Buscar

Estruturas clínicas na clínica - Histeria - Palonsky

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS 
Grão-Chanceler 
Dom Serafim Fernandes de Araújo 
Reitor 
Prof. Pe. Geraldo Magela Teixeira 
Pró-reitora de Execução Administrativa 
Pror. Ângela Maria Marques Cupertino 
Pró-reitor de Extensão 
Prof. Bonifácio José Teixeira 
Pró-reitor de Graduação 
Prof. Djalma Francisco Carvalho 
Pró-reitora de Pesquisa e de Pós-graduação 
Pror. Léa Guimarães Souki 
... 
EDITORA 
PUC•MINAS 
EDITORA DA PUC•MINAS 
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais 
Pró-reitoria de Extensão 
Av. Dom José Gaspar, 500 • Coração Eucarístico 
Caixa Postal: 1.686 • Te!.: (031) 319.1220 • Fax: (031) 319.1129 
30535-610 • Belo Horizonte• Minas Gerais• Brasil 
facebook.com/lacanempdf
CIII I IH Ili. PHLUll�HY 
� 
ESTRUTURAS ,CLlnlCAS 
� 
nA CLlnlCA: 
A HISTERIA 
Colaboração na organização e redação dos textos 
ffiár10 Lúcio U1e1ra da S1l1,1a 
Belo Horizonte 
1991 
, sumnnm 
Apresentação ................................................................... 11 
A noção de estrutura ........................................................ 15 
Estruturas clínicas ............................................................ 20 
Constituição do sujeito .................................................... 22 
A estrutura neurótica ....................................................... 25 
A estrutura histérica ......................................................... 28 
Condições de estrutura .................................................... 33 
• Ausência de um objeto sexual fixo, 
previamente determinado ........................................... 34 
• Estrutura do desejo como desejo 
que está sempre mediatizado pelo 
desejo do Outro .......................................................... 36 
• Ausência de complementaridade 
entre os sexos ............................................................. 39 
• Particularidades do Édipo na mulher ......................... 42 
Saber e não saber ............................................................. 46 
Causa e objeto de desejo ................................................. 50 
A procura de respostas .................................................... 53 
A outra mulher ................................................................. 59 
A posição fálica ............................................................... 62 
Algumas respostas ........................................................... 67 
O sintoma histérico .......................................................... 70 
A clínica da histeria ......................................................... 79 
Referências bibliográficas ............................................... 85 
APRESEnTncno 
O texto que estamos apresentando não começou como tal. Os seminários de estruturas clínicas vêm sendo desenvolvidos em Belo Horizonte 
desde 1991, e aqui estamos tentando uma transcrição, tal­
vez não muito feliz. A passagem da palavra falada para a 
escrita não é fácil, e o clima do seminário, com a interven­
ção dos participantes, os exemplos e vinhetas clínicas, é 
irreproduzível. Mesmo assim, decidimos reproduzir a es­
trutura do seminário, evitando citações de textos e/ou re-
ferências bibliográficas mais próprias de uma obra escrita. li 
A bibliografia já existente sobre histeria poderia nos 
isentar do esforço de apresentar mais um texto, uma vez 
que não_ se trata nem de uma análise exaustiva de toda a 
bibliografia conhecida, nem de uma obra que apresente 
grandes novidades teóricas. No entanto, a importância do 
quadro, a enorme dimensão de suas conseqüências e a fre­
qüência com que aparece em nossos consultórios, justifi­
cam este trabalho. 
Nosso propósito estará cumprido se a maneira parti­
cular com que temos organizado o material permitir en­
tender melhor uma certa lógica da estrutura que estamos 
apresentando. Vamos insistir, no texto, sobre a questão de 
Cmtia m. Palonsky 
pensar em termos de estrutura. Não se trata de uma forma­
lidade. Se ficarmos apenas na fenomenologia, nada nos 
autoriza a dizer que uma militante feminista, urna dona de 
casa e mãe de família, urna prostituta, um executivo, uma 
freira, uma adolescente anoréxica, uma homossexual, uma 
modelo ou atriz, enfim, pessoas com vidas aparentemente 
tão diferentes e com problemas e conflitos tão diversos, 
têm alguma coisa em comum. 
Por sinal, temos a sensação de que existe uma certa 
imagem estereotipada que representa cada quadro. No caso 
da histeria, essa imagem é a de uma pessoa extremamente 
sedutora e sensual, assim como a imagem de um obsessi­
vo é a de uma pessoa muito preocupada com a higiene e a 
12 formalidade. Na verdade, estes são apenas "modelitos", e 
se pensarmos em função disso na hora de fazer um diag­
nóstico, podemos cometer grandes enganos. 
Uma outra questão que merece atenção especial re­
fere-se à relação entre histeria e feminilidade. Teoricamen­
te, fala-se da histeria como sendo independente do sexo 
do sujeito. No entanto, com freqüência os textos falam em 
termos de "a histérica"; quando aparece a referência à his­
teria no homem, vem desta maneira: "a histeria no ho­
mem", ou "a histeria masculina". É evidente que se fosse 
indiferente o sexo do sujeito não seria necessário fazer es­
sas distinções. Pensamos que a posição da mulher em re­
lação ao falo facilita o surgimento da questão histérica, 
estruturas Clínicas na Clínica, H Histeria 
como de fato vamos apresentá-la. Na prática clínica, en­
contramos a histeria basicamente em pacientes do sexo 
feminino, se bem que em alguns casos podemos conside­
rar que se trata de homens histéricos. Por outro lado, a 
descrição da problemática histérica inevitavelmente aca­
ba parecendo uma caricatura exagerada da conduta femi­
nina, ao melhor estilo de "Mulheres à beira de um ataque 
de nervos". 
Na organização do material, começamos por descre­
ver noções gerais, como o conceito de estrutura e o pro­
cesso de constituição do sujeito, já que este é o começo do 
curso de estruturas clínicas, e procuramos localizar e defi­
nir uma estrutura clínica como tal, de modo a diferenciá-
la da descrição sintomática. Assim, preferimos não consi- 13 
derar como óbvio aquilo que pode não sê-lo. 
A partir desse ponto, e já na apresentação da estrutu­
ra histérica como tal, organizamos o material em função 
da questão do saber, quase como um jogo de perguntas e 
respostas, partindo do que consideramos os pontos de es­
trutura que permitem, facilitam e até talvez justificam o 
surgimento da problemática histérica. O desenvolvimento 
é feito num movimento de espiral, que em cada volta de 
uma aparente repetição vai acrescentar mais um elemento. 
Por último, dedicamos uma atenção especial àquilo 
que encontramos na clínica, já que, apesar de comumente 
a histeria ser considerada o quadro mais "fácil" para o tra-
14 
Cmba m. Palonsky 
balho psicanalítico, na prática esse trabalho não é tão fá­
cil. Por outro lado, achamos importante fazer certas con­
siderações referentes ao diagnóstico diferencial, uma vez 
que muitas vezes a apresentação "enlouquecida" da histe­
ria pode levar a pensar numa psicose, assim como as coi­
sas que o sujeito é capaz de fazer em sua busca de saber 
aparecem à maneira de uma perversão. Mais de uma vez 
temos visto pessoas histéricas diagnosticadas como de­
pressivas e até melancólicas, pela facilidade com que po­
dem fazer rupturas narcísicas que atingem a auto-estima. 
A nOCAO OE ESTRUTURA 
Q
uando falamos em estrutura, estamos fazendo re­
ferência a um ç_gnj_uJ1to _c;le �kment()s que_rnan.:­
têm uma certa relação entre si, sendo que essa 
r ç , sua articulação e su_a posição relativa são mais 
importantes
do que os elementos em si. Esse conceito de 
estrutura vale para qualquer tipo de estrutura, não sendo 
exclusivo da psicanálise. Uma maneira simples de repre­
sentar uma estrutura seria: 
a e 
b d 
Trata-se de uma relação entre relações em que as po­
sições estão marcadas, ou seja, os elementos da expressão 
mantêm uma certa relação entre si, uma relação lógica. 
Isto quer dizer que céld� um dos elementos da expressão 
tem uma importância pelo lugar que ocupa em relação 
aos otttros elementos, não em si mesmo. O fato de a ex­
pressão ser composta por letras indica que os números que 
eventualmente poderão estar nos lugares das letras não têm 
importância em si: é a posição que cada número ocupa em 
relação aos outros que determinará o seu valor. Isso não 
significa, porém, que se possa colocar qualquer número 
15 
Cmtia m. Palonsky 
em qualquer lugar, uma vez que toda estrutura possui as 
suas regras. Por exemplo, podemos substituir as letras a, b 
e c da expressão por quaisquer números; suponhamos: 
2 3 
4 d 
O número que virá no lugar da letra d, porém, já não 
pode ser um número qualquer, arbitrário; a estrutura de­
termina que apenas um número pode estar nesse lugar, ou 
seJa: 
2 3 
4 6 
Desde que se respeitem as regras, é indiferente o ele­
mento concreto que constitui a equação. 
Vamos apresentar agora uma equação mais comple­
xa, por exemplo: 
2x ..J§ �x2 +6x+9 
---e===+ -- = ------
� x-3 x2 -4x+3 
Aparentemente, trata-se de fenômenos absolutamente 
diferentes, e no sentido da particularidade, é claro, são 
diferentes. Mas em termos de estrutura, são equivalentes. 
Se pensarmos na "equação" de cada sujeito, podemos apli­
car o mesmo raciocínio. 
O mesmo acontece em termos da estrutura da lín-
�struturas Clínicas na Clínica, A H1ster1a 
gua: não podemos juntar as palavras de uma forma aleató­
ria; tal como numa equação, existem regras que precisam 
ser respeitadas. Assim, falando ou escrevendo, é necessá­
rio fazer concordar o predicado com o sujeito, fazer a con­
cordância em gênero, número etc. Também nesse caso não 
interessa o elemento que está sendo colocado na estrutu­
ra, desde que a relação seja mantida. 
