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Aula 8 – Tensões no Solo I MECÂNICA DOS SOLOS 78 Aula 8: Tensões no Solo I Como em todo material utilizado na engenharia, o solo, ao sofrer solicitações, irá se deformar, modificando o seu volume e forma iniciais. A magnitude das deformações apresentadas pelo solo irá depender não só de suas propriedades intrínsecas de deformabilidade (elásticas e plásticas), mas também do valor do carregamento a ele imposto. O conhecimento das tensões atuantes em um maciço de terra, sejam elas advindas do peso próprio ou em decorrência de carregamentos em superfície (ou até mesmo do alívio de cargas provocado por escavações) é de vital importância no entendimento do comportamento de praticamente todas as obras da engenharia. 1. Tensões em uma Massa de Solo Nesta aula tratar-se-á da determinação ou previsão simplificada das pressões, aplicadas ou desenvolvidas em pontos do terreno, como resultado de um carregamento imposto, bem como as tensões existentes no maciço devido ao seu peso próprio, isto é, as tensões geostáticas. Nos solos ocorrem tensões devidas ao seu peso próprio e às cargas externas aplicadas. Assim, o estado de tensões em cada ponto do maciço depende do peso próprio do terreno, da intensidade da força aplicada e da geometria da área carregada e a obtenção de sua distribuição espacial é normalmente feita a partir das hipóteses formuladas pela teoria da elasticidade, conforme será visto mais adiante. No caso de tensões induzidas pelo peso próprio das camadas de solo (tensões geostáticas) e superfície do terreno horizontal, a distribuição das tensões total, neutra e efetiva a uma dada profundidade é imediata, considerando-se apenas o peso do solo sobrejacente. O conceito de tensão em um ponto (desenvolvido pela mecânica do contínuo) é apresentado na disciplina Mecânica dos Sólidos, podendo ser representado pela equação apresentada adiante, e já conhecida de outras disciplinas, por exemplo, como Fundações: σ = F A Onde F é o módulo da força que atua no elemento de área de módulo A. Aula 8 – Tensões no Solo I UNIDADE 3 – DISTRIBUIÇÃO DE TENSÕES 79 1.1. O Princípio das Tensões Efetivas Postulado por Terzaghi, para o caso dos solos saturados, o princípio das tensões efetivas é uma função da tensão total (soma das tensões nas fases água e partículas sólidas) e da tensão neutra (denominada também de pressão neutra, é a pressão existente na fase água do solo), que governa o comportamento do solo em termos de deformação e resistência ao cisalhamento. Mostra-se experimentalmente que, para o caso dos solos saturados, o que governa o comportamento do solo em termos de resistência e deformabilidade é a diferença entre a tensão total e a pressão neutra, denominada então tensão efetiva. As tensões normais desenvolvidas em qualquer plano num maciço terroso, serão suportadas, parte pelas partículas sólidas e parte pela água. As tensões cisalhantes somente poderão ser suportadas pelas partículas sólidas. No caso dos solos saturados, uma parcela da tensão normal age nos contatos inter- partículas e a outra parcela atua na água existente nos vazios. Assim, a tensão total num plano será a soma da tensão efetiva, resultante das forças transmitidas pelas partículas, e da pressão neutra, dando origem a uma das relações mais importantes da Mecânica dos Solos, proposta por Terzaghi: σ′ = σ − μ Onde σ′ é a tensão efetiva do solo, σ é a tensão total e μ é a pressão neutra no ponto considerado. Devido a sua natureza de fluido, a pressão na fase água do solo não contribui para a sua resistência, sendo assim chamada de pressão neutra. Para visualizar um pouco melhor o efeito da água no solo imagine uma esponja colocada dentro de um recipiente com água suficiente para encobri-la (a esponja se encontra totalmente submersa). Se o nível de água for elevado no recipiente, a pressão total sobre a esponja aumenta, mas a esponja não se deforma. Isto ocorre porque os acréscimos de tensão total são contrabalançados por iguais acréscimos na tensão neutra, de modo que a tensão efetiva permanece inalterada. 