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Prévia do material em texto

1
Organização
Mário Ribeiro dos Santos
S237a Santos, Mário Ribeiro dos
 
Acorda Povo e Bandeiras dos Santos Juninos: Pesquisa sobre 
o patrimônio cultural imaterial de Pernambuco/ Mário 
Ribeiro dos Santos. Recife: Edupe, 2020.
 
88 p.: il.;18 cm
 
ISBN 978-65-86413-01-4
1. Acorda Povo. 2.Bandeiras dos Santos Juninos. 3. Festas 
Juninas. 4. Catolicismo. 5. Candomblé. Recife, Olinda. I. Título
 
 CDU 398 (81)
Dados Internacionais da Catalogação-na-Publicação (CIP)
Associação Brasileira das Editoras Universitárias (ABEU)
Elaborada pela bibliotecária Neide M. J. Zaninelli - CRB - 9/884
Este livro foi submetido a avaliação do Conselho Editorial da Universidade de Pernambuco. 
UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO – UPE
REITOR Prof. Dr. Pedro Henrique Falcão
VICE-REITORA Profa. Dra. Socorro Cavalcanti
EDITORA UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO – EDUPE
CONSELHO EDITORIAL
Profa. Dra. Adriana de Farias Gehres, Prof. Dr. Amaury de Medeiros, Prof. Dr. Alexandre 
Gusmão, Prof. Dr. Álvaro Vieira de Mello, Profa. Dra. Ana Célia O. dos Santos, Profa. Dra. 
Aronita Rosenblatt, Prof. Dr. Belmiro do Egito e Prof. Dr. Carlos Alberto Domingues do 
Nascimento.
GERENTE CIENTÍFICO Prof. Dr. Karl Schurster
COORDENADOR Prof. Dr. Carlos André Silva de Moura
Abril 2020
Organização
Mário Ribeiro dos Santos
Pesquisa sobre
o Patrimônio Cultural
Imaterial de Pernambuco
Pesquisa sobre
o patrimônio cultural 
imaterial de Pernambuco
FICHA TÉCNICA
COORDENAÇÃO DO PROJETO
Mário Ribeiro dos Santos
PRODUÇÃO
Naara Santos
PESQUISA DE CAMPO E DOCUMENTAL
Alice Alves
Ester Monteiro
Déborah Callender
ASSISTENTE DE PESQUISA
Raquel Araújo
TEXTOS AUTORAIS
Alice Alves
Ester Monteiro
Déborah Callender
Mário Ribeiro dos Santos
FOTOGRAFIA
Paulo Maia
DESIGN 
Isadora Melo
REVISÃO DE TEXTOS 
Vanessa Marinho
AGRADECIMENTOS
Alcidis Campelo Cavalcanti (Cid do Bonde)
Célia Maria do Monte Silva
Clésito José Genésio de Almeida (Kesinho)
Dona Nenzinha
Ladimir Ferreira da Silva
Marcelo Varella
Maria Antonieta Vidal
Maria Cristina de Andrade
Maria da Conceição de Andrade Silva
Maria Helena Sampaio
Mestra Ana Lúcia
Wanessa Paula Conceição Quirino dos Santos
SUMÁRIO
Introdução
Os grupos de Acorda Povo e as Bandeiras dos Santos Juninos
Escritos que transcendem os tempos: os primeiros registros 
das homenagens a São João em Pernambuco 
Nas fronteiras: aproximações e distanciamentos entre os 
Acorda Povo e as Bandeiras dos Santos Juninos
Entre festas e louvações, devoção aos Santos e Orixás – 
a prática religiosa nas Bandeiras dos Santos Juninos e nos 
Acorda Povo de Pernambuco
Os símbolos da festa e as subjetividades do sagrado
Quando a comida é muito mais do que um alimento: 
os sabores e os sentidos do comer no Acorda Povo
A musicalidade da festa que faz o corpo dançar e louvar 
Algumas observações sobre a música nos grupos pesquisados
Considerações Finais
Fontes e Referências
................................................................ 10
........... Mário Ribeiro dos Santos ............................. 16
........... Mário Ribeiro dos Santos ............................. 18
........... Mário Ribeiro dos Santos ............................. 24
........... Ester Monteiro de Souza .............................. 30
........... Déborah Callender..................................... 52
........... Déborah Callender e Mário Ribeiro dos Santos ........... 62
........... Alice Alves ......................................... 66
................................................................ 72
................................................................ 78
................................................................ 80
................................................................ 10
........... Mário Ribeiro dos Santos ............................. 16
........... Mário Ribeiro dos Santos ............................. 18
........... Mário Ribeiro dos Santos ............................. 24
........... Ester Monteiro de Souza .............................. 30
........... Déborah Callender..................................... 52
........... Déborah Callender e Mário Ribeiro dos Santos ........... 62
........... Alice Alves ......................................... 66
................................................................ 72
................................................................ 78
................................................................ 80
10
Introdução
Reconhecer, valorizar e salvaguardar a diversidade do 
nosso patrimônio cultural - em especial as singularidades 
encontradas nas expressões de fé e nos atos festivos do São 
João de Pernambuco - são ações importantes e necessárias para 
manter vivas as nossas tradições, historicamente recriadas e 
transmitidas de geração em geração.
