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HISTÓRIA DA MATEMÁTICA Professora Dra. Clélia Maria Ignatius Nogueira GRADUAÇÃO Unicesumar C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius História da Matemática. Clélia Maria Ignatius Nogueira Reimpressão 2021. Maringá-Pr.: UniCesumar, 2019. 248 p. Graduação - EaD 1. Matemática 2. História . 3. EaD 4. EaD. I. Título. ISBN 978-85-8084-928-8 CDD 22ª Ed. 510.9 NBR 12899 - AACR/2 Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828 Coordenador de Conteúdo Ivnna Gurniski Design Educacional Camila Zaguini Silva, Jaime de Marchi Junior, Larissa Finco, Maria Fernanda Canova Vasconcelos, Nádila de Almeida Toledo, Rossana Costa Giani, Yasminn Zagonel Projeto Gráfico Jaime de Marchi Junior José Jhonny Coelho Editoração Aline Morais Revisão Textual Maria Fernanda Canova Vasconcelos Reitor Wilson de Matos Silva Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi NEAD - Núcleo de Educação a Distância Diretoria Executiva Chrystiano Minco� James Prestes Tiago Stachon Diretoria de Graduação Kátia Coelho Diretoria de Pós-graduação Bruno do Val Jorge Diretoria de Permanência Leonardo Spaine Diretoria de Design Educacional Débora Leite Head de Curadoria e Inovação Tania Cristiane Yoshie Fukushima Gerência de Processos Acadêmicos Taessa Penha Shiraishi Vieira Gerência de Curadoria Carolina Abdalla Normann de Freitas Gerência de de Contratos e Operações Jislaine Cristina da Silva Gerência de Produção de Conteúdo Diogo Ribeiro Garcia Gerência de Projetos Especiais Daniel Fuverki Hey Supervisora de Projetos Especiais Yasminn Talyta Tavares Zagonel Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desafio para todos os cidadãos. A busca por tecnologia, informação, conhecimento de qualidade, novas habilidades para liderança e so- lução de problemas com eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho. Cada um de nós tem uma grande responsabilida- de: as escolhas que fizermos por nós e pelos nos- sos farão grande diferença no futuro. Com essa visão, o Centro Universitário Cesumar – assume o compromisso de democratizar o conhe- cimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros. No cumprimento de sua missão – “promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” –, o Centro Universi- tário Cesumar busca a integração do ensino-pes- quisa-extensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento da consci- ência social e política e, por fim, a democratização do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade. Diante disso, o Centro Universitário Cesumar al- meja ser reconhecido como uma instituição uni- versitária de referência regional e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição de competências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; con- solidação da extensão universitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e administrati- va; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relaciona- mento permanente com os egressos, incentivan- do a educação continuada. Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quan- do investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequente- mente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capa- zes de alcançar um nível de desenvolvimento compa- tível com os desafios que surgem no mundo contem- porâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialó- gica e encontram-se integrados à proposta pedagó- gica, contribuindo no processo educacional, comple- mentando sua formação profissional, desenvolvendo competências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de maneira a inse- ri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproxi- mação entre você e o conteúdo”, desta forma possi- bilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessários para a sua formação pes- soal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de cres- cimento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos peda- gógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possi- bilita. Ou seja, acesse regularmente o AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e en- quetes, assista às aulas ao vivo e participe das discus- sões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui- lidade e segurança sua trajetória acadêmica. Professora Clélia Maria Ignatius Nogueira Licenciada em Matemática pela FAFIT – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Tupã, Mestre em Matemática pela USP – Universidade de São Paulo, Especialista em Educação Especial – área da surdez pela UEM – Universidade Estadual de Maringá, Doutora em Educação pela UNESP – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. A U TO R A SEJA BEM-VINDO(A)! Este texto aborda a História da Matemática, ou seja, estamos tratando de mais do que a justaposição de dois campos do conhecimento, mas de uma área interdisciplinar, da qual a História é a determinante, a que estabelece os métodos de investigação e a Mate- mática, além de fornecer os fatos, estabelece também o contexto científico em que tais fatos foram produzidos. Vamos conhecer um pouco desses campos do conhecimento. História é o campo do conhecimento que estuda a forma como os homens se orga- nizaram e viveram no passado para entender o processo de constante transformação vivenciado pela humanidade. Os historiadores servem-se de vestígios do passado para reconstruir fatos históricos. Os diferentes povos, ao construírem o conhecimento matemático, deixaram vestígios di- versos sobre este processo, que são produções humanas, portanto, sujeitas a equívocos e que constituem as fontes históricas. Para descrever e explicar o passado, os historiadores selecionam os fatos históricos mais importantes, e não apenas os narram detalhadamente, mas os organizam no tempo, os contextualizam e os explicam. Se a História estuda o passado para compreender o presente e vislumbrar o futuro, o tempo é essencial para o estudo da História, particularmente para a organização dos acontecimentos. Tradicionalmente, os historiadores dividem a História em cinco grandes períodos, em função de fatos históricos que marcaram profundamente a humanidade, provocando profundas transformações: Pré-História (até cerca de 4000 a. C, quando acontece a in- venção da escrita cuneiforme na Mesopotâmia); Idade Antiga ou Antiguidade (de cerca de 4000 a. C até 476 d. C, com a queda do Império Romano do Ocidente); Idade Média (de 476 d. C até 1453, com a Queda de Constantinopla); Idade Moderna (de 1453 até 1789, com a Revolução Francesa) e Idade Contemporânea (de 1789 até atualmente). Essa divisão foi muito criticada tanto por ser positivista quanto por se basear na história da Europa, não correspondendo às transformaçõesque ocorreram em outras partes do mundo. Entretanto, a maioria dos livros de História faz referência a esses períodos, razão pela qual os mencionamos e nos baseamos para a organização de nossas Unidades. Se já pudemos compreender um pouco da História, tratemos agora da Matemática, po- rém, não apenas com uma definição sobre o campo do conhecimento, do tipo: “A Mate- mática é a ciência dos padrões, das regularidades”, mas vamos tentar compreendê-la já com a contribuição da História. Segundo Caraça (1984), a Matemática pode ser concebida de duas maneiras bem distin- tas: uma é a que é apresentada nos livros técnicos e especializados e, particularmente, nos didáticos, em que o seu aspecto é de um todo harmonioso, com os assuntos se sucedendo por meio de uma cadeia bem definida de pré-requisitos e, principalmente, sem nenhuma contradição. APRESENTAÇÃO HISTÓRIA DA MATEMÁTICA A outra maneira de se conceber a Matemática é como um conjunto de conheci- mentos construído através das relações do homem com o meio em que vive, com o mundo, profundamente influenciado pelas relações sociais, pelas ideias filosóficas dominantes em determinado momento histórico, pelo comércio, pelas guerras, por outras ciências, pelas exigências tecnológicas etc. Esta última concepção fica evi- dente quando se envereda pela via da História da Matemática. Ao se buscar as origens e evolução do conhecimento matemático, ao se procurar entender como foi construído, aparecem dúvidas, hesitações, contradições, mudan- ças de rumo, novas diretrizes, enfim, a Matemática emerge como um bem cultural, que recebeu e recebe influências do meio externo, desmistificando a imagem de um saber à parte da humanidade, que é autossuficiente, cuja formação de teorias e conceitos obedece apenas a necessidades internas, “impossível para as pessoas comuns”, e ao qual apenas os mais bem dotados intelectualmente teriam acesso. Parafraseando Caraça (1984) – a citação original refere-se à Ciência de um modo geral – a Matemática, encarada assim, aparece como um organismo vivo, impreg- nada de condição humana, com suas forças e fraquezas e subordinada às grandes necessidades do homem na sua luta pelo entendimento e pela libertação, aparece, por fim, como um grandioso capítulo da vida humana. É preciso ficar claro que, se por um lado, o conhecimento matemático apresenta a universalidade, a precisão e a impessoalidade entre suas principais características, com a História da Matemática o mesmo não acontece. Aparecem