1.2. Cálculo das Pressões Geostáticas Conforme relatado anteriormente, as tensões no interior de um maciço de solo podem ser causadas por cargas aplicadas ao solo e pelo seu peso próprio. A distribuição destes estados de tensão ponto a ponto no interior do maciço obedece a um conjunto de equações diferenciais denominadas de equações de equilíbrio, de compatibilidade e as leis Aula 8 – Tensões no Solo I MECÂNICA DOS SOLOS 80 constitutivas do material, cuja resolução é geralmente bastante complicada e não abordada em nível de ensino médio. Mesmo a distribuição de tensões no solo devido ao seu peso próprio pode resultar em um problema mais elaborado. Existe, contudo, uma situação frequentemente encontrada na geotecnia, em que o peso do solo propicia um padrão de distribuição de tensões bastante simplificado. Isto acontece quando a superfície do solo é horizontal e quando as propriedades do solo variam muito pouco na direção horizontal. 1.2.1. Cálculo da Tensão Geostática Vertical Para a situação descrita anteriormente, não existem tensões cisalhantes atuando nos planos vertical e horizontal (em outras palavras, os planos vertical e horizontal são planos principais de tensão). Portanto, a tensão vertical em qualquer profundidade é calculada simplesmente considerando o peso de solo acima daquela profundidade. Assim, se o peso específico do solo é constante com a profundidade, a tensão vertical total pode ser calculada simplesmente utilizando-se a equação apresentada adiante, onde “z” representa a distância do ponto considerado até a superfície do terreno: σV = γ . z Onde: σV é a tensão geostática vertical total no ponto considerado; γ é o peso específico do solo; z equivale à profundidade. A pressão neutra é calculada de modo semelhante, utilizando-se a equação a seguir: μ = γw . zw Onde: μ é a pressão neutra atuando na água no ponto considerado; γw é o peso específico do da água (adotado normalmente como γw = 10 kN/m3). zw equivale a profundidade do ponto considerado até a superfície do lençol freático. Quando o terreno é constituído de camadas estratificadas, o que é comum em grande parte dos casos, ocorre uma variação dos pesos específicos ao longo da profundidade e a tensão normal resulta do somatório do efeito das diversas camadas. A tensão vertical efetiva é então calculada utilizando-se: Aula 8 – Tensões no Solo I UNIDADE 3 – DISTRIBUIÇÃO DE TENSÕES 81 σ′V = ∑(γi . hi) − (γw n i=1 . zw) Onde hi e γi representam a espessura e o peso específico de cada camada considerada. A figura abaixo, mostra um diagrama de tensões com a profundidade em um perfil de solo estratificado. 1.2.2. Uso do Peso Específico Submerso Caso o nível de água, apresentado na figura acima, estivesse localizado na superfície do terreno, o cálculo das tensões efetivas poderia ser simplificado pelo uso do conceito de peso específico submerso, discutido na aula de índices físicos (item 3.6 da aula 6). Neste caso, a tensão total vertical será dada por σv = γsat . z, enquanto que a pressão neutra no mesmo ponto será μ = γw . z. A tensão efetiva, correspondente à diferença entre estes dois valores, será: σv' = σv – μ → σv' = (γsat . z) – (γw . z) → σv' = (γsat - γw) . z O que tenhamos: Aula 8 – Tensões no Solo I MECÂNICA DOS SOLOS 82 σv' = γsub . z Onde γsub é o peso específico submerso do solo. Exemplo: Determinar as tensões geostáticas verticais efetiva e total e a pressão neutra para o perfil apresentado na figura e traçar os diagramas correspondentes.Resolução: 1º Passo: Cálculo das Tensões Totais: σv = γ . z σv1 = γ1 . z1 → σv1 = 17,0 . 1,0 → σv1 = 17,0 kN/m² σv2 = σv1 + (γ2 . z2) → σv2 = 17,0 + (18,5 . 