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Seção 1 SUA PETIÇÃO DIREITO PENAL Olá, estimados operadores do direito! Vamos iniciar os estudos na prática penal com tudo aquilo que há de mais importante para o correto desenvolvimento do Direito Penal e Processual Penal. O caso prático que trabalharemos diz respeito à prisão em flagrante de um agente que estava dirigindo embriagada e causou a morte de duas pessoas. Fulano de tal, brasileiro, solteiro, carteira de identidade número xxx, residente e domiciliado na rua xxx, nesta capital, estava numa boate com seus amigos comemorando seu aniversário de 18 anos. Durante toda a noite, ele bebeu várias taças de vinho, champanhe e cerveja, estando em estado avançado de embriaguez. Não obstante, pegou o seu veículo automotor de marca Porsche e foi embora para casa. Todavia, no meio do caminho, estando em velocidade dentro do permitido, dormiu no volante e subiu na calçada, atropelando duas pessoas que estavam no ponto de ônibus esperando para irem trabalhar, que morreram naquele exato momento. Na sequência, a Polícia Militar chegou até o local e constatou que Fulano de tal estava dormindo no volante, tendo algumas testemunhas no local que presenciaram o atropelamento conversado com os policiais militares. Após Fulano de tal ter recuperado os sentidos, foi sugerido que ele fizesse o teste do bafômetro, sendo que ele se recusou, mas ainda assim os policiais prenderam-no com base nos depoimentos de testemunhas, bem como pelo forte odor etílico que estava saindo de sua boca. Com sua prisão em flagrante, Fulano de tal fora encaminhado para a audiência de custódia que fora realizada duas semanas depois do fato. O fato se deu na comarca de São Paulo/SP. Em razão disso, Fulano de tal procura você como advogado (a) para participar da audiência de custódia. Na audiência de custódia, o membro do Ministério Público requer seja a prisão em flagrante convertida em prisão preventiva, pois uma pessoa rica, que estava bebendo sem limites e que pega Seção 1 DIREITO PENAL Sua causa! o carro em alta velocidade e atropela duas pessoas que estavam indo trabalhar deve ser mantida presa em razão da ordem pública. Além disso, o membro do Ministério Público entendeu que o crime era doloso contra a vida, uma vez que o agente atuou com dolo eventual por causa da embriaguez somada com a velocidade excessiva. O Juiz determinou que você manifestasse por escrito o que seria requerido pelo seu cliente. Você deverá realizar a peça processual cabível. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA Com o intuito de compreender os pontos atinentes ao novo instituto processual da audiência de custódia, importante destacar o seu endereço legal. Com previsão no art. 310, caput, CPP, a audiência de custódia tem o seguinte regramento legal, in verbis: Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência) I - relaxar a prisão ilegal; ou (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011). II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011). III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Fundamentando! http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art3 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art3 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art20 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12403.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm#art312... http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12403.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12403.htm#art1 De acordo o dispositivo legal citado, a audiência de custódia deveria ser realizada 24 horas depois do fato, o que não ocorrera, tendo em vista que o acusado ficou duas semanas preso até ser realizado o referido ato. A visão jurisprudencial é no sentido de que a audiência de custódia que for realizada além do prazo legal gera nulidade da prisão, conforme destaca-se abaixo decisão do Augusto Superior Tribunal de Justiça, nesse sentido: Em liminar, o ministro Rogerio Schietti determinou o relaxamento da prisão em flagrante. Segundo ele, a ilegalidade presente no caso justifica a não aplicação da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal, a qual, em princípio, impediria o exame do pedido da defesa antes da conclusão do julgamento do HC anterior no tribunal estadual. Segundo o relator, o artigo 1º da Resolução 213 do CNJ — em conformidade com decisão do STF na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347 — determina que toda pessoa presa em flagrante seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas, à autoridade judicial