Essas considerações acerca da noção de estrutura, 
que à primeira vista podem parecer alheias ao sujeito, di­
zem respeito a ele em vários sentidos. O sujeito também 
faz parte de estruturas, de tal modo que se não fosse em 
relação a uma estrutura não existiria o sujeito, e o�or_da 
palavra de uma pessoa depende do lugar que essa pessoa 
ocupa numa estrutura. Assim, a palavra pronunciada pela 11 
mãe é importante porque provém de um lugar: o lugar da 
mãe. Da mesma maneira, o valor que tem a palavra do 
analista é dado pelo lugar do analista e não pela pessoa do 
analista. De fato, o ser humano faz parte de uma estrutura . ,, ,,' 
>' 
ainda antes de nascer, uma vez que ninguém chega num 
vazio. Em relação aos pais, à família, à cultura, já existe 
um certo lugar reservado para a criança que ainda não nas­
ceu, ela já tem o seu lugar marcado. Isso significa que a 
vida de um indivíduo tem suas determinações fora dele, 
determinações anteriores e exteriores a ele. A essa estru­
tura na qual todo ser humano se insere, a essa estrutura ex­
terna ao sujeito e que o determina, chamamos, em psica­
nálise, de Outro (A). Quando falamos em Outro, não es-
Cmba m. Palonshy 
tamos nos referindo a uma pessoa, mas a uma estrutura. 
Pode ser que este Outro esteja, em determinado momento, 
encarnado numa pessoa; mas o Outro é um lugar de estrutu­
ra e, como tal, interessa enquanto posição. Esse lugar pode 
ser ocupado pela psicanálise, deus, religião, enfim por qual­
quer coisa. O sujeito, por definição, está determinado des­
de fora dele, e o Outro deve ser pensado como uma referên­
cia, como o que marca os parâmetros da vida desse sujei­
to, o que ele é. 
Um aspecto fundamental à noção de estrutura é o fa­
to de que não existe nenhuma estrutura perfeita, comple­
ta, sem falhas. Por definição, toda estrutura tem uma fa­
lha, uma falha que lhe é inerente, não sendo, portanto, de-
18 vida a alguma contingência. A essa falta/falha da estrutu­
raJ em psicanálise, chamamos castração. Aqui, castração 
está referida a uma questão simbólica, não tendo a ver com 
a presença ou ausência de pênis, o que seria apenas uma 
maneira de imaginarizá-la. 
Pelo que estamos apresentando, trata-se de uma ques­
tão de definição da estrutura, e não da conseqüência de 
qualquer acontecimento contingente da história de um su­
jeito. PorimLilpél_re<::_e _c1_11_oção de que algo falta ou falha 
porque existe a suposiç_çío de çorripl�tLJcl_e. É importante 
frisar que se trata de uma suposição, no sentido de que é 
porque se "imagina" a possibilidade de uma estrutura per­
feita, completa, à qual se atribui uma falha. No entanto, 
intrinsecamente, não lhe falta nada: ela é como é. Dada 
estruturas Clínicas na Clínica, n Histeria 
porém a suposição da completude e da falta que lhe é cor­
relativa, chamamos de falo àquilo que completaria a es­
trutura, àquilo que supostamente falta. O Outro, enquanto 
estrutura, implica também uma castração, e a.man�ira como 
o sujeito se posiciona frente à castração do Outro e à sua 
própria resulta na definição ou no estabelecimento do que 
denominamos estrutura clínica. 
19 
20 
ESTRUTURAS cumcns 
O que o conceito de estrutura clínica como tal está defin indo é uma posição do sujeito, basicamen­te em relação à castração do Outro e à própria 
castração. Portanto, quando falamos em uma estrutura clí­
nica, não estamos nos referindo a um certo tipo de sinto­
mas, mas a uma posição do sujei to. É bem verdade que 
podemos falar de sintomas hi stéricos ou obsessivos, mas é 
importante assinalar que não é possível caracterizar uma 
estrutura a partir dos sintomas, os quais podem aparecer 
em qualquer estrutura. Fazer um diagnóstico estrutural é 
um processo que consiste em determinar a posição do su­
jeito frente à castração, não partindo, portanto, dos s into­
mas. Ao lado dessa posição do sujeito diante da castração, 
cada estrutura se organiza em torno de uma pergunta fun­
damental. A pergunta fundamental da histeria vai se dar 
em relação ao sexo, enquanto na neurose obsessiva vai ser 
em relação à vida e à morte. Isso não significa que tais 
questões não alcancem todos os seres humanos, mas cada 
uma das estruturas neuróticas vai se organizar em função 
de uma dessas questões básicas. 
Teoricamente, cada sujeito teria uma estrutura clíni­
ca definida, possível de ser identificada. Ternos, como es­
truturas reconhecidas, a neurose, a perversüo e a psicose 
Estruturas Clínicas na Clínica, n H1ster1a 
e, dentro das neuroses, são reconhecidas a histeria e a neu­
rose obsessiva. Um terceiro quadro neurótico, afobia, não 
tem a mesma condição das outras duas, nem todos os au­
tores a reconhecem como uma estrutura. 
É importante lembrar que as estruturas clínicas vão 
aparecer nitidamente delineadas nos livros e nos cursos, 
enquanto a realidade clínica freqüentemente mostra uma 
outra situação. Os quadros com os quais nos deparamos 
no consultório nem sempre são nítidos, muito embora pos­
sam, às vezes, apresentar claramente um tipo de problemá­
tica. Do ponto de vista teórico, supostamente é sempre 
possível identificar uma estrutura para o sujeito, o qual não 
pode estar em duas posições ao mesmo tempo; na clíni­
ca, por outro lado, às vezes pode-se duvidar durante mui­
to tempo acerca da estrutura de um determinado sujeito. 
Teoricamente, a determinação da estrutura é questão de 
tempo, sendo que a__e1,trutura clínica de determinado sujei­
to deve ir ficando clara através do trabalho analítico, à me­
dida que vai se afastando do sintoma
em si e identificando 
mais nitidamente o quadro, com a colocação de algumas 
suposições que vão sendo confirmadas ou não ao longo 
das entrevistas. 
Fazer o diagnóstico estrutural não é condição para 
iniciar uma análise; tenta-se, porém, aproximar-se dele pelo 
menos em termos das três grandes estruturas, o que tam­
bém às vezes não é fáci 1. O diagnóstico, por outro lado, dá 
ao analista certas indicações de como trabalhar em dire­
ção à cura. 
21 
conSTITUICAO ao SUJEITO 
Falamos em constituição do sujeito ou estruturação do sujeito porque partimos do princípio de que o sujeito é algo que vai se constituir, não é algo que 
já está aí. Antes de ser sujeito, o ser humano é objeto, ob­
jeto do desejo de um Outro. O sujeito tem uma série de 
determinações que são anteriores ao seu próprio nascimen­
to, já que ele chega numa estrutura que o antecede. Ele é 
sujeito ainda antes de nascer, no sentido de que já é falado 
por outros, de fazer parte de uma estrutura simbólica, mas 
22 é em relação a uma estrutura simbólica que ele vai se cons­
tituir realmente como sujeito. Se não fosse em relação a 
uma estrutura, não existiria o sujeito como tal. 
Quando o ser humano nasce, ele vai ocupar, por es­
trutura, o lugar de falo da mãe; ou seja, em um primeiro 
momento, ele vai ser o falo da mãe. Isso quer dizer que, 
nesse momento, a mãe vai estar completa com ele, que ele 
é tudo o que a mãe deseja. Existe assim a ilusão de uma 
completude possível. Dado que essa situação está caracte­
rizada pela completude, pela ausência de uma falta qual­
quer, a dimensão do desejo está aí abolida, de tal modo 
que não existe para o filho a possibilidade de desejar qual­
quer coisa. É a aparição da dimensão do desejo da mãe 
Estruturas Clímcas na Clímca, n H 1ster1a 
como tal que vai permitir, por sua vez, o aparecimento do 
desejo no filho. 
Para que isso ocorra, é necessário que exista na mãe 
um desejo que não possa ser satisfeito pelo filho. Aparece 
então qualquer sinal de que aquela completude era ilusó­
ria; o olhar da mãe se dirige para um além do filho, evi­
denciando que a mãe sente falta de algo, o que quer dizer 
que ela não é completa. Nesse momento vai aparecer a 
pergunta acerca do desejo da mãe, pergunta que nunca vai 
ser respondida, mas que também nunca vai ser abandona­
da totalmente. 
A partir da constatação de uma falta na mãe que a 
criança não pode satisfazer e da questão relacionada ao 
que a mãe deseja, a criança perde automaticamente o lu- 23 
gar de ser o falo e, uma vez tendo saído desse lugar, a ele 
não volta mais; correlativamente, quem dele não saiu não 
vai mais sair. A primeira alternativa - ter saído do lugar de 
falo - implica o afastamento da possibilidade de vir a ser 
um psicótico. No segundo caso, esse filho pode se tornar 
um psicótico, dado que a estrutura da psicose vai ter a ver 
com uma falha no corte da unidade mãe/filho, o que vai 
dar como conseqüência uma falha na estrutura do desejo. 
É aqui que aparece a importância da função paterna, 
já que é o pai quem vai entrar na cena, impedindo que mãe 
e fi lho fiquem fundidos, que a mãe engula o filho. Quando 
falamos em pai, não estamos fazendo referência à paterni-
Cmba m. Palonsky 
dade biológica; trata-se de uma função, uma função sim­
bólica, e poderíamos dizer que quem a exercer será o pai 
desse filho. Quer dizer que é com um não, com uma proi­
bição, que vai se abrir a possibilidade de existir um desejo 
e que vai se constituir o sujeito como tal. Para que esse 
não tenha valor, é necessário que a mãe o respeite, ou seja, 
a posição da mãe em relação ao pai é que vai determinara 
lugar do pai. Novamente aqui vamos esclarecer que não 
estamos nos referindo às pessoas concretas da mãe e do 
pai biológico, nem a atitudes manifestas de cada um deles. 
Aberta a pergunta acerca do desejo da mãe, o que 
vai aparecer como resposta é o que se chama Nome-do­
Pai, que tem a ver com a dimensão simbólica que estamos 
2q analisando. O Nome.ado-Pai entra num lugar terceiro, como 
referência, e seria aquilo que estaria dirigindo o desejo da 
mãe. Ou seja, que vai ter um lugar fundamental na estru­
tura, porque vai organizar todo o universo sirnhóJico. 
