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CARLOS ADRIANO DE MELO SANTOS HISTÓRIA DA IGREJA MODERNA E CONTEMPORÂNEA PORTFÓLIO (CICLO 3) CEARÁ 2021 FICHAMENTO Referência da obra: KELLER, Eugenio Dirceu; MAZULA, Ronaldo. História da Igreja Contemporânea. Batatais, SP: Claretiano, 2013. 170 p. ISBN: 978-85-8377-021-3. UNIDADE 4: Séculos 19 e 20: A Era do Totalitarismo (pp. 105-125). IGREJA E QUESTÃO SOCIAL “No decorrer do século 18 e início do século 20, dois fenômenos complementares caracterizaram a vida técnica-econômica-social. Por um lado, assistiu-se a um imenso progresso técnico, industrial e comercial nos países europeus inicialmente e, mais tarde, em todos os continentes, com inumeráveis repercussões psicológicas e sociais. ” (p.106, prgfo. 1º). “A indústria nascente em todos os países ocasionou a concentração de riquezas nas mãos de um pequeno número de empreendedores. Com o tempo, a potência do capital aumentou e poucos homens tinham em suas mãos os destinos do mundo. Em grande parte do século 18 e nos países onde o desenvolvimento veio mais tarde, o proletariado, quase sempre oprimido pela miséria e degradado pelo trabalho, vivia em condições desumanas: 1) Horários que, no início, alcançavam 14 a 17 horas, durante as quais o operário devia repetir mecanicamente o mesmo gesto. 2) Emprego indiscriminado de mulheres e crianças (às vezes, abaixo dos seis anos). 3) Falta de toda segurança diante das doenças e infortúnios. 4) Salários apenas suficientes para manter o operário, e não a família. 5) Subalimentação e habitação insalubres. ” (p.107, prgfo. 1º). “Eis as condições habituais de vida do proletariado urbano que Marx, em sua obra Capital, e Charles Dickens, nos seus romances, retratam com muita realidade. ” (p.107, prgfo. 2º). “Se a sorte dos operários era dura, a dos camponeses, que ainda não tinham contato com a industrialização, não era diferente: [...] A esse proletariado industrial ou agrícola, as classes dirigentes não sabiam oferecer outro remédio senão a paciência e a resignação. ” (p.107, prgfo. 3º). Dois fatores essenciais da questão social A Revolução Industrial, que substituiu em grande escala a máquina pelo homem. O Liberalismo econômico com os quatro elementos recordados: amoralismo econômico, livre concorrência, absenteísmo estatal e individualismo. Recorda-se, nesse sentido, a Lei Le Chapelier e seu significado histórico, isto é, o fim das antigas corporações medievais que se transformaram em castas fechadas, interessadas na defesa dos próprios interesses. [...] Recorda-se, ainda, o significado do termo “liberalismo”, isto é, “aplicação dos princípios liberais na economia”. Este provocou um forte desenvolvimento da economia e explica-se, assim, o entusiasmo provocado por ele. Todavia, o progresso deu vantagem somente aos capitalistas, e não aos operários. ” (p.108, prgfo. 2º). “Em 1848, Karl Marx e Engels elaboraram o livro Manifesto do partido comunista, que se tornou referência aos movimentos sociais, uma vez que traz uma síntese da história da humanidade segundo o esquema de luta de classes, que, na Idade Moderna, justamente pelo sucesso da burguesia, com o desenvolvimento industrial e o aumento do proletariado esmagado, tendia a lutar de modo sempre mais organizado contra a burguesia, antes de modo disperso, depois organizando-se em um partido político. ” (p.108 e 109, prgfo. 3º). “[...] O escopo dos comunistas é a formação do proletariado em classe, de modo a destruir o domínio burguês e a conquistar o poder político. É bem conhecido o apelo final do livro: “proletários de todos os países, uni-vos. ” (p.109, prgfo. 1º). O acordar dos católicos diante dos problemas sociais “Com relação aos problemas sociais, houve, na Igreja, a coexistência de duas tendências. A primeira, caritativa-assistencial, reconheceu justa a situação econômica-social do proletariado do século 18 e pensava poder resolver os inconvenientes até muito visíveis e inegáveis com a ajuda dada a título de “caridade”, e não de “justiça”. Esse posicionamento prevaleceu de modo determinante na primeira metade do século 18, mas não se extinguiu nem mesmo depois. A segunda tendência propriamente social procurou uma solução superando o plano caritativo, seja evitando sempre a luta sistemática e a revolução, seja respeitando a propriedade. Essa linha se fez sempre mais forte, enquanto a primeira se tornava mais fraca. ” (p.109, prgfos. 