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CASO CLÍNICO Paciente, sexo masculino com ferida na asa direita nasal (lesão ulcerada, com bordas elevadas e eritematosas não dolorosa) com comprometimento do assoalho nasal e no pênis. Ambas não cicatrizam. A do pênis teve início há 8 meses e apresentava lesão secundária (miíase). Já tentou tratamento com penicilina e tetraciclina LEISHMANIOSE I: Leishmaniose Tegumentar Americana II: Leishmaniose Visceral Americana CLASSIFICAÇÃO DO PARASITA LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA (LTA) A leishmaniose tegumentar americana é considerada uma enfermidade polimórfica e especial da pele e das mucosas As principais manifestações observadas nos pacientes com LTA podem ser classificadas de acordo com seus aspectos clínicos, patológicos e imunológicos AGENTE ETIOLÓGICO A leishmaniose tegumentar americana é uma doença causada por diferentes espécies de parasitos do gênero Leishmania Ross. Este é um protozoário digenético que tem seu ciclo biológico realizado em dois hospedeiros, um vertebrado e um invertebrado I: Leishmania braziliensis II: Leishmania guyanensis III: Leishmania lainsoni IV: Leishmania shawi V: Leishmania naiffi VI: Leishmania amazonenses MORFOLOGIA FORMA AMASTIGOTA Apresentam-se tipicamente, ovoides ou esféricas. Pode-se encontrar vacúolos, um único núcleo que se apresenta esférico ou ovoide disposto em geral em um dos lados da célula É aflagelada e presente nas células do SMF em tecidos diversos, onde realizam divisão binária FORMA PROMASTIGOTA METACÍCLICA São formas alongadas em cuja região anterior emerge um flagelo livre É a forma infectante que se desenvolve no aparelho digestivo do Lutzomya Realiza divisão binária e transforma-se em amastigotas no vacúolo parasitóforo REPRODUÇÃO O processo de reprodução das leishmanias é feito por divisão binária Nas formas promastigotas existentes no trato digestivo do vetor, o primeiro sinal de divisão é a produção de um segundo flagelo que sempre permanece menor que o original. Isto é acompanhado de uma mudança no cinetoplasto, provavelmente por replicação do DNA. O núcleo então se divide em dois, que normalmente ficam lado a lado A reprodução das formas amastigotas ocorre no interior dos fagossomas de macrófagos, também por divisão binária, de modo similar ao que ocorre nas formas promastigotas HOSPEDEIROS INVERTEBRADOS Os hospedeiros invertebrados são pequenos insetos da ordem Diptera, família Psychodidae, subfamília Phlebotominae, gênero Lutzomya. Nesses insetos, ocorre parte do ciclo biológico do parasito HOSPEDEIROS VERTEBRADOS Os hospedeiros vertebrados incluem grande variedade de mamíferos: roedores, edentados (tatu, tamanduá, preguiça), marsupiais (gambá), canídeos e primatas, incluindo os humanos A ocorrência e a dispersão da doença nas mais variadas regiões do Brasil têm como importante fator a grande variedade de hospedeiros vertebrados que, epidemiologicamente, comportam-se como reservatórios CICLO BIOLÓGICO As formas amastigotas de Leishmania são encontradas parasitando células do sistema mononuclear fagocitário (SMF) do hospedeiro vertebrado, principalmente macrófagos evidentes na pele. Sobrevivem e se multiplicam nesta célula, que é especializada na destruição de agentes estranhos. As formas promastigotas são encontradas no tubo digestivo dos flebotomíneos livres ou aderidas ao epitélio intestinal. CICLO NO VETOR A infecção do inseto ocorre quando a fêmea pica o vertebrado infectado para exercer o repasto sanguíneo e juntamente com o sangue ingere macrófagos parasitados por formas amastigotas. Durante o trajeto pelo trato digestório anterior, ou ao chegarem ao estômago, os macrófagos se rompem liberando as amastigotas. É provável que as amastigotas sofram uma divisão binária antes da transformação em promastigotas, que também ocorre por processos sucessivos de divisão Após a digestão do sangue entre o terceiro e o quarto dias, a membrana peritrófica se rompe e as formas promastigotas ficam livres. São observadas diferentes formas promastigotas (procíclica, nectomona, haptomona, leptomona, metacíclica) no interior do inseto vetor que provavelmente têm papéis diferentes no estabelecimento e na manutenção da infecção. Nesta etapa do ciclo, as promastigotas procíclicas permanecem reproduzindo por divisão binária, podendo seguir dois caminhos, dependendo da espécie do parasito. No primeiro, as