É nesse ponto que podemos falar, com rigor, da cons­
tituição do sujeito como tal e da constituição do inconsci­
ente. Até aqui não existe, pelo menos do ponto de vista 
teórico, diferença entre os sexos. É a partir da perda do lu­
gar de ser o falo que a questão de ter ou não ter vai ser 
importante, já que supostamente o falo é o que a mãe de­
seja. Assim, a chamada partição dos sexos vai se definir 
em função de ter ou não ter o falo, e esse processo vai se 
completar na hora da constatação da diferença sexual. 
n ESTRUTURA nEUROTICA 
V imos anteriormente que um ponto fundamental na constituição do sujeito refere-se à castração do Outro, entendida no sentido de que não exis­
te estrutura sem falha. O recalque dessa condição é o que 
define a neurose. Como elemento de estrutura, o recalque 
relaciona-se, portanto, com a castração do Outro e com a 
própria castração e aparece sempre como falta de um 
significante. Porém, dissemos que podemos falar de cas­
tração em dois sentidos: a castração do Outro e a do pró-
prio sujeito. Quando falamos em castração do Outro - con- 25 
ceito muito importante para a compreensão das demais 
estruturas - foi dito que toda estrutura apresenta uma fa-
lha, ou seja, toda estrutura é "castrada", não existe nenhu-
ma estrutura que seja perfeita. Vale a pena insistir nesse 
ponto, porque tal fato não constitui apenas um problema 
teórico, mas um problema para o sujeito. Isto significa que 
não existe na vida de um ser humano absolutamente nada 
garantido; a única coisa certa é a morte, certa no sentido 
de que inevitavelmente vai ·acontecer, mas não sabemos 
quando, como nem onde. 
Quando falamos em falta de garantia e em morte, esta­
mos nos referindo não apenas às do sujeito, mas também 
Cmlia m. Palonshy 
às dos seres próximos a ele. Não existe nenhuma previsão 
que se possa fazer do que vai acontecer na nossa vida, seja 
em um sentido mais concreto, seja em relação a qualquer 
circunstância da vida. Valores como lógica, justiça, ordem 
não passam de ideais que o sujeito constrói e sustenta para 
conseguir levar a_ vida de uma maneira mais ou menos "na­
tural". Se tivéssemos todo o tempo a consciência absoluta 
da imprevisibilidade, estaríamos permanentemente em um 
estado de angústia tal que a vida não seria possível. 
O conceito de angústia é aqui incorporado por ser 
fundamental, enquanto afeto que o sujeito vive quando se 
vê confrontado com a castração do Outro. Dado que seria 
impossível viver com a presença constante da angústia, o 
26 ser humano inventa ilusões, cria sistemas mais ou menos 
organizados para sentir que a vida é previsível, que existe 
justiça, ordem, para sentir que a vida faz sentido. Para que 
possa fazer isso e sustentar a possibilidade de um Outro 
não castrado, o movimento do neurótico é colocar a cas­
tração do seu próprio lado. Isso quer dizer que a existên­
cia de qualquer falha passa a ser devida ao fato de que ele 
não sabe, não pode, não consegue ou não merece, e não 
porque a falha existe por estrutura. 
O que seria então do plano da impossibilidade (e im­
possibilidade sempre quer dizer castração do Outro, situa­
ção de uma falha estrutural, onde o que é impossível as­
sim o é por estrutura e não pela vontade de alguém) o su-
Cstruturas Clínicas na Clímca, A H1ster1a 
jeito neurótico transforma em impotência. Isso significa 
que quem não pode é ele, o neurótico, mas que a questão, 
em si, é possível. Exemplo disso é o
fato de a menina cul­
par a mãe por não ter pênis; ao culpá-la, a presença do pê­
nis em uma mulher aparece como uma possibilidade dita­
da pela vontade de alguém, e não como algo impossível. 
Esse oferecimento que o sujeito faz da própria castração 
para sustentar o Outro como não-castrado é o que define a 
neurose. 
21 
A ESTRUTURA HISTERICA 
Ahisteria é um quadro de existência muito antiga, um nome que já vinha sendo usado muito antes de Freud. Constituindo sempre um objeto de in­
teresse, a histeria ganhou um grande número de explica­
ções acerca da sua etiologia e, dependendo da natureza da 
explicação, tornava-se alvo de práticas religiosas, judiciá­
rias e médicas, entre outras. 
Na história da histeria, Charcot introduziu contribui-
28 ções muito significativas, demonstrando que os sintomas 
histéricos, predominantemente localizados no corpo, po­
dem ser induzidos ou suprimidos através da hipnose e que, 
portanto, a histeria estaria muito mais relacionada ao de­
sejo do médico do que a uma questão neurológica. 
Freud, que estagiou com Charcot, absorveu essa li­
ção e também o fato de que a histeria tem as suas próprias 
leis, não necessariamente as leis da medicina. Abordando 
a questão da lesão nas paralisias histéricas, Freud ( 1 893) 
diz que ela deve ser completamente independente da ana­
tomia do sistema nervoso, pois, nas suas paralisias e em 
outras manifestações, a histeria comporta-se como se a 
anatomia não existisse, ou como se não tomasse conheci-
Estruturas Clírncas na Clírnca, A H1ster1a 
menta dela. 1 Assim, o corpo que as histéricas apresenta­
vam era um corpo marcadamente diferente daquele que 
era objeto da atenção da medicina. 
Na verdade, o interesse de Freud pela histeria já es­
tava presente antes mesmo de estagiar com Charcot, pos­
sivelmente a partir do relato que Breuer lhe fez acerca do 
caso conhecido como "Anna O.". Esse interesse fez com 
que Freud dedicasse sua atenção àquelas pacientes que, 
apresentando uma sintomatologia toda particular, desafia­
vam o conhecimento médico e, de certa forma, "exigiam" 
do médico uma escuta também particular. A fala dessas 
pacientes passa então ao primeiro plano, e da sua escuta 
rigorosa, podemos dizer, nasce a psicanálise. Assim, Freud 
esclarece a etiologia da histeria ao mesmo tempo em que 29 
lança os principais conceitos da psicanálise, entre eles o 
de recalque, inconsciente, fantasia, transferência etc. 
A histeria é um dos poucos quadros, senão o único, 
em relação ao qual não existem muitas discussões teóricas 
acerca da sua qualificação como neurose. Não obstante, 
suas manifestações são tão variadas que certos quadros 
são chamados "psicose histérica" e, de fato, a histeria às 
vezes pode se apresentar de maneira tal que sugere uma 
psicose. 
Com relação à variedade das manifestações da histe-
' FREUD, 1 977. p. 234. 
Cmba m. Palonsky 
ria, à diversidade de sintomas que apresenta, podemos di.­
zer que os quadros atuais são nitidamente diferentes da­
queles descritos por Freud. Naquela época, Freud descre­
via suas pacientes como apresentando graves paralisias, 
sérias perturbações, incluindo a chamada "grande conver­
são". Pacientes desse tipo não são a maioria dos que fre­
qüentam atualmente os consultórios dos analistas, ou seja, 
a "aparência" dos sintomas, hoje em dia, é diferente da 
época de Freud. Essa modificação na forma que o sintoma 
assume, fazendo com que determinado "tipo" seja mais 
prevalente em determinada época, aponta para a impor­
tância das identificações no estabelecimento do sintoma. 
Sabemos que os ideais de uma sociedade não são fixos, de 
30 modo que aquilo que ontem era considerado como o má­
ximo numa escala de valores, hoje pode estar numa posi­
ção bem inferior. Para ficarmos apenas em um campo, te­
mos, por exemplo, a constante variação do que seria o ide­
al da beleza feminina. Conforme veremos posteriormen­
te, as identificações vão estar sendo determinadas pelos 
ideais e, portanto, a maneira como os sintomas se apre­
sentam sofre necessariamente uma modificação em fun­
ção da modificação dos ideais. De fato, quadros como ano­
rexia e bulimia, tão freqüentes na atualidade, poderiam 
ser o equivalente das grandes crises de cem anos atrás. 
Essa, digamos, "mutabilidade" na forma como os sin­
tomas se apresentam é um dos indicadores de que a defi-
Cstruturas Clímcas na Clímca, n H isteria 
nição de uma estrutura clínica não pode ser feita com re­
ferência a um certo tipo de sintoma. Muito embora possa­
mos falar de "sintomas histéricos", é importante reafirmar 
que os sintomas, em si, não caracterizam uma estrutura, 
mesmo porque um dado sintoma pode aparecer em qual­
quer estrutura. O reconhecimento de uma estrutura clínica 
requer um outro referencial. O conceito central em torno 
do qual vai girar a possibilidade de. um diagnóstico dife­
rencial em termos de estrutura clínica é o conceito de cas­
tração. A partir da noção de constituição do sujeito, te­
mos que nesse processo vai estar envolvido o reconheci­
mento por parte da criança da castração: a de si própria e a 
do Outro, inicialmente encarnado na figura da mãe. Sabe-
mos que a neurose vai se estruturar em função da posição 31 
que o sujeito vai tomar em relação à cªstração, posição es-
ta caracterizada pelo recalque da castração do Outro, bus-
cando manter um Outro não-castrado. O movimento rea-
lizado pelo sujeito de modo a conseguir manter a ilusão 
acerca da existência de um Outro completo consiste em 
trazer para si a castração, e é nesse sentido que Lacan diz 
que o neurótico oferece a própria castração para sustentar 
um Outro não-castrado. Como conseqüência, aquilo que é 
impossível por estrutura, o neurótico "transforma" em im­
potência de si próprio. Assim, a falha existente e inerente 
a qualquer estrutura passa a ser devida a uma falha do su-
jeito. 
Cmba m. Palonsky 
Esse movimento do sujeito de manter o Outro como 
não-castrado deve-se a uma importante condição: por defi­
nição, temos que o Outro refere-se a uma estrutura incom­
pleta, portanto castrada, e que defrontar-se com a castra­
ção do Outro produz angústia; podemos também dizer que 
o sujeito tudo fará para não se defrontar com isso, tudo fa­
rá para não se angustiar. A saída por excelência desenvol­
vida pelo neurótico nesse sentido é, como foi dito, trazer a 
castração para si, mantendo o Outro completo e, portanto, 
livrando-se da angústia. Mantendo dessa maneira a supo­
sição de uma estrutura perfeita, aquilo que seria da ordem 
de uma impossibilidade estrutural (e, portanto, produtor 
de angústia), é transformado em impotência e insatisfa-
32 ção. Como veremos, a-h.i.s_térica.vai_se_apresentavremprt 
como insatisfeita. 