Nas noites de junho do Recife e Região Metropolitana, as 
culturas do Acorda Povo e das Bandeiras dos Santos Juninos 
são testemunhos patrimoniais vivos, gestados por diferentes 
segmentos étnicos que aqui chegaram, foram trazidos ou 
migraram, criando novas maneiras de estar no mundo, novos 
símbolos, novas formas de comer, de cantar, de dançar, de 
rezar, de louvar e de agradecer. Um conjunto de práticas com 
múltiplas cores, texturas, sabores e sons, que flutuam entre o 
presente e o passado, não se resumindo ao tempo em que vivem.
Nesse sentido, este trabalho torna pública uma pesquisa 
realizada durante oito meses com grupos sediados em Olinda 
(Peixinhos, Amaro Branco, Aguazinha, Águas Compridas e 
Santa Casa) e Recife (Água Fria, Areias, Casa Amarela, Santo 
Amaro, Torrões, Várzea e Brasília Teimosa), atribuindo a 
essas localidades referências identitárias que dão sentido de 
existência à vida de seus participantes. 
O contato empírico com os agentes dos bens culturais foi 
importante para nos aproximar das subjetividades, dos ritos, das 
músicas e dos elementos de comunicação barrocamente construídos, 
a exemplo dos andores, das bandeiras, das estrelas, entre 
outros códigos criados, que ultrapassam a dimensão material, 
plástica e sonora das formas de expressão. A presença desses 
símbolos nas madrugadas de junho dá um colorido diferente à 
vida de moradores dos subúrbios das cidades de Olinda e do 
Recife que, acordados, saem em procissão, dançando pelas ruas 
ao som de cantigas e toadas de coco em homenagens a São João 
11
e a Xangô – santo e orixá do fogo, senhores da fartura, donos 
da festa, do vermelho e do branco.
Longe de qualquer pretensão de expressar identidades 
globalizantes entre os grupos investigados, os textos 
apresentados aqui procuram nas particularidades de cada 
grupo de Acorda Povo e das Bandeiras, as redes de práticas e 
significados pelos quais as relações são tecidas, envolvendo, 
logicamente, momentos de tensão e de conflitos. 
Nesse sentido, os textos que seguem - elaborados por 
historiadores, antropólogos e etnomusicólogos - são o resultado 
de um trabalho gestado coletivamente, visando ao adensamento 
teórico-metodológico do tema pesquisado. São autores com 
larga experiência no campo das festas e expressões culturais 
do estado, vinculados a projetos institucionais de pesquisa 
e grupos culturais da região. Esses núcleos de irradiação 
forneceram a base necessária e a garantia para que o resultado 
desse trabalho chegue ao grande público com maior qualidade. 
Considerando as evidências apresentadas, o FUNCULTURA, 
ao publicar este trabalho, agrega valor às pesquisas sobre 
patrimônio cultural imaterial no Brasil, notadamente, aos 
processos criativos de segmentos sociais historicamente 
marginalizados e que encontram na arte meios de resistir, 
reexistir e assegurar a continuidade de suas práticas, seus 
saberes e fazeres. 
Por fim, desejamos que o conjunto de textos e imagens das 
páginas que se seguem possam aguçar a imaginação e os sentidos 
de cada um dos leitores, possibilitando trazer à tona o prazer 
de ouvir os cânticos e as rezas, sentir o cheiro do munguzá 
comcanela e o gosto abrasador do quentão e licor de jenipapo 
que aquecem as noites frias e animadas de junho. 
12
Metodologia
As manifestações culturais do Acorda Povo e das Bandeiras 
dos Santos Juninos são vivenciadas, significativamente, pelos 
moradores dos subúrbios do Recife e Região Metropolitana. 
Historicamente, esse segmento social teve suas histórias 
silenciadas e negadas pelas elites letradas, ocasionando uma 
lacuna considerável nos registros históricos referentes às 
expressões das culturas populares. 
Partindo desse pressuposto, escolhemos adotar uma metodologia 
de trabalho que nos colocasse em contato direto com as 
trajetórias individuais e coletivas dos agentes envolvidos com 
os bens em estudo, no intuito de compreender e interpretar as 
diferentes realidades vivenciadas. 
É importante destacar também que, antes desse trabalho, outros 
escritos (poucos, por sinal) foram produzidos sobre o Acorda Povo 
e sobre as Bandeiras dos Santos Juninos - em geral, escritos por 
folcloristas, os primeiros a se interessarem pelo registro do 
assunto. O nosso objetivo, com este trabalho, é apresentar uma nova 
leitura do tema. Não a mais correta, mas uma forma de analisar o 
assunto de outros ângulos, problematizando questões naturalizadas, 
que foram repetidas ritualisticamente a ponto de inculcar nas 
mentes que as manifestações culturais em foco tinham uma mesma 
origem e um único sentido para todos os agentes envolvidos. 
Dito isto, esta publicação assume, na atualidade, o 
documento que registra a representatividade do Acorda Povo 
e das Bandeiras dos Santos Juninos dentro da amplitude 
que compreende o patrimônio cultural brasileiro. Ela reúne 
documentos que historicizam as ações dos detentores do bem, 
atribuindo consistência e singularidade à pesquisa e maior 
fundamentação teórica ao conteúdo catalogado. 
