nestes pressupostos, o conceito de saúde sofre varia- ções durante o ciclo de vida de uma pessoa, de acordo com as poten- cialidades e as condições de vida desta. Desta forma, se reconhece a saúde como um constructo de variadas dimensões, e não meramente a oposição à doença. A essência estabelece que ter saúde implica num processo de equilíbrio, vigor e autorrealização. Na prática, a comple- xidade desta concepção vai além do indivíduo, tem estreita relação com uma consciência sanitária coletiva para que a saúde seja encarada como prioridade, pois há uma íntima conexão entre saúde individual e saúde coletiva. Nas relações que o sujeito desenvolve em sua vida é possível per- ceber uma rede de representações e significados que apontam para a amplitude deste termo ou conceito. Nesse sentido, o ponto de referên- cia biológico tem raízes nas bases genéticas, anatômicas e fisiológicas que definem o organismo. Caso não haja perturbações nestas bases, a saúde será possível. Todavia, é fundamental que sejam atendidas, cotidianamente, as necessidades de alimentação, sono e prática de ati- vidades físicas. A existência humana é estabelecida socialmente, sendo o nosso referencial de vida, nossa inserção na cultura e nas relações estabele- cidas com os demais atores sociais com os quais interagimos. Deste modo, a dimensão psicológica tem ligação estreita com a saúde mental e se expressa na qualidade das relações com nossos pares. Fatores indi- viduais, sociais, emocionais e financeiros estão inseridos nesse aporte; – 29 – Bases biológicas de aprendizagem muitas dificuldades podem contribuir para que haja um desequilíbrio e a saúde seja comprometida. A base social do conceito é, acima de tudo, coletiva, e nela estão incorporados aspectos do ambiente, como espaço físico, que inclui solo, água e ar, aliados à moradia e ao estilo de vida. Desta forma, políticas públicas relacionadas à interação entre a saúde humana e os fatores do ambiente natural e antrópico influenciam de forma positiva na melhoria da qualidade de vida do sujeito. Além disso, na vida adulta, exercem influ- ências consistentes sobre esta base o ambiente de trabalho, os vícios e os referenciais de qualidade de vida. Assim sendo, a saúde é resultado da totalidade de condições que se amparam no componente físico e moral, aliada à alimentação, habitação, saneamento, educação, renda, meio ambiente, trabalho, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse de informações e dos serviços de saúde. Con- siderando todas as proposições sobre o papel da saúde no ciclo de vida de cada sujeito, torna-se patente que o crescimento e o desenvolvimento humano estão atrelados à saúde e têm relação direta com o potencial de aprendizagem. O desafio emergente, então, é reconhecer os fatores determinantes para a saúde. Na infância, há riscos que afetam a saúde, como obesidade, má nutrição, transtornos mentais, doenças cardiovasculares e margina- lidade, portanto as crianças precisam de ambientes resilientes, seguros, saudáveis, acolhedores, educativos e dinâmicos para viver com seguri- dade e se desenvolverem física, emocional, social e cognitivamente. Nas últimas décadas, a problemática da obesidade infantil tem aumentado, e, junto com ela, surgem várias complicações para as crianças, que costumam acompanhá-las na fase da adolescência e também na vida adulta. Muitas vezes, essa obesidade está ligada aos hábitos e disponibilidade de alimentos no espaço familiar. O aumento na ingestão de alimentos altamente calóricos, principalmente os do último nível da pirâmide alimentar, geram acúmulo de gordura no metabolismo. A elevada taxa total de gordura, o acúmulo no tronco ou na região abdominal, além, é claro, de excesso de gordura junto às vísceras, fre- Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 30 – quentemente se associam a outras doenças, como colesterol alto e até mesmo diabetes. A realização de atividades físicas promove uma condição de potên- cia aeróbica, força e flexibilidade, por isso, uma criança que desenvolve atividades de forma periódica tem menor propensão a se tornar obesa. O sedentarismo é um fator coadjuvante ao excesso de consumo de ali- mentos na promoção