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Autores: Prof. Alexandre Torchio Dias Prof. Leslie Domenici Kulikowski Colaboradores: Prof. Flávio Buratti Gonçalves Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano Genética e Citogenética Humana Professores conteudistas: Alexandre Torchio Dias / Leslie Domenici Kulikowski © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) D541g Dias, Alexandre Torchio Genética e Citogenética Humana / Alexandre Torchio Dias, Leslie Domenici Kulikowski. – São Paulo: Editora Sol, 2022. 136 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Genoma. 2. Genética. 3. Doenças. I. Kulikowski, Leslie Domenici. II. Título. CDU 575 U514.57 – 22 Alexandre Torchio Dias É doutor em Ciências (Citogenômica) pelo Programa de Patologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP (2015); especialista em Administração Hospitalar pelo Instituto de Pesquisa e Educação em Saúde de São Paulo – Ipessp – Unicid (2011) e em Genética Médica e Citogenética pelo Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de São Paulo – Iamspe (2004); além de graduado em Ciências Biológicas – Modalidade Médica (bacharel em Biomedicina) pela Universidade de Mogi das Cruzes (2002). É pesquisador no Laboratório de Citogenômica do LIM 03 do Departamento de Patologia da FMUSP. Atua como pesquisador e orientador permanente no programa de Pós-graduação (mestrado e doutorado) no Iamspe com as seguintes linhas de pesquisa: Citogenômica e Epigenética; Genética Médica e Defeitos Congênitos; Influência da Arquitetura do Genoma nas Doenças Humanas. Na Universidade Paulista – UNIP, é coordenador auxiliar e professor titular do curso de Biomedicina, campus Tatuapé; COO da Omika Consultoria em Genética Ltda.; diretor do Departamento de Inovação e Genética da Testfy Diagnóstica Ltda.; é membro do Comitê de Patologia Molecular e Genômica da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial – SBPC/ML; da Sociedade Brasileira de Genética; da American Society of Human Genetics; do Conselho Consultivo da Casa Hunter e do Comitê de Ética da UNIP. É revisor dos periódicos Einstein Journal e Journal of Assisted Reproduction and Genetics. Leslie Domenici Kulikowski Possui livre-docência pelo Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (2018), doutorado e mestrado em Ciências (Morfologia e Genética) pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (2009), com aperfeiçoamento em Citogenética Molecular – Case Western Reserve University, School of Medicine, Cleveland, EUA (2003). É especialista em Biologia Molecular pela Universidade São Judas (2001), bacharel e licenciada em Ciências pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1999). É pesquisadora científica concursada dos Laboratórios de Investigação Médica – LIMs – pelo HC-FMUSP (2009) e professora e orientadora da Pós-graduação do Departamento de Patologia da FMUSP. É coordenadora do Laboratório de Citogenômica e Patologia Molecular. Atua em pesquisa e ensino nas seguintes áreas: Genética Médica; Citogenômica; Diagnóstico Citogenético-molecular; Arquitetura do Genoma: mapeamento e mecanismos de origem de desequilíbrios genômicos; Mapeamento do Metiloma. É membro da Comissão Científica dos LIMs HC-FMUSP, do Comitê de Inovação do HC-FMUSP, do Comitê de Ética em Pesquisa HC-FMUSP, da Sociedade Brasileira de Genética; da American Society of Human Genetics e da European Society of Human Genetics. Revisora ad hoc Fapesp e das seguintes revistas: American Journal of Medical Genetics; American Journal of Medical Genetics Part B; Neuropsychiatric Genetics; European Journal of Medical Genetics; Clinics; Molecular Cytogenetics; Reprodutive Sciences; Journal of Pediatrics; Genetic Testing and Mol Bio, entre outras. Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Profa. Sandra Miessa Reitora em Exercício Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez Vice-Reitora de Graduação Profa. Dra. Marina Ancona Lopez Soligo Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Claudia Meucci Andreatini Vice-Reitora de Administração Prof. Dr. Paschoal Laercio Armonia Vice-Reitor de Extensão Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades do Interior Unip Interativa Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático Comissão editorial: Profa. Dra. Christiane Mazur Doi Profa. Dra. Angélica L. Carlini Profa. Dra. Ronilda Ribeiro Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista Profa. Deise Alcantara Carreiro Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Vitor Andrade Giovanna Oliveira Sumário Genética e Citogenética Humana APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9 Unidade I 1 O GENOMA HUMANO: ESTRUTURA E FUNÇÕES DOS GENES ....................................................... 11 1.1 DNA e RNA: estruturas e funcionalidades ................................................................................. 11 1.2 O gene: sua estrutura básica e sua funcionalidade ............................................................... 14 1.3 O dogma central da biologia molecular ..................................................................................... 15 1.3.1 Replicação do DNA................................................................................................................................. 15 1.3.2 Transcrição e tradução ......................................................................................................................... 18 2 PADRÕES DE HERANÇAS MONOGÊNICAS ............................................................................................ 21 2.1 Doenças causadas por SNVs patogênicas .................................................................................. 28 2.1.1 Doenças autossômicas dominantes ................................................................................................ 29 2.1.2 Doenças autossômicas recessivas .................................................................................................... 30 2.1.3 Doenças ligadas ao X recessivo ......................................................................................................... 32 2.1.4 Doenças ligadas ao X dominante ..................................................................................................... 33 2.2 Outros padrões de herança e fatores que alteram o padrão de herança monogênica ........................................................................................................................... 34 3 GENÉTICA DE POPULAÇÕES: COMO ESTUDAR FREQUÊNCIAS GÊNICAS E GENOTÍPICAS EM UMA DETERMINADA POPULAÇÃO ................................................... 37 4 O GENOMA HUMANO E A GENÉTICA MÉDICA .................................................................................... 39 4.1 A genética e os defeitos congênitos ............................................................................................ 40 4.2 Prevenção dos defeitos congênitos .............................................................................................. 41 Unidade II 5 CITOGENÉTICA: CONCEITOS E FUNDAMENTOS ................................................................................... 47 5.1 O teste de cariotipagemclássica: da coleta ao laudo ........................................................... 52 5.2 Cariotipagem sob coloração convencional – passo a passo............................................... 54 5.3 Citogenética molecular: a hibridação in situ fluorescente (Fish) ..................................... 63 5.4 Citogenômica: aspectos clínicos e laboratoriais ..................................................................... 65 5.4.1 MLPA ............................................................................................................................................................ 65 5.4.2 Cariotipagem molecular por arrays ................................................................................................. 66 5.5 Nomenclatura para testes citogenéticos e citogenômicos ................................................. 67 6 DOENÇAS CAUSADAS POR ANEUPLOIDIAS (ALTERAÇÃO NUMÉRICA) ..................................... 68 6.1 Aneuploidias dos cromossomos autossômicos ........................................................................ 68 6.1.1 Síndrome de Down ................................................................................................................................ 68 6.1.2 Síndrome de Edwards ........................................................................................................................... 70 6.1.3 Síndrome de Patau ................................................................................................................................. 71 6.2 Aneuploidias dos cromossomos sexuais ..................................................................................... 71 6.2.1 Síndrome de Klinefelter ....................................................................................................................... 71 6.2.2 Síndrome de Turner ............................................................................................................................... 72 6.2.3 Síndrome do duplo Y ............................................................................................................................. 75 6.2.4 Síndrome do triplo X ............................................................................................................................. 75 6.3 Doenças causadas por CNVs (rearranjos estruturais) ............................................................ 76 Unidade III 7 VARIANTES GENÔMICAS: ASPECTOS MOLECULARES E SUAS CONSEQUÊNCIAS CLÍNICAS ............................................................................................................................ 