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AULA V O Direito e a Filosofia na Idade Media

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Filosofia do Direito – Período Medieval
O traço fundamental da estrutura social do período medieval é o feudalismo (embasado numa	noção absolutista de poder). Isto é, as relações de
poder determinadas
são com
base na relação entre senhores feudais (suseranos) e servos.
Filosofia do Direito – Período Medieval
No que concerne à história da filosofia do Direito, é importante destacar que, nesse período, o Direito é entendido como uma espécie de dádiva divina. Ou seja, algo criado por Deus que deve ser
reconhecido pelo homem. Assim, embora o Direito continue não possuindo autonomia (pois ele é considerado algo dependente da igreja e da teologia), a fundamentação da lei com base no cosmos dá lugar para a fundamentação da lei com base na vontade de Deus.
SOCIEDADE TEOCENTRICA.
PRINCIPAIS	FILÓSOFOS	DO
PERÍODO MEDIEVAL: SANTO AGOSTINHO
SOCIEDADE TEOCENTRICA.
DESAFIO Imagine a seguinte situação:
A partir dessa situação, explique para o seu tio o que significa dizer que Santo Agostinho "cristianizou" a teoria das ideias de Platão.
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Objetivos de aprendizagem
Explicar o que foi a escolástica.
Descrever a importância de Santo Agostinho para a filosofia e para o Direito.
Demonstrar a importância de São Tomás de Aquino para a filosofia e para o Direito.
Filosofia do Direito – Período Medieval
Filosofia do Direito – Período Medieval
Marcado pela ascensão da religião católica e dos dogmas do cristianismo na Europa. 
Nesse contexto, o ponto de partida da reflexão filosófica do período é dado pelas palavras bíblicas. 
Adoção de uma visão de mundo fundada na fé, intensifica-se o debate acerca da relação entre a fé e a razão. 
Tal período é geralmente distinguido em duas fases, a patrística e a escolástica. O principal nome da fase patrística foi Santo Agostinho. Já no período escolástico, o principal nome foi São Tomás de Aquino.
Filosofia do Direito – Período Medieval
Por que o período é conhecido como idade das trevas
 ou noite de mil anos?
A filosofia Medieval se divide em: patrística e escolástica. 
Patrística do séc. V ao séc. VIII
Escolástica do séc. IX ao séc. XV. 
Qual a diferença entre elas? Diferença na compreensão sobre o papel da razão na justificação e explicação das questões ligadas a fé. 
Ambas afirmam que a razão está de algum modo está subordinada à fé. 
- Patrística: a fé não demanda justificações ou explicações por parte da razão; 
- Escolástica: busca argumentos e provas para embasar os dogmas advindos da fé.
Sobre a existência de Deus. No caso da patrística, a existência de Deus era dada pela fé e a questão da necessidade de prová-la racionalmente seria algo fútil e irrelevante. Já no caso da escolástica, mesmo que a existência de Deus também fosse algo assegurado pela fé, surgiu uma vontade de encontrar argumentos e razões capazes de prová-la.
A Patrística surgiu com qual finalidade? 
Período marcado tanto pelo estabelecimento quanto pela defesa da tradição católica. 
O Cristianismo passou de uma religião marginalizada e perseguida para a religião oficial do Estado
Qual a maior diferença entre a cultura, a visão de mundo greco-romana e a cristã? O que se usa para fundamentá-la? 
- A visão de mundo deixada pelos gregos é racional e pressupõe uma espécie de preponderância da razão sobre a fé. 
- A visão cristã pressupõem uma preponderância da fé sobre a razão. 
Como misturar filosofia e religião? Como explicar os dogmas a partir da fé e não da razão em um mundo embasado no raciocínio, no pensar, no agir a partir da razão? 
Há um grande esforço por parte dos padres da fase patrística para, de um lado, elucidar os dogmas do cristianismo e a fé católica, e para, de outro lado, defendê-los dos diversos ataques dos descrentes — chamados pelos próprios padres de hereges e pagãos. 
A estratégia foi desenvolver um elo de ligação entre os pressupostos do cristianismo e a visão de mundo herdada dos gregos. 
A filosofia antiga havia fracassado na sua busca pela verdade por ignorar completamente a fé em nome da razão. A verdade que os gregos buscavam era encontrada justamente pela fé nas revelações bíblicas.
