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DIREITO PROCESSUAL CIVIL IV Guérula Mello Viero A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar o tratamento das tutelas de urgência nos tribunais superiores. � Reconhecer o tratamento processual diferenciado da fazenda pública nas tutelas de urgência. � Definir a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em relação às tutelas de urgência. Introdução As medidas de urgência na fase recursal ganharam maior importância a partir da década de 1990, com as reformas no Código de Processo Civil (CPC) de 1973. Neste capítulo, você vai verificar como os tribunais supe- riores tratam as tutelas de urgência. Você vai estudar o funcionamento de medidas de urgência no que se refere à ação contra a fazenda pública, conhecendo também as vedações para a concessão das tutelas provisó- rias. Por fim, vai ler sobre a posição do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao deferir as medidas urgentes e sobre os requisitos exigidos pela Corte. 1 A tutela de urgência e os tribunais As tutelas de urgência, sejam elas cautelares ou antecipatórias, têm o objetivo de evitar danos a quem tem razão devido à duração do processo. Ou seja, elas pretendem impedir que a tutela jurisdicional tenha seu resultado com- prometido por conta do tempo (RIBEIRO, 2003). As tutelas caracterizam-se pela sumariedade da cognição, sendo tanto definitivas quanto provisórias. As definitivas referem-se à cognição exauriente, pois definem o litígio; já as provisórias objetivam assegurar o resultado final do processo, baseadas em cognição sumária (RIBEIRO, 2003). Como explica o ministro Antônio de Pádua Ribeiro, a concretização das tutelas de urgência se dá mediante pressupostos de “evidência, aparência, plausibilidade do bom direito e o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação” (RIBEIRO, 2003, p. 183). A concessão pode ser de forma liminar, quando não se ouve a parte contrária, ou após oitiva em cognição sumária. A situação de perigo de dano irreparável ou propósito protelatório pode ocorrer quando o processo já está em fase recursal. Assim, “a solução que o novo sistema oferece é o pedido de antecipação, que será dirigido ao tribunal e será apreciado pelo órgão competente para o julgamento do recurso, ou pelo relator, conforme dispuser o regimento interno” (ZAVASCKI, 1995, p. 93 apud TUCCI, 2015, documento on-line). Fornaciari Júnior (1996) explica que essa tutela antecipatória também pode ser pleiteada no tribunal, cabendo ao relator do recurso conhecer o pedido. Ou seja, se os requisitos legais para a concessão da tutela de urgência estiverem presentes, haverá obrigação incontornável do Estado, visto o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. As medidas de urgência na fase recursal ganharam maior importância desde a década de 1990, com as reformas no CPC de 1973. Novas possibilidades surgiram quando houve a mudança no art. 558 do CPC de 1973, decorrente da Lei nº. 9.139, de 30 de novembro de 1995. Tal lei possibilitou a concessão de efeito suspensivo em recurso de agravo quando estiver presente o perigo de lesão grave e de difícil reparação. Esse efeito suspensivo passou a ser denominado pela doutrina de “efeito ativo” (ou “suspensivo ativo”), “quando a mera suspensão da eficácia da decisão recorrida não era suficiente para remendar os males decorrentes da passagem do tempo” (ASSIS, 2016, documento on-line). Para uma parcela da doutrina, esse “efeito ativo” consistia na antecipação da tutela recursal, a qual era aplicada em âmbito recursal. Essa expressão acabou sendo englobada pelo art. 527, com redação dada pela Lei nº. 10.352, de 26 de dezembro de 2001. Assim, durante a vigência do CPC de 1973, analisava-se que, se a antecipação da tutela recursal fosse cabível em caso de urgência (art. 273, I, do CPC de 1973), também seria admissível em caso de evidência (art. 273, II, do CPC de 1973). A partir dessas discussões, o CPC de 2015 trouxe alguns elementos rele- vantes à tutela recursal. Como você já viu, quem aprecia o pedido de tutela provisória em matéria recursal é o relator, como dispõe o art. 932, II, do CPC de 2015, essencialmente em agravo de instrumento. O art. 995 do CPC de 2015 estabelece que, em regra, os recursos não possuem efeito suspensivo. No entanto, em seu parágrafo único, esse artigo admite a possibilidade de o relator suspender a eficácia da decisão “se houver risco de dano grave, de A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública2 difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de pro- vimento do recurso” (BRASIL, 2015, documento on-line). Contudo, somente a suspensão da eficácia pode não ser suficiente para afastar o risco. Nesse caso, há necessidade de uma providência ativa. Imagine que o autor da demanda pleiteia uma medida em caráter liminar. O juiz de primeiro grau a denega, e o autor, em seguida, ingressa com agravo de instrumento. Supondo que ele precise dessa medida com urgência, pleitear efeito suspensivo em nada lhe ajudará. Ele precisará que o tribunal, antes mesmo de julgar o agravo, antecipe os resultados decorrentes do futuro e do eventual provimento do recurso interposto. Em suma, ele precisará que o tribunal (na pessoa do relator, conforme o art. 932, II) lhe conceda uma antecipação da tutela pleiteada via recurso, ou seja, uma antecipação de tutela recursal (ASSIS, 2016, documento on-line). O efeito ativo, ou a antecipação da tutela recursal, pode ocorrer tanto em agravo de instrumento, como disciplina o art. 558 do CPC de 2015, quanto em apelação, independentemente de a sentença ser procedente ou improcedente. Em uma sentença procedente, esse efeito ativo permite ao autor antecipar o mérito com base na sentença previamente procedente, por meio de uma simples petição ao tribunal (arts. 249 e 299 do CPC de 2015). Por outro lado, o efeito suspensivo tem o intuito de beneficiar o réu, uma vez que possibilita proibir a execução provisória por parte do autor. Já em uma sentença improcedente, terminativa ou definitiva, em que haja a decretação da prescrição ou deca- dência, a tutela recursal permite devolver ao tribunal as questões decididas na sentença, impedindo, assim, a coisa julgada. Dessa forma, tem-se a tutela com efeito devolutivo (OLIVEIRA; NEGRI, 2018). Veja o que afirma o atual ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux: Reconhecida a antecipação como instrumento de efetividade da prestação judicial, técnica capaz de vencer a tão decantada morosidade da justiça, que afronta os mais comezinhos direitos fundamentais do ser humano, nada mais apropriado que delegá-la aos tribunais superiores, os quais, mantendo a inteireza do direito nacional, logram carrear para o poder a que pertencem o prestígio necessário àqueles que, consoante as sagradas escrituras, possuem o sumo sacerdócio da saciar os que têm sede e fome de justiça (FUX, 2001, p. 23). 3A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública As tutelas provisórias recursais são distintas das tutelas provisórias re- queridas em primeira instância. Na primeira instância, disciplinada pelo art. 294 do CPC de 2015, a concessão ocorre por meio de decisão interlocutória, cabendo agravo de instrumento em caso de insatisfação ou contrariedade à escolha do magistrado. Com o requerimento do agravo de instrumento, em face da rejeição da tutela antecipada, e com o consequente provimento desse agravo, haverá a tutela recursal — isto é, a tutela que antes fora rejeitada em primeira instância teve nova avaliação e foi procedente em fase recursal. Já na apelação, a tutela recursal serviria para acelerar os efeitos da sentença, evitando a protelação com interposições de recursos pela parte vencida. Caso a tutela seja concedida em apelação que impugna sentença por extinção da ação, sem julgamento de mérito ou por error in procedendo, o tribunal rescindirá a sentença eencaminhará os autos para a primeira instância prosseguir com o processo e o julgamento (OLIVEIRA; NEGRI, 2018). As tutelas provisórias, em regra, permanecem com sua eficácia enquanto estiverem pendentes do processo principal. No entanto, a qualquer tempo elas podem ser revogadas ou modificadas, e o procedimento para a revogação será o mesmo utilizado para a concessão. Assim, por requerimento do agra- vante, o relator do agravo de instrumento pode suspender o cumprimento da decisão até que haja pronunciamento definitivo da turma ou da câmara em casos como: adjudicação, prisão civil, levantamento de dinheiro sem caução idônea, remissão de bens, entre tantos outros que possam resultar em lesão grave ou de difícil reparação — ou seja, se a execução da decisão agravada puder gerar lesão grave ou de difícil reparação, o agravo poderá ser suspenso pelo relator (RIBEIRO, 2003). O mandado de segurança só é cabível para efeito suspensivo de decisão judicial, como dispõe a Lei nº. 9.139/1995, após o impetrante ter indeferido seu pedido referente aos casos citados no parágrafo anterior. Já para impugnar decisão interlocutória, que