2º e 3º). “Dentro da Igreja, a linha mais conservadora preocupou-se em defender o direito de propriedade, de condenar em bloco o socialismo e o comunismo, sem aprofundar o exame das questões persuadidas de que tudo se resolveria com a generosidade dos ricos. Essa mentalidade apareceu em vários documentos pontifícios como: Qui pluribus (1846); Quanta cura e Sillabo (1864), entre outros que recordavam e condenavam, também, o amoralismo econômico. ” (p.109, prgfo. 3º). “Vale ressaltar que todos esses documentos tinham como tema principal a defesa do direito de propriedade. Já os católicos que estavam inseridos dentro de uma linha propriamente social surgiram como o prolongamento da linha conservadora; concretamente, o desenvolvimento da ação caritativa que, num primeiro momento, não foi desvalorizada. ” (p.110, prgfo. 1º). “Sob o plano propriamente social, podemos mencionar, entre os primeiros estudos, as primeiras denúncias e as primeiras iniciativas, as pregações do bispo Von Ketteler, em Magonza, em 1848, o qual reivindicava a competência da Igreja na questão social e propunha cooperativas de produção. ” (p.110, prgfo. 3º). Questão social – desafios e documentos do magistério “Com a questão social, surgiram alguns problemas, os quais veremos a seguir: Salário: era determinado pela Lei da Oferta e Procura, ou dirigido por considerações morais, isto é, respondia às necessidades de satisfazer às exigências mínimas do operário. Intervenção do Estado: o Estado aparecia, muitas vezes, em vários países, como um “inimigo” a ser combatido. Sindicato ou corporações: pergunta-se: por que a ideia de muitos católicos com relação ao sindicato parecia inaceitável? A solução corporativa mostrou-se, também, insuficiente historicamente. ” (p.111, prgfo. 2º). Rerum Novarum e seu significado histórico “Para alguns, o Rerum Novarum foi o nascimento do movimento social católico [...]. Para outros, tal documento é essencialmente antissocialista e tendeu a reforçar o poder da burguesia à qual a Igreja sempre foi mais ligada. Essa foi a interpretação que fizeram, sobretudo, os marxistas. [...]. Certo é que toda encíclica é uma obra de mediação, e essa primeira grande encíclica social foi promulgada por Leão XIII, em 1891. Nela, examinou-se a condição dos trabalhadores assalariados, particularmente penosa para os operários das indústrias, afligidos pela miséria. ” (p.112, prgfos. 1º, 2º e 3º). “A encíclica enumerou os erros que provocavam o mal social, excluiu o socialismo e expôs a doutrina católica acerca do trabalho, do direito de propriedade, do princípio de colaboração contraposto à luta de classes como meio fundamental para a mudança social, sobre o direito dos fracos, sobre o aperfeiçoamento da justiça mediante a caridade e sobre o direito a ter associações profissionais. Tornou-se, assim, uma espécie de “Carta Magna” da atividade cristã no campo social. A encíclica defendeu, dessa forma, a instauração de uma ordem social justa. ” (p.112, prgfo. 4º). “Toda a doutrina social da Igreja pode ser entendida como uma atualização, um aprofundamento e uma expansão do núcleo original de princípios expostos na Rerum Novarum. Com o texto de Leão XIII, confere-se à Igreja quase um estatuto de cidadania, como lembrou João Paulo II na carta encíclica Centesimus annus. ” (p.113,prgfo. 1º). Quadragesimo anno “No início dos anos de 1930, logo depois da grave crise econômica de 1929, o papa Pio XI publicou a encíclica Quadragesimo anno, em 1931. Nessa data, comemoravam-se os 40 anos da Rerum novarum. ” “Nessa encíclica, o papa releu o passado à luz de uma situação econômico-social em que à industrialização se ajuntara a expansão do poder dos grupos financeiros, em âmbito nacional e internacional. Além disso, a encíclica advertiu sobre a falta de respeito à liberdade de associação e reafirmou os princípios de solidariedade e de colaboração para superar as desigualdades sociais; assim, as relações entre capital e trabalho deviam dar-se sob o signo da colaboração. Indicou, também, vários pontos concretos, como o salário familiar: ” […] ao trabalhador se deve pagar um salário que baste ao seu sustento e de sua família”, sendo esse um progresso nítido com relação à Rerum Novarum. Defendeu, ainda, certa estabilidade quanto ao emprego: ” […] achamos prudente que o contrato de trabalho venha temperado como outros contratos da sociedade” (PIO XI, 1951, n. 63). ” (p.113, prgfos. 