84 7.1 Variantes do genoma .......................................................................................................................... 84 7.2 Tipos de variantes genômicas ......................................................................................................... 84 7.3 Interpretação de SNVs........................................................................................................................ 85 7.4 Interpretação das CNVs ..................................................................................................................... 87 7.5 Importância clínica das variantes genômicas .......................................................................... 88 7.6 Doenças e as variantes genômicas ............................................................................................... 89 7.7 Compreendendo variação versus mutação ............................................................................... 89 7.8 Variantes entre indivíduos saudáveis ........................................................................................... 91 7.9 Variação entre populações ............................................................................................................... 92 7.10 Mutações de novo e mosaicismo ................................................................................................ 92 8 A GENÉTICA E AS DOENÇAS COMPLEXAS ............................................................................................. 93 8.1 Estudos familiares ................................................................................................................................ 94 8.2 Identificando os lócus genéticos em doenças complexas ................................................... 95 8.3 Câncer: variantes versus epigenética ........................................................................................... 97 8.3.1 Oncogenes e os supressores tumorais .........................................................................................100 8.3.2 Os tipos de câncer mostram perfis de mutação característicos ........................................104 8.3.3 Fatores epigenéticos relacionados às neoplasias malignas .................................................104 8.3.4 Câncer hereditário e a predisposição ao câncer ......................................................................105 8.4 Hemoglobinopatias ...........................................................................................................................107 8.4.1 Genética das hemoglobinas .............................................................................................................108 8.4.2 Produção de Hb .....................................................................................................................................109 8.4.3 Variação nos genes HBA1, HBA2 e HBB .......................................................................................111 8.4.4 Doença falciforme ................................................................................................................................112 8.4.5 Hemoglobina C ......................................................................................................................................113 8.4.6 Hemoglobina E .......................................................................................................................................113 8.4.7 Talassemias ..............................................................................................................................................113 8.5 Classificação das hemoglobinopatias ........................................................................................114 8.5.1 Incidência das hemoglobinopatias ................................................................................................114 8.5.2 Fisiopatologia das hemoglobinopatias ........................................................................................115 8.5.3 Manifestações clínicas das hemoglobinopatias .......................................................................117 8.5.4 Prevenção das hemoglobinopatias: diagnóstico pré-natal .................................................117 8.6 O aconselhamento genético no contexto de doenças genômicas ................................118 8.6.1 Papel do aconselhamento genético ..............................................................................................118 8.6.2 Aconselhamento genético versus novos testes genéticos ...................................................119 8 9 APRESENTAÇÃO Caro aluno, Este livro-texto apresenta um conteúdo atualizado sobre o estudo do genoma humano, sua funcionalidade, as consequências clínicas do seu desequilíbrio na população e os mecanismos de prevenção das doenças genéticas. Serão acentuados conceitos básicos de genética humana e médica, relatando-se um pouco da história dessa ciência, desde os estudos das doenças monogênicas e caracteres herdados, passando pelos estudos de Watson e Crick, desvendando o principal da biologia molecular e analisando os estudos de populações humanas. Faremos o estudo cromossômico clássico, com base na citogenética, bem como o estudo citogenômico. Serão contempladas as principais cromossomopatias e síndromes de microdeleções e microduplicações,destacando técnicas diagnósticas para o estudo do genoma humano. Também será ilustrada a importância da variabilidade genética em nosso genoma, seus impactos e suas consequências clínicas nas doenças hematológicas e no desenvolvimento do câncer. Conhecer todas as estruturas, as técnicas diagnósticas e suas consequências clínicas tem grande relevância na relação genótipo-fenótipo de doenças, permitindo a realização do aconselhamento genético mais acurado e assertivo, possibilitando a prevenção de novos casos em uma família. Esperamos que a leitura desse material seja proveitosa! INTRODUÇÃO A genética humana é o ramo da ciência que estuda os aspectos da herdabilidade genética, congregando diferentes áreas do conhecimento científico, como citogenética clássica, citogenômica, genética de populações, genética médica e aconselhamento genético. Nos últimos cinquenta anos, a genética humana desenvolveu-se exponencialmente, modificando de forma impactante a maneira de estudarmos e compreendermos o genoma, composto pelo conjunto de DNA presente em uma célula. Com o advento de técnicas citogenéticas e moleculares para análise e estudo do DNA, conceitos antigos foram aperfeiçoados e novos conhecimentos foram incorporados para atingirmos o que chamamos hoje de estudo genômico de alta eficiência. As técnicas diagnósticas e de estudo genético como a cariotipagem clássica, a hibridação in situ por fluorescência, as triagens genômicas específicas, a cariotipagem molecular por métodos de array (arranjo ou matriz) e os sequenciamentos genéticos capilar e massivo viabilizaram a descoberta de novos genes, desvelando novas doenças e, consequentemente, elucidando quadros clínicos complexos que antes permaneciam irresolutos. 10 Hoje, a investigação genética de um indivíduo é realizada de maneira personalizada, avaliando-se o probando e seus familiares de forma integral, relacionando os sinais clínicos (fenótipo) com os resultados dos testes genéticos (genótipo) dos envolvidos. Assim, atingimos uma nova era da medicina genômica. Atualmente, os tratamentos são elaborados de acordo com o genótipo; as dietas são planejadas conforme as variantes do DNA; e doenças e anomalias podem ser evitadas com a realização do aconselhamento genético familiar. A figura a seguir apresenta uma linha do tempo evidenciando o desenvolvimento do estudo genético, desde os trabalhos de Mendel até os dias atuais. Princípio da hereditariedade Bases nitrogenadas / cromossomos Molécula de DNA 1953 Definição do cariótipo humano e da síndrome de Down / dogma central da biologia molecular PCR / sequenciamento / projeto genoma humano Arrays, MLPA e sequenciamento de próxima geração 1865 1940/50 1980/20001880 1950/61 2000 em diante Figura 1 – Linha do tempo, revelando os principais acontecimentos na história da genética humana 11 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Unidade I 1 O GENOMA HUMANO: ESTRUTURA E FUNÇÕES DOS GENES 1.1 DNA e RNA: estruturas e funcionalidades O DNA (deoxyribo nucleic acid) ou ADN (ácido desoxirribonucleico) é um composto químico orgânico situado no núcleo das células do corpo humano. Presente também na mitocôndria, o DNA é a molécula base da hereditariedade, ou seja, nela estão contidas informações genéticas essenciais para o desenvolvimento, o funcionamento e a manutenção da vida, isto é, nossos genes. O DNA é composto de nucleotídeos, uma tríade formada por um grupo fosfato, um açúcar – pentose (desoxirribose) – e uma base nitrogenada. As bases nitrogenadas podem ser de dois tipos: púricas ou pirimídicas. As bases púricas são a adenina e a guanina; as bases pirimídicas, a citosina e a timina. Assim, o DNA é constituído por cadeias polinucleotídicas. Os nucleotídeos apresentam a seguinte conformação: o grupamento fosfato e a base nitrogenada estão ligados à desoxirribose; o grupo fosfato é ligado ao carbono 5 dessa pentose e a base nitrogenada, ao carbono 1. Os nucleotídeos são unidos entre si pela ligação do grupo fosfato do nucleotídeo subsequente ao carbono 3 da desoxirribose de seu antecessor. Uma vez que o carbono 5 da pentose carrega o início do nucleotídeo (grupo fosfato) e o carbono 3 se une ao grupo fosfato do próximo nucleotídeo, dizemos que o DNA tem sentido de formação e leitura do carbono 5 para o 3, o que chamamos de sentido 5 → 3’. A figura a seguir mostra a estrutura química de uma molécula de DNA. N N N O O O O O O NH HO NH OH H2N H2N NH2 O