apresente conteúdo negativo, a via é o agravo de instrumento, em que o relator poderá conceder o “efeito suspensivo ativo”, como explica Ribeiro (2003). No que diz respeito às medidas cautelares e à suspensão de segurança, Ribeiro (2003) disciplina que uma das primeiras distinções se refere a quem examina o pedido. Em caso de medida cautelar, a competência é do relator; já nas medidas suspensivas, a incumbência é do presidente do tribunal res- ponsável pelo exame do recurso cabível. Outra diferença apresentada pelo ministro é que a suspensão de liminar ou de sentença só é requerida na tutela do interesse público: “Só cabe a requerimento da pessoa jurídica de direito A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública4 público interessada e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas (Lei n. 4.348, de 26.6.1964, art. 4º; Lei n. 8.038, de 28.5.1990, art. 25; Lei n. 8.437, de 30.6.1992, art. 4º)” (RIBEIRO, 2003, p. 184). O art. 4º da Lei nº. 8.437/1992, ao dispor sobre a suspensão, afirma o seguinte: “Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes”. Em seu § 1º, o mesmo artigo determina: “Aplica-se o disposto neste artigo à sentença proferida em processo de ação cautelar inominada, no processo de ação popular e na ação civil pública, enquanto não transitada em julgado” (BRASIL, 1992, documento on-line). Como esclarece Ribeiro (2003), a suspensão de segurança abrange a suspensão da execução de liminar e da sentença; já a suspensão de decisão compreende a suspensão da execução de sentença, no entanto somente quando proferida em cautelar inominada, ação popular e ação civil pública. É importante você considerar que, nas hipóteses mencionadas, a competên- cia para suspender a decisão é do presidente do STJ quando a causa se fundar em matéria infraconstitucional; em casos com fundamento constitucional, a competência é do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). O art. 25 da Lei nº. 8.038/1990 impõe a competência para suspender execução de liminar ou decisão concessiva de mando de segurança ao presidente do STJ; contudo, ele não possui competência para restabelecer liminar ora cassada. Com a concessão da liminar por membro do tribunal, o presidente do STJ possui competência para apreciar o pedido de suspensão da medida, contanto que seja fundado em risco de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Entretanto, isso não afasta o cabimento de agravo para examinar eventuais vícios na decisão no âmbito do STJ. Conforme Ribeiro (2003, p. 185), ao conceder medida suspensiva, o presidente do STJ deve se ater aos limites suficientes para resguardar o interesse público, visto o caso concreto, “até o julgamento do agravo pelo Tribunal de Apelação ou até o trânsito em julgado da decisão ou do julgamento do recurso especial, a ser interposto”. Contudo, no âmbito do mandado de segurança individual ou coletivo, o art. 7º, § 2º, da Lei nº. 12.016, de 7 de agosto de 2009, dispõe que “não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a re- classificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza” (BRASIL, 2009, documento on-line). 5A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública 2 A tutela de urgência e a fazenda pública A tutela provisória, seja satisfativa ou cautelar, é aplicável contra a fazenda pública, como disciplina o art. 1.059 do CPC de 2015, quando o caso em questão estiver estabelecido nos arts. 1º a 4º da Lei nº. 8.437/1992 e no art. 7º, § 2º, da Lei nº. 12.016/2009. Assim, o CPC de 2015 manteve substancialmente o mesmo regramento em torno da matéria, contudo simplificou e sintetizou formalmente o quadro de restrições sobre a tutela provisória contra a fazenda pública, dispondo que as únicas leis que a limitam são: i) as Leis n. 4.348/1964 e n. 5.021/1966 foram explicitamente revogadas (pela Lei n. 12.016/2009, art. 29), embora seu conteúdo tenha sido preservado no art. 7°, § 2º, da mesma Lei n. 12.016/2009; ii) e o art. 1º da Lei n. 9.494/1997 acabou tornando-se desnecessário e foi implicitamente revogado, vez que o art. 1.059 do CPC–2015 fez constar a extensão de todas essas regras restritivas das cautelares e mandado de se- gurança às tutelas provisórias em geral contra a Fazenda Pública (DIDIER JUNIOR; OLIVEIRA; BRAGA, 2015, p. 631–632). Dessa forma, a tutela provisória fica proibida contra o poder público quando tiver por objeto, como explicam Didier Junior, Oliveira e Braga (2015, p. 632): a) “a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.” (art. 7º, § 2º, da Lei n. 12.016/2009); b) medida “que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação” (art. 1º, § 3º, Lei n. 8.437/1992) — que, na pior das hipóteses, é mera repetição da vedação (já mitigada) à irreversibilidade (cf. art. 300, § 3º, CPC), como já se disse; e, enfim, c) a impugnação, em primeira instância, de ato de autoridade sujeita, na via de mandado de segurança, à competência originária do tribunal — ressalvados a ação popular e a ação civil pública (art. 1º, §§ 1º e 2º, Lei n. 8.437/1992). No entanto, a constitucionalidade dessas hipóteses é controversa e provoca debates entre os doutrinadores. Uma parte da doutrina entende que elas seriam inconstitucionais, visto implicarem ofensa à inafastabilidade da tutela jurisdi- cional; outra parte, contudo, defende a constitucionalidade, pois esses casos não apresentariam os requisitos necessários para a concessão da tutela, devido à ausência de periculum in mora ou de irreversibilidade (CARLOS, 2017). A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública6 Entretanto, como ensina Cunha (2016, p. 306), Não há inconstitucionalidade na vedação. Nas hipóteses previstas em lei, não é possível, em princípio, haver a tutela de urgência contra a Fazenda Públi- ca. Pode, porém, o juiz, demonstrando fundamentadamente que a hipótese reclama uma regra de exceção, afastar a norma e conceder medida. O certo, e enfim, é que tais restrições reclamam exegese restritiva, somente sendo vedada a concessão da tutela de urgência nos casos expressamente indicados no dispositivo legal. Por sua vez, o STF, ao analisar a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº. 4, em 2008, reconheceu a constitucionalidade da Lei nº. 9.494, de 10 de setembro de 1997, consolidando o entendimento de constitucionalidade de tais restrições. No entanto, essas restrições devem ser interpretadasestri- tamente, ou seja, a concessão de tutela de urgência torna-se possível quando não estiver tipificada nos artigos mencionados anteriormente. A seguir, você vai conhecer melhor cada um desses artigos (CARLOS, 2017). No artigo “(In)compatibilidades sistêmicas à concessão de tutela provisória contra o Poder Público: a remessa necessária e o regime de precatórios”, Bruno Carlos Pastore e outros autores analisam diferentes formas de proteger o Estado no processo, com base na interpretação e na aplicação sistêmica do ordenamento jurídico. O artigo pode ser lido on-line; para encontrá-lo, faça uma pesquisa no seu mecanismo de busca preferido. Art. 1º, §§ 1º e 2º da Lei nº. 8.437/1992 — ato de autoridade com prerrogativa de foro O § 1º veda a concessão de “medida cautelar inominada ou a sua liminar, quando impugnado ato de autoridade sujeita, na via do mandado de segu- rança, à competência originária de tribunal” em primeiro grau de jurisdição (BRASIL, 1992, documento on-line). Essa vedação ocorre devido à violação de competência, prevista na Constituição Federal, quanto à prerrogativa de foro. Mesmo sendo possível interpor mandado de segurança diretamente no juízo competente, escolhe-se ajuizar em primeiro grau; nesse caso, conceder 7A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública a tutela cautelar seria impor obrigação por juiz incompetente. Contudo, se não couber mandado de segurança, a concessão de tutela em face do poder público é possível, por juiz de primeira instância, inclusive em ação civil pública e ação popular, como disciplina o § 2º do art. 1º (CARLOS, 2017). Art. 1º, § 3º, da Lei nº. 8.437/1992 — irreversibilidade da medida Esse parágrafo trata da irreversibilidade da medida, visto que dispõe que “não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação” (BRASIL, 1992, documento on-line). Dessa forma, note que a norma trata da reversibilidade que deve nortear o deferimento da tutela. Coadunando, tem-se o art. 300, § 3º, do CPC de 2015. Esse artigo estabelece que “a tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão” (BRASIL, 2015, documento on-line). Art. 1º, § 5º, da Lei nº. 8.437/1992 e art. 7º, § 2º, da Lei nº. 12.016/2009 — vedação à compensação de créditos tributários e previdenciários Ambas as leis vedam a compensação de créditos tributários e previdenciários. Tendo em vista a irreversibilidade da medida, as normas visam a proteger o Estado, pois quando da compensação dificilmente a parte contrária (nesse caso, o particular) teria condições de restabelecer o status original. Assim, veja as disposições a seguir: � Art. 1º, § 5º, da Lei nº. 8.437/1992: “Não será cabível