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Problemas e distúrbios da aprendizagem W B A 0 0 4 6 _ V 2 .3 2/184 Problemas e distúrbios da aprendizagem Autoria: Eveline Tolonetto Barbosa Pott Como citar este documento: TONELOTTO BARBOSA POTT, Eveline. Problemas e distúrbios da aprendi- zagem. Valinhos: 2017. Sumário Apresentação da Disciplina 04 Unidade 1: Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olha- res e traçando horizontes 06 Unidade 2: Distúrbios da aprendizagem: características e problemas 30 Unidade 3: O TDAH e suas possibilidades de intervenção 53 Unidade 4: A dislexia e suas possibilidades de intervenção 76 2/201 3/1843 Unidade 5: A discalculia e suas possibilidades de intervenção 97 Unidade 6: A disortografia e suas possibilidades de intervenção 121 Unidade 7: A psicomotricidade e suas possibilidades de intervenção 142 Unidade 8: Aprendizagem e a neurociência 163 Sumário Autoria: Sandra Cristina Malzinoti Vedoato Como citar este documento: VEDOATO, Sandra. C. M. O tradutor interprete de Libras: formação e práti- ca. Valinhos: 2017. 4/184 Apresentação da Disciplina Nesta disciplina, temos como objetivo abordar o tema dos problemas e distúrbios da aprendizagem, apresentando uma visão atual e contextualizada do assunto. A de- manda por profissionais qualificados para atuarem com este tipo de queixa é cada vez maior e foi pensando nesta necessida- de que este curso foi desenvolvido, a fim de atender aos profissionais que trabalham com educação, como professores, gestores escolares e psicólogos. Abordaremos as influências da dificuldade de aprendizagem e os possíveis caminhos para lidar com este problema, destacando o papel da educação inclusiva neste proces- so. Também serão abordados alguns diag- nósticos que historicamente vêm sendo uti- lizados por profissionais para justificarem problemas da aprendizagem, como o Trans- torno de Déficit de Atenção com Hiperativi- dade (TDAH), dislexia, discalculia e disorto- grafia. E ainda, discutir-se-ão os problemas psicomotores e a contribuição da neuroci- ência na compreensão dos problemas da aprendizagem. Não obstante, destacaremos a necessidade de compreender a dificuldade de aprendi- zagem para além de seu diagnóstico, colo- cando em xeque as práticas que visam rotu- lar e patologizar o sujeito e que pouco têm ajudado a superar as dificuldades no pro- cesso de aprendizagem. Será demonstrado que tão mais importante que o diagnóstico é a busca de caminhos e soluções para en- frentar os problemas de aprendizagem. Assim, vamos abordar várias temáticas que 5/184 se relacionam aos problemas e aos distúr- bios da aprendizagem e esperamos que possamos contribuir com o seu aprendiza- do. Boa leitura! 6/184 Unidade 1 Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e tra- çando horizontes Objetivos • Discutir o contexto atual da educação escolar no Brasil. • Compreender quais são os fatores que influenciam os problemas da aprendizagem. • Compreender a proposta da educação inclusiva e educação especial. Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes7/184 Introdução Neste texto, temos como principal objetivo trazer informações importantes para você, profissional que trabalha ou trabalhará com os chamados problemas da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial. Assim como o processo de inclusão esco- lar, os chamados problemas e distúrbios da aprendizagem vêm se tornando cada vez mais comuns, o que tem aumentado a ne- cessidade de profissionais qualificados para atuarem nestas áreas. Antes mesmo de fa- lar sobre esses temas, é importante discutir e conhecer o cenário da educação escolar no Brasil, a fim de compreender as influên- cias que estão na base desse tipo de queixa e demanda profissional. 1. O contexto da educação esco- lar no Brasil Avaliações internacionais e nacionais apon- tam para problemas de aprendizagem em nossos alunos. O Programme for Interna- tional Student Assessment (Pisa) – Pro- grama Internacional de Avaliação de Estu- dantes –, por exemplo, é uma avaliação que ocorre a cada três anos e que tem como ob- jetivo avaliar os sistemas educacionais no mundo, envolvendo alunos de 15 anos de idade. No Pisa, realizado em 2015, foram avaliados 70 países, e o Brasil ocupou umas das últimas colocações, ficando em 68° lu- gar (PISA, 2015). Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes8/184 No âmbito nacional, podemos citar o Índi- ce de Desenvolvimento da Educação Bási- ca (Ideb) que foi desenvolvido para avaliar a qualidade do aprendizado dos alunos no Brasil, além de estabelecer metas de desem- penho escolar para melhoria do ensino. Em 2015, os resultados do estado de São Pau- lo apontaram a nota de 5,25 para os anos iniciais do ensino fundamental, caindo para 3,06 nos anos finais e para 2,25 no ensino médio. Nota-se que quanto maior o tempo do aluno na escola, menor é o seu desem- penho escolar. Para os estudiosos e pro- fissionais que conhecem os bastidores da educação, sobretudo do contexto público, estes resultados não são surpreendentes, entretanto, isto não diminui a preocupação quanto ao desempenho escolar desses es- tudantes (IDESP, 2015). Link Caso você queira encontrar o Ideb das escolas de seu estado ou cidade, basta consultar no site do INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes9/184 Compreender estes resultados leva a refletir sobre suas causas: será que este desempe- nho é parte de uma dificuldade individual que remete exclusivamente à incapacida- de do aluno de se apropriar dos conteúdos escolares? Ou é uma dificuldade em relação aos processos de ensino-aprendizagem e como estes vêm ocorrendo nas escolas? Autores como Libâneo (2012) e Saviani (2013) apontam que o baixo desempenho escolar desses alunos é fruto de um contex- to social e politico que cada vez mais vem sendo fonte da precarização da educação escolar pública em nosso pais. Estes auto- res citam vários fatores que influenciam tal cenário, como: o baixo investimento finan- ceiro na educação, a falta de sentido dos alunos pelo conhecimento, a desmotivação dos profissionais quanto ao processo de en- sino-aprendizagem, a precarização da for- mação dos profissonais da educação, entre outros fatores. Assim, em meio a essa realidade na educa- ção, não é novidade a existência de tantos problemas e distúrbios da aprendizagem. Podemos pensá-los apenas como a ponta de um iceberg, ou seja, é o aparente, sen- do que há muitos fatores históricos e sociais que contribuem para sua manifestação e que não são vistos e considerados. Se a educação escolar pública vem nos pre- ocupando com o baixo desempenho dos alunos, no âmbito privado a lógica é total- mente oposta em vista da exigência para um melhor desempenho escolar dos alunos. É crescente a pressão das escolas para au- Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes10/184 mentar o número de aprovações nos vesti- bulares, com a promessa de que estes alu- nos serão bem-sucedidos e terão melhores condições de viver em nossa sociedade. Via de regra, quando não conseguem acompa- nhar o “ritmo” da escola, muitas vezes são encaminhados a profissionais especializa- dos com a queixa de dificuldade de apren- dizagem (LIBÂNEO, 2012). Sendo assim, tanto no âmbito público quan- to no privado, não podemos negar o papel do contexto social na produção dos proble- mas e distúrbios da aprendizagem e estas questões precisam ser levadas em conside- ração na compreensão deste tipo de queixa escolar, a fim de não minimizar os fatores que influenciam em seu diagnóstico. Para aprofundar e problematizarum pou- co esta questão, você já assistiu a um filme chamado “Contador de Histórias”? Caso não tenha assistido, deixo como indicação. Trata-se de uma história verídica que narra a vida de um menino chamado Roberto, en- tregue pela mãe à Fundação Estadual para o Bem-estar do Menor – FEBEM – aos seis anos de idade, e lá, em um determinado momento, passa por avaliações psicológi- cas, recebendo diagnóstico de dislalia, dis- lexia, discalculia, sendo visto como um caso irrecuperável aos olhos da instituição. En- tretanto, Roberto encontra uma pedagoga que oferece todo o suporte que ele precisa- va e que acreditava em sua capacidade de superação daquela condição que vivia. Ro- berto foi adotado por esta professora e hoje é pedagogo e considerado um dos maiores Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes11/184 contadores e escritores de histórias infantis do mundo. Este tipo de diagnósticos não mudou em nada a vida de Roberto, tampouco sua posi- ção em relação ao seu desempenho escolar. Neste sentido, muito sábio foi Roberto em não deixar que os diagnósticos determinas- sem quem ele era. Entretanto, será que esta mesma posição aplica-se a todos os casos? O foco da avaliação psicológica de Roberto concentrou-se tanto no diagnóstico, em lhe rotular, que se quer houve espaço para ana- lisar suas potencialidades e interesses. Tal- vez se tivessem focado na grande habilida- de de Roberto em contar histórias e guiado seu processo de aprendizagem por esta via, sua vida teria sido mais fácil no que se refe- re aos processos de aprendizagem. Portan- to, tão mais importante do que compreen- der os problemas e dificuldades do sujeito é Para saber mais O filme narra a história verífica de Roberto Carlos Ramoso, mais conhecido em sua cidade (Belo Ho- rizonte) por Roberto Carlos Contador de Histórias. A sigla FEBEM era a abreviação da Fundação Esta- dual para o Bem-estar do Menor, que atualmente alterou-se para Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente – Fundação Casa. A partir desta história questiono você: em que os diagnósticos mudaram a vida de Ro- berto? Eles trouxeram algo de bom para sua formação e dificuldade de aprendizagem? Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes12/184 compreender suas potencialidades, afim de tentar conduzir seu processo de aprendiza- gem por essas vias. Abordaremos sobre este tema ao longo deste curso. Assim, ao discutir sobre a questão da apren- dizagem e seus problemas, é importante, primeiramente, compreender a história do sujeito e o contexto no qual este está inse- rido, acessando sua lógica de pensamento e buscando caminhos diferentes para condu- zir seu processo de aprendizagem. Entretan- to, ainda nos deparamos com concepções que visam buscar as causas para a dificul- dade da aprendizagem no indivíduo (SCOZ, 1994). Artigos de revisão da literatura (AN- GELUCCI et al, 2004; LEONARDO; LEAL; ROSSATO, 2015) apontam que a maioria dos estudos sobre dificuldades da aprendi- zagem apresenta uma visão individualizan- te dos problemas e distúrbios da aprendiza- gem, atribuindo a causa a algo associado ao aluno, à escola ou à família. Pesquisas mais atuais apontam para a necessidade de su- perar estas concepções individualizantes da dificuldade de aprendizagem, colocando como necessário a existência de uma ava- liação mais contextualizada, que leve em consideração todo o processo histórico de escolarização do aluno, bem como as esfe- ras que participam de seu envolvimento es- colar. O fato de destacar a necessidade de uma análise contextualizada sobre os fatores que ocasionam a dificuldade de aprendiza- gem não exclui de modo algum a existência de casos em que por conta de alguma de- Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes13/184 ficiência, transtorno global do desenvolvi- mento ou outros fatores não relacionados a alguma deficiência, o aluno necessite de algum atendimento individualizado, a fim de favorecer seu processo de aprendiza- gem. Para estes casos, ele deve ser benefi- ciado com a modalidade da educação inclu- siva tão discutida nos dias atuais e que será aprofundada a seguir. 2. Inclusão escolar e educação especial: caminhos para uma educação para todos É de extrema importância ampliar o olhar em relação à inclusão escolar e à dificuldade de aprendizagem. É preciso compreender estas questões para além da deficiência, visto que muitas vezes a inclusão é associada a algum tipo de deficiência física ou cognitiva. Começo a reflexão deste tema com algumas perguntas para você refletir: os alunos des- critos no início deste texto, que apresentam um baixo desempenho escolar, segundo as avaliações sobre a escola pública, não esta- riam excluídos em relação a seus direitos em acessar uma educação de qualidade? E os alunos com superdotações? Jovens e adul- tos que não conseguiram concluir a educa- ção escolar no tempo correto, também não precisam de um atendimento educacional especializado? Claro que sim! Não restam dúvidas de que todos esses alunos preci- sam ser incluídos no contexto da educação escolar. Portanto, os desafios da educação inclusiva são mais amplos e complexos, en- Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes14/184 volvendo não só o aluno com alguma defi- ciência, mas todos aqueles que possuem al- guma necessidade educacional especial. Apesar desta ampla visão sobre a inclusão escolar, via de regra, em estudos e no co- tidiano escolar a inclusão geralmente está associada à pessoa que apresenta alguma deficiência, seja ela fisica e/ou cognitiva, por meio da oferta de uma educação especial. Este processo de escolarização das pessoas com necessidades educacionais especiais é uma modalidade da educação conhecida como educação especial. A educação especial é compreendida como um foco da educação escolar que trabalha com crianças, jovens e adultos que não se beneficiam com o sistema convencional de ensino. Ela pode ser exercida tanto em es- colas quanto em centros especializados. Em 2008, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência incorporou à legislação brasileira os postulados da con- venção da Organização das Nações Unidas – ONU – sobre os direitos das pessoas com deficiência, assegurando sua acessibilida- de em toda esfera social. No que se refere à educação, o referido documento, em seu artigo 24, assegura à pessoa com deficiên- cia o seu direito à educação, postulando seu direito de frequentar o ensino regular gra- tuito, destacando claramente o dever do estado em assegurar este direito por meio da organização física do espaço escolar e da contratação de profissionais qualificados para facilitar este processo (BRASIL, 2012). Entretanto, os profissionais que trabalham Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes15/184 com educação inclusiva, sobretudo no con- texto público, sabem que estes direitos nem sempre são ofertados pelo estado e as di- ficuldades encontradas neste processo são inúmeras (BARBOSA; SOUZA, 2010). de que insiste em se camuflar em meio a alguns discursos. Para exemplificar, ao tra- balhar com educação inclusiva, é frequente o seguinte questionamento: “meu filho que não possui nenhuma deficiência não será prejudicado com a inclusão, pois os conteú- dos serão ofertados de modo mais lento?”. É importante refletir sobre esta questão, porque você certamente lidará com ela em algum momento. Costumamos dizer que os alunos da educa- ção regular são os que mais se beneficiam com o processo de inclusão, isto porque na prática com educação especial vivencia- mos momentos em que a interação entre os alunos com necessidadesespeciais e os demais alunos favorece o aprendizado de muitas formas. Por exemplo, ao conviver Apesar da expansão do processo de inclu- são escolar, ainda é frequente deparar-se com a barreira do preconceito da socieda- Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes16/184 com alunos com necessidades especiais, os demais aprendem a lidar com a diversidade e isto é um valor importante que precisa ser trabalhado na escola, uma vez que é a base para a formação de uma sociedade justa e humanizada. Pais e familiares que apoiam a educação inclusiva no ensino regular estão proporcionando aos seus filhos a possibili- dade de aprenderem a respeitar as pessoas e conviverem com a diversidade. Portanto, a aprendizagem no contexto escolar vai mui- to além da apreensão de conceitos cientí- ficos. Quanto ao conteúdo oferecido, habitual- mente é apenas adaptado para que o alu- no com necessidade educacional especial consiga aprender. Para isto, o professor na maioria das vezes conta com a ajuda de pro- fissionais para o auxiliarem neste processo. Para saber mais Conceitos científicos são aqueles aprendidos principalmente na escola; que exigem certa abs- tração do pensamento e a mediação de uma ou- tra pessoa para serem aprendidos. Exemplos de conceitos científicos: seres vivos, reino animal, sistema digestivo etc. Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes17/184 A inclusão escolar no ensino regular não ex- clui de modo algum o fato de que este aluno não possa/deva receber atendimento es- pecializado e individualizado. Muitas vezes é preciso que o sujeito tenha um trabalho individualizado para ser incluído no ensino regular. Esta é a base do conceito de equi- dade que sustenta os princípios da educa- ção inclusiva que significa tratar as pessoas de modo diferente, a partir de suas necessi- dades, para que todos consigam acessar os mesmos horizontes e possibilidades de de- senvolvimento (SAMPAIO; FREITAS, 2011). Para saber mais estes profissionais que auxiliam no processo de in- clusão podem ser contratados pela escola, como professores de educação especial ou auxiliares de inclusão; ou no caso de algumas escolas privadas, estas indicam aos pais a contratação de um me- diador que pode ser professor ou psicólogo. Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes18/184 Glossário Educação escolar: trata-se do processo de escolarização realizado no sistema regular de ensino. Iceberg: bloco de gelo que se desprendeu de alguma plataforma de gelo e vaga pelo mar. No iceberg somente uma pequena parte emerge à superfície, sendo que 90% de seu tamanho encontra-se sub- merso na água. Rotular: sinônimo de classificar, etiquetar, marcar uma pessoa ou objeto com determinada caracterís- tica de qualquer natureza. Questão reflexão ? para 19/184 Como você viu, é muito importante realizar uma avalia- ção cuidadosa e contextualizada sobre os problemas e distúrbios da aprendizagem e, neste sentido, convido-o a pensar: quais são os aspectos que devem ser conside- rados na avaliação do aluno com a queixa de dificuldade e distúrbio da aprendizagem? 20/184 Considerações Finais • Necessidade da avaliação cuidadosa quanto aos problemas de aprendiza- gem, destacando a necessidade de considerar o contexto escolar, social, fa- miliar e individual de cada aluno. • Importância de compreender o aluno, sua história de vida, buscando acessar os sentidos sobre o seu processo escolar. • Para além da preocupação com o diagnóstico e rótulo de um aluno com pro- blema ou distúrbio da aprendizagem, é importante compreender suas capa- cidades, potencialidades e buscar estratégias de ação guiadas por estas vias. • A inclusão escolar como forma de oferecer uma educação de qualidade para todos. Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes21/184 Referências ANGELUCCI, C. B. et al. O estado da arte da pesquisa sobre o fracasso escolar (1991-2002): um estudo introdutório. Revista Estudo e Pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 1, p. 51-72, 2004. BARBOSA, E. T.; SOUZA, V. L. T. A vivência de professores sobre o processo de inclusão: um estu- do da perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural. Rev. psicopedagia, São Paulo, v. 27, n. 84, p. 352-362, 2010. BRASIL. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. 