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Ponto 2 PE

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Disciplina:
Profª Drª Michelle Dias Bublitz
PONTO 2 PE
DEFINIÇÃO DE RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO:
A relação jurídica de consumo pode ser definida como aquela relação firmada entre consumidor e fornecedor, a qual
possui como objeto a aquisição ou utilização de um produto ou a contratação de um serviço.
Sobre o tema, sobreleva notar que a opção adotada pelo legislador pátrio foi no sentido de não definir relação
jurídica de consumo no Código de Defesa do Consumidor, mas de conceituar os elementos dessa relação, ou seja,
trouxe apenas as definições de consumidor e de fornecedor (sujeitos da relação), assim como de produto e de
serviço (objetos da relação).
Com efeito, importante a observação de Bruno Miragem no sentido de que consumidor e fornecedor, além de
produto ou serviço, são “conceitos relacionais e dependentes”, ou seja, “só existirá um consumidor se também existir
um fornecedor, bem como um produto ou serviço”.
De fato, os conceitos em apreço não se sustentam por si mesmos, nem podem ser considerados isoladamente. As
definições estão atreladas umas nas outras, necessitando da presença de ambas para ensejar a aplicação do
Diploma Consumerista.
ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO:
De forma mais aprofundada, Nelson Nery Jr.* fala na existência de 3 (três) elementos da relação jurídica de
consumo:
▪ Subjetiva
▪ Objetiva
▪ Teleológico ou finalístico
Os elementos subjetivos consistem nos sujeitos da relação de consumo: consumidor e fornecedor.
Já os elementos objetivos são os objetos perante os quais recaem os interesses dos fornecedores em aliená‐los e
dos consumidores em adquiri‐los ou contratá‐los. São eles: produtos e serviços.
O elemento teleológico ou finalístico da relação de consumo nada mais é do que a finalidade com a qual o
consumidor adquire produtos ou contrata serviço, qual seja: a de destinatário final.
* Ver: GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de V.; FINK, Daniel Roberto; FILOMENO, José Geraldo Brito; NERY JR., Nelson; DENARI, Zelmo. Código
Brasileiro de Defesa do Consumidor. p. 555
CONSUMIDOR COMO SUJEITO DA RELAÇÃO DE CONSUMO:
O diploma consumerista trouxe quatro definições de consumidor, sendo que três delas retratam o denominado
consumidor por equiparação*. Iniciaremos os trabalhos sobre o tema com a análise de consumidor em sentido
estrito (ou também chamado standard), ou seja, aquele que efetivamente adquire ou contrata um produto ou serviço,
conforme disposto no art. 2º do CDC:
Art. 2º, CDC. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final.
Numa análise inicial e despretensiosa da definição legal, podemos concluir rapidamente que:
▪ consumidores são as pessoas naturais ou jurídicas;
▪ consumidor é aquele que adquire produto ou contrata serviço;
▪ consumidor é também aquele que utiliza produto ou serviço;
▪ consumidor é o destinatário final do produto ou do serviço adquirido/ contratado no mercado de consumo.
* Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de
consumo (art. 2º, parágrafo único, CDC). “(...) equiparam-se aos consumidores, todas as vítimas do evento” (art. 17, CDC). As
pessoas determináveis ou não, expostas às práticas comerciais e contratuais abusivas (art. 29, CDC).
O tema mais controverso da definição anterior é saber como deve ser interpretada a qualificação de “destinatário
final” atribuída ao consumidor na sua identificação prevista pelo caput do art. 2º do CDC.
Consumidor em sentido estrito nos termos da Lei n. 8.078/90 é, portanto, o destinatário final. Desta forma,
representa verdadeiro desafio resolver este entrave em razão das distintas acepções que a expressão nos fornece.
Segundo Bruno Miragem, a respeito da qualificação “destinatário final” poderemos identificar:
“O destinatário fático, ou seja, aquele que ao realizar o ato de consumo (adquirir ou utilizar) retira o produto ou
serviço do mercado de consumo, usufruindo de modo definitivo sua utilidade. O destinatário fático e econômico do
produto ou serviço em questão. Neste último caso, é destinatário final por ter praticado ato de consumo e não pela
aquisição de insumos que posteriormente reempregará na atividade no mercado, transformando-os em outros
produtos ou aproveitando‐os no oferecimento de algum outro serviço.”
Da citação anteriormente colacionada, identificamos que a interpretação da expressão “destinatário final” irá interferir
diretamente no tema pessoa jurídica‐consumidora a ponto de saber se esta poderá valer‐se ou não dos direitos e
prerrogativas inerentes na lei tutelar do vulnerável na relação jurídica de consumo. Em contexto diametralmente
oposto, a pessoa jurídica não seria considerada destinatária final se a abrangência deste qualificativo exigisse, além
da destinação fática, o consumo efetivo do produto e do serviço (destinação econômica). Isto porque uma empresa
geralmente adquire um produto ou contrata um serviço para integrar a cadeia produtiva, ou seja, para produzir novos
bens ou serviços. Nesse sentido, sustenta Bruno Miragem que o conceito de consumidor deve ser interpretado a
partir de dois elementos: a) a aplicação do princípio da vulnerabilidade e; b) a destinação econômica não profissional
do produto ou do serviço. Claudia Lima Marques segue afirmando que “se presume que a pessoa física seja sempre
consumidora frente a um fornecedor e se permite que a pessoa jurídica vulnerável prove sua vulnerabilidade”.