O principal tema abordado na patrística foi a relação entre fé e razão. 
Qual é o papel da fé e da razão no que diz respeito a verdade? 
Fé e razão são conciliáveis? 
O que é justo? Em que se embasa a justiça? 
Tendo em vista a preponderância da fé, formaram-se basicamente três posições:
A verdade vem exclusivamente da fé;
Fé e a razão se tratavam de categorias distintas e irreconciliáveis de verdades, isto é, que existiam verdades que vinham da fé e verdades que vinham da razão;
Embora as verdades venham da fé, a razão tem função de elucidar as mesmas.
A ESCOLÁTICA
O termo escolástica vem do termo latino scholasticus, que significa “instruído” ou “aquele que pertence à escola”. 
Trata-se de um período de profundo desenvolvimento dos debates ligados à fé e à razão, da relação entre Deus e o homem, o corpo e a alma. 
Outro ponto marcante da escolástica diz respeito à estruturação e difusão do ensino com base nas chamadas artes liberais — o trivium, composto pelas disciplinas de gramática, lógica e retórica, e o quadrivum, composto por aritmética, geometria, astronomia e música. 
Nesse período surgem as primeiras universidades europeias, com cursos como teologia, medicina e Direito.
Filosofia do Direito na Idade Média e escolástica
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O ressurgimento do Aristotelismo no ocidente. 
Atribui-se a São Tomás de Aquino, principal nome da escolástica, o mérito não apenas por traduzir os escritos aristotélicos do grego antigo para o latim como, também, por ter sido o grande responsável pela cristianização das ideias aristotélicas.
O método de investigação empregado pelos escolásticos. Com relação a isso,
é possível dizer que eles se valiam, de um lado, do raciocínio dialético e, de
outro lado, de argumentos de autoridade. Isto é, dado um assunto qualquer, eles formulavam a questão com base na ideia de tese e antítese, e valiam-se de autoridades renomadas para fundamentar ambas. Assim, por exemplo, fulano apresentava uma questão x para debate e alegava que o cânone A defendia tal e tal posição; o seu opositor tentava refutá-lo com base em um cânone B. O debate seguia até que se chegasse a novas conclusões sobre a questão debatida.
Filosofia do Direito na Idade Média e escolástica
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Santo Agostinho
Agostinho de Hipona (354 d.C.–430 d.C.), mais conhecido pela alcunha de Santo Agostinho (Figura 1), nascido em Tagate, uma província romana na África, é considerado o filósofo mais relevante da patrística. 
O valor das suas ideias é inestimável não apenas para a teologia cristã, como também para a filosofia ocidental como um todo. 
As suas obras mais importantes são Confissões e Cidade de Deus, cujas ideias seguem sendo estudadas até hoje.
Filosofia do Direito na Idade Média e escolástica
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De que forma Agostinho cristianizou Platão? 
- Viu na teoria das ideias de Platão um caminho para explicar aquilo que entendia ser a revelação da verdade pela fé nas palavras da Bíblia. Lembre-se de que a teoria das ideias de Platão veio para responder a questão sobre a possibilidade do conhecimento da verdade. Na base da teoria, está a distinção entre aquilo que ele chama de mundo sensível e mundo das ideias. Enquanto o mundo das ideias consiste nas formas perfeitas, eternas e imutáveis das coisas, o mundo sensível não passa de mera aparência imperfeita do mundo das ideias. Com efeito, o conhecimento das coisas não estaria nelas mesmas, mas no seu correspondente no reino superior das ideias. 
Filosofia do Direito na Idade Média e escolástica
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Qual foi a estratégias de Agostinho? 
Substituir o que Platão chama de mundo das ideias por Deus. 
Dessa forma:A verdade não estaria nas aparências do nosso mundo físico, mas em Deus.
 
Deus é perfeito, eterno e imutável. 
 Deus é a causa de toda a existência. 
Mas se Deus é a causa perfeita de tudo, como explicar a existência do mal que é uma 
imperfeição ?
Filosofia do Direito na Idade Média e escolástica
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Como é a Filosofia do Direito em Agostinho?
A explicação agostiniana passa pela ideia de que a justiça está em Deus. 