da obesidade. Do mesmo modo, hábitos de vida que geram diminuição do gasto calórico no ciclo circadiano, como permanecer por longos intervalos no celular, no computador ou assistindo à televisão, favorecem o surgimento da obesidade infantil. Uma alimentação equilibrada auxilia o corpo, atuando como um suporte sólido para promover o crescimento e o desenvolvimento adequa- dos, em sintonia com a faixa etária e a maturação biológica. Entre os itens alimentares indispensáveis estão as proteínas, uma vez que estas potencia- lizam a construção das redes sinápticas do sistema nervoso. A má alimentação é um dos fatores que podem comprometer o desenvolvimento físico, social, afetivo e psicomotor de uma criança, repercutindo para outras fases de seu ciclo de vida. A desnutrição infan- til é uma das mais significativas doenças, sendo de origem multicausal. Crianças malnutridas apresentam limitações de aprendizagem, e não res- pondem adequadamente aos estímulos educacionais, tendo reduzidos o interesse pelo ato de brincar e explorar sua realidade. Nessa percepção, é fundamental observar atentamente as crianças e monitorar seus hábitos alimentares. Obesidade e desnutrição pregressa, mesmo que moderadas na infância, atuam como principais causas daalteração no desenvolvi- mento mental e do mau desempenho no processo de ensino e aprendiza- gem. Uma das consequências para as crianças é a apatia e a diminuição da capacidade de atenção. Outro aspecto relativo à saúde que pode exercer influência sobre a aprendizagem compreende a presença de transtornos mentais, os quais afetam o modo como se processa o aprender. Essa designação é apli- cada quando há uma anormalidade no funcionamento de uma ou mais partes componentes do sistema nervoso. Neste caso, os componentes – 31 – Bases biológicas de aprendizagem de ordem neurológica provocam problemas na forma como o indivíduo responde a uma ou mais situações do cotidiano, com comportamentos que não são comuns. Deste modo, se entende que a leitura, escrita ou os cálculos, de forma isolada ou associados, podem não atender aos padrões de normalidade. Nesse contexto, inclui-se, por exemplo, a dislexia e o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, os quais induzem a defasagens de apropriação de uma ou várias habilidades ou competências inseridas nos mecanismos de cognição. Há muitos fatores que podem influenciar no surgimento de transtornos mentais: aspectos genéticos, problemas familiares, traumas de diferentes origens e graus de amplitude, e também o uso ou abuso de substâncias psicoativas. A aprendizagem, em todos estes exemplos, será de algum modo comprometida. Saiba mais Ampliando saberes Saúde da criança e do adolescente. Autores: Emanoela Gonçalves; Paulo Roberto Barsano, Rildo Pereira Barbosa (Editora Iátria, 2014). O livro contempla temas essenciais, como fatores que influenciam o crescimento infanto-juvenil, alimentação saudável, desenvolvimento humano, características neurológicas e psíquicas, doenças mais comuns na infância e métodos de imu- nização. Discute também o papel dos maus-tratos e abusos na saúde mental. O esquema a seguir representa uma proposição de relações entre palavras-chave que empregamos durante nossas abordagens. A intencio- nalidade é provocar reflexões, de modo que se possa ressignificar o papel dos conhecimentos aqui explorados ao pensar o planejamento de uma pro- posta pedagógica. Figura 1.1 – Entrelaçando concepções Fonte: elaborada pela autora. Da teoria à prática A aprendizagem é um processo amplo; ao longo de todo o nosso ciclo de vida aprendemos, pois essa é uma habilidade inerente ao ser humano. Desde que nascemos, e durante nosso crescimento e desenvolvimento, sempre esta- mos buscando aprender, por meio dos processos cognitivos, em nossas rela – 33 – Bases biológicas de aprendizagem ções com os diversos contextos de nossa realidade, e, nesse processo, compre- endemos que a busca pelo conhecimento pode ser prazerosa. Partindo dessa premissa, reflita sobre a aplicabilidade das abordagens aqui apresentadas em sua atividade acadêmica e profissional. Considere a perti- nência destes fundamentos para uma prática pedagógica ética, responsável e amparada