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Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 1 LEISHMANIOSE GÊNERO LEISHMANIA: -O gênero Leishmania (Ross, 1903) pertence a ordem Kinetoplastida, à família Trypanossomatidae e agrupa espécies de protozoários unicelulares, digenéticos (heteroxenos), encontradas nas formas promastígota e paramastigota, flageladas livres ou aderidas ao trato digestivo dos hospedeiros invertebrados, e amastigota, sem flagelo livre, parasito intracelular. A reprodução ocorre por divisão binária simples em ambos os hospedeiros. -Como hospedeiros invertebrados são identificados, exclusivamente, fêmeas de insetos hematófagos conhecidos como flebotomíneos. -Os hospedeiros vertebrados incluem uma grande variedade de mamíferos. Embora as infecções por esses parasitos sejam mais comuns nos roedores e canídeos, são conhecidas também entre edentados, marsupiais, procionídeos, ungulados primitivos, felinos, primatas e, entre estes, o homem. -A transmissão do agente ocorre por meio de mecanismo complexo, no momento da hematofagia do inseto infectado. Morfologia: -AMASTIGOTAS: As amastigotas, no interior das células fagocitárias ou livres, dependendo da preparação, quando fixadas e coradas pelos métodos derivados do Romanovsky, aparecem a microscopia óptica como organismos ovais, esféricos ou fusiformes. No citoplasma, corado em azul-claro, são encontrados: núcleo grande e arredondado, ocupando as vezes um terço do corpo do parasito, e cinetoplasto em forma de um pequeno bastonete, ambos corados em vermelho-púrpura, além de vacúolos que podem ou não ser visualizados. Não há flagelo livre. -Quando examinadas ao microscópio eletrônico de transmissão o envoltório é formado por uma unidade de membrana, sob a qual estão dispostos, em conformação regular e equidistante, microtúbulos em número variável. Nas diferentes espécies de Leishmania, a membrana apresenta uma invaginação na região anterior do corpo do parasito formando a bolsa flagelar, onde se localiza o flagelo. Aí não são encontrados microtúbulos subpeliculares e são grandes as atividades de excreção e de pinocitose. -O núcleo possui configurações variadas, tendendo a esférico, ora denso, ora mais frouxo, mostrando um cariossomo central ou excêntrico e a cromatina com disposição variável. São observados na matriz citoplasmática o aparelho de Golgi e o retículo endoplasmático, ribossomos, além de vacúolos e inclusões. -PROMASTIGOTAS: As formas flageladas, promastígotas são encontradas no trato digestivo do hospedeiro invertebrado. São alongadas, com um flagelo, livre e longo, emergindo do corpo do parasito na sua porção anterior. O núcleo é arredondado ou oval, e está situado na região mediana ou ligeiramente na porção anterior do corpo. -As promastigotas apresentam uma variabilidade muito grande nas medidas do corpo. O flagelo apresenta sempre medidas iguais ou superiores ao maior diâmetro do corpo. -As promastígotas metacíclicos são as formas infectantes para os hospedeiros vertebrados, possuem os diâmetros do corpo nos menores limites apresentados pelos promastígotas e o flagelo muito longo, cerca de duas vezes o comprimento do corpo. Possuem mobilidade intensa e são encontrados livres nas porções anteriores do trato digestivo do inseto. -PARAMASTIGOTAS: As paramastígotas são pequenas e arredondadas ou ovais. O flagelo é curto, exterioriza se na região anterior do corpo e sua extremidade pode estar aderida a superfície cuticular da porção anterior do trato digestivo do vetor através de hemidesmossomos. O núcleo mantém-se na posição mediana do parasito e o cinetoplasto é paralelo ou ligeiramente posterior ao núcleo. -A multiplicação, por divisão binária simples, é iniciada pela duplicação do cinetoplasto, um dos quais mantém o flagelo remanescente, enquanto o outro promove a reprodução da estrutura flagelar. A seguir, o núcleo se divide e, em seguida,o corpo do parasito se fende no sentido antero-posterior. -Leishmania, nas diferentes formas evolutivas, apresenta em sua superfície uma variedade de moléculas muito importantes para a relaçao dos parasitos com os seus hospedeiros, determinando a virulência, infecciosidade, sobrevida e patogênese. As formas flageladas expressam, entre outras moléculas, um complexo lipofosfoglicano, o LPG. Dentre as proteínas, uma metaloprotease, a gp63, é encontrada em ambas as formas. Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 2 CICLO BIOLÓGICO: -Os hospedeiros vertebrados são infectados quando formas promastígotas metacíclicas são inoculadas pelas fêmeas dos insetos vetores, durante o repasto sanguíneo. Estes insetos possuem o aparelho bucal curto e rígido, adaptado para dilacerar tecidos e vasos sangíneos do hospedeiro, o que proporciona a obtenção de um misto de linfa, sangue e restos celulares durante a alimentação. A saliva do inseto é inoculada neste ambiente e exerce papel importante como anticoagulante, vasodilatadora e antiagregação de plaquetas, favorecendo o fluxo de sangue e o acúmulo de linfa intersticial. Além destes efeitos, sabe-se que fatores presentes na saliva de flebotomíneos têm ação quimiotática para monócitos e imunorregulador, com capacidade de interagir com os macrófagos, aumentando sua proliferação e impedindo a ação efetora destas células na destruição dos parasitos. A saliva de Lutzomyia longipalpis contém o mais potente vasodilatador conhecido, o maxidilan, que além desta ação parece ser responsável pela maioria dos efeitos imunomodulatórios da saliva deste inseto sobre a célula hospedeira, durante a transmissão de Leishmania. -As formas promastígotas metacíclicas são resistentes a lise pelo complemento. Um dos mecanismos desta resistência é devido, em parte, a modificações estruturais no LPG. Após a ativação do complemento, frações como C3 e C3b, não se ligariam diretamente a membrana do parasito, devido a cobertura desta pelo LPG, e assim, o acesso e a inserção do complexo C5b-9 ou a formação de C5 convertase seriam dificultados, impedindo a sua lise. Por outro lado, a gp63 também preveniria a ação do complemento, através da clivagem de C3b em C3bi. As promastígotas podem ainda interagir com outras proteínas do soro para ativar o complemento, facilitando a adesão a membrana do macrófago. -Durante o processo de endocitose do parasito, por causas fisiológicas, a célula hospedeira aumenta intensamente a sua atividade respiratória. Os produtos liberados deste processo, com a formação de óxido nítrico, dos radicais livres óxidos, hidroxilas, hidróxidos e