medida liminar que defira compensação de créditos tributários ou previdenciários” (BRASIL, 1992, documento on-line). � Art. 7º, § 2º, da Lei nº. 12.016/2009: “Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza” (BRASIL, 2009, documento on-line). A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública8 Art. 7º, § 2º, da Lei nº. 12.016/2009 — entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior Essa norma também disciplina sobre a entrega de mercadorias e bens prove- nientes do exterior, os quais são protegidos pelo mesmo motivo dos créditos: a irreversibilidade da decisão. Isso significa que a liberação da mercadoria e dos bens poderia inviabilizar “eventual cominação de perdimento”, como indica o acórdão do Recurso Especial (REsp) nº. 1.184.720/DF, de 2010 (CARLOS, 2017, documento on-line): O art. 273, § 2º, do CPC veda a concessão de tutela em situações nas quais haja perigo de irreversibilidade do provimento judicial. Frise-se que o desembara- ço antecipado das mercadorias (kits de cartas de baralho), considerando ser possível a venda a varejo, pode impedir eventual cominação do perdimento. Contudo, não havendo risco e como a apreensão enseja meio indireto de cobrança de tributo, é possível conceder tutela de urgência, dados a interpre- tação restritiva e o entendimento sumulado do STF (s.d., documento online). Veja a seguir. � Súmula nº. 70: é inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo. � Súmula nº. 323: é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. � Súmula nº. 547: não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais. Além disso, do mesmo art. 7º, § 2º, se extrai que é vedada a tutela de urgência em casos de reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou na concessão de aumento ou extensão de vantagens. Entretanto, quando se tratar de recomposição suprimida, promoção do servidor ou inclusão em curso de habilitação, mesmo que haja efeito secundário de concessão de vantagem pecuniária, é possível conceder tutela de urgência, como indica a Reclamação (Rcl) nº. 8.902 AgR/MG (BRASIL, 2014, documento on-line): 9A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública A concessão, em sentença de mérito, de antecipação dos efeitos da tutela em face do Poder Público não afronta a autoridade da decisão proferida ao exame da ADC 4/DF. [...] Tampouco há falar em afronta à autoridade do acórdão prolatado na ADC 4/DF quando, no caso da decisão reclamada, a concessão de vantagem pecuniária constitui mero efeito secundário de promoção ou inclusão em curso de habilitação. Além das hipóteses de vedação mencionadas, há mais uma constante no art. 29–B da Lei nº. 8.036, de 11 de maio de 1990, que trata sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS): Não será cabível medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, nem a tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS (BRASIL, 1990, documento on-line). Todas as vedações listadas foram ratificadas pelo CPC de 2015, disciplinadas no art. 1.059. 3 A tutela de urgência no STJ A jurisprudência nos tribunais, possivelmente com inspiração em um pro- cesso justo, em situações concretas que tenham relação com os provimen- tos antecipatórios executivos, tem apresentado uma tendência a suprimir os efeitos prejudiciais gerados pelo duplo efeito da apelação que é interposta contra sentenças improcedentes. Um exemplo disso é o julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº. 133.843/DF, pela Terceira Turma do STJ. Nesse caso, o então ministro Waldemar Zveiter disciplinou: “julgada improcedente, no mérito, a demanda de reintegração possessória, impõe-se seja a posse restituída a quem dela, por força de liminar, havia sido destituído” (TUCCI, 2015, documento on-line). A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública10 O professor da Universidade de São Paulo (USP) José Rogério Cruz e Tucci (2015) explica que o mesmo órgão colegiado consignou, ao julgar o Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº. 1.284/RS, que Reformada a decisão concessiva de liminar em possessória, devem as coisas voltar ao estado anterior, tornando a posse do imóvel a quem dela havia sido destituído. Irrelevância do fato de a apelação, relativa à sentença que julga a ação improcedente, haver sido recebida no duplo efeito, posto que não se trata de executá-la provisoriamente (TUCCI, 2015, documento on-line). Conforme Watanabe (1987, p. 109), isso ocorre devido à cognição plena e exauriente que possibilita a solução do conflito de forma mais segura ao jurisdicionado. Ademais, atuais e reiterados julgadosreafirmam que a con- cessão da antecipação de tutela na fase recursal somente pode se dar com a coexistência de pressupostos legais. Tucci (2015) ainda traz outro exemplo: de forma análoga à vertente, a Terceira Turma do STJ julgou o Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº. 1.121.907/SP, sob relatoria da ministra Nancy Andrighi. Veja: No direito de família, notadamente quando se trata do interesse de menores, a responsabilidade do julgador é redobrada: é a vida da criança que está para ser decidida e para uma criança, muitas vezes, um simples gesto implica causar- -lhe um trauma tão profundo, que se refletirá por toda a sua vida adulta. Por esse motivo, toda a mudança brusca deve ser, na medida do possível, evitada. Nos processos envolvendo a guarda de menores, a verossimilhança deve ser analisada com maior rigor. Tirar a criança do convívio com sua mãe, com que esteve sempre, desde o nascimento, é medida que só pode ser adotada em casos extremos [...] (TUCCI, 2015, documento on-line). O STJ tem concedido as medidas cautelares quando estão presentes os pressupostos fumus boni iuris e periculum in mora. Como explica Ribeiro (2003), as tutelas objetivam a eficácia da decisão a ser proferida no recurso especial interposto. Logo, o atendimento ao requisito da aparência do bom direito deve ser realizado mediante exame de deliberação sobre a possibilidade do êxito do recurso especial. Caso seja inviável ou pouco viável, o pressu- posto deve ser afastado. Já no que se refere aos danos que decorram da mora, o exame deve seguir os princípios que regem a concessão de liminar nas tutelas urgentes em geral, considerando, obviamente, os limites do recurso especial. 11A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública Como destaca Ribeiro (2003, p. 190), “O Superior Tribunal de Justiça tem concedido medidas cautelares antes mesmo da publicação do acórdão e, portanto, da interposição do recurso especial”. Muitas vezes, a medida provisória é requerida contra uma decisão decla- ratória negativa, isto é, que deu improcedência ao pedido. Assim, concede-se o efeito suspensivo ativo, visto que apenas a suspensão dos efeitos de uma decisão declaratória negativa não resulta em nada na prática. Contudo, em caráter excepcional, pode-se conferir efeito suspensivo a um recurso especial com o objetivo de garantir a utilidade e a eficácia de uma decisão que possa ser favorável ao recorrente, desde que ambos os pressupostos estejam presentes (RIBEIRO, 2003). Você também deve considerar que a Lei nº. 9.756, de 17 de dezembro de 1998, responsável por introduzir o § 3º no art. 543 do CPC de 1973, disciplinou o seguinte (BRASIL, 1973, documento on-line): O recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interpostos contra decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar, ou embargos à execução ficará retido nos autos e somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição do recurso contra a decisão final, ou para as contrarrazões. Como explica Ribeiro (2003), a jurisprudência tem temperado a retenção dos referidos recursos, visto que tem admitido a subida em casos como os referentes às decisões concessivas de tutela antecipada. Contudo, como salien- tado pelo ministro, deve-se ter cuidado ao decidir essas medidas para que a decisão não assuma um papel de quase definitividade: “dar efeito suspensivo ativo ao recurso especial para conceder decisão antecipatória de tutela, sem determinar a subida do recurso especial, prolongará, em demasia, os efeitos da medida” (RIBEIRO, 2003, p. 192). Em suma, as tutelas de urgência dão vida à função jurisdicional, visto que procuram evitar os desvios e salvaguardar os processos da ação do tempo, que muitas vezes pode gerar danos irreversíveis. A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública12 ASSIS, C. A. Breves notas sobre tutela provisória em matéria recursal no novo CPC. Migalhas, Ribeirão Preto, 8 set. 2016. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/ depeso/245196/breves-notas-sobre-tutela-provisoria-em-materia-recursal-no-novo- -cpc. Acesso em: 18 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Brasília: Casa Civil da Presidência da República, 1973. Disponível em: http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/l5869impressao.htm. Acesso em: 18 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 8.036, de 11 de maio de 1990. Dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, e dá outras providências. Brasília: Casa Civil da Presidência da República, 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8036consol.htm. Acesso em: 18 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 8.437, de 30 de junho de 1992. Dispõe sobre a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público e dá outras providências. Brasília: Casa Civil da Presidência da República, 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/l8437.htm. Acesso em: 18 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 12.016, de 7 de agosto de 2009. Disciplina o mandado de segurança indivi- dual e coletivo e dá outras providências. Brasília: Casa Civil da Presidência da República, 2009. 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Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmulas. Brasília: Coordenadoria de Análise de Jurisprudência, 2017. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?s ervico=jurisprudenciaSumula. Acesso em: 18 maio 2020. FERREIRA, W. S. Breves reflexões acerca da tutela antecipada no âmbito recursal. In: ALVIM, E. P. A. et al. (org.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 654–693. PASTORE, B. C. et al. (In)compatibilidades sistêmicas à concessão de tutela provisória contra o Poder Público: a remessa necessária e o regime de precatórios. Âmbito Jurídico, São Paulo, 11 set. 2019. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito- -processual-civil/incompatibilidades-sistemicas-a-concessao-de-tutela-provisoria- -contra-o-poder-publico-a-remessa-necessaria-e-o-regime-de-precatorios/. Acesso em: 18 maio 2020. 15A tutela de urgência nos tribunais e contra a fazenda pública DIREITO ADMINISTRATIVO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Conceituar agentes públicos. > Classificar os agentes públicos. > Descrever as hipóteses de acumulação de cargos, empregos e funções. Introdução O termo “servidor público” é utilizado em sentido amplo para indicar toda e qualquer pessoa que preste serviço público à administração, ao Estado e às entidades da administração indireta. No entanto, atualmente, o termo mais uti- lizado para designar tais pessoas é “agente público”, sendo determinado como aquele indivíduo que exerce a função pública. Esse termo se encontra previsto constitucionalmente (art. 37, § 6º, BRASIL, 1988). Neste capítulo, você vai estudar o conceito e vai compreender a classificação dos agentes públicos. Por fim, você vai verificar as hipóteses de acumulação de cargos, empregos e funções. O conceito de agentes públicos Os agentes públicos são o braço sem o qual a administração pública não funcionaria. Embora atualmente esteja desassociado do conceito estrito da administração pública (conforme a teoria do órgão), o agente público funciona como um recurso essencial para o funcionamento do serviço público. Os agentes públicos nada mais são do que vetores que a administração utiliza para alcançar seus fins e objetivos. Assim, pode-se concluir que o termo Agentes públicos Fernanda Ribeiro Souto “agente público” é usado para se referir de forma ampla e generalizada a absolutamente todos aqueles que exercem atos em nome da administração. Trata-se de um gênero muito amplo do ramo do Direito Administrativo. São classificados como agentes públicos todos aqueles que desempenham função pública, ainda que em caráter temporário ou permanente, seja por contratação, convocação ou nomeação, com ou sem remuneração, nos três Poderes do Estado — Executivo, Legislativo e Judiciário — e nas três esferas de governo – União, estados, Distrito Federal e municípios. Ou seja, qualquer ente do povo que exerça função estatal é agente público, enquanto essa condição permanecer, sendo suas vontades, enquanto em exercício de sua função, imputadas ao próprio Estado. Encontram-se abarcados pelo conceito de agentes públicos os que com- põem o aparato estatal da administração pública direta ou indireta, incluindo sociedades de economia mista e empresas públicas, bem como os que são alheios ao Estado, mas exercem função pública. Conforme Di Pietro (2020), agente público é toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da administração indireta. Já nas palavras de Mazza (2018), agentes públicos são “[...] todos aqueles que exercem função pública, ainda que em caráter temporário ou sem remuneração” (MAZZA, 2018, p. 747). Em sua maioria, os agentes públicos são regidos pelo regime jurídico estatutário, em razão de a Lei dos Funcionários Públicos Federais (Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990) abarcar grande parcela dos servidores no âmbito da União. Por vezes, ela também é aplicada subsidiariamente nos âmbitos estadual e municipal. No entanto, os agentes públicos diferem em algumas categorias. O termo mais comumente utilizado para designar o indivíduo que presta serviço à administração pública é “servidor público”. Todavia, o termo servidor público corresponde a uma espécie do gênero agente público. Estritamente, servidor público é um ente ligado ao Estado por meio de estatuto. Os servi- dores ocupam cargos públicos, na medida em que os agentes públicos podem ocupar cargos, empregos, funções ou mandatos. Como os servidores públicos são espécies de agentes públicos, logo, são agentes administrativos. Por outro lado, o termo “empregado público” representa aqueles que têm vínculo funcional estabelecido para com a administração, porém, por meio de regime jurídico celetista. Já o termo “funcionário público”, atualmente, apenas é utilizado no ramo do Direito Penal, não sendo mais relevante para o Direito Administrativo. Para o Direito Penal, todos aqueles que praticam crime contra a administração em exercício de cargo, emprego ou função pública, mesmo que de forma transitória ou sem remuneração, são considerados funcionários Agentes públicos2 públicos. Assim, nota-se que os termos “agente público”, do Direito Admi- nistrativo, e “funcionário público”, do Direito Penal, são igualmente amplos e podem ser considerados equivalentes. O estabelecimento do referido conceito de agentes públicos presta apoio para a geração de consequências impostas pelo ordenamento jurídico pátrio, para o controle dos atos praticados por estes, não sendo apenas uma dis- cussão meramente doutrinária. Todos aqueles que realizam atos em razão de funções públicas são regrados pelos mecanismos de controle judicial, como mandados de segurança, mandados de injunção, ações populares, entre outros remédios constitucionais de controle. O conceito de agentes públicos tem sua reconhecida serventia para a identificação de autoridades coatoras, em referência ao art. 10 da Leinº 12.016, de 7 de agosto de 2009, que disciplina sobre os mandados de segurança individuais e coletivos para figuração em polo passivo de referidos remédios constitucionais. Como os agentes públicos exercem funções públicas, logo, exercem atribuições do Poder Público. Por isso, para fins de interposição de mandado de segurança, são autoridades públicas — por exemplo, diretores de universidades ou hospitais particulares que exercem função pública prestando serviços públicos, colaborando com o Poder Público. Nessa mesma categoria, devem ser inclusos os diretores de empresas públicas e sociedades de economia mista, sejam exploradoras de atividades econômicas ou prestadoras de serviços públicos. Os atos sujeitos ao controle judicial executados por empresas exploradoras de atividades econômicas são aqueles expedidos para cumprimento de normas de direito público e aos quais as referidas empresas estejam obrigadas, como as licitações. A delimitação desse mesmo conceito amplo e genérico é fundamental para a aplicação de diplomas legais. É o caso da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, em seu art. 2º, ao definir os agentes públicos passíveis de cometerem crimes de improbidade administrativa, e da Lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1965, denominada Lei de Abuso de Autoridade, sendo os agentes públicos considerados sujeitos ativos dessas infrações. Além da responsabilidade administrativa e criminal a que se sujeitam os agentes públicos, também se faz presente a responsabilidade civil. Indepen- dentemente de suas classificações ou regimes, todos aqueles que exercem funções públicas estão sujeitos às regras de reponsabilidade civil do Estado. Vale lembrar que as regras de reponsabilidade civil estatais são diferentes das aplicadas no regime privado. O Estado responde pelos atos de seus agentes públicos que, no exercício de sua função, causem danos a terceiros, em conformidade com o art. 37, § 60, da Agentes públicos 3 CF/1988 (BRASIL, 1988). Sendo assim, o Estado não pode se eximir de prejuízos causados por quem atua munido de seus poderes e atribuições — apesar de que, em alguns casos, essa responsabilidade passa a ser subsidiária. A CF/1988 também dedicou duas seções especificamente para versar acerca dos agentes públicos, tratando dos servidores públicos e militares, em seus arts. 39 ao 42. Portanto, em razão de seu amplo