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1 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Otorrinolaringologia TONTURA E VERTIGEM Introdução: A tontura é definida como a alteração de equilíbrio do corpo, ou seja, como o problema que causa instabilidade postural e sensação de que pode haver queda a qualquer momento. A tontura classifica-se em rotatória e não rotatória. A tontura rotatória, ou seja, a sensação de que o ambiente está girando ou de que o indivíduo está girando também é denominada vertigem. A tontura representa queixa inespecífica, podendo ser utilizada por pacientes para referir-se à vertigem, ao desequilíbrio, à pré-síncope e à síncope. A prevalência da tontura na população geral é de aproximadamente 15-30%. A tontura apresenta várias causas, tais como vestibular ou neurológica (tontura rotatória ou vertigem), cardiovascular (pré-síncope ou síncope), metabólica, infecciosa, autoimune, traumática, psicológica e relacionada a drogas e/ou medicamentos. Causas de Tontura: As causas mais comuns de tontura na população geral são: - Vestibular: associa-se à tontura rotatória/vertigem, que é definida como a sensação de que o ambiente está girando (vertigem objetiva) ou de que o indivíduo está girando (vertigem subjetiva). → Vertigem posicional paroxística benigna (VPPB): representa a causa mais comum de vertigem na população geral. → Labirintite: infecção aguda do sistema vestibular de causa viral ou bacteriana. → Doença de Menière: doença rara caracterizada por vertigem episódica, perda auditiva flutuante, zumbido e plenitude aural. → Neurite vestibular: reativação de infecção viral, geralmente por herpes simples, do núcleo vestibular, do nervo vestibular e/ou do labirinto. → Deiscência do canal semicircular superior. → Fístula endolinfática/perilinfática. → Otite média aguda. → Tontura postural-perceptual persistente (TPPP). - Neurológica: associa-se à tontura rotatória/vertigem e/ou à tontura não rotatória. → Enxaqueca/Migrânea Vestibular. → Acidente vascular cerebral (AVC). → Tumores de fossa posterior: neuroma acústico ou schwanoma vestibular, meningiomas, tumores de cerebelo e tumores de tronco cerebral. → Esclerose múltipla. → Isquemia vertebrobasilar. → Dissecção de artéria cervical: artérias carótidas ou artérias vertebrais. → Malformação de Arnold-Chiari tipo 1. → Síndrome de Wallenberg. → Ataxia hereditária. → Hipertensão intracraniana benigna. → Hidrocefalia de pressão normal. → Síndrome do mal do desembarque. → Degeneração cerebelar paraneoplásica. - Cardiovascular: → Síncope: perda de consciência transitória associada à hipoperfusão cerebral, caracterizada por início rápido, curta duração e recuperação espontânea completa; associa-se à incapacidade de manter o tônus postural; as principais causas são ataques vasovagais, hipotensão ortostática/postural, doença cardiopulmonar, arritmias cardíacas, ataque isquêmico transitório (AIT) e efeitos adversos de medicamentos. → Pré-síncope: tontura que manifesta-se antes da perda de consciência ou da quase perda de consciência; geralmente associa- se a outros sintomas, tais como fraqueza generalizada, cefaleia, visão turva, sudorese, parestesias, náuseas e vômitos. → Hipotensão ortostática/postural. → Síndrome da taquicardia ortostática postural. - Autoimune: → Lúpus eritematoso sistêmico (LES). 2 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → Artrite reumatoide. → Granulomatose de Wegener. → Doença de Behçet. → Síndrome de Cogan. - Metabólica: → Diabetes mellitus: hipoglicemia e/ou neuropatia diabética. → Hipotireoidismo. - Infecciosa: → Citomegalovírus (CMV): acomete o sistema vestibular, causando vertigem. → Sífilis: acomete o sistema vestibular, causando vertigem. → Herpes simples tipo 1 (HSV-1): causa neurite vestibular, resultando em vertigem. → HIV: causa alterações do SNC e neuropatia, resultando em tontura. - Traumática: → Vertigem pós-traumática (pós-TCE). → Pós-cirurgia de orelha média. - Psicológica: → Tontura psicofisiológica. → Tontura psicogênica: associa-se a transtornos de ansiedade. - Relacionada a drogas e/ou medicamentos: → Medicamentos ototóxicos: antibióticos aminoglicosídeos, diuréticos de alça, AINES e salicilatos. → Medicamentos quimioterápicos: cisplatina. → Bebidas alcoólicas. → Outros medicamentos: anti-hipertensivos, α-bloqueadores, β-bloqueadores, nitratos, antiarrítmicos, anestésicos, antipsicóticos, opioides, antiparkinsonianos, sildenafil, anticonvulsivantes/antiepilépticos, etc. → Intoxicação por monóxido de carbono. Causas mais prevalentes de Tontura Vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) Doença de Menière Neurite vestibular Labirintite Enxaqueca/Migrânea vestibular Síncope ou pré-síncope Hipotensão ortostática/postural Síndrome da taquicardia ortostática postural Diabetes mellitus Hipotireoidismo Artrite reumatoide Bebidas alcoólicas Medicamentos Vertigem: A vertigem é definida como a sensação de que o ambiente está girando (vertigem objetiva) ou de que a pessoa está girando (vertigem subjetiva). O termo vertigem é comumente usado de forma errada para referir-se a qualquer forma de tontura. A vertigem verdadeira é a tontura rotatória, caracterizada por sensação de rotação do paciente ou do ambiente e geralmente apresenta causa vestibular. A vertigem pode ser causada por alterações do sistema vestibular (mais comum) ou por alterações do sistema nervoso central (menos comum). Dependendo da causa subjacente, a vertigem pode manifestar-se associada a náuseas e vômitos e, eventualmente, a outros sinais e sintomas neurológicos, tais como cefaleia e distúrbios visuais. A maioria das causas de vertigem é periférica (associada ao sistema vestibular) e não apresenta risco de vida. Entretanto, nas poucas vezes em que a causa da vertigem é central (vascular ou neoplásica/tumoral), deve-se considerar o distúrbio como emergência/urgência médica, havendo necessidade de tratamento imediato. Diferentemente da tontura, a vertigem causa ataques de queda que geralmente não cursam com perda de consciência, associam-se mais comumente à presença de náuseas e vômitos e podem manifestar-se em associação à perda auditiva, zumbido e plenitude auricular. 