competente. Considerando que a prisão em flagrante se caracteriza pela precariedade, de modo a não se permitir a sua subsistência por tantos dias sem a homologação judicial e a convolação em prisão preventiva, identifico manifesta ilegalidade na omissão apontada, afirmou o ministro. Schietti frisou que, apesar de relaxar o flagrante, essa ordem não prejudica a possibilidade de decretação da prisão preventiva, se for concretamente demonstrada sua necessidade, ou de imposição de alguma medida alternativa prevista no artigo 319 do Código de Processo Penal. Ele lembrou a importância de o juiz avaliar a necessidade de manutenção da prisão preventiva, pois a medida atinge um dos bens jurídicos mais expressivos do cidadão: a liberdade. (HC 485.355) Para o Professor Renato Brasileiro, conceitua-se a audiência de custódia da seguinte forma: Na sistemática adotada pelo Pacote Anticrime (Lei n. 13.964/19), a audiência de custódia pode ser conceituada como a realização de uma audiência sem demora após a prisão em flagrante (preventiva ou temporária) de alguém, permitindo o contato imediato do custodiado com o juiz das garantias, com um defensor (público, dativo ou constituído) e com o Ministério Público. (LIMA, 2020, p. 1017) Assim, o aluno deve atentar-se para a demora na realização da audiência de custódia como sendo um sinal de que a prisão se tornara ilegal, devendo esse fato ser corrigido por meio da peça adequada ao caso. Em relação aos elementos da prisão preventiva, o membro do Ministério Público fundamentou o seu pedido no fato de o acusado ser pessoa rica, sem qualquer elemento a mais. Ora, isso por si só não autoriza a aplicação do art. 312, CPP, com base na garantia da ordem pública, devendo existir elementos concretos de que o acusado solto poderá voltar a delinquir, fugir para outro país ou ameaçar testemunhas. O simples fato de ser rico não tem o condão de gerar um decreto prisional. Tamanha a importância do artigo 312, CPP, transcreve-se para fácil compreensão: Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. Outra questão levantada pelo membro do Ministério Público é que o acusado estava dirigindo o seu veículo automotor em alta velocidade e embriagado, o que por si só já o enquadraria na figura do dolo eventual, devendo ser submetido a um julgamento mais severo dentro dos crimes dolosos contra a vida no Tribunal do Júri. Essanão é a visão do Supremo Tribunal Federal quando tratou a questão da embriaguez no volante com resultado morte, não sendo uma conta aritmética a existência de velocidade excessiva mais embriaguez como resultado de dolo eventual, nesse sentido: A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu, na tarde do dia 06.09, Habeas Corpus (HC 107801) a L.M.A., motorista que, ao dirigir em estado de embriaguez, teria causado a morte de vítima em acidente de trânsito. A decisão da Turma desclassificou a conduta imputada ao acusado de homicídio doloso (com intenção de matar) para homicídio culposo (sem intenção de matar) na direção de veículo, por entender que a responsabilização a título “doloso” pressupõe que a pessoa tenha se embriagado com o intuito de praticar o crime. O julgamento do HC, de relatoria da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, foi retomado hoje com o voto-vista do ministro Luiz Fux, que, divergindo da relatora, foi acompanhado pelos demais ministros, no sentido de conceder a ordem. A Turma determinou a remessa dos autos à Vara Criminal da Comarca de Guariba (SP), uma vez que, devido à classificação original do crime [homicídio doloso], L.M.A havia sido pronunciado para julgamento pelo Tribunal do Júri daquela localidade. A defesa alegava ser inequívoco que o homicídio perpetrado na direção de veículo automotor, em decorrência unicamente da embriaguez, configura crime culposo. Para os advogados, “o fato de o condutor estar sob o efeito de álcool ou de substância análoga não autoriza o reconhecimento do dolo, nem mesmo o eventual, mas, na verdade, a responsabilização deste se dará a título de culpa”. Sustentava ainda a defesa que o acusado “não anuiu com o risco de ocorrência do resultado morte e nem o aceitou, não havendo que se falar em dolo eventual, mas, em última análise, imprudência ao conduzir seu veículo em suposto estado de embriaguez, agindo, assim, com culpa consciente”. Ao expor seu voto-vista, o ministro Fux afirmou que “o homicídio na forma culposa na direção de veículo automotor prevalece se a capitulação atribuída ao fato como homicídio doloso decorre de mera presunção perante a embriaguez alcoólica eventual”. Conforme o entendimento