Nesse sentido, considerando a dinâmica histórico-social 
e a subjetividade da temática, trabalhamos com uma equipe 
13
formada por pesquisadores de diferentes áreas: Ester Monteiro 
(Antropologia), Alice Alves (Etnomusicologia), Déborah 
Callender e Mário Ribeiro (História), além da essencial presença 
da pedagoga e educadora social Raquel Araújo, detentora do 
bem, integrante do Acorda Povo do Bacnaré – Balé de Cultura 
Negra do Recife. O diálogo com a fotografia e a sensibilidade 
das lentes de Paulo Maia foram fundamentais para captar a 
diversidade dos bens analisados, ampliando a interpretação do 
que encontrávamos ao aproximar os diversos olhares dentro e em 
torno do objeto estudado.
Uma vez formada a equipe, procuramos dividir o trabalho nas 
seguintes etapas: 
a) Identificação e mapeamento dos grupos de Acorda Povo 
e Bandeiras de Santos Juninos em atividade na capital e 
região metropolitana, bem como a divulgação da pesquisa aos 
respectivos grupos. Foram entrevistados 11 representantes de 
grupos, encontrados em diferentes localidades do Recife e 
Região Metropolitana: Água Fria, Areias, Dois Unidos, Várzea, 
Chão de Estrelas, Pina e Imbiribeira. Em Olinda: Sapucaia de 
Dentro e Amaro Branco. 
b) Levantamento de jornais, cartazes, fotografias, 
documentários, artigos, material bibliográfico e outras fontes 
disponíveis nos arquivos, bibliotecas, centros de pesquisa e 
redes sociais, no intuito de ampliar a compreensão dos bens, 
as reflexões da equipe e o diálogo com nossos interlocutores 
no momento das entrevistas. Importante registrar que o uso 
de fotografias também auxiliou os pesquisadores durante as 
entrevistas, estimulando a memória narrativa dos interlocutores 
durante o trabalho de campo.
c) Elaboração de um questionário baseado no trabalho publicado 
pelo IPHAN (2016), intitulado Educação Patrimonial: inventários 
participativos - um instrumento de livre acesso, disponível nas 
redes sociais e que possibilita aos usuários o contato com os 
princípios da pesquisa de campo, técnicas básicas de levantamento 
documental, sistematização e interpretação de dados. 
14
d) Realização de entrevistas com os representantes dos grupos 
mapeados e que se disponibilizaram a contribuir com o trabalho. 
Os nomes dos entrevistados foram escolhidos a partir do seu 
envolvimento com a manifestação, o tempo de relação e até mesmo 
o reconhecimento pelos seus pares. O método da história oral 
foi então indispensável, principalmente porque nos possibilitou 
agregar novos significados às formas de expressão em estudo.
e) Delimitação do universo geográfico da pesquisa. Esta etapa 
foi realizada após dois momentos importantes: o levantamento 
preliminar dos grupos de Acorda Povo em atividade no Recife e 
Região Metropolitana e o acesso à programação do Desfile das 
Bandeiras dos Santos Juninos, promovido pela Prefeitura do 
Recife.1
f) Elaboração de um calendário de prioridades para o fotógrafo, 
de acordo com as especificidades das situações apresentadas 
pela equipe, entre as quais destacamos: rezas em louvor a 
Santo Antônio, no início e término da trezena em homenagem 
ao santo; o encontro oficial das Bandeiras dos Santos Juninos 
no Morro da Conceição; os rituais religiosos nos terreiros de 
Candomblé nos dias que antecedem a saída de alguns grupos de 
Acorda Povo; a saída dos grupos nas madrugadas de junho pelas 
ruas e ladeiras da cidade, o hasteamento e recolhimento das 
bandeiras, entre outros momentos registrados em aproximadamente 
2.065 fotografias, algumas delas selecionadas para integrar a 
composição deste trabalho.
g) Sistematização do material coletado e a escrita coletiva 
dos textos pelos pesquisadores, priorizando as afinidades 
temáticas de cada um. Desse modo, Ester Monteiro dedicou-se à 
escrita do capítulo sobre as diferentes formas de religiosidade 
presentes nos grupos pesquisados; Alice Alves debateu sobre 
os aspectos da musicalidade e suas especificidades; Déborah 
Calender e Mário Ribeiro escreveram sobre a historicidade 
dos bens, as continuidades e descontinuidades, os momentos 
de tensão envolvendo a Igreja e o Estado, os diferentes usos 
e sentidos dos símbolos, entre outras reflexões teórico-
metodológicas que atribuem densidade ao trabalho. O formato 
1 
A Secretaria de Cultura do 
Recife, em parceria com 
a Fundação de Cultura 
Cidade do Recife realizam 
a programação cultural do 
São João da cidade, que 
retrata a pluralidade de 
manifestações culturais: o 
Concurso Pernambucano 
de Quadrilhas Juninas, a 
Feira de Culinária Junina, a 
Procissão das Bandeiras, a 
Caminhada do Forró, entre 
outras formas de expressão, 
fazem parte do calendário 
festivo do mês de junho.
15
de apresentação dos temas e a escolha da linguagem foram 
cuidadosamente analisados, resultando numa escrita simples e 
direta, com o objetivo de tornar a leitura prazerosa e atraente 
para os diversos públicos.
h) Diagramação do conteúdo.
i) Lançamento, por meio de Rodas de Debate. 