abarcamento, o gênero “agente público” se subdivide em várias outras espécies, envolvendo desde servidores públicos estatutários, empregados públicos, servidores de entes governamentais de direito privado, ocupantes de cargos em comissão, agentes políticos e agentes militares, até contratados temporários e particulares em colaboração com a administra- ção (agentes honoríficos). Todos esses manifestam a vontade estatal em suas funções, sendo o Estado o ente soberano que lhes empresta poderes para tal. Os agentes públicos são classificados conforme as pessoas jurídicas em que exercem seus cargos, a força e a relevância que suas decisões carregam e o regime jurídico a que são submetidos, além de também serem considerados os particulares que exercem função pública. Assim, até mesmo o estagiário atuante em qualquer órgão da administração pública, não importando se aufere ou deixa de auferir remuneração ou bolsa auxílio para estudos, é classificado como agente público, para todos os efeitos legais, principal- mente para fins de responsabilização criminal em caso de delito contra a administração pública. Perceba-se que a administração pública somente realiza seus atos por meio de seus agentes e representantes, sem os quais sua existência como pessoa jurídica de direito público restaria inútil e sem eficácia, tornando-se um estorvo para a sociedade. Dessa forma, pode-se definir que os agentes públicos são os recursos humanos necessários e indispensáveis para o bom andamento de todos os processos e as funções da administração pública, sob pena de, na sua falta, restar prejudicada a prestação dos serviços públicos e as implementações de políticas públicas. A classificação dos agentes públicos Dada a diversidade existente entre os agentes públicos, estes se subdividem em variadas categorias, que são descritas separadamente a seguir. Agentes políticos Os agentes políticos suportam o múnus público de gerenciamento e direção do Estado. Em regra, eles adquirem sua investidura por meio de eleições diretas Agentes públicos4 para desempenharem mandatos fixos e determinados, aos quais, quando findados, perdem seu vínculo público instantaneamente. Sua vinculação com o Poder Público é meramente institucional e estatutária, e não profissional. São exemplos de agentes políticos: os parlamentares, o presidente da República, os governadores, os prefeitos municipais, além de seus respectivos vices, os ministros de Estado e os secretários estaduais e municipais. Magistrados, promotores e outros membros do Judiciário Em relação aos magistrados, promotores de justiça, procuradores da Re- pública e diplomatas, a doutrina jurídica brasileira diverge quanto às suas classificações como agentes públicos. A corrente majoritária de entendimento sempre considerou que tais agentes se enquadram como servidores públicos estatutários titulares de cargos vitalícios, e não como sendo agentes políticos. É o que defendem Carvalho Filho (2020) e Di Pietro (2020), por exemplo. O que acontece é que o regime jurídico ao qual os magistrados e membros do Ministério Público se submetem é completamente diferente do aplicado aos agentes políticos. Isso se deve ao fato de: � não serem eleitos, muito menos nomeados, mas, sim, ingressarem no serviço público por meio de devido concurso público; � não terem mandatos determinados; � exercerem vinculação técnico-profissional para com o Estado, uma vez que os agentes políticos não necessitam atender a essa exigência; e � não administrarem os interesses do Estado nem implementarem po- líticas públicas. O posicionamento minoritário, encabeçado pelo doutrinador Hely Lopes Meirelles, inclui os membros do Ministério Público, os magistrados e os diplo- matas como sendo agentes políticos, sob o viés de que estes também exercem uma parcela da soberania do Estado, conferida aos próprios agentes políticos. Esse tema já foi objeto de confusão entre candidatos em exames de concursos públicos voltados principalmente à magistratura e ao Ministério Público. Isso porque algumas bancas examinadoras estranhamente adotaram o posicionamento da corrente minoritária como sendo o correto ao avaliar suas questões objetivas, aparentemente com o intuito de exaltar a já reconhecida relevância das funções que juízes de direito e promotores de justiça Agentes públicos 5 desempenham. A banca Cespe se viu na necessidade de escolher o bom senso ao anular uma questão da prova do concurso público para analista judiciário da Controladoria Geral de Justiça do Rio de Janeiro de 2008, em que considerava como correta a assertiva que afirmava o pensamento minoritário. Ocupantes de cargo em comissão Os ocupantes de cargos em comissão são agentes públicos que preenchem vagas de livre nomeação e exoneração na administração pública, sendo esco- lhidos exclusivamente a critério da autoridade competente. Sendo assim, os comissionados podem ser removidos de seus postos a qualquer tempo pela autoridade que igualmente os nomeou, sem ser necessário qualquer motivo a ser alegado que justifique sua remoção, nem mesmo direito ao contraditório ou à ampla defesa ou o devido processo legal. Porém, por mais que se trate de cargo de livre exoneração, caso a autori- dade competente, no ato da exoneração, resolva motivar a saída do agente comissionado, tal exoneração será nula se a motivação for comprovadamente inverídica, pela teoria dos motivos determinantes. Os comissionados somente devem ser nomeados para funções de direção, chefia ou assessoramento, sendo qualquer outra designação em contrário considerada inconstitucional. Contratadostemporários Os contratados temporários foram disciplinados pela Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, que foi criada para regulamentar o art. 37, IX, da CF/1988. Este prescreve nos seguintes termos: “[...] a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público” (BRASIL, 1993, documento on-line). Essa possibilidade de contratação só pode ser utilizada na esfera federal. Isso porque a Lei nº 8.745/1993 apenas abordou a contratação temporária no âmbito dos órgãos da administração federal direta e de suas autarquias e fundações públicas, não se aplicando às empresas públicas, às sociedades de economia mista da União nem ao Distrito Federal, aos estados ou aos municípios. Em regra, a contratação temporária é realizada por meio de processo seletivo simplificado, sendo que, em casos de emergência ambiental ou calamidade pública, o processo seletivo fica dispensado. O prazo máximo definido para duração do contrato vai de seis meses até quatro anos, a depender do previsto em lei, variando conforme o caso. Agentes públicos6 Agentes militares Os agentes militares que compõem os quadros permanentes das instituições militares, sejam elas integrantes das Forças Armadas ou das polícias militares estaduais, são regulados por regime jurídico de legislação militar específica, portanto, diferente dos civis, e não têm vinculação contratual, mas, sim, estatu- tária. As instituições militares são organizadas pela hierarquia e pela disciplina, sendo seus integrantes proibidos constitucionalmente de exercerem direitos de greve, de filiação partidária, de se sindicalizarem e de acumular cargos. Servidores públicos estatutários Os servidores públicos estatutários têm regime comum pela administração pública direta e indireta. Ingressam nos quadros do serviço público por meio de concurso público, adquirindo estabilidade após período de estágio probatório, e têm vínculo de natureza estatutária, sendo não contratual. Por essa razão, estão sujeitos à alteração unilateral do regime a eles aplicado, desde que as alterações não prejudiquem os direitos adquiridos. Em relação ao emprego público, o cargo público é mais vantajoso e prote- tivo, em razão de que o servidor deve se manter são em relação às pressões políticas e às influências partidárias a que fica exposto em virtude da natureza do cargo. Em relação aos cargos públicos vitalícios, como os de magistrados e membros do Ministério Público e Tribunais de Contas, após adquirida a vitaliciedade, tais servidores somente perdem o cargo por meio de sentença judicial transitada em julgado. Empregados públicos Apesar de os empregados públicos adquirirem seu vínculo para com a admi- nistração por meio de aprovação em concurso público, eles têm vinculação contratual regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), sendo conhe- cidos, por isso, como celetistas. Como já abordado anteriormente, o vínculo do emprego público é menos protetivo que o estatutário regido pelos cargos públicos. Este é constitucionalmente designado para ser o sistema de con- tratação das pessoas jurídicas de direito privado da administração indireta, como as empresas públicas, as fundações governamentais, as sociedades de economia mista e os consórcios privados. Enquanto os servidores públicos se sujeitam a estágio probatório de três anos, os empregados públicos, por não terem a estabilidade do regime Agentes públicos 7 estatutário, não estão sujeitos a esse estágio. Porém, eles