2,0) → σv2 = 54,0 kN/m² σv3 = σv2 + (γ3 . z3) → σv3 = 54,0 + (20,8. 1,5) → σv3 = 85,2 kN/m² Perceba, aluno, que as tensões totais do solo consideram sempre as camadas que estão acima dele. 2º Passo: Cálculo das Pressões Neutras μ = γw . hw μ1 = γw1 . hw1 → μ1 = 0 (acima do lençol freático) μ2 = μ1 + (γw2 . hw2) → μ2 = 0 + (10 . 2,0) → μ2 = 20,0 kN/m² μ3 = μ2 + (γw3 . hw3) → μ3 = 20,0 + (10 . 1,5) → μ3 = 35,0 kN/m² Aula 8 – Tensões no Solo I UNIDADE 3 – DISTRIBUIÇÃO DE TENSÕES 83 3º Passo: Tensões Efetivas σV’ = σV – μ σV1’ = σV1 – μ1 → σV1’ = 17,0 – 0 → σV1’ = 17 kN/m² σV2’ = σV2 – μ2 → σV2’ = 54,0 – 20,0 → σV2’ = 34,0 kN/m² σV3’ = σV3 – μ3 → σV3’ = 85,2 – 35,0 → σV3’ = 50,2 kN/m² 4º Passo: Gráfico 1.2.3. Cálculo das Tensões Geostáticas Horizontais As tensões geostáticas horizontais existentes em um maciço de solo são muito importantes no cálculo dos esforços de solo sobre estruturas de contenção, como os muros de arrimo, cortinas atirantadas etc. Estes esforços dependem em muito dos movimentos relativos do solo, ocasionados em função da instalação da estrutura de contenção. Para o caso do solo em repouso, as tensões geostáticas horizontais são calculadas empregando-se o coeficiente de empuxo em repouso do solo, conforme apresentado pela equação: σ′H = Ko . σ′V Segundo Jaky (1956), o coeficiente de empuxo em repouso do solo pode ser estimado com o uso da equação, apresentada a seguir, onde φ' é o ângulo de atrito interno efetivo do solo: Aula 8 – Tensões no Solo I MECÂNICA DOS SOLOS 84 Ko = 1 − sin ф′ 1.3. Acréscimo de Tensões Devido Carga Aplicada As cargas aplicadas na superfície de um terreno induzem tensões, com consequentes deformações, no interior de uma massa de solo. Embora as relações entre tensões induzidas e as deformações resultantes sejam essencialmente não lineares, soluções baseadas na teoria da elasticidade são comumente adotadas em aplicações práticas, respeitando-se as equações de equilíbrio e compatibilidade relatadas anteriormente. O solo é admitido como um meio homogêneo (propriedades iguais em cada ponto do maciço), isotrópico (em cada ponto, as propriedades são iguais em qualquer direção), de extensão infinita, sendo as deformações proporcionais às tensões aplicadas e calculadas utilizando-se os parâmetros elásticos do solo: E (módulo de elasticidade) e ν (coeficiente de Poisson). Estas hipóteses envolvem considerável simplificação do comportamento real do solo, sendo as soluções obtidas apenas aproximadas, devido às seguintes razões: • A admissão de uma relação linear entre tensões e deformações é razoavelmente consistente apenas no regime de pequenas deformações, quando a magnitude final das tensões induzidas é bastante inferior a magnitude das tensões de ruptura; • A hipótese de meio isotrópico e homogêneo significa assumir valores constantes para os parâmetros elásticos do solo quando se sabe, por exemplo, que o módulo de elasticidade tende a variar tanto em profundidade como lateralmente. A aplicação do modelo elástico fica então, implicitamente, vinculada à adoção de constantes elásticas do solo compatíveis com as condições de tensões e deformações existentes "in situ"; • A consideração do solo como um semi-espaço infinito e homogêneo, requer que terreno seja homogêneo em amplas áreas e até uma grande profundidade, função das dimensões da área do carregamento. Apesar destas limitações, a simplicidade das soluções obtidas justifica o amplo emprego desta teoria. Em análises mais avançadas, o método dos elementos finitos, incorporando modelos de comportamento tensão - deformação mais realistas para os solos, tem sido frequentemente utilizado para a avaliação de tensões e deformações induzidas em uma massa de solo. Baseado e adaptado de Sandro Lemos Machado e Miriam C. Machado. Edições sem prejuízo de conteúdo.
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