 Ao folhear o produto impresso, ficamos satisfeitos com 
o resultado. Acreditamos que foi uma oportunidade para 
repensarmos o método de trabalho com as expressões culturais 
populares, reconhecendo seus limites, bem como seu potencial 
para uma escrita que democratiza saberes específicos e que 
põe luz sobre as experiências de vida de sujeitos, os quais 
resistem a partir do lugar político e social em que vivem e de 
onde observam e transformam o mundo. 
Procissão das Bandeiras dos Santos Juninos/Morro da Conceição 2018.
16
Os grupos de Acorda Povo e as 
Bandeiras dos Santos Juninos
Os grupos de Acorda Povo e as Bandeiras dos Santos Juninos 
são duas formas de expressão vivas nas festas juninas de 
Pernambuco, que reúnem música, dança, ancestralidade e devoção 
a São João e a Xangô. Constituem os frutos de uma mistura de 
tradições religiosas protagonizadas por grupos sociais que 
pertencem, inicialmente, a contextos culturais diferentes. 
No Brasil, durante o processo de colonização europeia, 
marcado por uma realidade de violência, perseguições, 
extermínios, resistências e hibridismos de diferentes povos 
e culturas, diversos grupos sociais, nos diferentestempos e 
espaços, misturaram-se, trocaram experiências e inventaram 
novas maneiras de estar no mundo.
Diante desse novo contexto histórico que brotava surgiram, 
também, novas formas de comunicação, novas receitas e sabores, 
outros modos de vestir, de diversão, novos espaços de 
sociabilidade, novas traduções do sagrado, orações, cânticos, 
festas, entre outras formas de expressão desenvolvidas e 
ressignificadas em um cotidiano notadamente mestiço. 
É nesse universo marcado pela diversidade que identificamos 
os grupos de Acorda Povo e as Bandeiras dos Santos Juninos 
como práticas culturais que refletem a mistura das expressões 
de religiosidade de determinados grupos de africanos e europeus 
que aqui se encontraram. De algumas regiões da África ocidental 
herdamos modelos de cultos a divindades conhecidas no Brasil 
como orixás, principalmente Xangô – o terceiro Alafin (Rei) de 
Oyó – uma das cidades da Nigéria. Em Pernambuco, a palavra 
Xangô adquiriu sentidos variados: pode significar o nome da 
religião afro-brasileira, também pode representar o nome de 
uma das divindades do panteão africano, assim como remeter ao 
nome da casa onde se realizam os cultos. 
 POR MÁRIO 
RIBEIRO
DOS SANTOS
17
Do contato com os colonizadores portugueses conhecemos as 
tradições de celebrar os santos católicos, aqui apropriadas e 
reelaboradas. Essas apropriações culturais negam a pureza e a 
autenticidade que algumas lideranças das diferentes religiões 
que existem no Brasil defendem, por não aceitarem esses 
hibridismos. E essas misturas continuam se fazendo...
SINCRETISMO
Durante a pesquisa, deparamo-nos muitas vezes com o conceito 
de sincretismo, seja nos jornais analisados, na bibliografia 
consultada e nas falas de alguns entrevistados. Desde muito tempo, 
este tema é motivo de estudo para a Antropologia, a História 
e outras ciências. Em geral, é associado, exclusivamente, aos 
fenômenos religiosos, principalmente o sincretismo afro-católico. 
Mas será que apenas os fenômenos religiosos podem ser analisados 
como sincréticos? As artes, as festas populares como o Carnaval, 
o São João, as expressões culturais como o bumba-meu-boi, as 
escolas de samba, o frevo e outras, podem ser sincréticas? Para 
compreendermos melhor o assunto, é importante refletirmos sobre 
outros temas a ele relacionados, por exemplo: relações de poder, 
colonialismo, tolerância cultural, representações simbólicas, 
misturas, analogias entre fenômenos distintos, confrontos, 
ecletismo, fluxos culturais, mestiçagens, pureza cultural, enfim, 
são vários os caminhos que podemos percorrer durante o debate 
sobre o conceito em foco. O que podemos constatar é que o 
termo não possui um sentido único. Pelo contrário, seus vários 
sentidos resultam de construções históricas que, por sua vez, são 
constantemente reinterpretadas. Esse debate não se esgotou. Ele 
está vivo nas nossas práticas, faz-se presente no nosso cotidiano, 
dentro da nossa casa, entre os nossos familiares, vizinhos e 
amigos. Acreditamos que o tema ainda é motivo de muito estudo nas 
diferentes áreas do saber. 
PARA
SABER
MAIS
18
Escritos que transcendem os 
tempos: os primeiros registros das 
homenagens a São João em Pernambuco
Os memorialistas e os folcloristas foram os primeiros 
intelectuais a se interessarem pelo tema das expressões 
culturais e registrá-lo em seus trabalhos. Em Pernambuco, 
merece destaque os estudos de Pereira da Costa, recifense 
nascido no Bairro de Santo Antônio, em 1851 que, ainda jovem, 
despertou o interesse pela leitura de temas da história e do 
folclore da região. Hábil pesquisador, frequentador assíduo dos 
arquivos estaduais e eclesiásticos, bom observador, anotava 
o que lia, via e ouvia falar durante as conversas com os mais 
velhos. 