O STJ firmou entendimento pautado na ideia de se enquadrar a pessoa jurídica como consumidora desde que
comprovada a sua vulnerabilidade, ou seja, tal posicionamento realiza o exame em concreto do conceito de
consumidor. Trata‐se do reconhecimento pela jurisprudência da pessoa jurídica como consumidora, desde que
comprovada sua fragilidade no caso concreto, tratada pelo STJ como aplicação da teoria finalista, porém de forma
atenuada, mitigada ou aprofundada, seguindo ensinamentos de Cláudia Lima Marques quanto ao denominado
finalismo aprofundado (slide 22, aula 31/08/2020). Tal contexto é muito recorrente às relações envolvendo
microempresas, empresas de pequeno porte, profissionais liberais, profissionais autônomos, dentre outros.
Sobre o tema, destaca‐se que a vulnerabilidade não é atributo exclusivo do consumidor pessoa física, mas atinge
também pessoas jurídicas, oportunidade em que poderão ser consideradas consumidoras por equiparação nos
termos do art. 29 do CDC.
Como forma de exemplificar a pessoa jurídica enquanto consumidora, segue:
▪ as empresas que adquirem computador para realização de suas atividades;
▪ o agricultor que adquire adubo para o preparo do plantio;
▪ a aquisição de um software para o exercício profissional da advocacia.
Interessante, também, trazer ao conhecimento a doutrina de Rizzatto Nunes que leva em conta mais um elemento
na identificação da incidência ou não do CDC na relação jurídica, qual seja: a diferenciação entre bens de consumo
(adquiridos como destinatário final) e bens de produção (adquiridos para integrar a cadeia produtiva).
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEGURO EMPRESARIAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO
DO ÔNUS DA PROVA. POSSIBILIDADE. PESSOA JURÍDICA. TEORIA FINALISTA MITIGADA. Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da decisão
proferida pela magistrada a quo, que afastou a aplicação do CDC, com determinação de incidência do artigo 373, I, do CCB, cabendo a parte autora a prova dos fatos
constitutivos do direito. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos contratos de seguro, na medida em que se trata de relação de consumo, consoante traduz o
artigo 2º, §único do CDC. Ainda que de forma excepcional, mostra-se viável a incidência do CDC, à luz da Teoria Finalista Mitigada, quando
demonstrada a vulnerabilidade jurídica, técnica, fática ou informacional da pessoa jurídica. No caso em apreço, presente a vulnerabilidadetécnica da
parte agravante, é possível a aplicação do CDC, com a consequente inversão do ônus probatório. O STJ admite a mitigação do referido entendimento, a saber, quando
se possa verificar, in concreto, que, a despeito de tratar-se de pessoa jurídica, se possa constatar, em seu desfavor, alguma espécie de vulnerabilidade apta a ensejar a
incidência do CDC no âmbito da relação empresária: (a) vulnerabilidade técnica, atinente à ausência de conhecimento específico quanto ao produto ou serviço que
constitui o objeto da relação de consumo; (b) vulnerabilidade jurídica, relativamente à desinformação jurídica, econômica ou contábil, e aos seus reflexos, na relação de
consumo; (c) vulnerabilidade fática, concernente ao estado de submissão do consumidor ensejado por insuficiência de ordem física ou econômica; e (d) vulnerabilidade
informacional, referente à insuficiência de dados, por parte do consumidor, quanto ao produto ou serviço, que possua o condão de influir no processo decisório de
compra. A determinação de inversão do ônus probante, é medida que se impõe por força da incidência do estatuto consumerista, até mesmo porque tal determinação
sequer seria necessária tendo em vista que a ordem decorre de lei, nos termos do art. 6º , inciso VIII do CDC. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO(Agravo de
Instrumento, Nº 70081657033, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em: 15-08-2019)
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS AÇÃO REVISIONAL. APLICAÇÃO DO CDC E INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
RELAÇÃO DE CONSUMO. POSSIBILIDADE DE REVISAR CONTRATAÇÕES BANCÁRIAS. TEORIA FINALISTA. REGRA. MITIGAÇÃO. TEORIA DO FINALISMO
APROFUNDADO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. PRECEDENTES. De acordo com a teoria do finalismo aprofundado, também adotada pelo Colendo STJ, a
empresa pode ser considerada consumidora dos serviços prestados por instituição financeira, excepcionalmente, quando identificada
vulnerabilidade. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70081881708, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Guinther Spode, Julgado em: 07-08-2019)
Ementa: APELAÇÕES CÍVEIS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO PARA CAPITAL DE GIRO.