em aportes teóricos que possibilitam compreender as bases bioló- gicas que afetam o processo de aprendizagem. Síntese A compreensão do processo de ensino e aprendizagem implica no domínio de diferentes conhecimentos, muitos dos quais amparados nos domínios das ciências biológicas. O corpo humano é constituído por milhares de células de diferentes tipos, organizadas em tecidos e sistemas, sob o comando do sistema nervoso, e as sinapses compreendem o meca- nismo interativo entre as células. Embora a anatomia e a fisiologia celular impliquem diferenças, no núcleo estão os cromossomos que carregam a informação genética her- dada dos progenitores e que nos definem como indivíduo e espécie. Nosso crescimento e desenvolvimento dependem basicamente de processos desencadeados pela atividade celular. Nessa visão, a cognição é o resul- tado da atividade de células do nosso sistema nervoso. Para que o corpo possa desempenhar todas as suas atividades ao longo do ciclo circadiano, é fundamental que suas necessidades sejam atendidas em três diferentes contextos: a alimentação, o sono e a atividade física. O primeiro envolve os hábitos culturais, regionais e familiares, que recebem influência da sociedade na qual vivemos. Por meio deste ato, seguindo as orientações de consumo da pirâmide alimentar, obtemos os nutrientes fun- damentais para o desencadeamento de nossos processos metabólicos;dos diferentes tipos de alimentos, nosso organismo recebe, utiliza e elimina os nutrientes que ingerimos diariamente. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 34 – O segundo contexto recebe influência direta do ambiente, que regula o ciclo sono/vigília. O sono exerce papel especial em nossa vida. Durante a noite oscilamos entre sono de fase REM e sono não Rem. Esta varia- ção é crucial para a nossa qualidade de vida, com maior destaque para a consolidação de nossas memórias. Durante o período em que estamos dormindo, nosso sistema nervoso continua em atividade, desencadeando processos fisiológicos fundamentais para manutenção do nosso metabo- lismo e amparando e sedimentando processos sinápticos cognitivos. No período de vigília, nossos movimentamos promovem o desenvolvimento motor, e esse pode ser reconhecido como um processo contínuo, sequen- ciado e relacionado à nossa faixa etária. Inicialmente, temos movimentos rústicos, e, na medida em que avançamos na idade, nossas habilidades se tornam mais refinadas e complexas. Nessa dinâmica nosso sistema ner- voso se torna cada vez mais eficiente, e isso nos permite melhorar nosso desempenho, inclusive dinamizando nossa aprendizagem. A concepção de saúde sofre influência na história da própria huma- nidade, e na atualidade se reconhece que esta é um constructo dinâmico, elaborado com base em, no mínimo, três amplos referenciais. O biológico, enraizado na constituição genética, anatômica e fisiológica que estrutu- ram o organismo e lhe permitem enfrentar as batalhas do cotidiano. O psicológico, ligado à saúde mental e que apresenta intima relação com a qualidade de vida, permitindo que o indivíduo venha a interagir com seus pares. O social, que resgata aspectos do ambiente, da moradia e do estilo de vida nos quais o sujeito se insere. Nessa dimensão, torna-se rele- vante que a infância seja cuidadosamente monitorada, de modo a prevenir comorbidades que podem prejudicar a saúde e comprometer o desempe- nho escolar. A obesidade e a má nutrição inserem-se nesse contexto - os nutrientes não atendem adequadamente aos requisitos do metabolismo, e a criança se torna menos atenta, apresentando dificuldades na apropriação durante o processo de ensino e aprendizagem. Atividades 1. Diferencie crescimento de desenvolvimento e relacione estes processos à aprendizagem. – 35 – Bases biológicas de aprendizagem 2. Explique a importância da alimentação, do sono e das atividades físicas no ritmo circadiano. 3. Qual a relevância da saúde para a aprendizagem? 4. Considerando as abordagens apresentadas, por que a aprendiza- gem não se processa do mesmo modo em todas as pessoas? 