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4a Prova AUTORIA e PLÁGIO MARCELO KROKOSCZ UM GUIA PARA ESTUDANTES, PROFESSORES, PESQUISADORES E EDITORES 4a Prova AUTORIA e PLÁGIO 4a Prova MARCELO KROKOSCZ AUTORIA e PLÁGIO Um Guia para Estudantes, Professores, Pesquisadores e Editores 4a Prova TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos de autor (Lei no 9.610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal. Depósito legal na Biblioteca Nacional conforme Lei no 10.994, de 14 de dezembro de 2004. Capa: David de Oliveira Lemes Foto: Andrian Valeanu CC0 Creative Commons Grátis para uso comercial Atribuição não requerida pixabay.com 4a Prova Para Ana Clara e Larissa, minhas filhas, as maiores e mais importantes criações de minha vida, e para Daniella, minha esposa, companheira e coautora indispensável nesta dádiva divina! 4a Prova 4a Prova Esta obra resulta do trabalho de pesquisa e leitura do autor, o qual declara que alguns trechos ou partes já foram utilizados literalmen- te pelo mesmo na elaboração do website www.plagio.net.br e em conteúdo preparado para orientação da comunidade educativa da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado – FECAP. O Autor 4a Prova Apresentação, xi Prefácio, xv Introdução, 1 1 O Que é Plágio?, 9 1.1 Origem, 10 1.2 Definição, 11 1.3 Envolvidos, 12 Reflexão, 20 2 Por Que Acontece Plágio?, 22 2.1 Razão acidental (desconhecimento técnico), 22 2.2 Facilidade de acesso à informação eletrônica (Internet) e de uso de recursos de edição de texto, 24 2.3 Falta de tempo, 24 2.4 Dificuldade de escrita acadêmica e hábito de reprodução textual, 27 2.5 Interesse em aumentar o número de publicações, 30 2.6 Falta de ética, 31 Reflexão, 38 3 Tipos de Plágio no Âmbito Educacional, 39 3.1 Plágio direto (word-for-word), 39 3.2 Plágio indireto (paráfrase, mosaico e apt phrase), 43 3.2.1 Uso de paráfrase sem atribuição de crédito, 43 Sumário x AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova 3.2.2 Elaboração de mosaico, 44 3.2.3 Uso inadequado de chavões (apt phrase), 46 3.3 Plágio de fontes (reprodução de citações), 47 3.4 Plágio consentido (conluio), 50 3.4.1 Conluio entre colaboradores, 50 3.4.2 Conluio comercial, 53 3.5 Autoplágio, 53 Reflexão, 61 4 Como o Plágio pode ser Evitado?, 63 4.1 Conscientização ética, 64 4.2 Atualização das formas de solicitação de trabalhos acadêmicos, 66 4.3 Capacitação metodológica, 72 4.3.1 Referências, 72 4.3.2 Citações, 79 4.3.2.1 Citação direta curta, 80 4.3.2.2 Citação direta longa, 81 4.3.2.3 Citação indireta, 82 4.4 Uso de programas de detecção eletrônica de plágio, 83 4.5 Institucionalização político-normativa, 84 4.5.1 Leis, 85 4.5.2 Regras institucionais, 86 4.5.3 Sanções, 87 Reflexão, 91 5 Nem Tudo é Plágio, 92 5.1 Conhecimento comum, 94 5.2 Paródia, 99 Reflexão, 107 6 Exercícios, 108 6.1 Teste seus conhecimentos sobre o plágio, 108 6.2 Correção comentada dos exercícios, 130 Referências, 141 Este livro é uma obra de apoio didático que visa auxiliar estu-dantes, professores, pesquisadores, autores e instituições no que se refere à apresentação de conteúdos científicos por meio de projetos, trabalhos de conclusão de curso, dissertações, teses, artigos, relatórios, livros etc. Portanto, trata-se de um material de apoio e orientação destinado principalmente ao meio acadêmico cuja finalidade principal é instrumentalizar os sujeitos de pesquisa no que se refere à exatidão na forma de apresentação de trabalhos científicos por meio da escrita. É por meio da redação científica que o pesquisador conven- cionalmente apresenta e compartilha com seus pares os resulta- dos obtidos durante seu processo de investigação. Esta tarefa de descrição de um percurso científico requer a adequação a certas convenções acadêmicas que permitem à comunidade científica compreender e aceitar no debate as ideias apresentadas. Um dos aspectos fundamentais que caracterizam um novo discurso que se apresenta à discussão científica, seja ele um traba- lho de conclusão de curso ou um artigo científico, é que ele tenha sido concebido e apresentado de forma honesta, pois esta é uma pressuposição tácita da comunidade acadêmica. Um texto honesto é aquele que apresenta argumentos e ideias no debate científico respeitando e dialogando com a diversidade Apresentação xii AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova de outras vozes envolvidas no assunto. Isto é viabilizado quando as fontes utilizadas na construção de um discurso são adequada- mente reconhecidas. No trabalho de redação científica isto acontece por meio do uso correto de citações e referências, ou seja, quando a descrição de um conteúdo em um texto é uma cópia ou síntese das ideias de outrem é preciso INDICAR (citar) no parágrafo redigido quem são o autor e a obra original e, além disso, devem ser IDENTIFICADAS (referenciadas), no final do trabalho, todas as informações rela- cionadas a tal citação, de forma que a obra possa ser recuperada por qualquer leitor. Fundamentalmente, a exatidão no reconhecimento das fontes utilizadas em um trabalho acadêmico assegura boa parte da au- tenticidade e credibilidade da argumentação científica proposta. Ao contrário, quando a este aspecto não é dispensado o devido cuidado e atenção acaba ocorrendo plágio. Por origem histórica e definição plágio é a apropriação e apre- sentação de obra alheia como se fosse própria. Embora em algumas situações isto possa acontecer de modo deliberado (quando há intenção do redator em cometer uma fraude intelectual), supõe-se que em muitos casos o plágio acontece de forma acidental, ou seja, ocorre na redação científica simplesmente por desconhecimento por parte do redator das diretrizes de escrita acadêmica, o que resulta na inaplicação de regras básicas e eficazes que evitam a ocorrência do plágio. A forma de utilização de citações e referências em trabalhos científicos varia de acordo com determinadas convenções, como, por exemplo, da The American Psychological Association (APA), do International Committee of Medical Journal Editors e da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), entre outras. Todas estas padronizações tratam da elaboração de citações e referências, reservando-se a cada uma delas pequenas alterações no que se refere à forma e apresentação de alguns elementos relaciona- dos ao reconhecimento de uma fonte, como o modo de apresentar o(s) autor(es) ou a posição da indicação do ano de publicação. APRESENTAÇÃO xiii 4a Prova Embora neste livro sejam privilegiadas as diretrizes da ABNT, as orientações relacionadas à prevenção da ocorrência do plágio são aplicáveis às diferentes normalizações porque o conteúdo aqui apresentado visa instrumentalizar o redator para identificar as diferentes situações em que se faz necessária a indicação e identificação da fonte consultada. Sabendo-se isto, a forma de se fazerem as citações e as referências pode ser adequada às diretrizes de qualquer convenção. Embora a principal característica desta obra seja auxiliar de forma prática o trabalho de redação científica, na introdução é desenvolvida uma reflexão sobre aspectos teóricos subjacentes à temática do plágio, cujo intuito fundamental é fomentar o aprofun- damento e o debate com a comunidade interessada. Considerando este escopo, o incômodo e provocação contidos nas indagações certamente exercerão um papel fundamental. Em tudo isto, que prevaleça o desenvolvimento do conhecimento que torne a vida humana cada vez melhor. O tema está na ordem do dia. A cobrança pela produção de resultados de pesquisa é cada vez mais intensa. Estudantes, professores, jovens pesquisadores ou pesquisadores seniores, todos são afetados. Aqui, como em outros países, publish or perish é a mensagem sub-reptícia que anima a vida acadêmica. A pressão parece legítima. A pesquisa científica é dispendiosa. Os financiamentos são alimentados pela expectativa de frutos, de transbordamentode resultados para a comunidade científica e para a sociedade em que se insere. O primeiro passo para isso é a divulgação dos resultados em veículos respeitáveis. A quantificação da produção acadêmica tem sido a regra geral. Muito mais que o conteúdo específico do que se produz, a quantidade de papers produzidos tem sido um indicador especialmente valorizado. A síndrome de tal produtivismo, no entanto, tem sido associada com frequência crescente a algumas distorções sérias na avaliação do mérito do que se publica. Artifícios diversos para maquiar os números e inflar os resultados têm sido frequentes. Fatiamento de trabalhos para publicações parceladas, reiteração de artigos, coautorias fictícias são alguns deles. Estatisticamente, no entanto, desvios de conduta relativos à efetiva autoria dos trabalhos publi- cados estão na moda. Em intervalos de tempo cada vez mais curtos, manchetes oportunas ou oportunistas na grande imprensa têm provocado Prefácio xvi AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova marolinhas, tempestades, furacões, terremotos ou tsunamis no meio acadêmico. Levantam suspeitas, tingem reputações, maculam carreiras. Injustamente, induzem generalizações indevidas. No epicentro do fenômeno situa-se a ideia de plágio. Não se trata de uma ideia simples. As redes informacionais amplificaram a ideia bakhtiniana de polifonia e fizeram ressoar mais fortemente ainda a dúvida foucaultiana sobre o significado da autoria. As fecundas e relevantes questões teóricas envolvidas não podem, no entanto, elidir os aspectos técnicos e a dimensão ética associada ao plágio. No presente trabalho, a ideia de plágio é examinada de modo a contemplar todos os aspectos anteriormente referidos. O centro de gravidade das questões tratadas é a prática efetiva da escrita acadêmica. Após uma caracterização inicial do que se considera plágio, o autor realiza um esforço de compreensão das razões de sua ocorrência em diferentes contextos. Sem qualquer resquício de moralismo, apresenta os fundamentos teóricos da ideia