Em 1908, publica o livro Folk-lore Pernambucano: subsídios 
para a história da poesia popular em Pernambuco, no qual reúne 
informações sobre superstições, brinquedos infantis, poesias, 
romances, quadras populares, entre outros assuntos coletados 
em textos bibliográficos, manuscritos, jornais e entrevistas 
com diferentes pessoas.
Trouxemos, para este trabalho, as práticas registradas pelo 
autor sobre as noites de junho em tempos de Colônia, quando 
era comum nos dias dedicados a São João, principalmente nos 
festejos do campo, encontrar “ranchos de homens e mulheres, 
coroados de capelas de flores e folhas, percorrendo alegres as 
estradas e ruas dos povoados.” De acordo com o pesquisador, 
as pessoas enfeitadas com as capelas, “na abençoada noite”, 
iam ao “milagroso banho”, cantando os “conhecidíssimos versos: 
Capelinha de melão / É de São João / É de cravo, é de rosa / 
É de manjericão.”2 
No Recife, os capelistas percorriam, em animados bandos, as 
ruas próximas ao porto e “encaminhavam-se, de preferência, 
2 
COSTA, Francisco 
Augusto Pereira. Folk-lore 
Pernambucano: subsídios 
para a história da poesia 
popular em Pernambuco. 2 
ed. – Recife: CEPE, 2004.p. 
200
 POR MÁRIO 
RIBEIRO
DOS SANTOS
19
para o banho na Cruz do Patrão, no istmo de Olinda, cujas 
águas, quer as do mar, de um lado, quer as do rio Beberibe, do 
outro, gozavam, na noite de São João, da particular virtude de 
dar felicidades e venturas.”3
Tomar banho na madrugada que antecedia o dia do nascimento de 
São João significava, para os devotos, purificar-se, dissolver 
os males, curar as tristezas, desintegrar as enfermidades, 
afastar a falta de amor, o desemprego e outras “mazelas” 
que atrapalhavam o desenrolar da vida das pessoas. Outro 
significado atribuído ao banho nas águas do rio, riacho ou 
mar, nas vésperas do dia de São João era também uma alusão 
ao batismo de Cristo nas águas do Rio Jordão. Em todos os 
sentidos, o que compreendemos é que o ato simbólico do banho 
é, portanto, o início de um novo ciclo, uma nova vida, agora 
regenerada, limpa, pronta para recomeçar.
A prática do banho de São João se desloca no tempo e 
continua nas primeiras décadas do século XX, integrando a 
programação dos festejos do estado. As matérias do jornal 
Diário de Pernambuco de junho de 1946, ilustram essa realidade:
3
Idem, p. 201
Imagem à esq. extraída do Diário de Pernambuco, 
4 de junho de 1946.
Imagem acima extraída do Diário de Pernambuco, 
5 de junho de 1946.
20
A caminhada, em procissão, dos devotos até o rio é chamada 
de barca pelos participantes e os devotos do santo batizados 
de marujos, “recrutados entre os moradores da cidade”. Todo o 
percurso seguia animado por danças embaladas pelos ritmos do 
coco e do samba. 
No tempo presente, as lembranças da infância da Mestra de 
Coco Ana Lúcia de Amaro Branco, nascida em 1944, aproxima-
se desse contexto que relaciona o banho de São João com os 
pedidos de bênçãos pelos devotos:
Meu pai já fazia o banho de São João. O Acorda povo é 
para o rio, só que não existe mais rio, você não pode se 
jogar ali dentro pra tomar um banho que tá contaminado, 
muito sujo, mas o rio era tudo limpo e tinha pouca casa. 
Eu nasci aqui, isso era mato e as casas distantes. E 
levava [os participantes do acorda povo] para tomar 
banho de rio lá pra Casa Caiada, levava pra Rio Doce. 
Saía cantando, fazia o coco. Aí saía cantando pra levar 
o andor com a bandeira para o rio. Quando chegava no 
rio, arriava a bandeira, o andor, todo mundo mergulhava, 
as pessoas de idade faziam os seus pedidos, as pessoas 
novas era [pedido de] casamento. E depois que terminava 
isso tudinho, o pessoal saía cantando com a procissão. 
Meu pai já deixava antes de sair de casa, pamonha, 
canjica, milho cozinhado, tudo, mais umas mesas que 
pareciam uns balcões enormes.4
O depoimento da mestra cirandeira e representante das 
Bandeiras de São João e São Pedro Cristina Andrade também se 
aproxima do pensamento de Ana Lúcia, acrescentando, em suas 
lembranças, a aproximação do Acorda Povo com as religiões 
afro-brasileiras: “saía o povo em forma de procissão, com 
batuque tocando e vai até a beira do rio, se banhar, cantando 
as músicas de São João que eu não sei, com manjericãoque benze 
o povo. Isso é coisa que sai do Xangô.”5 
4
Mestra Ana Lúcia – Acorda 
Povo de Amaro Branco, 
Olinda-PE. Entrevista 
realizada por Alice Alves e 
Raquel Araújo. Olinda, 11 
de junho de 2018.
5
Maria Cristina Andrade das 
Bandeiras de São João e São 
Pedro. Entrevista realizada 
por Déborah Callender. 
Recife, 06 de julho de 2018.