Os homens não são justos pelos seus atos, mas por uma espécie de graça divina conferida pela fé. Agostinho teoriza que: 
"o justo vive da fé, porque, como ainda não vemos nosso bem, é preciso que o busquemos pela fé. O próprio bem-viver não o obtemos com nossas próprias forças, se quem nos deu a fé, que nos leva a crer em nossa debilidade, não nos auxilia a crer em nossa debilidade, não nos auxilia a crer e a suplicar. Com estranha vaidade, fizeram a felicidade depender de si mesmos aqueles que julgaram encontrar-se nesta vida o fim dos bens e dos males e, assim, radicaram o soberano bem no corpo ou na alma, ou nos dois juntos (SANTO AGOSTINHO, 2015, p. 285).
Filosofia do Direito na Idade Média e escolástica
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Como é a Filosofia do Direito em Agostinho?
“Ignorava a verdadeira justiça interior, que não julga pelo costume, mas pela lei retíssima de Deus Onipotente. Segundo ela formam-se os costumes das nações e dos tempos, consoante as nações e os tempos, permanecendo ela sempre a mesma em toda parte, sem se distinguir na essência ou nas modalidades, em qualquer lugar. A face desta lei foram justos Abraão, Isaac, Jacó, Moisés, Davi e todos os que Deus louvou por sua própria boca” (Confissões p. 67)
Filosofia do Direito na Idade Média e escolástica
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Como é a Filosofia do Direito em Agostinho?
“Se é lícito ao rei da cidade a que preside dar uma ordem que antes dele jamais alguém, nem sequer ele mesmo, prescreveu, e se o obedecer-lhe não vai contra os princípios sociais da cidade, antes é contrário a eles o desobedecer-lhe — pois a obediência aos reis é um pacto geral da sociedade humana —com quanto maior razão se deve obedecer, sem hesitações, às ordens de Deus rei efetivo de toda a criação ? De fato, assim como, nos poderes que existem na sociedade humana, o maior se impõe ao menor, para que este lhe preste obediência, assim Deus domina a todos. (Confissões p. 69)
Diferentemente dos antigos, que entendiam que a justiça estava nas ações e a felicidade consistia em uma atividade racional conforme a virtude, para Agostinho, a questão passa por Deus e pela fé. 
O que é justo deixa de se fundamentar na razão; 
O justo se fundamente da fé, gerida e controlada pela Igreja. 
A lei emanada de Deus é imutável. 
Porventura a justiça é desigual e mutável? Não. Os tempos a que ela preside é que não correm a par, pois são tempos. [...] Não reparava que a justiça, a que os homens retos e santos se sujeitam, formava nos seus preceitos um todo muito mais belo e sublime. Não varia na sua parte essencial, nem distribui e determina, para as diversas épocas, tudo simultaneamente, mas o que é próprio de cada uma delas (SANTO AGOSTINHO, 2015, p. 285).
Nesse caso, torna-se possível compreender a ideia de que todas as leis que não estão em conformidade com as escrituras sagradas são fruto da imperfei- ção humana, que, no limite, remonta ao pecado original que tirou o homem do reino dos céus. E mais: há uma clara distinção entre lei dos homens (lex temporalem) e lei divina (lex aeterna).
Perceba que, quanto a isso, embora haja alguma similaridade com a distinção grega entre justo natural e justo legal, enquanto a distinção grega nos leva a crer que a justiça está na ação realizada no mundo, a distinção agostiniana coloca a justiça em um plano transcendental além do alcance da ação racio-
nal. A propósito da noção de Direito natural agostiniana, Alysson Mascaro, afirma que “o Direito natural — se é que assim se pode chamá-lo na visão
agostiniana — é um rol de regras inflexíveis, não naturais no sentido de que
não se veem na natureza nem na sociedade, mas que são oriundas do desígnio divino” (MASCARO, 2016, p. 100).