2º e 3º). “Foi também Pio XI quem introduziu a Justiça Social como categoria central da Doutrina Social da Igreja, de modo que praticar a justiça social passou a ser a “conditio sine qua non” de um amor cristão genuíno e sua verificação histórica. Quadragesimo Anno refere a ela nos seguintes termos: A justiça social é um princípio regular de uma justa distribuição (n.57). É sinônimo de Bem Comum (n.58). Junto com a caridade social, é um princípio regular da atividade econômica que não pode ser entregue nem à livre concorrência (livre mercado) nem à ditadura econômica (monopólios) (GUTIERREZ, 2005, p.37). ” (p.114, prgfo. 1º). Outros documentos sociais “Os anos de 1960 irromperam promissores, com o reinício no pós-guerra, a descolonização da África e os primeiros e tímidos sinais de um degelo nas relações entre blocos americanos e soviético. ” (p.114, prgfo. 2º). “Nesse sentido, João XIII, sensível aos sinais dos tempos, entendeu que a questão social estava se universalizando e abarcava todos os países: ao lado da questão operária e da Revolução Industrial, delineavam-se os problemas da agricultura, das áreas em via de desenvolvimento, do incremento demográfico e os referentes à necessidade de cooperação econômica mundial. As desigualdades, antes advertidas no interior das nações, apareceram no âmbito internacional e faziam emergir, cada vez mais, a situação dramática em que estava o Terceiro Mundo. ” (p.114, prgfo. 3º). “Com a encíclica Mater et magistra, João XXIII pretendeu atualizar os documentos já conhecidos e avançar no sentido de comprometer toda a comunidade cristã. As palavras-chave da carta são “comunidade” e “socialização”: a Igreja é chamada na verdade, na justiça e no amor a colaborar com todos os homens para construir uma autêntica comunhão. Por tal via, o crescimento econômico não se limitaria somente a satisfazer às necessidades dos homens, mas poderia promover, também, a sua dignidade. ” (p.115, prgfo. 1º). “No início dos anos de 1970, sob um turbulento clima de contestação ideológica, Paulo VI retomou a mensagem social de Leão XIII e atualizou-a, por ocasião do octogésimo aniversário da Rerum novarum, com a carta apostólica Octogesima adveniens. Nela, o papa refletiu sobre a sociedade pós-industrial com todos os seus complexos problemas, salientando a insuficiência das ideologias para responder a alguns desafios: a urbanização, a condição juvenil, a condição da mulher, o desemprego, as discriminações, a emigração, o incremento demográfico, o influxo dos meios de comunicação social e o ambiente rural. ” (p.115, prgfo. 2º). “Já a encíclica Laborem exercens, lançada noventa anos depois da Rerum novarum, por João Paulo II, foi dedicada ao trabalho, que é visto como bem fundamental para a pessoa, fator primário da atividade econômica e chave de toda a questão social. A Laborem exercens delineou uma espiritualidade e uma ética do trabalho no contexto de uma profunda reflexão teológica e filosófica. O trabalho não deveria ser entendido, então, somente em sentido objetivo e material, mas também se levando em conta a sua dimensão subjetiva como atividade, que exprime sempre a pessoa. Além de ser o paradigma decisivo da vida social, o trabalho tem toda a dignidade de um âmbito no qual deve encontrar realização e vocação natural e sobrenatural da pessoa. ” (p.115, prgfos. 3º e 4º). “Comemorando o vigésimo aniversário da Populorum progressio, João Paulo II, com a encíclica Sollicitudo rei socialis, abordou, novamente, o tema do desenvolvimento para dois dados fundamentais: Por um lado, a situação dramática do mundo contemporâneo, sob o aspecto do desenvolvimento que falta no Terceiro Mundo e, por outro lado, o sentido, as condições e as exigências de um desenvolvimento digno do homem (CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA, 1988, p.30). ” (p.116, prgfo. 