superóxidos (O-, OH-, H+e H202), são conhecidos por serem altamente lesivos para membranas celulares. Os parasitos necessitam da utilização de mecanismos de escape a este ataque. Novamente o LPG aparece como uma molécula protetora contra a ação destes radicais. Além disto, a saliva do inseto, presente neste ambiente, exerce ação inibidora da estimulação dos macrófagos, reduzindo a capacidade destas células de produzir Óxido nitrico. Entretanto, a internalização é também um mecanismos de defesa. -A internalização de Leishmania se faz através da endocitose mediada por receptores na superficie do macrófago. As promatígotas metacíclicas utilizam a opsonização com C3b e C3bi para se ligarem a CR1 e CR3 no macrófago. Estes receptores promovem a fagocitose, sem estimular o aumento da atividade respiratória da célula e a consequente geração de radicais livres. Através deles, o parasito pode ser prontamente internalizado pelas células de Langerhans da derme, embora não se reproduzam aí. A rápida transformação em amastígotas é outra forma de evadir ao ataque do hospedeiro. -Após a internalização, o promastigota metacíclico é encontrado dentro do vacúolo parasitóforo. Ocorre, então, ofenômeno de toque entra o vacúolo que contém o parasito e os lisossomos, que permite a passagem de enzimas para o fagossomo sem, no entanto, ocorrer a fusão. O LPG do parasito pode retardar este toque, para sua adaptação as condições do novo ambiente. A promastígota transforma-se em amastígota, capaz de desenvolver e multiplicar no meio ácido encontrado no vacúolo digestivo. Nestas condições, a gp63, protease, atua degradando as enzimas lisossomais. -Mantendo o controle das condições ambientais internas do vacúolo, a amastígota inicia o processo de sucessivas multiplicações. Na ausência do controle parasitário pela célula hospedeira, esta se rompe e as amastígotas liberadas serão, por mecanismo semelhante, internalizadas por outros macrófagos. Este ciclo (multiplicação da forma asmastigota dentro do macrófago) acontece tanto na LTA quanto na LV. A diferença é a seguinte: • LTA: o ciclo ocorre nos macrófagos residentes na pele e/ou mucosas. • LV: o ciclo ocorre em órgãos linfoides (medula óssea, baço, linfonodos) e nas vísceras. -A infecção para o hospedeiro invertebrado ocorre quando da ingestão, no momento do repasto sanguíneo em indivíduo ou animal infectado, das formas amastígotas que acompanham o sangue e/ou a linfa intersticial. O alimento, no intestino médio do inseto, é rapidamente envolvido por uma membrana quitinosa, secretada pelas células epiteliais do intestino, a matriz peritrófica. No interior desta matriz, após cerca de 18-24 horas, as amastígotas se transformam em flagelados pequenos, ovóides, pouco móveis. Após aproximadamente três e quatro dias de multiplicação intensa, ocorre a transformação em formas promastígotas delgadas e longas. -As moléculas de superfície de Leishmania, como o LPG e gp63, entre outras, exercem papel importante nos eventos que se seguem. Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 3 -O LPG reveste o parasito de forma a protegê-lo da ação enzimática digestiva no interior da matriz peritrófica. Por outro lado, a gp63, com sua ação enzimática, exerce papel importante na ruptura da matriz e conseqüente liberação dos parasitos, antes que o bolo alimentar siga seu percurso intestinal. -As formas liberadas, também por ação do LPG, se ligam, através do flagelo, as microvilosidades intestinais do inseto, garantindo a sua permanência e desenvolvimento naquele local. -Por volta de três a cinco dias o alimento é digerido e excretado. Neste tempo, já são encontradas formas flagelas migrantes na porção torácica do intestino médio. (Esta migração é acompanhada pela transformação dos parasitos em (1) promastígotas curtas e largas livres na luz intestinal, (2) paramastígotas arredondadas, fixadas pelo flagelo a cutícula através de hemidesmossomos e (3) promastígotas metacíclicos.) -A colonização de Leishmania, para algumas espécies, é restrita A porção média e anterior do intestino. Para outras, ocorre no triângulo posterior do intestino, onde os parasitos são encontrados aderidos a cutícula da parede intestinal, através de hemidesmossomos, ou livres no lúmen, em processo de multiplicação. Em todas as espécies, os parasitos migram para as porções anteriores do aparelho digestivo do inseto LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA: -A leishmaniose tegumentar americana (LTA) é uma doença de caráter zoonótico que acomete o homem e diversas espécies de animais silvestres e domésticos, podendo se manifestar através de diferentes formas clínicas. -É considerada uma enfermidade polimórfica e espectral da pele e das mucosas. - As principais manifestações observadas nos pacientes com LTA podem ser classificadas de acordo com seus aspectos clínicos, patológicos e imunológicos. • A forma cutânea localizada é caracterizada por lesões ulcerosas, indolores, únicas ou múltiplas; • A forma cutaneomucosa é caracterizada por lesões mucosas agressivas que afetam as regiões nasofaríngeas; • A forma disseminada apresenta múltiplas úlceras cutâneas por disseminação hematogênica ou linfática; • A forma difusa com lesões nodulares não-ulceradas. -Agente etiológico: A leishmaniose tegumentar americana é uma doença causada por parasitos do gênero Leishmania Ross, 1903. Este é um protozoário digenético que tem seu ciclo biológico realizado em dois hospedeiros, um vertebrado e um invertebrado (heteroxeno). • Os hospedeiros vertebrados incluem grande variedade de mamíferos: roedores, edentados (tatu, tamanduá, preguiça), marsupiais (gambá), canídeos e primatas, incluindo o homem. • Os hospedeiros invertebrados são pequenos insetos da ordem Diptera, família Psychodidade, subfamília Phlebotominae, gênero Lutzomya. Nestes insetos ocorre parte do ciclo biológico do parasito. -Reprodução: O processo de reprodução das leishmania é feito por divisão binária Ciclo biológico: 1. Ciclo no vetor: -A infecção do inseto ocorre quando a fêmea pica o vertebrado e juntamente com o sangue ingere o macrófago parasitado por formas amastigotas. Durante o trajeto pelo trato digestivo anterior, esses macrófagos vão ser rompidos e vão liberar a forma amastigota, elas vão sofrer uma divisão binária e vão se transformar na forma promastigota. Após a digestão no sangue a membrana peritrófica se rompe e a forma promastigota será livre. -Nesta etapa do ciclo, as promastigotas permanecem se reproduzindo por divisão binaria, podendo seguir dois