3 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Vertigem Posicional Paroxística Benigna: Definição: A vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) é definida como o distúrbio vestibular periférico que manifesta-se por episódios abruptos/súbitos de vertigem de curta duração (geralmente com duração < 30 segundos) desencadeados por movimentos específicos da cabeça. A VPPB geralmente é autolimitada, mas pode tornar-se crônica, manifestando-se por episódios recorrentes de vertigem de início abrupto/súbito que causam comprometimento da qualidade de vida do paciente. Epidemiologia: A vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) representa a causa mais prevalente de vertigem na população geral, acometendo 18-42% dos pacientes com queixa de vertigem. A VPPB apresenta incidência de aproximadamente 108 casos a cada 100.000 habitantes por ano. Etiologia: Aproximadamente 50-70% dos casos de vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) são idiopáticos, ou seja, não apresentam nenhuma causa conhecida (VPPB primária). Aproximadamente 30-50% dos casos de VPPB são causados por doenças subjacentes, tais como TCE, neurite vestibular, labirintite, Doença de Menière, enxaqueca/migrânea, doenças isquêmicas e iatrogenias (cirurgia otológica, manobras de reposicionamento). Fisiopatologia: Os canais semicirculares do sistema vestibular são responsáveis por identificar a aceleração da cabeça e estão associados à fixação visual enquanto a cabeça está em movimento (reflexo vestíbulo-ocular). Entretanto, a presença de sinal anormal de um dos canais semicirculares resulta em percepção incorreta de movimento (vertigem) e em nistagmo do olho no planodo canal semicircular acometido. Ao longo do tempo, com os movimentos normais da cabeça, as partículas de otocônia migram do utrículo em direção aos canais semicirculares e permanecem flutuando na endolinfa. As otocônias são mais densas que que o fluido da endolinfa e, portanto, respondem à gravidade, tendendo a se depositar principalmente no canal semicircular posterior. Assim, movimentos específicos da cabeça, no plano do canal semicircular acometido, desencadeiam a vertigem, que dura apenas enquanto o paciente realiza determinado movimento da cabeça. Além dos canais semicirculares posteriores, as partículas de otocônia também podem se depositar no canal semicircular horizontal/lateral (menos comumente) e no canal semicircular anterior/superior (raramente). A VPPB geralmente é causada por alteração unilateral do sistema vestibular. Fatores de Risco: Os principais fatores de risco para vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) são: - Aumento da idade: o envelhecimento associa-se a processos degenerativos que aumentam o risco de migração das otocônias do utrículo em direção aos canais semicirculares. - Sexo feminino: as alterações hormonais associadas ao aumento da idade aceleram o processo de descalcificação do utrículo, com migração das otocônias em direção aos canais semicirculares. - TCE: lesão direta ao utrículo, aumentando o risco de migração das otocônias em direção aos canais semicirculares. - Neurite vestibular: associa-se à isquemia da orelha interna, com degeneração do utrículo e aumento do risco de migração das otocônias em direção aos canais semicirculares. - Labirintite: lesão direta à orelha interna e ao utrículo, aumentando o risco de migração das otocônias em direção aos canais semicirculares. - Enxaqueca/Migrânea: associa-se à isquemia da orelha interna, com degeneração do utrículo e aumento do risco de migração das otocônias em direção aos canais semicirculares. - Cirurgia da orelha interna: lesão direta à orelha interna e ao utrículo, aumentando o risco de migração das otocônias em direção aos canais semicirculares. 4 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Doença de Menière: associação desconhecida. - Outros fatores de risco: otite média, HAS, dislipidemia, DM, isquemia vertebrobasilar, arterite de células gigantes (arterite temporal), osteoporose, intubação orotraqueal e posição lateral da cabeça durante o repouso no leito. Apresentação Clínica: A vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) caracteriza-se clinicamente por crises de vertigem de início abrupto/súbito, com duração < 30 segundos, desencadeada por movimentos específicos da cabeça, como flexão-extensão da cabeça e rotação lateral da cabeça. A VPPB, diferentemente de outras causas de vertigem, não está associada à perda auditiva, zumbido ou plenitude auricular. Entretanto, a VPPB pode cursar com náuseas, vômitos e desequilíbrio que duram mais tempo que a vertigem. O distúrbio pode apresentar resolução espontânea ou apresentar evolução para episódios recorrentes de vertigem (VPPB crônica). Caso Clínico: Mulher de 65 anos apresenta queixa principal de tontura. Ela descreve esta tontura como se tudo girasse de forma intensa e abrupta/súbita, após virar de lado