O O O O O - - - - OOO O O O O O O O O O P P P P N N N NN N N Guanina Citosina Adenina 3’ 3’ 5’ 5’ Timina Figura 2 – Estrutura química de parte da molécula do DNA O DNA é formado por duas fitas polinucleotídicas antiparalelas complementares e helicoidais. Essa dupla fita é interligada pelas bases nitrogenadas, unidas por pontes de hidrogênio; a citosina é ligada 12 Unidade I à guanina por pontes triplas de hidrogênio e é ligada à adenina com timina por pontes duplas de hidrogênio. A figura a seguir apresenta o modelo químico do DNA. N N N O O O O O O NH HO NH OH H2N H2N NH2 O O O O O O - - - - OOO O O O O O O O O O P P P P N N N NN N N Guanina Citosina Adenina 3’ 3’ 5’ 5’ 5’ 3’ 3’ 5’ Timina N N NN O H OH H H HH O- O- OP O H O NH2 CH2 Fosfato Base Açúcar - desoxirribose Esqueleto de açúcar - fosfato Esqueleto de açúcar - fosfato Bases Bases Adenina Timina Guanina Citosina Sulco maior Sulco menor Bases nitrogenadas Esqueleto de açúcar - fosfato Figura 3 – Estrutura química dos nucleotídeos, das bases nitrogenadas e da conformação da dupla fita de DNA Grande parte das moléculas de DNA se encontram no núcleo celular. Organizado em 46 moléculas na espécie humana, o DNA se compacta em octâmeros de proteínas histonas, enovelando-se cada vez mais até atingir o estágio de cromatina. Essa cromatina nada mais é que a estrutura arquitetônica de nossos cromossomos. Assim, o conjunto de DNA no núcleo celular de todas as células diploides da espécie humana é organizado em 23 pares de cromossomos, ou seja, em 46 cromossomos humanos. Os cromossomos humanos são classificados em dois grandes grupos: os autossômicos (22 pares = 44 cromossomos, numerados de 1 a 22) e os sexuais (1 par = 2 cromossomos). Os homens possuem um par denominado XY; as mulheres, XX. Os pares dos cromossomos autossômicos são idênticos entre si, são chamados de homólogos. Quanto aos cromossomos sexuais, o par XX para as mulheres é homólogo entre si, entretanto, para o par XY, existe homologia parcial entre regiões específicas de sua constituição. Assim, durante a gametogênese, ocorre o crossing-over entre regiões homólogas dos 23 pares de cromossomos, permitindo a variabilidade genética e a recombinação homóloga entre os pares cromossômicos. No fim do processo meiótico, os espermatozoides e os oócitos carregam um exemplar de cada par, oriundo de uma “mistura” de cada par de homólogos dos genitores. Com a fecundação do oócito feminino (n=23) pelo espermatozoide masculino (n=23), constitui-se um zigoto (2n=46), que sofrerá 13 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA inúmeras mitoses para o desenvolvimento embrionário e fetal. O zigoto apresenta os cromossomos aos pares (um oriundo do pai e outro da mãe). A figura a seguir mostra o processo de compactação do DNA, desde sua estrutura mais básica (fita dupla) até sua forma mais compacta (na forma de cromossomo). 1 3 52 4 Figura 4 – Estrutura do DNA e o processo de compactação até o nível cromossômico O RNA (ribonucleic acid – ácido ribonucleico) é composto de sequências nucleotídicas (grupo fosfato, pentose e base nitrogenada) muito semelhantes às estruturas formadoras do DNA. O RNA difere do DNA em quatro aspectos importantes: • No RNA, não há a base nitrogenada timina; no lugar desta, há a base nitrogenada uracila. • O RNA é constituído basicamente de fita simples. • O RNA está presente tanto no núcleo como no citoplasma. • O açúcar (pentose)do RNA é a ribose. A figura a seguir apresenta a estrutura química da molécula de RNA. O O O NH2 1’ 2’3’ 4’ 5’ O P O- O O P O- O O OH OH Ribose Base: adenina Base Fosfato Direção 5’-3’ O O N N N NH Figura 5 – Esquema químico da molécula de RNA 14 Unidade I O RNA é categorizado principalmente em três tipos, mensageiro (RNAm), transportador (RNAt) e ribossômico (RNAr), e todos esses participam diretamente da síntese proteica. O RNAm é a cópia fiel da estrutura gênica. Produzido durante o processo de transcrição, leva a informação genética do núcleo para o citoplasma, promovendo a expressão e a atividade gênica; corresponde a cerca de 5% do RNA total. O RNAt é o responsável pelo transporte do aminoácido no processo traducional (formação da cadeia polipeptídica); corresponde a cerca de 15% do RNA total. Por fim, o RNAr é responsável pela constituição da maquinaria do ribossomo, organela fundamental para a síntese proteica; corresponde a cerca de 85% do RNA total. A figura a seguir apresenta os três tipos principais de RNA. RNAm RNAt Região que se liga ao molde de RNA Aminoácido RNAr 5’ 3’ RNAr RNArRNAr Subunidades dos ribossomos Figura 6 – Estrutura do RNAm, RNAt e RNAr 1.2 O gene: sua estrutura básica e sua funcionalidade O genoma humano é composto de aproximadamente 20.500 genes, os quais representam cerca de 1-3% do DNA total da espécie. Vem à tona a seguinte questão: se os genes representam tão pouco do volume total de DNA do genoma humano, por que há tanto interesse em estudá-los? A resposta está em sua importância funcional. Eles são segmentos do DNA que codificam um RNA mensageiro e, após esse processo, produzirão estruturas vitais para o funcionamento do organismo. Observação Nos genes estão presentes 85% das variantes genéticas que causam doenças genômicas nos seres humanos. Por esse motivo, a busca pelo conhecimento mais aprofundado do genoma humano é incessante e motivadora. O gene é formado basicamente por três regiões distintas: a região promotora do gene, a sequência de nucleotídeos que codificará um RNAm e sua região terminal; variantes em qualquer uma dessas três estruturas podem modular o processamento do gene. 15 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Os genes são compostos por sequências denominadas éxons e íntrons. Os éxons são as regiões codificadoras do gene, que posteriormente serão base para a formação de aminoácidos. Os íntrons são sequências da região gênica que não participarão como molde para o processo de síntese proteica. A figura a seguir ilustra a estrutura básica de um gene. Gene Promotor Éxon Íntron Éxon Íntron Éxon Íntron Figura 7 – Estrutura básica de um gene 1.3 O dogma central da biologia molecular O dogma central da biologia molecular é composto de processos distintos englobando a replicação, a transcrição e a tradução, conforme destaca a figura a seguir. Replicação (DNA>DNA) DNA RNA (+) RNA (-) Transcrição (DNA>RNA) Transcrição inversa (RNA>DNA) Transcriptase reversa DNA polimerase RNA polimerase RNA polimerase RNA dependenteRibossomo Replicação do RNA (RNA>RNA) Tradução RNA>proteína Proteína Figura 8 – Esquema do dogma central da biologia molecular 1.3.1 Replicação do DNA O processo de replicação do DNA nada mais é do que a sua capacidade de se duplicar. Esse fenômeno é visto principalmente no ciclo celular, na fase S (síntese), etapa em que as moléculas de DNA precisam ser replicadas. Assim, a partir das moléculas originais de DNA, será formada uma cópia extra idêntica 16 Unidade I à molécula-mãe. Caso isso não ocorra de maneira correta, dizemos que em determinado ponto do processo replicativo ocorreu uma mutação, ou seja, surgiu uma variante genética na molécula-filha, diferente da molécula de origem. A replicação acontece com uma maquinaria de enzimas e estruturas funcionais, do início ao fim, de maneira contínua e gradual. Para fins didáticos, os processos serão divididos em etapas: • deselicoidização do DNA; • rompimento das pontes de hidrogênio; • anelamento dos primers (iniciadores); • adição dos nucleotídeos na fita molde; • terminação da replicação e união dos nucleotídeos. Cada uma das etapas engloba enzimas importantes para o processo replicativo: a enzima que “desenrola” o DNA chama-se topoisomerase (DNA girase); a helicase rompe as pontes de hidrogênio, expondo as fitas de DNA para sua replicação; a primase adiciona o primer na fita molde, para sinalizar o sítio de início da replicação; a DNA polimerase adiciona os nucleotídeos, dando continuidade à conformação da nova fita de DNA; e a enzima que liga os fragmentos formados entre as bolhas de replicação da fita tardia é a DNA ligase. Relembrando a estrutura do DNA, com sua formatação helicoidal, ambas as fitas do DNA deverão ser duplicadas para a formação de duas novas moléculas de DNA. As novas fitas serão constituídas com base na sequência de nucleotídeos da fita molde. Assim, cada nova molécula de DNA terá em sua conformação uma das fitas moldes. Por esse motivo, o processo replicativo é dito semiconservativo, já que sempre a nova molécula de DNA produzida terá em sua estrutura uma das fitas usadas como modelo para a criação da nova fita, conforme ilustra a figura seguinte. Figura 9 – A replicação como um processo semiconservativo. Note que nas duas novas duplas fitas de DNA formadas existe uma das fitas da molécula de DNA original 17 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA O processo replicativo inicia-se com a modificação temporária da conformação da dupla fita de DNA. Com a ação de enzimas denominadas topoisomerases (DNA girase), o DNA deixa de ser helicoidal em seu sítio de replicação. A seguir, no local do processo replicativo, entra em ação uma enzima fundamental para a exposição dos nucleotídeos da fita molde. A enzima que rompe as pontes de hidrogênio que unem a dupla fita do DNA é a DNA helicase. Assim, haverá a exposição dos nucleotídeos que serão utilizados como molde para a produção da nova fita complementar de DNA. Em seguida, será adicionada uma pequena sequência de nucleotídeos em cada uma das fitas do DNA recém-rompidas, e tal segmento denomina-se primer ou iniciador. Essa sequência de poucos nucleotídeos serve como sinalizador do sítio de início da replicação e, assim, a enzima DNA polimerase inicia a adição dos novos nucleotídeos na nova fita de DNA. Após o término da adição dos nucleotídeos para a concepção da nova fita de DNA, os nucleotídeos serão ligados pela enzima DNA ligase. As novas fitas de DNA formadas têm sentido antiparalelo à sua fita molde. A fita que é produzida no mesmo sentido da ação da enzima DNA helicase recebe o nome de fita contínua, enquanto a fita que está no sentido contrário ao da ação da enzima DNA helicase é denominada fita tardia. A fita contínua recebe apenas um primer e a adição dos nucleotídeos é feita de maneira ininterrupta pela DNA polimerase. À fita tardia serão adicionados vários primers em cada bolha de replicação para a confecção dessa nova fita. A fita tardia será formada pelos fragmentos, os quais são denominados fragmentos de Okazaki. A figura a seguir apresenta o processo replicativo e toda a maquinaria utilizada para sua efetivação. Cadeia atrasada Cadeia líder 5’ 3’ 3’ 3’ 5’ 5’ Polimerase do DNA Polimerase do DNA Ligase do DNA Fragmento de Okazaki Iniciador do RNA Primase do DNA Helicase Proteínas de ligação Topoisomerase Figura 10 – Esquema do processo replicativo Por fim, a fita tardia tem seus fragmentos ligados pela ação da enzima DNA ligase, finalizando o processo replicativo. 