devem passar por período de experiência de 90 dias, que é o previsto no art. 455, parágrafo único, da CLT (BRASIL, 1943). Apesar de não terem estabilidade profissional, isso não significa que o empregado público possa ser demitido banalmente. Para que os empregados públicos possam ser demitidos, é preciso que a demissão seja devidamente motivada e ocorra após processo administrativo. É garantido ao empregado público o exercício do contraditório e da ampla defesa, sendo a demissão imotivada incompatível com os princípios administrativos de motivação, finalidade, moralidade, legalidade, impessoalidade, etc. Particulares em colaboração com a administração Os particulares em colaboração com a administração são agentes públicos que, em regra, não têm vínculo permanente e remunerado para com o Estado. São agentes que exercem funções públicas, porém não são servidores públi- cos, apesar de também estarem sujeitos à prática do crime de improbidade administrativa. Segundo Mello (2019), os particulares em colaboração com a administração são: requisitados de serviço, como mesários e conscritos; gestores de negócios públicos; contratados por locação civil de serviços; colaboradores das concessionárias e permissionárias; delegados de função ou ofício público, como os titulares de cartórios. As hipóteses de acumulação de cargos, empregos e funções O ordenamento jurídico brasileiro não admite a acumulação remunerada de cargos ou empregos públicos, em regra. Porém a Constituição da República elenca um rol taxativo de excepcionalidades em que a proibição de acumula- ção de cargos é mitigada. Por mais que haja tais exceções, a acumulação tão somente será permitida em caso de plena compatibilidade de horários entre as funções e, ainda, desde que seja respeitado o limite máximo de dois cargos a serem acumulados. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal (STF) já afirmou ser inconstitucional a acumulação de três ou mais vencimentos e proventos, até mesmo para servidores ingressados em cargos públicos antes da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, em sede de julgamento de mérito com repercussão geral. Além de a referida proibição dever ser respeitada pela administração pública direta, o impedimento de acumular cargos também alcança os Agentes públicos8 empregos e as funções públicas da administração pública indireta de quais- quer ordens políticas. Isso inclui autarquias, fundações governamentais, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias e sociedades controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público, conforme o art. 37, XVI e XVII, da CF/1988 (BRASIL, 1988). Ainda, a Lei dos Funcionários Públicos Federais, apesar de se tratar de dispositivo legal aplicável somente na esfera da União, em seu art. 118, amplia a vedação de acúmulo de cargos ou empregos públicos para as entidades da administração indireta dos estados, municípios, Distrito Federal e territórios (BRASIL, 1990). As únicas hipóteses em que a acumulação de cargos é autorizada cons- titucionalmente são (BRASIL, 1988): � dois cargos de professor (art. 37, XVI, a, CF/1988); � um cargo de professor e outro cargo técnico ou científico (art. 37, XVI, b, CF/1988); � dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões devidamente regulamentadas por lei (art. 37, XVI, c, CF/1988), incluindo os militares, adicionados pela Emenda Constitucional nº 77, de 11 de fevereiro de 2014, que alterou os incisos II, III e VIII do parágrafo 30 do art. 142 da Constituição; � um cargo de vereador com outro cargo, emprego ou função pública (art. 38, III, CF/1988); � um cargo de magistrado com outro de professor (art. 95, parágrafo único, I, CF/1988); � um cargo como membro do Ministério Público com outro de professor (art. 128, § 50, II, d, CF/1988). Para a finalidade de acumulação, consideram-se cargos técnicos ou cien- tíficos aqueles que necessitam de conhecimentos técnicos específicos na área de atuação do agente público, acompanhados de habilitação técnica específica mínima de segundo grau profissionalizante ou grau universitário. Para análise de necessidade técnica de referido cargo, deve-se observar lei infraconstitucional pertinente. O STF também já foi provocado a verificar a possibilidade de os membros do Ministério Público acumularem uma segunda função pública. O julgamento da Arguição de Descumprimento de PreceitoFundamental Agentes públicos 9 (ADPF) 388 resolveu pela inconstitucionalidade de nomeação de membros do Ministério Público para outros cargos públicos que não tenham relação com a instituição, ficando apenas autorizados a acumular seus cargos com o magistério (BRASIL, 2016). No caso de o segundo cargo a ser exercido pelo agente público ser de mandato eletivo federal, distrital ou municipal, o cargo ou emprego público anterior não poderá ser acumulado com a nova função. Assim, o agente fica obrigado a se afastar de sua primeira função pública para exercer somente o mandato eletivo ao qual foi confiado, podendo auferir apenas a remuneração desse cargo. Se o segundo cargo a ser desempenhado pelo agente público for o de prefeito, a acumulação também não fica permitida, devendo o agente se afastar do cargo que exercia para atuar somente pelo mandato eletivo de chefe do poder municipal. Mas, nessa hipótese, ele pode optar por auferir os rendimentos do antigo cargo exercido na administração ou os proventos do cargo de prefeito. Como exceção, caso o agente público seja eleito vereador, a acumulação pode ser admitida para exercer seus dois cargos, auferindo remuneração referente a ambos, condicionada ao limite do teto remuneratório, conforme art. 37, XI, da CF/1988, e desde que haja compatibilidade de horários entre os cargos a serem exercidos. Caso os horários de trabalho não sejam compatíveis, a acumulação fica vedada, aplicando-se a esse agente público a regra utilizada para prefeitos eleitos. Assim, este deve exercer apenas o mandato eletivo e afastar-se do cargo anterior, podendo ainda optar pela remuneração referente a um dos cargos. Sendo assim, como regra, o agente público em atividade não poderá acumular cargos caso resolva assumir um mandato eletivo, sendo a única alternativa para que isso possa ocorrer, no caso de mandato eletivo para vereador, quando não houver incompatibilidade de horários. Além do mais, a Emenda Constitucional nº 20/1998 acrescentou o § 10 no art. 37 da Constituição. Este veda o recebimento simultâneo de proventos advindos de aposentadoria que decorram do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 conjuntamente com a remuneração de cargos, empregos ou funções públicas, salvo os cargos já descritos como acumuláveis na Constituição. Assim, a acumulação somente será permitida caso o agente público, aposentado na primeira função, vir a exercer cargo decorrente de mandato eletivo ou cargo em comissão descrito em lei de livre nomeação e exoneração. Somente nessas hipóteses o agente público poderá receber os proventos provenientes do primeiro cargo em que estiver aposentado e a remuneração do segundo que estiver em exercício, simultaneamente, admitindo-se, dessa forma, a acumulação. Agentes públicos10 Tal regulamento vedatório de proventos cumulados com remuneração não faz parte do texto original da CF/1988, sendo apenas definido a partir da Emenda Constitucional nº 20/1998. Por isso, para garantir o direito adquirido de servidores que já recebiam cumulativamente, foi estipulada mais uma exceção no art. 11 do texto da Emenda. O dispositivo reconhece o direito adquirido e sustenta que os aposentados e inativos que, até a publicação da Emenda, houverem ingressado uma segunda vez no serviço público podem continuar acumulando. Porém, esse dispositivo garante apenas a hipótese de acúmulo de proventos mais remuneração, sendo vedada a acumulação de dois proventos de aposentadorias do regime próprio de previdência provenientes do serviço público, salvo hipóteses permissivas expressas para a atividade do art. 37, XVI, conforme art. 40, § 6º, ambos da Constituição da República (BRASIL, 1988). Para o teto remuneratório constitucional, o STF decidiu que os valores auferidos em razão do exercício das funções acumuladas devem ser obser- vados isoladamente, e não de forma conjunta, como havia sido definido em interpretação anterior. A nova interpretação foi publicada na decisão do Recurso Extraordinário 612.975 (BRASIL, 2017), que seguiu a seguinte tese em sede de repercussão geral: Nos casos autorizados, constitucionalmente, de acumulação de cargos, empregos e funções, a incidência do artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal, pressupõe consideração de cada um dos vínculos formalizados, afastada a observância do teto remuneratório quanto ao somatório dos ganhos do agente público (BRASIL, 2017, documento on-line). Salvo as hipóteses em que é permitida a acumulação, todas as outras que surgirem não passam de conduta ilegal. E, especialmente aos servidores públicos federais, que são regulamentados pela Lei nº 8.112/1990, tal conduta é considerada infração funcional grave, sendo repreendida com demissão. Referências BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 11 ago. 2021. BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Brasília: Presidência da República, 1943. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 11 ago. 2021. BRASIL. Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Brasília: Presidência da República, 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/l8112cons.htm. Acesso em: 11 ago. 2021. Agentes públicos 11 BRASIL. Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1993. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/l8745cons.htm. Acesso em: 11 ago. 2021. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Funda- mental 388 Distrito Federal [ADPF 388/DF]. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Julgado em: 9 mar. 2016. Brasília: STF, 2016. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/ paginador.jsp?docTP=TP&docID=11338511. Acesso em: 11 ago. 2021. BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). Recurso Extraordinário 612.975 Mato Grosso. Relator: Ministro Marco Aurélio. Julgado em: 27 abr. 2017. Brasília: STF, 2017. Disponí- vel em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=13561815. Acesso em: 11 ago. 2021. CARVALHO FILHO, A. dos S. Manual de direito administrativo. 34. ed. São Paulo: Atlas, 2020. DI PIETRO, M. S. Z. Direito administrativo. 33. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. MAZZA, A. Manual de direito administrativo. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. MELLO, C. A. B. de. Curso de direito administrativo. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2019. Leitura recomendada BRASIL. Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sôbre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1967. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm. Acesso em: 11 ago. 2021. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Agentes públicos12 DIREITO PROCESSUAL CIVIL IV Guérula Mello Viero Tutela provisória: legitimidade, competência e procedimento Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Indicar os legitimados a requerer a tutela provisória. � Identificar o juízo competente paraanalisar a tutela provisória. � Expor o procedimento da tutela provisória. Introdução Neste capítulo, você vai estudar alguns aspectos da tutela provisória. Você vai verificar quais são as pessoas legitimadas a requerer a tutela provisória, quando é possível requerê-la, como ocorre o seu procedimento e de quem é a competência para julgar os pedidos. Como você vai ver, essa medida pode ser concedida antes ou durante o processo; o tempo em que ela é requerida determina o tipo de tutela em questão e os requisitos para a sua concessão. Por fim, você vai conferir como ocorre a revogação, a modificação ou a cessação da eficácia da tutela provisória. 1 Legitimação na tutela provisória Há alguns anos, o tempo não era considerado relevante para o processo. A ação era encarada de um “ângulo estritamente interno de visão” pelos processualistas, que focavam apenas os conceitos processuais e tudo que se referisse ao direito material. Por trás dessa mentalidade, estava a “neutralidade científica e o descompromisso do processo civil”, a não ser com seus próprios conceitos, isto é, havia “um frio e indiferente purismo metodológico”. Isso se justificava pela abstração, pelo conceitualismo e pelo sistematismo da ciência processual civil, que era o meio dos processualistas (MARINONI, ARENHART, MITIDIERO, 2015, p. 195). Contudo, a prática demonstrou que, para se atingir os fins de maneira idônea na justiça civil, é imprescindível uma distribuição do ônus do tempo adequada no processo. Ademais, é necessária a percepção de que a técnica processual só tem sentido se observada pelos olhos da tutela de direitos. Em vista disso, foi necessário corrigir o rumo, combatendo a morosidade, compreendendo a “tutela dos direitos na perspectiva da técnica antecipatória”. O novo rumo foi traduzido na antecipação de tutela — ou “tutela provisória”, como denomina o Código de Processo Civil (CPC) de 2015, entre seus arts. 294 e 311 (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2015). O CPC não apresenta uma conceituação da tutela provisória. No entanto, o art. 294, incluindo o seu parágrafo único, enumera as naturezas distintas que a tutela pode ter e as razões pelas quais ela pode ser concedida. Isso permite que o magistrado que interpreta a tutela formule uma conceituação. Veja: “Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental” (BRASIL, 2015, documento on-line). Como explica Neves (2017), a tutela provisória consiste em uma tutela diferenciada, visto que a cognição do juiz não é exauriente, mas sumária. Tal cognição é fundada na verossimilhança ou na evidência, o que justifica sua natureza provisória e sua modificação e/ou revogação a qualquer tempo. A tutela provisória tem três finalidades, como você pode ver a seguir (NEVES, 2017): 1. afastar o perigo a que está sujeita a tutela jurisdicional definitiva, o que ela alcança por meio da antecipação dos efeitos da sentença; 2. adotar medida protetiva, assecuratória, que visa não a fazer, mas a preservar o provimento final; 3. redistribuir o ônus da demora na solução no processo quando o direito tutelado for evidente. Tutela provisória: legitimidade, competência e procedimento2 Assim, com base no disposto no CPC de 2015 e nas finalidades da tutela provisória, é possível formular uma conceituação para esse tipo de medida. Veja: “tutela diferenciada, emitida em cognição superficial e caráter provisório, que satisfaz antecipadamente ou assegura e protege uma ou mais pretensões formuladas, e que pode ser deferida em situação de urgência ou nos casos de evidência” (NEVES, 2017, p. 440). Em síntese, a função das tutelas provisó- rias é dar maior efetividade ao processo. Como você sabe, um processo sem as medidas tutelares pode ser bastante demorado e financeiramente custoso para pessoas de menor poder aquisitivo, o que diminui as chances de elas suportarem o processo até o seu resultado final. A tutela provisória pode ser classificada pela sua natureza, pela sua fundamentação ou pelo momento em que for requerida. Conforme a natureza, pode ser antecipada ou cautelar; quanto à fundamentação, de urgência ou de evidência; e quanto ao momento de concessão, antecedente ou incidental (NEVES, 2017). Com a previsão de tutela provisória, consegue-se assegurar o provimento final e, ao mesmo tempo, distribuir melhor o ônus da demora. Afinal, o juiz tem a possibilidade de conceder antes algo que só seria concedido ao final; ou, ainda, o magistrado pode determinar as medidas necessárias para garantir a eficácia da decisão final. Se não houvesse a tutela provisória, o ônus da demora recairia sempre sobre o autor, o que estimularia o réu a utilizar os diversos mecanismos disponíveis para retardar o encerramento do processo (NEVES, 2017). Em regra, o princípio dispositivo das tutelas provisórias, princípio que é estruturante do sistema processual, funciona de forma generalizante, se decompondo em uma série de regras processuais, as quais reservam para a parte o direito de provocar a atuação jurisdicional (DIAS, 2017). Nesse sentido, todas as pessoas que possuem capacidade para serem parte têm legitimidade para requerer a tutela provisória jurisdicional. No CPC, os arts. 303 e 305 designam o requerimento da providência urgente antecedente e incidental ao sujeito processual interessado. 3Tutela provisória: legitimidade, competência e procedimento Ou seja, como explicam Didier Junior, Braga e Oliveira (2015), todo aquele que alegar ter uma tutela jurisdicional (definitiva) tem legitimação para re- querer os efeitos de forma antecipada provisoriamente; essa é a regra, que não comporta exceções. Como esclarecem os autores, a tutela jurisdicional deve ser encarada como um resultado prático favorável, que é proporcionado a quem tem razão e é obtido após o exercício da função jurisdicional. O resultado “pode beneficiar tanto ao autor quanto ao réu, dependendo de quem venha a lograr êxito, amparado que esteja no direito material” (YARSHELL, 1999, p. 28). Dessa forma, autor, réu e terceiros intervenientes (os quais se tornam partes a partir da intervenção) têm legitimidade para requerer a antecipação dos efeitos da tutela, seja satisfativa ou cautelar. Preenchidos os requisitos dispostos na lei, eles têm direito não só à tutela jurisdicional como à antecipação provisória dos seus efeitos (DIDIER JUNIOR; BRAGA; OLIVEIRA, 2015). Como destacam Nery Junior e Nery (2003, p. 647), inclusive o assistente simples pode fazer o requerimento se condicionado à vontade do assistido: Cabe tutela provisória em favor do denunciante à lide. Não há razão para vetar, em tese, o cabimento da tutela provisória em favor do denunciante, principalmente quando se sabe que pode ele abdicar do seu interesse na ação principal para concentrar-se na demanda regressiva. Esse comportamento do