no leito para se deitar sobre seu lado direito. Os sintomas geralmente duram < 30 segundos. Eles manifestaram-se na parte da noite, durante o último mês, e eventualmente durante o dia, quando ela inclina a cabeça para trás para olhar para cima. Ela descreve ausência de eventos desencadeantes antes do início e nenhuma perda auditiva associada, zumbido ou outros sintomas neurológicos. Os exames otológicos e neurológicos estão normais, exceto por manobra de Dix-Hallpike, que é negativa para a esquerda, mas fortemente positiva para a direita. Diagnóstico: VPPB de canal semicircular posterior (mais comum). Diagnóstico: O diagnóstico de vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) é clínico e baseia-se em anamnese (características clínicas dos episódios de vertigem) e exame físico (manobra de Dix-Hallpike e manobra de rotação lateral da cabeça em posição supina). A manobra de Dix-Hallpike é usada para o diagnóstico de vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) de canal semicircular posterior. A manobra caracteriza-se por: - Paciente sentado e posicionado na mesa de exame de forma que seus ombros repousem sobre a borda superior da mesa quando o paciente está na posição supina, com a cabeça e o pescoço estendendo-se sobre a borda. - A cabeça do paciente é girada em 45º em direção ao lado que será testado. - A cabeça do paciente é sustentada pelo examinador e, em seguida, o paciente é rapidamente abaixado para a posição supina, com a cabeça estendendo-se aproximadamente 30º abaixo da linha horizontal e permanecendo rotacionada a 45º em direção ao lado que está sendo testado. - A cabeça do paciente é mantida nesta posição e o examinador avalia a presença de nistagmo. - Para concluir a manobra, o paciente volta à posição sentada e os olhos são novamente avaliados quanto à presença de nistagmo reverso. A manobra de Dix-Hallpike é considerada positiva quando o paciente apresenta vertigem e nistagmo em resposta à manobra. A vertigem e o nistagmo, em geral, apresentam período de latência de 5 segundos e duração < 30 segundos. O nistagmo associado à VPPB de canal semicircular posterior é rotatório/torsional, unidirecional (sentido horário na VPPB 5 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 esquerda e sentido anti-horário na VPPB direita), reversível na posição sentada e fatigável. Além de confirmar o diagnóstico de VPPB de canal semicircular posterior, a manobra de Dix-Hallpike também possibilita determinar o lado acometido. A manobra de rotação lateral da cabeça em posição supina é usada para o diagnóstico de vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) de canal semicircular horizontal/lateral. A manobra caracteriza-se por: - Paciente em posição supina sobre a mesa de exame. - A cabeça do paciente é girada em direção ao lado que será testado e mantida nesta posição por 1 minuto e, em seguida, é girada para o lado oposto e também mantida nesta posição por 1 minuto. A manobra de rotação lateral da cabeça em posição supina é considerada positiva quando o paciente apresenta vertigem e nistagmo em resposta à manobra. Em geral, a vertigem e o nistagmo da VPPB de canal semicircular horizontal/lateral apresentam período de latência mais curto, o nistagmo é menos fatigável, são mais graves e são mais comumente associados à presença de náuseas e vômitos, em comparação à VPPB de canal semicircular posterior. O nistagmo associado à VPPB de canal semicircular horizontal/lateral não é rotatório/torsional e classifica-se em apogeotrópico (em direção oposta ao chão) e geotrópico (em direção ao chão). Os exames complementares são úteis para excluir diagnósticos diferenciais de VPPB, mas não são necessários para o diagnóstico da doença. Os principais exames complementares que podem ser realizados são audiometria, que apresenta resultado normal na VPPB primária, que não cursa com perda auditiva, mas pode estar alterado na VPPB secundária à labirintite ou à Doença de Menière, que cursam com perda auditiva, e RM de crânio, para excluir o diagnóstico diferencial de esclerose múltipla, tumores de fossa posterior, entre outras condições que podem mimetizar a VPPB. Diagnóstico Diferencial: - Doença de Menière. - Neurite vestibular. - Labirintite. - Fístula endolinfática/perilinfática. - Doenças centrais: enxaqueca/migrânea vestibular, esclerose múltipla, tumores de fossa posterior, etc. Tratamento: O tratamento da vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) baseia-se em: - Educação e tranquilização do paciente: explicar ao paciente que a VPPB não está associada a risco de vida, apresenta bom prognóstico, com resolução espontâneaem semanas ou meses e é altamente tratável por meio de manobras de reposicionamento; deve-se alertar, entretanto, que a VPPB pode apresentar recorrência de forma imprevisível. - Manobra de reposicionamento de 3 posições: apresenta alta eficácia para o tratamento da VPPB, com resolução do distúrbio, na maioria dos pacientes, por meio de uma única manobra; a manobra de reposicionamento objetiva remover as otocônias do canal semicircular acometido, fazendo com que elas retornem ao utrículo; a manobra de reposicionamento mais realizada é a manobra de Epley; as contraindicações à realização da manobra de reposicionamento de 3 posições são doença cervical grave, doença cardiovascular instável, suspeita de doença vertebrobasilar e estenose grave de artéria carótida. - Medicamentos supressores vestibulares: não são eficazes para o tratamento da VPPB e, portanto, não devem ser utilizados rotineiramente. 