1º). “Essa encíclica introduziu, ainda, a diferença entre o progresso e desenvolvimento, afirmando que: “O verdadeiro desenvolvimento não pode limitar-se à multiplicação dos bens e dos serviços, isto é, àquilo que se possui, mas deve contribuir para a plenitude do ser do homem. Deste modo pretende-se delinear com clareza a natureza moral do verdadeiro desenvolvimento (CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA. 1988, p.30). ” (p.116, prgfo. 2º). “No centésimo aniversário da Rerum Novarum, João Paulo II promulgou a sua terceira encíclica social, a Centesimus annus, da qual emergiu a continuidade doutrinal de cem anos de magistério social da Igreja. Retomando um dos princípios basilares da concepção cristã da organização social e política, que fora o tema central da encíclica precedente, o para escreveu: “O princípio, que hoje designamos de solidariedade […], várias vezes Leão XIII o enuncia com o nome amizade […]; desde Pio IX é designado pela expressão mais significativa caridade social, enquanto Paulo IV, ampliando o conceito na linha das múltiplas dimensões atuais da questão social, falava de civilização do amor” (JOÃO PAULO II, Carta Encíclica Centesimus annus,10,1991). ” (p.116, prgfo. 3º). “João Paulo II realçou, também, como o ensinamento social da Igreja correu ao longo do eixo da reciprocidade entre Deus e o homem: reconhecer a Deus em cada homem e cada homem em Deus é a condição de um autêntico desenvolvimento humano. ” (p.116, prgfo. 4º). “Os documentos que aqui foram lembrados constituem as pedras fundamentais do caminho da doutrina social da Igreja desde Leão XIII até os dias atuais. Na elaboração e no ensinamento dessa doutrina, a Igreja foi e é animada por intentos não teóricos, mas pastorais, quando se encontra diante das repercussões das mutações sociais sobre os seres humanos individualmente tomados, sobre multidões de homens e mulheres e sobre a sua própria dignidade humana. A doutrina social da Igreja desenvolveu-se como um corpo doutrinal atualizado, que se articula à medida que a Igreja vai lendo os acontecimentos, enquanto eles se desenrolam no decurso da história. ” (p.117, prgfo. 1º). QUESTÃO ROMANA “A questão romana não foi somente uma questão jurisdicional e um problema territorial, mas também um problema religioso. Tal problema se tornou claro a partir do ano de 1848, em que o antagonismo entre Cúria Romana e o Reino de Sardenha era devido à política de Vitor Emanuel II, que pretendia “libertar “o país dos velhos privilégios para dar- lhe uma estrutura moderna. Tal intento, ao menos em teoria, terminaria por reduzir, necessariamente, o prestígio e a influência da Igreja; contudo, isso nem passava pelas ideias da Cúria. ” (p.117, prgfo. 2º). [...] “Como surgiram os Estados Pontifícios? [...] deveram-se a muitos fatores de ordem política, econômica e social no decorrer na história.” (p.117, prgfo. 3º). “O Estado Pontifício, do ponto de vista jurídico, apareceu em 754, com o Pacto de Quiercy entre o papa Estevão II (752-757) e o rei dos francos, Pepino, o Breve (714-768), pai de Carlos Magno, quando foram restituídos ao Pontífice os territórios que tinham sido ocupados pelos longobardos, na região centro-norte da península itálica. Foi dessa maneira que se consolidou, oficialmente, uma evolução em curso há anos: a constituição da Sancta Ecclesiae Respublica, isto é, os Estados Eclesiásticos. ” (p.117, prgfo. 4º). “No dia 13 de maio de 1871, promulgou-se a famosa Lei das Garantias – o acordo unilateral que Pio IX refutou. Estava aberta, então, a questão romana. ” (p.118, prgfo. 1º). Conflitos “O primeiro motivo de conflito entre a Igreja e o Estado italiano que se formava ocorreu em torno das Leis Siccardi, em fevereiro de 1850. [...] As leis eram: Abolição do foro eclesiástico, das imunidades dos religiosos e do direito de asilo nas Igrejas e conventos. Abolição das penalidades aplicadas, no reino saboiano, a quem não observasse as principais festividades religiosas. ” (p.118, prgfo. 