formas promastigotas das espécies pertencentes ao subgênero Viannia dirigem-se para o intestino posterior, onde se estabelecem nas regiões do piloro e do íleo Além das alterações morfológicas das promastigotas durante o processo de migração no trato digestivo do vetor, há uma mudança da expressão de várias moléculas dessas formas durante o seu desenvolvimento. Este processo é denominado metaciclogênese, onde as promastigotas que migram para a parte anterior do tubo digestivo do vetor atingem um estágio infectivo, ou seja, transformam-se em formas metacíclicas infectantes No segundo caminho, as formas promastigotas das espécies pertencentes ao subgênero Leishmania multiplicam-se livremente ou aderidas às paredes do estômago (seção suprapilária) CICLO NO VERTEBRADO Durante o processo de alimentação da fêmea de flebotomíneo infectada é que ocorre a transmissão do parasito As formas promastigotas são regurgitadas e introduzidas no local da picada A saliva do flebotomíneo possui neuropeptídeos vasodilatadores que atuam facilitando a alimentação do inseto e ao mesmo tempo imunossuprimindo a resposta do hospedeiro vertebrado; desta forma, exerce importante papel no sucesso da infectividade das promastigotas metacíclicas. As promastigotas infectantes interagem com os macrófagos através de receptores de membrana que facilitarão a entrada do parasito, bem como sua sobrevivência no interior da célula. O macrófago estende pseudópodes que envolvem o parasito, introduzindo-o para o seu interior, envolto pelo vacúolo fagocitário. Rapidamente, as formas promastigotas transformam-se em amastigotas, que são encontradas 24 horas após a fagocitose. Dentro do vacúolo fagocitário dos macrófagos, as amastigotas estão adaptadas ao novo meio fisiológico e resistem à ação destruidora dos lisossomas, multiplicando-se por divisão binária até ocupar todo o citoplasma Esgotando-se sua resistência, a membrana do macrófago rompe-se liberando as amastigotas no tecido, sendo novamente fagocitadas, iniciando no local da picada uma reação inflamatória. OBS: No homem e no mosquito, a reprodução ocorre de forma assexuada MECANISMO DE TRANSMISSÃO A transmissão ocorre pela picada de insetos hematófagos pertencentes ao gênero Lutzomyia conhecidos no Brasil por Mosquito-Palha Ainda, esta pode ocorrer por transfusões de sangue e por compartilhamento de agulhas INTERAÇÃO PARASITO-CÉLULA HOSPEDEIRA Devido ao seu curto aparelho bucal, os flebotomíneos são incapazes de canular pequenos vasos da derme, provocando então lesões neste microambiente no qual as formas promastigotas metacíclicas encontrarão diversas substâncias, como proteínas do soro, saliva, PSG e fluidos digestivos do inseto Os anticorpos da classe IgG e as fibronectinas participam do processo de adesão das promastigotas infectantes ao macrófago por meio de receptores para a porção Fe das IgG. A saliva contribui efetivamente na infecciosidade das formas promastigotas, por meio de substância vasodilatadora (maxidilan). Essa substância imunossupressora parece inibir a apresentação de antígenos de Leishmania pelos macrófagos. Além disso, o maxidilan exerce um papel imunomodulador da resposta imune, inibindo a secreção de citocinas tipo I (IL12 e INF-y). Desta forma, citocinas tipo II(IL4) ou mesmo citocinas imunomoduladoras (IL10, TGF-P) agem suprimindo a resposta imune celular, de forma a favorecer o sucesso da infecção. A substância gelatinosa (PSG) regurgitada juntamente com as promastigotas no momento do repasto sanguíneo pode favorecer a exarcebação da infecção através das propriedades atribuídas a ela: o recrutamento de macrófagos para o local da infecção na derme e o incremento da atividade da arginase, aumentando o catabolismo da L- arginina e a síntese de poliaminas, essenciais para o crescimento do parasito dentro da célula hospedeira. As diversas espécies de Leishmania são capazes de ativar o complemento tanto pela via clássica quanto pela via alternativa ASPECTOS IMUNOLÓGICOS Evidências sugerem que vários fatores podem afetar o processo durante a infecção por Leishmania: I: Presença de determinadas citocinas no meio durante os eventos iniciais da diferenciação celular; II: A influência de outros sinais coestimuladores; III: Mecanismos sinalizadores diferenciais usados pelas subclasses de células TH e sua utilização com os seus receptores. Na forma cutânea localizada observa- se uma correlação com