contradições, con- trovérsias, falta de precisão sobre quando e como aconteceram os fatos, originando, então, interpretações particulares e pessoais dos estudiosos sobre o assunto. Para Struick (1992), novos resultados muitas vezes têm origem numa nova forma de escrever resultados já construídos, como os que se seguiram após a introdução do Sistema de Numeração Decimal e os que sucederam à notação de Leibniz para o cálculo, sem falar, é claro, nos progressos da Matemática a partir do estabelecimen- to da álgebra simbólica. Neste texto, vamos conversar sobre História da Matemática. Quando se trata de uma história que se confunde com a história da própria humanidade, não se preten- de, absolutamente, apresentar “toda” essa história, até porque isto seria impossível. Nosso objetivo principal é que você conceba a Matemática como construção huma- na e, conhecendo este processo de construção, você pode compreender as dificul- dades das crianças e a ideia de que o conhecimento matemático é impossível para as pessoas comuns desaparece. APRESENTAÇÃO APRESENTAÇÃO Organizamos nosso livro em cinco unidades, cada uma das quatro primeiras abran- ge a Matemática de um determinado período histórico, a saber: A Matemática das antigas civilizações (Unidade I), A Matemática dos gregos e dos árabes (Unidade II), A Matemática na Europa: da Idade Média ao século XVII (Unidade III) e A Matemática no século XIX: a libertação do real (Unidade IV). Como o principal objetivo deste texto é proporcionar sua reflexão sobre o processo de construção do conhecimento matemático, finalizamos com uma discussão filo- sófica sobre a evolução da Matemática enquanto ciência, inclusive questionando se este processo de construção é infinito. Isto é abordado na Unidade V, intitulada Filosofia da Matemática: alguns destaques. Para orientar seus estudos, ao final de cada Unidade são propostas questões e, além delas, sugerimos que, após a leitura de cada uma das Unidades, você: Elabore um texto de no máximo 15 linhas com um resumo do que foi lido, destacan- do o que você entendeu como o mais importante da leitura realizada. Destaque uma dúvida que surgiu durante a leitura e que você conseguiu resolver. Escreva a dúvida em forma de pergunta e, em seguida, responda-a. Compartilhe a dúvida e sua resposta com seus colegas no Fórum, pois além de confirmar sua res- posta, alguns de seus colegas podem ter tido a mesma dúvida e não ter conseguido sanar. Escreva uma dúvida que surgiu e você não encontrou a resposta nos textos apre- sentados e que lhe motive a pesquisar mais sobre o assunto. Compartilhe a dúvida com seus colegas no Fórum, pois algum deles pode sanar sua dúvida, além de que, discutir o assunto favorece a consolidação de seu conhecimento. Essas atividades são fundamentais para consolidar sua aprendizagem. Como este é o tipo de questão que certamente ocupará bastante tempo, procure realizá-las logo após a leitura da Unidade e, embora a aprendizagem seja favorecida pela discussão em grupo, a construção do conhecimento é uma ação solitária. É apenas quando você reflete que você organiza seus conhecimentos. Assim, nada impede que você discuta com seus colegas sobre o que está estudando, na verdade é importante que essas discussões aconteçam, mas elabore INDIVIDUALMENTE os textos sobre cada Unidade. Bons estudos! SUMÁRIO 10 UNIDADE I A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES 15 Introdução 17 Os Primórdios, na Pré-História 25 O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal 52 As Civilizações da Mesoamérica: Zapotecas, Maias e Incas 60 Considerações Finais UNIDADE II A MATEMÁTICA DOS GREGOS E DOS ÁRABES 67 Introdução 68 A Matemática Clássica ou Helênica 86 A Matemática do Período Helenístico 93 A Matemática Greco-Romana 98 A Matemática dos Árabes 104 Considerações Finais SUMÁRIO 11 UNIDADE III A MATEMÁTICA NA EUROPA: DA IDADE MÉDIA AO SÉCULO XVII 113 Introdução 115 A Matemática na Idade Média 122 A Matemática do Renascimento 133 O Cálculo Diferencial e Integral 141 O Século de Ouro da Matemática Francesa e o Sistema Métrico Decimal 149 Considerações Finais UNIDADE IV A MATEMÁTICA NO SÉCULO XIX: A LIBERTAÇÃO DO REAL 157 Introdução 158 As Geometrias Não Euclidianas 167 A Aritmetização da Análise 170 A Álgebra Abstrata 173 Kronecker, Kummer, Cantor e Poincaré 179 O Século XX: a Lógica 190 Considerações Finais SUMÁRIO 12 UNIDADE V FILOSOFIA DA MATEMÁTICA: ALGUNS DESTAQUES 199 Introdução 200 As Diferentes Concepções de Matemática 204 A Crise dos Fundamentos 207 Logicismo e Intuicionismo 210 Poincaré e a Intuição Racional do Número 213 O Estruturalismo de Nicolas Bourbaki 216 O Futuro 221 Considerações Finais 229 CONCLUSÃO 233 GABARITO 243 REFERÊNCIAS U N ID A D E I Professora Dra. Clélia Maria Ignatius Nogueira A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Objetivos de Aprendizagem ■ Compreender a Matemática como construção humana. ■ Conhecer as contribuições dos povos da antiguidade na construção do conhecimento matemático. ■ Conhecer os diferentes sistemas de numeração e as origens do Sistema de Numeração Decimal. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ Os primórdios, na Pré-História ■ O Oriente Antigo: os egípcios, os babilônios, os chineses e os hindus e o Sistema de Numeração Decimal ■ As civilizaçõesda mesoamérica: zapotecas, maias e incas INTRODUÇÃO Por falta de registros, não é possível precisar o momento exato em que o homem começou a fazer Matemática. As mais recentes descobertas científicas acerca da presença do homem na Terra demonstram que ela é muito mais antiga do que se acreditou durante muito tempo. Foram descobertos registros de que os pri- meiros hominídeos a andar sobre duas pernas, que é um dos critérios utilizados para diferenciar o homem dos demais primatas, surgiram na África, há aproxima- damente quatro milhões de anos. Os registros sobre a construção das primeiras ferramentas de pedra criadas pelo chamado Homo habilis, natural da África, datam de dois milhões de anos atrás e, desde o seu aparecimento na Terra, para poder sobreviver, o homem contava, media, calculava, mesmo sem ter a menor consciência disso ou de si mesmo. Mas como foi possível reconstruir a História da Matemática? Pelo estudo dos elementos matemáticos no trabalho humano. Assim, da análise de fer- ramentas, armas, ornamentos encontrados em escavações arqueológicas; de indícios referentes ao conhecimento da roda, com ou sem raios; das edifica- ções (moradias e templos); do comércio (relação de trocas) e da orientação no tempo e no espaço (calendários); podemos situar o aparecimento da Matemática como tal, em algum ponto da História da Humanidade, entre 10 mil e 50 mil anos atrás. Uma das fontes mais importantes para a reconstrução da História da Matemática é a agricultura. A agricultura, talvez a mais importante criação da humanidade (superada apenas, segundo alguns autores, pela revolução industrial), aparece no Oriente Médio, entre os rios Tigre e Eufrates, na região onde hoje é o Iraque, há cerca de 10 mil anos atrás. Antes da agricultura, o homem sobrevivia da coleta imediata de alimentos, da caça e da pesca. Passando a plantar e a colher seus alimentos, o homem precisou desenvolver métodos para armazenar os produtos colhidos, estabelecer técni- cas para a divisão da terra e para o plantio. Se na época da coleta a humanidade era nômade, isto é, precisava se deslocar sempre que o alimento ficava difícil em Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 15 A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E16 uma determinada região, a agricultura fixou o homem à terra, criou necessida- des, como divisão de terras, ferramentas e técnicas de irrigação e estocagem. Com os primeiros aglomerados populacionais, surgiram gradualmente os ofícios mais elementares, como a carpintaria, a tecelagem e a cerâmica. Foram estabelecidas formas de governo com a consequente coleta de impostos, exigindo conhecimentos mais aperfeiçoados da Matemática. Um ponto que é preciso ter clareza, porque permite a compreensão da natu- reza do conhecimento matemático, é que desde o seu início até o momento atual, a Matemática nunca teve sua construção interrompida. Em se tratando da construção desse conhecimento pelos matemáticos, uma geração de estudiosos formaliza o que a geração anterior construiu. É assim que se produz Matemática. Neste sentido, os resultados (teoremas e fórmulas) não são registrados e comu- nicados da mesma forma e na mesma sequência em que foram obtidos. Para terem valor enquanto conhecimento científico, os resultados dos matemáticos são comunicados de maneira despersonalizada, generalizada e descontextuali- zada no tempo e no espaço e escritos de modo que a validade desse resultado possa ser testada por qualquer interessado, isto é, demonstrada. É essa forma de apresentação, harmoniosa, sem contradição dos resultados matemáticos, que dá ao conhecimento matemático a impressão de ser acessível só aos gênios. A História derruba por terra essa ideia, por isso é fundamental que o professor a conheça. Os Primórdios, na Pré-História Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 17 OS PRIMÓRDIOS, NA PRÉ-HISTÓRIA Há cerca de 