APELO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. - DESISTÊNCIA DO RECURSO. A parte recorrente pode, a qualquer tempo, desistir do recurso, mesmo sem a anuência do
recorrido, nos termos do art. 998 do CPC. Desistência do recurso homologada. APELO DA PARTE RÉ - APLICABILIDADE DO CDC. PESSOA JURÍDICA –
MICROEMPRESA. Conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, em regra, somente o destinatário final do produto,
assim entendido o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, retirando-o de forma definitiva do mercado de consumo, seja pessoa
física ou jurídica, é merecedor da proteção do CDC, excluindo-se, assim, o consumo intermediário, entendido como aquele cujo produto
retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (preço final) de um novo bem ou serviço. Todavia, a Corte Especial,
tomando por base o conceito de consumidor equiparado (art. 29 do CDC), vem admitindo uma aplicação mais flexível dessa definição de
destinatário final, em determinadas hipóteses, frente às pessoas jurídicas adquirentes de um produto ou serviço, equiparando-as à condição
de consumidoras, por apresentarem alguma vulnerabilidade em relação ao fornecedor (REsp nº 1.195.642-RJ). Na hipótese, considerando a
vulnerabilidade presumida do microempresário frente ao fornecedor do crédito, equipara-se ela a consumidor, fazendo jus à proteção do CDC, para fins de revisão dos
juros remuneratórios pactuados. - JUROS REMUNERATÓRIOS. A aplicação em taxa substancialmente superior à média de mercado divulgada pelo BACEN (30% acima,
conforme entendimento desta Câmara) é abusiva, sendo passível de limitação à referida taxa média. Na hipótese, não há abusividade dos juros pactuados. Desprovido
no ponto. - CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. É possível a capitalização dos juros em periodicidade inferior a um ano nos contratos celebrados após 31.03.2000, data da
publicação da MP nº 1.963-17/2000, (em vigor como MP nº 2.170-36/2001), desde que haja cláusula expressa nesse sentido ou, se ausente, na hipótese de ser a taxa de
juros anual contratada superior ao duodécuplo da mensal, quando será aplicada a efetiva taxa anual, que já contempla a capitalização mensal (REsp 973.827/RS). No
caso, embora não haja pactuação expressa, a taxa de juros anual contratada é superior ao duodécuplo da mensal. Desprovido no particular. - COMISSÃO DE
PERMANÊNCIA. Permitida a cobrança da comissão de permanência durante o período de inadimplemento, desde que expressamente pactuada, não cumulada com
correção monetária, juros remuneratórios, moratórios e multa, não podendo seu valor exceder a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato,
conforme Súmulas 30, 294, 296 e 472 do STJ. Na espécie, há previsão de incidência, todavia, cumulada com outros encargos moratórios (multa e juros de mora), os
quais devem ser afastados, permanecendo apenas a comissão como encargo moratório. Parcialmente provido no tópico. DESISTÊNCIA DO APELO DA INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA HOMOLOGADA. APELAÇÃO DA PARTE RÉ PARCIALMENTE PROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70080291735, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Cairo Roberto Rodrigues Madruga, Julgado em: 26-06-2019)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. COMPRA E VENDA DE MAQUINÁRIO. PRODUTOR RURAL.
INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. O artigo 2º do CDC traz a definição de consumidor como todo aquele que adquire o produto como
destinatário final, sem distinção entre pessoa física ou jurídica. Inaplicabilidade do CDC à espécie. Produtor rural que não se confunde com o
consumidor final quando adquire insumos a sua atividade produtiva. Mantida a sentença que afastou a responsabilidade solidária. NEGARAM
PROVIMENTO AO APELO E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO.(Apelação Cível, Nº 70078807146, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Glênio José Wasserstein Hekman, Julgado em: 14-08-2019)
FORNECEDOR COMO SUJEITO DA RELAÇÃO DE CONSUMO:
O diploma consumerista traz no caput do art. 3º CDC o conceito de fornecedor, que resumidamente podemos
identificar como sendo aquele que coloca produto ou presta serviço no mercado de consumo, segue:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação,
importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de
natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Importante observar que o fornecedor deve exercer atividade econômica, ou seja, colocar produto ou prestar serviço
no mercado de consumo, de forma profissional, habitual em sua atividade-fim e mediante contraprestação. (ver:
Agravo em Resp 1.963, STJ)
Percebe-se que, a legislação consumerista, indicou como fornecedores todos os partícipes da cadeia de
fornecimento, da produção até comercialização; não importando sua relação direta ou indireta, contratual ou
extracontratual, com o consumidor.
ELEMENTOS OBJETIVOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO:
▪ PRODUTO: Nos termos do art. 3º, § 1º, da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), produto é qualquer bem
móvel ou imóvel, material ou imaterial, colocado no mercado de consumo (mass consumption society). Como bem
demonstra Luiz Antonio Rizzatto Nunes, o Código de Defesa do Consumidor não adentrou na grande divergência existente
entre os civilistas, a respeitodos conceitos de bens e coisas, preferindo utilizar o termo produto. Apesar da pontuação do
jurista, constata-se que o CDC utilizou o termo bem, no sentido de ser uma coisa – algo que não é humano –, com interesse
econômico e/ou jurídico, construção que é seguida por este autor.