caminhos, dependendo da espécie do parasito. No primeiro, as formas promastigotas das espécies pertencentes ao subgênero Viannia dirigem-se para o intestino onde se colonizam nas regiões do piloro e íleo. Nestes locais ocorre a transformação das promastigotas em paramastigotas que permanecem aderidas pelo flagelo ao epitélio intestinal onde ainda se dividem. Novamente ocorre transformação em promastigotas que migram através do estômago em direção à faringe do inseto. -Durante o processo de migração no trato digestivo do vetor, há uma mudança da expressão, esse processo é chamado de metaciclogênese, onde as promastigotas migram para a parte anterior do tubo digestivo do vetor e atingem um estágio infectivo, ou seja, se transformam em formas metacíclicas infectantes. A principal transformação bioquímica observadas ocorre com a variação do tamanho das porções glicídicas da molécula de lipofosglicano (LPG) ancoradas na superfície das membranas das promastígotas. -No segundo, as formas promastigotas das espécies pertencentes ao subgênero Leishmania multiplicam-se livremente ou aderentes às paredes do estômago. Em Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 4 seguida, ocorre migração dos flagelados para a região anterior do estômago onde transformam-se em paramastígotas, colonizando no esôfago e na faringe. Neste local, diferenciam-se novamente em pequenas promastígotas metacídicas, semelhantes ao desenvolvimento anterior. O tempo necessário para que o ciclo se complete varia entre três e cinco dias para diferentes espécies. 2.Ciclo no vertebrado: - Durante a alimentação do flebotomíneo é que ocorre a transmissão do parasito. -Na tentativa de ingestão do sangue as formas promastigotas são introduzidas no local da picada e entre um período de 4h a 8h esses promastigotas são interiorizados pelos macrófagos teciduais. -A saliva do flebotomíneo possui neuropeptideos vasodilatadores que atuam facilitando a alimentação do inseto e ao mesmo tempo imunossuprimindo a resposta do hospedeiro vertebrado; desta forma, exerce importante papel no sucesso da infectividade das promastigotas metacíclicas. -O macrófago estende pseudópodos que envolvem o parasito, introduzindo-o para o seu interior, envolto pelo vacúolo fagocitário. Rapidamente as formas promastigotas se transformam em amastigotas que sãoencontradas 24 horas após a fagocitose. - Dentro do vacúolo fagocitário dos macrófagos, as amastigotas estão adaptadas ao novo meio fisiológico e resistem a ação destruidora dos lisossomas, multiplicando- se por divisão binária até ocupar todo o citoplasma. Esgotando-se sua resistência, a membrana do macrófago se rompe liberando as amastigotas no tecido, sendo novamente fagocitadas, iniciando no local uma reação inflamatória. - O curso da infecção nos animais, incluindo o homem, é altamente variável, sendo dependente da espécie de Leishmania que o parasita, de características genéticas e da resposta imune do hospedeiro, o que origina diferentes quadros clínicos. Transmissão: -A transmissão ocorre pela picada de insetos hematófagos pertencentes ao gênero Lutzomyia conhecidos no Brasil por birigui, mosquito-palha. Ao exercer o hematofagismo, a fêmea do flebotomíneo corta com suas mandíbulas o tecido subcutâneo logo abaixo da epiderme, formando sob esta um afluxo de sangue, onde são inoculadas as formas promastígotas metacídicas provenientes das regiões anteriores do trago digestivo: faringe e esôfago. Interação parasito-célula hospedeira: -A saliva contribui efetivamente na infecciosidade das formas promastígotas, por meio de substância vasodilatadora (Maxidilan). Essa substância imunossupressora parece inibir a apresentação de antígenos de Leishmania pelos macrófagos. Além disso, o maxidilan exerce um papel de imunomodulador da resposta imune, inibindo a secreção de citocinas tipo I (IL12 e INFy). Desta forma, citocinas tipo IL4 e IL10 agem suprimindo a resposta imune celular favorecendo o sucesso da infecção. -As diversas espécies de Leishmania são capazes de ativar o complemento tanto pela via clássica como pela via alternativa. Os fatores do complemento, principalmente o C3 e seus produtos de clivagem favorecem a fagocitose, uma vez que macrófagos possuem receptores específicos para os mesmos. O complexo lítico final do complemento é capaz de aderir a superfície dos promastígotas e provocar a lise dessas formas. Entretanto, os LPs (lipofosfossacarídeos) dos parasitos interferem na inserção do complexo C5-9, provavelmente por impedimento estérico produzido pelo espessamento da LPG (lipofosfoglicano). -Além do LPG, a glicoproteína gp63 e alguns carboidratos estão envolvidos com a ligação do parasito com a célula hospedeira.A penetração na célula por meio de receptores para estes ligantes resulta em uma forma de escape da Leishmania, uma vez que dessa forma o mecanismo microbicida de explosão respiratória dos macrófagos não será ativado. No interior do fagossoma as promastígotas transformam-se em amastigotas que sobrevivem e se multiplicam dando início à infecção. Resposta imune: -Na modulação da resposta imune, o macrófago apresenta os antígenos aos linfócitos T CD4+, que podem ser subdivididos em pelo menos duas subpopulações: Th1 e Th2. Essa variação no padrão de resposta tem sido constatada nas diferentes formas clínicas, resultando na existência de formas extremas da doença tal como na hanseníase. A resistência do hospedeiro está associada a ativação seletiva e diferenciação de células efetoras T helper CD4+ (Thl), as quais secretam um padrão de citocinas específicas, IL-2, INFy, IL-12 e TNF-a, conhecidos como citocinas pró-inflamatórias. Por outro lado, a suscetibilidade a infecção está relacionada com a resposta de células CD4+ (Th2), que secretam citocinas específicas do tipo IL-4, IL-5, IL-6, IL-10,TGF-p, dentre outras. Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 5 -Na forma cutânea, observa-se uma correlação com a resposta do tipo Th1, caracterizada histologicamente por um processo granulomatoso tipo tuberculoide, com proliferação linfocitária e plasmocitária marcada por ausência ou escassez de parasitos. A imunidade celular é facilmente detectada, mas, ao contrário do que ocorre nas formas auto-resolutivas, a doença progride, podendo evoluir para a forma cutaneomucosa, a qual apresenta expressão simultânea de citocinas Thl e Th2 (ou seja, um padrão Th0). -A leishmaniose cutâneo-difusa está correlacionada com a resposta do tipo Th2, na qual existe uma infiltração dérmica de macrófagos, habitualmente vacuolizados, repletos de amastigotas e com escassez de linfócitos, caracterizando um padrão de suscetibilidade em humanos. A resposta imune celular é variável conforme o quadro clínico, estando presente nos pacientes acometidos pela forma cutânea, exacerbada nos casos de lesões mucosas e usualmente suprimida nos casos de leishmaniose difusa. -A resposta imune humoral está normalmente presente em todas as manifestações clínicas de LTA. Os níveis de anticorpos observados nos casos de leishmaniose difusa são elevados. Nos casos de leishmaniose cutâneo e cutaneomucosa, os níveis de anticorpos são baixos ou discretamente aumentados quando ocorre acometimento de mucosa. - Após cura clínica, os títulos de anticorpos decrescem, deixando de ser detectados alguns meses após a cura em alguns casos. - Estudos recentes demonstram uma variação no padrão de resposta humoral de anticorpos da subclasse IgG, conforme as diferentes formas clínicas da leishmaniose tegumentar. - Observa-se um aumento dos níveis de anticorpos IgG1 e IgG3 nas formas clínicas cutânea e cutaneomucosa, enquanto na forma cutâneo difusa observa-se um aumento nos níveis de IgG4 e IgG1. Patogenia: - No início da infecção, as formas promastígotas são inoculadas na derme. As células destruídas pela probóscida (apêndice alongado) do inseto e a saliva inoculada atraem para a área células fagocitárias mononucleares, os macrófagos. Certos macrófagos são capazes de destruir os parasitos diretamente. Ao serem fagocitadas, as promastígotas transformam-se em amastigotas e iniciam reprodução por divisões binárias sucessivas; mais macrófagos são atraídos ao sítio, onde se fixam e são infectados. A lesão inicial é manifestada por um infiltrado inflamatório composto principalmente de linfócitos e de macrófagos na derme, estando estes últimos abarrotados de parasitas. -Período de incubação: O período de incubação pode ser de 2 semanas até 3 meses Evolução: As lesões iniciais são semelhantes independente do parasito e essa forma pode estacionar, regredir ou evoluir para um nódulo dérmico chamado de “histiocitoma”, localizado sempre no centro de onde foi a picada do vetor. Nos estágios iniciais, histologicamente a doença é caracterizada pela hipertrofia do extrato córneo e da papila com acumulo de histiócitos, onde o parasito se multiplica. • Gradualmente vai se formar um infiltrado celular que vai circundar a lesão, consistindo em pequenos e grandes linfócitos. Com resultado ocorre a inflamação do tipo tuberculoide. Ocorre necrose resultando na desintegração da epiderme e da membrana basal que culmina com a formação de uma lesão úlcero-crostosa. • Após a perda da crosta, observa-se uma pequena úlcera com bordas ligeiramente salientes e fundo recoberto por exsudato seroso ou seropurulento. Esta lesão progride, desenvolvendo-se em uma típica úlcera leishmaniótica que, por seu aspecto morfológico, pode ser reconhecida imediatamente. Trata-se de uma úlcera de configuração circular, bordos altos, cujo fundo é granuloso, de cor vermelha intensa, recoberto por exsudato seroso ou seropurulento, dependendo da presença de infecções secundárias. • As lesões podem assumir. entretanto, outras formas menos características: seca e hipercerastósica, com exsudato seropurulento. Simultaneamente, ou em seguida ao aparecimento da lesão inicial, pode ocorrer disseminação linfática ou hematogênica, produzindo metástases cutânea, subcutânea ou mucosa. • Seguido a um tratamento com sucesso, forma-se no local, emsubstituição a úlcera, uma cicatriz característica. Em geral a área cicatricial está despigmentada, com uma leve depressão na pele, com uma fibrose sob a epiderme, que está fina. Formas clínicas: 1. Leishmaniose cutânea -A leishmaniose cutânea é caracterizada pela formação de úlceras únicas ou múltiplas confinadas na derme, com a epiderme ulcerada. Resultam em úlceras leishmanióticas típicas, ou, então, evoluem para formas vegetantes verrucosas ou framboesiformes. A densidade de parasitos nos bordos da úlcera formada é grande nas fases iniciais da infecção, com tendência a escassez nas úlceras crônicas. -Leishmaniose braziliense: Provoca no homem lesões conhecidas por úlcera-de Bauru, ferida brava, ferida seca Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 6 e bouba. As lesões primárias são usualmente únicas, ou em pequeno número, mas frequentemente de grandes dimensões, com úlceras em forma de cratera. O curso da infecção é geralmente irregular e crônico; e a tendência para cura espontânea, que depende em parte do tipo e da localização das lesões, varia grandemente de uma região geográfica para outra. Esta espécie é responsável pela forma cutânea mais destrutiva dentre as demais conhecidas -A leishmaniose cutâneo-disseminada é uma variação da forma cutânea e geralmente está relacionada com pacientes imunossuprimidos (AIDS). 2. Leishmaniose cutaneomucosa -Um dos aspectos mais típicos da doença causada pela L. braziliensis é a frequência com que o parasito produz, meses ou anos após a lesão inicial primária, lesões destrutivas secundárias envolvendo mucosas e cartilagens. Trata-se de um processo lento, de curso crônico. Estas lesões secundárias podem ocorrer por extensão direta de uma lesão primária ou então através da disseminação hematogênica. -As regiões mais comumente afetadas pela disseminação metastásica são o nariz, a faringe, a boca e a laringe. O primeiro sinal de comprometimento mucoso manifesta-se por eritema e discreto infiltrado inflamatório no septo nasal, resultando em coriza constante e posteriormente em um processo ulcerativo. Atinge depois o vestíbulo, as asas do nariz, o assoalho da fossa nasal, o palato mole e a úvula, daí descendo para a faringe, podendo comprometer a laringe e a traqueia. A destruição do septo provoca mudança anatômica e aumento do órgão, que se constitui no chamado nariz de anta. Em muitos casos ocorre completa destruição de toda a estrutura cartilaginosa do nariz. -O processo ulcerativo pode atingir os lábios e se propagar pela face. Estas graves mutilações criam ao paciente dificuldades de respirar, falar e se alimentar. São frequentes, nesta fase, complicações respiratórias por infecções secundárias, podendo levar o paciente ao óbito. 