a resposta do tipo Th 1, com proliferação linfocitária e plasmocitária marcada pela ausência ou escassez de parasitos A imunidade celular é facilmente detectada, mas, ao contrário do que ocorre nas formas autorresolutivas, a doença progride, podendo evoluir para a forma cutaneomucosa, a qual apresenta expressão simultânea de citocinas Thl e Th2, ou seja, um padrão ThO. A leishmaniose cutaneodifusa está correlacionada com a resposta do tipo Th2, na qual existe uma infiltração dérmica de macrófagos, habitualmente vacuolizados, repletos de amastigotas e com escassez de linfócitos, caracterizando um padrão de suscetibilidade em humanos .A resposta imune celular é variável conforme o quadro clínico, estando presente nos pacientes acometidos pela forma cutânea, exacerbada nos casos de lesões mucosas e usualmente suprimida nos casos de leishmaniose difusa. PATOGENIA No início da infecção, as formas promastigotas são inoculadas na derme durante o repasto sanguíneo do flebotomíneo. As células destruídas pela probóscida do inseto e a saliva inoculada atraem para a área células fagocitárias mononucleares, os macrófagos e outras células da série branca. Certos macrófagos são capazes de destruir os parasitos diretamente, enquanto outros necessitam ser estimulados. Ao serem fagocitadas, as promastigotas transformam-se em amastigotas e iniciam reprodução por divisões binárias sucessivas; mais macrófagos são atraídos ao sítio, onde se fixam e são infectados. A lesão inicial é manifestada por um infiltrado inflamatório composto principalmente de linfócitos e de macrófagos na derme, estando estes últimos abarrotados de parasitos. PERÍODO DE INCUBAÇÃO Esse período, que corresponde ao tempo entre a picada do inseto e o aparecimento de lesão inicial, varia entre 2 semanas e 3 meses EVOLUÇÃO As lesões iniciais são semelhantes, independentemente da espécie do parasito. Esta forma inicial pode regredir espontaneamente após um breve curso abortivo, permanecer estacionária ou evoluir para um nódulo dérmico chamado “histiocitoma”, localizado sempre no sítio da picada do vetor infectado Gradualmente, forma-se um infiltrado celular circundando a lesão, consistindo principalmente de pequenos e grandes linfócitos, entre os quais alguns plasmócitos. Como resultado, forma-se no local uma reação inflamatória do tipo tuberculoide. Ocorre necrose, que resulta na desintegração da epiderme e da membrana basal que culmina, por sua vez, na formação de uma lesão ulcerocrostosa. Após a perda da crosta, observa-se uma pequena úlcera com bordas ligeiramente salientes e fundo granuloso. Esta lesão progride, desenvolvendo-se em uma típica úlcera leishmaniótica Trata-se de uma úlcera de configuração circular, bordos altos (em moldura), cujo fundo é granuloso, de cor vermelha intensa, recoberto por exsudato seroso ou seropurulento, dependendo da presença de infecções secundárias. Simultaneamente, ou em seguida ao aparecimento da lesão inicial, pode ocorrer disseminação linfática ou hematogênica, produzindo metástases cutânea, subcutânea ou mucosa. Seguido a um tratamento com sucesso, forma-se no local, em substituição à úlcera, uma cicatriz característica. Em geral a área cicatricial está despigmentada, com uma leve depressão na pele e com uma fibrose sob a epiderme, que está fina FORMAS CLÍNICAS Um amplo espectro de formas clínicas pode ser visto na LTA, variando de uma lesão autorresolutiva a lesões desfigurantes. Esta variação está intimamente ligada ao estado imunológico do paciente, às espécies de Leishmania., aos hábitos do vetor e aos tratamentos com imunossupressores LEISHMANIOSE CUTÂNEA A leishmaniose cutânea é caracterizada pela formação de úlceras únicas ou múltiplas confinadas na derme, com a epiderme ulcerada A densidade de parasitos nos bordos da úlcera formada é grande nas fases iniciais da infecção, com tendência à escassez nas úlceras crônicas. A leishmaniose cutâneo-disseminada é uma variação da forma cutânea e geralmente está relacionada com pacientes imunossuprimidos LEISHMANIOSE CUTANEOMUCOSA Esta forma clínica é conhecida por espúndia e nariz de tapir ou de anta. O agente etiológico é a L. braziliensis Um dos aspectos mais típicos da doença causada pela L. braziliensis é a frequência com que o parasito produz, meses ou anos após a lesão inicial primária, lesões destrutivas secundárias envolvendo mucosas e cartilagens. Trata-se de um processo