2º). “Essas leis encarregavam o governo de preparar um projeto destinado a regular o contrato de casamento em suas relações com a lei civil, a capacidade dos contraentes, a forma e os efeitos desse contrato. Além disso, tais leis preparavam a laicização do casamento, que veio a ocorrer em 25 de junho de 1865, com a promulgação do Código Civil da Itália Unida, no qual estava previsto o casamento civil obrigatório para todos os cristãos, tirando, assim a eficácia e o efeito legal do matrimônio religioso. [...] A Santa Sé, interpretando essas leis como uma violação unilateral da Concordata de 1841, rompeu, então, as relações diplomáticas. ” (p.118, prgfo. 3º). “O segundo motivo de conflito residia nas leis de 1855 contra as ordens religiosas, que negavam reconhecimento jurídico às ordens não dedicadas à pregação, à educação dos jovens, e à assistência aos enfermos, em como estabeleciam o sequestro dos seus bens, destinando-os às necessidades do clero secular. A Santa Sé reagiu aplicando a excomunhão ao rei e ao parlamento; isso exasperou, no seio do Reino da Sardenha, o dissenso entre católicos e liberais. ” (p.119, prgfo. 1º). “Se, por um lado, essa legislação repressiva penalizava pesadamente algumas ordens religiosas tradicionais que estavam se reconstruindo depois das supressões revolucionárias e napoleônicas, por outro lado, favoreceu de maneira surpreendente, o nascimento e o desenvolvimento de congregações e ordens religiosas e leigas dedicadas a atender às necessidades do povo: cuidado com as crianças, assistência aos doentes, instrução popular, formas novas de solidariedade social. Essa legislação antirreligiosa, somada aos problemas territoriais, acarretou uma situação de intenso antagonismo entre Estado e Igreja, que duraria muito tempo. ” (p.119, prgfo. 2º). “Na unificação do Estado Italiana, dois momentos foram significativos: a proclamação do Reino da República italiana, no dia 17 de março de 1861, e a tomada de Roma, no dia 20 de setembro de 1870. Isso representou o fim do poder temporal dos papas, deixando isolada a Santa Sé no plano internacional. ” (p.119, prgfo. 3º). “Em vão, Pio IX apelou para outros governos, expondo a incompatibilidade dos dois poderes em Roma. O papa não reconheceu o Reino da Itália nem aceitou as anexações de 1861 e de 1870. O problema só foi resolvido, da parte do Estado, com a Lei das Garantias, de 13 de maio de 1871.Essa lei, concedia ao papa as honras de soberano, uma renda anual e o direito de legação ativa e passiva. Não garantia, porém, plena liberdade à Igreja; poderia continuar usando os palácios apostólicos, mas sem definir-se como proprietário ou usufrutuário. Pio IX declarou, ainda, nula a lei, recusou a pensão oferecida e prescreveu aos fiéis que se abstivessem de participar das eleições políticas. ” (p.119, prgfo. 4º). TRATADO DE LATRÃO “O Tratado de Latrão foi um acordo entre a Igreja de Roma e o governo italiano que resolveu a questão romana. ” (p.120, prgfo. 2º). “Longas e penosas discussões aconteceram para que se chegasse à solução da questão romana. Os personagens importantes nas conversações foram o advogado Francesco Pacelli, irmão do futuro Pio XII, por parte do Vaticano, e o professor Domenico Barone Conselheiro de Estado, por parte do Estado. ” (p.120, prgfo. 3º). “Em 22 de novembro, o rei Vitor Emanuel deu ao Chefe do Governo, Benito Mussolini, os poderes necessários para conduzir negociações oficiais, tendo em vista uma solução definitiva da questão romana; uma delegação idêntica foi concedida ao Cardeal Gasparri, da parte de Pio XI. No dia 7 de fevereiro de 1929, o Cardeal de Estado fez um histórico pronunciamento, no qual resumiu, em poucas palavras, os dois anos em que representantes da Santa Sé e do Estado Italiano estiveram reunidos para estudos, tratativas e, finalmente, selaram um acordo. O Cardeal do Estado lembrou que a Igreja tinha plena liberdade e independência no governo da Igreja Universal e que a concordata regulamenta, suficientemente, as condições da religião e da Igreja na Itália. Disse, ainda, que os governos que quisessem ser representados pela Santa Sé poderiam fazê-lo quando o Pontífice Romano estivesse no seu pequeno Estado soberano, livre e independente. ” (p.121, prgfo.1º). “Após essa histórica comunicação, Magalhães de Azevedo, embaixador do Brasil, na qualidade de decano do Corpo Diplomático, externou, em nome dos presentes, as felicitações e votos de prosperidade à Santa Sé. ” (p.121, prgfo. 