▪ De acordo com a Lei Consumerista, o produto pode ser um bem móvel ou imóvel, diferenciação clássica do Direito Privado,
que consta entre os arts. 79 e 84 do Código Civil brasileiro. O bem móvel é aquele que pode ser transportado sem prejuízo de
sua integridade, caso de um automóvel, que pode ser o conteúdo de uma relação de consumo, como na aquisição de
automóvel para uso próprio em uma concessionária de veículos, seja ele novo ou usado. Por outra via, o bem imóvel é aquele
cujo transporte ou remoção implica destruição ou deterioração considerável, hipótese de um apartamento, que, do mesmo
modo, pode ser o objeto de uma relação de consumo, como presente em negócios de incorporação imobiliária (nesse sentido: STJ
– REsp 334.829/DF – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 06.11.2001 – DJ 04.02.2002, p. 354).
▪ O produto pode ser um bem material (corpóreo ou tangível) ou imaterial (incorpóreo ou intangível). Como ilustração
do primeiro, vejam-se as hipóteses agora há pouco mencionadas, de aquisição do veículo e do apartamento. Como bem
imaterial, destaque-se o exemplo do lazer, que envolve uma plêiade de situações contemporâneas. De início, quanto ao lazer,
consigne-se a ilustração de Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery a respeito do jogo de futebol, com citação de
julgado do Tribunal Paulista nesse sentido. Não se olvide que o Estatuto de Defesa do Torcedor (Lei 10.671/2003) segue a
principiologia consumerista, enunciando o seu art. 40 que “A defesa dos interesses e direitos dos torcedores em juízo
observará, no que couber, a mesma disciplina da defesa dos consumidores em juízo de que trata o Título III da Lei 8.078, de
11 de setembro de 1990”. Ainda a título exemplificativo, seguindo a sistemática de subsunção do CDC: Ementa: RECURSO INOMINADO.
OBRIGACIONAL E RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSUMIDOR. ESTATUTO DO TORCEDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. FURTO DE
APARELHO CELULAR NA SAÍDA DE UM JOGO DE FUTEBOL. ENTIDADE DESPORTIVA. RÉ QUE DEMONSTROU TER AGIDO DE ACORDO COM AS REGRAS PREVISTAS NO
ESTATUTO DO TORCEDOR, A FIM DE ASSEGURAR A SEGURANÇA DOS TORCEDORES. AUTOR QUE DEVERIA TER MAIS ATENÇÃO AOS BENS QUE ESTAVAM DIRETAMENTE
SOB SUA VIGILÂNCIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO NÃO EVIDENCIADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. Narra a
parte autora que no dia 11/03/2018 estava no estádio do clube desportivo réu quando teve seu aparelho celular furtado. Sustenta que procurou ajuda junto ao posto da polícia civil e do
juizado especial, mas não obteve atendimento. Pugna pela condenação do réu ao pagamento de indenização por danos materiais e morais. 2. Sentença que julgou improcedente a ação.
3. O Estatuto do Torcedor, consubstanciado na lei 10.671/03, embora lei especial, propõe-se ao diálogo com o Direito do Consumo, de modo a
equiparar as entidades de desporto profissional à figura do fornecedor instituída pelo Código de Defesa do Consumidor. Como se vê do texto
dos artigos 3º e 14 da Lei n° 10.671/03, o Estatuto do Torcedor faz expressa remissão ao microssistema consumerista, equiparando a entidade
responsável pela organização da competição ao fornecedor. Precedente: Recurso Cível Nº 71002390987, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator:
Fabio Vieira Heerdt, Julgado em 24/06/2010. 4. Tem-se por serviço defeituoso aquele que não apresenta a segurança legitimamente esperada pelo consumidor (art. 14, § 1.º, do CDC).