6 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Cirurgia: a cirurgia é altamente eficaz para o tratamento da VPPB, mas está indicada apenas para casos de VPPB refratários ao tratamento com múltiplas tentativas de manobras de reposicionamento ou para casos de VPPB que respondem às manobras de reposicionamento, mas que apresentam recorrência frequente dos episódios de vertigem associados à VPPB; a cirurgia representa a única forma de tratamento definitivo da VPPB. A manobra de Epley trata a VPPB de canal semicircular posterior e caracteriza-se por: - Paciente sentado e posicionado na mesa de exame de forma que seus ombros repousem sobre a borda superior da mesa quando o paciente está na posição supina, com a cabeça e o pescoço estendendo-se sobre a borda. - A cabeça do paciente é girada em 45º em direção ao lado afetado. - A cabeça do paciente é sustentada pelo médico e, em seguida, o paciente é rapidamente abaixado para a posição supina, com a cabeça estendendo-se aproximadamente 30º abaixo da linha horizontal e permanecendo rotacionada a 45º em direção ao lado afetado (manobra de Dix-Hallpike). - A cabeça do paciente é mantida nesta posição por 1 minuto. - A cabeça do paciente é girada 90º em direção ao lado não afetado, sendo mantida nesta posição por 1 minuto. A alteração de posição deve ser realizada em < 5 segundos. - Ao solicitar que o paciente posicione-se em decúbito lateral, a cabeça do paciente é girada mais 90º em direção ao lado não afetado, de forma a completar 180º em relação à posição de Dix-Hallpike original, sendo mantida nesta posição por 1 minuto. A alteração de posição deve ser realizada em < 5 segundos. - Para concluir a manobra, o paciente volta à posição sentada. Após sentar, não deve haver vertigem nem nistagmo se a manobra for bem sucedida. A principal alternativa à manobra de Epley para o tratamento da VPPB de canal semicircular posterior é a manobra de Semont. A manobra de Semont caracteriza-se por: - Sentar o paciente no centro da mesa de exame com as pernas penduradas sobre a borda lateral da mesa. - Girar a cabeça do paciente 45º em direção ao lado não afetado. - Enquanto mantém-se a rotação de 45º da cabeça do paciente, posiciona-se rapidamente a parte superior do corpo do paciente em posição de decúbito lateral do lado afetado, com a cabeça repousando sobre a mesa de exame, mas voltada para cima. - Esta posição causará vertigem e nistagmo. Entretanto, deve-se manter o paciente nesta posição até que a vertigem e o nistagmo parem (1-2 minutos). - Em seguida, posiciona-se o paciente sentado sobre a mesa de exame, com a cabeça em rotação de 45º em direção ao lado não afetado. - Enquanto mantém-se a rotação de 45º da cabeça do paciente, posiciona-se rapidamente a parte superior do corpo do paciente em posição de decúbito lateral do lado não afetado, com a cabeça repousando 7 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 sobre a mesa de exame, mas voltada para baixo. - Esta posição causará vertigem e nistagmo. Entretanto, deve-se manter o paciente nesta posição até que a vertigem e o nistagmo parem (1-2 minutos). - Para concluir a manobra, o paciente volta lentamente à posição sentada no centro da mesa de exame. Para o tratamento da VPPB de canal semicircular horizontal/lateral, há a manobra de Gufoni e a manobra de Lempert, e para o tratamento da VPPB de canal semicircular anterior/superior, há a manobra de Yacovino, que, entretanto, devem ser realizadas por médicos em centros especializados. Doença de Menière: Definição: A Doença de Menière, também denominada hidropsia endolinfática, é definida como a doença auditiva e vestibular que caracteriza- se por episódios recorrentes de vertigem de início abrupto/súbito associados à perda auditiva neurossensorial, incialmente apenas para sons de baixa frequência (sons graves), zumbido e plenitude auricular. Epidemiologia: A Doença de Menière representa causa rara de vertigem, com prevalência de aproximadamente 1% na população geral. A Doença de Menière apresenta incidência de aproximadamente 15 casos a cada 100.000 habitantes por ano. Etiologia e Fisiopatologia: A causa da Doença de Menière é desconhecida. Entretanto, acredita-se que a doença seja multifatorial, ou seja, depende de fatores ambientais e de fatores genéticos. Os fatores genéticos estão associados ao desenvolvimento da doença, pois a maioria dos pacientes portadores da Doença de Menière têm história familiar positiva. Os principais fatores ambientais possivelmente associados ao desenvolvimento da doença são alergias alimentares, sífilis, Doença de Lyme, hipotireoidismo, estenose do canal auditivo interno, trauma do osso temporal, infecções virais e doenças autoimunes. A fisiopatologia da Doença de Menière caracteriza-se por aumento da produção de endolinfa e/ou diminuição da absorção de endolinfa, resultando em hidropsia endolinfática. O excesso de fluido endolinfático causa ruptura da membrana vestibular, com extravasamento de endolinfa para o interior da orelha média, resultando em lesão às estruturas neurais e sensoriais da orelha interna, que manifesta-se clinicamente por vertigem, perda auditiva neurossensorial, zumbido e plenitude auricular. Fatores de Risco: - História familiar positiva. - Infecção viral recente. - Doenças autoimunes. Apresentação Clínica: As principais manifestações clínicas da Doença de Menière são: - Vertigem de início abrupto/súbito, com duração que varia de minutos a horas, comumente associada à presença de náuseas e vômitos. Diferentemente da VPPB, a vertigem não é desencadeada