1.400.000 anos atrás, o Homo erectus que, segundo alguns estudiosos, já dominava o uso do fogo, partiu da África com destino aos continentes euro- peu e asiático, garantindo a presença do homem nas demais partes do mundo. O homem moderno, o chamado Homo sapiens sapiens, que já possuía uma linguagem, pensava, criava e procurava intervir na natureza, partiu da mesma África, há cerca de 300 mil a 200 mil anos atrás, povoando, assim, os demais continentes. Para Karlson (1961), pode causar estranheza à maioria das pessoas o fato de que o mundo “sempre esteve e está repleto de matemática”, pois estão acos- tumadas com um matemático estereotipado, de óculos grossos, desligado do mundo, aparentemente distraído e cujo habitat natural não seria o mundo real. Porém, continua Karlson, “desde o seu aparecimento na terra”, o homem contava, media, calculava, “mesmo no período em que seu espírito não tinha consciência de si mesmo e quando sobre tais assuntos não existiam conceitos e convenções” (KARLSON, 1961, p.3). Ele dividia a presa em partes iguais, com o que criou as frações; corta- va com a sua clava ou media um pedaço de pele – comparando com- primentos, admitindo assim as ideias contrárias de “maior” e “menor”. A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E18 Para encurtar o caminho na curva de um rio, ele abria um atalho re- tilíneo através do capim da estepe – junto ao leito dos rios – e com isso traçava a primeira corda de um arco. Fabricava vasos, que eram seus padrões de medida, efetuando assim as primeiras determinações de vo- lume [...] (KARLSON, 1961, p.3). Não é possível deixar de perceber que as atividades anteriormente descritas pas- savam ao largo de qualquer operação matemática consciente, mas que estava, tal como a criança nos estágios iniciais de seu desenvolvimento, agindo sobre os objetos e, desta forma, construindo seus conhecimentos sobre formas matemá- ticas, estabelecendo relações entre objetos e, mais ainda, estabelecendo relações entre grandezas. Na verdade, o homem primitivo conhecia e utilizava diferentes grandezas antes que a tomada de consciência delas lhe possibilitasse designá-las com nomes específicos. Se noções primitivas relacionadas com os conceitos de forma, grandeza e número aparecem já nos primórdios da raça humana, é possível encontrar “vis- lumbres de noções matemáticas” em outras formas de vida “que podem datar de milhões de anos antes da humanidade” e hoje a ciência já estabelece de modo claro que “as capacidades de distinguir número, tamanho e forma”, o que constitui os rudimentos do pensamento matemático, “[...] não são propriedades exclusi- vas da humanidade” (BOYER, 1974, p.1). Para Boyer (1974), inclusive, se existe “[...] validade no princípio biológico da sobrevivência do mais apto, a persistência da raça humana provavelmente tem relação com o desenvolvimento no homem de conceitos matemáticos” (BOYER, 1974, p.1). Garbi (1997) considera, segundo registros arqueológicos, que há cerca de 50 mil anos acontece uma “grande revolução intelectual” na espécie humana, traduzida pela sofisticação e variedade das ferramentas, pelo uso de tecnologia que “[...] lhe permitiu realizar longas viagens pelo mar” – o que é confirmado pelo registro dos primeiros homens na Austrália por essa época – viagens estas realizadas, novamente, a partir da África, “[...] através de pelo menos 90 km de oceano, coisa que exigia a construção de barcos razoavelmente especializados, além de algum planejamento”, particularmente no que se refere à quantidade de água e alimentos a serem utilizados durante a viagem, o que implica, necessaria- mente, na utilização de instrumentos matemáticos (GARBI, 1997, p.7).Os Primórdios, na Pré-História Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 19 Por outro lado, a presença de belíssimas pinturas de animais encontradas em cavernas da Espanha e da França demonstra que o homem já estava familiarizado com as formas e distribuições espaciais, pois descrevem algum tipo de ritual, com descrição bidimensional dos objetos no espaço, há cerca da 20 mil anos atrás. Poucos progressos se fizeram no conhecimento de valores numéricos e de relações espaciais até se dar a transição da mera recolha de alimen- tos para a sua produção, da caça e da pesca para a agricultura. Com esta transformação fundamental – uma revolução na qual a atitude do homem perante a natureza deixou de ser passiva, para se tornar ativa – inicia-se um novo período da idade da pedra, o neolítico (STRUICK, 1992, pp.29-30). Como comentamos na Introdução desta Unidade I, a agricultura promove a fixação do homem à terra, fazendo surgir o desenvolvimento de métodos para armazenar os produtos colhidos, além do estabelecimento de técnicas para a divisão da terra e para o plantio. Com o desenvolvimento dos ofícios mais elementares, como a carpintaria, a tecelagem e a cerâmica, surgiram os primeiros aglomerados popula- cionais que exigiram a criação de governos, com a consequente coleta de impostos, demandando conhecimentos mais aperfeiçoados da Matemática. Coziam o pão, fermentavam a cerveja e, nos últimos tempos do neo- lítico, preparavam e fundiam o cobre e o bronze. Ocorreram algumas invenções notáveis: a roda de oleiro e a roda de carro; aperfeiçoaram-se os barcos e os abrigos. Estas importantes invenções deram-se somente em certas áreas e nem sempre atingiram outras localidades. Os índios americanos, por exemplo, pouco sabiam da técnica para usar a roda no transporte até a chegada dos Europeus (STRUICK, 1992, p.30). Você já viu na Introdução que é possível situar o aparecimento da Matemática como tal em algum ponto da História, entre 10 mil e 50 mil anos atrás, quando surgem os seus primeiros indícios na atividade humana. Quando pensamos em Matemática, a primeira ideia que nos vem à mente é a de número. Embora a Matemática também tenha como elementos as formas geométricas, as equações e outros, o número é talvez o objeto matemático que mais represente simbolicamente esta ciência. Em se tratando especificamente do número, pode-se dizer que seu surgimento é impossível de ser precisado. Para Ifrah (1997), é necessário o estabelecimento de alguns “limites” para uma aventura na história dos números: A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E20 Se se quisesse esquematizar a história das numerações, dir-se-ia que é todo o caminho que separou o Um do Zero, conceitos que se tornaram, depois, os símbolos da nossa sociedade técnica (IFRAH, 1997, p.xvi). A citação acima, hoje, parece estranha, uma vez que basta um pequeno passo, subtrair uma unidade do Um para se ter o Zero, ou ainda, pela “falsa certeza” de que o Zero sempre precedeu o Um, entretanto, a caminhada da humanidade partiu do Um e levou milhares de anos para atingir o Zero, com o prumo desta jornada não sendo fornecido pela lógica, e sim pela necessidade prática de cole- tores de alimentos, caçadores, agricultores, pastores, astrônomos, sacerdotes e, somente por último, de matemáticos. Se o conceito de número inteiro é algo que demorou milênios para ser cons- tituído pela Matemática, em função de sua complexidade e sutileza, a ideia de quantidade que acompanha cada número em particular está intimamente ligada às experiências mais simples realizadas pela humanidade, como a de compara- ção entre duas coleções. Desde os tempos mais remotos da humanidade, o ser humano é dotado de uma faculdade que lhe permite reconhecer variações em pequenas coleções, quando um (ou mais) objeto é retirado ou acrescentado. O senso numérico não deve ser, todavia, confundido com a contagem, que é muito posterior e que demanda, ao contrário do primeiro, um complexo processo mental. Algumas espécies animais ditas “irracionais” possuem senso numérico, enquanto que a contagem parece ser prerrogativa dos humanos. “A gênese do número está oculta por trás do véu impenetrável de incontáveis eras pré-históricas”, porém estudos arqueológicos e antropológicos (comparativos com tribos atuais) permitem concluir que a origem deste conceito foi extrema- mente modesta, praticamente inexistindo dúvidas de que “[...] o núcleo do qual cresceu o conceito de número” foi um rudimentar senso numérico, igual, em seus limites, ao possuído pelos pássaros (DANTZIG, 1970, pp.18-19). Por meio de circunstâncias e processos notáveis, a humanidade aprendeu a complementar seu senso numérico com a contagem, responsável pelo extraor- dinário progresso da capacidade humana de “representar” o universo em termos numéricos, tal qual acontece atualmente. Os Primórdios, na Pré-História Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 21 Foi a contagem que consolidou o concreto e, portanto, as noções he- terogêneas de pluralidade, tão características do homem primitivo, no conceito numérico homogêneo abstrato, o que tornou possível a Mate- mática (DANTZIG, 1970, p.19). Para registrar os resultados da contagem nossos antepassados recorriam à cor- respondência um a um utilizando pedrinhas, nós em cordas e fibras vegetais, ou, ainda, marcas em ossos ou madeira, conforme figura a seguir: Figura 1: Registros de contagem em ossos, pedras e nós Fonte: Branco e Menta (2010, online) Inicialmente, a contagem se limitava