No entanto, o autor não logrou comprovar a responsabilidade dos organizadores do evento desportivo pela alegada falha na segurança do estádio. E, por outro lado, a parte ré anexou
farta documentação evidenciando que providenciou todas as medidas de segurança exigidas pelo Estatuto do Torcedor, em seu art. 14, comunicando e solicitando ao Poder Público a
competente segurança, por meio de agentes públicos devidamente identificados. 5. Indiscutível que a responsabilidade pela segurança dos torcedores nestes eventos esportivos é dos
organizadores do evento, consoante dispõe o estatuto do torcedor, devendo resguardar, de forma eficiente, aqueles que no ambiente ingressam para a assistir ao espetáculo. Todavia,
não é por isso que os torcedores podem se descuidar da posse de seus bens. Sabe-se que o final das partidas, ainda mais de um denominado ‘jogo clássico’, enseja grande circulação e
aglomeração de pessoas, razão pela qual a atenção com os bens que estão sob a guarda direta dos consumidores deve se redobrada. 6. Assim sendo, não se evidencia a
responsabilidade do clube esportivo, pois, estando o aparelho celular sob a vigilância direta do autor, ainda mais levando em conta que a própria testemunha do demandante relatou que
o grupo de mulheres suspeito de furtar o celular esbarrou no autor “de forma não muito usual”, inviável imputar a responsabilidade pelo evento danoso ao clube. 7. Nestas condições,
verifica-se a aplicabilidade da excludente por inexistência do defeito na prestação do serviço, prevista no inciso I do parágrafo 3.º do artigo 14 do CDC. 8. Sentença mantida por seus
próprios fundamentos, a teor do art. 46, da Lei 9.099/95, aos quais se agregam aqueles esgrimidos no item 3, supra. RECURSO IMPROVIDO.(Recurso Cível, Nº 71008036774, Terceira
Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Fabio Vieira Heerdt, Julgado em: 21-02-2019)
▪ Cont. PRODUTO: Ainda a respeito do lazer, as casas noturnas e de espetáculos estão abrangidas pela Lei Consumerista,
conforme julgados a seguir, relativos às conhecidas agressões praticadas nos seus interiores: Ementa: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AGRESSÃO EM CASA NOTURNA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTABELECIMENTO E
SUBJETIVA DO AGRESSOR. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MAJORAÇÃO. I. A responsabilidade civil é a obrigação de
reparar o dano causado a alguém. Para ser caracterizada a responsabilidade civil subjetiva, nos termos do art. 927, do Código Civil, é necessária a
comprovação da ação (conduta comissiva ou omissiva), da culpa do agente, da existência do dano e do nexo de causalidade entre a ação e o dano. II. Em
relação à casa noturna, a hipótese dos autos trata de relação de consumo, sendo objetiva a responsabilidade do fornecedor de serviços, nos
termos do art. 14, caput, do CDC, ou seja, a parte requerida responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados ao
consumidor, bastando a comprovação do prejuízo e do nexo de causalidade. III. Com base no conjunto probatório dos autos, resta incontroverso que o
autor foi vítima de agressão pelo requerido Diego Gomes, que utilizou um garrafa de vidro, no interior do estabelecimento da ré “Estação Bangalô”. Nestas
circunstâncias, verifica-se que foi o demandado Diego quem iniciou a briga e agrediu fisicamente o autor com uma garrafada, não sendo demonstrado por este
nenhum fato que pudesse afastar a sua responsabilidade, como eventual legítima defesa. IV. No que concerne à responsabilidade da requerida, em se tratando
de casa noturna, local em que há consumo exacerbado de bebidas alcoólicas, não é improvável a ocorrência de discussões entre os presentes, sendo certo
que a venda de tais bebidas em garrafas de vidro acaba por aumentar o potencial de risco e de dano aos presentes no estabelecimento. Logo, é notório que a
demandada falhou na prestação do serviço, eis que não garantiu minimamente a segurança e proteção do seu cliente. Portanto, a requerida não comprovou
nenhuma excludente de responsabilidade, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, razão pela qual também deverá ser responsabilizada pelas agressões
suportadas pelo demandante na festa por ela realizada. V. Desta forma, a situação dos autos reflete o dano moral inre ipsa, considerando o transtorno, o
aborrecimento, o constrangimento e a lesão sofrida pelo autor. Majoração do quantum indenizatório, tendo em vista a condição social do autor e do réu Diego,
o potencial econômico da ré, a gravidade do fato, o caráter punitivo-pedagógico da reparação e os parâmetros adotados por esta Câmara em casos
semelhantes. A correção monetária pelo IGP-M incide a partir da data do presente arbitramento, nos termos da Súmula 362, do STJ. Em se tratando de relação
extracontratual, os juros moratórios devem incidir a partir do evento danoso, a teor da Súmula 54, do STJ. VI. Redimensionamento da sucumbência,
considerando o integral decaimento dos réus em suas pretensões. APELAÇÃO DO RÉU DESPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA.(Apelação Cível,
Nº 70081532871, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge André Pereira Gailhard, Julgado em: 28-08-2019)
▪ Cont. PRODUTO: Ainda a respeito do lazer, festas populares, do mesmo modo, estão abrangidas pela Lei 8.078/1990, pela
sistemática da questão do lazer. Assim, o caso dos rodeios, festas típicas do interior do País (TJMT – Apelação 69.465/2009, Várzea
Grande – Terceira Câmara Cível – Rel. Des. Evandro Stábile – j. 14.12.2009 – DJMT 13.01.2010, p. 11). Citem-se, nesse contexto, também, as festas
carnavalescas que são exploradas por profissionais da área, caso das micaretas, que são os carnavais fora de época e que
reproduzem o carnaval de Salvador, em que foliões acompanham os trios elétricos, dentro das cordas, e pagando pelos
abadás.
▪ A encerrar o presente tópico, atente-se ao fato de que os produtos digitais também podem ser englobados pela Lei Protetiva
do consumidor, caso de programas de computador ou softwares.
▪ Como decorrência natural da última forma de julgar, os produtos digitais vendidos pela internet também podem ser
enquadrados como elementos objetivos caracterizadores da relação jurídica de consumo.
✓ Classificação doutrinária:
- móvel ou imóvel
- material ou imaterial
- durável ou não durável
- descartável
- gratuito ou amostra grátis
CONT. ELEMENTOS OBJETIVOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO:
▪ SERVIÇO: Estabelece o art. 3º, § 2º, do CDC que o serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as
decorrentes das relações de caráter trabalhista.