de autoria, ao mesmo tempo em que aborda as questões de natureza técnica envolvidas. Articula constantemente a complexidade da noção de autoria com os aspectos pragmáticos relacionados com a produção do texto científico. Com discernimento teórico e competência didá- tica, esboça não somente uma tipologia dos plágios, como também um repertório de ações práticas para evitá-los. O modo equilibrado como o autor trata das três vertentes da ocorrência do plágio – a incompreensão teórica, as falhas técnicas ou os desvios éticos – parece adequado tanto para a leitura de estudantes universitários que se iniciam na pesquisa nas diversas áreas da atividade acadêmica, quanto para facilitar a vida de pesquisadores em atividade, especialmente no que tange às ativi- dades de orientação. O trabalho realizado apresenta, portanto, as características de um verdadeiro manual antiplágio. São Paulo, agosto de 2011 Nílson José Machado Professor Titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo Parodiando uma famosa frase de Isaac Newton, se nesta obra vi melhor, foi porque contei com o olhar de dois amigos que tenho ao meu lado na atividade acadêmica: Ao professor Nílson José Machado, Livre-Docente na área de Epistemologia e Didática da Faculdade de Educação da Universi- dade de São Paulo, instituição na qual é professor titular, agradeço pela gentileza e elegância das orientações teóricas no processo de entendimento das relações entre autoria, criação e plágio. À bibliotecária Gisele Brito, membro efetivo da Comissão de Estudo de Documentação, da Associação Brasileira de Normas Técnicas e mestranda em Ciência da Informação pela Universidade de São Paulo, agradeço pelas contribuições quanto à precisão na indicação de autoria, identificação de documentos e normalização de trabalhos acadêmicos em geral. A generosa e competente contribuição destes dois colabora- dores ajudou no aperfeiçoamento conceitual e técnico deste livro. Agradecimentos “Somos sempre menos originais do que pensamos e menos plagiários do que cremos.” (SCHNEIDER, 1990, p. 348). Apesar de a prática do plágio remontar à antiguidade romana, no contexto brasileiro trata-se de um assunto que merece ser mais bem explorado, principalmente considerando-se o impacto negativo que pode ter na produção científica no meio acadêmico. A pesquisa científica relacionada especificamente ao plágio e, de forma geral, à integridade acadêmica no país é praticamente inexistente e, por consequência, a produção bibliográfica relacionada também é incipiente. Até mesmo a preocupação nos manuais de formação científica ou nos códices e diretrizes institucionais com o objetivo de evitar ou reduzir a prática do plágio é pouco verificada no cotidiano acadêmico. Isso ocorre de forma diversa nas comu- nidades científicas internacionais. Como exemplo, instituições de ensino de países como África do Sul, Inglaterra, Austrália e Estados Unidos, por meio de seus websites, divulgam amplamente orien- tações e disponibilizam treinamentos para que seus estudantes e pesquisadores conheçam as padronizações de escrita e aprimorem a prática de redação científica. Introdução 2 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova Além disso, revisando a literatura internacional, constata-se a existência da preocupação no campo da investigação científica com o fenômeno do plágio e da ética na produção do conhecimen- to. O trabalho de pesquisa relacionado a este assunto é veiculado por periódicos especializados como o International Journal for Educational Integrity e discutido em eventos científicos como o International Plagiarism Conference. No Brasil, a problemática vem obtendo visibilidade na mídia e recentemente a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), seguindo uma orientação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), recomendou a todas as instituições de ensino superior nacionais que “adotem políticas de conscientização e informação sobre a propriedade intelectual, adotando procedimentos específicos que visem coibir a prática do plágio quando da redação de teses, monografias, arti- gos e outros textos por parte de alunos e outros membros de suas comunidades” (CAPES, 2011). Destaca-se também a publicação do Código de Boas Práticas Científicas elaborado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). O documento apresenta orientações para pesquisadores visando à prevenção de práticas de más condutas relacionadas à pesquisa científica, como a fabricação e falsificação de resultados e plágio (FAPESP, 2011). Essas iniciativas são passos importantes que não podem ser ignorados pelo meio acadêmico brasileiro. Ainda não há índices de estimação da ocorrência do plágio em trabalhos científicos no Brasil, mas é possível supor que não sejam dos menores. Em países em que o fenômeno vem sendo enfrentado de forma sistemática há décadas, as estimativas coincidem em números em torno de 30% a 40% da incidência de plágio em trabalhos acadêmicos (PLAGIA- RISM.ORG, 2009; POSNER, 2007). Considerando-se a inclinação cultural do brasileiro de confundir corrupção com jeitinho, uma forma diferenciada de favor, somada à inexistência de reflexão, orientação ou normatização difundida INTRODUÇÃO 3 4a Prova sobre o plágio, é possível imaginar que os índices nacionais sejam bem maiores. Muitos casos de plágio podem ser categorizados como ocorrên- cia acidental devido à falha técnica ou negligência procedimental de quem redige um trabalho científico. Uma ideia de outro autor deixada para ser documentada depois ou a falta de clareza sobre o que é plágio e o que não é acabam sendo motivos despercebidos para que o redator cometa plágio acidental. Contudo, de uma forma dissimulada ou talvez por serem pouco discutidas, outras formas de plágio (com um sentido mais carregado de eufemismo: modos de apresentação de conteúdo com ausência de originalidadeou fragilidade de autoria) também poderiam ser debatidas como passíveis desse enquadramento. O que dizer de artigos publicados em periódicos com vários nomes de autores que na realidade nem mesmo foram coadju- vantes no trabalho de pesquisa, mas, em conluio com colegas, compartilham a autoria com o escopo de incrementar o próprio currículo acadêmico ou aumentar as possibilidades de serem citados pelos pares? E, também, o que pensar da originalidade da autoria quando orientadores pegam carona na publicação de trabalhos de alunos de graduação, mestrado e doutorado simplesmente porque exercem o papel de tutoria acadêmica? Em suma, a temática que se impõe neste debate é a reflexão sobre o papel da autoria em trabalhos científicos. Os limites para a arena da discussão que essas indagações provocam são a compreensão sobre o que de fato é um autor, ori- ginalidade, obra e escrita no campo da divulgação científica. Além disso, há de ser considerado imprescindível para o debate justo de tais questões a consideração de que o piso de sustentação para o enfrentamento dessas ideias seja a reflexão ética subjacente ao desenvolvimento do conhecimento. Certamente cada um destes tópicos merece um tratamento suficientemente pormenorizado para esclarecer sua compreensão. 4 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova Nesta breve introdução, são apresentados apenas alguns aspectos iniciais que minimamente permitem sustentar a reflexão proposta. Sobre a autoria pode-se partir da convicção de que na realidade o que existe são processos de instauração de discursividades nos quais o papel ou a função do autor é ser o agente originário do texto e alguém que ao mesmo tempo tende a ser desconsiderado (FOUCAULT, 2002). Nesta perspectiva depreende-se que o que se tem a dizer sobrepõe-se a quem o disse. Desta maneira, o conteúdo é mais importante que seu emissor, pois a finalidade da discursivi- dade é o fomento do debate. Nesta indiferença ao autor, Foucault (2002) entende que subjaz o princípio ético da escrita contemporânea na qual o autor não está vinculado a uma escrita e, portanto, desaparece. E isso é aceitável em relação ao autor que nada mais é do que uma função entendida como uma “característica do modo de existência, de circulação e de funcionamento de alguns discursos no interior de uma sociedade” (FOUCAULT, 2002, p. 46). Mas então, por que indicar o autor (citá-lo, como feito acima), se o mais importante é a discursividade? Inicialmente, o próprio Foucault (2002) apresenta um motivo que justifica a atribuição de autoria de uma ideia a alguém. Para ele, em certas circunstâncias, essa é uma forma de indicar que se trata de um discurso diferenciado e que deve ser recebido com certo status. Além disso, a nomeação do autor em algumas áreas, como, por exemplo, na biologia e na medicina, tem o papel de dar indícios de “fiabilidade” metodológica ao que é apresentado para discussão. A indicação do autor também é importante porque é uma forma de se respeitar o interlocutor numa discussão, reconhecendo-o como o agente emissor da ideia que está sendo apresentada. Ademais, é um ato de honestidade do redator, que reconhece os limites do alcance que tem o próprio conhecimento. Ao indicar a autoria de determinada ideia o redator deixa de parecer aos olhos do leitor alguém exclusivamente – ou mesmo brilhantemente – responsável pelo que está sendo apresentado. INTRODUÇÃO 5 4a Prova A atribuição da autoria no trabalho de redação é uma maneira, portanto, de se assegurar a originalidade do texto que está sendo escrito e se evitar dessa forma a ocorrência do plágio. Desse ponto de vista, originalidade não significa absolutamente dizer o que ninguém disse ainda. Isto corresponde àquilo que é inédito. Mas se é original na maneira como são articuladas e apresentadas as ideias e conteúdos que podem ser próprios ou alheios. Assim, um autor pode ser brilhante porque é capaz de apre- sentar ideias por meio de personagens por ele criados, como o que acontece nas obras literárias em geral, mas também pode ser surpreendente na capacidade de elaborar textos teóricos sobre outros autores. Neste caso, a originalidade está menos aliada sobre o que se fala e mais relacionada ao modo como se fala, a maneira como cada autor em particular desenvolve o debate sobre ideias e pessoas comuns ou inéditas. De acordo com esta concepção, o plagiário – este epíteto in- famante, como assevera Schneider (1990) –, além de não ser um autor, isto é, não ter um estilo, uma personalidade intelectual ou literária, ao reproduzir ou associar-se às ideias ou palavras alheias apropria-se da forma e do conteúdo de outro alguém passando-se por ele, ou pelo menos ficando à sombra dele. O plagiário pretende-se autor, mas falta-lhe a obra e esta existe sob a condição de um ato de criação, que é sempre pessoal. Esta afirmação encontra fundamento na reflexão desenvolvida por Moles (1971), para quem o processo de criação científica é resul- tado do modo particular como cada cientista percorre uma rede de caminhos metodológicos, faz associações e estabelece implica- ções, bem como das interações que cada indivíduo cultiva com a sociedade e seus modos de representação míticos e científicos, ou seja, narrativos e lógicos. Nesta rede de possibilidades e motivações, cada pesquisador traça um percurso com a experiência pessoal que tem e isso confere ao conhecimento criado uma singularidade estética que permite equiparar o cientista ao artista que cria de forma gratuita, apai- xonada e lúdica. 