a uma comparação, por correspondência termo a termo, entre duas coleções (cabeças de um rebanho e seixos ou talhos feitos numa árvore), e pode parecer que tal processo não avançava além da equiparação, não possibilitando o surgimento de números. Todavia, mediante a criação de cole- ções modelos, cada uma simbolizando uma coleção (asas de um pássaro, trevo, patas de um animal, dedos da mão etc.) foi possível a transição de números relati- vos para absolutos, e a estimativa de uma dada coleção qualquer ficaria reduzida à escolha, dentre os modelos disponíveis, do que é mais adequado e, finalmente, “[...] uma vez criada e adotada a palavra numérica, ela se torna um modelo tão bom quanto o objeto que representava anteriormente” (DANTZIG, 1970, p.20). Com o aumento da confiança do homem em sua linguagem, gradualmente os sons vão substituindo as imagens que representam os objetos concretos, os quais tomam a forma de palavras numéricas ou palavras-número (um, dois, três, ..., dez, ..., mil, ...). Por fim, após o uso das palavras-número constituir em um hábito, a memória (e o próprio hábito) realiza o percurso inverso, ou seja, as simples palavras (formas abstratas) assumem contornos concretos e passam a significar medidas de pluralidade. A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E22 Uma vez construída a ideia de pluralidade e admitida a possibilidade de comparação entre duas coleções mediante o estabelecimento de uma correspon- dência, a humanidade havia alcançado o conceito de número cardinal. Assim, para a construção da cardinalidade, o princípio da correspondên- cia é suficiente, em outras palavras, não há necessidade de contar os elementos para se estabelecer uma quantidade, é possível determiná-la por comparação, por exemplo, “existem tantas ovelhas quanto os dedos das mãos”. Todavia, uma ordem heterogênea de modelos do tipo descrito anteriormente (asas de pássaro, trevo etc.), por mais que seja de fácil compreensão, não é sufi- ciente para a determinação de um processo de contagem. Para isso, é necessário arranjar tais modelosnuma sequência ordenada e crescente (com variação de uma unidade), ou seja, o estabelecimento da sucessão natural um, dois, três, ... Uma vez criado esse sistema, contar uma coleção significa designar a cada número um termo na sequência natural em sucessão ordenada até que a coleção esteja esgotada (DANTZIG, 1970, p.21). Por sua vez, o último termo da sequência natural pronunciado e que designa o último membro da coleção (após todos terem sido contados) é chamado de número ordinal da coleção. Os dois aspectos do número (cardinal e ordinal) são indissociáveis, ou seja, para estabelecer a cardinalidade de uma coleção, é feita uma contagem (que pres- supõe uma ordem), por outro lado, para determinar o ordinal de um número, é preciso saber quantos o antecederam (ou seja a cardinalidade do número ao qual sucede). Além disso, a comparação, sozinha, não possibilita o estabelecimento das operações aritméticas, uma vez que estas se baseiam na pressuposição tácita de que todo número possui um sucessor, ou seja, a ordinalidade, em sua essência. Nos dedos, o homem possui um artifício que lhe permite passar im- perceptivelmente dos números cardinais para o ordinal: se quiser in- dicar que certa coleção tem quatro elementos (cardinal), ele abaixará ou erguerá quatro dedos simultaneamente e, se quiser contar a mes- ma coleção (ordinal), ele erguerá ou abaixará os dedos em sucessão (DANTZIG, 1970, p.70). Os Primórdios, na Pré-História Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 23 Segundo o princípio da cardinalidade, as quantidades podem, também, ser representadas por alinhamento, justaposição ou superposição de tantas pedras (entalhes, traços, pequenos círculos etc.) simbolizando quantas unidades ou, ainda, pela simples repetição, tantas vezes quantos forem os elementos, do nome do objeto ou da unidade. Em contrapartida, no princípio ordinal utilizam-se, também, palavras, ges- tos, sinais, desenhos e objetos, porém, todos diferentes entre si. A criação de uma sequência de palavras para designar coleções hierarqui- camente encaixadas passou por diversos estágios antes de atingir o nível de generalização atual, completamente independente dos objetos aos quais se refere, enquanto que, em sua origem, estavam indelevelmente vinculadas ao concreto. Um exemplo do concretismo do conceito numérico é o dos índios Palikur do Amapá, que ainda não conseguiram desvincular a natureza do objeto das palavras-número que empregam para enumerá-los e possuem seis sequências de palavras numéricas; 1) para contar animais e pessoas; 2) para objetos quadra- dos; 3) para o tempo; 4) para objetos ovais; 5) para objetos cilíndricos e 6) para mortos e objetos indefinidos. Outras tribos, como a dos Canelas, do Maranhão, e dos Nhambiquaras, no Mato Grosso, contam um, dois e muitos, testemu- nhando a vinculação do desenvolvimento da enumeração com as necessidades práticas dos povos. De posse de um sistema de representação de quantidades, o homem começou a conceber conjuntos cada vez mais extensos, encontrando, entretanto, dificul- dades de representação tanto cardinal quanto ordinal, o que deu origem a um problema de difícil solução, ou seja, o de criar meios de designar números ele- vados com o mínimo possível de símbolos. De acordo com Ifrah (1997), o fato deste delicado problema ter sido solucionado “[...] é uma prova da engenhosi- dade do espírito humano” (IFRAH, 1997, p.48). A solução encontrada consiste em privilegiar determinados agrupamentos (dezena, dúzia, vintena, sessentena etc.) e “[...] organizar a sequência regular dos números segundo uma classificação hierárquica fundada nessa base” (agrupa- mento particular) (IFRAH, 1997, p.48). A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E24 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. A partir daí estava, então, estabelecido o princípio de base, que marcou o surgimento dos sistemas de numeração, e a aplicação desse princípio a materiais intermediários, sinais gráficos ou palavras deu origem à enumeração propria- mente dita, nas formas concreta, escrita ou oral. A numeração escrita pode ser dividida em dois grupos. O primeiro é o das puramente aditivas, no qual as cifras são totalmente livres e se adicionam para formar o número, não sendo, portanto, posicionais. O segundo grupo é o das numerações de posição, no qual as cifras são coligadas e é sua posição na escrita que determina o seu valor. A numeração de posição escapou à maioria dos povos da história. Essa regra essencial só foi imaginada quatro vezes no curso da história. Apa- receu pela primeira vez no início do segundo milênio antes de nossa era, entre os sábios da Babilônia. Foi redescoberta, em seguida, pelos matemáticos chineses, um pouco antes do início da era cristã, depois, entre os séculos III e V d.C., pelos astônomos maias e, enfim, pelos ma- temáticos da Índia, por volta do séc. V (IFRAH, 1997, p.xxii). A razão principal para que apenas um número tão pequeno de civilizações tenha concebido sistemas de numeração posicionais está na dificuldade de se perce- ber a necessidade de um símbolo para a “ausência de quantidade”, para ocupar uma “posição vazia” na escrita de números, ou seja, de um “zero”, imprescindí- vel ao princípio posicional e, além destes quatro povos, nenhum outro parece ter sentido tal necessidade. Porém, apenas o “zero” indiano foi concebido como número, os demais indicavam apenas uma coluna vazia. Como os números estão tão perfeitamente inseridos no cotidiano atual, é difícil percebê-los como um dos conceitos mais abstratos e complexos que a espécie humana construiu. Cada uma das antigas civilizações construiu sua linguagem, sua escrita e seu sistema de numeração, do qual se origina a aritmética e, embora os regis- tros de quantidade sejam anteriores à própria escrita, a aritmética foi, dentre as três (aritmética, linguagem e escrita), a que mais tempo e esforço exigiu para ser assimilada pela humanidade. Entretanto, apesar das diferenças inerentes ao sis- tema de numeração adotado, que interferem nos procedimentos, as operações, as regras e leis aritméticas são idênticas e obedecem a uma mesma sequência de construção, independentemente das diferentes culturas. O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 25 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . O ORIENTE ANTIGO: OS EGÍPCIOS, OS BABILÔNIOS, OS CHINESES E OS HINDUS E O SISTEMA DE NUMERAÇÃO DECIMAL O início da civilização acontece na mesma região onde aparece a agricultura, nas bacias dos rios Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia, concomitantemente com o surgimento, no vale do rio Nilo, da civilização egípcia, com os hindus, no cen- tro-sul da Ásia, nas bacias dos rios Indo e Ganges e os chineses, aglutinados nas regiões dos rios Huang Ho e Yang Tsé, na Ásia Oriental. Como as terras nos vales desses rios eram extremamente férteis, proporcionando colheitas abundantes, surgem os primeiros vilarejos, dando origem a sociedades que se apresentam tecnicamente evoluídas já nos milênios III, IV e V a.C. As principais culturas desse período foram a do Egito, da Mesopotâmia, da Índia e da