3. Leishmaniose Cutânea Difusa -Caracteriza-se pela formação de lesões difusas não ulceradas na pele, contendo grande número de amastigotas. -Essa entidade mórbida envolve amplas áreas da pele, particularmente extremidades e outras partes expostas, onde numerosas lesões papulares ou nodulares não ulceradas são vistas. -O curso da infecção inicial se processa com a formação de uma única ulcera. A multiplicidade das lesões ocorre por conta do resultado metastático do parasito de um sítio para outro através de vasos linfáticos ou migração de macrófagos parasitados. -A LCD está associada a uma deficiência imunológica do paciente, em que a resposta imune celular está deprimida com relação a antigenos de Leishmania, levando-o a um estágio de anergia imunológica frente à infecção estabelecida. A doença caracteriza-se pelo curso crônico e progressivo por toda vida do paciente, não respondendo aos tratamentos convencionais. Diagnóstico: -Diagnóstico clínico: O diagnóstico clínico da LTA pode ser feito com base na característica da lesão que o paciente apresenta, associado a anarnnese, na qual os dados epidemiológicos são de grande importância. Deve ser feito o diagnóstico diferencial de outras dermatoses granulomatosas que apresentam lesões semelhantes à LTA e que podem ser confundidas, como tuberculose cutânea, hanseníase, infecções por fungos (blastomicose e esporotricose), úlcera tropical e neoplasmas. -Diagnóstico laboratorial: A demonstração do parasito pode ser feita do material obtido da lesão existente através de: • Exame direto de esfregaços corados. • Exame histopatológico. • Cultura de fragmentos do tecidos -Os métodos imunológicos são feitos por meio do Teste de Montinegro que avalia a resposta celular mediante a ativação dos linfócitos. O teste consiste no inóculo de 0,1 ml de antígeno intradermicamente na face interna do braço. No caso de reações positivas, verifica-se o estabelecimento de uma reação inflamatória local formando um nódulo ou pápula que atinge o auge em 48-72 horas, regredindo então. Os resultados do exame podem ser: reação negativa (ausência de qualquer sinal no local de inoculação) ou reação positiva (presença de nódulo com diâmetro variado). • Pacientes com Leishmaniose tegumentar cutânea apresentam geralmente resultados positivos. • Pacientes com Leishmaniose tegumentar cutânea- mucosa apresentam geralmente resultados positivos. • Pacientes com Leishmaniose tegumentar cutâneo- difusa, por se tratar de uma resposta Th2, o teste pode fornecer resultado falso negativo, sendo um método limitado para diagnóstico desse tipo de leishmaniose. Tratamento: Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 7 - O tratamento da LTA foi introduzido pelo médico brasileiro Gaspar Vianna, em 1912, com o uso do antimonial tártaro emético. Esta droga durante muitos anos se constituiu na única arma terapêutica em todo o mundo. Atualmente utiliza-se um antimonial pentavalente, Glucantimeo. - O esquema terapêutico varia muito no Brasil, mas usualmente os resultados são excelentes utilizando-se o seguinte esquema: 17mg Sb5+/kg peso/dia, durante dez dias. Faz-se um intervalo de dez dias e novamente inicia- se outra série de tratamento durante dez dias. A dose máxima por injeção deve ser de 10 ml, independente do peso do paciente. O número de séries necessárias varia de acordo com o processo de cura da lesão. Recomenda-se a continuação do tratamento até completa cicatrização da úlcera. - A via de administração é geralmente intramuscular, mas também pode ser feito endovenoso ou local. A droga não deve ser utilizada em pacientes cardíacos e nem em mulheres grávidas, pois o antimônio pode provocar alterações eletrocardiográficas e também é abortivo. - No entanto, o Ministério da Saúde preconiza o uso de 20mgSb5+/kg pesoldia, durante 20 dias, para a leishmaniose cutânea e 30 dias para leishmaniose cutaneomucosa. Todavia, em nossas experiências clínicas observamos um alto índice de recidivas neste esquema de tratamento. (Essse antimonial é indicado para o tratamento de todas as formas de LT, embora as formas mucosas exijam maior cuidado, podendo apresentar respostas mais lentas e maior possibilidade de recidivas.) - As lesões ulceradas podem sofrer contaminação secundária, razão pela qual devem ser prescritos cuidados locais como limpeza com água e sabão e se possível compressas com KMn04 (permaganato de potássio) -Imunoterapia: No Brasil, a imunoterapia vem sendo realizada em pacientes com LTA, em diferentes esquemas de tratamento, utilizando como antígeno uma vacina preparada para imunoprofilaxia obtendo excelentes resultados. Esta vacina representa uma alternativa na terapêutica de casos "resistentes" aos antimoniais ou com contra-indicação ao seu uso, como cardiopatas, nefropatas, mulheres grávidas, idosos etc. Também se mostra como uma medida de redução de custos, tanto diretos como indiretos, no tratamento da doença. -A imunoterapiapode ser feita com vários esquemas medicamentosos, a depender da indicação do paciente. Profilaxia: O controle de leishmaniose tegumentar americana é dificil nas vastas áreas florestais do Brasil e, no presente momento, é insolúvel. O uso, em larga escala, de inseticidas nas florestas tropicais não é somente altamente antieconômico mas representa, principalmente, perigo do ponto de vista biológico, com a destruição da população de pequenos mamíferos, afetando seriamente a fauna. Em áreas endêmicas do Sudeste do Brasil, a dedetização do ambiente domiciliar e peridomiciliar também não reduz a incidência da doença. -Em algumas situações é possível evitar a picada dos flebotomíneos através de proteção individual, com a utilização de repelentes e utilização de mosquiteiros de malha fina, -A solução ideal para o controle da leishmaniose tegumentar, particularmente no Brasil, é a produção de uma vacina.A busca de uma vacina efetiva contra a LTA é realizada atualmente em vários países, incluindo o Brasil. LEISHMANIOSE VISCERAL (CALAZAR): -Nas Américas, Leishmania chagasi é a espécie responsável pelas formas clínicas da leishmaniose visceral. -A leishmaniose visceral ou calazar é uma doença infecciosa sistêmica, de evolução crônica, caracterizada por febre irregular de intensidade média e de longa duração, esplenomegalia, hepatomegalia, acompanhada dos sinais biológicos de anemia, leucopenia, trombocitopenia, hipergamaglobulinemia e hipoalbuminemia. (Acomete os aparelhos viscerais). -O emagrecimento, o edema e o estado de debilidade progressiva contribuem para a caquexia e o óbito, se o paciente não for submetido ao tratamento específico. Entretanto, há evidências de que muitas pessoas que contraem a infecção nunca desenvolvem a doença, se recuperando espontaneamente, ou mantendo equilíbrio da infecção e se apresentando sempre como assintomáticas. -A doença é crônica, grave, de alta