Temos, pois, que o sujeito, em relaçãq à neurose, foi 
confrontado com a castração do Outro e que, portanto, ele 
"sabe" dessa castração. Entretanto, pelo recalque, esse "sa­
ber" é afastado do plano consciente, e o sujeito, mesmo 
sabendo, faz como se disso não soubesse. Podemos dizer 
que a neurose está e.struturada em torno desse "saber" iI1c 
consciente, a partir da ação do recalque. 
Esse é o fundamento da neurose, presente, tanto na 
histeria quanto na neurose obsessiva. Entretanto, podemos 
dizer que o recalque da castração do Outro é o mecanismo 
por excelência da histeria. 
conmcoES DE ESTRUTURA 
Podemos ainda avançar em relação àquilo que vai conferir especificidade à histeria, considerando que sua montagem vai se realizar em torno de al­
gumas condições de estrutura, principalmente as quatro 
seguintes : 
• ausência de objeto sexual fixo, previamente marcado; 
• estrutura do desejo como desejo que
está sempre 
mediatizado pelo desejo do Outro; 
• ausência de complementaridade entre os sexos; 
• características particulares do Édipo na mulher. 
Essas condições vão produzir o aparecimento de cer­
tas perguntas ou questões fundamentais que, assumindo 
as mais diferentes formas, estarão presentes durante toda 
a vida. Podemos dizer que se trata de questões que vão 
funcionar como eixo e guia da histérica, e toda a sua vida 
vai estar dedicada a tentar achar uma resposta a essas per­
guntas, colocando-a numa posição de supostamente estar 
sempre "querendo saber". Posteriormente, veremos por que 
aqui foi colocado o termo supostamente. 
Consideraremos, a seguir, cada uma dessas condi­
ções e as perguntas a elas relacionadas. 
33 
Cmlia m. Palonsky 
Ausência de um objeto sexual fixo, previamente 
determinado 
Até que Freud produzisse, em 1 905, o seu trabalho 
"Três ensaios sobre a teoria da sexualidade", existia, entre 
outras, a crença de que a sexualidade adulta estaria deter­
minada pelo encontro de um objeto heterossexual para que 
se pudesse realizar a sua finalidade, o ato sexual, o coito. 
Dada essa concepção, a sexualidade humana seria algo da 
natureza do instinto, existindo já previamente marcado 
através de que objeto poderia se dar a satisfação sexual. 
É sobretudo a partir do segundo dos três ensaios -
"As aberrações sexuais" - que Freud vai provocar uma 
profunda revisão nessa concepção. Fazendo uma análise 
Jq detalhada do que seriam os chamados "desvios sexuais", 
Freud mostra que quando tratamos de sexualidade huma­
na, a noção de instinto é inadequada; surge o conceito de 
pulsão, conceito diferente de instinto e que tem como uma 
das características fundamentais o fato de não possuir um 
objeto determinado, natural. 
Nas palavras de Freud ( 1 905), parece provável que 
a pulsão sexual seja, em primeiro lugar, independente de 
seu objeto; nem é provável que sua origem seja determi­
nada pelos atrativos de seu objeto.2 
Essa independência em relação ao objeto implica que, 
' FREUD, 1 977. p. 1 49. 
Estruturas Clínicas na Clímca, n H1ster1a 
pi irn ! l ser humano, não existe nada que indique, de ante-
1 1 1 :i ! l , qual é o objeto da satisfação sexual, nada que indi­
que o que desejar. Ou seja, não existe nenhuma indicação 
se o objeto ao qual se vai dirigir deve ser uma pessoa do 
sexo oposto, conforme era suposto antes de Freud. O ob­
jeto vai se constituir como resultado de um processo, e é 
sempre apresentado por um Outro. Além disso, os objetos 
com os quais o sujeito "aprende" o que se relaciona com o 
amor, o desejo e o sexo vão ser os objetos proibidos na ho­
ra da escolha. A própria estrutura do desejo faz com que 
nunca exista um objeto totalmente satisfatório, havendo 
sempre uma distância entre o objeto desejado e aquele en­
contrado. Isto não é um acidente particular da vida de uma 
pessoa, nem depende da sua maneira de buscar ou esco- 35 
lher o objeto. É claro que a história e as particularidades 
de cada um são importantes, mas a impossibilidade de en-
contrar "O Objeto" do desejo não depende disso. Por si­
nal,s_e,um sujeito tem um encontro com esse tal objeto, o 
. resulta<;lo não é uma imensa satisfação, mas uma intensa 
angústia, como veremos à frente. 
Esta condição de estrutura - a indeterminação pré­
via do objeto sexual, um não-saber acerca desse objeto - é 
uma das condições que possibilitam a estruturação da his­
teria. E, dado que não se sabe previamente acerca do obje­
to, abre-se então uma das perguntas fundamentais ao qua­
dro da histeria, mais precisamente uma pergunta sobre o 
que desejar. 
Cmba m. Palonsky 
Estrutura do desejo como desejo que está sempre 
mediatizado pelo desejo do Outro 
A consideração desse ponto implica que retomemos 
brevemente o processo envolvido na constituição do su­
jeito. Vimos que quando uma criança nasce, ela vai ocu­
par, por estrutura, o lugar de falo da mãe, ou seja, essa cri­
ança vai, inicialmente, ser o falo da mãe, aquilo que torna 
essa mãe completa. Estamos aqui falando de um momen­
to particular em que existe uma fusão mãe/criança, um 
momento em que a criança identifica-se com o que supõe 
ser o objeto de desejo da mãe. Nessa condição de suposta 
completude, a dimensão do desejo está abolida, não exis­
tindo a possibilidade de a criança desejar qualquer coisa: 
36 ela é tudo o que a mãe deseja. 
A unidade mãe/criança vai ser abalada se e quando 
surgir na mãe a possibilidade de um desejo que não possa 
ser satisfeito pelo filho; e, neste momento, entra em cena 
o pai como aquele para o qual se dirige o desejo da mãe. A 
percepção do desejo na mãe coloca para o filho a questão 
de que ele não a preenche, que a mãe não fica completa 
com ele, que ele não é tudo que a mãe precisa, quer. É nes­
sa circunstância que, supostamente, vai entrar a figura do 
pai. Como já foi apontado, não se trata exatamente do pai 
biológico, mas de umafunção que indica que o desejo da 
mãe está referido a uma outra ordem, que não está cir­
cunscrito no espaço mãe/filho. É nesse sentido que dize-
Estruturas Clínicas na Clínica, n H1ster1a 
mos que o desejo da mãe está submetido a uma lei tercei­
ra. Devemos lembrar que o que estamos analisando é a es­
trutura do desejo, o estabelecimento ou não da dimensão 
do desejo, dado que desejo não é algo que exista por es­
trutura, não é um ponto de saída, pode ou não surgir. E o 
surgimento, a estruturação do desejo dependem de uma 
série de elementos. Estamos tratando do desejo como tal, 
sempre em referência ao Outro. 
Conseqüência desse momento é o estabelecimento 
de uma pergunta acerca do desejo da mãe, sobre o que ela, 
afinal, deseja. A entrada do pai faz com que a resposta a 
essa pergunta aponte para o pai como, inicialmente, sendo 
o objeto de desejo da mãe e, posteriormente, como tendo 
tal objeto. Portanto, a resposta sobre o desejo da mãe- co- 31 
loca-o em relação ao desejo de um Outro e, insensivel-
mente, a criança se dá conta da relação do desejo da mãe 
com o do pai. Tal "pressentimento", de fato, revela aquilo 
que constitui a essência da estruturação do desejo: que o 
desejo de cada um está submetido à lei do desejo do Outro. 
Também neste ponto podemos falar da importância 
desempenhada pela percepção da diferença sexual e a su­
posição de que tal diferença é estabelecida em função de 
uma falta. Assim, a partir do ponto em que uma pergunta é 
levantada acerca do desejo da mãe, podemos considerar a 
resposta que aparece em dois níveis: num primeiro mo­
mento, a resposta aponta para o falo como aquilo que a 
Cm tia m. Palonsky 
mãe deseja, portanto aquilo que lhe falta; o falo como ob­
jeto concreto, como alguma coisa que alguém concreta­
mente possui e que, portanto, alguém pode vir a possuir. 
Num segundo momento, porém, a criança vai perceber que 
aquilo que a mãe deseja não é o falo, objeto concreto que 
o pai possui; aquilo que ela deseja é o desejo do pai, o que 
vai ser correlativo à percepção de que o que o pai deseja é 
o desejo da mãe. Ou seja, neste ponto, teríamos o estabe­
lecimento do desejo como desejo de desejo, como desejo 
que nunca pode ser realizado, uma vez que está estruturado 
em função de uma falta. 
Constituir-se enquanto sujeito implica, pois, abrir pa­
ra a criança a dimensão do desejo, ao mesmo tempo em 
]8 que a resposta sobre o que desejar encontra-se mediatizada 
pelo desejo de um terceiro, de um Outro. Portanto, para 
que um objeto possa ser tomado como objeto de desejo, é 
essencial a referência de um Outro. Essa situação pode ser 
articulada ao tópico visto anteriormente, sobre a ausência 
de um objeto sexual fixo, previamente determinado;
c;!;lda 
,;i. ausencia de indicações prévias sobre o objeto, é o desejo 
do Outro que vai apontar para o objeto e marcá-lo como 
objeto de desejo. Temos, assim, que um objeto qualquer se­
rá desejado se for um objeto desejado por um terceiro. Como 
diz Masotta, o acesso ao objeto do desejo é outorgado por 
um terceiro. O objeto é o objeto do desejo do terceiro.3 
' MASOTTA, 1 987. p. 92. 
Estruturas Clínicas na Clínica, D Histeria 
Temos assim estabelecida uma condição de estrutu­
ra que resulta numa indagação daquilo que é desejado pelo 
Outro, condição necessária para que o sujeito possa ter 
uma referência acerca do seu próprio desejo. 
Ausência de complementaridade entre os sexos 
Para tratar desse ponto, estaremos novamente nos 
embasando no processo de constituição do sujeito. Reto­
mando parte desse processo, temos que a situação na qual 
a criança ocupa o lugar de falo da mãe é rompida com a 
constatação de que a mãe tem o seu desejo voltado para 
outro lugar e que, supostamente, o que ela deseja é o falo. 