6 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova Portanto, a autoria entendida como processo de criação do conhecimento está mais associada a uma experiência íntima na qual a obra resultante é produto pessoal. Sendo assim, é indevido o compartilhamento desse crédito com outras pessoas que não fizeram parte da composição da obra. Naturalmente, nada é criado a partir do nada. Steiner (2003) argumenta que somente Deus é capaz de tal proeza. Em geral, no processo de criação humana todas as obras estão fadadas à influência ou inspiração de tal forma que toda obra sempre tem uma caracte- rística de déjà vu. Contudo, é na intimidade da persona que subjaz a potencialidade da criação, entendida como um ato de poiesis, na qual o sentimento mais profundo do autor é deixar como legado uma obra que tenha o status de criação imortal cujo intuito é que seja reconhecida como única no modo como aborda ou vislumbra o que em geral é visto de forma comum (STEINER, 2003). O reconhecimento e respeito a esta individualidade criativa é algo que depende, imperativamente, do compartilhamento do princípio de que interesses particulares não devem fazer do outro um meio se se admite por princípio e dever moral que a virtude de qualquer escolha depende da incondicionalidade de ser universa- lizada, da preservação da dignidade humana e da capacidade de decisão racional e livre pelo bem (KANT, 1980). Portanto, desse ponto de vista ético, o crédito de autoria não pode ser algo compartilhável entre quem não é criador de uma discursividade implícita em um trabalho científico, mesmo que tenha orientado ou inspirado as reflexões apresentadas, pois o que subsiste a um autor é minimamente o fato de ter seu nome atribuído a sua obra e desta relação, ainda que de forma incons- ciente, depreende-se um desejo íntimo e, portanto, pessoal de ser reconhecido como único e imortalizado por meio de seu estilo criativo. E isso é algo singular e indivisível porque é condição de afirmação de autenticidade e constituição de singularidade. Nesse sentido, esta obra, ainda que apresentada como recurso pragmático, é um instrumento que, em última instância, visa: à preservação de identidades obtidas pelo processo de autoria de INTRODUÇÃO 7 4a Prova quem já a alcançou; ao auxílio àqueles que buscam o desenvolvi- mento da capacidade de autoria; e, no caso especificamente desta introdução, à oportunidade de reflexão e esclarecimento de todosos que a partir de agora passam a admitir que “somos sempre me- nos originais do que pensamos e menos plagiários do que cremos” (SCHNEIDER, 1990, p. 348). Na obra Ladrões de palavras, Schneider (1990, p. 49) diz que “o plágio tem uma história. Mas essa história é complexa e contra- ditória: como tudo o que concerne à concepção, ela não tem mais desenlaces que começos”. Essa ideia faz sentido na perspectiva em que o assunto passa a ser abordado a partir deste capítulo. Embora o plágio seja entendido como o uso ou a reprodução desautorizada de obras alheias (livros, músicas, imagens etc.) e possa ser enquadrado nos códigos jurídicos, há certas especificidades do ponto de vista educacional que tornam o plágio nos ambientes de ensino e aprendizagem uma prática que requer análises mais complexas. Essa tarefa passa a ser cumprida a partir da compreensão da origem, legislação, definição e envolvidos com a prática do plágio apresentados a seguir. Dois elementos novos serão apresentados e merecerão aprofundamento: a) no ambiente educacional, o plágio envolve um terceiro sujeito além do criador e do reprodutor: o espectador; b) a peculiaridade do plágio no ambiente educacional escapa de possíveis enquadramentos judiciais, o que requer formas diferenciadas de abordagem. 1 O Que é Plágio? 10 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova 1.1 ORIGEM A ocorrência do plágio é verificada desde a antiguidade. No século II a. C. a Lex Fabia de Plarigriis do Direito Romano usava a expressão latina plagium para se referir a um crime que consistia no sequestro de um homem livre para fazê-lo de escravo a fim de comercialização ou uso doméstico. Parece que foi o poeta roma- no Marcus Valerius Marcialis (40? d. C. – 104? d. C) quem fez a associação entre essa prática criminosa e o uso ou apresentação de obras de outros como própria, referindo-se a essa pessoa como plagiário (MANSO, 1987). No Epigrama 53, o poeta declama Commendo tibi, Quinctiane, nostros, nostros dicere si tamen libellos possim, quos recitat tuus poeta. Si de servitio gravi queruntur, assertor venias, satisque praestes, et cum se dominum vocabit ille, dicas esse meos, manuque missos. Hoc si terque quaterque clamitaris, impones plagiario pudorem.1 (MARTIALIS, 1867). Essa reivindicação do poeta romano passou a ser representada nos códigos jurídicos pelos chamados direitos autorais (copyrights). Na legislação brasileira, tais direitos podem ser identificados na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5o, parágrafo XVII, o qual declara que “aos autores pertence o direito exclusivo de utiliza- ção, publicação ou reprodução de suas obras [...]” (BRASIL, 1988). A legislação específica sobre o assunto está na Lei 9.610/1998, que trata dos direitos autorais e considera contrafação a reprodução não 1 “Eu lhe recomendo meus versos, Quintiano, se é que eu posso denominá-los assim, desde que eles são recitados por certo poeta que se diz seu amigo. Se (meus versos) se queixam de sua penosa escravidão, seja o seu defensor e o seu apoio; e se esse outro (poeta) se diz ser seu dono, declare que (os versos) são meus e que eu os publiquei. Se isto é proclamado repetidas vezes, você imporá vergonha ao plagiário” (MANSO, 1987, p. 11-12). O QUE É PLÁGIO? 11 4a Prova autorizada de uma obra, sendo seus infratores sujeitos às sanções civis e penais cabíveis (BRASIL, 1998). Cabe destacar ainda a observação de Furtado (2002), de que “no Código Penal em vigor, no Título que trata dos Crimes Contra a Propriedade Intelectual, nós nos deparamos com a previsão de crime de violação de direito autoral – artigo 184 – que traz o seguinte teor: ‘Violar direito autoral: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa’ ”. 1.2 DEFINIÇÃO No Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (HOUAISS, 2009), plágio é definido como “ato ou efeito de plagiar; apresentação feita por alguém, como de sua própria autoria, de trabalho, obra intelectual etc. produzido por outrem”. Para o Novo Dicionário da Língua Portuguesa, plágio é “ato ou efeito de plagiar” e o verbete plagiar significa “assinar ou apresentar como seu (obra artística ou científica de outrem). Imitar (trabalho alheio)” (FERREIRA, 1986, p. 1343). Trata-se de qualquer conteúdo (artístico, intelectual, comercial etc.) que tenha sido produzido ou já apresentado originalmente por alguém e que é reapresentado por outra pessoa como se fosse próprio ou inédito. No campo artístico e comercial, o direito autoral é protegido por lei e qualquer tipo de reprodução pode ser questionada e submetida ao crivo judicial, sendo os responsáveis pela cópia penalizados de acordo com a legislação vigente. Entretanto, em relação aos conteúdos intelectuais (ideias, textos, trabalhos, atividades etc.) o plágio ocorre não por causa da reprodução, mas porque os créditos não foram atribuídos ao responsável original. Diferentemente dos produtos artísticos e comerciais, o conhe- cimento não tem um valor material e seu incremento depende do 12 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova que já foi apresentado, portanto, seu aumento se faz a partir do que já foi dito. Entretanto, o conhecimento antigo que serve de base ou ponto de partida para o novo conhecimento precisa ser reconheci- do por meio da indicação dos seus autores e identificação de sua localização (fonte). Se isso não é feito, ocorre o plágio acadêmico. 