por movimentos da cabeça. - Perda auditiva neurossensorial de início abrupto/súbito, geralmente unilateral, com duração que varia de minutos a horas, acompanhando a vertigem, inicialmente apenas para sons de baixa frequência. À medida que a doença evolui e quanto maior o número de crises, a perda auditiva torna-se gradual/progressiva, permanecendo mesmo em períodos sem crises. - Zumbido de início abrupto/súbito, em rugido, geralmente unilateral, acompanhando a vertigem e a perda auditiva. Assim como a perda auditiva, o 8 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 zumbido também manifesta-se inicialmente apenas para sons de baixa frequência. - Plenitude auricular, geralmente unilateral, podendo preceder a crise de vertigem, perda auditiva e zumbido. Caso Clínico: Mulher de 40 anos apresenta-se com história de 1 ano de episódios recorrentes de vertigem. Os ataques de vertigem são descritos como uma sensação de rotação do ambiente que dura de 20 minutos a algumas horas e pode estar associada a náuseas e vômitos. Os ataques são incapacitantes e acompanhados de tontura, vertigem e desequilíbrio que podem durar dias. Não há perda de consciência. A paciente também relata plenitude auricular, zumbido e perda auditiva no ouvido direito, que é mais pronunciada no período dos seus ataques de vertigem. O exame físico da cabeça e dopescoço está normal. É notado um nistagmo horizontal. Ela é incapaz de manter sua posição durante o teste de Romberg ou o teste dos passos de Fukuda. Os testes da função cerebelar estão normais. Diagnóstico: Doença de Menière unilateral à direita. Diagnóstico: O diagnóstico da Doença de Menière baseia- se em achados clínicos (anamnese + exame físico) e em achados de exames complementares (audiometria). No exame físico do paciente com Doença de Menière, os principais achados são nistagmo horizontal e unidirecional, teste de Romberg positivo (desequilíbrio ou queda quando solicita-se que o paciente fique de pé com os pés juntos e os olhos fechados) e teste dos passos de Fukuda positivo (virar para o lado afetado quando solicita-se que o paciente ande com os olhos fechados). Na audiometria do paciente com Doença de Menière, observa-se perda auditiva neurossensorial que inicialmente manifesta- se apenas para sons de baixa frequência (sons graves), formando rampa ascendente. Com a evolução da doença, a perda auditiva também manifesta-se para sons de maior frequência. Além disso, o diagnóstico da Doença de Menière geralmente é confirmado por RM de crânio com contraste que exclua possíveis diagnósticos diferenciais, que também causam perda auditiva, zumbido e vertigem unilateral de início abrupto/súbito, como neuroma acústico ou schwanoma vestibular. Diagnóstico Diferencial: - Neuroma acústico ou schwanoma vestibular. - Enxaqueca/Migrânea vestibular. - Neurite vestibular. - Labirintite. - Vertigem posicional paroxística benigna (VPPB). - Isquemia vertebrobasilar. Tratamento: O tratamento da Doença de Menière aguda baseia-se em: - Dieta pobre em sal (máximo de 1500-2000 mg/dia). - Hidroclorotiazida 25 mg VO 1x/dia. - Em casos de vertigem sintomática (associada a náuseas e vômitos): → Primeira Linha: meclozina, dimenidrinato ou prometazina. → Segunda Linha: diazepam ou proclorperazina. → Terceira Linha: prednisona. → Adjuvantes: injeções por via intratimpânica (dexametasona ou gentamicina), aparelho de Meniett e reabilitação vestibular. - Em casos de zumbido sintomático: → Primeira Linha: terapia sonora. → Segunda Linha: amitriptilina ou alprazolam. - Em casos de perda auditiva abrupta/súbita: → Primeira Linha: prednisona VO. → Segunda Linha: dexametasona por via intratimpânica. O tratamento da Doença de Menière em curso baseia-se em: - Perda auditiva persistente: aparelho de amplificação sonora individual/prótese auditiva e aconselhamento fonoaudiológico. 9 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Falha dos tratamentos medicamentosos sistêmicos e intratimpânicos e do aparelho de Meniett: → Audição adequada: cirurgia do saco endolinfático ou secção do nervo vestibular. → Perda auditiva grave ou profunda: labirintectomia. Labirintite: Definição: A labirintite é definida como a doença inflamatória causada por vírus ou bactérias que acomete a orelha interna (ou labirinto), com comprometimento da cóclea e do sistema vestibular. A labirintite caracteriza- se clinicamente por perda auditiva neurossensorial abrupta/súbita, vertigem e desequilíbrio que podem acometer 1 ou ambas as orelhas. A labirintite classifica-se em serosa e supurativa. A labirintite serosa caracteriza-se por infecção viral da orelha interna, resultando em perda auditiva e vertigem menos graves que a labirintite supurativa, com posterior recuperação da perda auditiva. A labirintite supurativa caracteriza-se por infecção bacteriana da orelha interna, resultando em perda auditiva grave à profunda e vertigem. Epidemiologia: A incidência e a prevalência reais da labirintite são desconhecidas. As infecções virais representam a causa mais comum de labirintite. A labirintite viral acomete principalmente adultos, enquanto a labirintite bacteriana acomete principalmente crianças com otite média aguda. Etiologia: A labirintite viral geralmente associa-se à infecção de via aérea superior (IVAS) recente, que evolui para inflamação da orelha interna (ou labirinto). Os principais vírus associados à labirintite são varicela- zóster, CMV, caxumba, sarampo, rubéola e HIV. A labirintite bacteriana geralmente associa- se à otite média aguda ou crônica e colesteatoma, podendo