21
Essa relação do Acorda Povo com as práticas culturais afro-
brasileiras é reforçada na fala da coordenadora da Bandeira 
de São João da Várzea, Antonieta Vidal: “Acorda Povo é uma 
manifestação popular de matriz africana, já a bandeira de São 
João é ligada mais à tradição católica”. A mesma explica que 
 
Anos atrás, ao iniciar o mês do mês de junho, a bandeira 
de São João era hasteada na frente da igreja [Igreja 
Matriz da Várzea - Paróquia Nossa Senhora do Rosário] 
e ali tinha as orações, os cultos a São João Batista, 
tinha todo esse ritual da igreja católica. E o acorda 
povo existia, só que separado, mais ligado ao Candomblé. 
Mas, quando terminava o cortejo da Bandeira de São 
João, que chegava na frente da igreja para ser entregue 
aos padrinhos, o grupo de acorda povo também entrava 
nessa festa e como [o Acorda Povo] era uma festa mais 
profana, tinha bebidas, tinha todas aquelas danças 
diferentes da procissão de São João, que só cantava 
músicas religiosas, e o acorda povo trazia toda essa 
festividade de alegria, de muita zoada, de muita dança 
ligada a Xangô, ao Orixá Xangô.6
As pessoas que outrora acompanhavam o Acorda Povo da Várzea 
pertenciam ao Terreiro da conhecida “Tia Zu”, Ialorixá já 
falecida, que residia na comunidade denominada Ambolê, 
localidade próxima ao bairro da Várzea. Segundo Antonieta 
Vidal, essa ligação com o Terreiro de Tia Zu surgiu porque 
uma das fundadoras da citada forma de expressão residia na 
mesma vila onde existia o Terreiro e quando a bandeira saía 
de sua casa em direção à Praça da Várzea, passava em frente 
ao Terreiro, onde recebia calorosa aclamação. Com saudosismo, 
Antonieta recorda:
Quando a gente passava por lá a alegria era muito 
grande, a própria Tia Zu fazia oração de Xangô, fazia 
6
Maria Antonieta Vidal – 
Bandeira de Santo Antônio 
da Várzea. Entrevista rea-
lizada por Ester Monteiro. 
Recife, 08 de junho de 2018.
22
comparação de Xangô com São João Batista. Eu aprendi a 
fazer isso com ela, nas vezes em que eu fiquei à frente 
a bandeira. Um ano muito importante foi o ano de 2002 
em que a bandeira pousou no Terreiro de Tia Zu, ficou de 
2001 a 2002, que é um ano que a bandeira passa na casa 
da madrinha, e nesse ano se renovou todas as bandeiras. 
Foi muito bom porque as filhas do terreiro fizeram uma 
festa belíssima, Tia Zu se esforçou para fazer uma das 
festas mais bonitas que tivemos.7
Antonieta continua explicando que, no ano de 2003, a bandeira 
saiu do Terreiro de Tia Zu e foi para sua residência; ela mesma 
seria madrinha até o ano seguinte, então convidou a Ialorixá 
para abençoar a bandeira:
Tia Zu veio, fez a benção de Xangô, no ano seguinte a 
menina que iria ficar com a bandeira teve um problema 
e não pôde ficar, então a bandeira permaneceu na minha 
casa, Tia Zu veio novamente e mais uma vez fez a bênção 
de Xangô, tanto que em 2005 voltou para a casa dela [para 
o terreiro] porque eu disse a ela: tia Zu eu preciso 
da sua ajuda senão a bandeira vai acabar, porque as 
pessoas se afastaram, esperavam lá em casa só a benção 
de São João Batista e aí a gente fez de São João Batista 
e de Xangô, por isso que eu mantenho até hoje essa 
bênção de Xangô, porque eu recebi essa luz né?
Esse caráter festivo do Acorda Povo ressaltado na fala de 
Antonieta Vidal também se aproxima da concepção apresentada 
pelo folclorista Evandro Rabello, ao destacar que o Acorda 
Povo “é, talvez, a derradeira procissão religiosa do Brasil, 
onde, com a presença do povo, ainda se dança”9. Nesse momento, 
dançar para o santo é se fazer mais próximo a ele; faz parte 
do sacramento e da relação de devoção estabelecida entre o 
santo e o devoto. Uma prática herdada do tipo de Catolicismo 
7
Idem.
8
Idem
9
Diário de Pernambuco, 
Recife, 18 de junho de 1975.
23
que se propagou pelas colônias portuguesas no Brasil, na 
qual os devotos se comunicavam com o sagrado por caminhos 
mais concretos, visíveis e palpáveis, a exemplo de festas, 
procissões dançantes, fogos de artifício, fogueiras, comidas, 
bandeiras estampadas com as imagens dos santos e altares 
montados no interior das casas barrocamente ornamentados com 
velas e flores de papel distribuídas nas cores do santo. Essa 
intimidade estabelecida entre o santo e os devotos nos remete 
a uma das toadas cantadas durante os cortejos. Nos versos 
que embalam os devotos nas ruas, São João cai n’água com 
as donzelas, num momento de confraternização e alegria que 
envolvia o ato festivo:
“São João foi tomar banho
Com vinte e cinco donzelas
As donzelas caíram n’água
São João caiu com elas”
 
Só mesmo na nossa forma singular de devoção aos santos 
que São João cairia na água com vinte e cinco donzelas. 
