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Thaís Silva Batista | 6º Semestre Medicina - UniFtc Fisiologia do crescimento O crescimento humano é um processo dinâmico, tem início na concepção e prossegue por vários estágios do desenvolvimento. Depende do sistema neuroendócrino (hormônios e fatores de transcrição), além de fatores genéticos, nutricionais e ambientais que se combinam para determinar a altura do indivíduo. O hormônio do crescimento (GH) é um dos principais reguladores do crescimento humano. É secretado de forma pulsátil pelos somatotrofos da hipófise anterior, sob a ação do hormônio liberador do hormônio do crescimento (GHRH) e da somatostatina, ambos sintetizados no hipotálamo como resultado de influências sistêmicas e corticais. O GH, hormônio mais abundante da hipófise, é liberado na circulação sistêmica, e a maior parte (60%) liga-se à proteína carreadora do GH. Sob o estímulo do GH, o fator de crescimento semelhante à insulina-1 (IGF-1) é produzido no fígado, sendo o principal responsável pelo crescimento. O equilíbrio entre o GHRH (estimulador) e a somatostatina (inibidora) é controlado por uma série de fatores neurogênicos, metabólicos e hormonais, em especial os hormônios tireoidianos, glicocorticoides, esteroides sexuais e o IGF1 (o IGF1 também interfere negativamente na secreção de GH, estimulando em retroalimentação). A ghrelina (produzido no estômago, hipófise e outros tecidos) também é um importante liberador de GH e age pelo receptor específico, GHSR. A dopamina também estimula a GHRH. O GH pode exercer efeitos diretos sobre as respostas celulares por sua ligação ao receptor do GH (GHR) nos tecidos alvo e, de forma indireta, pela estimulação da produção e da liberação do IGF1. O IGF1 está presente na circulação em complexos de proteína, a principal é a IGFBP3, à qual se ligam 70 a 95% do IGF1 circulante. Ela faz parte de um grande complexo ternário constituído por uma molécula de IGF1, uma molécula de IGFBP3 e uma molécula de uma proteína denominada subunidade ácido-lábil (ALS) = complexo ternário. Ambas (IGFBP3 e ALS) são produzidas no fígado sob efeito direto do GH. Menos de 1% do IGF1 circulante encontra-se no estado livre. Crescimento normal O crescimento pode ser dividido em quatro estágios distintos: → Intrauterino: maior velocidade de crescimento; → Lactância: após o nascimento, começa a fase de desaceleração; → Infância: crescimento prolongado e constante → adolescência: curta desaceleração fisiológica antes do estirão puberal. Após o término do estirão puberal há um crescimento residual final. Período de crescimento cm/ano Nascidos até 12 meses 20 a 28 12 a 24 meses 10 a 12 24 a 26 meses 7,5 a 10 2 anos até a puberdade 5 a 6 Estirão puberal Meninas 8 Meninos 10 Velocidade de crescimento anual esperada por faixa etária Baixa estatura Qualquer criança cuja altura se encontre abaixo do percentil 2 ou 3, vai depender do gráfico utilizado. É preciso avaliar também o potencial familiar e colocar a criança na curva de crescimento. ❖ São 3 as características que nos permitem definir uma baixa estatura: 1. Estatura abaixo do percentil 3 (≥ –2 desvios padrões da média para idade, sexo e etnia); 2. Redução da velocidade de crescimento para percentis mais baixos (após os 18 a 24 meses de idade); Endocrinologia Pediátrica Distúrbios do crescimento 3. Altura significativamente abaixo do potencial genético (>1,5 Desvio padrão abaixo da média da altura dos pais). Como avaliar a baixa estatura? ❖ Anamnese História da moléstia atual: ▪ Informações sobre a gestação; ▪ Consanguinidade; ▪ Eventos perinatais, peso e comprimento ao nascer; ▪ Sinais ou história de doença crônica; ▪ Status psicossocial; ▪ Relacionamento familiar; ▪ História de crescimento da criança (gráficos de crescimento); ▪ Histórico alimentar (amamentação, introdução alimentar); ▪ História