18 Unidade I 1.3.2 Transcrição e tradução Os processos de transcrição e tradução envolvem uma série de estruturas químicas, celulares e moleculares que atuam de maneira organizada para a expressão de genes e síntese proteica. A figura a seguir ilustra um esquema dessas duas fases do dogma central da biologia molecular. A U G C U U U C G U A U U A C G A A A G C A U A U A CG A A A G C A U AA U G C U U U C G U A U A T G C T T T C G T A T T A C G A A A G C A T A A T G C T T T C G T A T T A C G A A A G C A T A A T G C T T T C G T A T T A C G A A A G C A T A A T G C T T T C G T A T T A C G A A A G C A T A Mat Tyr Met TyrLeu Giu Leu GiuSer Ser Ser SerTyr Mat Tyr Ile Transcrição Tradução Proteína ativa RNA DNA Figura 11 – Esquema ilustrativo das fases de transcrição e tradução Transcrição A transcrição é um processo complexo que é realizado nas regiões gênicas do DNA. Dentro do núcleo celular, a enzima RNA polimerase atua na região gênica da fita antisenso, a qual é utilizada como molde para o processo de construção da molécula de RNA mensageiro. O processo transcricional pode ser dividido em etapas: • síntese do transcrito primário; • adição de estruturas no RNA mensageiro; • splicing; • finalização do RNA mensageiro maduro. Observação Splicing consiste na retirada dos íntrons de um RNA precursor, de forma a produzir um RNAm maduro functional. A etapa de síntese do transcrito primário é realizada pela enzima RNA polimerase. Esta se liga à região promotora do gene no DNA, rompendo a dupla fita e sintetizando, e então usa a fita antisenso, a nova molécula de RNA. A enzima RNA polimerase reconhece o sítio iniciador na fita antisenso e inicia a síntese do RNA mensageiro na extremidade 5’UTR. Assim, a molécula é sintetizada e, ao atingir a região finalizadora do gene, região 3’UTR, a enzima RNA polimerase finaliza o processo. 19 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Após a formação do transcrito primário, o RNA mensageiro recebe em sua extremidade 5’ uma estrutura denominada CAP; em sua extremidade 3’, uma cauda poli A (sequências de adenina). Essas estruturas têm a finalidade de proteger o RNA mensageiro fabricado da ação de enzimas líticas que poderiam degradá-lo e, consequentemente, destruí-lo antes de completar sua funcionalidade. Em seguida, o RNA mensageiro passa por um processo de maturação denominado splicing, um processamento que retira todos os íntrons desse RNA mensageiro e une todos os éxons que serão decodificados em aminoácidos. Após essa etapa, o RNA mensageiro maduro estará pronto para sair do núcleo e migrar para o citoplasma, onde será traduzido em cadeia polipeptídica. A figura a seguir destaca o processo de transcrição do DNA em molécula de RNA mensageiro. Éxon Éxon RNAm maduro Splicing Pré-RNAm Sequência completa de codificação de proteínas Éxon AAAAA... CAP 5’ ÍntronÍntron Transcrição 1. Transcrito primário 2. Adição do CAP 5’ e da cauda de poli A em 3’ Filamento molde Filamento não molde Transcrito de RNA RNA polimerase C T G A C G G A T C A G C C G C A A G C G G A A T T G G C G A C A T A A G A C U G C C U A G U C G G C G U U G A C T G C C T A G T C G G C G T T C G C C T T A A C C G C T G T A T T Cauda poli A em 3’ Região não traduzida (UTR) Sequência de codificação (CDS) Íntron Núcleo Citoplasma Figura 12 – Esquema ilustrativo da transcrição gênica 20 Unidade I Tradução Assim que o RNA mensageiro maduro atinge o citoplasma, mais precisamente os ribossomos no retículo endoplasmático rugoso, ele será traduzido em aminoácidos que constituirão uma cadeia polipeptídica. O RNA mensageiro é lido pelo ribossomo em sequências de três ribonucleotídeos, denominados códons. Estes serão lidos pelo ribossomo e, complementarmente, ligados aos anticódons do RNA transportador. No local do RNAm, onde o anticódon for complemetar ao códon, o RNA transportador liberará o aminoácido correspondente e, sequencialmente, formará uma cadeia polipeptídica. Dessa forma, o código genético vai gerar proteínas funcionais e importantes para o funcionamento do organismo humano. Todo RNAm se inicia pelo códon iniciador AUG, que codificará o amoniácido metionina e todo RNAm terminará com o códon finalizador (stop códon), que não codifica nenhum aminoácido, mas informa ao ribossomo que a síntese proteica deve ser finalizada. Existem aproximadamente vinte diferentes aminoácidos na constituição proteica. O genoma é composto por quatro tipos diferentes de nucleotídeos, agrupados em trincas (códons), que codificarão os aminoácidos. Assim, ao calcular as possibilidades de formação de códons, nota-se que existem 64 arranjos diferentes (quatro diferentes nucleotídeos, A, U, C e G, agrupados 3 a 3 – códons). Essas 64 possibilidades resultarão em vinte aminoácidos, ou seja, mais de um códon formará o mesmo aminoácido. Por esse motivo, o código genético é dito degenerado, conforme exemplifica a figura a seguir. 2ª Base U C A G 1ª B as e U UUU UUC UUA UUG Fenilanina (Fen) Leucina (Leu) UCU UCC UCA UCG Serina (Ser) UAU UAC UUA UUG Tirosina (Tir) Codão de finalização Codão de finalização UGU UGC UGA UGG Cisteína (Cis) Codão de finalização Triptofano (Trp) U C A G 3ª Base C CUU CUC CUA CUG Leucina (Leu) CCU CCC CCA CCG Prolina (Pro) CAU CAC CAA CAG Histidina (His) Glutamina (Glu) CGU CGC CGA CGG Arginina (Arg) U C A G A AUU AUC AUA AUG Isoleucina (Ile) Metionina (Met) Codão de iniciação ACU ACC ACA ACG Treonina (Tre) AAU AAC AAA AAG Asparagina (Asn) Lisina (Lis) AGU AGC AGA AGG Serina (Ser) Arginina (Arg) U C A G G GUU GUC GUA GUG Valina (Val) GCU GCC GCA GCG Alanina (Ala) GAU GAC GAA GAG Ácido aspártico (Asp) Ácido glutâmico (Glu) GGU GGC GGA GGG Glicina (Gli) U C A G Figura 13 – Tabela de formação de aminoácidos a partir dos códons do RNAm 21 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Observação O exame do exoma é o sequenciamento genético de todos os éxons do genoma humano. O estudo do exoma permite verificar doenças monogênicas com a identificação de SNVs (single nucleotide variants – variantes de nucleotídeos únicos), pequenas variações das sequências do DNA, indels (inserçoes e deleções) e alterações estruturais equilibradas, como as inversões de regiões genômicas. Caso ocorra alguma falha, em qualquer parte do processo replicativo, transcricional ou traducional, o impacto acometerá diretamente a cadeia polipeptídica. Nesse contexto, o estudo das variantes genômicas é fundamental para elucidar a etiologia das doenças humanas. 2 PADRÕES DE HERANÇAS MONOGÊNICAS Desde a redescoberta dos estudos do monge austríaco Gregor Mendel, as características e fenótipos que seguem o padrão de herança monogênica, monoibridismo, são estudados e cada vez mais compreendidos no contexto da genética humana. Para tanto, é preciso retomar as conhecidas Leis de Mendel, que são base para o estudo da hereditariedade genômica. Mendel, com seus estudos de cruzamentos com ervilhas-de-cheiro, Pisum sativum, observou e constatou que as características das ervilhas cruzadas eram diferentes das ervilhas filhas, constatando o fato em sucessivas gerações e cruzamentos. Por exemplo, no cruzamento de ervilhas puras amarelas com ervilhas puras verdes, Mendel percebeu que nasceram somente ervilhas amarelas. Ao cruzar as ervilhas amarelas, fruto do primeiro cruzamento, Mendel constatou que nasceram ervilhas amarelas e verdes, na proporção 3:1. Com isso, ele identificou que determinados fatores carregam características e que estes eram transmitidos de genitores para a prole de maneira matematicamente compreensível. Com isso, Mendel sugeriu que a prole do cruzamento (sexuado) de genitores carregava esses fatores aos pares, sendo cada um herdado de um genitor. Os estudos de Mendel revelaram que os fatores podiam se manifestar ou não, a exemplo do cruzamento das ervilhas puras amarelas com as ervilhas puras verdes, que resultou somente em ervilhas fenotipicamente amarelas. Com essa constatação, surgiu o conceito de dominância e recessividade. Nos estudos de Mendel, foram observadas sete características diferentes das ervilhas-de-cheiro, destacando-se cor, tamanho e textura. Ele notou que uma característica herdada por um par de fatores independia das outras características” herdadas por outro par de fatores, ou seja, do cruzamento entre ervilhas amarelaslisas e verdes rugosas nasceriam ervilhas amarelas lisas e rugosas e ervilhas verdes lisas e rugosas. Dessa maneira, Mendel evidenciou que um fator segregava de maneira independente de outros fatores. 