do ministro, a embriaguez que conduz à responsabilização a título doloso refere-se àquela em que a pessoa tem como objetivo se encorajar e praticar o ilícito ou assumir o risco de produzi-lo. O ministro Luiz Fux afirmou que, tanto na decisão de primeiro grau quanto no acórdão da Corte paulista, não ficou demonstrado que o acusado teria ingerido bebidas alcoólicas com o objetivo de produzir o resultado morte. O ministro frisou, ainda, que a análise do caso não se confunde com o revolvimento de conjunto fático-probatório, mas sim de dar aos fatos apresentados uma qualificação jurídica diferente. Desse modo, ele votou pela concessão da ordem para desclassificar a conduta imputada ao acusado para homicídio culposo na direção de veículo automotor, previsto no artigo 302 da Lei 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro). (HC 107.801/SP, STF) Observar, por fim, o seguinte dispositivo: Artigo 5º, inciso LXV da CR/88 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LXV- a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; Para elaborarmos uma peça prático-profissional que visa à liberdade da pessoa precisamos responder às seguintes indagações. 1 – após a audiência de custódia qual tipo de peça caberia? Poderia ser liberdade provisória ou relaxamento de prisão em flagrante, mas como a prisão é ilegal, resta apenas a última. 2 – a prisão é legal ou ilegal? Ilegal. 3- os requisitos da prisão preventiva estão presentes? Não estão na forma do art. 312, CPP. A origem da audiência de custódia está no Pacto de San Jose da Costa Rica. artigo 7, item 5, da CADH: "Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais". Esse importante Tratado Internacional de Direitos Humanos goza de status de norma Supralegal no ordenamento jurídico brasileiro e a sua obrigatoriedade inicial decorreu da ADPF 347 do STF e da Resolução 213, do CNJ. PONTO DE ATENÇÃO Vamos peticionar! Respondidas essas perguntas poderemos começar a desenvolver a nossa peça. 1 – Sempre importante fundamentar, inicialmente, com algum artigo da Constituição Federal, notadamente o artigo 5º. 2 – Após a utilização de um artigo da Constituição Federal é interessante que se utilize um ou mais artigos da legislação infraconstitucional e evidentemente explique o motivo da citação legal. 3 – Precisamos utilizar também a doutrina, se possível mais de um doutrinador com o mesmo entendimento. A utilização de uma doutrina atual enriquece qualquer peça. 4 – Não podemos deixar de utilizar uma jurisprudência atual acerca do assunto debatido. Deve-se preferir jurisprudência de Tribunais superiores, como Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. Atenção: Jurisprudência são decisões reiteradas dos Tribunais, decisões isoladas devem ser evitadas. 5 – Se possível utilizar súmulas, vinculantes e/ou não vinculantes. A primeira coisa a se fazer em uma peça processual é o endereçamento, ou seja, precisamos saber de quem é a competência para analisar aquele fato. Por esse motivo antes de ajuizar uma ação ou apresentar qualquer peça processual é necessário que o aluno conheça as regras de competência. As questões da OAB sempre demonstram onde se deu o fato, o que fica claro de atestar a competência. Após o endereçamento precisamos realizar um preâmbulo, nele colocaremos todos os dados das partes. Nunca se deve inventar dados nas peças práticas da OAB, pois isso identifica a sua prova, o que irá desclassificá-lo. Após o preâmbulo iniciaremos os fatos, que nada mais são que a história contada pelo examinador. Após a narrativa dos fatos iniciaremos os fundamentos jurídicos. É nesse ponto que você demonstra seu conhecimento. Portanto, faça com muita atenção e demonstre para o seu examinador que você conhece do assunto. Após a fundamentação é hora de fazer os pedidos. Cuidado! Você só pode pedir o que fundamentou. Essas são as chamadas dicas de ouro e tenho certeza de que com esse roteiro mental será fácil compreender e colocar em prática todos os seus poderes para uma escorreita peça prático- profissional. Vamos peticionar? Referências BRASIL. Decreto lei 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto- Lei/Del3689.htm. Acesso em 01 de setembro de 2021. BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em 01 de set. 2021. LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal: volume único-8ª ed.- Salvador: Ed. JusPodium, 2020. TÁVORA, Nestor; ALENCAR Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 14. ed. Salvador: Ed. JusPodium, 2019. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm
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