Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
P1 - farmacodermia 1 😅 P1 - farmacodermia Compreender a fisiopatologia da farmacodermia As farmacodermias são doenças tegumentares (pele e/ou mucosa) e/ou sistêmicas desencadeadas, direta ou indiretamente, de diferentes maneiras, pelo uso de remédios. Etimologicamente, o conceito de farmacodermia não necessariamente condiz com o termo em si, de maneira que talvez fosse melhor designá-la como RMA. A OMS define RMA como uma reação não intencional causada por medicamentos utilizados em doses usuais para o homem. A maioria dessas reações é evitável e dose-dependente. As RMA podem, ainda, ser subclassificadas em dois tipos: as do tipo A, que representam 80% dos casos, são consideradas previsíveis e dose-dependentes; as do tipo B são imprevisíveis, não dependem da dose de medicação administrada e compreendem as reações de hipersensibilidade e as idiossincrásicas não imunes. Entender os mecanismos imunológicos do desenvolvimento de farmacodermia RMA são desencadeadas por mecanismos imunológicos e não imunológicos. As reações de natureza imunológica são chamadas de alergia medicamentosa. RMA por mecanismos não imunológicos são muito mais frequentes, e incluem as interações medicamentosas. A utilização de fármacos costuma desencadear a produção de anticorpos, embora sem expressão clínica. P1 - farmacodermia 2 Reações imunológicas As reações imunológicas podem ser alérgicas e apresentarem reações cruzadas, como descrito a seguir. Reações alérgicas Todos os quatro tipos de hipersensibilidade descritos por Gell e Coombs estão representados nas farmacodermias: tipo I – anafilática: pode ser produzida por analgésicos, aminopirina, penicilinas, soros etc. tipo II – citotóxica: tem sido encontrada nos casos de púrpura trombocitopênica pelo sedormide tipo III – por imunocomplexos: tem sido relativamente frequente, como no caso da doença do soro pela penicilina tipo IV – celular tardia: é dos mais frequentes; é o mecanismo que ocorre em todos os casos de eczema de contato (sulfas, irgasan etc.). Cabe aqui, ainda, citar que a classificação apresentada representa uma simplificação da resposta imune desencadeada após diversos estímulos. Os tipos relacionados por Gell e Coombs tratam dos mecanismos predominantes de uma complexa interação celular e humoral presente em todas as reações imunológicas a substâncias. Reações cruzadas Ocorrem quando medicamentos diferentes compartilham um mesmo radical, por exemplo, a sulfa, a fenolftaleína e a anilina compartilham o anel parafenilenodiamina. Pacientes com alergia à penicilina apresentam reação cruzada com cefalosporina em 10% dos casos, eczema de contato a timerosal (antiga substância do mertiolate) e piroxicam. O metabolismo dos inibidores da bomba de prótons gera sulfonamidas. Reações não imunológicas Efeito colateral ou secundário É decorrente da ação secundária e não terapêutica do medicamento, por exemplo, eflúvio anágeno e alopecia secundários ao uso de citostáticos e sonolência pelo uso de anti-histamínicos. P1 - farmacodermia 3 Alterações metabólicas Fármacos podem alterar o status nutricional ou metabólico por vários mecanismos, como retinoides sistêmicos, levando ao aparecimento de xantomas, e hidantoína, interferindo na absorção de folato e desencadeando estomatite aftosa. Interações medicamentosas Existem três mecanismos pelos quais os medicamentos podem interagir e causar RMA: uma substância interferir na excreção de outra: probenecida reduzindo a excreção de penicilina pelo rim uma substância inibir ou estimular enzimas importantes na degradação de outra: rifampicina ou griseofulvina diminuindo a eficácia de pílula anticoncepcional; fluconazol potencializando a ação de hidantoína e da clorpropamida medicamentos competindo pelo mesmo local, que pode ser o da proteína plasmática transportadora; nesse caso, potencializando o efeito ou o deslocamento do receptor e, portanto, diminuindo a ação do fármaco deslocado. Por exemplo, fenilbutazona ou ácido acetilsalicílico deslocando cumarínicos, causando sangramento; folato administrado concomitantemente com metotrexato reduz a ação deste, por deslocá-lo do receptor. Exacerbação de doença preexistente Como a griseofulvina, os barbitúricos e a cloroquina na porfiria latente por ativação enzimática; lítio e agentes betabloqueadores desencadeando psoríase. Alterações de equilíbrio ecológico Aparecimento de candidíase e diarreia decorrentes de alteração da flora intestinal por uso prolongado de antibiótico. Clindamicina desencadeando quadro de colite pseudomembranosa causada por Clostridium dif icile. Mecanismos farmacológicos Decorrem de ação farmacológica direta de determinada substância; um exemplo é a urticária não alérgica provocada pela degranulação dos mastócitos, liberando histamina em decorrência do uso de opiáceos, atropina, ácido acetilsalicílico e outros. Fotossensibilidade P1 - farmacodermia 4 Como o nome indica, é necessário um componente lumínico. Substâncias fotossensibilizantes podem afetar a pele tanto pela via tópica quanto sistêmica. A quase totalidade das reações fotoquímicas mediadas por fatores exógenos é induzida pelo raio ultravioleta A. Esta reação adversa pode ser desencadeada por dois mecanismos distintos: fototóxico e fotoalérgico. Alguns fármacos podem desencadear tanto fototoxicidade quanto fotoalergia. Fototóxico Certas substâncias têm a capacidade de absorver radiações, produzindo lesões