acometer ambas as orelhas. As principais bactérias associadas à labirintite são Staphylococcus sp., Streptococcus sp., Haemophilus influenzae, Neisseria meningitidis e Treponema pallidum. Fisiopatologia: A infecção e a inflamação da orelha interna (ou labirinto) geralmente é causada por disseminação de microrganismos (vírus ou bactérias) da orelha média (otite média aguda ou crônica) em direção à orelha interna por meio da janela da cóclea e da janela do vestíbulo. Fatores de Risco: - Infecções virais do trato respiratório superior. - Otite média aguda. - Otite média crônica. - Colesteatoma. - Meningite, principalmente meningite bacteriana causada por Streptococcus pneumoniae. - Malformações da orelha interna. - Doenças autoimunes da orelha interna. - Sífilis. Apresentação Clínica: As principais manifestações clínicas da labirintite são: - Vertigem de início abrupto/súbito, com duração que varia de horas a dias (até 72 horas), comumente associada à presença de náuseas e vômitos. Diferentemente da VPPB, a vertigem não é desencadeada por movimentos da cabeça. - Perda auditiva neurossensorial de início abrupto/súbito, unilateral ou bilateral, de intensidade variável, com duração que varia de horas a dias, acompanhando a vertigem, que manifesta-se para sons de todas as frequências (sons agudos e sons graves). - Zumbido de início abrupto/súbito, unilateral ou bilateral, de intensidade variável e com duração que varia de horas a dias, acompanhando a perda auditiva e a vertigem. - Desequilíbrio. - Nistagmo horizontal e unidirecional. - Movimentos rápidos da cabeça e/ou do corpo associados à vertigem. 10 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Otalgia e/ou otorreia. - Sinais e/ou sintomas de IVAS. Caso Clínico: Mulher de 56 anos apresenta-se com história de 3 semanas de desequilíbrio, perda auditiva do lado direito e zumbido. Ela relata ter tido uma infecção do trato respiratório superior 1 semana antes do início dos sintomas. Os sintomas começaram com episódios graves de tontura rotatória (vertigem) com náuseas e vômitos associados que duraram dias. No dia seguinte, ela observou um zumbido do lado direito e não conseguia utilizar o telefone na orelha direita. Agora, ela relata desequilíbrio constante e leve vertigem associada a giros de cabeça rápidos para a direita. Diagnóstico: Labirintite viral unilateral à direita. Diagnóstico: O diagnóstico de labirintite baseia-se em achados clínicos (anamnese + exame físico) e em achados de exames complementares (audiometria e exames de imagem). No exame físico do paciente com labirintite, pode-se observar nistagmo horizontal e unidirecional, teste de Rinne normal e teste de Weber indicando perda auditiva neurossensorial. Na audiometria do paciente com labirintite, observa-se perda auditiva neurossensorial que, em geral, manifesta-se para sons de todas as frequências. Os exames de imagem, especialmente a TC de crânio e a RM de crânio, devem ser realizados em todos os pacientes que apresentam perda auditiva abrupta/súbita com o objetivo de excluir diagnósticos diferenciais, principalmente de neuroma acústico ou schwanoma vestibular. Diagnóstico Diferencial: - Neurite vestibular. - Doença de Menière. - Vertigem posicional paroxística benigna (VPPB). - Neuroma acústico ou schwanoma vestibular. - AVC de fossa posterior. - Fratura de osso temporal. - Malformações da orelha interna. - Esclerose múltipla. - Hemorragia labiríntica. - Neoplasia de osso temporal. Tratamento: O tratamento da labirintite depende da causa (viral ou bacteriana) da doença e baseia-seem: - Labirintite Viral: → Antieméticos e/ou supressores vestibulares: prometazina, ciclizina, dimenidrinato, proclorperazina, metoclopramida ou ondansetrona. → Corticoides: prednisona VO por curto período de tempo (10-14 dias), com diminuição gradual da dose; os corticoides representam o tratamento padrão em casos de perda auditiva abrupta/súbita. - Labirintite Bacteriana: → Antibióticos sistêmicos e/ou antibióticos em solução otológica. → Antieméticos e/ou supressores vestibulares: prometazina, ciclizina, dimenidrinato, proclorperazina, metoclopramida ou ondansetrona. → Corticoides: prednisona VO por curto período de tempo (10-14 dias), com diminuição gradual da dose; os corticoides representam o tratamento padrão em casos de perda auditiva abrupta/súbita. - Sintomas vestibulares persistentes: → Reabilitação vestibular. Neurite Vestibular: A neurite vestibular, também denominada neuronite vestibular, é definida como a vestibulopatia periférica aguda causada por reativação de infecção viral latente no organismo, mais comumente da infecção por herpes-simples (HSV), que acomete o núcleo vestibular, o nervo vestibular e/ou o labirinto. Além do herpes-simples, outro vírus associado à neurite vestibular é o herpes- zóster. A neurite vestibular caracteriza-se clinicamente por vertigem de início abrupto/súbito, que classicamente 11 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 manifesta-se durante a madrugada, com duração que varia de horas a dias, associada a náuseas e vômitos, mas não associada a perda auditiva, zumbido ou plenitude auricular, diferentemente da Doença de Menière e da labirintite. Além disso, diferentemente da VPPB, a vertigem não piora com movimentos da cabeça. A tontura e o desequilíbrio podem permanecer por dias, mesmo após a resolução da vertigem. O diagnóstico da neurite vestibular é essencialmente clínico e baseia-se em anamnese + exame físico. Os principais achados de exame físico do paciente com neurite vestibular são