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1 Juliana F. M. de Camargo I Turma IV I 2020.2 – Definição: . É uma doença hereditária caracterizada pela alteração dos glóbulos vermelhos do sangue, tornando-os parecidos com uma foice . Essas células passam por uma alteração na membrana e rompem-se mais facilmente, causando anemia. . Transmissão: Gene semidominante . Manifestação: Homozigose: HbS/HbS = doença Heterozigose: HbA/HbS= estigma ou traço falcêmico Obs.: Traço Falcêmico - Sem manifestações clínicas e hematológicas evidentes - <50% HbS eritrócito: sem cristalização - Crise presente em condições baixas de O2 - Pacientes NÃO indicados para doação de sangue Causas: 1) β hemoglobinopatia hereditária – HbS 2) Mutação genética no cromossomo 11 que codifica cadeia β da globina 3) Substituição de uma base nitrogenada no códon GAC para GTC no RNAm 4) Troca de ácido glutâmico pela valina . Presença do ácido glutâmico: - Eletronegatividade - Afastamento das moléculas de Hb deoxigenadas . Presença da valina: - Neutralidade - Favorece a polimerização e formação de tactóides 5) Presença de HbS (α2β2 6 glu-val) Epidemiologia: . Comum em indivíduos da raça negra No Brasil, representam cerca de 8% dos negros, mas devido à intensa miscigenação historicamente ocorrida no país, pode ser observada também em pessoas de raça branca ou parda . Incidência: - Região central da África - Países do Mediterrâneo - Índia Fisiopatologia: 1) Mutação no gene da globina β 2) Leva a formação da hemoglobina S (HbS) 3) A hemoglobina S sofre polimerização das moléculas de hemoglobina anormal quando desoxigenadas 2 Juliana F. M. de Camargo I Turma IV I 2020.2 4) A HbS leva a uma deformação na hemácia quando tiver desoxigenação, pH baixo (ambiente ácido ou em situação de estresse) e temperaturas baixas 5) Essas hemoglobinas irão sofrer polimerização (polímeros longos e insolúveis) 6) A partir da polimerização - Alteração na forma do eritrócito (foice ou depranócito) - na capacidade de deformidade (facilita formação de trombos) POLIMERIZAÇÃO: - A porção hidrofóbica da cadeia β na posição 6 da valina projeta-se formando uma ligação com a fenilalanina ou leucina de outra cadeia globínica - Agregação de 30 tetrâmeros formam um núcleo onde outros tetrâmeros poderão se aderir formando um polímero - Agregação de fibras aos polímeros formados e produção de feixes paralelos chamados tactóides Obs.: Desoxigenação RÁPIDA → pequenos polímeros → não altera o formato da hemácia Desoxigenação LENTA E/OU PARCIAL→ formação de longos polímeros → alinhamento de fibras → células em foice ou depranócitos . Hemoglobina fetal INIBE a polimerização Obs.: Ao nascer, apresentamos grande quantidade de hb fetal, na fase adulta há uma queda na sua produção . Hemoglobina A participa pouco do processo de polimerização, se temos um indivíduo que produz HbA (contém o traço talassêmico) e não tem os dois genes da HbS, ou seja, indivíduos heterozigotos terão menos anormalidades clínicas, a HbA protegerá a hemácia das deformidades, da falcização Cinética da falcização: . Processo reversível com a reoxigenação . Repetição desse processo promove lesão da membrana e se torna irreversível - A persistência da forma de foice, gera: da meia vida da hemácia Inflamação Obstrução vascular (essa hemácia não é tão maleável e é mais aderente/pegajosa) . Células falcizadas: ✓ Aumentam a viscosidade do sangue ✓ Diminuem o fluxo sanguíneo ✓ Aumentam o grau de falcização ✓ Promovem alterações na membrana eritrocitária Vaso- oclusão: . Geralmente na microcirculação . Pode afetar grandes artérias principalmente pulmões e cérebro . Envolve interação de hemácias, leucócitos ativados, plaquetas, células endoteliais e proteínas plasmáticas ________________________________FISIOPATOLOGIA: 1) Hemácias fragilizadas em forma de foice rompem (ação do endotélio) 2) Liberam hemoglobina intravascular (é danosa), essa hemoglobina intravascular causa dano e ativação das células endoteliais 3) Levam a uma resposta inflamatória vascular (há liberação de citocinas e outras células), leva a adesão de células brancas e vermelhas na parede e vasoconstrição 3 Juliana F. M. de Camargo I Turma IV I 2020.2 