22 Unidade I Por fim, Mendel postulou duas leis importantes para o estudo dos padrões de heranças monogênicas: • Princípio da Segregação dos Caracteres: os indivíduos têm os fatores aos pares, mas na reprodução sexuada transmitem apenas um fator a sua prole. • Lei da Segregação Independente: a segregação de um fator determinado não influencia na segregação de outro fator (diferente do primeiro). Mendel contribuiu para o desenvolvimento dos estudos de herdabilidade genética, iniciando uma nova maneira de compreender a transmissão dos caracteres genéticos. O que Mendel denominou par de fatores nada mais é do que o nosso par de genes, e as características que ele evidenciou correspondem ao fenótipo das ervilhas-de-cheiro. Esse par de genes, que definem uma característica ou funcionalidade herdável, são denominados genes alelos, cada um localizado no cromossomo homólogo. Os alelos ocupam uma determinada coordenada genômica, que é idêntica em cada um dos cromossomos homólogos. Essa coordenada genômica, local no cromossomo onde o gene reside, é chamada lócus. A relação entre os alelos tembém foi observada nos estudos de Mendel. As relações de dominância e recessividade foram bem estabelecidas nos cruzamentos das ervilhas, mostrando que essa conjunção de alelos pode originar a mesma característica ou cada alelo pode carregar uma informação diferente para a mesma característica, por exemplo: um par de alelos para cor pode gerar ervilhas verdes ou amarelas. Nesse contexto, são definidos os conceitos de homozigose e heterozigose. Dizer que um par de genes encontra-se em homozigose significa dizer que ambos carregam as mesmas informações para uma determinada característica. Em contrapartida, dizer que um par de genes encontra-se em heterozigose significa dizer que o par de alelos carrega informações diferentes para a mesma característica. Os conceitos de homozigose e heterozigose são representados pelo par de genes (alelos), que, juntos, formam o genótipo de um indivíduo. A expressão (resultado mensurável da manifestação genotípica) desse genótipo é observada por meio do fenótipo. O genótipo de um indivíduo homozigoto pode ser representado por duas letras maiúsculas, por exemplo, AA, quando determinam uma característica dominante; quando definem uma característica recessiva, por duas letras minúsculas (aa); os indivíduos heterozigotos sempre serão representados por uma letra maíuscula e uma letra minúscula (Aa). Assim, indivíduos heterozigotos sempre terão um gene dominante e um gene recessivo. Para que uma característica dita dominante se expresse, obrigatoriamente o indivíduo deve ter em seu genótipo um gene A. Nesse caso, basta apresentar um gene com essa característica que o indivíduo expressará o fenótipo correspondente. Já para as características recessivas, o indivíduo deverá apresentar o par de alelos aa para haver a manifestação do fenótipo correspondente. 23 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Destaca-se também um tipo de relação gênica denominada codominância, a qual se associa à ausência de dominância de um gene sobre outro. Alelos múltiplos são aqueles nos quais uma determinada característica é expressa pela ação de alelos gênicos localizados em mais de um lócus cromossômico. Exemplos clássicos de codominância e múltiplos alelos são constantes nas tipagens sanguíneas, nos sistemas MN e ABO. Saiba mais Para estudar os sistemas sanguíneos e as relações de dominância, recessividade, codominância e alelos múltiplos, leia: FRIDMAN, C. Replicação de DNA, genótipo/fenótipo e herança quantitativa. Apostila. USP, 2012. Disponível em: https://midia.atp.usp.br/ plc/plc0030/impressos/plc0030_top03.pdf. Acesso em: 9 dez. 2019. Na transposição dos estudos de Mendel para o desenvolvimento da genética médica e científica, grande parte das doenças monogênicas humanas seguem os padrões das Leis de Mendel. Os padrões de heranças das doenças monogênicas são: autossômico recessivo e autossômico dominante (quando o par de alelos está contido nos cromossomos autossômicos). A herança é ligada ao X dominante e ao X recessivo quando o gene relacionado com a doença encontra-se no cromossomo X, e é ligada ao Y quando o gene causador da alteração estiver no cromossomo Y. As doenças monogênicas são aquelas cuja variante é do tipo SNV, a qual relaciona-se com variantes presentes em um gene ou par de genes, em um determinado lócus cromossômico. No caso de heranças autossômicas recessivas, para um indivíduo apresentar um fenótipo, este deve ter ambos os alelos recessivos. Quando se trata de doenças autossômicas recessivas, para um paciente apresentar o fenótipo, ele deverá ter ambos os alelos com variantes genéticas. No caso de indivíduo heterozigoto, ou seja, que possui apenas um alelo alterado, ele geralmente não tem quadro clínico e é reconhecido como portador (pois um dos alelos está alterado). Excepcionalmente, para algumas doenças recessivas, o indivíduo portador pode apresentar algum grau da doença, em especial quando envolve a produção de determinadas enzimas. Assim, serão elencados a seguir alguns critérios das doenças autossômicas recessivas. A doença se expressa na homozigose. Há um risco aumentado para doenças autossômicas recessivas no casamento consanguíneo (entre membros da mesma família), caso haja indivíduos afetados e portadores que segregam esse gene dentro de uma família. Para determinadas doenças e genes específicos, alguns portadores podem apresentar algum fenótipo relacionado à doença. 24 Unidade I No tocante às heranças autossômicas dominantes, estas se expressam tanto na homozigose como na heterozigose. Basta haver um alelo presente para expressar o fenótipo. Quando são estudadas doenças que seguem esse perfil de herança, deve-se lembrar que, para uma pessoa apresentar uma doença com padrão de herança autossômica dominante, basta ela ter um alelo alterado. A seguir, serão acentuados alguns critérios típicos de doenças autossômicas dominantes: • A doença se expressa tanto na homozigose como na heterozigose. • Não existem indivíduos portadores, somente afetados e normais. • Distribui-se de maneira equilibrada e aleatória, independentemente do sexo. • Dependendo da variante e do gene envolvido, em alguns casos da homozigose dominante, a doença é letal. Com relação às heranças ligadas ao X dominante, destaca-se que os homens possuem apenas um cromossomo X e as mulheres apresentam dois exemplares desse cromossomo. Assim, homens que carregam variantes em genes localizados nesse cromossomo obrigatoriamente são doentes hemizigóticos e suas filhas também serão doentes (já que o homem envia o cromossomo X alterado para todas as suas filhas). Por sua vez, a prole do sexo masculino de homens afetados por doenças ligadas ao X dominante nunca será doente pela linhagem paterna, uma vez que o homem manda o cromossomo Y para todos os seus filhos. Em contraposição, quando uma mulher apresentar uma variante genética em heterozigose para uma doença ligada ao X dominante, ou seja, ela tem um cromossomo X com o alelo alterado e outro exemplar normal, ela será obrigatoriamente doente e poderá transmitir o cromossomo com o alelo alterado para sua prole, independentemente do sexo, já que a mulher sempre enviará um cromossomo X para meninos e meninas. Caso a mulher doente seja homozigota para essa variante, todos os filhos e filhas (100% da prole) será doente. A figura a seguir traz um esquema da transmissão de variantes ligadas ao cromossomo X dominante. 25 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Pai afetado Pai não afetado Mãe não afetada Mãe afetada Filho afetado Filho não afetado Filho não afetado Filho afetado Filha não afetada Filha afetada Filha afetada Filha não afetada Probabilidades 0% filhos homens afetados100% filhas mulheres afetadas Probabilidades 50% filhos homens afetados 50% filhas mulheres afetadas (a) Doença ligada ao X dominante, pai afetado (b) Doença ligada ao X dominante, mãe afetada Figura 14 – Exemplos de herdabilidade de doença ligada ao cromossomo X dominante Lembrete Quanto às heranças ligadas ao X recessivo, os homens possuem apenas um cromossomo X, e as mulheres apresentam dois exemplares desse cromossomo. Assim, proles do sexo masculino de homens afetados por doenças ligadas ao X recessivo nunca serão doentes pela linhagem paterna, uma vez que o homem manda o cromossomo Y para todos os seus filhos. Dessa forma, as doenças ligadas ao X recessivo são mais frequentes em homens do que em mulheres. 26 Unidade I Em contraposição, quando uma mulher apresentar uma variante genética em homozigose para uma doença ligada ao X recessivo, ou seja, ela tem os dois cromossomos X com os alelos alterados, ela será obrigatoriamente doente e transmitirá os cromossomos com os alelos alterados para sua prole, sendo todos os filhos doentes (pois receberão um X com o alelo recessivo) e todas as suas filhas serão, no mínimo, portadoras (pois todas as filhas receberão um cromossomo X com o alelo alterado da mãe e um outro normal, caso a mulher tenha sua prole com um homem saudável para essa característica). Por essas razões, dizemos que os homens de uma família na qual se segrega um gene alterado com herança ligada ao X recessivo, são aparentados pela linhagem das mulheres. No caso de a mulher ser portadora de uma característica recessiva ligada ao X, ou seja, ter um cromossomo X com um alelo normal e um cromossomo X com um alelo alterado, ela poderá gerar filhos normais ou doentes e, consequentemente, filhas normais ou portadoras, dependendo do genótipo do genitor. A figura a seguir ilustra um esquema da herdabilidade de doenças ligadas ao cromossomo X recessivo. Doença ligada ao X recessivo, mãe portadora Pai não afetado Filho não afetado Não afetado Afetado Portador Filha não afetada Filha portadora Filho afetado Mãe portadora Figura 15 – Esquema da herdabilidade de doenças ligadas ao cromossomo X recessivas para mulheres portadoras 27 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA As doenças e heranças ligadas ao cromossomo Y afetam exclusivamente homens, e os filhos de homens afetados terão 100% de probabilidade de serem tão afetados quanto o seu progenitor. Um exemplo de característica ligada ao Y é a presença de pelos na orelha. O estudo genético de doenças genômicas é baseado no exame físico, na investigação de variantes genéticas através de exames específicos e na análise do heredograma, que é a análise da árvore genealógica de uma família. Pautado em informações transmitidas pelo paciente, o heredograma apresenta as linhagens ascendentes e descendentes de todos os envolvidos no estudo genético do paciente. Com a utilização do heredograma, o geneticista poderá verificar a segregação de genes e, consequentemente, de características e doenças em uma família. Com simbologia própria, o heredograma é uma das principais ferramentas para a realização do aconselhamento genético familiar. A figura a seguir destaca alguns dos símbolos utilizados para a confecção do heredograma familiar. 