1.3 ENVOLVIDOS Convencionalmente o plágio é identificado quando envolve dois sujeitos: o responsável original pela obra (o autor) e a pessoa que o copia (o redator). Porém, no ambiente educacional a constituição de alguns tipos de plágio ocorre devido ao envolvimento de um terceiro sujeito que é aquele que recebe o conteúdo intelectual (o leitor). O caso de trabalhos escolares ou acadêmicos integralmente ou com partes copiadas literalmente de páginas da Internet ou de livros são configurados como plágio porque o redator (o plagiário) reapresentou conteúdos de outros autores como sendo próprios, mas não atribuiu os créditos. Se, por exemplo, ao apresentar um trabalho sobre o assunto o valor do conhecimento o redator transcreve em seu trabalho um parágrafo inteiro de outro autor, mas indica quem escreveu o texto e qual é a sua fonte, não há nada errado nisso, como neste exemplo: A produção e a circulação de mercadorias baseiam-se em certos princípios que são apenas parcialmente aplicáveis ao conhecimento, ou então que são absolutamente impertinentes em tal universo. A materialidade, a fungibilidade, a objetivação, a estocabilidade, a confiança e a equivalência constituem alguns terrenos em que a “mercadoria” conhecimento parece derrapar. De fato, se disponho de certo conhecimento e alguém se mostra interessado em comprá-lo, posso negociar o preço considerado justo e vendê-lo; no entanto, diferentemente de uma mercadoria em sentido industrial, o comprador fica com ele, mas não fico sem O QUE É PLÁGIO? 13 4a Prova ele. Como se pode lidar com um “bem” que posso vender, ou mes- mo dar ou trocar, sem ter que ficar sem ele? Esse caráter imaterial do conhecimento viola de modo inexorável certas expectativas mercantis (MACHADO, 2004, p. 28, grifo do autor). Se o plágio envolvesse apenas autores e redatores, citações e referências seriam suficientes para evitar sua ocorrência. Contudo, há situações nas quais o redator entrega um trabalho formalmente benfeito, com citações e referências corretas, mas que foi feito por um amigo, comprado de piratas do conhecimento (pessoas ou empresas que vendem trabalhos acadêmicos) ou até mesmo é um trabalho idêntico a outro feito pelo redator há um tempo ou entregue a outra finalidade, mas apresentado como sendo original. Nesses casos, nos quais há conluio entre amigos e prestadores de serviço ou o próprio redator entrega trabalhos idênticos em si- tuações diferentes, também ocorrem formas de plágio que podem ser chamadas de plágio consentido e autoplágio. Essas formas de ocorrência do plágio sãopossíveis porque há um sujeito envolvido (o leitor) que está sendo enganado nessa relação das pessoas com o conteúdo. Portanto, mesmo que um trabalho acadêmico seja pago para ser feito por outro, a partir do momento em que é apresentado para alguém como sendo próprio, constitui-se como plágio, pois o leitor está recebendo o produto intelectual do redator confiando que o trabalho foi originalmente escrito por ele. Trata-se de plágio consentido porque um amigo ou prestador de serviço foi quem na realidade fez o trabalho, mas consentiu que o mesmo fosse apresentado a um leitor como sendo próprio sem que ele tenha condições de saber sobre o envolvimento de outros no processo de produção. Da mesma maneira, quando um trabalho escolar ou acadêmico foi produzido originalmente pelo redator, mas é apresentado para leitores diferentes como sendo inédito ou é reapresentado duas ou mais vezes como se fosse a primeira vez, configura-se como auto- plágio. Neste caso, é o próprio autor-redator que está se copiando sem que o leitor o saiba. 14 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova Portanto, o plágio no âmbito escolar e acadêmico não pode simplesmente ser atribuído a um determinado sujeito e deve ser analisado considerando-se todos os envolvidos no processo de produção da escrita: o autor, o redator e o leitor. Apesar dessa afirmação fomentar possível polêmica por ampliar o alcance do plágio também ao leitor, no aprofundamento a seguir essa questão pode ser melhor compreendida. APROFUNDAMENTO Polêmicas e dificuldades relacionadas ao plágio acadêmico Do ponto de vista educacional o plágio pode ser considera- do um assunto que envolve dificuldades e polêmicas. Uma das dificuldades refere-se ao enquadramento judicial do trabalho escolar considerado plágio. Um dos aspectos po- lêmicos tem a ver com os envolvidos com o plágio, que em geral considera-se apenas o autor e o redator. Entretanto, um terceiro personagem tem uma participação importante nessa situação: o leitor. Como no ambiente acadêmico os trabalhos plagiados são identificados por terceiros, sem que os autores originais sequer imaginem que suas obras foram reproduzidas e são eles quem de fato poderiam requerer direitos junto a justiça, é bem difícil que o plágio acadêmico seja considerado um crime. Além disso, o jurista norte-americano Richard Posner (2007) observa que não se pode atribuir ao plagiário a pecha de “ladrão de palavras ou ideias”, pois no caso do roubo ou do furto a pessoa prejudicada fica sem o que é subtraído. Mas, no caso do plágio, o autor continua tendo suas ideias ou palavras, embora tenha sido copiado. Portanto, tratar o plágio acadêmico apenas na perspectiva judicial ou criminosa acaba sendo uma forma reducionista e até mesmo equivocada de enfrentamento do problema. Há O QUE É PLÁGIO? 15 4a Prova outros modos de enfrentamento desse problema que serão apresentados no decorrer deste livro e que têm se mostrado mais eficazes. Quanto à polêmica indicada, cabe refletir que a focalização do problema sobre o redator e o autor é uma maneira simplista de analisar a ocorrência do plágio no ambiente educacional. O leitor também é corresponsável pela ocorrência do plágio, seja pela sua participação passiva ou ativa no processo de produção da cópia. No ambiente acadêmico ou escolar os leitores de um texto plagiado invariavelmente são professores ou orientadores, ou seja, as pessoas que em nome da instituição de ensino recebem o trabalho do aluno. Esses leitores exercem um papel passivo em relação ao plágio de trabalhos educacionais quando são enganados com trabalhos que formalmente estão benfeitos: o conteúdo é consistente e coerente e as fontes estão indicadas e identificadas de acordo com a normaliza- ção vigente. Contudo, se o trabalho tiver sido comprado, foi cedido por um colega que tinha feito o mesmo trabalho há um tempo ou até mesmo se trata de um trabalho feito pelo próprio redator, mas que já foi entregue para outro professor ou disciplina com partes ou integralmente semelhante, o leitor provavelmente terá dificuldades para identificar a fraude, mas é na intenção e atitude do redator de enganar o leitor que reside a materialidade do plágio em suas modalidades correspondentes: plágio consentido e autoplágio. Mas o leitor também pode ter uma participação mais ativa no processo de produção do plágio no ambiente educacional, ainda que isso ocorra involuntariamente. Pode acontecer porque a forma como os trabalhos acadêmicos são solicitados é que muitas vezes determina ou oferece a oportunidade de o redator fazer o plágio. A professora Nancy Stanlick, da University of Central Florida (EUA), observa que quando os professores conhecem mini- mamente seus alunos, e sabem, por exemplo, qual é o seu 16 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova estilo de escrita porque já solicitaram vários trabalhos escri- tos por eles, quando esses alunos apresentam um trabalho com uma eloquência ou repertório conceitual diferente do conhecido fica flagrante o reconhecimento de problemas no processo de autoria (STANLICK, 2008). Portanto, no ambiente escolar e acadêmico, o papel do leitor dos trabalhos produzidos pelos estudantes é importante para que o plágio seja mitigado. Como visto, há possibilidades e alternativas inovadoras quanto à forma de solicitação de trabalhos produzidos por alunos que professores e orienta- dores envolvidos ativamente no processo de produção da escrita podem utilizar. Sem uma postura mais incisiva e par- ticipativa dos educadores no processo de escrita acadêmica será difícil evitar a ocorrência do plágio nos trabalhos dos alunos, pois cada vez mais aumenta o número de informa- ção disponível na Internet e há uma caixa de ferramentas eletrônicas diversificadas e eficientes que facilitam a edição de textos (colagens). Obviamente, apenas o comprometimento do leitor não é su- ficiente para que o plágio seja evitado, pois há outros fatores que influenciam sua ocorrência. É o que será aprofundado no próximo capítulo. O QUE É PLÁGIO? 17 4a Prova ATUALIDADES Matéria publicada na página eletrônica da Secretaria de Comunicação da Universidade de Brasília, em 14 de julho de 2006. Ideias Roubadas CAMILA RABELO Estagiária da UnB Agência Calouro de um curso da área de exatas, o estudante Marcos*, 19 anos, mal ingressou na Universidade de Brasília (UnB) e já utilizou recursos inadequados para conseguir nota em uma disciplina. Ele confessa que, diante da falta de tempo, entregou ao professor um texto copiado da Internet. O plágio em trabalhos acadêmicos não é novidade em instituições de ensino superior, públicas ou particulares. Na graduação – quando as exigências quanto a referências e citações são menores que em cursos de pós-graduação – não é difícil en- contrar professores que tenham recebido trabalhos como o de Marcos. Embora comum, copiar textos sem dar o devido crédito ao autor, além de antiético, é crime. O Código Penal, no artigo 184, prevê pena de detenção de três meses a um ano, ou pagamento de multa. No entanto, conforme o professor da Faculdade de Direito (FD) da UnB Othon Azevedo Lopes, raramente casos de cópia sem o devido crédito ao autor evoluem para um pro- cesso penal. “Esse tipo de pena (de três meses a um ano) dificilmente resulta em prisão. O mais efetivo nesses casos é o regimento da instituição”, explica. Segundo o decano de Ensino de Graduação (DEG) da UnB, Murilo Camargo, a ins- tituição preza pela conduta ética do aluno. “Pedimos cuidado com referências e crédito aos autores originais nos materiais escritos”, diz. Mas quando o assunto é a pós-graduação, as medidas são mais severas. Isso porque as dissertações e te- ses devem representar contribuições originais e inovadoras, como determina o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) da UnB, órgão regulador dos programas. 