2 Neurociência e aprendizagem A neurociência compreende um campo vasto do conheci- mento científico de natureza multidisciplinar – o que se dedica ao estudo da complexidade do entendimento das estruturas que for- mam o Sistema Nervoso Humano. Subsídios de diferentes ramos da medicina, biologia (anatomia, fisiologia, bioquímica), etolo- gia, educação e psicologia se aliam para desvelar os mecanismos que desencadeiam o processo de aprendizagem. Avanços cientí- ficos nestas áreas do conhecimento produzem, numa velocidade vertiginosa, novos saberes, os quais cada vez mais rapidamente esclarecem os mistérios da mente humana. Educadores e demais profissionais ligados à educação bus- cam informações no campo das neurociências, para promover um processo de ensino e aprendizagem com resultados mais eficazes. Na mesma tônica, se procura elucidar os fatos que desencadeiam as dificuldades escolares, e, com esta elucidação emergemferramentas que ensejam novas alternativas para que o processo de ensino e aprendizagem seja elaborado de acordo com as necessidades e capacidades de cada estudante, tornando- -o mais significativo. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 38 – Considerando as argumentações apresentadas, o propósito deste capí- tulo é contextualizar os conhecimentos das neurociências como elementos basilares na dinâmica do processo de ensino e aprendizagem. 2.1 Neurociências e conexões com os espaços pedagógicos Nas últimas décadas, houve crescente preocupação com o processo de ensino e aprendizagem, e os avanços na área das neurociências têm contribuído de forma decisiva para explicar como o cérebro humano explora sua realidade e se apropria de conhecimentos. Nessa dimensão, se reconhece a importância de entender, de forma elucidativa, a capaci- dade do cérebro de se apropriar de informações e armazená-las em regiões específicas, para, quando necessário, recuperá-las e/ou reorganizá-las para interagir com a realidade. Um dos marcos da busca destes saberes foram as diferentes pesquisas realizadas pelo neurologista alemão Korbinian Brodmann (1868-1918). Seus estudos apresentaram para a área um detalhado mapa do córtex cere- bral, no qual ele analisou, com os recursos da época, as camadas celula- res, o tecido nervoso, os neurônios e a neuróglia, constatando que havia diferenças teciduais na anatomia, na estrutura e no tamanho. Deste modo, foram sistematizadas, identificadas e numeradas cinquenta e duas diferen- tes áreas no cérebro humano. Para Brodmann, a localização e a citoarquitetônica cortical estavam organizadas em três padrões: o primeiro, elementar, amparado nos ele- mentos histológicos (diferentes tipos de neurônio e neuróglia), o segundo, laminar, fundamentado na organização das camadas celulares, e o terceiro, topográfico, elaborado de acordo com áreas tangencialmente organizadas (BRODMANN, 1912). Esse mapeamento cerebral trouxe à tona resul- tados que potencializaram a identificação das áreas motoras, sensitivas, cognitivas e áreas relacionadas com a memória – um legado de muitas utilidades para a medicina, a biologia, a psicologia e a educação. A biotecnologia, por meio do uso de equipamentos cada vez mais elaborados e dotados de alta complexidade, nos devolve subsídios funda- – 39 – Neurociência e aprendizagem mentais para as neurociências. Desta forma, as ferramentas tecnológicas atuais permitem obter sofisticadas informações, por meio do uso de regis- tros tais como: tomografia por emissão de pósitrons, ressonância nuclear magnética e funcional, eletroencefalografia, eletrocorticografia, magneto- encefalografia e espectroscopia óptica por infravermelho. Esses registros permitem determinar, com maior precisão, as áreas do cérebro envolvidas em determinada atividade ou ação que o corpo esteja executando. Nesse entendimento, foi possível correlacionar neuroanatomia com neurofisiolo- gia, numa percepção “in vivo” (DAMIANI et al. 2016). Estudos de GLASSER et al. (2016) trouxeram incrementos relevan- tes na estruturação do mapeamento cerebral, com a mais recente organiza- ção dos hemisférios cerebrais sendo redesenhada. Baseados na topografia, interconexão, citoarquitetura e função são reconhecidas, na atualidade, 180 áreas funcionais presentes em cada hemisfério. As pesquisas no campo da neurociência estão em constantes avanços e