4. ed. 2012. Disponível em: <http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/sites/default/files/publicacoes/convencaopes- soascomdeficiencia.pdf>. Acesso em: 1 abr. 2017. IDESP. Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo. Secretária de Educação do Estado de São Paulo. 2015. Disponível em: <http://idesp.edunet.sp.gov.br/>. Acesso em: 17 jul. 2017. LEONARDO, N. S. T.; LEAL, Z. F. R. G.; ROSSATO, S. P. M. A naturalização das queixas escolares em periódicos científicos: contribuições da psicologia histórico-cultural. Psicol. Esc. Educ., Maringá, v. 19, n. 1, p. 163-171, abr. 2015. LIBANEO, José Carlos. O dualismo perverso da escola pública brasileira: escola do conhecimento para os ricos, escola do acolhimento social para os pobres. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 1, p. 13-28, mar. 2012. Unidade 1 • Problema da aprendizagem, educação inclusiva e educação especial: ampliando olhares e traçando horizontes22/184 PISA. Programme for International Student Assessment. Organization for economic co-ope- ration and development, 2015. Disponível em: <http://www.oecd.org/pisa/>. Acesso em: 2 abr. 2017. SAMPAIO, S.; FREITAS, I. B. (Orgs.). Transtornos e dificuldades de aprendizagem: entendendo melhor os alunos com necessidades educativas especiais. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2011. SAVIANI, Dermeval. Vicissitudes e perspectivas do direito à educação no Brasil: abordagem his- tórica e situação atual. Educ. Soc., Campinas, v. 34, n. 124, p. 743-760, set. 2013. SCOZ, Beatriz. Psicopedagogia e realidade escolar: o problema escolar e de aprendizagem. Pe- trópolis, RJ: Vozes, 1994. Referências 23/184 1. No diagnóstico dos problemas e distúrbios da aprendizagem, é importan- te o profissional avaliar: a) O contexto social, político, familiar e o próprio desenvolvimento do aluno. b) Somente o desenvolvimento individual. c) Os contextos familiar e individual. d) O contexto político. e) O desenvolvimento afetivo. Questão 1 24/184 2. No texto, faz-se uma crítica quanto aos procedimentos de avaliação dos problemas e distúrbios da aprendizagem que folocalizam somente o âm- bito: Questão 2 a) Político. b) Afetivo. c) Indivídual. d) Social. e) Familiar. 25/184 3. A educação inclusiva deve beneficiar o aluno: a) Que possui qualquer tipo de necessidade educacional especial. b) Que possui alguma deficiência física. c) Que possui algum transtorno global do desenvolvimento. d) Que possui algum déficit cognitivo. e) Que possui deficiência cognitiva e /ou motora. Questão 3 26/184 4. A educação especial pode ser oferecida: a) Preferencialmente no ambiente familiar. b) No ambiente familiar e na instituição especializada. c) Nas escolas e centros especializados. d) Somente na educação regular. e) Somente em instituição especializada. Questão 4 27/184 5. O que significa o conceito de equidade? a) Trabalhar com todas as pessoas com deficiências de modo diferente, colocando limitações para sua inserção no contexto social. b) Direitos perante a lei. c) Aprofeitar as oportunidades. d) Tratar as pessoas de modo diferente a partir de suas necessidades, a fim de que todos aces- sem as mesmas condições de aprendizado e desenvolvimento. e) Tratar todas as pessoas deficientes de modo igual. Questão 5 28/184 Gabarito 1. Resposta: A. Os problemas e distúbios da aprendizagem precisam ser pensados a partir de uma ava- liação ampla, que consideratodas as ins- tâncias formadoras do sujeito, como: o con- texto social, político, familiar e o próprio de- senvolvimento do aluno. 2. Resposta: C. É necessário a superação da concepção dos problemas e distúrbios da aprendizagem que parte da concepção individualizante desta queixa, visto que suas causas envol- vem outros aspectos da vida do sujeito. 3. Resposta: A. A educação inclusiva envolve uma modali- dade de educação que contempla todas as pessoas que possuem alguma dificuldade com a adaptação ao ensino regular, envol- vendo as pessoas com e sem deficiências. 4. Resposta: C. Com a ampliação dos postulados da educa- ção inclusiva, a educação especial passou a ser oferecida não mais unicamente em ins- tituições especializadas, mas também na educação regular. 29/184 5. Resposta: D. O conceito de equidade dentro dos postula- dos da educação inclusiva veio para romper com a ideia de que todos devem ser trata- dos da mesma forma no processo de inclu- são, objetivando a necessidade de um tra- tamento diferenciado a depender da neces- sidade de cada pessoa com o intuito de que todos consigam aprender e se desenvolver. Gabarito 30/184 Unidade 2 Distúrbios da aprendizagem: características e problemas Objetivos • Apontar as diversas áreas do conhecimento que buscam respostas para os distúrbios da aprendizagem. • Definir o conceito de aprendizagem, assim como seus distúrbios. • Favorecer a reflexão sobre os processos de patologização da aprendizagem e da vida. • Refletir sobre a concepção médica dos distúrbios da aprendizagem. • Destacar a necessidade da compreensão contextualizada e avaliação cuidadosa dos dis- túrbios da aprendizagem. Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas31/184 Introdução Neste texto, temos como objetivo caracte- rizar os chamados distúrbios da aprendiza- gem, bem como problematizar sua abran- gência e variações quanto à sua definição. Ao abordar este assunto, o seguinte para- doxo emerge: se por um lado os diagnósti- cos de distúrbios da aprendizagem crescem cada vez mais, por outro, também aumen- tam suas definições e conceituações, apre- sentando concepções distintas e contradi- tórias entre si, o que dificulta um consenso quanto à sua definição. Na história das dificuldades de aprendiza- gem são muitos os campos de interesse que buscam explicar tal fenômeno envolvendo, por exemplo, professores, psicólogos, médi- cos, nutricionistas e neurocientistas, o que resulta nas mais diversas teorias e modos de conduzir tal queixa. Portanto, para caracte- rizar a dificuldade de aprendizagem, muitos são os caminhos possíveis. E neste desafio, buscamos caracterizar as dificuldades e dis- túrbios da aprendizagem começando pelo conceito de aprendizagem, conforme você verá a seguir. 1. O que é aprendizagem? Bus- cando caminhos para compre- ender os distúrbios da aprendi- zagem Inspirado nas ideias de Vygotsky (1991, 2001), compreende-se o conceito de apren- dizagem como a capacidade humana de apreender a realidade material e simbóli- ca, em um processo contínuo que ocorre ao Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas32/184 longo da vida. Para Vygotsky (1991, 2007, 2001), a apren- dizagem se dá a partir da necessidade apre- sentada pelo sujeito em sua relação com o contexto social. O surgimento desta carên- cia ocorre no momento em que o repertó- rio de conhecimento do sujeito já não é su- ficiente para lidar com a realidade na qual está inserido. E este processo é acompanha- do por momentos de crises, de sentimentos negativos, visto que o sujeito entra em con- tato com o seu “não saber”, com sua falta e dificuldade de compreensão e adaptação ao meio. Isto é acentuado, quanto maior a complexidade dos conceitos que o sujeito precisa aprender. Vygotsky (1991), inspirado nas ideias de Marx, vai relacionar a questão da aprendi- zagem ao processo de trabalho, dizendo que aprender é trabalhoso, visto que exige um grande esforço do sujeito. Portanto, é neces- sário desconstruir a ideia de que aprender é algo somente prazeroso, discurso bastante Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas33/184 O que quero destacar com esta reflexão, é que aprender é trabalhoso, exige esfor- ço e a dificuldade de aprendizagem é algo extremamente comum e esperado a qual- quer pessoa. Ela tanto faz parte do desen- volvimento como o promove, uma vez que quanto maior a dificuldade, maior é o de- senvolvimento do pensamento. No entan- to, a dificuldade de aprendizagem torna-se realmente um problema quando é genera- lizada, envolvendo vários âmbitos, a saber: escola, família, relacionamento com amigos e as atividades práticas do dia a dia. Além disso, outro importante fator a ser considerado sobre o processo de aprendi- zagem é que ele ocorre, segundo Vygotsky (1991), nas interações que tem a fala como principal instrumento mediador. Como um proclamado nos dias de hoje. Obviamente que a aprendizagem é acompanhada, mui- tas vezes, de emoções positivas, entretanto isto não é a regra. Geralmente o que ocorre é que a emoção positiva acompanha o re- sultado da aprendizagem, ou seja, quando o sujeito consegue apreender o conceito, am- plia sua visão de mundo. Para saber mais Karl Marx (1818-1883) foi um filósofo que cons- truiu uma vasta teoria sobre sociedade, econo- mia e política, revolucionando o modo de pensar de várias pessoas e estudiosos. Nos dias atuais, os trabalhos de Marx ainda são amplamente utiliza- dos como referência teórica para explicar sobre a vida cotidiana, como a estrutura da vida no capi- talismo e as relações de poder no trabalho. Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas34/184 exemplo deste processo, citamos um caso descrito há muitos anos sobre um garo- to conhecido como Victor de Aveyron, que foi encontrado já adolescente na floresta, vivendo em meio aos animais. Victor não falava, emitia somente alguns grunhidos, andava em quatro apoios, não vestida rou- pas e demonstrava comportamentos mui- to próximos aos de um animal. Ele foi ado- tado por um cientista chamado Jean Marc Gaspard Itard, responsável por lhe ensinar habilidades e comportamentos caracterís- ticos da espécie humana, como tomar ba- nho, usar roupas e dizer algumas palavras. Este caso ilustra o fato de que Victor apren- deu as habilidades que faziam parte de seu contexto, pois na ocasião em que viveu na floresta aprendeu comportamentos e ha- bilidades dos animais para, em seguida, em seu processo de socialização na cultura hu- mana aprender os comportamentos e cos- tumes humanos. Este exemplo mostra que aprendemos aquilo que faz parte do nosso meio, de nossas interações, apropriando- -nos de conceitos e características que fo- ram construídos ao longo dos anos, em um processo histórico. Para saber mais É por meio da fala humana em suas várias expres- sões, como a escrita e falada, que nos apropria- mos da cultura, do conhecimento e, por conse- guinte, nos desenvolvemos. Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas35/184 Portanto, se a aprendizagem ocorre nas in- terações sociais e é fruto de um processo histórico, isto significa que ao olhar para a dificuldade de aprendizagem é preciso vi- sualizar também estes dois fatores como elementos fundamentais. Ao pensar na dificuldade de aprendizagem, é importante analisar o contexto no qual este processo ocorre, levando em conside- ração o ambiente escolar, a relação fami- liar, o conceito aprendido e o aluno. A se- guir apresentamos algumas questões im- portantes que precisam ser investigadas no processo de compreensão da dificuldade de aprendizagem: • Como é a estrutura escolar na qual o aluno está inserido? • Como é a relação dos professores com o aluno? • Como é a relação familiar deste aluno? • Quais são os sentidos que o aluno atribui ao conteúdo escolar? • De que modo este conteúdo, fonte da dificuldade de aprendizagem,é ensi- nado? • Já foi tentado ensinar este mesmo conteúdo de uma outra forma? • O aluno possui dificuldade de apren- dizagem em uma determinada área do conhecimento ou é uma dificulda- de generalizada? • Este aluno apresenta a mesma dificul- dade de aprendizagem em casa ou na Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas36/184 relação com os amigos? Estas são algumas questões importantes a serem consideradas no diagnóstico da difi- culdade de aprendizagem, buscando iden- tificar suas causas e avaliar se é algo comum ao desenvolvimento, conforme abordado anteriormente, ou se a dificuldade é gene- ralizada, caracterizando-se como um pro- blema ou distúrbio do desenvolvimento. Portanto, ressalto a importância de uma análise contextualizada da dificuldade de aprendizagem, uma vez que na maioria das vezes ela remete a um obstáculo em rela- ção aos processos de ensino-aprendizado e como eles ocorrem na escola. Segundo Leonardo, Leal e Rossato (2015), a escola é acostumada a ensinar a um padrão mui- to específico de aluno, e quando o padrão é desviado, a escola geralmente encaminha este aluno a um profissional (psiquiatra, psicólogo, psicopedagogo) com a queixa de dificuldade ou transtorno de aprendizagem. Moyses e Collares (2013) apontam que o “não saber/conhecer” sobre as reais causas da dificuldade de aprendizagem favorece encaminhamentos e tratamentos bastante preocupantes, como a utilização de medi- camentos que visam tratar o aluno conce- bido como aquele que é culpado por seu fracasso escolar. Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas37/184 2. O normal versus patológico nas dificuldades e distúrbios da aprendizagem Na sociedade ocidental, a busca pela padro- nização das pessoas é cada vez mais recor- rente. Lidar com a diversidade e a diferença parece ser algo mais difícil, sendo atribuí- do a algumas instâncias sociais o poder de fiscalizar e tratar os indivíduos que social- mente não se enquadram nos padrões de normalidade (MOYSES; COLLARES, 2013). Quais são estes padrões? No que eles con- sistem? Quem dita o que é normal e anor- mal? Estas são questões de difícil resposta, visto sua fluidez e inconstância que se mo- difica o tempo todo a depender do período histórico e social em que se vive. Por muitos anos a religião foi a instância que fiscalizava e era responsável pela or- dem social, entretanto, nos dias atuais cada vez mais a medicina vem ocupando este lu- gar, colocando-se na função social de res- ponder ao que é anormal e normal, ao que é saúde e doença. Neste campo, psiquiatras e neurologistas sofisticaram e desenvol- veram mecanismos para explicar o desen- Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas38/184 volvimento humano, especializando-se em casos em que há um desvio em relação ao padrão comportamental normal. Neste ce- nário, é crescente a transformação de pro- blemas inerentes à vida, que tem em sua base aspectos sociais e políticos, distúr- bios individuais, de ordem biológica, como ocorre em alguns casos de diagnóstico de distúrbios da aprendizagem. Ainda, ao atri- buir as dificuldades e distúrbios da aprendi- zagem a uma doença orgânica inerente ao sujeito, o caminho mais utilizado para so- lucionar este problema é a medicalização – fenômeno crescente que atinge crianças e adolescentes em idade escolar (MOYSES; COLLARES, 2013). Sobretudo a partir dos anos 1980, é obser- vado um crescente número de enfoques te- óricos, bem como sua consolidação, que vão concebem as dificuldades e distúrbios da aprendizagem como problemas neurológi- cos, envolvendo certa limitação das sinap- ses cerebrais, sustentando a construção dos seguintes diagnósticos: dislexia, trans- torno e déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), entre outros (MOYSES; COLLARES, 2013). Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas39/184 Para exemplificar este problema, em relação ao TDAH nos últimos dez anos, cresceu es- pantosamente o número de casos de crian- ças e adolescentes diagnosticados, bem como o uso de metilfenidato como trata- mento medicamentoso (MOYSES; COLLA- RES, 2013). A associação entre aprendizagem e desen- volvimento neurológico é algo bastante discutido pela neurociência e não há dú- vidas de sua relação. É consenso na litera- Para saber mais Sinapses são as conexões entre os neurônicos que promovem o desenvolvimento cerebral. Para saber mais O mecanismo de ação do metilfenidato é seme- lhante ao da cocaína, sendo um poderoso psico- estimulante. Aumenta-se o nível de dopamina no cérebro, neurotransmissor responsável pela sen- sação de prazer. Muitos são os riscos deste au- mento da dopamina na infância e adolescência, como: dependência e busca de outras fontes de prazer artificias, como as drogas, o efeito conhe- cido como “zombie-like”, em que a pessoa fica contida, obediente, tranquila (MOYSES; COLLA- RES, 2013). Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas40/184 tura científica atual que a aprendizagem agiliza as sinapses cerebrais, e o contrário também, que a “não aprendizagem” limi- ta o desenvolvimento neurológico (CAPO- VILLA; VALLE, 2011, ROTTA; OHLWEILER; RIESGO, 2006). Entretanto, atualmente a grande dificuldade é que via de regra apre- ende-se este conhecimento para justificar a dificuldade de aprendizagem, tendo como causa uma disfunção neurológica, e aí resi- de o problema na grande maioria dos casos: transformam-se problemas sociais em do- enças. É importante para você profissional que tem interesse por este tipo de queixa esco- lar envolvendo dificuldades e distúrbios da aprendizagem, conhecer estas questões de transformação de dificuldades normais em doenças. O desenvolvimento de um pensa- mento crítico, que afinal está cada vez mais em extinção, sobre as dificuldades e distúr- bios da aprendizagem, não exclui de modo algum a existência de deficiências e doen- ças que afetam o desenvolvimento cogni- tivo do sujeito e limitam seu processo de aprendizagem. No entanto, estes são casos raros, não correspondendo à quantidade de alunos que encontramos hoje sendo diag- nosticados com distúrbios da aprendiza- gem e em tratamento medicamentoso. Desta forma, destaco dois tipos de proble- mas de aprendizagem: o específico, que refere-se àquele aluno que possui algu- ma dificuldade em determinada área, por exemplo, em matemática ou português; e o generalizado em que a criança apresenta Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas41/184 dificuldade em múltiplas áreas, envolvendo os conteúdos escolares, os valores e normas da sociedade, o uso das diversas tecnolo- gias etc. Para exemplificar e demarcar esta diferença, trazemos um caso ilustrativo, mas bastante frequente, que envolve o alu- no com dificuldade de aprendizado na es- cola, sendo incapaz de atingir a média ne- cessária, porém que em casa joga videoga- me, conversa com os amigos normalmente e consegue acompanhar suas séries e filmes favoritos. Aí perguntamos a você: este alu- no possui uma dificuldade específica ou ge- neralizada? Certamente, a dificuldade deste aluno é do tipo específica, restringindo-se às atividades e conceitos escolares, não afetando as suas atividades cotidianas e, portanto, não se caracterizando como um distúrbio da aprendizagem. Geralmente, a dificuldade de aprendizagem generalizada é associada ao déficit cogniti- vo que algumas crianças possuem em vista de alguma deficiência orgânica, transtorno global do desenvolvimento ou algum ou- tro tipo de doença que afeta suas possibi- lidades cognitivas. Portanto, o distúrbio da aprendizagem só pode ser considerado a partir da dificuldade generalizada de apren- dizado, e nunca a partir de uma dificuldade específica. Saber caracterizar os tipos de dificuldade de aprendizagem é importante para que você, profissional, realize uma avaliação adequa- da e estabeleça planos deintervenção que favoreçam o desenvolvimento pleno do alu- no. Entretanto, apesar da diferença entre Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas42/184 os tipos de dificuldade de aprendizagem, a conduta profissional sempre será múltipla, envolvendo um trabalho com o aluno, com a escola e com a família. Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas43/184 Glossário Realidade material: é aquilo que consigo sentir, ver ou tocar. Realidade simbólica: é aquela que meus sentidos não conseguem apreender, como os valores e ide- ologias que permeiam nossa cultural. Emoções positivas: são aquelas que causam certa sensação de bem-estar no sujeito, como a alegria, satisfação, felicidade etc. Psicoestimulantes: são drogas que ativam o sistema nervoso central, aumentando a atividade moto- ra e cognitiva, além de acentuar o estado de vigília, alerta e atenção do usuário. Questão reflexão ? para 44/184 Como você pode observar na leitura do texto, há uma di- ferença entre dificuldade e distúrbio de aprendizagem e neste sentido convidamos você a pensar em estratégias de ações para estes dois tipos de dificuldades de apren- dizagem. Como você planejaria uma intervenção envol- vendo um caso de dificuldade e um outro de distúrbio de aprendizagem? 45/184 Considerações Finais • Nem toda dificuldade de aprendizagem deve ser vista como um problema, uma vez que sua presença é importante e normal ao desenvolvimento humano. • O aprendizado ocorre nas interações sociais, portanto, na queixa de dificuldade de aprendiza- gem também é necessário considerar o contexto social no qual os processos de ensino-apren- dizagem são realizados. • A dificuldade de aprendizagem pode ser um distúrbio quando é generalizada, envolvendo to- dos os âmbitos sociais do sujeito, como família, escola, relacionamento com amigos e tarefas do dia a dia. • Na maioria das vezes a dificuldade de aprendizagem generalizada está associada a um quadro de deficiência cognitiva, transtorno global do desenvolvimento ou outro tipo de doença que afeta o funcionamento cognitivo. • Independentemente do tipo de dificuldade de aprendizagem (específica ou generalizada), é importante que o profissional englobe em seu processo de avaliação e intervenção todo o contexto social do aluno. Unidade 2 • Distúrbios da aprendizagem: características e problemas46/184 Referências CAPOVILLA, F. C.; VALLE, L. E. L. R. Neuropsicologia e aprendizagem. 3. ed. Ribeirão Preto: Novo Conceito, 2011. LEONARDO, N. S. T.; LEAL, Z. F. R. G.; ROSSATO, S. P. M. A naturalização das queixas escolares em periódicos científicos: contribuições da Psicologia Histórico-Cultural. Revista Quadrimestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional. v. 19, n. 1, p. 163-171, 2015. MOYSÉS, M. A. A.; COLLARES, C. A. L. Control y medicaliación de la infancia. Desidades, n. 1, p. 11-21, 2013. ROTTA, N. T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. S. Transtornos da aprendizagem: abordagem neurobio- lógica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2006. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. Organizadores Michael Cole et al. Tradução José Cipolla Neto, Luís Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. (Original publicado em 1935) ______. Obras escogidas II. Madrid: Vysor Aprendizaje y Ministerio de Cultura y Ciencia, 2001. (Original publicado em 1932) ______. Pensamento e linguagem. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991. (Original publicado em 1934). 47/184 1. Em relação à definição e caracterização dos problemas da aprendizagem há um consenso? a) Sim, existe apenas uma teoria científica para caracterizar os problemas da aprendizagem. b) Sim, principalmente em relação ao encaminhamento psicopedagógico. c) Não, sendo possível encontrar várias teorias distintas que explicam os problemas da apren- dizagem. d) Não, entretanto, tal cenário está mudando. e) Sim, principalmente na educação. Questão 1 48/184 2. O que é aprendizagem? Questão 2 a) É um processo orgânico. b) É a capacidade humana de apreender a realidade material e simbólica. c) É prestar atenção. d) É a capacidade do aluno em permanecer em silêncio na sala de aula. e) É tirar boas notas. 49/184 3. A dificuldade de aprendizagem torna-se um problema quando: Questão 3 a) É uma dificuldade generalizada, envolvendo vários âmbitos sociais do sujeito. b) O aluno não consegue alcançar a média necessária na escola. c) A família é culpabilizada. d) Associa-se a uma dificuldade cognitiva. e) Ocorre um problema escolar. 50/184 Questão 4 a) Uma análise do contexto familiar. b) Uma avaliação escolar. c) Uma avaliação neurológica. d) Uma avaliação afetiva. e) Uma avaliação contextualizada. 4. Na avaliação da dificuldade de aprendizagem, é importante realizar: 51/184 5. Quais são os dois tipos de dificuldade de aprendizagem? Questão 5 a) Geral e específica. b) Familiar e escolar. c) Afetiva e cognitiva. d) Individual e social. e) Ampla ou complexa. 52/184 Gabarito 1. Resposta: C. Atualmente há muitas teorias e áreas do conhecimento que visam explicar os pro- blemas da aprendizagem, não encontrando um consenso. 2. Resposta: B. A aprendizagem refere-se à capacidade hu- mana de apreender a realidade em que se vive. 3. Resposta: A. A dificuldade de aprendizagem só pode ser considerada como um problema a partir da dificuldade generalizada. 4. Resposta: E. Na avaliação da dificuldade de aprendiza- gem, é importante realizar uma avaliação contextualizada que leve em consideração o contexto escolar, familiar, social e indivi- dual de cada aluno. 5. Resposta: A. Há dois tipos de dificuldade de aprendiza- gem, a específica e a geral, sendo que esta última se refere a um déficit de aprendiza- gem. 53/184 Unidade 3 O TDAH e suas possibilidades de intervenção Objetivos • Caracterizar o TDAH. • Problematizar as causas e linhas de tratamento do TDAH. • Destacar a importância da construção de outros modos de compreender o TDAH. • Favorecer a reflexão sobre possibilidades de intervenção. Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção54/184 Introdução Na história do Transtorno do Déficit de Aten- ção com Hiperatividade (TDAH) muitas são as teorias que buscam explicar suas causas e seu tratamento. Via de regra, o enfoque maior são suas alterações orgânicas, expli- cadas pelo olhar neurológico, colocando em demanda a necessidade de outras áreas do conhecimento também se posicionarem a respeito deste problema. Portanto, é funda- mental olhar o TDAH a partir de várias óti- cas, dispondo-se a compreender este pro- blema pela conduta multiprofissional (CA- POVILLA; VALLE, 2011; ROTTA, OHLWEILER; RIESGO, 2006). 1. Em busca da compreensão do TDAH Segundo a Associação Brasileira do Défi- cit de Atenção (ABDA), o TDAH tem como principal causa alterações neurobiológicas que podem afetar o desenvolvimento da pessoa por toda a vida. Há estudos que buscam comprovar que o TDAH afeta algumas regiões do cérebro em Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção55/184 especial a região frontal, responsável pela regulação do comportamento, principal- mente no que se refere ao controle da aten- ção, memória, autocontrole, planejamen- to e organização. Estes estudos também apontam para a existência de várias teorias que buscam explicar a causa do TDAH, apre- sentando diferentes fontes do problema: questões hereditárias, substâncias ingeri- das durante a gravidez, fatores ambientais e orgânicos que levaram a sofrimento fetal, exposição ao chumbo, entre outras causas (ABDA, 2017). Não obstante, a ABDA descreve no TDAH a presença de alguns sintomas como: desa- tenção, inquietude e impulsividade, sobre- tudo no contexto escolar. Na maioria das vezes, o TDAH é pensado como hipótese diagnóstica em situações em que a crian- ça apresenta dificuldades na escola, prin-cipalmente no que se refere à capacidade de concentração nas atividades, resultando em um baixo desempenho escolar. Em adul- tos tal transtorno também pode estar pre- sente, entretanto, na maioria das vezes seu diagnóstico é realizado ainda na infância ou na adolescência, quando seu desempenho escolar é acompanhado de modo mais pró- ximo por educadores e pais. Estima-se que 3 a 5% das crianças no mundo são afetadas pelo TDAH. Em relação ao seu diagnóstico, não há ne- nhum exame específico que comprove sua existência, sendo realizado com base em al- guns indícios e exclusão de outras causas. A ABDA aponta que somente o profissional Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção56/184 médico é habilitado para realizar o diagnós- tico do TDAH e sugere como principal via de tratamento a utilização de medicamentos. A partir destas informações, cabe reali- zar alguns questionamentos: por que atri- buir somente problemas de ordem biológi- ca como causa do TDAH? Qual o papel da sociedade, da educação, neste processo? Como o profissional médico saberá diferen- ciar um problema escolar de um problema neurobiológico já que não existe um exame específico para o diagnóstico? Qual o posi- cionamento de áreas como a pedagogia e a psicologia que estudam os processos de aprendizagem e desenvolvimento humano? Alguns pesquisadores (MOYSÉS; COLLA- RES, 2013) tanto do campo da medicina quanto da pedagogia têm questionado as afirmações hegemônicas sobre o TDAH, in- serindo outras possibilidades de compreen- são deste problema cada vez mais crescen- te. Para saber mais Maria Aparecida Affonso Moysés é medica e li- vre-docente em Pediatria. Atualmente é profes- sora titular em Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Nos últimos anos tem produzido mui- tos estudos científicos questionando o proces- so de patologização da vida e dos problemas de aprendizagem. Cecília Azevedo Lima Collares é pedagoga e livre- -docente em Psicologia Educacional. É profes- Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção57/184 Para você, profissional que trabalha com os processos de aprendizagem, seja profes- sor, gestor ou psicólogo, pouco sentido faz apresentar o enfoque neurológico do TDAH, sendo necessário pensar e discorrer sobre o que, no âmbito de sua prática profissio- nal, pode ser desenvolvido para melhorar as condições de aprendizagem de seu aluno ou paciente. Portanto, destacamos a impor- tância de uma compreensão para além da lógica médica (que visa buscar o problema, a doença e tratar com a utilização de medi- camentos ou intervenções cirúrgicas), que incorpore uma compreensão educacional do TDAH. Tal forma de compreender o TDAH consiste na construção de ideias que ofereçam sub- sídios para a prática de educadores e de- mais profissionais no geral, preocupando- -se muito mais com o “devir”, com as pos- sibilidades de desenvolvimento do sujeito. Neste sentido, muito mais importante do que questionar sobre as causas e consequ- ências do déficit de atenção, é pensar em caminhos para seu desenvolvimento. Como a atenção se desenvolve? Quais são as vias Para saber mais sora aposentada pela faculdade de Educação da UNICAMP. Sua produção científica volta-se prin- cipalmente para temas como fracasso escolar e medicalização dos processos de ensino-aprendi- zagem. Também é militante no movimento pela despatologização da vida. Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção58/184 ção, assunto que abordaremos a seguir. 2. O desenvolvimento da atenção e possibilidades de intervenção Segundo Vygotsky (1991b), a atenção é uma função psicológica que o sujeito possui ao nascer, são as condições biológicas neces- sárias para seu desenvolvimento. Portanto, a atenção só pode se desenvolver a partir de um arcabouço biológico que é próprio da espécie humana. Entretanto, a atenção no início da vida é muito volátil, sendo que na criança quanto menor sua idade maior é a dificuldade de permanecer atenta a algo. para sua potencialização? Portanto, nesta compreensão educacional o foco não é tan- to o déficit de atenção, mas, sim, o desen- volvimento da atenção. Entretanto, adiantamos que abordar o TDAH por este viés não é o caminho mais fácil, tampouco confortável, visto exigir empe- nho do profissional com o aluno, bem como o desenvolvimento de pensamentos criati- vos que possibilitem pensar em estratégias de ensino para encontrar a melhor forma de favorecer o desenvolvimento da atenção. Também, não é o caminho mais rápido, vis- to que as mudanças são lentas e demoram para ocorrer, porém não há dúvidas de que são as ações mais efetivas! Para isto, é importante que você compreen- da como ocorre o desenvolvimento da aten- Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção59/184 Com o processo de inserção na cultura, a criança aprende a significar o mundo, ou seja, cada vez mais consegue reconhecer e nomear os objetos, processo este que se dá em função do desenvolvimento da fala. Na criança, quanto maior sua capacidade de significar o mundo, maior será sua capa- cidade de regular a atenção, ou seja, maior será sua capacidade de manter-se atenta a uma determinada situação. Portanto, a capacidade de significação e o desenvolvi- mento da atenção estão interligados e são interdependentes (VYGOTSKY, 1991b). Para saber mais Para Vygotsky (1991a), é por meio da fala humana (que envolve a fala oral, gestual e a escrita) que o homem se apropria da cultura, ao mesmo tempo que também a produz. Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção60/184 Explicamos o que foi dito com um exemplo: imagine que você está assistindo a uma pa- lestra sobre determinado assunto e desco- nhece totalmente o idioma do palestrante e não há nenhum tipo de tradução. Prova- velmente, sua atenção nesta palestra não se sustentará nem por cinco minutos e ra- pidamente pensará em outros assuntos (na família, em seu emprego, em alguma tarefa que ficou pendente, por exemplo). Portanto, toda vez que você estiver dian- te de alguma situação que não consegue atribuir nenhum sentido e significado, sua atenção dificilmente será regulada. O in- verso também ocorre, imagine esta mesma palestra só que agora há uma pessoa que faz a tradução (ou seja, agora você conse- gue compreender o que está sendo dito), entretanto, o conteúdo abordado não lhe traz muitos conhecimentos novos, visto que a maioria já são de seu domínio. Também, nesta condição sua atenção não se manterá por muito tempo (BARBOSA, 2017). Então, Para saber mais A significação é o processo de atribuição de senti- dos e significados pelo sujeito a situações da vida ou a algum conhecimento. Os sentidos são da or- dem do privado, cada sujeito atribui um sentido único ao que vivencia. Já o significado é da ordem do público, refere-se à definição dicionarizada da palavra. Por exemplo: a palavra casa, todas as pes- soas vão saber descrever o que é uma casa (isto é o significado), entretanto cada pessoa atribuirá um sentido para esta palavra (afeto, medo etc.). Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção61/184 em quais situações a atenção permanece ativa? outra que é desconhecida (que não faz par- te da experiência do sujeito). Esta relação se apresenta como um conflito a ser vivido e superado pelo sujeito, visto a necessidade de transformar o desconhecido em conhe- cido. E é a partir do surgimento deste con- flito que a atenção permanece constante e se desenvolve cada vez mais (BARBOSA, 2017). Você lembra que no começo deste curso disse que no processo de aprendi- zagem muitas são as dificuldades vividas? Pois é, no processo de aprendizagem o su- jeito está em conflito o tempo todo. Portanto, isto permite dizer que a aten- ção ocorre a partir do vínculo que o sujei- to faz entre sua experiência (ou seja, aquilo que conhece) e o desconhecido, ou seja, é a consideração doconhecido que garante A atenção é mantida por um período mais longo quando há o equilibro entre os ele- mentos que o aluno conhece e aqueles que desconhece. Em outras palavras, nas inte- rações sociais em que a atenção está pre- sente há sempre uma parte que é conhecida (que faz parte da experiência do sujeito), e Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção62/184 o desconhecido como possibilidade, como “devir”. Vamos explicar com um exemplo: imagine que você está na mesma palestra que des- crevemos anteriormente, em que há um bom sistema de tradução e que agora mudou o assunto da palestra, sendo apresentado um tema do seu interesse e que traz muitos ele- mentos que até então eram desconhecidos por você. Agora, consegue compreender o que está sendo dito, há elementos que es- tão sendo aprendidos, e, por conseguinte, sua atenção permanecerá constante na pa- lestra toda. Assim, é na síntese entre o que faz parte de minha experiência (conhecido) com aquilo que ainda não experienciei (des- conhecido) que a atenção é desenvolvida e regulada. Tal concepção rompe com a ideia de que para produzir a atenção do aluno é neces- sário ficar no mundo dele, incorporando a necessidade de inserir elementos que o alu- no desconhece e que se relacionam de cer- ta forma com sua experiência, promovendo assim seu aprendizado. Diante desta exposição, o que você, como profissional, pode fazer para promover o de- senvolvimento da atenção de seu aluno/pa- ciente? A seguir trazemos algumas suges- tões que consideramos muito importantes: • Pensar em atividades que sejam do in- teresse do aluno/paciente. • Propor atividades que exigem a regu- lação da atenção de modo gradativo, respeitando sempre o limite de cada aluno. Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção63/184 • Estabelecer relações entre a vida do aluno/paciente e o conhecimento que será apresentado. • Na escola, utilizar estratégias diferen- ciadas de ensino. • Ouvir a opinião do aluno/paciente so- bre o conteúdo. • Sugerir ao aluno a apresentação de um seminário sobre determinado as- sunto. • Pedir que o aluno/paciente explique com suas palavras determinado as- sunto. Estes são apenas alguns encaminhamen- tos a serem pensados nas situações em que há a necessidade de desenvolvimento da atenção, mas que em sua prática poderão envolver outros que ajudem a potencializar o desenvolvimento da atenção no aluno/ paciente. Em uma escola havia um grupo de alunos que apresentavam a queixa de desatenção. A partir desta queixa foram realizados vários encontros de intervenção a fim de promover atividades que favorecessem o desenvolvi- mento da atenção desses alunos. Para isto, foram realizados encontros de contação e produção de histórias, trabalhados contos clássicos da literatura, sendo os preferidos pelos alunos os contos de Edgar Allan Poe e Clarice Lispector. As atividades de conta- ção de histórias eram organizadas a fim de despertar maior interesse nos alunos, orga- nizando a sala do seguinte modo: estendia- -se um pano no chão, sugerindo que os alu- Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção64/184 nos sentassem em círculo, colocava-se uma música de fundo e também apagavam-se as luzes. O envolvimento dos alunos com a intervenção surpreendeu toda a escola, principalmente pela capacidade de conse- guir prestar atenção em contos clássicos, narrados em muitas páginas, com certa di- ficuldade gramatical e densidade poética. Este é apenas um exemplo de uma ativida- de que se bem elaborada e planejada, com a intencionalidade de promover o interesse e a participação dos alunos, pode levar ao sucesso da aprendizagem e ao desenvolvi- mento da atenção. Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção65/184 Glossário Hegemonia: palavra utilizada para afirmar que determinada concepção é mais preponderante, possui um maior destaque e aceitação. Função psicológica: são todas aquelas funções que compõem e constituem o sistema psicológico, como: atenção, fala, imaginação, pensamento, emoção, entre outras. Cultura: refere-se a tudo aquilo que foi construído pelo homem, por exemplo: o conhecimento, as leis, os valores, as instituições sociais. Devir: processo permanente de vir a ser algo. Questão reflexão ? para 66/184 Você como profissional especializado em distúrbios da aprendizagem, qual atividade proporia para favorecer o desenvolvimento da atenção de alunos, tanto em aten- dimento individual quanto coletivo? 