letalidade se não tratada. -Os fatores de risco para o desenvolvimento da doença incluem a desnutrição, o uso de drogas imunossupressorase a co-infecção com HIV. Ciclo Biológico: -A infecção do inseto por Leishmania chagasi ocorre quando as fêmeas, hematófagas, se alimentam em hospedeiro vertebrado infectado, e ingerem com o sangue macrófagos e monócitos parasitados. No interior do intestino médio, rapidamente ocorre a ruptura das Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 8 células liberando as formas amastigotas que, após divisão binária, se transformam em promastigotas arredondadas e de flagelo curto, que se dividem intensamente, ou alongadas com um flagelo longo e cujo processo de divisão é bem menos intenso. -Quando a matriz peritrófica se rompe, cerca de 48 a 72 horas após o repasto alimentar, as formas promastígotas livres migram para o intestino anterior. Na válvula estomadeo, no esôfago, na faringe são encontradas: paramastigotas, fixadas ao epitélio pelo flagelo através de hemodesmossomos, em reprodução intensa; promastigotas longas com o flagelo também longo, em processo de multiplicação de pouca intensidade; e promastigotas curtas, dotadas de flagelo longo, ágeis na movimentação e que nunca foram vistas em processo de divisão. Estas formas, as promastigotas metaciclicas, são infectantes para o hospedeiro vertebrado. -A transmissão do parasito ocorre quando as fêmeas infectadas se alimentam em vertebrados susceptíveis. Durante a alimentação, a saliva é inoculada com as formas do parasito. Dentre outros fatores, a presença do maxidilam, um dos mais potentes vasodilatadores conhecidos, parece ser muito importante para os eventos que se seguem na modulação da resposta imune, determinantes da infecção. -Para escapar ao ataque do sistema imunológico do hospedeiro vertebrado, as formas promastigotas metacíclicas são rapidamente internalizadas, através de fagocitose mediada por receptores, por células do SMF, principalmente os macrófagos. Dentro do fagossomo, no interior destas células, o parasito se diferencia em amastigota para a sua sobrevida fisiológica e inicia o processo de sucessivas divisões binárias. Quando os macrófagos estão densamente parasitados, rompem-se liberando as amastigotas que irão parasitar novos macrófagos tornando o hospedeiro infectado. Transmissão: -O principal mecanismo de transmissão, nas condições naturais, é a picada da fêmea do mosquito L. longipalpis. -Pode ocorrer também por meio de transfusões sanguíneas e uso de drogas injetáveis, acidentes de laboratório, e a transmissão materno-fetal que ocorre ou pela placenta pela passagem de células do sistema imune infectadas, ou pelo contato com o sangue da mãe durante o parto. Relação hospedeiro-parasito: (Imunidade) -Na infecção por Leishmania sabe-se que a multiplicação dos parasitos dentro dos macrófagos depende de mecanismos imune regulatórios, como a capacidade da célula de prevenir a apoptose, estimular o complexo maior de histocompatibilidade classe I1 (MHC 11), modular a expressão de citoquinas do próprio macrófago e sua ação sobre os linfócitos T. -Macrófagos parasitados e outras células apresentadoras de antígeno apresentam antígenos de Leishmania aos linfócitos T do tipo CD4+. Estes linfócitos são estimulados a produzir interleucinas e dependendo do perfil estimulado, ocorre o desenvolvimento de duas subpopulações de linfócito TH. TH1 secreta grande quantidade de TNF-y associado a produção de citocinas pró inflamatórias, enquanto TH do tipo 2 produz grande quantidade de IL-4 associada citocinas promotoras da produção de anticorpos produzidos por linfócitos B. Também foi caracterizado nesse modelo que a resposta THI está associada a capacidade do hospedeiro em controlar a infecção e a resposta TH2, mais correlacionada com o processo progressivo da doença. -A indução preferencial das células THI ou TH2 depende de alguns fatores, como a dose infectante, o mecanismo de apresentação pela APC, a via de inoculação e o padrão genético do hospedeiro. Algumas das citocinas produzidas pela resposta do tipo THl ou TH2 possuem caráter regulador, favorecendo ou inibindo a expansão celular de um ou outro grupo. -A leishmaniose visceral é caracterizada pela incapacidade do macrófago em destruir as amastigotas. Nos doentes, tem sido observada a produção de níveis elevados de IL-10. O aumento de IL- 1 O em sinergismo com IL-4 parece ser fundamental na progressão da doença, desde que ambas são capazes de inibir: a ativação de macrófagos pelo INF-y produzido pelas células TCD4+; a transcrição do TNF-a; e a produção de H2O2. -A produção de anticorpos, principalmente IgG, é muito elevada. Entretanto, como a ativação de LB é policlonal, a maioria das imunoglobulinas são inespecíficas. A presença de anticorpos específicos contra Leishmania é importante, principalmente para o diagnóstico. -Esses eventos perpetuam a infecção, tomando a doença progressiva e eventualmente letal, se não controlada. O curso da infecção é dependente, ainda, da capacidade do hospedeiro em estabelecer uma resposta imune mediada por células. Patogenia: -A L. chagasi é um parasito de células do SMF, principalmente do baço, fígado, linfonodo e medula óssea. Entretanto, no curso da infecção outros órgãos e tecidos podem ser afetados, como intestino, sangue, pulmões, rins e pele. Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 9 -A pele é a porta de entrada para a infecção. A inoculação das formas infectantes é acompanhada da saliva do inseto vetor, que é rica em substâncias com atividade inflamatória. Esta atividade é muito importante para o aumento de células fagocitárias neste local e crucial para a instalação da infecção. O sinal de porta de entrada é transitório e representadopela ação inflamatória que determina a formação de um nódulo chamado de leishmanioma. No entanto, na infecção por Leishmania chagasi, o local da inoculação dos parasitos normalmente passa desapercebido. - O processo pode evoluir para a cura espontânea ou, a partir da pele, ocorrer a migração dos parasitos, principalmente para os linfonodos, seguida da migração para as vísceras. -Nas vísceras, os parasitos induzem uma infiltração focal ou difusa de macrófagos nãoparasitados, além de infiltrado de linfócitos e células plasmáticas, com focos de plasmacitogênese. As alterações mais particulares são descritas nos tecidos esplênico, hepático, sanguíneo, pulmonar e renal. -A via de disseminação de Leishmania pode ser a hematogênica elou linfática. -Alterações esplênicas: Esplenomegalia