China, localidades que são reunidas sob a expressão “Oriente Antigo”. As matemáticas orientais surgiram como uma ciência prática, com o objetivo de facilitar o cálculo do calendário, a administração das colheitas, a organização das obras públicas e, consequentemente, a cobrança de impostos e taxas. Apesar das trocas comerciais que existiam entreas antigas sociedades, o centro econômico era a agricultura e, portanto, era centrado nas vilas, que se caracterizavam pelo seu isolamento e tradicionalismo. O resultado foi que, ape- sar da similaridade existente na estrutura econômica e nos traços essenciais do conhecimento científico, permaneceram diferenças notáveis entre as diversas culturas, possibilitando a fácil diferenciação da arte e dos escritos dos egípcios, dos babilônicos, dos chineses e dos indianos. No que se refere à Matemática, embora a natureza aritmético-algébrica seja globalmente similar, existiam peque- nas diferenças. Entretanto, mesmo quando o desenvolvimento matemático de uma civilização avançava mais que o da outra, num mesmo período, suas carac- terísticas aproximadas e simbolismo permaneciam preservadas. As matemáticas orientais eram, de maneira geral, essencialmente práticas, não apresentavam nenhuma tentativa de demonstração, a grande preocupação era com o como fazer, sendo que o interesse pelo porquê só aparece com os gre- gos, muitos séculos depois. Além disso, o caráter estático da estrutura social do Oriente Antigo contribuiu para preservar o conhecimento científico da época durante séculos, ou mesmo milênios. A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E26 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. OS EGÍPCIOS É bastante comum a afirmação de que é apenas com os egípcios que se pode falar em ciência Matemática, uma vez que, premidos pela necessidade de medir frequentemente suas terras (as enchentes do rio Nilo alteravam os limites) e pre- ocupados com suas grandiosas construções, foram obrigados a manejar números e retas. Todavia, não existe unanimidade em considerá-los como os primeiros matemáticos, conforme opinião de Boutroux: Os egípcios conheceram fatos matemáticos; souberam manejar fórmu- las e raciocinar com figuras geométricas, porém, na medida em que se pode julgá-los atualmente, o fizeram, perseguindo fins práticos e uti- litários. Não parece que tenham tido uma concepção clara da ciência teórica, um ideal científico (BOUTROUX, 1962, p.242). Para Germain (1962), essa controvérsia está longe de ser resolvida, pois um exame mais acurado dos papiros egípcios revela resultados que podem fortalecer as opi- niões contrárias a Boutroux: aparecem problemas que exigem determinado grau de abstração, como “o cálculo exato do volume do tronco de pirâmide de base quadrada segundo a fórmula h (a² + ab + b²) 3 V ”; a determinação da área de um semi- -círculo, com o auxílio de uma “fórmula equivalente à usada atualmente, com a excelente aproximação para π de (16/9)2 = 3,160...” (GERMAIN, 1962, p.242). Struick (1992) não aprofunda as discussões acerca do assunto e prefere assu- mir uma posição intermediária, a de que a Matemática egípcia possuía objetivos limitados, essencialmente práticos, embora com alguma sofisticação dentro des- ses limites. Como não é objetivo deste texto um aprofundamento nas discussões O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 27 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . que envolvem atualmente as pesquisas em História da Matemática, adotamos a mesma posição de Struick, com o assunto sendo tratado mediante a descri- ção de fatos. A origem da civilização egípcia é desconhecida, mas é seguramente ante- rior ao IV milênio a.C. e, como disse o historiador grego Heródoto, essa terra é um presente do rio Nilo, o qual, após suas cheias anuais de cem dias, fertiliza com generosidade a terra. Porém, segundo Durant (1957), “[...] cada presente tem seu preço; e o campônio sabia que sem o controle das enchentes a força das águas poderia destruir tudo” (DURANT, 1957, v. I, p.147). Essa foi, com certeza a principal fonte propulsora da civilização egípcia: apren- der a aproveitar a generosidade do rio sem perder, a cada cheia, os benefícios conquistados nas inundações precedentes. Assim, o povo egípcio “vem desde tem- pos imemoriais construindo essas valas que cruzam e recruzam a terra; retendo o excesso de água dos canais”; e, no período de seca, transportando a água com baldes, criando primitivos sistemas de irrigação (DURANT, 1957, v.I, p.147). Desde o que se pode considerar como o início da civilização egípcia, em torno de 4000 a.C., já aparecia uma forma rudimentar de escrita, com os pri- mitivos registros pictográficos evoluindo para símbolos linearmente ordenados mediante um processo de convencionalização lento e gradual. Embora milhares de peças de barro e diversos papiros contendo escritos ante- riores ao IV milênio a.C. tenham sobrevivido até a atualidade, muito tempo se passou para que fossem decifrados. Em 1799, a expedição de Napoleão desco- briu em Rosetta, antigo porto de Alexandria, uma grande peça contendo escritos egípcios, que ficou conhecida como a Pedra de Rosetta. Essa peça continha uma mensagem em três línguas: grega, demótica (escrita egípcia do séc. VII a.C. ao séc.V d.C., para fins literários, administrativos e comerciais) e hieroglífica (inscri- ções sagradas e primeira escrita egípcia). Conhecedores do grego, o arqueólogo francês Champollion (1778-1867) e o físico inglês Thomas Young (1773-1829) fizeram rápido progresso na decifração dos hieróglifos. Boyer (1974) chama atenção para o fato de que “[...] há um limite para a quantidade de informação que se pode retirar de calendários e pedras tumula- res”, o que restringiria em muito o conhecimento da contribuição egípcia para a Matemática, caso não existissem outras fontes, as quais, felizmente, existem. A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E28 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. “Um certo número de papiros egípcios de algum modo resistiu ao desgaste do tempo por mais de três e meio milênios” (BOYER, 1974, p.9). Dentre todos os documentos matemáticos que sobreviveram até a época atual, os principais são os papiros de Ahmes (ou de Rhind) e o de Moscou. O mais antigo deles é o de Moscou, que apresenta 25 problemas e contém a fórmula correta para o cálculo do volume de um tronco de pirâmide já mencionado, entretanto, o de Ahmes, de cerca de 1650 a.C., ficou notório por ter permitido o registro histórico do nome de seu autor, que passa a ser o primeiro matemático de que se tem notícia. Também conhecido como papiro de Rhind, em homenagem ao egiptólogo inglês que o encontrou em 1858, o papiro de Ahmes contém 85 problemas expres- sos verbalmente, alguns dos quais de interesse apenas matemático (mostrando a tendência da Matemática, desde a sua origem, de se desvencilhar do real), por exemplo, “uma quantidade, somada a seus dois terços, mais sua metade e mais sua sétima parte perfaz trinta e três. Qual é essa quantidade?”. O sistema de numeração era decimal, ou seja, de base 10, de modo que o mesmo símbolo podia ser repetido nove vezes, depois era substituído por outro que podia ser repetido até nove vezes e, assim, sucessivamente. Dez símbolos iguais eram trocados por um novo símbolo de um agrupamento superior. O valor do número escrito é a soma dos valores dos símbolos utilizados. Este sis- tema de numeração possui mais de cinco mil anos. SÍMBOLO EGÍPCIO DESCRIÇÃO DO SÍMBOLO O NÚMERO NA NOSSSA ROTAÇÃO bastão 1 calcanhar 10 rolo de corda 100 flor de lôtus 1000 dedo a apontar 10000 peixe 100000 homem 1000000 Figura 2: Símbolos numéricos egípcios e seus respectivos valores Fonte: Branco e Menta (2010b) O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios,os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 29 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . A numeração egípcia era aditiva e não posicional. Era esculpida em pedra, por meio de cinzel e martelo, ou traçada em lascas de rochas, cacos de cerâmica ou em folhas de papiro, utilizando um pincel feito de um caniço, com a ponta esma- gada e mergulhado em tinta. O mais antigo testemunho arqueológico da numeração egípcia é de cerca de 2900 a.C. É uma clava de pedra, encontrada na cidade de Hierakonpolis. Na cabeça desta clava está escrito foneticamente “Narmer” (nome do rei que unifi- cou o Baixo e o Alto Egito) e apresenta o que deve ser um inventário de algumas batalhas, com representações numéricas referentes a cabeças de animais e número de prisioneiros trazidos por este soberano de suas batalhas. Percebe-se que a notação encontrada traduzia o resultado de um método concreto de enumeração, ou seja, o número é representado pelo alinhamento ou acúmulo de objetos que necessitavam para associar a uma ordem de unidades, como pedras para as unidades, conchas para as dezenas, bolinhas para cente- nas, pauzinhos para os milhares, e assim por diante. A numeração hieroglífica já continha sinais específicos para representar as diversas ordens, assim, um traço vertical representava a unidade; um sinal em forma de alça indicava a dezena; um sinal parecido com um pedaço de corda enrolada