desequilíbrio e nistagmo horizontal e unidirecional. Os exames complementares, em geral, são realizados para excluir diagnósticos diferenciais, não sendo necessários para confirmar o diagnóstico de neurite vestibular. Na neurite vestibular, a audiometria apresenta resultado normal, assim como os exames de imagem (TC de crânio e RM de crânio), que são realizados para excluir o diagnóstico diferencial de AVC de fossa posterior ou de tumor de fossa posterior (neuroma acústico ou schwanoma vestibular), que podem mimetizar o quadro clínico da neurite vestibular. O tratamento da neurite vestibular baseia-se em: - Antieméticos e/ou supressores vestibulares. - Corticoides: prednisona VO por curto período de tempo, seguido de diminuição gradual da dose. - Reabilitação vestibular. Deiscência do Canal Semicircular Anterior/Superior: A deiscência do canal semicircular anterior/superior caracteriza-se por episódios recorrentes de vertigem associados à hiperacusia e plenitude auricular. A hiperacusia associa-se ao aumento da percepção de condução do som na via óssea, pois há diminuição de condução do som na via aérea (perda auditiva condutiva). Na audiometria, a deiscência do canal semicircular anterior/superior caracteriza-se por perda auditiva condutiva com presença de reflexos acústicos normais. O diagnóstico de deiscência do canal semicircular anterior/superior baseia-se em TC de crânio, que indica a presença de deiscência óssea do canal semicircular anterior/superior, permitindo a transmissão do som conduzido por via óssea de forma muito intensa em direção à cóclea (hiperacusia óssea). Fístula Endolinfática/Perilinfática: A fístula endolinfática/perilinfática é definida como a comunicação anormal existente entre o espaço perilinfático e a orelha média por meio da janela da cóclea (janela redonda) ou da janela do vestíbulo (janela oval) ou entre o espaço endolinfático e o espaço perilinfático. A fístula endolinfática/perilinfática desenvolve-se mais comumente em pacientes submetidos a cirurgia do estribo (estapedectomia), com história de TCE ou mergulhadores. A fístula endolinfática/perilinfática manifesta-se clinicamente por episódios recorrentes de vertigem posicional associada a desequilíbrio, perda auditiva neurossensorial e zumbido. A vertigem associada à fístula endolinfática/perilinfática é considerada grave, de forma semelhante aos ataques da Doença de Menière. O fenômeno de Hennebert (nistagmo desencadeado por pressão aplicada no conduto auditivo externo) e o fenômeno de Túlio (vertigem desencadeada por som de alta intensidade) são altamente sugestivos de fístula endolinfática/perilinfática. O diagnóstico de fístula endolinfática/perilinfática é cirúrgico e o tratamento baseia-se em correção da comunicação anormal existente entre o espaço perilinfático e a orelha média. 12 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Enxaqueca/Migrânea Vestibular: A enxaqueca/migrânea vestibular representa a segunda causa mais comum de vertigem na população geral. A migrânea vestibular acomete aproximadamente 10% dos pacientes com migrânea. A doença caracteriza-se por vertigem espontânea e/ou posicional (desencadeada por movimentos da cabeça) com duração que varia de minutos a dias, manifestando-se de forma independente da cefaleia associada à enxaqueca. Outras manifestações clínicas associadas à cefaleia e à vertigem são náuseas, vômitos, fotofobia e fonofobia. O tratamento da enxaqueca/migrânea vestibular é igual ao tratamento de qualquer outro tipo de migrânea (tratamento da crise + tratamento profilático). Vertigem Pós-Traumática: A vertigem pós-traumática é definida como a vertigem desencadeada por TCE, cirurgia da orelha média, implante coclear ou mergulho. As manifestações clínicas são semelhantes às da Doença de Menière e da fístula endolinfática/perilinfática, mas estão associadas à história de cirurgia e/ou trauma. Os pacientes, em geral, apresentam vertigem, desequilíbrio, zumbido, plenitude auricular, cefaleia, diplopia e nistagmo em direção ao lado afetado. Isquemia Vertebrobasilar: A tontura e a vertigem são sintomas comuns em eventos cerebrovasculares. O acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico ou hemorrágico de fossa posterior, especialmente de artéria cerebelar inferior anterior, pode manifestar-se clinicamente de forma semelhante às causas periféricas de vertigem (labirintite, neurite vestibular, etc), com vertigem abrupta/súbita associada à presença de náuseas e vômitos. A vertigem pode ser causada por isquemia de labirinto e/ou tronco cerebral, pois ambos os territórios são irrigados por artérias da circulação vertebrobasilar. A artéria do labirinto é ramo da artéria cerebelar inferior anterior que, por sua vez, é ramo da artéria basilar, que irriga as estruturas do tronco cerebral. O nistagmo associado à vertigem de causa central (isquemia vertebrobasilar) é bidirecional e vertical, diferentemente do nistagmo associado à vertigem periférica, que é unidirecional e horizontal. Outras manifestações clínicas associadas ao AVC de circulação posterior são ataxia, desequilíbrio e alteração de marcha, devido à isquemia cerebelar, disartria, disfagia, cefaleia e redução do nível de consciência, devido à isquemia do tronco cerebral. Entretanto, às vezes, a vertigem manifesta- se de forma isolada, sem outros achados neurológicos ao exame clínico, havendo indicação de TC de crânio ou de RM de crânio de urgência para todos os pacientes com vertigem aguda que apresentam fatores de risco de AVC, como HAS, DM, tabagismo e doença