é o achado mais importante e frequente no calazar. Na fase inicial da doença, a esplenomegalia pode não ocorrer ou ser pouco acentuada, mas na doença estabelecida e crônica toma-se uma característica invariável. -Alterações hepáticas: Hepatomegalia é outra característica marcante no calazar. O órgão mantém consistência firme e ocasionalmente mostra congestão passiva. Ocorre hiperplasia e hipertrofia das células de Kupffer, em geral densamente parasitadas. É frequente a presença de infiltrado difuso de células, plasmáticas e linfócitos, intraparenquimal. Podem ser observadas fibrose septal e portal, leve ou moderada, ao longo do infiltrado inflamatório. -Alterações no tecido hemocitopoético: A medula óssea é em geral encontrada com hiperplasia e densamente parasitada. A eritropoese e granulopoese são normais no início do processo infeccioso. Durante as fases mais adiantadas da infecção, ocorre desregulação da hematopoese, caracterizada pela diminuição da produção celular, com reflexo no quadro hematológico em períodos sucessivos: hiperplasia no setor histiocitário; hipoplasia no setor formador de sangue e, por fim, aplasia (desenvolvimento imperfeito de um órgão). A anemia é o achado mais frequente 'nos indivíduos doentes. As contagens de eritrócitos nesses casos são muito baixas, entre 2 e 3 milhões/mm3 de sangue -Alterações renais: A principal alteração que ocorre nos rins está relacionada com a presença de imunocomplexos circulantes. Em muitos casos ocorre glomerolonefrite proliferativa e nefrite intersticial. Estudos a microscopia eletrônica e imunofluorescência revelam o espessamento da membrana basal e proliferação das células mesangiais como achados mais frequentes. -Alterações dos linfonodos: Os linfonodos encontram-se frequentemente aumentados. Ocorre reatividade nos centros germinativos dos folículos linfóides, reflexo do aumento na celularidade perifolicular. Na zona paracortical há depleção de células T e presença de plasmócitos e macrófagos parasitados. -Alterações pulmonares: Nos pulmões ocorre, com relativa frequência, pneumonite intersticial com o espessamento dos septos pulmonares, devido a tumefação endotelial e proliferação das células septais, as vezes com fibrose septal, e de linfócitos e células plasmáticas. As amastigotas são raras ou ausentes no pulmão. Quadro clínico: A doença pode ter desenvolvimento abrupto ou gradual. Os sinais sistêmicos típicos estão associados a febre intermitente, palidez de mucosas, esplenomegalia associada ou não a hepatomegalia, e progressivo emagrecimento com enfraquecimento geral do hospedeiro. • Fase assintomática: Os indivíduos podem desenvolver sintomatologias pouco especificas que se manifestam por febre baixa recorrente, tosse seca, diarréia, sudorese, prostração e apresentar cura espontânea ou manter o parasito, sem nenhuma evolução clínica por toda a vida. • Fase aguda: febre alta, palidez de mucosas e hepatoesplenomegalia discretas. Muitas vezes o paciente apresenta tosse e diarréia. Clinicamente, é confundida com febre tifóide, malária, esquistossomose, doença de Chagas aguda, toxoplasmose aguda, entre outras doenças febris agudas que apresentam hepatoesplenomegalia. Os pacientes apresentam IgG anti-leishmania e o parasitismo é mais frequente no fígado e baço e menos frequente na medula. • Forma sintomática ou calazar clássico: febre irregular e agravamento de sintomas. O emagrecimento é progressivo e conduz o paciente para desnutrição protéico-calórica, caquexia (enfraquecimento) acentuada, mesmo com apetite preservado. A hepatoesplenomegalia, associada à ascite determinam o aumento do abdome. É comum edema generalizado, dispneia, cefaleia, dores musculares. É uma doença de caráter imunodepressor, consequentemente aumenta as infecções bacterianas oportunitas como pneumonia, tuberculose. Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 10 *Leishmaniose Dérmica Pós-Calazar: A leishmaniose dérmica pos-calazar (LDPK) é uma manifestação cutânea da leishmaniose causada pela Leishmania donovani, que ocorre após o tratamento da forma visceral. A LPDK é mais frequente em pacientes na India e no Sudão, onde aparece de 6 meses a 6 anos depois da cura clínica do calazar. Diagnóstico: -A rotina do diagnóstico da leishmaniose visceral baseia- se nos sinais e sintomas clínicos, em parâmetros epidemiológicos, e na grande produção de anticorpos. -Diagnóstico clínico: baseia-se nos sinais e sintomas apresentados pelos pacientes associados a história de residência em área endêmica. Em particular, nos pacientes com AIDS, os sintomas mais relatados são as lesões de pele, manifestações hemorrágicas gastrointestinais e respiratórias, por vezes, na completa ausência de febre e esplenomegalia. É necessário, por muitas vezes (principalmente na região Nordeste), realizar diagnóstico diferencial com esquistossomose. -Diagnóstico laboratorial: Pesquisa do parasito: baseia-se na observação direta do parasito em preparações de material obtido de aspirado de medula óssea, baço, fígado e linfonodo, através de esfregaços em lâmina de vidro, corados pelo Giemsa, inoculados em meio de cultura NNN ou em animais de laboratório. A punção de medula óssea é a técnica mais simples e representa menos risco para o paciente. No adulto, é realizada na medula do esterno, no nível do segundo espaço intercostal e em crianças, na crista ilíaca. A biópsia hepática oferece resultados questionáveis, em virtude da menor expressão do parasitismo do fígado. A punção do baço apresenta riscos, podendo levar a ruptura do órgão e a hemorragias fatais. Métodos imunológicos: uma característica clínica imunológica marcante do calazar é a hipergamaglobulinemia, decorrente da expansão policlonal de linfócito B, que caracteriza a resposta especifica, através da produção de imunoglobulinas G (IgG e IgM), com grande produção de proteínas inespecíficas. Outras técnicas são: RIFI (Reação de Imunofluorescência Indireta), ELISA (Ensaio Imunoenzimático) e a Reação de Fixação do Complemento Tratamento: -O arsenal terapêutico contra a leishmaniose visceral é limitado. Os antimoniais pentavalentes antimoniato de N- metilglucamina e o estibogliconato sódico são, na maioria dos países, a primeira opção terapêutica. No Brasil, a droga de escolha é o Glucantimea, que é de distribuição gratuita na rede de saúde pública. O Ministério da Saúde recomenda a dose de 20mg de Sb5+kg/diap, or via endovenosa ou intramuscular, durante 20 dias e, no máximo, por 40 dias. -Os critérios de cura são clínicos e devem ser observados