EM RESUMO: - Processos associados a vaso-oclusão: . Ação do endotélio . Inflamação . Adesão celular . Queda do óxido nítrico . Ativação de plaquetas e da coagulação . Aumento do estresse oxidativo Obs.: A adesão de células brancas e vermelhas levam a de óxido nítrico, importante vasodilatador, ou seja, teremos uma ação mais vaso-oclusiva, além da ativação das plaquetas e da coagulação, teremos também um do estresse oxidativo _______________________________COMPLICAÇÕES: ▪ Priapismo ▪ Síndrome Torácica Aguda ▪ Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC) ▪ Úlceras crônicas Padrões de Herança: HEMOGLOBINA S . Em heterozigose confere vantagem seletiva contra o Plasmodium falciparum . Houve do gene HbS em regiões onde a malária foi endêmica . Prevalência nos afrodescendentes HEMOGLOBINA SS = ANEMIA FALCIFORME Homozigose para o gene βS . Forma + grave das síndromes . Ausência de HbA . de HbF Heterozigose para hemoglobina S . Indivíduo com traços talassêmicos . Sem anormalidades hematológicas significativas . Podem ser raramente observadas hemácias falciformes . NÃO necessitam de tratamento, apenas aconselhamento genético . No Brasil há 2 milhões de heterozigotos AS ________________________COMPLICAÇÕES RENAIS: ✓ Hematúria (geralmente, simples e transitória) ✓ Redução da capacidade de concentra urina ✓ Infecções urinárias mais frequentes na gravidez _________________________COMPLICAÇÕES RARAS: ✓ Falcização em procedimentos cirúrgicos ✓ Glaucoma agudo após sangramento intraocular ✓ Infartos esplênicos em situações de hipóxia ✓ Maior risco de trombose venosa profunda ✓ Maior incidência de carcinoma medular renal HEMOGLOBINA SC . HEMOGLOBINA C: variante estrutural da cadeia β da globina . Evolução mais benigna do que Hb SS, porém pode apresentar TODAS as complicações da anemia falciforme S/ β Talassemia: S/β0 talassemia: . Ausência de Hb A . Mais grave, semelhante a SS . Microcitose, hipocromia e aumento de HbA2 . Estudo familiar é essencial para entender de onde vem o gene S/ β+ talassemia: . Quantidades reduzidas de HbA . Clínica grave a moderada Obs.: S/ β Talassemia é rara em afrodescendentes, visto que o gene da talassemia é frequente na Europa, na população branca Diagnóstico laboratorial: ELETROFORESE DE HEMOGLOBINA: . Feito na triagem neonatal (teste do pezinho) . Faz-se eletroforese de Hb em pH alcalino para detectar HbS 4 Juliana F. M. de Camargo I Turma IV I 2020.2 Obs.: Hemoglobina S TEM que estar presente em casos de síndromes falciformes ____________________ACHADOS NO HEMOGRAMA: HEMOGLOBINA: 6-10 g/dL na fase estável Anemia normocítica e normocrômica com anisocitose Reticulócitos ESFREGAÇO DE SANGUE PERIFÉRICO: ✓ Hemácia no formato de foice ✓ Corpos de Howell- Jolly (pontos pretos na hemácia) . Sinal de que a hemácia está velha, provavelmente, o baço não está funcionando. Esses indivíduos tendem a sofrer autoesplenectomia, por causa de microtromboses o baço deixa de ser funcional o aumento súbito do baço e a redução intensa da Hb pode evoluir para choque hipovolêmico ✓ Hipofunção esplênica LEUCOCITOSE: - Às vezes com desvio à esquerda - Não necessariamente associada a infecção PLAQUETOSE: - Pode atingir1.000.000/μL (isso ocorre por causa do estímulo da medula óssea) PROVAS DE COAGULAÇÃO NORMAIS: - Exceto nas crises vaso-oclusivas, podem indicar hipercoagulabilidade FERRITINA ↑ EM PACIENTES POLITRANSFUNDIDOS: - Podem desenvolver hemocromatose secundária, devem usar quelantes de ferro _____________________MARCADORES DE HEMÓLISE: Bilirrubina INDIRETA Haptoglobina sérica Urobilinogênio urinário . Ao fazer um mielograma: Hiperplasia eritróide da medula óssea PROVA DE FALCIZAÇÃO: 1) Uma pequena gota de sangue colhido com anticoagulante é colocada sobre uma lâmina de vidro e misturada com uma gota de solução de 0,5% de metabissulfito de sódio, preparada no momento do uso 2) Sobre a mistura, coloca-se uma lamínula de vidro, retira-se o excesso de sangue das bordas e vedam-se as bordas para impedir a entrada de ar 3) A vedação pode ser feita com parafina, esmalte de unha etc. 4) As leituras são realizadas após 1,2,6,12,24 e 48 horas (pode-se omitir as leituras intermediárias) as hemácias falciformes