valia cem; uma flor de lótus, com seu talo, para representar o mil; um dedo humano, dobrado, representava dez mil; com um girino representava cem mil; e uma figura humana ajoelhada representava um milhão. A Aritmética dos egípcios apresentava símbolos hieróglifos para alguns números, que eram combinados para formar números intermediários e, como na maioria das escritas orientais, o sentido era da esquerda para a direita. Essencialmente aditiva, a Aritmética egípcia determinava os resultados das adi- ções e subtrações mediante a simples combinação de símbolos; as multiplicações e divisões eram reduzidas a processos aditivos. Além desses conhecimentos, eles conheciam também as frações (essenciais para as medidas) e representavam algumas delas por símbolos especiais. As even- tuais raízes quadradas que ocorriam em alguns problemas eram simples e foram expressas em termos de números inteiros e frações, sendo que a natureza dos irracionais não foi reconhecida pelos egípcios. A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E30 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. Alguns dos problemas contidos nos papiros apresentam, ainda que de forma tímida e velada, equações do primeiro grau, as quais eram resolvidas com o uso de processos puramente aritméticos sem atingir a ideia de resolução de equa- ções; não adotavam nenhuma simbologia simplificadora, porém utilizavam um artifício bastante engenhoso e que ficou conhecido como a regra da falsa posi- ção ou a regra do falso. Por exemplo: qual o número que somado à sua terça parte dá oito? Pela Regra da Falsa Posição, fazia-se uma hipótese inicial qualquer a res- peito do número e verificava-se o que ocorria. Suponhamos, em nosso caso, que tal número fosse 3. Ora, 3 somado com sua terça parte dá 3+1=4, exatamente a metade dos 8 que deveria dar. Portanto, o número procurado é o dobro de 3, ou seja, 6 (GARBI,1997, p.13). De maneira geral, os problemas eram apresentados verbalmente com limitadas direções para obter soluções e sem explicação de como os métodos foram usa- dos. Quanto a equações de grau maior do que 1, apenas o tipo mais simples de equações quadráticas (ax2 = b) foi considerado e quando apareciam duas incóg- nitas, como ax2 + by2 = c, com y = d, eles reduziam a uma equação do tipo mais simples, pela eliminação de y. A maneira como são escritos os papiros, em particular os papiros de Ahmes e de Moscou, indica terem sido destinados a estudantes e apresentam, hoje, a “[...] direção e as tendências do ensino de Matemática no antigo Egito” (quase todo prático e com ênfase nos cálculos, deixando claro que o principal objetivo era o domínio da técnica e não a compreensão). Entretanto, tais informações, reunidas a “[...] outras evidências fornecidas por inscrições sobre monumen- tos”, demonstram que os egípcios pouco aproveitaram de seus conhecimentos geométricos, e deixam claro, também, que a Aritmética de Ahmes era a de seus antepassados e, portanto, bem mais antiga (BOYER, 1974, p.16). Os progressos da Geometria egípcia são atestados pela sua arquitetura refle- tida na construção das pirâmides, com as mais antigas, as de Gisé, datando por volta de 2900 a.C. De maneira explícita, os egípcios sabiam determinar as áreas do triângulo, do círculo, entre outras; calculavam o volume do cubo, do parale- lepípedo, do tronco de pirâmide e do cilindro circular. Frequentemente se afirma que os egípcios conheciam o teorema de Pitágoras, porém isso não aparece nos papiros que resistiram até hoje, bem como não há vestígios de nenhum teorema O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 31 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . ou demonstração formal. Todavia, as comparações geométricas utilizadas para justificar os cálculos realizados para estabelecer determinados perímetros ou áreas podem ser consideradas “[...] entre as primeiras afirmações precisas da história referentes a figuras não curvilíneas” (BOYER, 1974, p.13). Para Cajori (2007, p.42), é curioso que os egípcios tenham conseguido resul- tados tão avançados em período tão remoto. “Mas é estranho, na verdade, o fato de que durante os seguintes dois mil anos não fizeram, em absoluto, progresso algum neste campo”. Para o autor, a antiga civilização do vale do rio Nilo tinha um caráter estático, tanto nos assuntos do governo, como em sua aprendizagem. Isto fica demonstrado pelas pesquisas realizadas pelos estudiosos gregos, que os visitaram seis séculos antes de Cristo e verificaram que o conhecimento de Geometria que os egípcios possuíam naquela época era o mesmo já dominado por eles, “[...] desde dois mil anos antes, quando construíram aquelas estupen- das e gigantescas estruturas – as pirâmides”. A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E32 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. Por sistema de numeração, entendemos um conjunto de símbolos e de re- gras utilizadas para escrever números. O sistema de numeração que utiliza- mos atualmente é o Sistema de Numeração Decimal – SND. Os símbolos do SND são: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 0, denominados algarismos indo-arábicos, e as regras são: 1) O sistema é decimal, isto é, funciona com agrupamentos de dez. Esse número dez é chamado de base do sistema. 2) O sistema é posicional, isto é, o valor de um algarismo é determina- do pela posição que ocupa no numeral. 3) O sistema é multiplicativo, isto é, em um numeral, cada algarismo representa um número que é múltiplo de uma potência da base dez. Por exemplo, no numeral 543, o algarismo 5 representa o nú- mero 25 10× , que é múltiplo de 210 , o algarismo 4 representa o número 14 10× , que é múltiplo de 110 e o algarismo 3 representa o número 03 1 3 10× = × , que é múltiplo de 010 . 4) O sistema é aditivo, istoé, o valor do numeral é dado pela soma dos valores individuais de cada símbolo de acordo com a regra anterior. Por exemplo, 543 500 40 3= + + . Embora não se tenha confirmação, acredita-se que a escolha da base dez deve-se à quantidade de dedos das mãos. A associação entre dedos e nú- meros até hoje está presente na palavra dígito. Fonte: NOGUEIRA, C. M. I.; BELLINI, M.; PAVANELLO, R. M. O ensino de Mate- mática e das Ciências Naturais nos Anos Iniciais na perspectiva da Epis- temologia genética. Curitiba: CRV, 2013. O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 33 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . A MATEMÁTICA NA MESOPOTÂMIA Na antiga Mesopotâmia, região compreendida entre os rios Eufrates e Tigre, havia por volta do final do IV milênio a.C., milênio este de notável progresso cultural (é nele que se desenvolve a escrita, o domínio dos metais e o uso da roda), uma civilização bastante avançada. Originária de antigas civilizações, como a dos caldeus, dos assírios e dos sumérios, a Babilônia florescia na região mesopotâmica. De maneira geral, se considera pelo termo babilônico apenas o habitante da cidade da Babilônia, entretanto, utilizamos aqui, indistintamente, as palavras Suméria, Babilônia e Mesopotâmia para designar a região do vale entre os rios Tigre e Eufrates. É difícil datar com precisão os primórdios da civilização mesopotâmica, par- ticularmente em função do material usado para o registro de seus conhecimentos. Os sumérios utilizavam placas de barro cozido, praticamente indestrutíveis, o que, juntamente com o caráter estático da estrutura social desse povo, dificulta o estabelecimento, com certo rigor, da data dos tabletes encontrados. Diferentemente dos escritos egípcios, que embora tenham também apresen- tado dificuldade para serem decifrados, deixaram de ser um enigma a partir do século XVIII, os escritos babilônicos demoraram em torno de um século a mais para serem compreendidos. A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E34 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. Assim, até bem pouco tempo, o que se sabia da Matemática babilônica se restringia às informações existentes na literatura grega clássica e aos escritos dos matemáticos e astrônomos caldeus. Com base nesses escritos, alguns equívocos foram cometidos, como supor que existia algum tipo de misticismo numérico ou numerologia na Mesopotâmia, o que demonstrou ser falso em virtude de descobertas mais recentes. De maneira geral, costuma-se dividir em dois períodos as principais infor- mações existentes acerca da civilização e da Matemática da Babilônia, algumas datam de cerca de 2000 a.C., e um número bem maior em torno de 600 a 300 a.C. A localização privilegiada – era rota de caravanas, em contraste com o isola- mento do Egito – fez com que o desenvolvimento da Mesopotâmia fosse superior ao das demais sociedades da região. Além disso, as inundações dos rios Tigre e Eufrates eram imprevisíveis, e o aproveitamento das áreas férteis necessitava de mais “[...] perícia técnica e administração do que o Nilo”, exigindo maiores estu- dos matemáticos, levando, consequentemente, também a Matemática a maiores desenvolvimentos (STRUICK, 1992, p.52). O conhecimento sobre a Matemática dos babilônios foi bastante ampliado com as descobertas, em meados do século XX, de O. Neugebauer e F. Thureau- Dangin, que conseguiram decifrar inúmeras