67/184 Considerações Finais • Necessidade de compreender o TDAH a partir de múltiplas concepções, não se limitando à vi- são biológica deste distúrbio. • Mais importante do que a caracterização do TDAH, é pensar em possibilidades de intervenção tanto em contextos institucionais, como na clínica. • Necessidade de buscar estratégias de desenvolvimento da atenção pela via da ampliação das possibilidades de significação. • Oferecer atividades que promovam o interesse e a participação dos alunos. • Pensar em estratégias diferenciadas para promover a aprendizagem. Unidade 3 • O TDAH e suas possibilidades de intervenção68/184 Referências ABDA. Associação Brasileira de Déficit de Atenção. Sobre o TDAH. Disponível em: <http://www. tdah.org.br/>. Acesso em: 20 abr. 2017. BARBOSA, Eveline Tonelotto. Os “donos da imaginação”: a contação e produção de histórias promovendo o interesse e a participação de adolescentes em atividades escolares. Tese (Douto- rado em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Ciências da Vida, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Campinas, 2017. CAPOVILLA, F. C.; VALLE, L. E. L. R. Neuropsicologia e aprendizagem. 3. ed. Ribeirão Preto: Novo Conceito, 2011. MOYSÉS, M. A. A.; COLLARES, C. A. L. Control y medicaliación de la infancia. Desidades, n. 1, p. 11-21, 2013. ROTTA, N. T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. S. Transtornos da aprendizagem: abordagem neurobio- lógica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2006. VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991a. ______. Obras escogidas I. Madrid: Vysor Aprendizaje y Ministerio de Cultura y Ciencia, 1991b. 69/184 1. Segundo a Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), o TDAH é resultado de uma alteração: a) Ambiental. b) Afetiva. c) Neurobiológica. d) Intelectual. e) Social. Questão 1 70/184 2. Quais são as principais características do TDAH? a) Desmotivação, atenção e concentração. b) Agressividade, fraqueza e retardo no desenvolvimento motor. c) Desatenção, inquietude e impulsividade. d) Desinteresse pela escola, impulsividade e bom desempenho nos estudos. e) Agressividade, desatenção e desmotivação. Questão 2 71/184 3. Em relação ao diagnóstico do TDAH, ele é realizado nas seguintes condi- ções: Questão 3 a) Não há um exame específico, sendo que seu diagnóstico é realizado com base na exclusão de outras causas. b) A partir de um exame específico realizado por um médico. c) A partir da aplicação de um teste psicológico. d) Atualmente há vários exames neurológicos que favorecem o diagnóstico preciso do TDAH. e) A partir de uma avaliação socioeconômica. 72/184 4. O desenvolvimento da atenção está relacionado: Questão 4 a) Ao nível socioeconômico. b) À vontade. c) Ao estímulo sensorial. d) Ao desenvolvimento afetivo. e) À capacidade de significação. 73/184 5. Em relação ao TDAH, é mais importante: Questão 5 a) Realizar seu diagnóstico. b) Buscar estratégias a fim de promover o desenvolvimento da atenção. c) Conversar com a família. d) Utilizar medicamentos. e) Realizar exames. 74/184 Gabarito 1. Resposta: C. A ABDA concebe os problemas envolvidos no TDAH como causa neurobiológica, a partir de algu- mas evidências científicas que ainda não possuem um consenso na literatura científica. 2. Resposta: C. Segundo a definição da ABDA (2017), as principais características do TDAH são desatenção, in- quietude e impulsividade, principalmenteno contexto escolar. 3. Resposta: A. Ainda não há um consenso na literatura sobre a forma de realizar o diagnóstico do TDAH, sendo que seu diagnóstico é considerado como hipótese a partir da exclusão de outras causas, como ambiental, pedagógica etc. 4. Resposta: E. A atenção é desenvolvida na relação com o processo de significação, ou seja, quanto mais o su- jeito conhece o mundo, atribuindo sentidos e significados, maiores serão suas possibilidades de regulação da atenção. 75/184 5. Resposta: B. Vários estudos apontam que é necessário a superação de práticas que visam apenas diagnos- ticar os problemas, colocando-se a necessidade de pensar em intervenções que promovam sua superação, no caso do TDAH em práticas que promovam o desenvolvimento da atenção. Gabarito 76/184 Unidade 4 A dislexia e suas possibilidades de intervenção Objetivos • Caracterizar a dislexia. • Discorrer sobre as dificuldades e limitações em relação ao diagnóstico de dislexia. • Favorecer uma reflexão sobre os processos de ensino da leitura e da escrita. • Descrever como ocorre o processo de desenvolvimento da leitura e da escrita. • Apontar estratégias de atuação profissional para trabalhar com problemas de leitura e es- crita. Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção77/184 Introdução A dislexia é um tipo de transtorno da apren- dizagem que afeta principalmente as habi- lidades de leitura e escrita, dificultando, na maioria das vezes, o processo de escolariza- ção. Entretanto, muitas são as ações pos- síveis para superar este tipo de problema, despertando a necessidade de criar novas práticas de alfabetização e de estímulo à leitura e à escrita. Para além das questões neurobiológicas que sustentam as causas da dislexia, é importante pensar e repensar os modos como a escola habitualmente vem trabalhando com os processos de leitura e escrita, a fim de pensar em novas práticas para superar este problema que é cada vez mais frequente, em especial em relação aos alunos que frequentam o ensino público. 1. Em busca da compreensão da dislexia Segundo a Associação Brasileira de Disle- xia (ABD), a dislexia trata-se de um distúr- bio de aprendizagem que tem como origem fatores neurobiológicos, que acarretam di- ficuldade em reconhecer de modo preciso a palavra, sobretudo, em sua decodificação e soletração. Tal transtorno afeta o compo- nente fonológico da fala, dificultando o re- conhecimento e diferenciação de algumas letras. Neste sentido, a dislexia pode resul- tar dificuldades com a leitura e a escrita. Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção78/184 Entretanto, para a realização do diagnósti- co de dislexia, é necessário que a criança já tenha sido alfabetizada, visto que os sinto- mas característicos da dislexia são comuns em pessoas que estão em processo de alfa- betização. Segundo a ABD, na idade escolar, quan- do o diagnóstico da dislexia se torna mais aceitável perante a literatura, comumente a criança ou adolescente apresenta os se- guintes sinais: • Dificuldade na leitura e escrita. • Problema no conhecimento de sons iguais no final e início das palavras. • Desatenção e dispersão em ativida- des de leitura e escrita. • Troca de algumas letras na escrita. • Dificuldade em cópia de textos. • Dificuldade na coordenação motora. • Confusão para identificar direções como esquerda e direita. • Dificuldade em manusear dicionários, mapas etc. • Vocabulário pouco desenvolvido. Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção79/184 A dislexia é um diagnóstico bastante co- nhecido e utilizado para justificar os proble- mas em relação ao desenvolvimento da lei- tura e da escrita. Entretanto, é importante considerar que nem todos os problemas em relação à leitura e à escrita remetem a um quadro patológico, visto que muitas pes- soas em processo de apropriação da leitu- ra e escrita ou que foram mal alfabetizadas apresentam as mesmas características des- critas pela ABD. Estudos e avaliações nacionais apontam para um percentual significativo de pesso- as com dificuldades em relação à leitura e à escrita, em especial aqueles provenien- tes de escolas públicas. Isto é tão verdade que cada vez mais aumenta o número dos chamados analfabetos funcionais, que são aquelas pessoas que passaram pelo proces- so de escolarização, mas que possuem mui- tas dificuldades em relação à leitura e, por conseguinte, na escrita (MARSIGLIA; SA- VIANI, 2017; SILVIA; TULESKI, 2014, SCOZ, 1994). Assim, cabe o seguinte questiona- mento: como pensar que aquelas pessoas que estão em processo de escolarização (ou que já concluíram) não possuem o domínio da leitura e da escrita por um problema in- dividual? Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção80/184 Portanto, alguns estudos (MARSIGLIA; SA- VIANI, 2017; SILVIA; TULESKI, 2014) vão de- fender que os problemas relacionados à di- ficuldade de aprendizagem, como o caso da dislexia, são considerados muito mais pro- blemas de escolarização ou ensino do que individuais. Tal afirmação é comprovada pe- los vários casos de problemas de aprendiza- gem que são superados com uma eficiente intervenção pedagógica. Assim, é muito importante que você, pro- fissional, faça uma avaliação bastante cui- dadosa sobre as reais causas da dificuldade de leitura e escrita, buscando considerar o modo como o aluno foi ou está sendo alfa- betizado, seu contexto social e familiar. Além disto, é importante considerar que as dificuldades que caracterizam a dislexia são passíveis de serem superadas, uma vez que não há um comprometimento do siste- ma cognitivo da pessoa. Atualmente, temos vários gênios da nossa história que quando crianças apresentaram um quadro bastante próximo à dislexia, por exemplo, Albert Eins- tein, pai da Teoria da Relatividade e um dos Para saber mais O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) é uma avaliação bienal que avalia o desempenho de estudantes, sendo que em seus resultados demonstram pouca melhora no de- sempenho de estudantes ao longo dos últimos 15 anos na disciplina de Língua Portuguesa, em que a prática da leitura e da escrita é exigida de modo mais intenso. Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção81/184 maiores intelectuais da nossa história, que começou tarde a falar e foi alfabetizado so- mente por volta dos nove anos, apresentan- do inúmeras dificuldades em seu processo inicial de escolarização. Então, para que as dificuldades em relação à leitura e à escrita sejam superadas, é im- portante compreender como ocorre o de- senvolvimento da leitura e da escrita, tema este que será abordado a seguir. 2. O desenvolvimento da leitura e da escrita Segundo Vygotsky (1991), a fala é o que ca- racteriza o homem como um ser social, visto que é por meio dela que se constrói a histó- ria, os valores, o conhecimento, ao mesmo tempo em que também nos apropriamos destes elementos que passam a nos cons- tituir. É por meio das diversas formas de re- gistros (desenho, escrita) que temos acesso ao que aconteceu no passado, na história da humanidade, e é em função deles que conseguimos nos apropriar dos aconteci- mentos de determinada época ou período histórico. Este conhecimento regulará as ações e o modo de pensar sobre si e a rea- lidade. Por exemplo, é o meu conhecimento sobre os valores da sociedade socialista ou capitalista que me fará questionar e pensar sobre os modos de vida da sociedade atual. Para saber mais Entende-se por fala qualquer forma de lingua- gem, como a oral, a escrita, a gestual. Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção82/184 Vygotsky (1991) vai destacar que a fala e o pensamento se constituem mutuamente, uma vez que não é possível falar sem pen- samento e pensar sem a fala. Faça um exer- cício você mesmo tentando pensar em algo sem ser por meio da palavra. Dificilmente isto será possível. Entretanto, ao longo do desenvolvimentonem sempre pensamento e fala estão liga- dos. Aproximadamente antes dos dois anos de idade, fala e pensamento são funções que percorrem separadamente, isto porque muitas vezes a criança aprende a falar por meio da repetição de palavras, sem se apro- priar de seu significado (ou seja, sem a pre- sença do pensamento). Este é um primei- ro nível de aprendizado da fala, que ocorre pela repetição, pela cópia, para só depois a criança ser capaz de apropriar o significa- do. Um exemplo é a criança bem pequena que aprende a falar a palavra “não” e para várias situações utiliza esta palavra. Neste caso, será pela repetição da palavra, inse- rida em um contexto social (com a ajuda de outras pessoas de seu convívio) que a crian- ça irá se apropriar do significado da palavra. No momento em que a criança for capaz de compreender as palavras, não somente re- peti-las, é porque pensamento e fala estão interligados, processo este que ocorre apro- ximadamente a partir dos dois anos de ida- de. Após esta ligação entre pensamento e fala, um passa a constituir o outro e devem caminhar juntos no processo de desenvol- vimento. Compreender a importância da ligação en- Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção83/184 tre fala e pensamento leva a questionar as práticas escolares que muitas vezes se pau- tam na repetição, na cópia de textos da lou- sa, por exemplo, sem exigir a atuação do pensamento, da reflexão. Este tipo de prá- tica não favorece o processo de aprendiza- gem, em especial no que se refere aos pro- cessos de leitura e escrita. Nos processos de aprendizagem da leitu- ra e escrita, é importante que o aluno não apenas aprenda a repetir as palavras, co- piando-as de modo repetitivo ou lendo de modo mecânico. É necessário a atuação do pensamento, em que o aluno seja capaz de pensar sobre o que está lendo e escrevendo. Portanto, para além da repetição das pala- vras, o aluno deve compreendê-las, proces- so este que exige a mediação de um profis- sional qualificado. Diferentemente da fala oral que é apreen- dida nas práticas sociais, a escrita depende de uma ação intencional, pedagógica, para seu desenvolvimento. Tal apropriação exige um grande esforço tanto por parte do alu- no quanto do profissional que precisará re- correr a diversas estratégias para ensiná-lo (VYGOTSKY, 2007). Na apropriação da escrita e da leitura, é importante superar a concepção de que se trata de um processo linear, constante e ir- reversível, ou seja, que o aprendizado da leitura e escrita uma vez alcançado perma- necerá para sempre nesta mesma condição. As habilidades da leitura e escrita percor- rem um longo processo de dificuldades que deverão ser superadas, uma vez que se am- Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção84/184 plia a complexidade dos conceitos (VYGOT- SKY, 2007). SKY, 2007). Para que me servem a leitura e a escrita? Qual a diferença de assistir a um fil- me e ler um livro de história? O mesmo vale para a escrita: por que preciso me comuni- car sem ser pela fala oral? Qual a função da escrita? Estas são questões que precisam ser trabalhadas e focalizadas no processo de alfabetização. Portanto, a escola precisa oferecer um es- paço para os alunos exercitarem a escrita e a leitura, focalizando especialmente em temas que sejam do interesse deles. Via de regra, a escola trabalha com temas prontos, fechados, de escrita, o mesmo ocorre com a leitura, oferecendo obras que são determi- nadas previamente. Claro que há algumas obras clássicas que precisam ser socializa- das no processo de escolarização, entre- Para saber mais As habilidades de escrita e leitura acontecem muito antes da criança aprender a escrever e a ler suas primeiras palavras. Por exemplo, em relação à escrita, sua origem está nos gestos, nos rabiscos e desenhos das crianças. Para Vygotsky (2007), a criança primeiro aprende a desenhar coisas para depois aprender a desenhar palavras. A leitura e a escrita só são desenvolvidas a partir da necessidade da criança. Neste sentido, a criança deve ter alguma necessi- dade para se apropriar da escrita, existindo alguma relevância para sua vida (VYGOT- Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção85/184 tanto, é importante também considerar os interesses de leitura dos alunos e contem- plá-los nas práticas de ensino. Isto porque, no processo de leitura e escrita, o aluno es- tabelecerá muitas relações com sua vida e o interesse pela leitura e a escrita será desen- volvido. Marsiglia e Saviani (2017) destacam a im- portância de criar um espaço estético para o conhecimento, o que significa pensar em situações diferenciadas para conduzir as atividades de leitura e escrita. Há várias es- tratégias para desenvolver essas ativida- des, tais como modificações na sala (como apagar as luzes, sentar em roda no chão, colocar música de fundo) ou até mesmo ir a outros espaços da escola, além disso, po- de-se sugerir que os alunos criem suas his- tórias, sem oferecer um tema específico, e que após vários momentos de correção e reescrita, com ajuda da professora de Lín- gua Portuguesa as histórias que forem cria- das pelos alunos sejam organizadas em um livro. Dessa forma, é possível que a relação desses alunos com o processo de leitura e escrita surpreenda a toda a escola e tenham bons resultados. Estes são somente alguns exemplos de prática que podem ser pen- sados e desenvolvidos, a fim de promover o interesse e a participação em atividades de leitura e escrita. Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção86/184 Entretanto, considero também que há casos em que a dificuldade de leitura e escrita exige um atendimento mais individualizado e o acompanhamento de outros profissionais, como fonoau- diólogo, psicólogo ou psicopedagogo. Portanto, a atuação multiprofissional é necessária e im- portante para superar este problema (ROTTA; OHWEILER; RIESGO, 2006). Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção87/184 Glossário Decodificação: ação de interpretação da palavra. Soletração: pronúncia de letras, sílabas e palavras. Estético: refere-se à forma como o conhecimento é trabalhado. Questão reflexão ? para 88/184 Você como profissional que possui um conhecimento sobre problemas e distúrbios de aprendizagem, qual atividade faria em sala de aula (caso seja professor) ou sugeriria para a escola (caso seja um profissional clínico) para favorecer o interesse e a participação de alunos em atividades de leitura e escrita? 89/184 Considerações Finais • Importância de uma avalição cuidadosa em relação ao diagnóstico da dis- lexia. • Necessidade de conhecer o contexto e histórico escolar do aluno/paciente, a fim de não tratar um problema de alfabetização como um distúrbio indi- vidual, orgânico. • Necessidade de pensar em práticas que favoreçam o interesse e a participa- ção em atividades de leitura e escrita. • Em casos mais específicos, em que há uma necessidade de um trabalho mais individualizado, considerar a importância de um trabalho multiprofissional, envolvendo: fonoaudiólogo, psicólogo, psicopedagogo, entre outros. Unidade 4 • A dislexia e suas possibilidades de intervenção90/184 Referências MARSIGLIA, A. C. G.; SAVIANI, D. Práticas pedagógicas alfabetizadoras à luz da psicologia histó- rico-cultural e da pedagogia histórico-crítica. Psicologia em Estudos, 22 (1), p. 3-13, 2017. ROTTA, N. T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. S. Transtornos da aprendizagem: abordagem neurobio- lógica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2006. SCOZ, B. Psicopedagogia e realidade escolar: o problema escolar e de aprendizagem. Petrópo- lis, RJ: Vozes, 1994. SILVIA, M. A. S.; TULESKI, S. C. Dificuldades de aprendizagem em cena: o que o cinema e a psico- logia histórico-cultural têm a dizer sobre a dislexia. Interfaces da Educação, 5(14), p. 177-199, 2014. VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991. ______.
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