são reconhecidas por se apresentarem recurvadas e com “espículas” (ou prolongamento) nas extremidades Quadro clínico: 1) Fase estável: . Sem manifestação clínica 2) Crises de falcização: 2.1) Vaso-oclusivas . Episódios dolorosos 2.2) Aplásticas 2.3) Hemolíticas 2.4) De sequestro 2.1) Crises VASO-OCLUSIVAS: . Manifestação clínica mais comum das doenças falciformes . Frequência e intensidade variadas 5 Juliana F. M. de Camargo I Turma IV I 2020.2 . Causa: Falcização das hemácias - Provoca oclusão microvascular - Ocasiona isquemia de tecidos e resposta inflamatória aguda, isso provoca DOR no paciente dor nos ossos longos, articulações, região lombar, tórax, pelve, couro cabeludo, face... Obs.: Síndrome mão-pé/Dactilite - Afeta faixa pediátrica (6 meses aos 2 anos) - Dor, hiperemia e inchaço agudo de mãos e pés - Autolimitadas, resolve com tratamento de suporte - Diagnóstico diferencial: osteomielite . Fatores desencadeantes: - Infecção - Desidratação - Tensão emocional - Tempo frio - Período pré-menstrual - Gravidez . Ocorre, principalmente, na 3ª-4ª década de vida . Mortalidade maior em adultos ______________________Crise vaso-oclusiva GRAVE: . Necessita de tratamento hospitalar com analgésico parenteral por mais de 4 horas . Se o paciente teve 3 ou mais episódios graves em 1 ano definem evolução clínica GRAVE pense em trocar o tratamento ou aconselhar o paciente para aderir, caso não esteja tratando 2.2) Crises APLÁSTICAS: . Queda acentuada da hemoglobina . Reticulócitos reduzidos* ou seja, insuficiência na produção das hemácias (Insuficiência transitória da eritropoiese) . Única crise que afeta a medula óssea . Causas: Infecção pelo Parvovírus B19 . 68% dos casos ocorrem nas crianças . Causas em adultos: Infecção pelo Streptococcus pneumoniae, Salmonelas, Vírus Epstein- Barr . Diagnósticos diferenciais: - O2 com tensão supramáxima por 2 dias (iatrogenia), pode levar a um quadro de supressão da medula óssea que simula crise aplástica - Deficiência de ácido fólico (B9): especialmente em grávidas * . Esse paciente tem que produzir muitas hemácias, quanto mais produz, mais consome B9 . Consequências: - Necrose medular óssea extensa - Febre - Reação leucoeritroblástica 2.3) Crises HEMOLÍTICAS: . Importante da hemólise . Secundário à: - Infecção por Mycoplasma - Deficiência de G6PD - Associação com esferocitose hereditária . Consequências: Agravamento da anemia Piora da icterícia . Diagnósticos diferenciais: - Obstrução por cálculo vesicular (como tem muita bilirrubina, pode formar cálculos) - Falcização com colestase intra-hepática - Hepatite 2.3) Crises DE SEQUESTRO ESPLÊNICO: . Acúmulo rápido de sangue no baço, ou seja, “sequestra” o sangue (Ex.: do coração e cérebro) . Complicação que exige tratamento emergencial . Definição: - Queda de pelo menos 2g/dL da hemoglobina - Hiperplasia compensatória da medula óssea ( de reticulócitos) - Rápido aumento do baço (aumenta porque está enchendo de sangue, rouba cada vez mais sangue porque está aumentando seu tamanho/capacidade) . Acomete a fase pediátrica (6 meses e 2 anos de idade) Pois paciente com anemia falciforme, devido as microtromboses, ele sofre autoesplenectomia (o baço perde sua função) . Responsável por 10-15% dos óbitos nos primeiros 10 anos de vida do paciente falciforme INFECÇÕES: 6 Juliana F. M. de Camargo I Turma IV I 2020.2 . Principal causa de mortalidade e morbidade na anemia falciforme . Suscetibilidade a infecções bacterianas causadas principalmente pela disfunção esplênica secundária a múltiplos infartos com ocorrência de asplenia funcional. Exemplo: as crianças são mais propensas a desenvolver pneumonia e meningite . Principais agentes infecciosos: - Haemophilus influenza - Neisseria meningitidis - Escherichia coli - Enterobacter sp - Klebsiella sp - Streptococcus pneumoniae - Staphylococcus aureus - Salmonella typhimurium causa osteomielite nos pacientes - Mycoplasma sp ________________________CONSEQUÊNCIAS: Síndrome Torácica Aguda (STA): - Dor torácica - Febre - Dispneia - Opacidade nova no RX de tórax - Queda da hb - Pode evoluir com hipóxia grave - Importante causa de óbito e hospitalização . Causas da STA: - Infarto de costela ou