1 1 I II III 1 2 2 4 2 3 3 Indivíduo do sexo masculino Acasalamento consanguíneo ? Gêmeos de zigosidade desconhecida Indivíduo do sexo feminino 1 1 II I 2 3 2 Numeração dos indivíduos nos heredogramas Ausência de progênie Sexo indefinido Probando Indivíduos afetados Gêmeos monozigóticos Indivíduo falecido Heterozigotos para um caráter autossômico Morte pré-natal Portador de caráter recessivo ligado ao X Gêmeos dizigóticos Aborto espontâneo Acasalamento Figura 16 – Modelo representativo de simbologias para confecção dos heredogramas Para estudar as probabilidades familiares de um casal gerar filhos normais ou alterados, deve-se proceder o cruzamento dos genótipos utilizando-se o quadro de Punnett. A tabela a seguir ilustra uma representação do quadro de Punnett, por meio do qual são realizados os cruzamentos dos alelos nos gametas para a formação de zigotos. 28 Unidade I Nesse quadro, são realizados os cruzamentos dos alelos paternos e maternos para a constituição da possibilidade da formação de gametas. Em azul, destaca-se o par de alelos paterno (gene 1 e gene 1’); em vermelho, o par de alelos maternos (gene 1 e gene 1’). Desse cruzamento, serão criadas sempre quatro possibilidades de resultados da conjunção dos alelos na formação do zigoto. Quadro 1 Alelo 1 da mãe Alelo 1’ da mãe Alelo 1 do pai 11 11' Alelo 1’ do pai 1'1 1'1' Lembrete As doenças e heranças ligadas ao cromossomo Y afetam exclusivamente homens, e os filhos de homens afetados terão 100% de probabilidade de serem tão afetados quanto o seu progenitor. Um exemplo de característica ligada ao Y é a presença de pelos na orelha. 2.1 Doenças causadas por SNVs patogênicas Até o momento, foram identificados mais de 6 mil fenótipos pelos quais a base molecular é conhecida. Esses fenótipos e os genes associados são coletados no banco de dados Omim (online mendelian inheritance in man – herança mendeliana no homem on-line). Saiba mais Aprofunde seus conhecimentos em: www.omim.org Quadro 2 – Exemplos de doenças mendelianas Herança Doença Gene/região Variante Frequência Autossômica dominante Osteogênese imperfeita COL1A1 ou COL1A2 (90%) Mutação de ponto 6-7/100000 Deficiência de Glut1 SLC2A1 Mutação de ponto Rara, cerca de 1/90000 Acondroplasia FGFR3 Mutação de ponto 1/15000 a1/40000 Autossômica recessiva Fenilcetonuria PAH Diferentes tipos de alterações 1/10000 a 1/15000 29 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Herança Doença Gene/região Variante Frequência Ligada ao X recessivo Hemofilia A F8 Mutação de ponto 1/4000 a 1/5000 homens Distrofia muscular de Duchenne DMD Deleções Mutação de ponto 1/3500 a 1/5000 Ligada ao X dominante X frágil FRM1 CGG expansão 1/4000 (homens) Ligada ao Y Falha espermatogênica USP9Y Deleções 1/2000 a 1/3000 As doenças são mostradas com seus padrões de herança, o gene afetado, os tipos de mutação mais comumente encontrados e as taxas de incidência estimadas. Observe que algumas doenças, por exemplo, osteogênese imperfeita (das quais existem várias formas), podem ser causadas por variantes patogênicas em diferentes genes. 2.1.1 Doenças autossômicas dominantes A acondroplasia é uma doença autossômica dominante causada por uma variante no gene FGFR3, localizado em 4p16.3. A acondroplasia é a forma mais frequente de nanismo, com encurtamento de membros. Os indivíduos afetados apresentam baixa estatura, causada pelo encurtamento rizomélico dos membros, com fácies característica, com bossas frontais e hipoplasia da face média, lordose lombar exagerada, limitação da extensão do cotovelo, genu varum (deformação dos ossos das pernas caracterizada por concavidade da coxa e saliência do joelho) e mão em tridente. Para uma pessoa ser acondroplásica, basta que um dos alelos esteja alterado para que a doença se manifeste (A_). Dessa forma, o casamento entre um indivíduo acondroplásico (A_) e outro de estatura normal (aa) tem, no mínimo, 50% de chance de gerar uma prole acondroplásica, caso o indivíduo doente seja heterozigoto (Aa). Para comprovar essa afirmação, foi realizado o cruzamento no quadro de Punnett, conforme exemplificado a seguir: Quadro 3 a a A Aa Aa a aa aa Aa = 50% (doente) – heterozigoto aa = 50% (normal) – homozigoto A neurofibromatose tipo I (NF1) é outro tipo de doença autossômica dominante, causada por uma variante no gene NF1 localizado no cromossomo 17, na região q11.2. Caracterizada clinicamente por manchas café com leite, nódulos de Lisch no olho e tumores fibromatosos da pele, os indivíduos portadores dessa doença têm maior suscetibilidade de desenvolver neoplasias benignas e malignas. A incidência mundial de NF1 é de 1 em 2.500 a 1 em 3 mil indivíduos, em ambosos sexos. 30 Unidade I Em um casamento entre um indivíduo com NF1 e um indivíduo com NF1, ambos heterozigotos, a probabilidade de se gerar uma prole afetada é de 75%, destacando-se 25% em homozigose e 50% em heterozigose. Para comprovar essa afirmação, foi realizado o cruzamento no quadro de Punnett, conforme exemplificado a seguir: Quadro 4 A a A AA Aa a Aa aa AA = 25% (doente) – homozigoto Aa = 50% (doente) – heterozigoto aa = 25% (normal) – homozigoto A figura a seguir apresenta um heredograma para uma doença autossômica dominante. Observe que nessa característica de herança não há salto de geração. Uma vez que a doença não se perpetua no heredograma, não haverá mais casos herdáveis (causados pelo mesmo gene que segregava nessa família). III II I Figura 17 – Esquema de um heredograma para doença autossômica dominante. Os símbolos coloridos em vermelho representam indivíduos afetados em heterozigose (Aa); em azul, os indivíduos com par de alelos recessivos (aa), ou seja, livres da doença 2.1.2 Doenças autossômicas recessivas A doença de Tay-Sachs é uma enfermidade autossômica recessiva relacionada a variantes no gene HEXA, localizado em 15q23. Clinicamente, a doença de Tay-Sachs é caracterizada pelo aparecimento, ainda na infância, de atraso global do desenvolvimento, seguido de paralisia, demência e cegueira. Geralmente, os portadores dessa doença falecem até o terceiro ano de vida. Como sinal patognomômico da doença, os pacientes apresentam uma mácula em um ponto central da retina “vermelho-cereja” (red spot cherry). A doença de Tay-Sachs é um erro inato do metabolismo, sendo marcada pelo acúmulo de lipídeos nas células ganglionares retinianas. 31 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA O casamento consanguíneo, ou seja, a união entre primos portadores dessa característica, apresenta chance de 25% de gerar uma prole doente, conforme demonstrado no cruzamento a seguir. Quadro 5 A a A AA Aa a Aa aa AA = 25% (normal) – homozigoto Aa = 50% (normal) – heterozigoto aa = 25% (doente) – homozigoto O albinismo oculocutâneo tipo I (AOCI) é um distúrbio autossômico recessivo caracterizado pela presença de variantes nos alelos do gene TYR, localizado em 11q14.3. Clinicamente, os pacientes com AOCI manifestam ausência de pigmentos no cabelo, na pele e nos olhos, com nistagmo grave, fotofobia e acuidade visual reduzida. Do casamento de indivíduos com AOCI, toda a prole (100%) nascerá albina, conforme demonstrado no cruzamento a seguir. Quadro 6 a a a aa aa a aa aa aa = 100% (doente) – homozigoto A figura a seguir destaca um heredograma para uma doença autossômica recessiva cujos indivíduos portadores geram prole normal, portadora e doente. Entretanto, em um casamento entre pessoas saudáveis e não portadoras, não há risco de gerar uma prole doente ou portadora. Figura 18 – Esquema de um heredograma para doença autossômica recessiva. Os símbolos coloridos em vermelho representam indivíduos afetados (aa); em azul, os indivíduos com par de alelos dominantes (AA), ou seja, livres da doença; os símbolos com metade vermelho e metade azul indicam os indivíduos portadores dessa característica, ou seja, as pessoas com genótipo em heterozigose (Aa) 32 Unidade I 2.1.3 Doenças ligadas ao X recessivo A distrofia muscular de Duchenne (DMD) é acentuada geneticamente por variantes (do tipo deleção) e SNVs no gene DMD, localizado em Xp21.2-p21.1. De herança recessiva ligada ao cromossomo X, a DMD acomete preferencialmente homens filhos de mulheres portadoras dessa característica. Clinicamente, os pacientes com DMD apresentam fraqueza muscular, com evolução para perda dos movimentos de pernas. Progressivamente, apresentam insuficiência cardíaca, disfunção muscular lisa no trato digestivo e/ou urinário, falecendo, em sua maioria, entre a segunda e a terceira década de vida. Em um casamento entre um indivíduo do sexo masculino com o gene DMD sem variantes e uma mulher portadora da variante patogênica no gene DMD, existe a possibilidade de ela gerar um filho doente em 50% dos casos de prole masculina. O cruzamento no quadro de Punnett destaca as possibilidades para esse cruzamento. Quadro 7 XA Xa XA XA XA Y XAY XaY XAXA = 25% (mulher normal) – homozigoto XAXa = 50% (mulher portadora) – heterozigoto XAY = 25% (homem normal) – hemizigoto XaY = 25% (homem doente) – hemizigoto A hemofilia A é caracterizada geneticamente por variantes no gene F8, localizado em Xq28. De herança recessiva ligada ao cromossomo X, acomete preferencialmente homens filhos de mulheres portadoras desse caráter. Clinicamente, os pacientes com hemofilia A apresentam sangramentos causados por uma deficiência no fator VII da cascata de coagulação. Os pacientes com hemofilia A devem tomar muito cuidado com traumas, os quais podem gerar hemorragias internas, podendo ser fatais em alguns casos. Observação A rainha Victoria (Inglaterra) foi uma das responsáveis pela disseminação da hemofilia A pela Europa, sendo citada em diferentes livros de genética. Em um casamento de uma mulher portadora de hemofilia A com um homem também portador, há 50% de chance de o filho ou a filha nascer com tal doença, conforme ilustrado no quadro de Punnett. 