Ora, mas se isso é assim, dado que não dispomos das leis divinas para organizar a sociedade, tampouco podemos viver em sociedade sem leis, surge a necessidade de que leis humanas sejam instituídas. Além do mais, para que
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tais leis possam ser efetivamente chamadas de Direito, devem estar de algum modo subordinadas à lei eterna. Quanto a isso, nas palavras de Eduardo Bittar:
[...] apesar de imperfeitas, as leis humanas são a garantia da ordem social, e, para serem chamadas em seu conjunto de Direito, devem estar minimamente aproximadas da justiça. A justiça, na teoria agostiniana, figura como ratio essendi do Direito; é aqueça essentia para este, pois o Direito, sem a justiça, consistiria em mera instituição transitória humana, iníqua e sem sentido (BITTAR; ALMEIDA, 2015, p. 254).
Assim, embora essa linha de argumentação não abra espaço para que as leis humanas possam vir a ser efetivamente justas, ela nos induz a crer que, quanto mais próximas da justiça divina e das revelações da fé, melhores elas serão. Em última análise, o fundamento de validade do Direito Positivo repousaria na lei eterna.
Embora a posição agostiniana esteja sujeita a inúmeras críticas, perceba que isso não significa que é incompreensível ou deselegante. Aliás, justo em função da sua coerência e capacidade explicativa ela constituiu as bases daquilo que podemos chamar de filosofia cristã. Tais bases se tornaram um dogma
absoluto que reinou sem maiores problemas até a redescoberta da Europa ocidental dos textos aristotélicos, via mundo árabe-judaico, depois do séc. VIII.
Embasados nos textos aristotélicos, os árabes foram capazes de desenvolver uma filosofia muito mais racional e sofisticada. Isso constituiu um grande problema para a tradição católica da época, pois, incapazes de compatibilizar
os seus dogmas com as bases do aristotelismo, restou-lhes um infrutífero,
ingrato e insustentável esforço de persegui-lo e condená-lo ao descrédito. Até que tudo mudou quando São Tomás de Aquino surgiu na história.
São Tomás de Aquino
Tomás de Aquino (1225 d.C.–1274 d.C.), nascido em Roccassecca, no Reino da Sicília, é o maior representante da escolástica. A grandeza da sua filosofia con- sistiu, entre outras coisas, no esforço de compatibilizar as bases do cristianismo com as obras de proporção enciclopédica de Aristóteles. Para tal, inclusive foi o responsável pela tradução dos textos aristotélicos do grego antigo para o latim. Como resultado desse esforço, resultou, ainda que inacabada, a sua obra mais importante: Suma teológica. Em função dela, atribui-se comumente a São Tomás de Aquino (Figura 2) a responsabilidade por ter cristianizado as ideias de Aristóteles.
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Na base da ideia de Tomás de Aquino está uma espécie de amenização da radical dicotomia agostiniana entre fé e razão, pois, se para o agostinianismo a fé era o único caminho para a salvação posterior, para o tomismo a razão não deixa de ter um papel importante para a salvação ainda nessa vida.
A relação entre a fé e a razão foi um dos grandes problemas que Tomás de Aquino se propôs a responder. Em função da visão agostiniana, a razão não cumpre qualquer papel na busca pela justiça e, na medida em que o reino dos homens é essencialmente imperfeito e pecaminoso, apenas a fé pode salvar o homem, mesmo que não em vida, e fazê-lo adentrar no reino dos céus.
Figura 2. São Tomás de Aquino.
Fonte: Instituto São Tomás de Aquino (2017).
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A estratégia de São Tomás consiste, de um lado, em distinguir “verdades da fé” de “verdades da razão”, e, de outro lado, em afirmar que ambas vêm de Deus. Com relação à distinção,enquanto o conhecimento da fé vem da palavra revelada, o conhecimento da razão diz respeito à natureza. Além disso, embora tratem-se de ordens distintas de verdade, na medida em que vêm de Deus, não podem estar em descompasso ou em contradição. Em função disso, diferentemente do desprezo agostiniano pela razão em nome da fé, São Tomás entende que a razão cumpre um papel destacado não apenas na busca das verdades que lhe são peculiares, mas também como um instrumento harmo- nizador de tais verdades com as verdades da fé. E, se em algum momento as verdades da fé entrarem em conflito com as verdades da razão, isso se deve fundamentalmente ao mau uso da razão.