cutâneas diretas somente nas áreas expostas, semelhantes à queimadura solar. É dose-dependente, não requer sensibilização prévia e ocorre poucas horas após a exposição. São exemplos as tetraciclinas, as quinolonas, os tiazídicos, as sulfas etc. Fotoalérgico É desencadeado por mecanismo imunológico (tipo IV), ocorrendo 24 a 48 h após a reexposição ao fotoalérgeno e acomete também áreas não expostas. Não é dose-dependente e pode apresentar reações cruzadas com outros agentes. São exemplos a clorpromazina, as sulfas, as salicilamidas etc. Efeito tóxico Trata-se de um termo abrangente, inespecífico, utilizado de modo heterogêneo. A toxicidade ocorre quando o contato com determinado composto desencadeia resposta do organismo, seja por dosagem excessiva (aparecimento de zumbido com o uso de ácido acetilsalicílico), falhas de metabolismo ou mecanismo alérgico (aplasia de medula pelo cloranfenicol) Superdosagem Ocorre após ter sido ultrapassado, a curto prazo ou após uso prolongado (efeito cumulativo), o limite de tolerância do organismo. É o que ocorre na ingestão acidental ou não de barbitúricos, levando ao coma ou quando a clofazimina causa hipercromia. Exemplo clássico de efeito cumulativo tardio, embora raro, é o aparecimento da doença de Bowen muitos anos após a ingestão de arsênico inorgânico. Idiossincrasia P1 - farmacodermia 5 É uma resposta individual peculiar e, às vezes, até paradoxal a uma substância, como sedativos provocando euforia. Intolerância É uma resposta individual exagerada às doses normais da medicação, como ocorre quando a eritromicina causa intolerância gástrica em adultos. Teratogenicidade Malformações podem ser desencadeadas por fármacos, sobretudo quando administrados no período de organogênese, isto é, entre a 4a e a 8a semana de gestação. Retinoides, talidomida e substâncias citotóxicas e vismodegibe são reconhecidamente teratogênicas. É possível a ocorrência de teratogenicidade com o uso de lítio, quinina, cumarínicos e hidantoína. Fármacos só devem ser administrados na gravidez quando estritamente necessário e, além de não terem potencial teratogênico comprovado, não desencadearem efeitos colaterais importantes no concepto ou a relação risco/benefício seja justificável. Conhecer quais os principais fármacos causadores de farmacodermia Anticonvulsionantes (Carbamazepina, fenitoína, fenobarbital) Antibióticos (sulfas, quinolonas e penicilinas) Aines (piroxican) Alopurinol Compreender a conduta terapêutica (diagnóstico e tratamento)Diagnóstico A anamnese é, isoladamente, o elemento de maior valia no diagnóstico de uma farmacodermia. A concomitância do aparecimento da erupção com a ingestão de um fármaco deve despertar a atenção do profissional para o diagnóstico de farmacodermia; ocasionalmente, a farmacodermia surge anos após o uso esporádico ou continuado de determinado fármaco. Outros dados devem ser considerados, como os tipos eruptivos mais frequentes nas farmacodermias serem exantemas (45%), urticárias e afins (27%), eritema fixo (9%) e eritema multiforme (5%); P1 - farmacodermia 6 a exclusão de outras causas; o enquadramento do tipo do fármaco ao tipo eruptivo; o diagnóstico diferencial bem conduzido com outras dermatoses; a eliminação do remédio como teste; a reexposição como teste diagnóstico só poder ser feita em determinados casos; às vezes, essa reexposição é acidental. Toda vez que um médico se confrontar com um caso atípico de apresentação clínica, evolução, patologia ou resposta terapêutica deve considerar o diagnóstico de farmacodermia. O diagnóstico laboratorial, apesar de útil em alguns casos, é de menor valia do que o diagnóstico clínico; destacam-se os seguintes exames: histopatologia, em que os achados variam com o tipo de reação e podem ajudar no diagnóstico, pois, além de serem eventualmente bastante correlacionáveis, podem afastar outras hipóteses. Testes cutâneos, compreendendo escarificação, intradérmico e de contato; os de contato são realmente de valor indiscutível quando positivos. Outros testes são: técnica da janela cutânea, hemograma, níveis séricos de IgE e outras imunoglobulinas; imunofluorescência, teste de desgranulação basofílica, testes de liberação de histamina e serotonina; teste radioalergossorbente (RAST) para anticorpo IgE-específico. Terapêutica Deve basear-se preliminarmente na interrupção do uso do fármaco. Em casos agudos e graves, a terapêutica deve ser imediata e heroica (epinefrina, corticosteroide venoso, massagem cardíaca, traqueostomia etc.). Conforme já visto, as farmacodermias mimetizam praticamente todas as erupções cutâneas, por isso exigem terapêutica adequada a cada caso, levando-se em consideração o mecanismo patogênico, a natureza e extensão das lesões cutâneas e o comprometimento de outros órgãos. Profilaxia A frequência com que ocorrem as RMA e a gravidade de algumas impõem ao médico reflexão antes de se indicar qualquer terapêutica. P1 - farmacodermia 7 O primeiro passo é fazer o diagnóstico correto da doença, evitando-se, assim, a polifarmácia; em segundo lugar, a indicação deve ser precisa, o que também reduz muito a polifarmácia; em terceiro lugar, deve-se procurar realizar anamnese sobre o uso anterior de remédios e seus possíveis efeitos colaterais; e, finalmente, o uso de determinadas substâncias (penicilina injetável, antissoros etc.) exige vigilância armada imediata (torniquete, epinefrina, corticosteroide venoso, anti-histamínico parenteral etc.).
Compartilhar