18 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova CREDIBILIDADE – O decano de Pesquisa e Pós-graduação da instituição, Márcio Pimentel,afirma que os casos de plágio em trabalhos finais são raríssimos. “Na graduação, é mais comum devido a uma porção maior de revisão bibliográfica”, analisa Pimentel. Em caso de denúncia, a instituição instala uma comissão formada por professores qualificados em diferentes áreas para avaliar a suspeita. Quando a cópia é descoberta antes da defesa, o aluno é impedido de apresen- tar; e se isso acontecer depois, o profissional perde o título. A inadmissão do plágio no ambiente acadêmico deve-se, além da questão legal, à credibilidade dos trabalhos, fundamental para a evolução da ciência no país. “A academia baseia-se em sinceridade. É importante mostrar ao leitor como a pes- quisa foi composta. Sem referências, o estudo perde todo o seu valor”, explica Lopes. O professor do Departamento de Ciência da Informação e Documentação (CID) da UnB, Murilo Bastos, afirma ser preciso mostrar aos estudantes que, sem honestidade intelectual, não existe evolução científica. OBSERVAÇÃO – Mas os plagiadores, assim como Marcos*, têm a Internet como poderosa ferramenta para burlar as regras. Bastos acredita que a facilidade com que as informa- ções são divulgadas na rede torna o problema ainda mais corriqueiro. “Com a Internet, ficou mais fácil preparar textos. Usa-se ‘ctrl c’ e ‘ctrl v’ (referência aos atalhos que copiam e colam trechos selecionados) e pronto”, lamenta Bastos. O coordenador do curso de Comunicação Social do Uniceub, Henrique Moreira Tavares, chegou a reprovar quatro alunos por plágio. Todos os casos ocorreram recentemente – entre 2000 e 2005 –, embora Tavares lecione há aproximada- mente 20 anos. “O plágio está virando uma praga no meio acadêmico. O professor até se sente inseguro ao corrigir os textos”, indigna-se. Ainda que nem sempre seja fácil identificar a cópia no tra- balho entregue pelos alunos, os professores também usam a Internet como ferramenta para conter a onda de plágios e O QUE É PLÁGIO? 19 4a Prova verificar a autoria dos textos. “Conheço os alunos e como eles escrevem. Caso a redação esteja diferente, confiro”, revela Tavares. No entanto, a medida pode ser muito trabalhosa, como ocorreu com o professor da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária (FAV) da UnB, Juan José Verdesio, que passava aos alunos trabalhos de 20 a 30 páginas como avaliação. Ele percebeu que havia textos copiados e resolveu adotar somente provas para compor a nota das disciplinas. “Já aconteceu de um aluno da graduação plagiar meu pró- prio texto”, critica. ESTRATÉGIAS – Mas mesmo com o esforço dos professores para monitorar essa prática, Fábio*, 20 anos, estudante do 3o semestre da área de Saúde da UnB, mostra que não falta habilidade para driblar as medidas adotadas pelos docentes. “Tive um professor que pedia trabalhos escritos à mão para evitar plágio. Mas não adiantou muito. Imprimi os textos da Internet e copiei”, conta. Descobrir o plágio fica ainda mais difícil quando, para burlar as regras, são utilizados trabalhos de veteranos do curso. “Você pega um texto de um amigo e muda algumas palavras”, diz Marcos*, que usou a tática já no primeiro semestre de curso. Prevendo momentos de aperto nas disciplinas, ele chegou a cogitar a compra dos trabalhos de todas as matérias de um estudante formando. “Ele tinha tudo gravado em um CD e estava vendendo por R$ 380,00. É muito dinheiro”, reclama. Tanto Fabio* quanto Marcos* nunca foram descobertos, sorte que a estudante Carolina*, do 6o semestre da área de Humanas do Uniceub, não teve. Ela foi reprovada em uma matéria no primeiro semestre de 2005 por entregar texto copiado da Internet. Segundo a estudante, a intenção não era plágio, mas sim utilizar a rede para obter informações adicionais para o trabalho. “Imprimi o arquivo errado e entreguei o texto na íntegra. É um caso isolado. Foi muito humilhante e depois disso resolvi não consultar mais a In- ternet”, desabafa Carolina. 20 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova ALÍVIO – Para o professor do Instituto de Psicologia da UnB, Odair Furtado, os motivos que levam estudantes a utilizarem recursos inadequados em trabalhos acadêmicos são muitos e vão desde uma exigência, considerada desnecessária pelo aluno, passando por acúmulo de tarefas, insatisfação com o curso e até falta de caráter. Todos eles relacionados entre si. Fábio* diz tê-los usado apenas em disciplinas “secundárias”. “O conhecimento passado nessas matérias não é muito pro- veitoso para a carreira”, justifica. Já no caso de Marcos*, a razão é a falta de estímulo com a avaliação do professor que o leva ao plágio: “Peguei um relatório de um amigo e copiei. O monitor dá zero para todo mundo mesmo.” Para o mestrando em Psicologia na UnB Pablo Bergami, 27 anos, que chegou a ministrar disciplinas na instituição, os estudantes estão muito despreparados em relação à escrita. “Eles têm dificuldade de sintetizar o que leram de um texto e expressarem com suas próprias palavras”, analisa. Uma das estratégias utilizadas por ele para evitar plágio nos trabalhos foi ensinar os alunos a fazerem referência e citações. Já Marcelo*, formando na área de Humanas da UnB, esca- pou de incorrer nessa prática pela atenção de sua professora orientadora. Ela identificou parágrafos idênticos a outras obras em sua monografia e sugeriu uma nova redação ou que ele utilizasse citações. “A revisão foi muito importante nesse ponto, senão acabaria deixando um parágrafo muito parecido com outro texto sem maldade”, alivia-se. RABELO, Camila. Ideias roubadas. 2006. Disponível em: <http://www.secom.unb.br/unbagencia/ag0706-27.htm>. Acesso em: 1 mar. 2011. REFLEXÃO 1. Dada a dificuldade de responsabilizar juridicamente o plagiário no âmbito educacional, cabe a indagação de Michel Schnei- O QUE É PLÁGIO? 21 4a Prova der (1990, p. 136): de que tem medo o plagiário? O próprio autor responde: “da vergonha de ser desmascarado. Você se dizia autor, criador e nada mais é além de um plagiário, de um copista. Você é nulo. Não é nada. Não é ninguém. Queria se dar um nome próprio, e aí está, reduzido ao estado comum de um epíteto infamante [uma característica depreciativa]”. Você concorda que a humilhação e a vergonha da descoberta intimidam o plagiário? Comente. 2. Em sua opinião, que estratégias diferentes das apresentadas, professores e orientadores poderiam utilizar para evitar a ocorrência do plágio nos trabalhos dos estudantes? 3. Algum dos motivos apresentados pelos alunos para cometerem plágio justificam essa prática? Comente. Há uma lista de fatores que podem ser analisados visando à identificação das razões que levam um acadêmico a cometer plágio intencionalmente. Entre esses fatores, o advento da Internet e a facilidade de acesso e uso da informação vêm sendo considerados pelos estudiosos do assunto a principal razão para o aumento do plágio em trabalhos acadêmicos. Mas, também há situações em que o plágio acontece acidentalmente... Em todos os casos, a res- ponsabilidade sempre recai primeiro sobre o redator. 2.1 RAZÃO ACIDENTAL (DESCONHECIMENTO TÉCNICO) O processo de desenvolvimento do conhecimento intelec- tual supõe a edificação contínua de ideias precedentes, que são confirmadas, aprofundadas, ampliadas ou negadas, modificadas, reduzidas etc. Portanto, em geral, o conhecimento produzido parte do que já existe, do que já foi dito, do que já aconteceu, do que já foi demonstrado. Neste sentido, o plágio acidental pode ocorrer no processo de escrita acadêmica por descaso ou desconhecimento técnico do redator, ou seja, incompetência em relação à indicação de autores (citações) e negligência quanto à importância da identificação 2 Por Que Acontece Plágio? POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 23 4a Prova das fontes de informação (referências) que foram utilizadas como ponto de partida ou fundamentação da reflexão que se apresenta no texto decorrente. Portanto, a precisão do processo de normalização do texto acadêmico é a prevenção técnica da ocorrência do plágio.Acon- tece que as convenções normalizadoras em geral possuem muitos detalhes considerados pelos redatores exagerados, enfadonhos e desnecessários. De fato, mas quais são os enquadramentos norma- tivos que não causam mal-estar a nossa civilização? O que seria do trânsito sem sinais, regras, obrigações etc.? E ao contrário, se todos seguissem adequadamente as normas de trânsito, quantos acidentes e mortes seriam evitados? Da mesma maneira, o uso correto das normas de escrita aca- dêmica é essencial para o perfeito desenvolvimento do conheci- mento produzido. Além do mais, não são técnicas difíceis de serem aplicadas e que, com o hábito de uso, tornam-se uma prática tão espontânea quanto o uso do cinto de segurança em um automóvel. No Capítulo 4 serão apresentadas algumas regras básicas de elaboração do texto acadêmico que conhecidas e usadas adequada- mente evitam a ocorrência do plágio acidental e também de todos os outros tipos que serão apresentados no Capítulo 3. Em tempo, uma observação importante: embora na circuns- tância da ocorrência do plágio acidental possa haver o atenuante da involuntariedade, o mesmo continua caracterizado como tal, o que é extensivo aos casos nos quais é alegado desconhecimento do plágio praticado por colega que assina o mesmo trabalho ou publicação. “Foi sem querer” ou “eu não sabia” podem servir como explicação, mas não negam ou justificam o fato em si: a ocorrência do plágio. Toda atenção e corresponsabilidade é pouca... 