Essas imbricações envolvendo religiosidade e muita animação 
nos impossibilita de estabelecer fronteiras que delimitem até 
onde vai o sagrado no interior dessas práticas culturais. 
Manifestar a sua fé é um ato totalmente subjetivo, que para 
uns pode se resumir ao recolhimento num ambiente silencioso, 
mas para outros quanto mais festa fizer mais irá demonstrar o 
seu respeito e admiração pela divindade.
 
24
Nas fronteiras: aproximações e 
distanciamentos entre os Acorda Povo 
e as Bandeiras dos Santos Juninos
Durante o processo de pesquisa, nas fontes bibliográficas, 
na imprensa e nas entrevistas com os detentores dos bens, 
identificamos que o Acorda Povo e as Bandeiras dos Santos são 
formas de expressões culturais distintas, embora a presença 
do símbolo bandeira esteja presente também no Acorda Povo, 
assim como o andor, em alguns grupos, encontra-se presente nas 
procissões das Bandeiras.
Nos anos 1970, o folclorista Evandro Rabello fez uma distinção 
entre Bandeira de São João e Acorda Povo. Para o estudioso, 
“existe diferença, sim. A Bandeira é o cortejo religioso, que nas 
primeiras horas da noite percorre os bairros ao som de orquestras 
ou instrumentos de percussão, levando uma bandeira de pano, 
estrela e andor, enquanto que o Acorda Povo sai pela madrugada, 
sem organização, com zabumba, caracaxá e sem levar andor.”10 
O depoimento de Evandro Rabello se aproxima da descrição 
realizada pelo pesquisador Pereira da Costa, no século XIX, 
sobre os préstitos das procissões de bandeiras em noites de 
celebração. Para o autor, o séquito era formado por:
Duas extensas alas de moças e meninas, trajadas de 
branco, coroadas de capelas, e com brandão aceso, com 
lanterna de papel, marchando no fim as que levavam a 
bandeira, segurando-a pelas pontas; e às vezes, quando 
se queria imprimir maior solenidade ao ato, ia o 
estandarte hasteado em uma charola carregada por moças. 
No coice do préstito, marchava uma banda de música, que 
acompanhava os versos em cadência de marcha, tirados 
pelo grupo de moças que carregava a bandeira e por 
10
Diário de Pernambuco, 
Recife, 18 de junho de 1975.
 POR MÁRIO 
RIBEIRO
DOS SANTOS
25
outras que faziam como que a sua guarda de honra, e eram 
respondidos em coro por todo o acompanhamento.11
Considerando os deslocamentos de tempo e a dinamicidade 
das práticas culturais sujeitas às mudanças para atender as 
necessidades dos agentes envolvidos, os seguidores de hoje 
vestem-se de todas as formas. Alguns devotos, usam as cores do 
santo homenageado, geralmente, o vermelho e o branco, remetendo 
a São João e a Xangô. Outras, vestem estampas floridas ou xadrez. 
No tocante ao formato da procissão, existem Bandeiras que 
possuem duas formas de apresentação. Segundo a presidenta 
da Bandeira de Santo Antônio de Água Fria, uma religiosa na 
comunidade, integrando a programação dos festejos a Santo 
Antônio, e outra procissão “mais animada”, que ela chama de 
“profana”, a qualintegra o encontro com outras Bandeiras de 
Santos Juninos organizado pela Prefeitura do Recife. Segundo 
Conceição, referindo-se ao tipo de música que acompanha o 
préstito: “a dança é tipo forró, as músicas de São João toca 
e você vai dançando, mas não tem uma coreografia específica 
para aquilo, é uma dança aberta, só na profana. Quando sai a 
procissão mesmo, as músicas sendo religiosas, ela tem ritmo aí 
o povo dança. Só na Bandeira que é só marcha.”12
11
COSTA, Francisco 
Augusto Pereira. Folk-lore 
Pernambucano: subsídios 
para a história da poesia 
popular em Pernambuco. 2 
ed. – Recife: CEPE, 2004.p. 
213
12
Entrevista com Maria da 
Conceição Andrade Silva. 
Realizada por Déborah 
Callender. Recife, 06 de 
julho de 2018.
Bandeira Sto. Antônio 
de Água Fria.
26
No “coice do préstito”, marcha não mais uma banda de 
música, mas, sim, alguns instrumentos percussivos como 
pandeiros, zabumbas e caracaxás. Tal composição aproxima-se 
da descrição dos desfiles das Bandeiras no campo, conforme 
registra Pereira da Costa: “No campo, tinham essas Bandeiras 
um tom mais acentuadamente popular e um aparato especial; 
marchava adiante da procissão o estrepitoso zabumba e mais 
instrumentos, foguetes do ar estourando.”13
Esse caráter festivo da procissão da Bandeira, em outras 
temporalidades (século XIX), foi criticado pelo religioso e 
escritor Padre Lopes Gama em sua passagem por Pernambuco. 