lento, de curso crônico As regiões mais comumente afetadas pela disseminação metastásica são o nariz, a faringe, a boca e a laringe. O primeiro sinal de comprometimento mucoso manifestase por eritema e discreto infiltrado inflamatório no septo nasal, resultando em coriza constante e posteriormente em um processo ulcerativo A destruição do septo provoca mudança anatômica e aumento do órgão, que se constitui no chamado nariz de anta. Em muitos casos ocorre completa destruição de toda a estrutura cartilaginosa do nariz. O processo ulcerativo pode atingir os lábios e se propagar pela face. Estas graves mutilações podem causar no paciente dificuldades de respirar, falar e se alimentar. São frequentes, nesta fase, complicações respiratórias por infecções secundárias, podendo levar o paciente ao óbito Trabalhos recentes demonstraram a presença do parasito na área cicatricial de antigas lesões tratadas de alguns pacientes. Isto pode explicar, em certos indivíduos, a ocorrência de metástases anos após o tratamento LEISHMANIOSE CUTÂNEA DIFUSA Caracteriza-se pela formação de lesões difusas não ulceradas por toda a pele, contendo grande número de amastigotas. Esta entidade mórbida envolve amplas áreas da pele, particularmente extremidades e outras partes expostas, onde numerosas erupções papulares ou nodulares não ulceradas são vistas A LCD está estreitamente associada a uma deficiência imunológica do paciente deixando-o incapaz de montar uma resposta inflamatória eficaz contra o parasito, em que a resposta imune celular está deprimida com relação de antígenos de Leishmania, levando-o a um estado de alergia imunológica frente à infecção estabelecida. Esses pacientes não respondem ao antígeno de Montenegro. A doença caracteriza-se por curso crônico e progressivo por toda a vida do paciente, não respondendo aos tratamentos convencionais. PROFILAXIA Pelas diferentes características epidemiológicas observadas nos focos de LTA, as medidas de controle devem ser flexíveis e distintas para cada situação específica O controle químico com o uso de inseticidas deação residual é indicado para áreas novas, em surto ou com mais de um caso nos últimos 6 meses, onde a transmissão ocorre em ambiente domiciliar objetivando diminuir o risco de contato humano com o inseto vetor Em algumas situações é possível evitar a picada dos flebotomineos por meio de proteção individual, com a utilização de repelentes e de mosquiteiros de malha fina, mas nem sempre isto é possível. Algumas medidas de caráter coletivo também devem ser estimuladas, tais como o manejo ambiental com a limpeza de quintais e terrenos, evitando o acúmulo de lixo orgânico na tentativa de impedir proliferação das formas imaturas dos flebotomineos bem como a aproximação de roedores e marsupiais, possíveis fontes de infecção para o vetor. A solução ideal para o controle da leishmaniose tegumentar, particularmente no Brasil, é a produção de uma vacina DIAGNÓSTICO DIAGNÓSTICO CLÍNICO O diagnóstico clínico de LTA pode ser feito com base na característica da lesão que o paciente apresenta, associado à anamnese, na qual os dados epidemiológicos são de grande importância DIAGNÓSTICO LABORATORIAL PESQUISA DE PARASITO I: Exame direto de esfregaços corados II: Exame histopatológico III: Cultura IV: Inoculo em animais PESQUISA DO DNA DO PARASITO I: PCR MÉTODOS IMUNOLÓGICOS TESTE DE MONTENEGRO Este teste avalia a reação de hipersensibilidade retardada do paciente e é utilizado para o diagnóstico ou para monitoramento de vacinação contra LTA em projetos de pesquisa. O teste consiste no inóculo de 0,1 mL de antígeno pela via intradérmica na face interna do braço. No caso de testes positivos, verifica-se o estabelecimento de uma reação inflamatória local formando um nódulo ou pápula que atinge o auge em 48- 72 horas, regredindo em seguida. Utiliza-se como padrão de positividade a presença de nódulo > 5 mm no local da inoculação do antígeno RIFI TRATAMENTO Atualmente, utiliza-se um antimonial pentavalente, Glucantime. Eles atuam interferindo com a bioenergética das formas amastigotas (redução de ATP e GTP) É a única parasitose que o tratamento é endovenoso ou intramuscular de cara OBS: Efeitos Adversos: cardiopatas, nefropatas, gestantes e idosos ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS É uma importante zoonose 0,7-1 milhão de novos casos por ano
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