de crescimento de puberdade dos pais; Antecedentes familiares: ▪ História do crescimento e puberdade dos pais; ▪ Dados sobre altura dos pais: Cálculo da estatura alvo: - Meninos: altura do pai + altura da mãe + 13/2 - Meninas: altura do pai + altura da mãe – 13/2 *Resultado: + ou – desvio padrão (05cm). ❖ Exame físico ▪ Aferir altura: < 2 anos: Deitada; > 2 anos: Supina (estadiômetro de parede) ▪ Proporções corporais: - Envergadura: Criança com braços abertos; - Altura; - Segmento superior e inferior: IDADE SS/SI RN 1,7 03 ANOS 1,3 06 – 10 ANOS 1 *a partir dos 9 anos a relação SS/SI fica igual. ❖ Avaliar estigmas que possam indicar o diagnóstico de síndromes genéticas. ❖ Avaliar sinais clínicos de doenças sistêmicas crônicas ❖ Exames laboratoriais ▪ Hemograma: Para investigar anemia; ▪ Velocidade de hemossedimentação: para investigar doenças inflamatórias crônicas; ▪ TSH e T4: para investigar doenças tireoidianas; ▪ Parasitológico de fezes: para afastar parasitose; ▪ Perfil bioquímico sérico: cálcio, fósforo, fosfatase alcalina, creatinina, ionograma e albumina para afastar doenças osteometabólicas e doenças renais; ▪ Avaliação radiológica da idade óssea; ▪ Transaminases (TGO, TGP): para investigar doenças hepáticas. *Lembrar que a fosfatase alcalina depende da idade. ❖ Exames específicos ▪ Cariótipo: meninas com baixa estatura sem causa aparente (Turner); ▪ Anticorpos antitransglutaminase (IgA) e antiendomísio; suspeita de doença celíaca → distensão abdominal, diarreia, etc; ▪ IGF-1 e IGFBP-3: suspeita de deficiência de GH; ▪ Calprotectina fecal: na suspeita de doença inflamatória intestinal ou alergias alimentares; ▪ Gasometria venosa em crianças com idade menor ou igual a 3 anos: na suspeita de acidose tubular renal; ▪ Testes de estímulos para o GH: na suspeita de DGH; ▪ Radiografia de esqueleto: na suspeita de displasias ósseas.; ▪ RNM de crânio e sela túrcica. Por que não solicitar dosagem de GH? O GH não é solicitado porque é liberado de forma pulsátil e não contínua, isso faz com que sua variação seja detectada, inviabilizando o diagnóstico. Já o IGF-1 possui uma liberação estável, logo, podemos estimular a liberação de GH a partir da insulina, induzindo uma hipoglicemia (para níveis inferiores a 40) pois, uma vez que a glicose cai tem-se a liberação do GH e assim, se torna possível identificar se a origem do problema está na liberação desse hormônio. ❖ Idade óssea É um exame radiográfico da mão e do punho não dominantes, que pode ser empregado em ambos os sexos, para se avaliar o grau de amadurecimento dos ossos. Os métodos mais classicamente empregados são os de Greulich & Pyle e de Tanner & Withehouse. Se há uma diferença entre 1,5 e 2 anos para menos em relação à idade cronológica, consideramos que a idade óssea da criança está atrasada. Isso significa que a puberdade pode começar mais tarde do que o padrão e, consequentemente, o estirão puberal poderá ser mais tardio. O quadro pode ter relação com uma deficiência no hormônio de crescimento, hipotireoidismo ou padrão familiar de crescimento e desenvolvimento puberal, por exemplo. É considerado normal desvios de até 6 meses para lactentes e 12 meses para crianças maiores. Só tem valor a repetição do exame após intervalo de 12 meses. Causas de baixa estatura ❖ Variantes do crescimento fisiológico: ▪ Baixa estatura familiar: Estatura abaixo do terceiro percentil, dentro do alvo familiar, desenvolvimento puberal adequado para a idade e maturação óssea compatível com a idade cronológica; ▪ Retardo constitucional do crescimento e puberdade: Estatura abaixo do alvo familiar, atraso da idade óssea, início tardio da puberdade com história familiar de atraso; ❖ Doenças crônicas ▪ Desnutrição: ingestão proteico calórica inadequada e deficiências de vitaminas e sais minerais; ▪ Doenças renais: rins hipoplásicos, acidosetubular