2º). “Resumo do conteúdo dos Acordos do Latrão: Tratado político Concordata Convenção financeira. ” (p.121, prgfo. 3º). A TEORIA DA AUTOCOMPREENSÃO DA IGREJA Referência da obra: SOFFIATTI, Elza Silva Cardoso. A teoria da autocompreensão da Igreja. Anais do III Encontro Nacional do GT História das Religiões e das Religiosidades–ANPUH–Revistas Brasileira de História das Religiões. Maringá (PR) v. III, n.9, jan/2011. ISSN 1983-2859. 8p. Disponível em http://www.dhi.uem.br/gtreligiao/pub.html. “O século XX foi, de fato, um século marcante para a humanidade. Marcado por evoluções e revoluções tecnológicas, culturais, sociais e morais que sucederam umas às outras de forma acelerada; marcado também por monstruosas e gigantescas catástrofes, com um número inigual de mortes, perseguições, racismos. Um século de heterogeneidade, de diferenças latentes, gritantes e tendentes à verdade absoluta. Tendência à verdade absoluta de alguns grupos. ” (p.1, prgfo. 1º). “Múltiplo e complexo não poderia deixar de ser a construção do conhecimento que se desenvolveu nesse século XX – no passado século XX – Na história foi fato o nascimento de um novo paradigma na escrita do saber histórico, a Escola dos Annales. Com os Annales se inovou na forma de fazer história, de escrever a história, tanto a história do próprio século XX, como a dos séculos e tempos passados. ” (p.1, prgfo. 2º). “A Escola dos Annales nasceu a partir da fundação, na França,da Revista Les Annales de Histoire Économique et Sociale em 1929, por Lucien Febvre e Marc Bloch. O objetivo da nascente revista era eliminar o espírito de especialidade, promover a pluridisciplinaridade, favorecer a união das ciências humanas, passar da fase dos debates teóricos predominantes na história para a fase das realizações concretas, das investigações coletivas no terreno da história contemporâneo, do olhar atento ao cotidiano. ” (p.1, prgfo. 3º). “Fernand Braudel, membro consagrado da segunda geração do Annales, tendia a uma história global na obra “O Mediterrâneo e Felipe II”. Nessa obra a preocupação de Braudel era de “situar indivíduos e eventos num contexto, em seu meio, masele os torna inteligíveis ao preço de revelar sua fundamental desimportância”. Segundo Peter Burke, para Braudel a história dos eventos embora “rica em interesse humano, é também a mais superficial”. (p.1, prgfo. 4º). “O autor da segunda geração tendia a uma história totalizante, no entanto o mundo pós Segunda Guerra Mundial, dividido em uma nova realidade político-econômica e tecnológica- cultural, fez com que houvesse uma mudança de interesse e uma reação ao determinismo e a história totalizante. Isso desencadeou mudanças dentro do movimento e deu origem a terceira geração dos Annales, que surgiu entre as décadas de 60 e 70 do século XX. ” (p.2, prgfo. 1º). “A expressão “do porão ao sótão” figurando a mudança de interesses dos membros dos Annales foi, segundo Peter Burke, cunhada por Le Roy Ladurie e citada por Michel Volvelle, ambos membros da terceira geração, ao lado de Jacques Le Goff, Jean Delumeau, Georges Duby. Uma característica marcante da terceira geração dos Annales foi a efetiva aproximação da história com as demais ciências sociais, dentre as quais: a antropologia cultural, a sociologia, a geografia. A aproximação se configurou pela aproximação dos métodos e conhecimentos específicos de cada uma dessas ciências pela História. ” (p.2, prgfo. 2º). “No entanto, o foco do presente artigo não é o movimento do Annales em si e sim, um movimento semelhante que ocorreu no fazer histórico da História da Igreja Católica. ” (p.2, prgfo.3º). “Essas reflexões estão contidas em duas publicações da Revista Conciluim que aconteceram nos anos de 1970 e 1971 e foram consagrados ao problema do método. ” (p.2, prgfo. 4º). “Foram precursores desse movimento,dentre outros historiadores e pensadores do catolicismo e da Igreja Católica: Roger Aubert, Anton Weiler, John B. Cobb Jr., Giuseppe Alberigo, Emile Poulat, C.W. Mönnich, Antoine Saucerotte. ” (p.2, prgfo. 