denunciante revela aceitação da derrota em face do seu adversário originário e, a depender do comportamento do denunciado, pode autorizar a concessão da tutela provisória em seu favor. A tutela provisória pode ser requerida pelo réu quando ele for reconvinte e denunciante; quando houver pedido contraposto; ou quando se tratar de uma ação dúplice, caso em que a simples defesa já demonstra o exercício da sua pretensão. A antecipação dos efeitos do acolhimento do contradireito (direito de retenção, de compensar, entre outros) também pode ser exercida pelo réu em fase de defesa (DIDIER JUNIOR; BRAGA; OLIVEIRA, 2015). Além disso, em casos em que houver contestação de demanda não dúplice, se os requisitos legais forem preenchidos, o réu pode requerer a antecipação provisória dos efeitos da tutela declaratória negativa (quando há a improce- dência do autor), dado o princípio da isonomia (DIDIER JUNIOR; BRAGA; OLIVEIRA, 2015). Tutela provisória: legitimidade, competência e procedimento4 Em uma demanda condenatóriacontestada, se o autor remeteu, em razão de suposta dívida, informações para órgãos de proteção ao crédito, o réu pode, em tese, postular a antecipação provisória de efeitos da futura sentença de improcedência, a fim de que seu nome seja provisoriamente excluído do rol de devedores inadimplentes ou de que essa informação não seja divulgada. Para quem considera os embargos à execução uma demanda proposta pelo executado contra o exequente, sendo os embargos do executado manifestamente protelatórios, o réu/exequente pode requerer, como tutela provisória, a continuidade do processo executivo, eventualmente suspenso pela concessão de efeito suspensivo aos embargos (DIDIER JUNIOR; BRAGA; OLIVEIRA, 2015). Entre os legitimados, o substituto processual pode requerer tutela provisória correspondente, pois defende o direito do outro, visto o benefício que obterá disso, por meio da tutela definitiva. O Ministério Público, quando for parte e quando for assistente diferenciado de incapazes, também possui legitimidade para requerer a tutela provisória. Ademais, atuando como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público pode apoiar, repelir ou sugerir pleito provisório formulado; contudo, não tem legitimidade para requerer a tutela provisória de forma autônoma (DIDIER JUNIOR; BRAGA; OLIVEIRA, 2015). 2 Cabimento e competência O Livro V da Parte Geral do CPC de 2015 estabelece as regras das tutelas provisórias que são aplicáveis aos processos em geral, de conhecimento ou de execução, e ao procedimento das leis dos juizados especiais cíveis. Nos processos de conhecimento, as decisões podem ser condenatórias, declara- tórias e constitutivas. A princípio, as tutelas provisórias podem ser deferidas em qualquer tipo de processo, tanto de conhecimento quanto de execução (GONÇALVES, 2017). Como explica Gonçalves (2017, p. 454), pode haver incompatibilidade entre a tutela provisória e o processo, visto que as tutelas abrangem medidas satisfativas ou cautelares, as quais são fundadas em urgência ou evidência. Ou seja, um tipo de tutela pode ser incompatível com a pretensão formulada no processo. 5Tutela provisória: legitimidade, competência e procedimento Em um processo de execução instituído com título certo líquido e exigível, não faz sentido postular tutela de evidência. Nesse caso, seria coerente postular uma tutela de urgência (NEVES, 2017). Contudo, a concessão da medida pode ocorrer no processo de conhecimento, independentemente do tipo de procedimento, que pode ser comum ou especial. Nas ações de procedimento especial, há previsão de liminares específicas, com natureza de antecipação de tutela, mas que necessitam de requisitos próprios; no entanto, a tutela provisória genérica pode ser deferida da mesma forma. Gonçalves (2017) menciona como exemplos: para procedimento especial, as ações de alimentos; de força nova, as ações possessórias. A norma proces- sual prevê liminares próprias, em que se antecipam os efeitos da sentença. No caso da ação de alimentos, é necessária a prova pré-constituída de parentesco; já na ação possessória, é fundamental demonstrar o esbulho, a turbação ou a ameaça há menos de ano e dia. O autor pode ajuizar uma ação possessória de força nova e não obter liminar, pois não conseguiu demonstrar, nem na inicial, nem na audiência de justificação, que perdeu a posse há menos de um ano, requisito da tutela específica. No entanto, se durante o curso do processo ocorrer uma situação de emergência, o autor poderá postular a concessão da tutela genérica, que pode ser tanto a satisfativa quanto a cautelar. Isso se justifica porque os requisitos das tutelas são distintos: o autor pode não preencher os requisitos da liminar própria do procedimento especial, mas preencher os requisitos da tutela provisória genérica, de urgência ou de evidência (GONÇALVES, 2017). As tutelas provisórias também podem ser postuladas em ações de cunho condenatório, seja de pagar, fazer, não fazer ou entregar coisa. Essas tutelas também são cabíveis em ações constitutivas e desconstitutivas, desde que a pretensão seja compatível com a provisoriedade da medida. Como exemplifica Tutela provisória: legitimidade, competência e procedimento6 Gonçalves (2017), em ação de divórcio ou separação judicial, não é possível antecipar a medida de caráter satisfativo, visto que não é possível alterar o estado civil de forma provisória. No entanto, é admitida a medida cautelar, pois pode haver medida de cunho protetivo ou assecuratório da sentença, como para resguardar bens a serem divididos pelo casal. Além do processo de conhecimento, as tutelas provisórias também podem ser concedidas em fase de execução, visto existir a possibilidade de uma providência acautelatória com o objetivo de afastar uma situação de risco ou de perigo. Da mesma forma, em situações excepcionais, em casos de urgência, em que houver risco de dano irreparável, o juiz pode antecipar a providência satisfativa, inclusive de expropriação de bens (GONÇALVES, 2017). Como explica Dinamarco (2004, p. 68), Entre os atos pertinentes ao processo executivo, existem ainda as “medidas urgentes” (cautelares ou antecipatórias de tutela jurisdicional), que o juiz determinará e serão efetivadas por ato de um auxiliar da justiça. É o caso do arresto a ser realizado incidentalmente ao processo de execução [...] ou de al- guma medida destinada à imediata fruição do bem pelo credor, a ser concedida quando presentes os requisitos estabelecidos no [...] Código de Processo Civil. Contudo, logicamente, nos processos executivos, apenas as medidas cau- telares são plausíveis, tendo em vista que a tutela de evidência é baseada na evidência do direito e, para que o processamento da execução seja deferido, deve estar fundado em um título executivo que apresente certeza, liquidez e exigibilidade. Logo, um processo executivo não seria condizente com uma tutela baseada em evidências. Competência Como estabelece o art. 299 do CPC de 2015, “A tutela provisória será requerida ao juízo da causa e, quando antecedente, ao juízo competente para conhecer do pedido principal”. O parágrafo único ainda define que, quando se tratar de ação de competência originária de tribunal e nos recursos, a “tutela provisória será requerida ao órgão jurisdicional competente para apreciar o mérito” (BRASIL, 2015, documento on-line). O requerimento da tutela provisória pode ser feito em qualquer fase do processo principal, desde antes do seu ajuizamento — salvo a tutela de evi- dência — até o trânsito em julgado. No entanto, como explica Gonçalves 7Tutela provisória: legitimidade, competência e procedimento (2017), se o julgamento já foi proferido pelo órgão a quo e houve recurso para o órgão ad quem, a medida será requerida ao ad quem. Em caso de apelação, a competência fica a cargo do tribunal responsável por julgá-la; em recurso especial ou extraordinário, a competência será do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou do Supremo Tribunal Federal (STF). A função jurisdicional do órgão a quo terá se esgotado com o julgamento. Contudo, para que o órgão ad quem passe a ter competência, o recurso não precisa ter subido, basta que tenha sido interposto. Os autos podem estar ainda no órgão a quo ao apresentar o requerimento ao órgão ad quem. Assim, o interessado deverá instruir convenientemente o pedido de tutela provisória, para que ele possa ser apreciado. Quando o recurso for interposto, o interessado deve requerer a tutela provisória por petição dirigida ao relator, mediante o acompanhamento das cópias necessárias, para que o pedido possa ser apreciado (GONÇALVES, 2017). Em casos de juízo absolutamente incompetente, não será possível proferir decisão no processo, a não ser que o juiz se declare incompetente e determine a remessa dos autos ao juízo competente. No entanto, em casos de extrema urgência, essa decisão pode implicar um dano irreparável devido à demora. Assim, é possível ao juízo incompetente, mesmo ao que
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