Já que a criança foi afastada do lugar de ser o falo da mãe, 
e dado que é o falo aqui lo que a mãe deseja, a questão de 39 
ter ou não ter o falo ganha dimensão. Nesse processo, que 
deverá resultar na partição dos sexos, o reconhecimento 
da distinção anatômica entre os sexos desempenha um 
papel importante. 
Para analisar esse papel, vamos recorrer a uma cren­
ça infanti l , apontada por Freud, segundo a qual todos os 
seres humanos seriam dotados de pênis, desconsiderando, 
portanto, a possibi l idade de que alguém não tenha pênis. 
Essa crença sofre um abalo com a constatação da diferen­
ça entre os sexos, ou seja, é i nstaurada para a criança a 
poss ib i l idade da existência de seres sem pênis. Freud 
( 1 924) diz: Mais cedo ou mais tarde a criança, que tanto 
Cmlia m. Palonsky 
orgulho tem da posse de um pênis, tem uma visão da re­
gião genital de uma menina e não pode deixar de conven­
cer-se da ausência de um pênis numa criatura assim se­
melhante a ela própria.4 A diferença entre os sexosé en­
tão colocada para a criança em relação a uma falta_. De 
fato, tudo isso poderia ser simplificado caso a diferença 
entre os sexos fosse "apenas" uma diferença, segundo a 
qual um sexo é constituído de uma maneira, e o outro, de 
outra maneira. No entanto, não é assim que acontece, e a 
suposição de que "algo falta" é o que vai constituir a base 
da diferença. 
A con�tatação de que "alguém tem" e "em alguém 
falta" traz algumas conseqüências importantes, entre elas 
o fato de "ter" ou "não ter" ser reconhecido como uma 
qo doação ou não-doação feita por um Outro, no caso �la 
mãe. Isto é o que, de fato, vai configurar a diferença: não é 
o pênis em si, mas o pênis enquanto símbolo daquilo que 
foi dado a um e negado a outro. É nesse sentido que pode­
mos entender a citação de Freud (1923) : 
A característica principal dessa 'organização genital 
infantil ' é sua diferença da organização genital final 
do adulto. Ela consiste no fato de, para ambos os 
sexos, entrar em consideração apenas uin órgão 
genital, o masculino. O que está presente, portanto, 
não é uma primazia dos órgãos genitais, mas uma 
primazia do falo.5 
' FREUD, 1 977. p. 220. 
' FREUD, 1 977. p. 220. 
�struturas Clínrcas na Clínrca, n H 1ster1a 
Estamos, portanto, lidando com uma estrutura na qual 
os conjuntos são delimitados em função da presença ou 
ausência de um único elemento, o falo. E, supostamente, 
o homem se coloca no conjunto dos que têm, enquanto a 
mulher se coloca no conjunto dos que não têm. O estabe­
lecimento desse ponto é importante, entre outros motivos, 
porque vai marcar uma dissimetria essencial entre a posi­
ção masculina e a posição feminina, ou seja, os dois sexos 
não estarão em posições simétricas. 
A respeito desse tema, Lacan nos fala do "mito de 
Aristófones", segundo o qual o que o ser humano procura 
é o seu complemento, que é o outro, que é sua metade se­
xual, que o vivo procura no amor.6 Podemos reconhecer 
no discurso das pessoas a existência desse mito no qual q1 
está implícita a possibilidade de homens e mulheres se 
completarem mutuamente. Tal crença, no entanto, vai um 
pouco além, chegando à suposição de que para cada mu-
. lher existe um homem, como duas metades que, juntadas, 
formariam um todo. A crença, pois, é na possibilidade do 
"todo", que este "todo" não existe apenas temporariamen­
te, que a questão da incompletude é algo apenas contin­
gencial e, portanto, passível 'de ser sanada. Supor a exis­
tência de um "todo" que seria formado quando as duas 
metades se encaixassem perfeitamente equivale a não se 
'' LACAN, 1 985. p. 1 95. 
Cmtia m. �alonsky 
_conformar com a incompktude como inerente à estrutura. 
Esse mito vai ter um lugar importante na estrutura da hi_s� 
teria; na verdade, a histérica vai buscar, de todas as manei­
ras, sustentá-lo, Não se conformando em ter de se definir 
por uma negatividade, a histérica vai buscar permanente­
mente uma resposta para a sua identificação, que não seja 
o falo, permanentemente indagando sobre o que é ser 
mulher. Trata-se, enfim, de uma pergunta em relação àquilo 
que seria um sinal distintivo da feminilidade, pergunta que 
estará sempre apontando para algo além do falo. 
Particularidades do Édipo na mulher 
Quando em "O Ego e o ld" ( 1923) Freud aborda a 
q2 questão da dissolução do complexo de Édipo, ele aponta 
que, para o menino, a saída mais normal para o conflito 
resulta em uma intensificação de sua identificação com o 
pai, saída que permite que a relação afetuosa com a mãe 
seja, em certa medida, mantida.1 Nessa época, considera­
va que, com a menina, as coisas ocorriam de maneira pre­
cisamente análoga. É importante sublinhar a última pala­
vra da frase de Freud - mantida -, indicando assim ser a 
mãe (ou o seio) o primeiro objeto investido libidinalmente 
pelo menino. Já em 1 925, em "Algumas Conseqüências 
Psíquicas da Distinção Anatômica Entre os Sexos", Freud 
7 FREUD, 1 977. p. 46-47. 
Estruturas Clínicas na Clínica, A H1ster1a 
revê sua opinião de que com as meninas a ocorrência do 
complexo de Édipo seria análoga à dos meninos. Afirma 
que o primeiro objeto de amor, tanto para os meninos quan­
to para as meninas, é a mãe e que tal fato vai exigir da 
menina uma ação adicional em relação ao menino, no sen­
tido de uma substituição do objeto: abandonar a mãe (ob­
jeto do mesmo sexo que o dela) e dirigir-se ao pai (objeto 
de sexo diferente do dela). Essa mudança de objeto decor­
re do complexo de castração de que a menina é vítima, 
sob a forma de inveja do pênis, provocada a partir da cons­
tatação da diferença sexual. Freud ( 1925), assim expressa 
o juíza e a decisão da menina frente à constatação da dife­
rença sexual: Ela o viu, sabe que não o tem e quer tê-lo.8 
Como conseqüências da inveja do pênis, Freud aponta qJ 
o desenvolvimento de um sentimento de inferioridade, o 
ciúme enquanto denotador da inveja do pênis deslocada, 
e uma reação contra a masturbação fálica. Uma outra con­
seqüência é �aracterizada por um afrouxamento da rela-
ção afetuosa da menina com seu objeto materno,9 ou seja, 
a percepção do pênis como aquilo que constitui o traço 
identificatório do sexo faz com que a intensidade da rela-
ção da menina com sua mãe diminua, na medida em que a 
mãe é responsabilizada pelo fato de a menina não possuir 
' FREUD, 1 977. p. 3 1 4. 
" FREUD, 1 977. p. 3 1 6. 
Cmlia ffi. Palonsky 
o traço indiscutível da sua identidade sexual. A menina 
poderia buscar tal identidade através de sua mãe, mas essa 
alternativa constitui um paradoxo, na medida em que a 
mãe é desvalorizada tanto pelo fato de não ter dado
à me­
nina o traço identificatório, quanto pelo fato de a menina 
perceber que a mãe não o deu porque também não o tem. 
Tal situação faz com que a menina volte o seu inte­
resse para o pai, esperando receber dele aquilo que a mãe 
supostamente lhe negou; e aquilo que ela espera receber 
do pai é um filho. Desse modo, o pai, em sua relação com 
a menina, aparece como um substituto da mãe, como aquele 
que vai dar a ela aquilo que a mãe não deu, o sinal iden­
tificador do sexo. Neste sentido, a maternidade passa a ser 
qq vista como o sinal da feminilidade, o traço identificatório 
do que é ser mulher. 
Conforme coloca Freud, Ela ( a menina) abandona 
seu desejo de um pênis e coloca em seu lugar o desejo de 
um filho; com este fim em vista, toma o pai como objeto 
de amor. 10 Na verdade, voltar o interesse para o pai, espe­
rando receber dele um filho, não significa que a menina 
esteja renunciando ao desejo de ter um pênis, mas que es­
tá buscando no filho o substituto do pênis. Tornar-se mu­
lher passa então a ser igual a tornar-se mãe. 
Em relação ao Édipo, Freud conclui que enquanto 
'º FREUD, 1 977. p. 3 1 8. 
Estruturas Clímcas na Clímca, n H 1ster1a 
nos meninos o complexo de Édipo é destruído pela amea­
ça de castração, nas meninas ele se faz possível e é intro­
duzido através do complexo de castração. 1 1 
Conforme foi apontado, a mãe não possui aquilo que 
poderia sustentar uma identificação da filha como mulher 
e, nessa busca de com o que se identificar, a menina passa 
então por um momento de identificação com o pai. Tal 
identificação com o pai, uma identificação masculina, é 
analisada por Lacan dentro da seguinte perspectiva: a ex­
pectativa da menina é de que, identificando-se com o pai e 
olhando para a mulher que o pai deseja, ela J:lClssa, afinal2 
_descobrir aquilo que um homem deseja numa mulher, por­
tanto, uma referência em relação ao que é ser mulher e ao 
que ela própria como mulher deve desejar; ou seja, um q5 
ponto que possa sustentar uma identificação feminina. 
Assim, uma das características do Édipo feminino 
consiste numa "dupla identificação", masculina e femini­
na, estruturada em torno da pergunta de o quê os homens 
desejam nas mulheres e o quê as mulheres desejam nos 
homens, pergunta presente de forma marcante no quadro 
da histeria. 
1 1 FREUD, 1 977. p. 3 1 8. 