33 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Quadro 8 XA Xa Xa XAXa XaXa Y XAY XaY XAXa = 25% (mulher portadora) – heterozigoto XaXa = 25% (mulher doente) – homozigoto XAY = 25% (homem normal) – hemizigoto XaY = 25% (homem doente) – hemizigoto 2.1.4 Doenças ligadas ao X dominante A síndrome de Rett (SR) é uma doença neurodegenerativa que acomete, em sua maioria, mulheres. De herança dominante ligada ao X, é caracterizada geneticamente por variantes no gene MECP2, localizado em Xq28. As pacientes com SR evoluem com perda das habilidades adquiridas, como fala e locomoção; apresentam movimentos estereotipados, classicamente em mãos, com microcefalia, convulsões e deficiência intelectual. Outra doença de herança dominante ligada ao X é o raquitismo hipofosfatêmico (RH). Marcado geneticamente por variantes no gene PHEX, localizado em Xp22.11, o RH tem expressividade variável, com raquitismo e deformidades ósseas, baixa estatura, anormalidades dentárias e hipofosfatemia (baixa reabsorção renal de fosfato). O heredograma a seguir mostra um padrão clássico de doença ligada ao X dominante cuja mulher afetada transmite alelos alterado e normal para sua prole. O filho dessa mulher terá todas as suas filhas doentes e nenhum filho afetado, já que o homem transmite o X alterado para todas as suas filhas, mas nunca passa essa variante associada ao cromossomo X para seus filhos. Figura 19 34 Unidade I 2.2 Outros padrões de herança e fatores que alteram o padrão de herança monogênica Além dos padrões de herança monogênicas, baseados nos estudos de Mendel, devem ser abordadas a herança poligênica, a herança mitocondrial (relacionada ao DNA presente nas mitocôndrias), o imprintig (metilação) do DNA e a dissomia uniparental. Na herança poligênica, o perfil de herdabilidade de determinada característica é contemplado por mais de um par de genes que interagem para produzir um efeito fenotípico. Um exemplo clássico de herança poligênica é a cor da pele em humanos, a qual é gerada pela expressão de vários genes, que, em conjunto, apresentam um efeito aditivo na manifestação do fenótipo. No tocante à herança mitocondrial, primeiro é preciso compreender sua origem. O DNA mitocondrial é um conjunto de estruturas pequenas e circulares que se assemelham ao DNA bacteriano. Acredita-se que tenha sido originada da incorporação de uma célula procarionte à célula humana. O DNA mitocondrial é recebido de forma monoparental, ou seja, de apenas um dos genitores. Na espécie humana, o DNA mitocondrial é recebido das mitocêndrias maternas, através do citoplasma do óvulo. Os espermatozoides contêm mitocôndrias, mas eles normalmente não são herdados pelo zigoto. Houve o relato de um caso de herança paterna de mitocôndrias em um serhumano, mas isso é extremamente raro. Assim, as doenças ligadas ao DNA mitocondrial são herdadas pela linhagem materna, o que significa que mães doentes passarão a doença para todos os seus filhos e suas filhas. Os filhos doentes não passarão a variante causadora da doença para sua prole, entretanto, as filhas de mulher doente passarão para todos os seus filhos e suas filhas. Assim, dizemos que todos os pacientes com doenças mitocondriais são aparentados pela linhagem materna. A figura a seguir mostra o padrão de herança mitocondrial. Pai com a doença Mãe afetada e todas as mitocôndrias mutantes Mãe afetada e algumas mitocôndrias mutantes Crianças não afetadas Crianças afetadas (penetrância completa) Crianças afetadas e crianças não afetadas (variabilidade) Figura 20 35 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Com relação ao imprintig genômico e a metilação do DNA, trabalhos recentes destacaram o papel das modificações epigenômicas, incluindo a metilação diferencial do DNA, na suscetibilidade e na etiologia de diferentes tipos de doenças, como o câncer, as doenças autoimunes, os distúrbios metabólicos, até doenças psiquiátricas. O padrão de metilação é um importante mecanismo regulador epigenético durante o desenvolvimento celular normal, mas que permanece alterado nos estados celulares doentes. Assim, os padrões de metilação aberrante são uma característica distintiva de muitas células. A metilação do DNA é uma das primeiras modificações epigenéticas encontradas em humanos. Refere-se a qualquer modificação potencialmente hereditária que altera a expressão do gene, sem alterar diretamente a sequência de nucleotídeos do DNA. Inclui alterações estáveis do DNA nuclear responsáveis pela identidade fenotípica de um tipo celular. A metilação do DNA consiste na adição de um grupo metil ao carbono 5 do anel de pirimidina do nucleotídeo citosina. A transferência de grupos metil é catalisada por uma classe de enzimas conhecidas como DNA metiltransferases (DNMTs). Estas realizam a transferência de grupos metil através de ligação covalente, o que confere à metilação a condição de marca epigenética mais estável. Metilações do DNA ocorrem ao longo de todo o genoma, inclusive em genes, mas são funcionalmente mais relevantes quando presentes em sequências ricas em dinucleotídeos CpGs (citosina-guanina), as denominadas ilhas CpGs, que são frequentemente encontradas em regiões promotoras de genes ativos. Portanto, a metilação do DNA tem um importante papel na regulação da transcrição. As DNA metiltransferases podem produzir pelo menos três status diferentes para cada sítio CpG: metilação completa em ambas as fitas de DNA (hipermetilação); metilação em apenas um dos filamentos de DNA (hemimetilação); e sem metilação em ambas as fitas do DNA (hipometilação). O papel da metilação do DNA em doenças humanas foi explorado primeiro no contexto do imprinting genômico. Se esse padrão for estável e herdável durante a mitose, levará consequentemente a uma expressão diferenciada dos alelos paternos e maternos. Alterações no imprinting herdados via paterna ou materna, na região 15q11.2-q13, causam as síndromes de Prader-Willi e/ou Angelman. A literatura científica revela o papel da metilação do DNA em doenças humanas comuns, por exemplo, as doenças autoimunes, as relacionadas à obesidade, incluindo as doenças cardiovasculares, que permitiram potencializar o desenvolvimento de testes diagnósticos baseados na detecção da metilação do DNA livre de células circulantes (cfDNA) no plasma. Os distúrbios neurológicos também são doenças nas quais se acredita que a metilação do DNA tenha um papel crucial. Supõe-se que alterações no perfil de metilação do DNA levem à expressão diferencial de genes relacionados à atividade sináptica, regulando o nível de expressão de genes associados à fisiopatologia do autismo e da síndrome de Rett, como o fator neurotrófico derivado do cérebro. 36 Unidade I Um caso especial de mutações de inserção são as doenças de expansão de repetição de nucleotídeos, normalmente doenças de repetição tripla. Repetições trinucleotídicas são sequências repetitivas nas quais os tripletos de nucleotídeos são repetidos em conjunto várias vezes; em alguns casos, essas repetições estão localizadas em sequências de codificação e são traduzidas como extensões de polipeptídeo, consistindo em uma repetição do mesmo aminoácido. Outras repetições de trinucleotídeos estão localizadas em sequências não codificantes. É possível que a presença de repetições expandidas em uma transcrição seja patogênica, causando efeitos deletérios para o mecanismo de processamento de RNA no núcleo. A sequência de repetições trinucleotídicas é frequentemente (CAG)n ou (CTG)n, sendo n é o número de unidades de repetição. Um aspecto incomum dessas repetições é que elas podem se tornar instáveis e se expandir, de modo que o número de repetições aumenta dramaticamente de uma geração para a outra, um fenômeno denominado antecipação. Além disso, as repetições (acima de um certo número) podem ser instáveis por meio da divisão celular somática, e as células de alguns tecidos apresentam um número extremamente variável de repetições no alelo expandido. Em todos os casos conhecidos de distúrbios de expansão por repetição de trinucleotídeos, indivíduos portadores de várias repetições até um limiar não apresentam sintomas clínicos, enquanto indivíduos portadores de repetições mais longas denotam sintomas progressivamente graves. A doença de Huntington (HD) é uma das doenças de expansão de repetição trinucleotídica cuja repetição CAG afeta a poliglutamina na região codificadora do gene HTT da huntingtina no cromossomo 4p16. É uma doença neurodegenerativa progressiva, e os pacientes sofrem de perda e atrofia progressivas de células neurais. Os sintomas começam com mudanças de personalidade e humor, seguidas por uma deterioração constante das habilidades físicas e mentais. A função da proteína huntingtina não é clara, mas é essencial para o desenvolvimento. A herança segue um padrão autossômico dominante, causado por um ganho de função associado à expansão repetida. Indivíduos não afetados carregam entre 9 e 35 repetições CAG: ocorre penetração incompleta em portadores de 36 a 39 repetições, e a doença é totalmente penetrante quando 40 ou mais repetições estão presentes. Há relatos de alelos contendo 250 ou mais repetições. Enquanto alelos repetidos de 9 a 30 são quase sempre transmitidos sem alteração para a próxima geração, alelos maiores mostram instabilidade, tanto nos tecidos somáticos quanto na linha germinativa, com tendência à expansão de uma geração para a próxima geração. Existe uma correlação entre o número de repetições e a gravidade da doença e também uma correlação inversa entre o número de repetições e a idade de início da doença. O grau de instabilidade de repetição é amplamente proporcional ao número de repetições e também é afetado pelo sexo do progenitor transmissor, com expansões maiores ocorrendo na transmissão masculina. Isso leva à antecipação, ou seja, um indivíduo aparentemente saudável pode ter um filho com HD tardia e um neto com sintomas mais graves e um início mais precoce, e assim por diante. 