novas contribuições, tanto no aspecto macroscópico quanto no microscópico, podem trazer luzes em breve. Todavia, uma certeza permanecerá imutável: não há como deter- minar um padrão comum para todos; cada indivíduo é ímpar e apresenta particularidades neuroanatomofuncionais. Existem várias concepções que procuram refletir sobre como o indi- víduo aprende, podendo ser reunidas em três grandes linhas de análise do processo de ensino e aprendizagem: comportamentalistas, cognitivistas e humanistas. Cada uma destas visões tem seus mentores e apoiadores. Deste modo, foram concebidas as Teorias de Aprendizagem, e essa base teórica reúne contribuições de educadores, psicólogos, psiquiatras, antro- pólogos com ligações estreitas com as neurociências. Um esclarecimento pertinente é a compreensão do que se entende por Teoria da Aprendizagem. Essa terminologia é aplicável num contexto de sistematização da área do conhecimento em questão. Corresponde a uma forma de reunir informações e formar um entendimento dos fatos e fenô- menos a ela relacionados. Nessa dimensão, cada teoria da aprendizagem apresenta as variáveis independentes, dependentes e intervenientes que explicam como ocorre a apropriação dos conhecimentos. Cabe ainda con- siderar que a rigorosidade da aplicação do termo teoria não é fixa, sofre influência de seus mentores ou daqueles que as adotam. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 40 – A linha comportamentalista, também denominada de behaviorista ou conexionista pode ser sinteticamente analisada com base nos refe- renciais do russo Ivan Pavlov (1849-1936), e dos norte-americanos John Broadus Watson (1878-1958), Edwin Ray Guthrie (1886-1959) e Bur- rhus Frederic Skinner (1904-1990). Partindo de diferentes pontos, estes autores entendem que o processo de aprendizagem pode ser organizado em várias etapas, que sofrem alterações, tendo em vista as diferentes perspectivas sobre o desenvolvimento humano. Além disso, a aquisição de habilidades complexas implica na aprendizagem de inúmeros movi- mentos que requerem repetições, para que cada vez sejam estabelecidas novas conexões mentais. Consequentemente, se concebe o aprendizado eficiente, como aquele no qual o educador promove o maior número de vezes possível a associa- ção de uma resposta (desejada) a determinado estímulo, para que o apren- diz adquira os conhecimentos em estudo. Além disso, o meio ambiente é um fator determinante para a ocorrência do processo de ensino e apren- dizagem, que passa a ser um condicionamento operante ou respondente subsidiado por estímulos positivos ou negativos. A retenção e a motivação são partes componentes do paradigma desta teoria da aprendizagem comportamentalista, as quais se sintonizam com a transferência dos conhecimentos. O desenvolvimento desta proposta parte da definição de objetivos educacionais, análise das tarefas ou atividades pedagógicas, de forma a ordenar sequencialmente os espaços da instru- ção e execução da proposta de ação. A seguir, se promove o reforço das respostas apresentadas pelo aprendiz em relação aos objetivos almejados e suas consequências diretas. Assim sendo, o papel do educador será pla- nejado visando conseguir condutas apropriadas por meio do controle do processo de ensino e aprendizagem pelos métodos educacionais. Cabe ainda ao educador premiar as respostas certas, de forma a gerar um hábito desejável e modelar as respostas apropriadas aos objetivos instrucionais. Nessa linha, o estudante é o ser que responde a estímulos do meio exterior e ocupa um segundo plano. Além disso, se concebe que todas as pessoas aprendem um mesmo comportamento da mesma forma; não se reconhece uma visão de con- junto no processo de ensino aprendizagem. O estudante é um ser passivo e – 41 – Neurociência e aprendizagem moldável, dependendo do professor que o ensina. Nessa linha teórica, fica evidente que a aprendizagem consiste na formação de relações estímulo- -resposta, e que estas derivam de sinapses neurais, embora não se explo- rem seus detalhes no contexto das neurociências. Contrapondo-se aos contextos do conexionismo, emerge a linha cog- nitivista, que pode ser holisticamente analisada com base nos referenciais