SABER E nAO SABER 
Temos, pois, levantadas as condições de estrutura que são fundamentais no estabelecimento da his­teria, bem como as perguntas ou questões que de­
las derivam. Essas perguntas, ao lado da posição do sujei­
to diante da castração do Outro, orientarão, na clínica, a 
identificação da estrutura histérica. A importância dessas 
perguntas justifica que as retomemos brevemente. São per­
guntas que dizem respeito a: O que desejar? A quem dese­
jar ? O que é ser mulher ? O que os homens desejam nas 
q6 mulheres? O que as mulheres desejam nos homens? Tais 
perguntas, como dissemos, são características da estrutu­
ra histérica, tendo um impacto decisivo sobre a vida da 
histérica; muito mais do que uma simples curiosidade, es­
sas perguntas básicas vão funcionar como eixo e guia da 
vida da histérica, que vai se dedicar a tentar achar uma 
resposta para elas, mas com a particularidade de que ela. 
nãQ sªbe que o que ela procura é um saber. 
Por sinal, a cultura oferece permanentemente mode­
los do que supostamente é uma mulher, o que é o amor, o 
que é o desejo, o que um homem deseja e o que uma mu­
lher deve desejar. Desde as novelas até as letras das músi­
cas, passando pela publicidade e a moda, indicam-nos: 
Estruturas Clínicas na Clínica, H H1ster1a 
"Uma mulher deve ser ... " (Da letra do bolero "La mujer", 
de Mario Clavell) 
Porém, a maneira como o sujeito histérico vai procu­
rar as respostas é bastante particular: se de um lado ele 
procura saber, de outro ele realmente não quer chegar a 
saber. Temos dito que a histeria se define pela posição do 
sujeito em relação à castração do Outro; dissemos tam­
bém da angústia como afeto inevitável diante da cons­
tatação dessa castração, e dos movimentos tendentes a evi­
tar esse encontro. Se a procura de saber na histeria che­
gasse às últimas conseqüências, o que apareceria seria pre­
cisamente a castração do Outro, o encontro com o objeto 
como causa de desejo e a angústia inevitável. A resposta 
do lugar da mulher como objeto de desejo de um homem é q1 
inaceitável; esse querer saber vai esbarrar no limite de che-
gar no ponto a partir do qual tudo volta atrás, dando lugar 
a um novo ciclo, tão inútil como o anterior. 
Assim como organizamos o texto até aqui em fun­
ção daquilo que o sujeito histérico procura saber, vamos 
continuar acrescentando aquilo que ele não quer chegar a 
saber. É bom lembrar que, de fato, o sujeito histérico sabe 
da castração do Outro, já que, se não fosse assim, tratar­
se-ia de uma psicose. Se falamos de neurose é porque esse 
saber existe, só que é um saber recalcado. 
Temos pois, na histeria, uma situação em que convi­
vem, ao mesmo tempo, a busca de um saber e um não que-
Cmlia m. Palonsky 
rcr saber, uma vez que a resposta possível levaria ao apa­
recimento da angústia. As perguntas que colocam o sujei­
to histérico na trilha do querer saber, como já vimos, apon­
tam para a questão do desejo e colocam em jogo a defini­
ção da feminilidade. Porém, temos que nada existe que 
defina a mulher pela presença de algo, de modo positivo; 
ela é definida por uma falta, por algo que não tem. V�_t_(!f, 
portanto, de se identificar como mulher en1 r�l-ªç_ão ª uma 
negatividade, ou seja, ela nunca vai encontrar alguma coi­
sa com a qual se identificar positivamente. Podemos exem­
plificar dizendo que cada país tem seus símbolos pátrios, 
tais como bandeira, hino etc., e o cidadão se identifica com 
o país através desses símbolos. Imaginando-se um país que 
qe não tenha nenhum símbolo, a identificação do cidadão de 
tal país se dará em função de uma falta. No caso da mu­
lher, o fato de ela não ter com o que se identificar em po­
sitivo vai levá-la a procurar durante toda a vida essa iden­
tificação: ser mulher é tal coisa, é ter isso ou fazer aquilo. 
Nada existe que possa identificá-la definitivamente. 
Essa condição resulta então em um problema: uma 
vez que não existem respostas possíveis para as pergun­
tas, isso vai fazer com que a histérica permaneça numa 
posição de supostamente querer saber; supostamente por­
que, na verdade, o que ela vai fazer é todo um movimento 
para nunca chegar a saber da inexistência de respostas. 
Tal inexistênci_a corresponde a uma falha da estrutura, e 
Estruturas Clínicas na Clímca, n H1ster1a 
deparar-se com isso é angustiante. Conforme já pudemos 
ver, o neurótico sempre procurará evitar o aparecimento 
da angústia e a histérica consegue isto em alguma medida, 
desde que não considere a possibilidade de não existirem 
respostas às suas perguntas. Dado que todas as respostas 
vão estar sempre apontando para uma única coisa, o falo, 
a histérica não se conforma, reivindicando sempre a exis­
tência de uma outra possibilidade. Ela sabe que_existe algo 
além do falo, e essa é a grande verdade que a histeria de­
nuncia sem sabê-lo. 
t,. resposta possível que a histérica recusa coloca a 
mulher como objeto de desejo de um homem, e estar na 
posição de objeto de desejo é angustiante, uma vez que , 
nunca se sabe exatamente o que o Outro deseja. Evitar a 49 
angústia implica então, para a histérica, não reconhecer a 
posição da mulher enquanto objeto de desejo de um ho-
mem. Nesse sentido, é importante diferenciar a função de 
causa de desejo e a de objeto de desejo.
CAUSA E OBJETO OE DESEJO 
D e§pertar um .desejo no homem é uma das ati.Y_i: d ades favoritas da histérica. Que uma mulher es­teja fazendo um jogo de sedução permanente não 
quer dizer que ela esteja disposta a ter uma relação sexual 
com um homem. A hi�t�rica, faz todo um jogo para excitar 
o homem, desde que ele concretize esse desejo com outra . 
mulher. Uma situação comum pode ser vista, por exem­
plo, entre um homem e uma mulher histérica; a relação 
entre os dois pode se tornar um completo jogo de sedução, 
50 e o homem vai supor que aquela mulher está querendo se­
duzi-lo, está disposta a algo. Caso ele proponha alguma 
coisa, é provável que a mulher reaja, por exemplo, dizen­
do algo do tipo: "Está pensando que eu sou o quê? ... ". Na 
situação, ela está causando o desejo, mas sem a mínima 
disposição de ser ela o objeto de desejo. 
É importante frisar que isso não é feito de má-fé, ela 
nem sequer é consciente do jogo de sedução. Precisamen­
te pelo recalque, ela "não sabe", e vê o desejo como vindo 
de fora, dos homens, que "só pensam nisso'.'; não há ne­
nhuma intenção de lesar o outro, é apenas para saber. Pado 
que se sentir à mercê do desejo do Outro produz angústia, 
para a histérica é então mais tranqüilizador controlar o de-
Estruturas Clímcas na Clímca, A H1ster1a 
se;:jo_do _outro. É, portanto, muito mais tranqüilo fazer um 
movimento que dirija o desejo, marcando para o homem o 
que ele deve desejar. Até-mesmo ter a certeza de que o ho­
mem quer uma relação sexual é mais tranqüilo do que não 
saber o que ele quer. 
Podemos ver aí a diferenciação entre objeto de dese­
jo no nível fálico e objeto de desejo do Outro. A partir do 
Édipo, o homem vai se identificar com o ter o falo, e a 
mulher vai se identificar com o ser o falo, mas não no sen­
tido anteriormente abordado no processo de estruturação 
do sujeito; aqui, podemos dizer que é muito mais um pa­
recer ter e um parecer ser do que propriamente ter ou ser. 
O homem vai se apresentar como tendo o falo e a mulher 
como sendo o falo, isto é, sendo desejável, tendo um valor 51 
fálico. Esse valor fálico é mais evidente na atitude de al-
guns homens que apresentam as mulheres referindo-se a 
elas como alguma coisa que têm. O homem se ocupa e 
preocupa em ter coisas para ser valorizado no mercado do 
desejo entre homens e mulheres, enquanto a mulher pro-
cura ser um falo, mesmo em termos de aparência. E, neste 
sentido, faz um série de esforços para "melhorar" a aparên-
cia, tentando despertar o desejo dos homens, buscando ser 
coisas que ela não é: da depilação à cirurgia plástica, es­
força-se para entrar como objeto desejável. 
Na situação em que uma mulher quer ter uma rela­
ção com um homem e faz o suficiente para que ele tam-
Cmtia m. Palonsky 
bém queira, na verdade, a mulher não ficou à mercê do 
desejo do homem, é quase exatamente o contrário. A si­
tuação mais angustiante é dada pela mulher que, pelo me­
nos supostamente, nada fez para seduzir um homem e co­
meça a se sentir olhada de uma maneira diferente. Existe 
aí algo de angústia, estando a mulher no lugar de objeto, 
onde não sabe o que um determinado homem quer com 
ela. Freqüentemente a histérica, na situação de não saber, 
vai rapidamente oferecer uma saída erótica, não tanto em 
razão do desejo pelo homem, mas para sair da angústia, 
para despistá-la. 
A mulher procura muito mais ser desejada do que 
concretizar a relação sexual, o que dá lugar a muitos mal-
5� entendidos. Um ponto fundamental é que a mulher não 
deseja um homem: o que ela deseja é o desejo de um ho­
mem, o que é absolutamente diferente. Ela qu_er ser_rnusa 
de desejo num homem, mas não ser o objeto de desejo do 
homem. Temos aí a fantasia do estupro como uma_fanta­
sia histérica, como a concretização da situaç.ão em.....que 
quem tem desejo é o homem, e a mulher não tem nada, a 
ver com isso. Causa e objeto de desejo não são a mesma 
coisa, embora se fale, num outro sentido, do objeto a, como 
objeto causa. A causa está produzindo o desejo, no caso, 
produzindo um desejo no homem, mas com a condição de 
que o homem dirija esse desejo a uma outra mulher. 
A PROCURA DE RESPOSTAS 
Falamos, até aqui, da castração do Outro, da falha da estrutura, seja quando nos referimos à ine­xistência do elemento definidor da feminilidade, 
seja quando abordamos a questão do desejo do Outro. Fi­
cou também caracterizado um ciclo, onde o sujeito histé­
rico sai em busca de uma resposta para suas questões, mas 
não se satisfaz com a única resposta possível existente, 
fonte inevitável de angústia, uma vez que aponta para a 
castração do Outro; parte então em busca de uma nova 
possibilidade de resposta. É desse movimento que estare- 53 
mos falando, deste particular modo através do qual se arti-
culam o saber e o não-saber na histeria. 