placas de argila, deixando claro que a matemática babilônica atingiu um nível mais elevado do que o obtido pela matemática egípcia, com evidências de grande habilidade para o cálculo. A pre- dominância do forte caráter aritmético-algébrico transparece mesmo quando se trata da geometria, a qual surge também, a exemplo da egípcia, de problemas prá- ticos relacionados com a medição, ressaltando-se, porém, que a forma geométrica de um problema servia, quase sempre, para apresentar uma questão algébrica. Os babilônios utilizavam em seus hábeis cálculos um sistema numérico sexa- gesimal o qual, supõe-se, tenha dado origem à divisão das horas em 60 minutos e cada minuto em 60 segundos, bem como a divisão do círculo em 360 graus. Esse sistema era posicional, mas eles não possuíam nenhum símbolo especial para indicar a ausência de um número em determinada posição, ou seja, não existia nada parecido com o “0”. Esta base e a notação posicional eram também utilizadas para representar fra- ções, entretanto, a base 60 – embora de maior predominância e de uso consistente O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 35 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . em textos de matemática e astronomia – não era absoluta, aparecendo também sistemas numéricos envolvendo múltiplos e submúltiplos de 60, 24, 12, 10, 6 e 2, para área, medidas de peso, datas e cunhagem de moedas, da mesma forma que atualmente se usa 12 para horas e polegadas e 10 para a contagem usual. O sistema de numeração de base 10 da Babilônia era aditivo e tinha símbo- los especiais para o Um, o Dez, o Cem, o Mil e o Dez Mil. O de base sessenta, que predominava nos textos matemáticos, possuía apenas dois símbolos que eram representados em pedaços de argila ainda mole. O aspecto era seme- lhante às cunhas, daí o nome de escrita cuneiforme para essa escrita. A unidade era representada por um símbolo mais fino, na posição vertical, que era repe- tido para números até nove. Outro símbolo, mais largo e na posição horizontal, representava o valor dez e era repetido e usado junto com o símbolo da uni- dade, conforme fosse necessário, para representar os números de 11 até 59. De 60 em diante, era utilizado o princípio da posição para indicar potências de 60: na segunda posição, o símbolo deixava de valer um pra valer 60, na terceira posição valia 60 vezes 60, e assim por diante. Assim, a partir de 60, o sistema se tornava complexo e utilizavam o princípio da posição para indicar múltiplos de potências de 60, como 600, 3 600 e 36 000. Figura 3: Símbolos numéricos babilônicos Fonte: Pimentel e Andrade (2010) A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E36 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. Em algumas tábuas, surgem números por justaposição aditiva e por subtração com o auxílio da expressão “lal”, que significava “menos” para valores simbóli- cos, como o setenta e nove, que é escrito como sessenta mais vinte menos um, o trinta e sete como quarenta menos três etc. O sistema de numeração da Babilônia, encontrado em escavações arqueo- lógicas na Mesopotâmia, foi criado há aproximadamente 4 mil anos. Entre 1600 e 1800 a.C., nenhum símbolo para o zero era utilizado, apenas um espaço em branco era deixado para qualquer potência de 60 e o valor do número só ficava claro de acordo com o contexto, causando muita confusão. Nos últimos três séculos a.C., os escritos cuneiformes encontrados indicam que os babilônios passaram a utilizar o símbolo para indicar a posição vazia, criando o zero de seu sistema de numeração. Aos babilônios se deve a invenção do sistema posicional. Com apenas símbolos para unidades e dezenas, podiam representar qualquer número por repetição e mudançade posição, independente da grandeza deste número. É essa mudança de valor de um símbolo, quando muda sua posição, que caracte- riza um sistema posicional. A civilização mesopotâmica conhecia – e utilizava com precisão – as quatro operações aritméticas fundamentais e criou tábuas expressando multiplicações (precursoras das “tabuadas”), além de listas de recíprocos, quadrados, raízes quadradas, cubos e raízes cúbicas. Para Aaboe (1984), uma enorme desvantagem de uma base grande, como 60, é o tamanho desconfortável de uma tábua (tabela) de multiplicação que mos- tra o produto de dois números quaisquer de um algarismo. Treme-se ao imaginar os pobres alunos babilônios tentando memori- zar uma tal tábua de dimensões 59 por 59, e sentimos alívio de saber que havia grande quantidade de tábuas de vários tipos, incluindo as de multiplicação; de maneira que se torna clara que uma tal memorização era desnecessária (AABOE, 1984, p.28). No mesmo período em que os egípcios apresentavam alguns esboços de equações lineares, os babilônios já trabalhavam com equações do 2º grau utilizando para a sua resolução um método fundado no “complemento do quadrado”, o mesmo raciocínio empregado por Bhaskara quase três milênios depois e, embora os Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 37 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . resultados fossem corretos, a exemplo dos papiros egípcios, os tabletes que tra- tam de “soluções de equações do 2º grau apresentam apenas sequências do tipo ‘faça isto’, ‘faça aquilo’, ‘este é o resultado’, sem qualquer justificativa lógica sobre o caminho seguido” (GARBI, 1997, p.13). É preciso destacar que, a exemplo também de Bhaskara, os mesopotâmicos negligenciavam as raízes negativas das equações quadradas porque não conhe- ciam os números negativos. Existem registros de que os babilônios conheciam as triplas pitagóricas e um pouco de teoria dos números, além de poderem ser considerados os precursores na utilização de uma designação especial para as incógnitas, que não eram repre- sentadas por letras, pois o alfabeto ainda não era conhecido, mas pelas palavras comprimento, largura, área e volume, não porque as incógnitas representassem estas medidas geométricas, mas em sentido realmente abstrato, visto que eles operavam com estas palavras, ou seja, não hesitavam “em somar um ‘compri- mento’ com uma ‘área’, ou uma ‘área’ com um ‘volume’. Tais problemas tomados literalmente, não podiam ter base em mensuração”, fazendo crer que pelo fato de muitos problemas algébricos derivarem de problemas geométricos, a utiliza- ção da terminologia geométrica se tornasse padrão (BOYER, 1974, p.23). Devido a esse uso especial de termos para as incógnitas, a solução de deter- minados tipos de equações, especialmente as quadráticas, envolvendo uma ou mais incógnitas e, particularmente, devido ao fato de apresentarem um leve e parcial envolvimento com a abstração matemática mediante o reconhecimento de que alguns procedimentos eram típicos de certa classe de equações, pode-se dizer que a matemática dos sumérios constituiu o começo do estudo da Álgebra. Entretanto, a exemplo dos egípcios, não há o menor vestígio de que empregas- sem demonstrações matemáticas, com os processos algébricos e aritméticos (assim como as regras da Geometria) resultando de observações físicas bastante acuradas, e de tentativas e erros decorrentes da preocupação principal que era o como fazer. Quanto à Geometria, alguns autores estabelecem que se a Matemática da Mesopotâmia superou a dos egípcios na Aritmética e na Álgebra, o mesmo não aconteceu em relação à Geometria devido ao fato de que esta última era tratada como um assunto à parte da Matemática, isto é, não como uma disciplina ou O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E38 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. tópico integrante do corpo de conhecimento matemático, mas como uma espécie de Álgebra ou Aritmética aplicada que relacionava números e figuras. Todavia, o principal argumento utilizado para confirmar tal assertiva se prende, “[...] em geral, à medida do círculo ou ao volume do tronco de pirâmide”, uma vez que os babilônios determinavam a área do círculo “[...] tomando três vezes o quadrado do raio e, em precisão isso é bem inferior à medida egípcia”, que apresentava uma melhor aproximação para o valor de π (BOYER, 1974, p.28). Descobertas mais recentes, como o conjunto de tabletes matemáticos desen- terrado em Susa (cerca de 300 quilômetros da Babilônia) dão conta, todavia, de resultados geométricos mais significativos, como o estabelecimento das razões entre as áreas e os quadrados dos lados dos polígonos regulares de três até sete lados, expressas em uma tabela, tão ao gosto mesopotâmico. Nessa mesma tabela, a razão entre o perímetro do hexágono regular e a circunferência do círculo ins- crito é 0,5736, donde se conclui que o valor estimado para π foi de 31/8, que não difere em muito do adotado pelos egípcios. Quanto ao teorema de Pitágoras, ele não aparece de forma explícita ou mesmo implícita em nenhum documento egípcio encontrado, ao contrário do que acon- tece na Babilônia, onde tabletes dos mais antigos (referentes ao primeiro período) mostram que ele era largamente usado, possibilitando inclusive aos sumérios a expressão de um valor aproximado em cerca de um milionésimo para a raiz qua- drada de 2, embora, em cálculos mais gerais, eles utilizassem o valor 1,25 como uma estimativa mais