24 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova 2.2 FACILIDADE DE ACESSO À INFORMAÇÃO ELETRÔNICA (INTERNET) E DE USO DE RECURSOS DE EDIÇÃO DE TEXTO Para os pesquisadores do assunto, o avanço tecnológico das últimas duas décadas facilitou o acesso, compartilhamento e uso da informação e a integração entre as pessoas (BEASLEY, 2004, apud McCORD, 2008; PERISSÉ, 2006; VAZ, 2006). Pesquisar tornou-se muito fácil e instantâneo. Copiar e colar por meio de editores de texto e computadores, servindo-se da Internet como fonte de informação, requer apenas alguns cliques e “os estudantes podem [até] plagiar sem perceber, embora saibam que o plágio é eticamente errado” (KRAUS, 2002, apud McCORD, 2008, p. 41). Além disso, o crescimento da aprendizagem virtual também tem sido observado como terreno propício para o aumento do plágio. Essa ponderação é feita por McCord (2008, p. 42), embora aponte estudos sugerindo que a facilidade de reproduzir textos da Internet contribui de forma semelhante para o aumento generali- zado do plágio tanto no ambiente virtual quanto nas salas de aula tradicionais (STEVENS; YOUNG; CALABRESE, 2007). Há poucos anos a produção textual exigia deslocamentos a livrarias e bibliotecas em busca das publicações necessárias à investigação, as pesquisas requeriam a prática de preenchimento manual de fichas de anotação, quando muito os privilegiados dispunham de máquinas de escrever mecanicamente. Em suma, o plágio existe desde a antiguidade, mas copiar foi se tornando muito mais fácil no decorrer dos tempos e está muito facilitado pela automatização dos processos de pesquisa e escrita na atualidade. 2.3 FALTA DE TEMPO Especialmente no Ensino Superior, grande parte dos estudantes conciliam os estudos com a jornada de trabalho. É uma carga de POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 25 4a Prova responsabilidades bastante exigente, pois, além do comprometimen- to profissional, a pessoa deve cumprir as obrigações acadêmicas, tais como: frequência nas aulas, realização de trabalhos, submissão às avaliações disciplinares, manutenção das leituras obrigatórias, execução de atividades complementares etc. Invariavelmente, a maioria dos alunos no ensino superior ainda precisa conciliar com isso seus compromissos familiares, conjugais, sociais e pessoais. Diante de uma carga tão grande de tarefas a serem realizadas, é que ocorre a tentativa ou o equívoco de querer simplificar algumas dessas atividades. É então que co- meça a mediocridade, isto é, as coisas passam a serem feitas na média ou pela metade... O volume de trabalho profissional cansa demais e o estudante falta nas aulas; os estudos se acumulam, e algumas atividades es- colares são realizadas durante o expediente profissional; nos finais de semana, compromissos familiares e sociais são substituídos pela preparação para as provas ou realização de trabalho ou vice-versa, e assim por diante. Nessas circunstâncias, o processo de realização e entrega de um trabalho acadêmico acaba sendo malfeito porque o tempo disponí- vel para se fazer tantas coisas é escasso. O texto apresentado é um trabalho feito por outros ou contém trechos e até páginas inteiras copiadas literalmente da Internet; o conteúdo apresentado é ruim porque as fontes utilizadas foram as primeiras que apareceram nos resultados do buscador eletrônico e o aluno não sabe distinguir uma fonte de informação de uma fonte acadêmica. Entretanto, esses trabalhos são facilmente reconhecidos por professores que conhecem o assunto que está sendo apresentado, conhecem os alunos que têm, utilizam técnicas de detecção do plágio ou leem e fazem arguição sobre os trabalhos entregues. A experiência mostra que quando esses alunos são apanhados porque cometeram plágio procuram se justificar alegando que ti- nham muita coisa para fazer e devido à falta de tempo acabaram reproduzindo trabalhos prontos. 26 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova Em relação a isso, cabe uma observação quanto às exigências acadêmicas. De fato, a falta de interdisciplinaridade faz com que cada professor desenvolva seu programa de ensino e cobre a pro- dução acadêmica de seus alunos como se eles tivessem apenas uma matéria a cada semestre ou ano letivo. A sobrecarga de trabalhos e atividades depositada sobre os estudantes é muitas vezes maior que a capacidade que eles possuem para as realizarem. Nesse caso, o resultado produzido acaba sendo um pouco de muito: um pouco para cada matéria. Portanto, solicitar trabalhos escolares ou acadêmicos inter- disciplinares diminui o volume de tarefas do estudante e então a qualidade da produtividade pode aumentar. Outra alternativa é seguir a estratégia indicada no Capítulo 1, solicitando trabalhos pequenos ou modificando a forma de realização e apresentação. Trabalhos em grupos de dois ou três alunos também pode facilitar e otimizar o processo de produção escolar, ao mesmo tempo em que diminui o trabalho de avaliação e correção do professor. Mas também cabe observar aqui que a falta de tempo alegada pelo aluno que comete plágio no máximo chega a ser uma boa explicação, mas nunca uma justificativa. Em termos gerais, pode-se argumentar que o volume de com- promissos assumidos por pessoa implica em atribuições que fazem parte da rotina dessas atividades e são conhecidas. Entretanto, a impressão que se tem é que, em especial no Brasil, o traço cultural do “jeitinho brasileiro” se manifesta em todas as áreas, inclusive no ambiente educacional. Então, quando o estudante não cumpre seu papel institucional e falta às aulas, não realiza as atividades requeridas, prepara-se mal para as avaliações e obtém um resultado negativo no final da etapa letiva, geralmente apresenta um rol de lamentações sobre suas dificuldades pessoais, problemas profissionais, histórico so- cial desprivilegiado etc. Um discurso de “coitadinho” que apela à instituição educacional a complacência como se o processo de aprendizagem fosse ou deveria ser um favor educacional feito por professores, escolas e universidades ao estudante. POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 27 4a Prova Enfim, com relação à alegada “falta de tempo” como fator reconhecidamente relacionado ao plágio, as estratégias para a sua eliminação dependem de mudanças em diferentes aspectos: seja na forma de organização das demandas escolares, na maneira dos professores requererem a produção dos alunos, no comprometi- mento dos alunos com a excelência dos seus estudos e, até mesmo, com a mudança da mentalidade social brasileira.2.4 DIFICULDADE DE ESCRITA ACADÊMICA E HÁBITO DE REPRODUÇÃO TEXTUAL No livro Algumas razões para ser cientista, Vitaly L. Ginzburg, do Instituto de Física P. N. Lebedev, que fica em Moscou, apresenta o seguinte relato: Minha linguagem é de certa forma pobre e minhas frases frequente- mente não são muito literárias. Nessa linha de pensamento, eu me lembro da minha conversa com G. S. Gorelik. Ele tinha a habilidade de escrever bem, e para minha pergunta – O que o ajuda a escre- ver tão bem? – ele respondeu com uma pergunta – Quantas vezes por semana você fazia redações na escola? – Eu respondi – Algo como uma vez por semana ou uma vez a cada duas semanas, não me lembro. – G. S. comentou que ele estudou na Suíça e escrevia redações todos os dias (GINZBURG, 2005, p. 28). Qualquer semelhança do histórico educacional do cientista russo com a realidade nacional pode até ser uma mera coincidência, mas a mesma situação enfrentada por ele, em muitos casos, é fator determinante da prática do plágio pelos estudantes brasileiros. Pesquisa realizada por Marta Oliveira (2007) demonstra como o plágio acadêmico resulta da dificuldade que o estudante univer- sitário tem na produção de textos. A autora desenvolve seu estudo a partir do embasamento em autores que discutem e questionam uma formação educacional básica voltada para a reprodução textual (SALOMON, 2001), cujo escopo de avaliação limita-se à verificação de elementos formais, tais como apresentação de margens, tipo 28 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova de caligrafia e adequação da apresentação (GARCEZ, 1998). Esse processo, inevitavelmente, acaba capacitando estudantes com habilidades limitadas a aspectos formais cuja capacidade de pro- dução textual é apenas o preenchimento de modelos padronizados (PÉCORA, 2002). Dessa forma, o estudante, premido pela necessidade de produ- ção textual acadêmica, acaba repetindo uma prática de pesquisa aprendida na educação básica, que é a simples reprodução/apre- sentação de textos prontos que estejam relacionados ao assunto estudado. Se por um lado isso acontece por um hábito escolar sedimen- tado, por outro lado acaba acontecendo porque o estudante não é capaz de produzir seu próprio texto, pois não foi desenvolvida nele a característica da autoria. Analisando a dificuldade de escrita acadêmica como uma das razões para a prática do plágio nessa perspectiva, o enfrentamento desse fator relacionado ao plágio pode ser feito pelo menos em dois momentos (na escola e na universidade) e de duas maneiras (capacitação técnica e formação pessoal). Durante o processo de aprendizagem educacional na escola básica, o estudante pode encontrar a primeira oportunidade para o desenvolvimento da capacidade técnica de escrita. Ainda que hoje a rapidez de acesso a informações na Internet e a facilidade de utilização das mesmas intensifiquem o processo de pesquisa como um simples hábito de cópia, isso deve ser abolido das práticas de ensino e aprendizagem escolares. A mudança não precisa ser radical. Como sugestão, durante o processo de estudo de um determinado assunto, os alunos podem fazer o levantamento e busca de materiais e informações sobre o mesmo. Porém, o que pode ser feito a partir disso é pedir ao aluno que faça um relatório das diferentes fontes selecionadas, observando, obviamente, alguns procedimentos de técnica textual como o uso de paráfrases, sumarização e intertextualidade, atenção a procedimentos de normalização como elaboração de citações e POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 29 4a Prova referências; e, o mais importante, a utilização de modos de pen- samento e raciocínio para o relacionamento e associação de ideias para a construção do próprio texto. Tudo isso requer domínio conceitual e procedimental do educa- dor, o que deve acontecer no seu processo de formação profissional, mas que também pode ser obtido em cursos de capacitação e por meio de materiais de estudo como este. Em 4.3 são apresentadas algumas das técnicas mencionadas. É importante reconhecer que essa mudança de prática pedagó- gica quanto ao processo de elaboração textual implica diretamente outro aspecto que pode ser iniciado na escola básica: o processo de construção do sujeito autor. Tornar-se autor é um modo de afirmação de identidade e isso requer uma escolha e tomada de decisão pessoal, pois se trata de um processo de individualização e de autoafirmação específico, mas não exclusivo. Tornar-se único e atuante na comunidade humana é algo que pode ser feito por diferentes vias e a autoria é apenas uma delas. Contudo, considerando a instituição escolar como lugar de experiências de ensino e aprendizagem daquilo que faz parte da vida, instrumentalizar o aluno para ser alguém por meio da pro- dução textual, que é uma forma de autoria, também é um escopo educacional, até porque o contexto em que vivemos exige a formação de um aluno que, distando do lugar comum, seja sujeito-autor atuante, crítico, autô- nomo e interventor, capaz de, a partir da sua autoria, interpretar e analisar a realidade, retirando-se da condição de sujeito aco- modado e reprodutor de modelos textuais para um sujeito capaz e consciente do seu dizer/escrever (SILVA, 2008). Mas ambos os processos apresentados, seja quanto à capaci- tação técnica, seja quanto à formação de autores, embora sejam melhores se iniciados na escola durante o processo de educação básica, cabe à universidade aprofundar e potencializar essas duas características. 