renal, nefrite crônica, proteinúria, uso de glicocorticoides; ▪ Doenças cardíacas: cardiopatias congênitas, insuficiência cardíaca congestiva; ▪ Doenças hematológicas: talassemia, anemia falciforme; ▪ Doenças gastrintestinais: doenças que cursam com a má absorção intestinal, doença inflamatória intestinal, doenças hepáticas crônicas, doença celíaca; ▪ Doenças respiratórias: asma, fibrose cística, uso de corticoides; ▪ Distúrbios imunológicos: doenças do tecido conjuntivo, artrite reumatoide juvenil; ▪ Infecções crônicas ❖ Doenças congênitas: ▪ Retardo do crescimento intrauterino ▪ Síndrome de Down ▪ Displasias esqueléticas: a) Osteocondroplasia (Acondroplasia) - Doença autossômica dominante; - Ocorre redução da velocidade de crescimento principalmente após 2 anos; - Anomalias esqueléticas: Macrocrania, ponte nasal baixa, lordose lombar e mãos curtas, rizomelia (extremidades curtas); b) Discondrosteose de LériWeill c) Osteogênese imperfeita ▪ Síndromes genéticas (Sd. Nonnan, progeria e turner) ❖ Doenças endócrinas: ▪ Hipotireoidismo: efeito importante no crescimento, associado com retardo puberal e da idade óssea; ▪ Deficiência de GH - Congênita: - Peso e altura normais ao nascimento; - Redução da velocidade de crescimento nos primeiros anos de vida; - Baixa estatura proporcional; - Retardo da idade óssea; - Pode gerar aumento de peso. *em casos mais graves de deficiência de GH: fronte proeminente, base nasal achatada e mandíbula pequena (fácies de boneca). ▪ Deficiência congênita GH ▪ Deficiência adquirida de GH ▪ Tumores hipotálamo-hipotalâmicos ▪ Histiocitose X ▪ Infecções do sistema nervoso central ▪ Traumatismo craniano Caso clínico 01 MCV, sexo masculino, 07 anos, procura o ambulatório de endocrinologia acompanhado pela genitora devido a quadro de ser mais baixo que os colegas da mesma idade. Refere que sempre foi menor que os colegas da mesma idade. Refere que sempre foi menor, mas a genitora nunca se preocupou muito pois a família toda é baixa, mas que resolveu fazer para uma avaliação. O menor se alimenta de forma adequada e realiza natação desde os 4 anos. AP: Nascido de parto normal e a termo, sem intercorrências, peso 3100 Kg e 50 cm. Nega patologias e uso de medicações. AF: Genitor com 1,65 e genitora com 1,55. Nega patologias na família. 1. O paciente tem baixa estatura? Quando se analisa o paciente na curva é possível perceber que ele está no percentil 15, mas são necessárias mais informações para opinar, como a altura dos pais, e a velocidade de crescimento. No caso do paciente MCV a estatura alvo com base na altura dos pais é: 165 (altura do pai) + 155 (altura da mãe) + 13 = 333/2 → 166,5 Após calcular a estatura tem-se que colocar a altura encontrada na curva para analisar se está dentro do seu padrão familiar, dessa forma é possível confirmar que o paciente NÃO tem baixa estatura. Paciente com velocidade de crescimento adequada e no canal familiar. Caso clínico 02 BNM, sexo masculino, 07 anos, foi ao ambulatório de endocrinologia com relato de ter nascido com baixo peso e desde o nascimento sempre foi menor que as crianças da mesma idade. Altura alvo: 1,80. 1. O paciente tem baixa estatura? É possível identificar uma baixa estatura pois se encontra abaixo do percentil 3 e no gráfico de crescimento é possível observar que a criança se encontra bem abaixo da altura esperada (1,80) com base na altura dos pais. Nem sempre é possível fechar o diagnóstico de baixa estatura apenas com o dado de que a criança “é a menor dentre as crianças da sua idade”, é necessário analisar a altura dos pais, estatura alvo, colocar na curva, analisar velocidade de crescimento e comparar as demais informações da caderneta, para poder dar o diagnóstico ou excluí-lo. Literatura recomendada/ fontes: ✓ Livro: Endocrinologia clínica: Lucio Vilar, sétima edição; ✓ Livro: O essencial em endocrinologia.