os seguintes aspectos: curva térmica normal, redução da hepatoesplenomegalia e melhora nos parâmetros hematológicos. O retono a normalidade nas alterações protéicas séricas e a redução dos títulos de anticorpos são gradativos e lentos. O estado geral melhora progressivamente com o retomo do apetite. A cura é completa com a negativação do parasitismo. -Imunoquimioterapia:Em algumas situações tem sido usado em pacientes com leishmaniose visceral aguda ou refratários aos antimoniais pentavalentes, drogas imunorreguladoras, como rHINFg (interferon-gama humano recombinante) em associação os antimoniais. Este tipo de medicação é ainda de alto custo, portanto seu uso tem sido restrito. Profilaxia: -A profilaxia do calazar humano, desde a década de 1960, quando se estabeleceu o papel do cão como reservatório doméstico e de Lutzumyia longipalpis como vetor, tem como base a tríade: • diagnóstico e tratamento dos doentes; • eliminação dos cães com sorologia positiva; • combate às formas adultas do inseto vetor. LEISHMANIOSE NO CÃO: -Do ponto de vista epidemiológico, o calazar canino, no Brasil, é considerado mais importante que a doença humana, pois além de ser mais prevalente, o grande contingente de animais infectados com parasitismo cutâneo, servindo como fonte de infecção para o inseto vetor L. longipalpis, caracteriza o cão como o principal elo doméstico na cadeia de transmissão da doença. -Em áreas endêmicas, entre os cães inoculados pelos insetos há uma população assintomática e uma população que evoluiu para a cura. -Após a inoculação dos parasitos sabe-se que alguns animais podem controlar a infecção por muitos anos sem evolução da doença, ou ainda, evoluir para a cura espontânea. Outros apresentam evolução aguda e doença grave, ou curso progressivo que conduz inexoravelmente a morte. -Os mecanismos determinantes da susceptibilidade ou da resistência dos cães não são ainda bem esclarecidos. Entretanto, é conhecido que alguns animais desenvolvem resposta imune mediada por linfócitos T, que produzem Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 11 INFy, TNFa, entre outras citocinas. Estes animais são capazes de controlar a infecção e permanecerem assintomáticos de forma semelhante ao que ocorre com o homem. -O período de incubação da leishmaniose visceral canina varia de três a vários meses, possivelmente até dois anos. Em alguns casos pode ocorrer a formação de leishmanioma no local do inóculo, caracterizado por nódulo, área de alopecia, às vezes úlcera, que desaparece posteriormente. O exame histológico dessa lesão revela um infiltrado crônico produtivo local com tendência à formação de granulomas. -Os animais infectados são incluídos em duas categorias clínicas: assintomáticos e sintomáticos • Assintomáticos: Nos animais assintomáticos a presença da infecção é determinada pela resposta sorológica positiva na pesquisa de anticorpos, principalmente IgG, e por vezes pela detecção do parasito em levantamento epidemiológicos ou na clínica. -São cães clinicamente normais, saudáveis e ativos. -Apresentam, quase sempre, baixos níveis de anticorpos, entretanto o exame parasitológico de pele (extremidade da oreha) revela parasitismo em cerca de 60% destes animais. -Entre os cães assintomáticos, um porcentual apresenta cura espontânea, caracterizada pela negativação dos testes sorológicos e a presença da resposta imune celular. • Sintomático:Os animais sintomáticos podem apresentar desde sintomas discretos, principalmente relacionados com a pele, passando por quadros de crescente comprometimento do organismo, até o estado final de caquexia e morte. -O emagrecimento é progressivo e a linfoadenopatia generalizada é frequente. - O crescimento das unhas é anormal. -Ocorre comprometimento ocular, muitas vezes em associação a dermatite facial, como blefarites, ceratoconjuntivite e opacificação das cómeas. -Na evolução do processo, registram-se edema de patas, paresia das patas posteriores, ascite, epistaxes, hemorragia gastrointestinais, diarréia, onicogrifose e úlceras de decúbito. - Os dois últimos sinais são, em geral, decorrentes da apatia do animal, que aos poucos se toma quieto, não respondendo a estímulos externos Diagnóstico: -O diagnóstico é realizado considerando-se a origem epidemiológica do cão e o conjunto de sintomas apresentados. -O diagnóstico parasitológico é o método de certeza e se baseia na demonstração do parasito, que é abundante nos órgãos linfóides Tratamento: -Há um arsenal limitado de drogas para o tratamento da leishmaniose visceral, e para o tratamento canino existem ainda vários esquemas terapêuticos relatados na literatura. Para os antimoniais pentavalentes, há recomendação explícita da OMS e do Ministério da Saúde para a não-utilização isolada do fármaco no tratamento de animais, principalmente em decorrência das recaídas, que por serem imprevisíveis poderiam determinar o desenvolvimento de cepas do parasito resistentes a este medicamento. No Brasil, esta recomendação baseia-se também na ineficiência do tratamento como medida de controle da transmissão. -Outro aspecto a ser considerado nesse contexto são os relatos de permanência, em alguns animais, de amastigotas em macrófagos da pele íntegra capazes de, após o tratamento, ainda infectar o inseto vetor. Este fato é controverso na literatura e por não se ter definição clara de que animais e após qual esquema terapêutico ou qual fármaco isto acontece, é preciso cercar de cuidados especiais o animal submetido a tratamento. Profilaxia: -Considerando que a principal forma de transmissão do parasito entre os animais é através da picada do flebotomineo, as medidas de controle da infecção devem ser voltadas para o transmissor -Medidas de proteção do ambiente onde vivem os animais, através do uso de inseticidas residuais, devem ser eficazes. -As medidas de controle dos insetos centradas no próprio animal podem ser mais eficazes, como uso de coleiras impregnadas com inseticidas, banhos periódicos ou ainda uso de produtos pour on com bases inseticidas e/ou. -A vacinação contra a infecção por Leishmania será, sem dúvida, a forma mais eficaz de proteção para esses animais REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Leishmaniose visceral:recomendações clínicas para redução da letalidade. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. 78 p.: il. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos). Doenças relacionadas a Agressão ao Meio Ambiente (DRAMA) Raquel Rogaciano 12
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