de Jean William Fritz Piaget (1896-1980), Lev Semyonovich Vygotsky (1896-1934), Alexander Romanovich Luria (1902 - 1977), Jerome Sey- mour Bruner (1915 - 2016), David Paul Ausubel (1918 - 2008), Joseph Donald Novak (1932) e Howard Gardner (1943). Cada um destes buscou centrar seus esforços na compreensão da atenção e da cognição em relação ao comportamento do aprendiz.Genericamente, o cognitivismo se preocupa em analisar a mente, no que diz respeito a conhecer e explicar como o indivíduo desenvolve seu conhecimento acerca de sua realidade, analisando os aspectos que inter- ferem no processo de ensino e aprendizagem. Na essência destes pen- samentos, a cognição se refere ao conjunto de habilidades que ocorrem em diferentes setores do sistema nervoso, e que são necessárias para a apropriação do conhecimento sobre a realidade. Consequentemente, a cognição é o processo por meio do qual o mundo de significados tem sua origem. Portanto, os significados não são entidades estáticas, mas pontos de partida para a atribuição de outras significações que possibilitam a ori- gem do processamento mental; a estrutura cognitiva é que se torna uma ponte para a aquisição de novos significados. Deste modo, as habilidades mentais envolvem pensamento, raciocínio, abstração, linguagem, memória, atenção, criatividade, capacidade de reso- lução de problemas, entre outras funções. Cabe-nos, então, explorar alguns elementos apresentados pelos mentores desta linha, que dimensionaram a compreensão, transformação, armazenamento e utilização das informações recolhidas pelo sujeito e envolvidas no plano da cognição. Além disso, é necessário incluir as variáveis intervenientes mais complexas que afetam a aprendizagem, como as representações, atitudes e crenças. Na percepção de Piaget, a compreensão do pensamento da criança ocorre considerando as diferentes fases do ciclo de vida, numa explica- Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 42 – ção biológica do conhecimento traduzida como a Epistemologia Genética. Nesse raciocínio, ao interagir com o meio, a criança utiliza-se de dois processos simultâneos: a organização interna e a adaptação ao meio, que ocorrem por meio da assimilação e acomodação, as quais se estendem ao longo de toda a existência do sujeito. As constantes funcionais são ine- rentes ao aspecto hereditário e tornam possível o aparecimento das estru- turas cognitivas do indivíduo, com base nos processos interativos que ele desenvolve com o ambiente. Na perspectiva sociointeracionista, proposta por Luria e Vygotsky, há relevante papel da interação social no desenvolvimento do sujeito. Deste modo, o desenvolvimento está intimamente relacionado, de forma dinâ- mica, por meio de rupturas e desequilíbrios causadores de contínuas reor- ganizações por parte do ser cultural. Nessa dimensão, os fatores biológicos são preponderantes sobre os sociais somente no início da vida da criança. Gradativamente, as interações com o grupo social e com objetos da sua cultura promovem um rearranjo no comportamento e no desenvolvimento do pensamento. Assim sendo, o desenvolvimento do ser cultural se dá em função das constantes interações com o meio social no qual ele vive. Diante dessa visão, o cérebro é um sistema biológico aberto, em cons- tante interação com o meio físico, histórico e social no qual o sujeito está inserido. Além disso, a plasticidade cerebral e as funções mentais supe- riores foram construídas ao longo da evolução de nossa espécie. A mente se modifica em contato com o meio ao longo de todo o ciclo de vida. A interferência do ambiente no sistema nervoso causa mudanças anatômicas e funcionais, e a quantidade de neurônios e as sinapses se alteram depen- dendo das experiências pelas quais se passa. Nesse entendimento, Bruner aponta a relevância de o estudante aprender de forma ativa, ou aprender fazendo. Com isso, identificam- -se dois níveis de desenvolvimento: aquele que se refere às conquistas já efetivadas, reconhecido como nível de desenvolvimento real, e aquele relacionado às capacidades em vias de constituição, compreendido como nível de desenvolvimento potencial. No primeiro caso, se reconhecem as conquistas consolidadas