5º). “Anton Weiler, no artigo intitulado “História da Igreja e Nova orientação da historiologia” separou a fé e a teologia de um lado do conhecimento eclesiástico e do outro lado, a história eclesiástica como sendo o ofício, a ciência do profissional da história. Para ele o historiador ou o estudioso da história da Igreja deve saber focalizar o problema histórico a partir das exigências atuais de ‘engajamento’, principalmente onde se referem as consequências para o conhecimento de História da Igreja. ” (p.3, prgfo. 1º). “Para Weiler a história pratica suas investigações a partir da exigência de se compreender o homem em seu tempo e instituições, com o objetivo de chegar a resultados que contribuam para a autocompreensão do homem hoje. Na mesma linha deveria ser feita a história da Igreja, ou seja, a partir de si mesma, de seus valores, dogmas, preceitos para buscar a compreensão de seus atos e tomadas de decisões. ” (p.3, prgfo. 2º). “Mönnich, no artigo intitulado “A História da Igreja, no conjunto das ciências do homem”. Elucidou que alguns fenômenos humanos se tornam mais compreensíveis se vistos pela ciência adequada: sociologia, antropologia, psicologia, economia, linguística, ciência, política. Afirmou também que os fenômenos humanos, não podem ser reduzidos a abstrações atemporais, nem mesmo os que estão dentro de searas da história eclesiástica, para não perderem sua veracidade, pois segundo o autor “seja qual for a definição de Igreja donde se quer partir, sempre se encontrará a própria realidade humana e não dados voando acima do tempo”. (p.3, prgfo. 3º). “Giuseppe Alberico fala, em seu artigo “Novas fronteiras da História da Igreja? Na necessidade de aceitar plenamente da secularização da História de Igreja, com “completa e engajada inserção na dialética científica das disciplinas históricas”. Afirma que se deve compreender como uma secularização da Igreja que se fundamenta e visa um conhecimento científico da sucessão do tempo nas formas de vida cristãs e os desencadeamentos dessas sucessões tanto na história eclesiástica, como na história leiga (ou profana, segundo Weiler). ” (p.3, prgfo. 5º). “Podemos dizer que há duas visões de construção da história, a tradicional, que se fundamenta na pesquisa, na exploração da documentação e que busca a historicidade; e uma nova visão que vai mais a fundo na compreensão da pesquisa, ampliando os objetivos e a compreensão das diferentes vertentes da instituição. [...] enfim, deveria levar em consideração a multiplicidade da unidade de Igreja Católica que ao ser uma, são várias. ” (p.4, prgfo. 1º). “Essa visão é fundamental, como ressaltou Weiler, pois “somente por esse caminho é possível uma investigação geral das estruturas, em conjunturas mais amplas”. Sendo assim podemos considerar que o autoentendimento da Igreja é influenciado pelas mudanças culturais e conduzem a uma nova perspectiva mais diversa, que por sua vez constrói uma nova história fruto das mudanças da estrutura político social, da transição para a sociedade industrial burocrática que atingiu a sociedade laica e a eclesiástica, atingindo inclusive o próprio historiador que, característica e intrinsecamente é filho de se tempo e carrega em sua análise interpretativa e em sua narrativa, seus valores e sua visão de mundo. ” (p.4, prgfo. 2º). “Weiler concluiu que o historiador da Igreja, em como a História Eclesiástica deveria acompanhar os caminhos e ramificações da “história profana “e se modificar paralelamente a ela. “ (p.4, prgfo. 3º). “Sobre a subjetividade do historiador e sua não parcialidade, Anton Weiler esclareceu que “desde o existencialismo de Heidegger, desde os trabalhos teoréticos de, p. ex., Aron, Maron, Romein e Collingwood, sabemos, pelo menos na ciência teórica da história que é impossível e indesejável excluir a própria subjetividade do interprete da história”. Por esse motivo, afirma ele, a função do historiador eclesiástico seria a de contribuir para junção das forças religiosas e morais, o que significaria, ” escrever (de novo) a história da Igreja à luz do povir; o que deverá ser feito junto com a Igreja e a partir da fé”. (p.5, prgfo. 