No que concerne à filosofia do Direito, em função da introdução da rele- vância do racional no contexto da filosofia cristã, torna-se possível reformular
a ideia agostiniana de lei do homem e lei divina. Se Agostinho considerava
que a lei divina era a única que poderia ser justa — e a lei dos homens aca- bava por ser considerada essencialmente injusta — São Tomás entendia que a lei dos homens poderia ser justa. Para isso, ele introduziu a noção de lei da natureza como uma espécie de termo médio entre a lei divina e a lei do homem. Nesse contexto, Alysson Mascaro afirma que “além dos mandamentos divinos obtidos por meio da revelação e da fé, há um espaço das leis naturais, que são divinas porque a natureza é criação de Deus, mas são passíveis do conhecimento humano” (MASCARO, 2016, p. 105). Assim, dado que as leis naturais também são ditas justas (em função de sua origem divina) e a razão é o instrumento utilizado para descobri-las, as ações e as leis humanas que estão em conformidade com a natureza também serão justas.
Outro aspecto interessante da concepção tomista da lei humana diz respeito à necessidade de que esteja vinculada ao bem comum. Isto é, na medida em que
a lei humana está indissociavelmente ligada com a razão, se uma lei não visa ao bem comum, ela simplesmente não pode ser considerada uma lei. Nessa mesma linha, Alysson Mascaro afirma que, para São Tomás de Aquino, “somente é considerada lei aquela ordenação que visa ao bem comum” (MASCARO, 2016,
p. 105) e Paulo Nader diz que “a lei humana (...) teria natureza de lei apenas quando se conformasse à reta razão e, quando se afastasse, lei não seria, mas
violência” (NADER, 20004, p. 166). Assim, no limite, é possível compreender
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que o fundamento de validade das leis humanas não está especificamente no poder estatal de editá-las, mas na sua conformidade com a reta razão, que tente para o bem comum.
Disso tudo resulta a ideia de que a distinção agostiniana entre lei dos homens e lei divina é substituída pela distinção tríplice entre lei divina, lei da natureza e lei dos homens. Tanto a lei divina quanto a lei da natureza são criadas por Deus. Porém, enquanto a primeira está fundamentalmente ligada à dádiva divina e é uma questão de fé na palavra revelada, a segunda está intimamente ligada à razão, pois é em função dela que o homem é capaz de descobrir quais são as leis da natureza. Por fim, graças à relação entre tal tipo de lei e as leis humanas, e ao papel destacado da razão, torna-se possível superar a ideia agostiniana de que as leis humanas são essencialmente injustas, abrindo caminho para a ideia de que as leis humanas podem ser justas.
Um último ponto importante acerca da visão tomista do Direito consiste na sua reafirmação das doutrinas aristotélicas acerca da justiça. Quanto a isso, tanto Paulo Nader quanto Alysson Mascaro consideram que concepção de São Tomás segue de perto as lições de Aristóteles no livro V da Ética a Nicômaco. Paulo Nader, em Filosofia do Direito, afirma que “Foi pequena a contribuição de Tomás de Aquino à teoria da justiça, pois acompanhou quase integralmente a doutrina aristotélica, não superada até hoje” (NADER, 2004,
p. 167). Na mesma linha, Alysson Mascaro, em Filosofia do Direito, diz que, a proposto da questão da justiça, “Tomás de Aquino segue em linhas gerais, (...), o pensamento de Aristóteles na Ética a Nicômaco. A justiça é por ele considerada o bem do outro, e sua manifestação específica é distributiva e retributiva” (MASCARO, 2016, p. 108).
A solução agostiniana para essa questão consiste na ideia de que o mal nunca foi criado efetivamente, tampouco que ele existe em si mesmo. Segundo Agostinho, a criação divina não pode ter os mesmos atributos do criador, sob pena de restarem ambos indiscerníveis. Porém, se esse fosse o caso, então estaria violada a ideia de que Deus é um só. Assim, tudo aquilo que Deus cria possui não apenas certo grau de autonomia ante o criador, mas também é essencialmente imperfeito, falho e limitado. Com efeito, nessa visão, o mal não é especificamente um “algo”, pois, em verdade, trata-se da mera ausência de bondade plena. É aquilo que a criatura não tem e que faz com que ela não seja plenamente boa, tal qual a divindade. Além disso, não é que Deus atribua a sua criação à possibilidade de escolher entre a bondade e a maldade, mas que a própria escolha da maldade se deve ao grau de imperfeição dos homens na escala hierárquica dos seres.

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