30 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova No âmbito universitário já existe de forma institucionalizada em praticamente todos os cursos, nas diferentes áreas de conhe- cimento, um espaço privilegiado para o desenvolvimento dessas características, que é a disciplina de Metodologia Científica. Em geral, os manuais com conteúdos de ensino dessa matéria limitam-se aos aspectos de técnicas de pesquisa e elementos de normalização. Cabe acrescentar no cotidiano de estudos atividades de produção textual com a devida orientação e acompanhamento técnico, bem como o incentivo ao desenvolvimento da capacidade de autoria. 2.5 INTERESSE EM AUMENTAR O NÚMERO DE PUBLICAÇÕES Na obra intitulada Bouvard e Pecuchét, Gustave Flaubert apresenta dois personagens que se tornam amigos casualmente e por compartilharem algumas semelhanças, entre elas a função profissional de copistas e o desejo de parar de trabalhar para se dedicarem exclusivamente ao conhecimento. Conseguem realizar esse projeto após um deles receber uma herança inesperada. Entretanto, a dedicação dos personagens aos estudos nas mais diferentes áreas de estudo, que vão da agronomia à astronomia, da medicina à filosofia, acaba resultando em um amontoado de fracassos e desilusões, o que leva ambos a retornarem à atividade de copistas: “Nada de refletir! Vamos copiar. A página deve ser preenchida [...]” (FLAUBERT, 2007, p. 353). Considerando-se o interesse com o aumento numérico da produção científica nacional, a expressão de um dos personagens da obra citada poderia ser parodiada da seguinte forma: nada de pesquisa. Vamos publicar! A produção deve aumentar. A relação entre a ocorrência de plágio e a produção científi- ca brasileira ainda precisa ser mais bem estudada. Contudo, em matéria publicada na Revista da Associação dos Docentes da USP, POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 31 4a Prova alguns professores compartilham a ideia de que há vínculos entre a ocorrência de plágio de um lado e as exigências do aumento de publicação de outro lado (REVISTA ADUSP, 2011). Para a professora Valéria de Marco (FFLCH – USP), “a pressão sobre professores e alunos, por uma produção muito rápida de teses e artigos, pode sim levar ao plágio”. Na opinião do professor Luiz Menna-Barreto (EACH-USP), “a produtividade se torna um convite para a não produção de trabalhos mais amplos”. Dessa maneira, o conhecimento se torna mais um produto de consumo apresentado na vitrine da “ciência shopping center” (BIONDI, 2011, p. 59-60).Portanto, trata-se de uma preocupação que também merece ser considerada. O interesse pelo produtivismo científico, seja pela pressão institucional que atrela concessão de vantagens ao tamanho do currículo do pesquisador, seja pela ambição pessoal do autor que deseja publicar a qualquer custo, representa um sério risco à originalidade e integridade da qualidade científica em todos os níveis acadêmicos. 2.6 FALTA DE ÉTICA Quando o plágio acontece intencionalmente, pode ser de- corrente de dificuldades e limitações do redator no processo de desenvolvimento de seu trabalho acadêmico. Entretanto, o plágio também ocorre porque se trata de algo que não tem muita impor- tância ou valor para o redator. Embora a universidade seja um ambiente caracterizado prin- cipalmente pela produção de conhecimento (pesquisa), também é reservada às instituições de ensino superior a tarefa de ensinar. Essa característica acaba sobressaindo em muitas universidades, principalmente porque muitos estudantes procuram o ensino su- perior com o objetivo de se qualificarem profissionalmente. Como o objetivo neste caso não é desenvolver o conhecimento, mas simplesmente obter uma capacitação técnica, o comprometi- 32 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova mento com a produção de conhecimentos não é a prioridade desse estudante. Nesse caso, a realização de pesquisas e apresentação de resultados é apenas mais uma exigência a ser cumprida e que acaba sendo feito de qualquer jeito ou pelos meios mais fáceis. Essa indiferença com o trabalho de pesquisa e avanço do co- nhecimento tende a ser pior no caso dos estudantes que sequer estão preocupados apenas com o ensino. Para aqueles para quem a importância do ensino superior limita-se à obtenção de um título de graduação para atestar nível superior frente às exigências do mercado de trabalho, a preocupação com a integridade acadêmica no que diz respeito a produção de trabalhos universitários ilibados é uma quimera. Isso pode ser entendido como uma “degradação quanto aos processos e aos procedimentos” característicos de um amoralismo acadêmico (SCHNEIDER, 1990, p. 61). Tal fenômeno pode ser verificado na reprodução literal de textos escritos por outros que são apresentados sem o menor escrúpulo de consciência. Neste caso, o plágio na cabeça do acadêmico pode chegar a ser entendido no máximo como um “jeitinho” arrumado para se alcançar determinado objetivo. Em relação a isso, cabe observar que se trata de algo relativo ao próprio padrão cultural ao qual se pertence. No caso do Brasil, dar um jeito se trata de uma estraté- gia de “navegação social” que é inclusive geralmente aceita pela sociedade como um padrão moral que permite alcançar direitos sociais, enfrentar a ineficiência das instituições e promover mobi- lidade hierárquica (ALMEIDA, 2007). Portanto, para aqueles para quem o conhecimento não é um valor em si, mas um meio para obtenção de outros fins, a decisão de cometer plágio é assumida deliberadamente e sem constrangi- mentos, embora se saiba que é algo que não deve ser feito e como pode ser evitado. Sendo assim, este pode ser considerado o pior motivo para a ocorrência do plágio, pois se relaciona diretamente à ausência ou corrosão de valores acadêmicos como o compromisso com a inovação do conhecimento. POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 33 4a Prova APROFUNDAMENTO Identidade e identificação [...] É da representação do sujeito como autor que mais se cobra sua ilusão de ser origem e fonte de seu discurso. É nessa função que sua relação com a linguagem está mais sujeita ao controle social. Assim, do autor se exige: coerência; respeito aos padrões estabelecidos, tanto quanto à forma do discurso como às formas gramaticais; explicitação; clareza; conhecimento das regras textuais; originalidade; relevância e, entre várias coisas, “unidade”, “não contradição”, “progressão” e duração do seu discurso. Essas exigências têm uma direção: procuram tornar o sujeito visível (enquanto autor, com suas intenções, objetivos, direção argumentativa). Um sujeito visível é calculável, controlável, em uma palavra, identificável. É, entre outras coisas, nesse “jogo” que o aluno entra quando começa a escrever. Para que o sujeito se coloque como autor, ele tem de esta- belecer uma relação com a exterioridade, ao mesmo tempo em que ele se remete à sua própria interioridade: ele cons- trói assim sua identidade como autor. Isto é, ele aprende a assumir o papel de autor e aquilo que ele implica. O autor é, pois, o sujeito que, tendo o domínio de certos mecanismos discursivos, representa, pela linguagem, esse papel, na ordem social em que está inserido. Não basta “falar” para ser autor; falando, ele é apenas falan- te. Não basta “dizer” para ser autor; dizendo, ele é apenas locutor. Também não basta enunciar algo para ser autor. Papel social e responsabilidade O que é preciso, então, para ser autor? 34 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova O que tem faltado, desse ponto de vista, quando se pensam as condições de produção da escrita, na escola, é compreender o processo em que se dá a assunção, por parte do sujeito, de seu papel de autor. Essa assunção implica, segundo o que estamos procurando mostrar, uma inserção (construção) do sujeito na cultura, uma posição dele no contexto histórico- -social. Aprender a se colocar – aqui: representar – como autor é assumir, diante da instituição-escola e fora dela (nas outras instâncias institucionais) esse papel social, na sua relação com a linguagem: constituir-se e mostrar-se autor. ORLANDI, Eni Puccinelli. Discurso & leitura. 