cardiovascular. Outros exames que também auxiliam na avaliação diagnóstica são ecografia/ultrassonografia com doppler de artérias vertebrais, angiografia por TC e angiografia por RM, que possibilitam identificar alterações da circulação vertebrobasilar. Vertigem Central X Vertigem Periférica: A vertigem de causa periféricaé muito mais comum que a vertigem de causa central. Entretanto, quando há suspeita de vertigem central, geralmente secundária a acidente vascular cerebral (AVC) de circulação posterior (isquemia vertebrobasilar), deve-se realizar avaliação adicional para o diagnóstico diferencial, pois a vertigem de causa central representa emergência médica associada à alta morbimortalidade. A vertigem central geralmente apresenta menor intensidade que a vertigem periférica, associa-se à presença de sinais/sintomas neurológicos focais, como ataxia, desequilíbrio, disartria, disfagia, diplopia, 13 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 relacionados à isquemia vertebrobasilar, e à presença de alteração do nível de consciência, diferentemente da vertigem periférica. Além disso, a vertigem periférica comumente associa-se à presença de perda auditiva, zumbido e plenitude auricular, que são raros na vertigem central. Ao exame físico, a diferenciação entre vertigem central e vertigem periférica é realizada por meio do teste de HINTS (HINTS Test), que caracteriza-se por: - Head Impulse: → Normal: vertigem central. → Alterado: vertigem periférica. O head impulse é considerado alterado quando há a presença de correção/sacada do reflexo vestíbulo-ocular. Quando realiza- se manobra para a direita e há correção para a esquerda, há lesão vestibular à esquerda. Quando realiza-se manobra para a esquerda e há correção para a direita, há lesão vestibular à direita. - Nistagmo: → Bidirecional e vertical: vertigem central. → Unidirecional e horizontal: vertigem periférica. - Test of Skew: → Alterado: vertigem central. → Normal: vertigem periférica. O teste de HINTS deve ser realizado apenas quando há suspeita de vertigem de causa central em paciente sintomático, não devendo ser realizado em paciente assintomático, ou seja, que apresenta vertigem episódica/paroxística. Cinetose: A cinetose caracteriza-se por presença de desconforto epigástrico, náuseas e vômitos, possivelmente associados a outros sintomas como tontura, cefaleia e sinais/sintomas autonômicos (palidez cutânea e sudorese), causados por movimento de transporte ou movimento visual. Os vômitos geralmente causam alívio dos sintomas. Quando determinado grau de náuseas é atingido, os vômitos são quase inevitáveis, mesmo que o paciente seja removido do ambiente de movimento. A intensidade dos sintomas da cinetose varia quanto à intensidade do movimento. Se o movimento associado à cinetose é sustentado, como em viagens de navio, a maioria dos pacientes desenvolve algum tipo de habituação ao movimento e torna-se menos suscetível à cinetose. As exposições curtas e recorrentes ao movimento provocativo também associam-se ao desenvolvimento de habituação ao movimento, embora a resposta dependa de fatores individuais. A cinetose geralmente manifesta-se durante a infância, tornando-se menos comum e/ou menos intensa durante a adolescência e a vida adulta. A cinetose é mais frequente em mulheres do que em homens. O diagnóstico de cinetose é clínico. O tratamento da cinetose baseia-se em respiração + medidas comportamentais associadas ao uso de anti-histamínicos ou antimuscarínicos, como escopolamina, dimenidrinato ou meclozina, em casos leves a moderados, e em respiração + medidas comportamentais associadas ao uso de anti- histamínico, como prometazina, em casos graves. Os medicamentos devem ser administrados aproximadamente 30-60 minutos antes de iniciar a viagem. Em pacientes que apresentam alta suscetibilidade à cinetose e que irão submeter-se a experiências de movimento frequente, indica-se habituação associada à terapia cognitivo-comportamental. Exames Complementares: Na avaliação da vertigem, além da anamnese e do exame físico, eventualmente há necessidade de realização de exames complementares para auxiliar na avaliação diagnóstica e para excluir diagnósticos diferenciais mais raros. Os principais exames complementares que podem ser realizados são: - Audiometria: avaliação da perda auditiva associada à vertigem; determinação do tipo de perda auditiva (condutiva, neurossensorial ou mista); a perda auditiva associada à vertigem geralmente é do tipo neurossensorial, como na Doença de Menière e na labirintite, exceto na deiscência do canal semicircular anterior/superior, na 14 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 qual a perda auditiva é do tipo condutiva, com reflexos acústicos normais. - Exame de Imagem: avaliação da perda auditiva neurossensorial abrupta/súbita e assimétrica; o exame de imagem de primeira escolha é a RM de crânio com contraste, que objetiva excluir diagnósticos diferenciais mais raros de perda auditiva associada à vertigem, como neuroma acústico ou schwanoma vestibular. - Exames Laboratoriais: avaliação de causas infecciosas, inflamatórias e metabólicas de tontura/vertigem, como diabetes mellitus, hipotireoidismo, HIV, sífilis e doenças autoimunes; os principais exames laboratoriais que devem ser solicitados são: → Glicemia de jejum e HbA1c. → TSH e T4 livre. → Sorologias: anti-HIV, VDRL, HbsAg e anti- HCV. → Ácido Fólico. → Vitamina B12. → 25-hidroxivitamina D. → PCR e VHS. → Hemograma. → Função hepática. → Função renal.
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