▪ De início, cumpre esclarecer que, apesar de a lei mencionar expressamente a remuneração, dando um caráter oneroso ao
negócio, admite-se que o prestador tenha vantagens indiretas, sem que isso prejudique a qualificação da relação
consumerista. Como primeiro exemplo, invoca-se o caso do estacionamento gratuito em lojas, shoppings centers,
supermercados e afins, respondendo a empresa que é beneficiada pelo serviço, que serve como atrativo aos consumidores.
Dessa forma, concluindo pela presença de responsabilidades, da jurisprudência: Ementa: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE
REPARAÇÃO DE DANO MATERIAL E MORAL. FURTO EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 130 DO STJ. DEVER DE
INDENIZAR PELOS PREJUÍZOS. DANO MATERIAL PARCIALMENTE MAJORADO. DANOS MORAIS NÃO VERIFICADOS. 1. Hipótese em que o autor, ao
estacionar seu veículo no estacionamento do réu para realizar compras, teve o veículo furtado, sendo posteriormente localizado em via pública. 2. Prova produzida
que corrobora a tese lançada na inicial. 3. Dever de guarda e vigilância atribuída à ré, nos termos da Súmula 130 do STJ, que preceitua que A empresa responde,
perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento. 4. A indenização por dano material tem por objetivo repor perdas
sofridas pela vítima, ou seja, reparar os prejuízos decorrentes do ato ilícito. Assim, deve ser majorado o dano material para R$ 944,00(...). 5. Conclui-se, outrossim,
que não há motivos para determinar a reparação tanto dos bens furtados quanto dos novos adquiridos, pois, do contrário, caracterizaria enriquecimento indevido do
requerente. 6. Não restam configurados, in casu, os danos extrapatrimoniais, visto que não há provas de que os transtornos suportados pelo autor foram suficientes
para atingir seus direitos de personalidade. Assim, não sendo o caso de danos morais in re ipsa, estes somente restariam reconhecidos, caso o requerente lograsse
comprovar alguma excepcionalidade, o que não fez. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME.(Recurso Cível, Nº 71008238875, Segunda Turma Recursal
Cível, Turmas Recursais, Relator: Elaine Maria Canto da Fonseca, Julgado em: 28-08-2019)
CONT. ELEMENTOS OBJETIVOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO:
▪ SERVIÇO: Estabelece o art. 3º, § 2º, do CDC que o serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as
decorrentes das relações de caráter trabalhista.
▪ De início, cumpre esclarecer que, apesar de a lei mencionar expressamente a remuneração, dando um caráter oneroso ao
negócio, admite-se que o prestador tenha vantagens indiretas, sem que isso prejudique a qualificação da relação
consumerista. Como primeiro exemplo, invoca-se o caso do estacionamento gratuito em lojas, shoppings centers,
supermercados e afins, respondendo a empresa que é beneficiada pelo serviço, que serve como atrativo aos consumidores.
Dessa forma, concluindo pela presença de responsabilidades, da jurisprudência: Ementa: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE
REPARAÇÃO DE DANO MATERIAL E MORAL. FURTO EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 130 DO STJ. DEVER DE
INDENIZAR PELOS PREJUÍZOS. DANO MATERIAL PARCIALMENTE MAJORADO. DANOS MORAIS NÃO VERIFICADOS. 1. Hipótese em que o autor, ao
estacionar seu veículo no estacionamento do réu para realizar compras, teve o veículo furtado, sendo posteriormente localizado em via pública. 2. Prova produzida
que corrobora a tese lançada na inicial. 3. Dever de guarda e vigilância atribuída à ré, nos termos da Súmula 130 do STJ, que preceitua que A empresa responde,
perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento. 4. A indenização por dano material tem por objetivo repor perdas
sofridas pela vítima, ou seja, reparar os prejuízos decorrentes do ato ilícito. Assim, deve ser majorado o dano material para R$ 944,00(...). 5. Conclui-se, outrossim,
que não há motivos para determinar a reparação tanto dos bens furtados quanto dos novos adquiridos, pois, do contrário, caracterizaria enriquecimento indevido do
requerente. 6. Não restam configurados, in casu, os danos extrapatrimoniais, visto que não há provas de que os transtornos suportados pelo autor foram suficientes
para atingir seus direitos de personalidade. Assim, não sendo o caso de danos morais in re ipsa, estes somente restariam reconhecidos, caso o requerente lograsse
comprovar alguma excepcionalidade, o que não fez. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME.(Recurso Cível, Nº 71008238875, Segunda Turma Recursal
Cível, Turmas Recursais, Relator: Elaine Maria Canto da Fonseca, Julgado em: 28-08-2019)
▪ Também: “Civil. Apelação. Ação de indenização. Furto de motocicleta em supermercado. Responsabilidade civil da empresa configurada.
Dever de guarda e vigilância. Dano material. Arts. 14 e 29 do CDC. Aplicação. Indenização cabível. Súmula 130 do STJ. Dever de indenizar.