esterno - Pneumonia - Embolia pulmonar - Infarto pulmonar por falcização Complicações neurológicas: 1) Acidente Vascular Encefálico (AVC) 2) Hemorragia cerebral associada com moya moya (consiste em neovascularização que forma novelos vasculares frágeis e dilatados) 3) Estão sujeitos pelas microtromboses a ataques isquêmicos transitórios . Tratamento: - Em situações vaso-oclusivas no SNC: Transfusão de concentrado de hemácias - Isso impede a progressão e pode até reverter o quadro clínico - Objetivo: Deixar os níveis de HbS < 30% . Diagnóstico: - Doppler ultrassonográfico transcraniano . Detecta precocemente lesões . feito principalmente em crianças . Observa altas velocidades, se há ↑ velocidade do fluxo, grande chance de AVE, já inicia esquema de transfusão crônica Complicações genitourinárias: 1) Hematúria . Normalmente transitória 2) Proteinúria . Glomeruloesclerose periférica focal e segmentar 3) Priapismo . Ereção involuntária e dolorosa . Conduta: - Hidratação - Repouso - Transfusão de troca visando HbS < 30% - Hidroxiureia pode auxiliar . Se caso, falhar, pode ser necessário intervenção cirúrgica (drena o corpo cavernoso com uma seringa) . Complicação: - Disfunção erétil Outras complicações: 1. Oftalmológicas 2. Osteoarticulares - Necrose asséptica da cabeça do fêmur 3. Cutâneas - Úlcera de perna (ocorre mais frequentemente próximo aos tornozelos, a partir da adolescência) 4. Hepatobiliares 5. Gestacionais Tratamento da anemia falciforme: . Conduta: . Acompanhamento em centro especializado - Abordagem multidisciplinar . Possuem benefício de reposição de ácido fólico 5mg/dia (hiperplasia eritropoética) . Profilaxia de infecções . Uso de hidroxiureia em pacientes selecionados . Tratamento das crises e complicações 7 Juliana F. M. de Camargo I Turma IV I 2020.2 _____________________________Uso de hidroxiureia: Síntese de Hb fetal . Indicação: ✓ SS, S/B- TALASSEMIA ✓ Crises dolorosas frequentes (3 ou + internações em 12 meses) ✓ História de síndrome torácica aguda ✓ Anemia grave ✓ Outra complicação vaso-oclusiva grave. Ex.: Priapismo Crises VASO- OCLUSIVAS: 1. Tratar fator desencadeante . Hidratação vigorosa oral e/ou endovenosa Obs.: Adulto sem complicações:3L/dia Se o paciente tiver internado, calcular balanço hídrico 2. Analgesia adequada para alívio da dor Obs.: Medidas não farmacológicas, farmacológicas e demais medidas necessárias . Analgésicos comuns . Opioides se necessário INFECÇÕES: 1. Vacinação de acordo com o calendário + penumococo 2. Penicilina profilática por via oral ou benzatina a cada 21 dias (na faixa pediátrica dos 2-3 meses de idade até os 5 anos de vida) Obs.: TRATAR TODO EPISÓDIO FEBRIL COMO POTENCIALMENTE FATAL SÍNDROME TORÁCICA AGUDA: 1. Antibioticoterapia agressiva 2. Antibióticos de amplo espectro 3. Manter SO2 > 92% (Crise torácica tem queda de saturação, quanto menos oxigênio, mais hemácias falciformes) 4. Transfusões simples ou de troca de acordo com a clínica Terapia transfusional: Objetivo: HbS < 30% - Simples: oferece 1 bolsa de concentrado de hemácias . Indicação: ✓ Hb < 5g/dL é clínica de anemia significativa ✓ Angina ou insuficiência cardíaca ✓ Hemorragia aguda ✓ Sequestro esplênico ou hepático ✓ Crise aplástica ✓ Pré-operatório - Transfusão de troca: (primeiro “doa” o sangue, depois entra com o concentrado livre de HbS) . Indicação: ✓ Acidente Vascular Encefálico ✓ Síndrome Torácica Aguda ✓ Insuficiência de múltiplos órgãos ✓ Priapismo agudo ✓ Cirurgia do sistema nervoso central ✓ Prevenção de AVE recorrente em crianças com AVE agudo - Controversas: . Indicação: ✓ Úlceras de pernas ✓ Gravidez ✓ Episódio doloroso que não responde ao tratamento ✓ Adultos com história de AVE ✓ Antes do uso de contraste hipertônico Transplante de células-tronco hematopoiéticas experimentais: Objetivo: Tratamento curativo para doença falciforme Retira a medula óssea defeituosa do paciente que produz hemácias com hemoglobina S e coloca medula óssea de um doador “normal” (Troca a fábrica) . Indicação: ✓ Crianças com casos graves . Índice de mortalidade e pode ter complicações piores do que as próprias complicações da anemia falciforme
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