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ARMADILHAS DE UMA POESIA
Foi na internet que eu vi seus primeiros escritos. Em uma tarde fria e despretensiosa de outubro de um ano que já não mais me recordo ao certo. Contudo, ver os seus escritos e a forma que se expressava foi paixão à primeira vista! Assim, vou explicar como isso aconteceu... 
Enquanto eu circulava pelo Facebook para verificar o que acontecia com a vida de meus amigos e me empolgar com suas coisas pessoais, eu vi aquele post retransmitido por Glória, uma conhecida de meus bailes de country de São Paulo. Era um poema lindo, que traduzia com perfeição e preciosidade o que eu sentia naquele instante. E é importante mencionar que sempre gostei de poemas, mas nunca tinha visto tamanho esmero e capricho em palavras tão sutis e sinceras. Pois bem, a partir disso, adicionei esse autor a minha rede de amigos e comecei a observar tudo o que ele escrevia.
Os dias foram passando e, sempre que possível, eu entrava na referida rede social pela noite para poder, de forma curiosa, ler os escritos desse poeta virtual e anônimo pela maioria. Sempre que eu podia, normalmente após ao banho, antes de me deitar e de falar com minhas filhas, eu fazia meu ritual noturno: tomava meu chá de camomila, colocava minhas netas para dormir e, logo em seguida, ia ler os poemas de meu admirado autor digital. 
E, tenho que ser sincera, toda vez era uma surpresa diferente! Eu queria que vocês pudessem ler cada uma das frases, das estrofes, dos versos que ele conseguia reproduzir! Era algo que, apesar de simples, tocava a realidade daqueles que vivem, daqueles que amam, daqueles que, assim como eu, vivia uma vida automática, mas com esperanças de um amor para poder trazer maior acalanto e mais preciosidade para uma vida tão mediana e tão rotineira...
Uma vez ele falava de um amor perdido... De outra, um amor não vivido. Outra, ainda, mostrava o valor das pequenas coisas. Certa feita, mostrava-se surpreendido com as possibilidades que a vida trazia... Ora falava da tristeza, ora das alegrias; discursava sobre as belezas da natureza, de outra maneira das dificuldades da vida. E assim seguia, mostrando sua capacidade de viver e de sentir a vida, de uma forma muito singular, autêntica e, por que não dizer, assim, tão genial para mim?
Soube de seus relatos da infância. E de que forma a vida tomava as grandes dimensões da vida adulta. Soube, também, de sua primeira esposa. E o porquê de seu relacionamento não ter dado certo: tudo eu lia e percebia nas entrelinhas! Era uma delícia, praticamente um exercício de muita curiosidade e percepção perceber o que ele queria dizer, a mensagem que transmitia e o que, de fato, queria mostrar sobre a vida para as pessoas que o liam.
E isso aconteceu durante sete meses. Todas as noites eu lia – ou relia – suas obras e sua vida. 
Isso foi muito interessante até eu perceber que, em certo ponto, eu comecei a me encantar, sobremaneira, pelo meu escritor favorito. Mas, como podia, eu, uma mulher madura, no auge dos meus cinquenta anos, nutrir sentimentos por alguém que nem ao menos na realidade eu não conhecia?
Ler todos seus escritos, ver suas fotos, sua linha do tempo, seus posts e comentários, era a certeza de dizer que o conhecia?
É possível conhecer alguém sem, ao menos, tocar-lhe a face e ter acesso fisicamente a essa pessoa?
Essas indagações me surpreendiam e ficavam na minha mente, sempre...
Assim, perdendo a vergonha e o medo de ser feliz, decidi mandar uma mensagem privada dizendo o quanto seus escritos me tocavam profundamente, o quanto eu gostava de lê-los e que, sempre que podia, eu parava e refletia o quanto a sua vida, de certa forma, lembrava a minha! A minha mensagem foi... Mas nenhuma, tão cedo, voltou.
---+---
Certo dia, algo em torno de dois meses depois do envio de minha mensagem, esta fora respondida!
Eu me senti uma adolescente (mesmo com a idade que eu tinha) sabendo que ele havia me respondido. Parei meu trabalho na casa de família que eu estava para poder ler, com todo o carinho, aquela mensagem que eu recebera. 
Tenho que confessar: foi algo inédito. Ele mostrava muita alegria em saber que eu o lia, e mais ainda em saber que já há tanto tempo. E vou além: ele escreveu uma poesia para mim no corpo da mensagem!
Ahhhh, essa foi a melhor sensação de todas! Uma poesia do meu autor favorito somente para mim! Isso não tinha preço... Tinha valor!
Senti-me, literalmente, derretida. E, de forma muito sutil, mandei um áudio para ele para agradecer.
E continuei acompanhando seus escritos por mais alguns meses. Sempre com ansiedade para saber o que viria logo em seguida...
---+---
 
Até que, um dia, por assim dizer, mais do que encantada – apaixonada seria? – eu vi a sua foto ao lado de uma pessoa conhecida! Mas não poderia ser! Ele conhecia a Elisa, uma prima distante! 