Responsabilidade civil do Estado. Não configuração. Recurso conhecido e não provido. O estabelecimento que permite, mesmo a título
gratuito, o estacionamento de veículo em seu pátio, tem responsabilidade pela guarda e vigilância do bem, e responde por qualquer dano
causado. Nos termos do art. 14 do CDC, o fornecedor de serviços ou de produtos responde para com o consumidor em caso de dano,
independentemente de culpa. A teor do art. 29 do CDC, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às
práticas nele previstas. O furto de veículo em estacionamento privativo de empresa gera a obrigação deindenizar conforme prevê a Súmula
130 do STJ. Não há como imputar ao Estado a responsabilidade por prejuízo sofrido pelo furto ocorrido em estacionamento privado de
supermercado. Recurso conhecido e não provido” (TJMG – Apelação Cível 1.0702.06.285022-8/0011, Uberlândia – Décima Sétima Câmara
Cível – Rel. Des. Márcia de Paoli Balbino – j. 24.04.2008 – DJEMG 09.05.2008). Caso de um motociclista que não adentrou ao
estabelecimento comercial, apenas utilizou o estacionamento. Não faz a jurisprudência distinção a respeito de ter
ou não o consumidor efetuado compras no local, havendo sempre a responsabilidade da empresa, nos termos da
Súmula 130 do STJ.
▪ Outro exemplo que envolve as vantagens indiretas ao prestador é o sistema de milhagens ou de pontuação em companhias
áreas, que igualmente serve como um atrativo aos consumidores, ou até mesmo como uma publicidade (nesse sentido: TJPE
– Apelação 0188732-5, Recife – Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Eduardo Augusto Paura Peres – j. 11.03.2010 – DJEPE
05.05.2010). Fornecendo amparo doutrinário a essa forma de pensar, na VI Jornada de Direito Civil, em 2013, foi aprovado o
Enunciado n. 559 do CJF/STJ, segundo o qual “no transporte aéreo, nacional e internacional, a responsabilidade do
transportador em relação aos passageiros gratuitos, que viajarem por cortesia, é objetiva, devendo atender à integral
reparação de danos patrimoniais e extrapatrimoniais”. A menção à reparação integral segue a linha defendida neste livro, de
afastar qualquer tarifação da indenização nas relações de consumo.
▪ Voltando à análise efetiva do conceito de serviço, a norma expressa que os serviços bancários, financeiros e de crédito são
abrangidos pela norma consumerista. Por isso, os contratos celebrados entre bancos e correntistas para administração e
transmissão de capitais financeiros são, em regra, de consumo, na esteira da Súmula 297 do STJ. Podem ser citados, assim,
os contratos de conta corrente, conta poupança, depósito bancário de quantias e bens, mútuo bancário, negócios de
investimentos, e outros.
▪ Consigne-se, no contexto de negócios financeiros contemporâneos, que o contrato de cartão de crédito também é abrangido
pela Lei 8.078/1990, nas relações entre o titular do cartão e a empresa que explora o serviço, surgindo uma quantidade
considerável de demandas relativas, principalmente, à responsabilidade civil, que ainda serão estudadas (ver, por exemplo: STJ –
REsp 1061500/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 04.11.2008 – DJe 20.11.2008; e STJ – REsp 81.269/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Castro Filho –
j. 08.05.2001 – DJ 25.06.2001, p. 150). Nas relações entre comerciantes e empresas de cartão de crédito, em regra e pela teoria
finalista, não há relação de consumo, uma vez que o serviço é contratado com os fins de facilitação da atuação dos primeiros
(STJ – REsp 910.799/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 24.08.2010 – DJe 12.11.2010). No caso de se tratar de comerciante de
pequeno porte, pode-se sustentar perfeitamente a incidência da teoria finalista aprofundada ou da teoria maximalista, na
esteira do que foi antes exposto. Indicação de leitura: Gerson Luiz Carlos Branco, “Sistema Contratual do Cartão de Crédito”
(1998).
▪ Voltando ao conteúdo do art. 3º, § 2º, do CDC, está expresso que os serviços securitários são abrangidos pela Lei Protetiva,
caso dos seguros em geral. Do mesmo modo, o contrato de seguro de vida.
▪ No tocante ao contrato de seguro-saúde, é clara a Súmula 469 do STJ, incidente para tais negócios: “Aplica-se o Código de
Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde”. Na mesma linha e com tom de ampliação, a Súmula 100 do Tribunal
de Justiça de São Paulo, do ano de 2013: “O contrato de plano/seguro saúde submete-se aos ditames do Código de Defesa
do Consumidor e da Lei n. 9.656/1998 ainda que a avença tenha sido celebrada antes da vigência desses diplomas legais”.
▪ Continuando no estudo da norma, estão excluídas as relações de caráter trabalhista, regidas pela legislação especial, no caso
a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Por tais relações são compreendidas as relações de emprego, com os elementos
que lhe são peculiares, como: a pessoalidade, a subordinação jurídica, a onerosidade, a habitualidade ou não eventualidade e
a alteridade. Sendo assim, imagine-se que um produto explode dentro de uma fábrica, vindo a atingir um de seus
empregados. Logicamente, o empregado demandará o empregador, e não o fabricante do produto, com base no acidente de
trabalho e não no acidente de consumo. Em suma, incide a CLT na situação descrita e não o CDC. Em outras palavras, o
protecionismo do empregado prevalece sobre o protecionismo do consumidor.