5. ed. São Paulo: Cortez; Campinas: Editora da Universidade Estadual de Campi- nas, 2000. p. 78-79. Grifo do autor. (Passando a Limpo). POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 35 4a Prova ATUALIDADES Matéria publicada pela Folha de S. Paulo, em 4 de novembro de 2009, que apresentou um caso de plágio na universidade. Reitora da USP é acusada de plágio em estudo sobre vírus EDUARDO GERAQUE da Folha de S. Paulo A USP abriu uma sindicância interna para apurar uma acusa- ção de plágio contra a reitora Suely Vilela e mais dez pessoas. Na prática, a universidade vai investigar sua própria reitora. O grupo formado por bioquímicos e farmacêuticos publicou um trabalho em 2008 com três figuras idênticas a um outro estudo, que saiu em 2003. A pesquisa mais antiga está assi- nada por um grupo da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), autor da denúncia. O estudo assinado pela microbiologista Angela Hampshire Soares e outros sete colaboradores é sobre a eventual apli- cação de uma substância extraída da planta sacaca (típica da Amazônia) para o controle da leishmaniose – as imagens que geraram acusação de plágio retratam ação da substância. Um dos objetivos da pesquisa da USP é investigar se uma substância isolada da jararaca é útil contra o vírus da dengue. A reitora Suely, que é bioquímica, é uma das coautoras do trabalho. O principal autor da pesquisa é Andreimar Soa- res, professor da USP de Ribeirão Preto. O grupo nega que houve má-fé. A cópia não se resume às três imagens idênticas de micros- copia eletrônica que aparecem nas duas pesquisas. Dois trechos do texto do artigo de 2008, publicado pela revista “Biochemical Pharmacology”, são semelhantes a parágrafos que constam do artigo original, editado na revista americana “Antimicrobial Agents and Chemotherapy”. 36 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova No artigo científico do grupo da USP não existe nenhuma referência ao trabalho anterior, de 2003. As chamadas referências bibliográficas formam um item obrigatório, e elementar, de todo texto de pesquisa. “Estamos todos chateados e perplexos [com o uso das imagens]”, diz Rodrigo Stábeli, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz em Porto Velho, Rondônia. Ele é um dos 11 autores do trabalho suspeito de plágio. Especialista em es- tudos de proteínas, Stábeli não participou diretamente das pesquisas realizadas em Ribeirão Preto. O cientista é a favor dasindicância, que deverá mostrar, segundo ele, que o suposto plágio é fruto de um equívoco. O artigo publicado em 2008, assinado pelas 11 pessoas e, portanto, sob responsabilidade de todos, surgiu a partir da tese de doutorado da, na época, aluna Carolina Sant’Ana. Após ter obtido o título de doutora, a pesquisadora, hoje, não está mais na universidade. Segundo o grupo acusado de plágio, uma confusão da aluna, que teria usado as imagens em seminário interno na faculdade, é o que poderia explicar as cópias. Ela não foi localizada. A USP possui um portal eletrônico exclusivo para as teses defendidas na universidade. O trabalho de Sant’Ana, depo- sitado em 2008, não estava disponível para consulta ontem. Na história recente da USP, não é a primeira vez que pes- quisadores são acusados de plágio. Em 2008, Alejandro de Toledo, diretor do Instituto de Física da USP, e Nelson Carlin Filho, vice-diretor da Fuvest, foram investigados. O caso ter- minou com uma moção de censura ética contra os cientistas. Outro lado A reitora Suely Vilela afirma que o eventual plágio será devidamente apurado. “Sobre as acusações referidas, de uso indevido de obra alheia anterior, já foi instaurada a competente sindicância administrativa para apuração dos fatos”, disse a reitora por meio de nota. POR QUE ACONTECE PLÁGIO? 37 4a Prova Apesar de 11 cientistas terem assinado o trabalho, como é comum na comunidade científica, cada um fez a sua parte. No caso das imagens que foram copiadas, Suely diz não ter nenhuma responsabilidade. “O trabalho mencionado é resultado da tese de doutorado da aluna Carolina Dalaqua Sant’Ana, que foi orientada pelo professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto Andreimar Martins Soares”, afirma a nota. Segundo a reitora, a participação dela no estudo ocorreu em outra área. “Minha colaboração com o docente é na área de isolamento e purificação de toxinas animais, matéria distinta em relação às passagens e imagens questionadas.” A Folha não conseguiu localizar a aluna. O professor Soares está na Costa Rica a trabalho e também não foi localizado. Segundo Rodrigo Stabeli, um dos coautores do trabalho, o pesquisador da USP de Ribeirão Preto estará de volta ao Brasil em dez dias aproximadamente para fazer a defesa do grupo na sindicância interna movida pela universidade. Em casos de supostos plágios, o caminho mais usado para informar à comunidade científica o que ocorreu de fato é fazer uma espécie de autodenúncia. Isso costuma ser publi- cado nas revistas que veicularam os trabalhos. Stabeli afirmou que essa retratação, por escrito, já foi en- viada para as duas publicações em questão. “E mandamos também isso para a professora Angela [Soares, da UFRJ]”, a principal autora do trabalho onde estavam as três imagens. O grupo da UFRJ, autor da denúncia de plágio que gerou o processo na USP, não falou sobre o caso. GERAQUE, Eduardo. Reitora da USP é acusada de plágio em estudo sobre vírus. Folha.com, 04 nov. 2009. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ul- t305u647429.shtml>. Acesso em: 24 fev. 2011. Grifo do autor. 38 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova REFLEXÃO 1. De acordo com o pensamento de Eni Puccinelli Orlandi, como se dá a constituição da identidade do autor? 2. Analise o caso de plágio ocorrido na Universidade de São Paulo, apesar da alegação dos envolvidos de não ter havido intencionalidade de reprodução. 3. Em sua opinião, qual é a principal razão para a ocorrência do plágio em trabalhos acadêmicos? Nas publicações brasileiras que se referem ao plágio acadêmico ainda não existe um consenso sobre as modalidades nas quais ele se apresenta. Entretanto, propõe-se aqui uma classificação que corresponde ao padrão internacional encontrado nas orientações dadas pelas melhores universidades ao redor do mundo conforme estudo realizado recentemente (KROKOSCZ, 2011). 3.1 PLÁGIO DIRETO (WORD-FOR-WORD) Quando o redator copia na íntegra (palavra por palavra) um conteúdo (ideia, texto, imagem, códigos de programação, entre outros) de outro autor sem a indicação (citação) do mesmo e a identificação (referência) da obra. Chama-se de plágio direto porque, de acordo com a normali- zação vigente no Brasil, cópias literais devem ser indicadas com citação direta (ver 4.3.2.1 e 4.3.2.2). Por ser uma reprodução literal da fonte original, este tipo de plágio pode acontecer por incapacidade do redator no processo de interpretação do conteúdo original, devido à falta de criati- vidade no processo de redação ou simplesmente desinteresse e comodismo do redator no processo de elaboração de um trabalho acadêmico que é feito pelo sistema de copiar e colar. 3 Tipos de Plágio no Âmbito Educacional 40 AUTORIA E PLÁGIO KROKOSCZ 4a Prova Basicamente, copiar e colar não é algo proibido. No entanto, isso deve ser feito raramente e, de modo particular, no caso da necessidade de utilização de conteúdos em que o estilo de escrita original confere ao texto um significado muito peculiar, visto que interpretá-lo poderia comprometer a qualidade original. Quando esta cópia é feita é preciso indicar claramente a fonte original. De acordo com a NBR 10520, da Associação Brasileira de Nor- mas Técnicas, que trata da apresentação de citação em documentos, essa indicação deve ser feita nos trabalhos acadêmicos com o uso de aspas duplas, quando o texto copiado ocupa até três linhas no novo texto. Quando a cópia tem mais de três linhas, precisa ser destacada com um deslocamento de 4 cm da margem esquerda, o tamanho da letra do texto deve ser reduzido (10 pontos) e o espaçamento entrelinhas deve ser simples. Com isso, cria-se uma “mancha de texto”, o que permite a identificação visual do leitor de que se trata de uma parte copiada. Em ambos os casos, no texto reproduzido precisa ser indicado quem é o autor (que pode ser uma pessoa, instituição, empresa etc.), a data da publicação do documento e a página. A indicação da página é dispensada quando o texto do documento reproduzido é extraído de um website, filme, música etc. (ABNT, 2002b). TIPOS DE PLÁGIO NO ÂMBITO EDUCACIONAL 41 4a Prova EXEMPLO: FONTE ORIGINAL Eu te digo: estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora se tornou um novo instante-já que também não é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do é da coisa. Esses instantes que decorrem no ar que respiro: em fogos de artifício eles espocam mudos no espaço. Quero possuir os átomos do tempo. E quero capturar o presente que pela sua própria natureza me é interdito: o presente me foge, a atualidade me escapa, a atualidade sou eu sempre no já. Fonte: LISPECTOR, Clarice. Água viva. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. p. 9. CITAÇÃO DIRETA LONGA CORRETA A permanente decorrência do tempo presente e de como a vida passa de forma tão fugaz tal qual a correnteza de um rio, são descritos por Clarice Lispector de forma bela e poética: Eu te digo: estou tentando captar a quarta dimensão do instante- -já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do é da coisa. Esses instantes que decorrem no ar que respiro: em fogos de artifício eles espo- cam mudos no espaço. Quero possuir os átomos do tempo. E que- ro capturar o presente que pela sua própria natureza me é interdi- to: o presente me foge, a atualidade me escapa, a atualidade sou eu sempre no já. (LISPECTOR, 1998, p. 9). As palavras da autora provocam a reflexão do leitor... O protagonismo na vida seria esta busca permanentemente adiada de encontrar-se em um instante no tempo que ainda não é ou já foi? Pode ser mesmo que para os seres humanos o sentido da vida é o reconhecimento da provisoriedade de si e das coisas. Referência: LISPECTOR, Clarice. Água viva. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. O plágio direto pode acontecer de forma disfarçada, com partes copiadas
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