1º). “John B. Cobb Jr., no artigo intitulado “Rumo a uma mudança da posição da historicismo e do positivismo” elucidou que a experiência humana de tomada de consciência é feita no tempo e de forma particular. O particular e como se compreende cada termo ou objeto estudado, selecionado pelo historiador. O objeto por sua vez possui duas características consideráveis: a primeira é que ele “é o que é para quem o percebe, e nada mais”; e a segunda é que o objeto do estudo do historiador contém em si certa subjetividade própria, atribuída a ele (objeto) pelo próprio historiador ao selecioná-lo. ” (p.5, prgfo. 2º). “Sem a fé no que se escreve, no caso, a história da Igreja, há, segundo o Weiler, maior possibilidade de se manipular a história e as veias por onde os relatos devem caminhar. Nessa linha seguiu Cobb, ao afirmar que a questão do fazer histórico deve ser não o que passado foi em si, mas o que ele é e representa para o historiador em sua própria existência. Para Weiler, seria falha a visão histórica que buscasse analisar com olhar leigo a História da Igreja, configurando algo desconexo. ” (p.5, prgfos. 3º e 4º). “Relevante é reconhecer que toda pergunta histórica é uma pergunta do presente, que por sua vez é fruto de um conjunto de conhecimentos históricos que trouxeram do conhecimento do passado a própria capacidade de desenvolver a consciência de tempo e, consequentemente de futuro. ” (p.5, prgfo. 5º). “Considera-se que o entendimento histórico parte do sujeito que busca entender o “ontem” a partir do hoje e, que por sua vez é subjetivo. ” (p.6, prgfo. 1º). “Desconsiderar a pluralidade humana é desconsiderar o homem, é a forma primeira de manipular e estereotipar seu pensamento, fadando-o a pensar somente no que deve ser pensado. ”(p.6, prgfo. 2º). “Essencial é compreender que “na visão histórica, a essência humana não é conhecida a priori, mas deverá ser alcançada somente mediante o vir-a-ser-homem na história”. E o mesmo se passa com a história da Igreja, na qual Jesus, para Weiler, ” primeiro historiólogo da Igreja”, definiu a essência do vir a ser-Igreja. ” (p.6, prgfo. 3º). “A história ciência ou profana – como a denominava Weiler – e a história eclesiástica devem reconhecer, em última instância, serem “ciência interpretativa” na qual o historiador deve colocar o conjunto analítico de suas fontes em uma conjuntura interpretativa, que por sua vez é fruto de seu entendimento da história, de sua visão de mundo, sua criatividade, não tendo receio de se expor como construtor do conhecimento histórico. ” (p.7, prgfo. 1º). “Já John Cobb, centrou sua discussão na superação do positivismo e do historicismo como elementos norteadores para a construção do conhecimento histórico. A origem da consciência para Cobb é semelhante à de Weiler. ” (p.7, prgfo. 2º). “Alberigo ao enunciar o positivismo como forma de pesquisa histórica, afirmou que este método de pesquisa é insuficiente para se conhecer e, principalmente compreender a “complexa estrutura teândrica da Igreja” e ampliou se pensamento afirmando que o método positivista de pesquisa é inadequado a complexidade dos objetos que se propõe pesquisar. Elucidou a necessidade de superar e libertar-se da forma reduzida da compreensão metodológico-positivista. ” (p.7, prgfo. 3º). “No entanto, Cobb elucidou que o positivismo e o programa positivista de absorver a história se caracterizam como fenômeno histórico e devem ser entendidos historicamente, ou seja, compreendidos como resultantes de fatores geradores e que possuem fatores consequentes. Ambos oferecem desconstruções dentro de suas radicalidades interpretativas e de suas seleções de fontes, inclusive no tocante a Igreja. ” (p.7, prgfo. 4º). “Cobb, afirmou que no momento em que escrevia, mais precisamente na década de 70 do século XX, a juventude estava revoltosa contra o positivismo e o historicismo, pois rejeitavam tanto a forma científica como a histórica como fontes de conscientização e ao procurar por outro fundamento, ou fonte de consciência, se deparam com o existencialismo de Heidegger e Sartre. No entanto, mesmo esse fundamento (o existencialismo) já perdeu seu poder. Com isso a tomada de consciência histórica sobrevive alicerçada na utopia, que sente o passado com um fardo e o presente como intolerável, ficando os “louros “para aqueles que, em nosso tempo, prometem o melhor futuro. ” (p.8, prgfo. 1º).
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