37 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Por fim, com relação à UPD (uniparental dissomy – dissomia uniparental), trata-se de um fenômeno que consiste em um erro na segregação cromossômica entre cromossomos homólogos ou cromátides-irmãs durante a gametogênese, causando o envio de duas cópias de um determinado par cromossômico de mesma origem parental. Normalmente, quando esse efeito acomete um gameta, após a fecundação é originado um zigoto trissômico (com três cópias de um determinado cromossomo). Durante os primeiros estágios, ocorre um evento denominado resgate trissômico, tornando a célula dissômica (com dois cromossomos). Entretanto, durante o resgate trissômico, algumas vezes o cromossomo que foi enviado por cópia única é removido, permanecendo o parcromossômico de mesma origem parental. Assim, quadros sindrômicos são originados, como as conhecidas síndromes de Prader-Willi e Angelman. Quanto aos fatores que podem alterar o padrão do heredograma de doenças monogênicas, destacam-se quatro: • Penetrância: relaciona-se à possibilidade de indivíduos portadores de um genótipo expressarem o fenótipo. Em indivíduos com genótipo e sem fenótipo, dizemos que o gene tem penetrância incompleta. • Heterogeneidade: associa-se a doenças que têm fenótipos semelhantes, sendo originadas por genótipos distintos ou vice-versa. • Pleiotropia: relaciona-se com a presença de múltiplos fenótipos originados de um único gene ou par de genes alterados. • Expressividade: alude-se à expressão do fenótipo a partir de um genótipo. Diz-se que um gene tem expressividade variável quando pessoas com o mesmo genótipo têm fenótipos distintos, ou seja, as manifestações clínicas são diferentes em indivíduos com a mesma anormalidade genética. 3 GENÉTICA DE POPULAÇÕES: COMO ESTUDAR FREQUÊNCIAS GÊNICAS E GENOTÍPICAS EM UMA DETERMINADA POPULAÇÃO A genética populacional é o estudo da frequência da distribuição genotípica e gênica em uma determinada população. Os genes da espécie humana são polimórficos, ou seja, podem se apresentar com diferentes sequências de nucleotídeos, que os tornam diferentes de seus alelos selvagens (clássico). O cálculo das frequências gênicas e genotípicas são essenciais para verificar o impacto e a inserção desses genes polimórficos em uma determinada população. Por exemplo, na população brasileira existe um gene com um determinado polimorfismo que predispõe aos indivíduos que o portam serem obesos. A frequência desse polimorfismo na população poderá informar o número de pessoas dessa mesma população que tem predisposição à obesidade. Com isso, modelos matemáticos são usados para investigar e prever a ocorrência de alelos específicos ou combinações de alelos em populações. Os fatores que influenciam a diversidade genética em uma população são: tamanho amostral, variantes genômicas, seleção natural, diversidade ambiental, migração e padrões de cruzamentos não aleatórios. 38 Unidade I O princípio de Hardy-Weinberg descreve e prediz um equilíbrio nas frequências gênicas e genotípicas em uma determinada população que se reproduz de maneira aleatória, de grande quantidade de pessoas, somente com alelos selvagens (não mutados), livres de seleção natural e sem fluxo migratório. Dessa forma, diz-se que essa população está sob panmixia e que o ambiente é extremamente controlado. A equação de Hardy-Weinberg deve ser usada para avaliar os processos evolutivos de diferenciação genética populacional. Considerando que existem dois alelos para um determinado lócus, chamaremos o alelo dominante (p) de A, e o alelo recessivo (q) de a. Assim, p será a frequência alélica de A e q será a frequência de a, logo, teremos que p + q = 1, uma vez que a soma desses dois alelos será igual a 100%. De acordo com o modelo de Hardy-Weiberg, teremos as frequências dos genótipos AA, Aa e aa representados, respectivamente, por p2, 2pq e q2. Assim, a equação de Hardy-Weinberg será definida por: p2 + 2pq + q2 = 1 As frequências gênica e genotípica são ferramentas utilizadas para verificar como está a distribuição de alelos e genótipos dentro de uma determinada população. Para compreender melhor o exposto, observe o exemplo a seguir: Em uma população de trezentos indivíduos, sabemos que fenotipica e, consequentemente, genotipicamente, temos cento e vinte pessoas com tipo sanguíneo MM, quarenta pessoas com tipo sanguíneo MN e cento e quarenta pessoas do tipo NN. Para calcular as frequências genotípicas, deve-se ter o seguinte raciocínio: • Quais são os genótipos presentes na população? — MM, MN e NN. • Qual o total de indivíduos na população? — Trezentos indivíduos, cada um tem um genótipo, portanto, trezentos genótipos. • Quantas pessoas apresentam cada um desses genótipos? — Genótipo MM = 120 — Genótipo MN = 40 — Genótipo MM = 140 • Para calcular as frequências de cada genótipo nessa população, basta dividir o número de cada genótipo pelo total da população: — Frequência do genótipo MM – 120/300 = 0,4 ou 40% 39 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA — Frequência do genótipo MN – 40/300 = 0,13 ou 13% — Frequência do genótipo NN – 140/300 = 0,47 ou 47% Assim, pode-se avaliar a frequência de cada genótipo em uma determinada população. A somatória das frequências genotípicas sempre deve ser igual a um inteiro, ou seja, 100%. Para calcular a frequência gênica, primeiro é preciso identificar quais genes estão presentes na população. Por exemplo, nessa população de trezentos indivíduos, caracteriza-se genotipicamente: cento e vinte pessoas com tipo sanguíneo MM, quarenta com tipo sanguíneo MN e cento e quarenta do tipo NN. Entretanto, há apenas dois genes que constituem os três genótipos: os genes M e N. Cada genótipo é formado pelo par de genes, logo, se na população existem trezentos genótipos, teremos obrigatoriamente seiscentos genes nessa população. Para calcular as frequências gênicas, deve-se adotar o seguinte raciocínio: • Verificar quantas vezes cada gene aparece em cada genótipo. — MM = cento e vinte genótipos. O gene M aparece duas vezes em cada indivíduo, consequentemente, teremos duzentos e quarenta genes M. — MN = quarenta genótipos. Os genes M e N aparecem uma vez em cada indivíduo, consequentemente, teremos quarenta genes M e quarenta genes N. — NN = cento e quarenta genótipos. O gene N aparece duas vezes em cada indivíduo, consequentemente, teremos duzentose e oitenta genes N. • Cálculo da frequência gênica: — Gene M = (240 + 40)/600 é 0,47 ou 47% — Gene N = (40 + 280)/600 é 0,53 ou 53% Assim, conhecer os padrões de herança, a genética de populações e o impacto dessas variantes nas doenças humanas é fundamental para a aplicabilidade e o desenvolvimento da genética médica e humana. 4 O GENOMA HUMANO E A GENÉTICA MÉDICA O estudo da genética humana revelou uma ampla aplicação desse conhecimento na medicina moderna. Hoje, conhecer o genoma de um indivíduo permite identificar e relacionar de que maneira as variantes do DNA podem impactar a saúde e os processos patogênicos do desenvolvimento humano. 40 Unidade I 4.1 A genética e os defeitos congênitos Defeitos congênitos (DCs) são definidos por anormalidades morfológicas, estruturais e/ou funcionais presentes nos organismos ao nascimento. De etiologia diversa, os defeitos congênitos podem ser originados por variantes no DNA ( cromossomopatias, variantes de ponto SNVs), CNVs (copy number variations – variações no número de cópias [de regiões genômicas]), indels (insertions and deletions – pequenas inserções e deleções genômicas), por anormalidades estruturais, por causas externas – ambientais, habituais e agentes danosos, por mecanismos físicos e de etiologia idiopática (sem causa definida). Os DCs estão presentes em cerca de 3 a 5% de todos os recém-nascidos vivos. Estes são classificados em dois grandes grupos: as anomalias maiores e menores. As anomalias maiores são aquelas de grande impacto clínico, de baixa frequência populacional, prejudicando a qualidade de vida do indivíduo. Por sua vez, as anomalias menores são aquelas de maior frequência populacional, as quais não trazem grandes complicações clínicas aos seus portadores. A tabela a seguir traz uma lista com exemplos de defeitos congênitos maiores e menores. Quadro 9 Defeitos congênitos maiores Defeitos congênitos menores Sistema nervoso central: holoprosencefalia, mielomeningocele, anencefalia etc. Microfosseta pré-auricular, apêndice pré-auricular Sistema cardiovascular: tetralogia e pentalogia de Fallot, CIA, CIV, transposição de grandes vasos etc. Nevo pigmentar, hemangiomas Sistema geniturinário: agenesia renal, rins em forma de ferradura, criptorquidia, hipogonadismo Apêndice digitiforme, hipogenitalismo Sistema musculoesquelético: displasias ósseas, hemicorpos Fendas
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