1\bi§_t�rica vai proc:urara§__re_spostas de ma�eiras �a­
ria_d_éls, _l;>�s§�d_()-S�t!mp_Ie __ n_a _§ _uposiç}iQ de que existe!Jl e 
el<1 f!_ão �!>tá_dispostaa aceitaJ:_qu_eoãQ e�is_tam. Através de 
sua busca, ela vai sustentar a existência da resposta que 
espera encontrar, seja por meio de um Outro que detenha 
tal resposta, seja por meio da i<:lentific.ação_da fernini!ida­
_de_com �J_g_L1_IT1 _s_igni.ficante, especialmente nas equações 
falo =filho e falo = corpo. 
Na vertente da suposição de um Outro que dê a res­
posta esperada, vemos freqüentemente <U1isJ_éri__ca.._e.I�, 
Cmba m. Palonsky 
�lgum h_on1��_ 9!1_e_ª-I)_a_r_e._Q_te1ner1t� t�rn _ _1:1���]:,e�bre as 
mulheres e tenta, atrn_\/_és _ _ci_�l�, de�obrir es-5e saber. Isso é 
o que faz com que a histérica muitas vezes entre em re la­
ções em que o outro tenha alguma característica de mes­
tre; por exemplo, mulheres que só procuram relacionamen­
tos com médicos, professores, analistas etc. Esse tipo de 
personagem que supostamente está no lugar de quem sabe, 
pode, tem, vai ser o tipo de pessoa talhada para ser amado 
pela histérica. A procura é sempre do que ela chama de "o 
homem da minha vida". É importante sublinhar que ela 
-�nte _ _<!_c)!_aque ex�ste_])G-mundo_ urn__ho!!le� ��la� 
tinado, e o que ela tem de fazer é procurar até encontrar 
esse homem, como se houvesse algo ou alguém que se en-
54 carregasse da distribuição de homens e mulheres. O en­
contro seria o encontro das metades. E, com certa freqüên­
cia, a mulher acha que encontrou "O Homem", que é tudo 
e tudo sabe. Esse homem, revestido de tal saber, suposta­
mente vai ter a resposta esperada. 
Supondo que ela consiga conquistar esse homem, em 
algum momento vai ficar evidente que ele também não 
tem para dar outra resposta que não seja o falo. Aí é hora 
da decepção, ponto importante na clínica da histeria, mo­
mento em que ��cionadR.tr:ansformaaque­
le homem "m<!ra_yilbQso" _ �m _urn _h_omem incapaz, impoc 
_te11te. Essa passagem pode ser apenas simbólica ou pode 
ter conseqüências no concreto, porque não muito raramente 
estruturas Clímcas na Clímca, A H1ster1a 
a histérica pode, de fato, tornar o parceiro impotente. 
Os dois pólos do ciclo ficam marcados assim pela 
idealização e pela decepção. A dcI_�_gçJo_,.J,11rg_e_nQ lug�r 
�1_1_gQfiljª, af9s_tando a RO_ssil:,i]idade de. que a resposta 
11rocu.rada..nã.o_exista, mantendo a suposição de mp Outro 
n.ãQ::castrad0. Dizer que esse outro não sabe, é idiota, é 
ruim etc., não significa colocar a castração no Outro; ao 
contrário, significa sustentar a possibilidade de um Outro 
não-castrado, um Outro que teria essas respostas. Daí re�_ 
�ul�a _um p.eriodo_ df! queixa.s e reclamações em relação a 
esse home111, como se ele realmente tivesse algo para dar, --------- - ------- _,,,.- --- -
gue ele não dá porque não quer
e não porque não tem___, qtJ_� --
�-� tem a possibilidade de dar alguma coisa a mais. A re-
clamação também não é mais do que uma maneira de sus- 55 
tentar o Outro como não-castrado, uma vez que sua exis-
tência implica que aquilo que está sendo reclamado ainda 
vai ser possível. Novamente, o que se produz é a transfor-
mação da impossibilidade em impotência, desta vez colo-
cada no homem. Em lugar de que homem nenhum tem a 
dar o que ela está esperando, é tal homem específico que 
não tem, e a questão é procurar outro homem. 
Por tudo isso podemos entender o porquê da freqüên­
cia com que a�- cªi no jogo dg$_1_YerSO, Quem -- - .. -. ...._. -·· ,,,.-----
melhor do que ele para representar aquele que sabe e que 
pode oferecer esse mundo de desejo e fantasia que o neuró­
tico custa tanto a alcançar? E quem melhor do que o Cha-
S6 
Cm tia ffi. Palonsky 
peuzinho Vermelho para proporcionar gozo a esse lobo 
disfarçado de vovó que precisa alimentar o seu próprio 
gozo com a angústia com que a histérica vai entrar no jogo? 
Estamos dizendo com isso que um dos significados 
da castração do Outro é que nem tudo é possível, que exis­
tem coisas que, por estrutura, são impossíveis. Mas depa­
rar com essa impossibilidade de estrutura é, por definição, 
angustiante: não existe resposta, o Outro não tem resposta 
para tudo. A reação diante da castração do Outro é a angús­
tia que a histérica transforma em insatisfação, remetendo, 
portanto, a um Outro não-castrado: não é que por estrutu­
ra é impossível, mas para aquele homem - esse é o movi­
mento da histérica. O rornp_iment� d�ss� cis;l�ll�Ql_yetia. 
fazer o caminho de volta, transformar a jnsa_!i_ sfaçjo eJ1L­
angústia. Porém, aquilo que o neurótico faz é praticamen­
te tentar evitar a angústia, estabelecendo e mantendo o ci­
clo: constrói-se um Outro (não-castrado) que, em algum 
momento, aparece castrado; a angústia é rapidamente trans­
formada em insatisfação, e um Outro não-castrado é, en­
tão, construído. Deotra desse ciclo, a_ile�ewQ .é�vitá­
vel e, freqüentemente,_ap_.ar�c:e_c:_��<:>__d_e21�ssãQ.. A procu­
ra da histérica é tal que, por estrutura, só pode terminar no 
fracasso, uma vez que se trata de uma falsa procura. Esse 
ponto pode ser claramente visto na clínica, onde o analista 
se torna mais um sobre quem a histérica coloca sua per­
gunta. Porém, �-apa�emente-ela-est�jnteressad_ª e[!l 
Estruturas Clínicas na Clímca, n Histeria 
�QI"g_u_e, de fato, ela não quer saber. Não quer saber 
que n�_ exi�te a resposta que ela espera. O trabalho analíti� 
co vai consistir em transformar a pseudo pergunta numa 
pergunta real, num verdadeiro questionamento. 
A insatisfação é, assim, uma forma de saída da an­
gústia, e a histérica vai se apresentar sempre como insatis­
feita. Essa insatisfação vai estar freqüentemente referida a 
"algo que falta", uma representação que indica o que está 
faltando. 
Retornando ao esquema da constituição do sujeito 
para melhor entendermos esse ponto, vimos que tornar-se 
,,sujeito envolve uma operação na qual ocorre o recalcamen­
to do que seria o desejo da mãe, ao mesmo tempo em que 
um significante ocupa o lugar do que foi recalcado. Entre- 51 
tanto, essa operação não é absolutamente precisa, nunca é 
perfeita, no sentido de que fica sempre um resto não-alcan-
çado pelo simbólico. Dado que algo ficou fora da possibi-
lidade de simbolização, no imaginário alguma coisa vai 
aparecer como faltante. Q__S_e,SS? _não-simbQlizado da ope­
raçã0--vai constituiLonbjeto como tal - objeto a - enquan_- 1 
_tg_ chamamos de - <p a representação da falta imaginária. 
Enquanto representante da falta, o surgimento de - <p im-
plica, pois, que o objeto esteja afastado: ou se está em 
termos de - <p ou se está em termos de objeto a. �defirü-
ç_ão, ª--ªngq§_ti_a está c!ireta_ ll!.ente rd�ci_o1rnda_ao apílreçi�. 
m:_nto d9 objet,o como,tal, portanto, a uma falha no - <p. A 
SB 
Cm tia m. Palonsky 
insatisfação da histérica que, como dissemos, freqüente­
mente aponta para um "algo que falta", para alguma coisa 
que poderia tamponar a falta, faz com que a presença an­
gustiante do objeto como tal seja transformada na falta de 
um - <p. 
Ainda na vertente da suposição de que a resposta es­
perada vai ser dada por um Outro, vemos uma outra ma­
neira de buscar o saber, muito particular e bastante carac­
terística da histeria, na qual podemos também observar o 
ciclo dominado pela evitação da angústia que vínhamos 
analisando. 
A OUTRA ffiULHER 
Essa outra maneira fundamenta-se na questão da identificação masculina, tema que abordamos quando falamos das particularidades do Édipo fe­
minino. Vimos que em relação à estruturação do desejo, 
em algum momento a criança vai se dar conta de que o de­
sejo é sempre desejo de desejo, ou seja, de que aquilo que 
a mãe deseja é ser desejada pelo pai, que as mulheres não 
desejam exatamente os homens, mas serem desejadas pe­
los homens. Qq� e!1l 11ão_ sabe é porque os homens dese-
j_amas_1nulheres e Q quê os homens desejam nas mulheres_. S9 
A identificação com o homem vai se constituir numa ma-
neira através da qual a mulher vai "entrar" na cabeça de 
um homem para, através dele, olhar as mulheres e procu-
rar esse saber. 
Na frase freqüentemente ouvida "o que ele viu nela?" 
tem-se claramente a estrutura da identificação masculina. 
É através de uITJa outra ,mulher, olhada "através" de um 
"----, . . . -�- - . � - . . 
bo111em,_que a mulher pretende chegar à feminilidade, o 
que constitui um paradoxo. Paradoxo em dois sentidos: 
primeiro pelo fato da identificação masculina, ou seja, é 
identificando-se com um homem que a mulher pretende 
descobrir o traço identificatório da feminilidade; segun-
Cmtia m. Palonsky 
do, vai procurar esse traço em outra mulher, isto é, em 
alguém que também não o possui. 