grosseira. Além disso, o “[...] conhecimento babilônio do teorema de Pitágoras não se limitava ao caso do triângulo retângulo isósceles” (BOYER, 1974, p.29). Outro ponto importante a ser mencionado é que, a exemplo do teorema de Pitágoras, os babilônios também “[...] conheciam o fato que o ângulo inscrito num semicírculo é reto, proposição geralmente conhecida como teorema de Tales, apesar de Tales ter vivido bem mais de um milênio depois dos babilônios terem começado a usá-la” (BOYER, 1974, p.30). É interessante notar que dois importantes resultados da Matemática da Babilônia foram “apropriados” pelos gregos e as razões para isso não são conhe- cidas, o que demonstra a dificuldade de se avaliar a influência do conhecimento dos mesopotâmicos em culturas posteriores. Também não se tem notícia de Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 39 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . que os textos cuneiformes fossem lidos pelas civilizações próximas, os gregos, em particular. Todavia, pela sua localização, é plausível supor que hindus e gre- gos possam ter adquirido conhecimentos por meio das caravanas que passavam pela Babilônia e, embora ela não fosse um centro político importante, continuou durante muitos séculos como o “[...] centro da cultura de um grande império, onde os Babilônios se misturaram com os Persas, Gregos, Judeus, Hindus e mui- tos outros povos” (STRUICK, 1992, p.62). Ainda segundo Struick (1992), é possível perceber nos textos cuneiformes uma tradição que parece apontar para um desenvolvimento local contínuo, que foi sem dúvida estimulado pelo contato com outras civilizações na mesma medida em que as influenciava, como atesta a forte presença da Astronomia babilônica na Astronomia grega ou como o cálculo aritmético, de maneira geral, foi influen- ciado pela Matemática da Mesopotâmia. É ainda “[...] razoável suporque, por intermédio das escolas babilônicas de escribas, as ciências grega e hindu tenham se encontrado” (STRUICK, 1992, p.63). O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E40 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. OS CHINESES Seguindo o mesmo padrão das civilizações estudadas anteriormente, a chinesa também se localiza entre rios, no caso os rios Huang-Ho ou rio Amarelo e o Yang Tsé. Cercada pelo Pacífico, o maior dos oceanos, de um lado e por um imenso deserto do outro, a China sempre esteve isolada, o que explica a imutabilidade e estagnação dos seus conhecimentos, bem como a tradição arraigada e que só recentemente vem recebendo influências externas. Assim, a matemática chinesa goza de um estatuto excepcional, pois pela sua tradição – praticamente intacta até tempos recentes – permite analisar melhor a sua influência do que em rela- ção às do Egito e da Babilônia. Numa tal atmosfera cultural estagnada, as novas descobertas torna- vam-se exceções, o que garantia mais uma vez a invariabilidade da tradição matemática. Tal tradição podia ser transmitida através de mi- lênios, sendo somente abalada ocasionalmente por grandes catástrofes históricas (STRUICK, 1992, p.67). Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 41 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . A civilização chinesa começa, então, às margens do Huang-Ho e do Yang Tsé, a exemplo dos egípcios e babilônios, lutando contra secas e enchentes; drenando pântanos, canalizando a água em canais e “construindo dia a dia, durante sécu- los, cabanas e casas, templos e escolas, aldeias, cidades e Estados” (DURANT, 1957, v.III, p.91). A origem deste povo é desconhecida, assim como também não se sabe ao certo quando sua civilização teve início, porém, pesquisas indicam que há 20 mil anos a.C., a Mongólia era densamente povoada por uma raça cujos utensílios encontram correspondentes entre os do mesolítico europeu e cujos descentes povoaram a Sibéria e China ao migrarem para estas regiões quando o sul da Mongólia secou e se transformou no deserto de Gobi. Outras descobertas arqueológicas, particularmente no sul da Manchúria, indicam a presença de sociedades neolíticas, com uma anterioridade de dois mil anos em relação ao mesmo período na Suméria e no Egito. Entretanto, apesar de seu isolamento e longevidade, não é possível estabele- cer uma homogeneidade absoluta tanto do povo como da cultura chinesa, uma vez que nas artes e nas indústrias primitivas é possível detectar traços da cul- tura da Mesopotâmia e, ainda mais, a cerâmica neolítica da região dos vales do Huang-Ho e Yang Tsé é quase idêntica à encontrada em Susa. Além disso, o atual tipo predominantemente “mongólico” do povo é uma mistura bastante com- plexa de elementos primitivos com povos invasores ou migrados da Mongólia, da antiga Rússia e da Ásia Central. Como já foi comentado anteriormente, foi fácil diferenciar a arte, a escrita e a Matemática dos egípcios, babilônios, chineses e hindus, pois as aldeias eram tradicionalistas e, de maneira geral, isoladas. Todavia, no que concerne particu- larmente à Matemática, embora os simbolismos utilizados fossem específicos de cada sociedade, as características gerais do conhecimento matemático eram idênticas e o que é surpreendente e sugestivo, do ponto de vista da constru- ção do conhecimento matemático é que, mesmo tendo seu desenvolvimento ocorrido de forma separada, tanto física como cronologicamente, esta iden- tificação permaneceu. É difícil precisar cronologicamente as descobertas no vale dos rios Huang-Ho e Yang Tsé, não apenas em função do caráter estático da estrutura social que, tal O Oriente Antigo: os Egípcios, os Babilônios, os Chineses e os Hindus e o Sistema de Numeração Decimal A MATEMÁTICA DAS ANTIGAS CIVILIZAÇÕES Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E42 Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. qual aconteceu com os egípcios e mesopotâmicos, resguardou por séculos ou milênios o conhecimento científico e cultural da época, como particularmente e, neste ponto, existe uma diferença enorme em relação ao Egito e Babilônia, em função do material utilizado para os registros. Enquanto os mesopotâmicos usa- vam placas de barro cozido, que são praticamente indestrutíveis, e os egípcios usavam o papiro que se conservou graças ao clima seco, os chineses (assim como os hindus) utilizavam cascas de árvore e bambu, materiais de fácil deterioração. De acordo com Struick (1992), os chineses começam a utilizar o papel em torno do século I a.C., porém poucos escritos anteriores a 700 a.C. foram conser- vados. Finalmente, e talvez seja essa a principal razão para a falta de informação acerca da China antiga, grande parte dos registros de caráter técnico foi destru- ída por mudanças dinásticas, guerras ou inundações. Conta-se que em 221 a.C., a China foi unificada por um déspota, conhecido por Shi Huang-ti, que ordenou a destruição de todo material destinado a estu- dos, todavia, como era costume que os estudiosos citassem de memória livros inteiros, muitos livros foram reescritos de memória muito tempo depois, o que dificulta a determinação das datas dos escritos descobertos, além do fato de que, por serem conhecidos de memória, os conhecimentos também foram transmitidos oralmente, de geração para geração, por milênios, podendo ter sido registrados em tempos bastante distintos dos que foram produzidos. Os principais textos acerca da antiga matemática chinesa são os Chiu chang suan shu, ou Nove Capítulos da Arte Matemática e o Chou Pei Suang Ching, que datam, na sua forma atual, da época da dinastia Han (206 a.C. – 220 d.C.), mas, pelas razões anteriormente expostas, devem conter material bem mais antigo. Os Nove Capítulos são inteiramente dedicados à matemática chinesa e tra- tam de cálculo aritmético, raiz cúbica, sistemas de equações utilizando matrizes e números negativos, que aparecem pela primeira vez na história apresen- tando, enfim, as características gerais da Matemática chinesa que perduraram por milhares de anos. A exemplo dos escritos matemáticos do Egito e da Babilônia, a Matemática dos Nove Capítulos é apresentada mediante problemas, com as regras gerais para a sua solução. Estas soluções apresentam características de cálculo aritmético e levam a equações algébricas com coeficientes numéricos, das quais se obtinham Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 43 Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . raízes quadradas e cúbicas. As equações lineares são resolvidas mediante o recurso da falsa posição e alguns problemas conduzem a sistemas de equações lineares escritos na forma de matriz de coeficientes com a solução encontrada por um processo semelhante ao de transformações de matrizes. São nessas matrizes que aparecem, pela primeira vez, números negativos. A ideia de números negativos parece não ter causado muitas dificulda- des aos chineses, pois estavam acostumados a calcular com duas cole- ções de barras – uma vermelha para os coeficientes positivos ou núme- ros e uma preta para os negativos. No entanto, não aceitavam a ideia de um número negativo poder ser solução de uma equação (BOYER, 1974, p.147). O número π, parâmetro utilizado por muitos autores para avaliar
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