no desenvolvimento da criança, as funções ou capacidades das quais ela já – 43 – Neurociência e aprendizagem apropriou e domina. O segundo, compreende aquilo que a criança é capaz de fazer mediante a ajuda de outra pessoa (um aprendiz mais eficaz ou mediador). Nesse caso, a criança realiza tarefas e soluciona problemas por meio do diálogo, da colaboração, da imitação e da experiência daqueles com os quais interage. Este nível é indicativo de potencial de desenvolvi- mento mental da criança. A distância que existe entre aquilo que a criança é capaz de fazer de forma autônoma e as realizações em colaboração com o mediador caracteriza a Zona de Desenvolvimento Proximal ou simples- mente ZPD. A ZDP está relacionada aos processos de maturação individual, pois todos estão propensos a inúmeras transformações baseadas na interação do agente social com seu meio cultural. Consequentemente, o desenvol- vimento desses processos no ser humano é mediado por instrumentos e signos construídos no universo social, histórico e cultural do contexto em que ele se situa. Por instrumento se entende algo que pode ser usado para fazer alguma coisa, e signo é algo que significa alguma coisa, como os signos linguísti- cos. Assim sendo, quanto mais instrumentos e signos se aprende, mais se amplia a gama de atividades que o sujeito pode aprender. Aliando essas ideias às proposições de Bruner é possível dizer que o aprendiz atinge a compreensão de qualquer assunto, desde que o material instrucional seja adequadamente organizado. Deste modo, ensinar é, em síntese, um esforço para auxiliar ou moldar o desenvolvimento intelectual. Sendo o processo de ensino e aprendizagem planejado com base no desenvolvimento intelectual do aprendiz, Ausubel e Novak propõem a aprendizagem significativa e o uso dos mapas conceituais como modos de estabelecer uma ponte entre a nova informação que se agrega a outra pré-existente e amplia e modifica o seu significado. Nessa ideia, propõe-se uma estrutura cognitiva pré-existente no aprendiz, que é referida como subsunçor. Nela, o novo conhecimento ou informação se ancora e amplia seus significados. Quando não há um subsunçor, os novos conhecimentos não encontram estrutura cognitiva preparada para recebê-los. Por conseguinte, torna-se fundamental ao edu- cador distinguir os conhecimentos prévios que o estudante já domina. Dificuldades de Aprendizagem Escolar – 44 – Ampliando o foco cognitivista, considerando os aspectos psicomotores e, principalmente, afetivos da aprendizagem, emerge a elaboração de mapas conceituais, durante o desenvolvimento do processo de ensino e aprendi- zagem, como ferramentas facilitadoras da aprendizagem. Reunido as ideias biológicas e antropológicas, ainda considerando as individualidades de cada aprendiz e valorizando suas potencialida- des, Gardner contempla as inteligências múltiplas. Nessa interpretação, a inteligência se apresenta como um ponto-chave no processo de ensino e aprendizagem. Cada estudante tem singularidades no seu potencial cog- nitivo e em seu estilo intelectual, e o processo de ensino e aprendizagem pode ser mais bem elaborado se for talhado para as capacidades e neces- sidades dos estudantes, sendo imprescindível ao educador conhecer seus estudantes, seus saberes prévios e suas potencialidades. A linha humanista pode ser reconhecida pelas proposições de Henri Paul Hyacinthe Wallon (1879 - 1962), Célestin Freinet (1896 - 1966), Carl Ransom Rogers (1902 - 1987), Urie Bronfenbrenner (1917 - 2005) e Paulo Reglus Neves Freire (1921 - 1997). Estes pensadores entendem que a afetividade exerce papel importante no processo de ensino e aprendiza- gem, e que este recebe a influência de diferentes elementos que afetam o desenvolvimento da criança. Nessa compreensão, há uma interdependên- cia indivíduo-contexto, sendo contexto o ambiente em que a pessoa está inserida (micro, meso, exo, macro e cronossistemas). É nesse contexto que se desenrolam os processos de desenvolvimento, desde os mais ime- diatos até os mais remotos, sujeitos a influências recíprocas. Deste modo, o educador que melhor compreende o desenvolvimento do estudante
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