Essa outra mulher aparece como "a rival". Vejamos 
quem é ela. Uma mulher sempre vai precisar de outra mu­
lher como referência. Como lugar de .estrutura,- o que y_a­
mos chamar de "a outra mulher" é imprescindível e,- na 
clínica, é necessário localizá-la. O lugar pode estar ocupa­
do pela esposa, sogra ou mãe de um homem etc. Suposta­
mente, as duas mulheres estariam brigando pelo amor de 
um homem, o que é uma ficção que as duas podem man­
ter. Trata-se de uma ficção porque, na verdade, nenhuma 
das duas está de fato interessada na posse desse homem. 
A "outra" (qualquer uma das duas), tem várias e im-
60 portantes funções. Primeiro, o interesse da histérica está 
em saber o que é ser uma mulher e o que um homem quer 
numa mulher; daí, ela precisa de uma outra mulher, a qual 
irá olhar através do homem para saber o que é uma mu­
lher. Além disso, é necessário que exista uma corrente de 
desejo entre o homem e a outra. A histérica estáidentificadfl_ 
ao homem, tanto que se a outra sai de cena o interesse é 
perdido. Considerando o triângulo constituído pelo ho­
mem, pela mulher e pela outra, o homem vai freqüente­
mente se apresentar rnmo insatisfeito com a mulher, o que 
abre uma pergunta fundamental: "o que tem essa mulher que 
consegue manter um homem mesmo sem satisfazê-lo?" 
Falamos da outra como aparente "rival". Trabalhar 
Estruturas Clímcas na Clímca, " H1ster1a 
essa relação com a outra como "rivalidade" é ficar apenas 
no nível do imaginário, sem analisar a importância que es­
sa outra mulher tem. A necessidade de que essa outra mu­
lher exista é tal que se ela já não fizer parte da vida do ho­
mem em questão, a histérica vai, de alguma maneira, ori­
entar D homem a procurar uma outra mulher para -preen­
cher esse lugar. Muitas vezes quem apresenta ao homem 
essa outra é a
própria mulher. 
Essa identificação masculina vai ser sempre a manei­
ra de olhar para outra mulher; no final das contas, a mu­
lher está sempre olhando para outra mulher, só que, no ca­
so, o faz através de um homem. A relação com o homem, 
então, não é uma relação em termos de objeto, mas de 
identificação. O homem é necessário como via de saber a 61 
respeito das mulheres. 
A questão da identificação masculina traz algumas 
outras conseqüências à estrutura, determinando um certo 
posicionamento do sujeito histérico que, mais uma vez, 
terá importante papel em encobrir a castração do Outro e, 
portanto, na evitação da angústia. Vamos aqui nos referir à 
questão da competição fálica e o que se apresenta clinica­
mente como homossexualidade feminina. 
A POSICAO rnucn 
Em relação à competição fálica, podemos dizer que, a partir da identificação masculina, a histérica pode se colocar frente ao homem como se fosse um ho­
mem, especialmente mostrando que até como homem ela 
é melhor do que os homens. Para melhor alcançarmos a 
extensão de tal posicionamento, precisamos entender que 
a mulher tem de aceitar as duas castrações: a do Outro e a 
de si própria. Na competição fálica existe o movimento _d� 
62 colocar a castração no outro, eomo semelhante, mas não 
no Grande Outro. Colocar a castração no outro, no caso, 
1:,'.:i em um homem, significa colocar esse homem na posição 
do impotente, o que não é apenas uma metáfora, uma vez 
que ela pode conseguir, de fato, que ele fique concreta­
mente impotente, com o que vai desqualificá-lo inteira­
mente como homem. 
Existe, nessa situação, uma certa sutileza, dado que 
pode surgir uma suposição tal como "eu sou tão mulher 
que comigo ele não pode", ou "ele não é suficientemente 
homem para uma mulher como eu"; mas, esta posição de 
ser "tão mulher" é, paradoxalmente, uma posição fálica:__Q 
que aparece como o _çúmuJo__ .da--f@min_iljclí!çl�a_pos-i-
.-- -- ·- - __ .,, 
Estruturas Clírncasna Clímca, A H1ster1a 
Este tema do masculino e feminino é um ponto inte­
ressante no sentido de que não só engloba ideais culturais, 
como também, no limite, no extremo, o masculino e o fe­
minino se confundem. Assim, uma mulher que procura 
ser �ma mulher no extremo, torna-se "um mulherão", o 
que já tem algo de masculino. Do lado masculino, aquele 
que é supostamente "o macho", identificado como galã 
das novelas, tem sempre um ar mais ou menos feminino. 
Neste ponto vamos ter uma certa oscilação em rela­
ção à potência do homem: de um lado, temos a situação 
de que nenhum homem seja suficientemente homem; do 
outro, a posição típica da histérica de fazer tudo para man­
ter a potência do homem . Porém, na verdade, quando a 
histérica diz que o homem "não dá conta", está se referin- 6] 
do a um homem específico e, assim, mantém a existência 
de uma potência sem falhas como possível. Mantém, por-
tanto, afastada a possibilidade de um Outro castrado ou, 
corno dissemos acima, a castração não é colocada na es-
trutura, e a angústia fica evitada. 
Revendo as perguntas características da histeria, per­
cebemos que a questão de fundo pode ser assim formula­
da: "sou homem ou mulher?" São perguntas que estão re­
lacionadas à identificação masculina enquanto momento 
do desenvolvimento da menina e que, na histeria, vai se 
manter sempre presente. A histérica vai ter sempre uma 
identificação masculina e uma identificação feminina. Essa 
Cm tia m. Palonsky 
dupla identificação é um ponto central, e �i-a__ 
_<1!_jd� n. tifiç açã9 .ma_sc u I i n él__é_Q__çµi.e_pode-ch � gªr--a--se.11Ju:.�� --.,------- -·· -
se...ntar-dinicam€mtc comci-kon.1Qssexualidade feminj,19-... A -- .. ______ ,...-------- .. ----------
homossexual feminina, como estrutura, é uma histérica. 
Por vários motivos pode chegar uma histeria a se estruturar 
como homossexualidade, e um dos motivos tem a ver com 
a identificação masculina. 
Na teoria, faz-se uma grande diferença de estrutura 
entre a homossexualidade masculina e feminina, no senti­
do de que a homossexualidade masculina, muitas vezes, 
embora nem sempre, corresponde a uma estrutura perver­
sa. A hornqssexualidade feminina não corrt!ip.Qnç!J} -lll.lllCf!_ 
a uma per.Y.�rsâO. ... J!lllª YeZ _q_ue a perversão, c_ol]l.o .. tal,...não . 
64 é considerada uma.es.tr.utuJª e_ossíyeL!:Ul m1,J!her. O que 
não quer dizer que não se encontrem mulheres com fortes 
traços perversos. �dad�_feminina é �e1J1.pre_ 
umª fonn.a .. de...histeria. 
Ao lado da identificação masculina, um outro ele­
mento que define a aparição da bom9�_sexu�­
Q_<t�tárelacionado }I pr.QÇJJ..!Itdahis.térica--P.OC um�mor to­
t<tl,_-ª-umªj.!J_11çãc) _9_o_amo��'-9ll�ºssar-e1:r­
ni]:,em_si ::q;iossibilidade....@i!.�d.es.ejQ.,_A entrega, 
o sacrifício que a histérica faz é uma busca de reciprocida­
de, no sentido de que se ela dá tudo para ele, ele vai dar tu­
do para ela, coisa que não acontece e que resulta na decep­
ção. O que pode suceder é que a repetição da decepção le-
Estruturas Clínicas na Clínica, A H1ster1a 
va a histérica à procura do amor de outra mulher, como a 
única possibilidade de ser amada tanto quanto ela ama. 
Segundo Lacan, o único amor verdadeiro é o de uma mu­
lher; isso porque, sendo o amor definido como "dar o qu� 
-· .__- - . �.. -· · · --·· ., 
não s� !�m", quem dá o que não tem é a mulher. A homosse-
xualidade seria a procura desse amor verdadeiro. Não é a 
procura do gozo sexual, fálico, mas a procura de amor, es­
tando ligado a uma posição de reivindicação, que é uma 
posição histérica. 
Essa busca de uma outra mulher relaciona-se tam­
bém com o Édipo feminino nas três saídas possíveis para 
a mulher, uma delas significando a volta para a mãe como 
objeto de amor. Também o que aparece como "bissexuali-
dade" tem a ver com a identificação masculina da histéri- 65 
ca, já que qualquer mulher, no Édipo feminino, vai passar 
pelo momento de identificação masculina. Porém, tal iden­
tificação na histérica vai perdurar, o que vai resultar na 
particular característica de uma dupla identificação, mas-
culina e feminina ao mesmo tempo. 
Vimos então, até aqui, algumas maneiras através das 
quais a histérica vai lidar com as perguntas características 
à estrutura, constituindo uma relação bastante particular 
entre o saber e o não-saber, onde o ciclo idealização-de­
cepção/insatisfação é o que se repete, ficando a decepção/ 
insatisfação no lugar da angústia. 
O que abordamos tem a ver com a suposição de que 
66 
Cmtia m. Palonsky 
a resposta desejada pelo sujeito histérico possa ser encon­
trada através de um Outro, freqüentemente identificado a 
um homem, garantia última da existência de uma estrutu­
ra sem falhas. Uma outra maneira refere-se a tentar res­
ponder sobre a identidade sexual - questão em torno da 
qual giram suas perguntas - identificando a feminilidade 
com algum significante, sobretudo filho e corpo. 
ALGUmns RESPOSTAS 
Aproblemática histérica gira em torno da falta do falo, dessa posição de não ser o falo e de tam­bém não tê-lo. Desenganada de tê-lo como coi­
sa concreta, uma vez que deixa de pensar que ainda vai 
crescer, 11parece habitualmente a tentativa de �).l_Qstituir a 
fa!tAJLeJalo em si_por um fill:io, estabelecendo uma equa­
ção pela qual falo = filho. Na equação falo = filho, o filho 
vai aparecer no desejo da histérica como aquilo que vai 
compensá-la da falta do falo, como aquilo que vai com-
pletá-la. 61 
A definição impossível da feminilidade passa a ser a 
'----�--- - ---- - - · - �· - - � 
mat!!rnictade, _tJm_a re_s_posta dacl_a muitas ve:z:es pela cultu-
_Ijl, não apen_as .pe.la l11l!.!.b�r. Não existindo a definição do 
que é ser

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Continue navegando