Olhei aos céus e exclamei “Apesar do universo ser tão grande, como esse mundo é pequeno!”. Eu estava a somente uma pessoa de conhecer o meu ícone dos versos digitais! E isso me empolgava bastante: será que gostaria de tomar um cafezinho com uma fã? Seria ele solteiro? Estaria aberto a um relacionamento? Minha mente se perdia com pensamentos de uma época que há tanto tempo eu já não mais me recordava... E as borboletas voltaram a voar no meu estômago, de uma forma tão inédita e tão veloz que eu já não sabia mais que elas estavam vivas depois de tanto tempo!
---+---
Pensando aqui comigo mesma, nestes tempos malucos em que vivemos, em especial de pandemia, a melhor coisa é ler: ajuda a passar o tempo e enriquecer a alma. “Vou ver o que meu ídolo-digital-dos-versos-do-Facebook escreveu hoje... 
Não encontrei nada novo. 
Li um outro poema antigo que escreveu.
No dia seguinte, a mesma coisa.
No dia posterior, novamente.
Já entrava o quarto dia seguido sem que postasse algo novo... “Deve estar viajando”, pensei comigo mesma. E segui lendo os tantos outros textos que eu gostava tanto dele.
Só que quinze dias se passaram. Um mês se passou. E nada de novo de ser postado...
Será que meu escritor favorito se perdeu com as palavras? Terá ele se perdido com o tempo?? Terá, quem sabe, se casado e ido morar fora do país?? 
Essas questões me atormentavam, pois eu adorava tomar meu chá de camomila e ler seus escritos com a paz e a tranquilidade de mais um dia vivido. Contudo, algo me faltava: sua Arte, mesmo a distância, fazia falta nos meus dias. O meu escritor favorito, mesmo não conhecido, criava em mim a falta de algo que eu não sabia, ao certo, o que era e como dizer em palavras, o vazio das faltas que suas palavras, pela noite, me acometiam.
---+---
No auge desta “peste bubônica moderna”, eu resolvi ficar em casa. Deixei de trabalhar, pois era preferível deixar de trabalhar e receber o valor das minhas diárias de trabalho do lar do que vir a perder a vida. Assim, eu só saia mesmo quando eu precisava ir a algum evento muito importante nestes dias, como a despedida de alguém muito querido que essa doença invisível acabara de ceifar a vida. E, mesmo assim, ainda saia de forma muito cuidadosa, tomando o cuidado e seguindo todos os protocolos para não colocar nenhuma de minhas netas em risco!
Fiz isso na despedida de minha prima Carla, do primo Antônio e do tio Nestor, todos eles enviados à casa de Nosso Senhor por terem confundido gripe com Covid no interior. E, hoje, o telefone tocou. Eu pressenti, de longe, que não era algo bom: mais uma pessoa da família dizendo que mais alguém estava a caminho do campo-santo para sua última viagem...
Enfim, me arrumei novamente, com todas as indumentárias, para poder sair e voltar em segurança. Os velórios estavam breves: uma ou duas horas no máximo. Então, em respeito aos entes da família, eu ia. Neste caso, eu ia com uma sensação diferente no peito: eu - de fato - não queria ir. Não sei o porquê, mas sabia que não queria. Achando que era algo bobo meu, me arrumei e fui.
Tomei o ônibus e desci ao centro da cidade, em direção ao velório municipal.
---+---
Aquele clima é o pior de todos.
As pessoas ali, reunidas ao redor do de cujus, de maneira a prestar uma última homenagem. Eali estava eu também, junto a todos, para contribuir com minha obrigação cristã e familiar.
Só que esse foi diferente.
O caixão estava fechado.
Quando eu cheguei, minha prima estava muito triste, praticamente em prantos, rompendo a dor de ter deixado seu mais novo e recente amor. Eu, sem muito poder fazer, fui deixar meu abraço e sentimentos neste momento tão difícil. Contudo, ao abraçá-la, reparei algo que me era familiar: a foto do corpo que estava sendo velado. Era uma foto que muito me agradava, uma foto que trazia boas lembranças. Era a foto de uma pessoa que me trazia conforto: a foto de quem há tanto tempo eu acompanhava, vibrava e torcia – a foto daquele que, através da poesia, fazia minha vida ser mais leve, mais doce... de ser mais colorida.
Não acreditei no que eu via!
Eu quis ter certeza do que eu vira e, para isso, perguntei para minha prima: “Prima, qual era o nome do seu companheiro?”
E ouvi o que eu mais temia: “Ele era o ........”. E eu ouvi o nome do meu ídolo digital. 
Neste instante o tempo parou.
Minha boca secou.
Os olhos encheram de lágrimas.
E o coração disparou.
O nome da pessoa que mais estimava – e ainda não conhecia – se fazia presente naquele instante. E isso eu, profundamente, sentia. 
E, e prantos, todos ali, não sabiam o que eu sabia, não o viam como eu o via.
Eu chorava, copiosamente, ao lado de minha prima, sem saber, que ali, por ironia, eu via a última poesia que me fora arrancada pela pandemia.
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