▪ Entretanto, deve ficar claro que o Código de Defesa do Consumidor incide sobre algumas relações de trabalho individual,
como na hipótese de um jardineiro, de um dentista, de um advogado, de um médico, de um empreiteiro, todos prestando
serviços eventuais. Em situações tais, é bem possível estarmos diante de uma relação de consumo que também é uma
relação de trabalho, e não necessariamente uma relação de emprego, diga-se de passagem. Imagine-se o singelo exemplo de
um jardineiro individual que presta seu serviço para alguém. O jardineiro é um trabalhador, sem ser um empregado. Na outra
ponta da relação há um consumidor, destinatário final de um produto ou serviço. Restam, então, duas dúvidas. Quem
merecerá proteção nessa hipótese? Qual a justiça competente para apreciar eventual dilema contratual entre as partes: a
Justiça do Trabalho ou a Justiça Comum Estadual?
Resposta: No caso descrito, sabe-se que ambos os envolvidos têm proteção constitucional. O consumidor está protegido no art. 5º, inc. XXXII,
da Constituição Federal, como antes exposto. Por outra via, o trabalhador – e não mais empregado – tem o amparo do art. 7º da Constituição,
alterado pela Emenda Constitucional 45/2004. Um consumerista diria que o direito do consumidor prevalece. Já um trabalhista afirmaria o
contrário, como se ouve quando a questão é levada a debate em ambientes diferenciados. Surge o grande dilema, eis que ambos os vulneráveis
têm o seu próprio princípio do protecionismo. Na hipótese descrita, acredita-se que a solução está na aplicação da técnica de ponderação,
fazendo-se um juízo de razoabilidade de acordo com o caso concreto. Há, assim, uma espécie de ponderação meritória, favorável à proteção que
deve prevalecer naquela situação concreta. Eis a solução para esse problema, que envolve um diálogo das fontes entre as normas consumeristas
e trabalhistas, sob o prisma constitucional, eis que tanto os consumidores quanto os trabalhadores estão protegidos pelo Texto Maior. Entende-se
que tais soluções devem ser adotadas também para a fixação da Justiça competente para apreciar a questão, de acordo com o pedido e a causa
de pedir (solução processual). Se quem merecer a proteção for o consumidor, a competência será da Justiça Comum Estadual, melhor habituada
com a principiologia consumerista. Caso contrário, a competência será da Justiça do Trabalho, até porque o art. 114, inc. I, da Constituição Federal,
alterado pela EC 45/2004, fixa a competência dessa justiça especializada para apreciar as ações oriundas da relação de trabalho. Houve clara
ampliação da competência, uma vez que não se menciona mais a relação de emprego, com aqueles elementos fixos e tradicionais já conhecidos.
▪ De toda sorte, tem prevalecido o entendimento de competência da Justiça Comum Estadual para os casos envolvendo
dilemas envolvendo profissionais liberais, notadamente cobrança de valores. Nessa linha, a Súmula 363 do STJ: “Compete à
Justiça estadual processar e julgar a ação de cobrança ajuizada por profissional liberal contra cliente”.
▪ A controvérsia envolve também a competência para cobrança de honorários advocatícios, sendo majoritária a tese de
competência, mais uma vez, da Justiça Comum.
▪ A encerrar o estudo do serviço abrangido pelo Código deDefesa do Consumidor, anote-se que os serviços oferecidos pela
internet também podem (e devem) ser objeto das relações de consumo. Aliás, há proposta de alteração da Lei 8.078/1990, em
curso no Congresso Nacional, para inclusão de dispositivos expressos nesse sentido, o que vem em boa hora, para que não
resista qualquer dúvida a respeito da questão (PLS 281/2012). O texto inicial do Projeto pretende, dentre outras alterações,
introduzir os arts. 44-A a 44-E ao CDC, incluindo a Seção VII ao Capítulo V (“Das Práticas Comerciais”), para tratar do
comércio eletrônico. Na mesma linha de incidência da Lei Consumerista para tais negócios, foi editado, em março de 2013, o
Decreto 7.962, que regulamenta a Lei 8.078/1990 para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico. A norma trata das
informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor; do atendimento facilitado ao consumidor e do respeito ao
direito de arrependimento em tais negócios digitais.
EXEMPLOS DE OUTRAS RELAÇÕES JURÍDICAS E O SEU 
ENQUADRAMENTO COMO RELAÇÕES DE CONSUMO:
▪ O CONTRATO DE TRANSPORTE E A INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR
▪ A INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR PARA OS CONTRATOS DE LOCAÇÃO URBANA
▪ PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS COMO SERVIÇO DE CONSUMO
▪ OS SERVIÇOS PÚBLICOS E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
▪ AS RELAÇÕES ENTRE ADVOGADOS E CLIENTES E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
CONTATOS:
Profª Michelle Dias Bublitz
email: michelle.bublitz@uniritter.edu.br
Michelle Bublitz michelle.bublitz
Ficou com 
alguma dúvida?

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