Segundo o intelectual, diz ter visto,
Em certo arraial uma bandeira dessas, e julguei estar 
observando uma dessas saturnais dos antigos romanos. Era 
dedicada ao Senhor S. Gonçalo. As ninfas, que a levavam, 
depois de gritarem por todo o lugarejo, sempre debaixo do 
compasso do mais rigoroso landum, entravam pela igreja, 
e ali, postas em redor de tal bandeira, saracoteavam as 
ancas, rebolavam-se, davam umbigadas [...].14
O mesmo discurso de rejeição, deslegitimando a manifestação 
cultural dos populares era proferido pela Igreja, na pessoa do 
bispo da diocese, o qual proibia o formato festivo do cortejo: 
Absolutamente, permitindo apenas que sejam as bandeiras 
levadas da igreja para o mastro, e retiradas depois para a 
mesma igreja, carregadas por crianças e acompanhadas pelas 
respectivas irmandades; e por muito empenho, concedem, 
às vezes, que sejam conduzidas e tiradas com as antigas 
solenidades, mas sem os versos cantados por moças.15
 No entanto, era comum, no período colonial, os devotos 
organizarem Bandeiras para os santos, não necessariamente 
13
COSTA, Francisco 
Augusto Pereira. Folk-lore 
Pernambucano: subsídios 
para a história da poesia 
popular em Pernambuco. 2 
ed. – Recife: CEPE, 2004.p. 
214
14
Idem
15
Idem
27
aqueles comemorados no período junino. São Gonçalo, Nossa 
Senhora do Rosário, Nossa Senhora da Saúde, Nossa Senhora do 
Monte, em Olinda, entre outros santos, tinham suas bandeiras 
festejadas em “devoções de patuscadas” com instrumentos 
percussivos, músicas e fogos de artifício.16
No tempo presente, o préstito segue as ruas da comunidade 
onde reside o organizador, numa animada batucada, regada com 
bebida, música e dança. Na Bandeira da Várzea, coordenada 
pela professora Antonieta Vidal, numa demonstração de fé, a 
imagem de Santo Antônio percorre as mãos dos seguidores, que, 
discretamente, fazem seus pedidos ao orago, enquanto outros 
cantam e dançam músicas de forró e algumas toadas de domínio 
público. Ao retornar para a casa da responsável, a imagem é 
colocada em um altar e os participantes festejam ao longo da 
noite, se servem com comida, bebida e muita música. 
16
A expressão “devoções de 
patuscada” é empregada 
por Pereira da Costa para 
se referir às procissões 
de Bandeiras dos Santos 
Católicos seguidas de 
instrumentos percussivos, 
música e danças. Ver Costa, 
Francisco Augusto Pereira. 
Folk-lore Pernambucanao: 
subsídios para a história 
da poesia popular em 
Pernambuco. 2 ed. – Recife: 
CEPE, 2004.p. 215 
Bandeira de Santo Antônio no bairro da Várzea e Sto. Antonio nas mãos dos festeiros.
28
No Recife, as Bandeiras dos Santos Juninos têm prevalência 
como eventos religiosos no calendário municipal. A Prefeitura 
local realiza a “Procissão dos Santos Juninos”, no Bairro de 
Casa Amarela e o “Desfile das Bandeiras Juninas”, nas ruas do 
centro do Recife. Em Casa Amarela, a Igreja de Nossa Senhora da 
Conceição recebe, anualmente, dezenas de Bandeiras e andores 
com imagens de santos para a tradicional procissão até o 
Sítio da Trindade, no mesmo bairro. Antes da saída, o padre 
celebra a sagração das Bandeiras com água benta, num momento 
de muita alegria e comoção, com palmas, cânticos e fogos de 
artifício. Fazem parte destes eventos Bandeiras de várias 
localidades, muitas transportando símbolos correspondentes à 
sua religiosidade, e também aquelas que não declaram vínculo 
religioso, a exemplo da Bandeira de São João Deveras, relacionado 
ao Balé Deveras, localizada no bairro Brasília Teimosa, no 
Recife. Como afirma seu coordenador, Ladimir Ferreira da Silva 
(“Mica Silva”), esse bem cultural “é puramente o resgate de um 
brinquedo, não tem nenhum vínculo religioso”. Ele relata que:
 
Na época, quando eu criei o Balé Deveras, eu era mais 
ligado à igreja Católica Apostólica Romana, mas hoje 
eu não tenho religião e ela [a Bandeira] não nasceu 
puramente por isso, não nasceu com essa conotação e 
sim com relação de devoção ao santo, o São João numa 
relação também a Xangô, a gente fez uma pesquisa mais 
aprofundada sobre sincretismo religioso para fazer 
essa relação com Xangô.17
Contudo, a Bandeira de São João do Bacnaré (Balé de Cultura 
Negra do Recife), localizada no Bairro de Água Fria, no 
Recife, se apresenta com trajes nas cores vermelho e branco, 
em menção ao Orixá Xangô, com modelos utilizados em cerimônias 
do Candomblé, além do uso de coreografias na dança, as quais 
remetem aos movimentos dos orixás, o que fazem por honra e 
tradição. 
17
Ladimir Ferreira da 
Silva. Bandeira de São 
João Deveras. Entrevista 
realizada por Ester 
Monteiro. Recife, 19 de 
junho de 2018.
29
Na “Procissão dos Santos Juninos”, assim como no “Desfile 
das Bandeiras Juninas”, é possível observar a diversidade de 
cada uma dessas formas de expressão. Na tradicional Bandeira 
de São João da Carroça e das Bandeiras dos Santos Juninos D’O 
Bonde, que agrupa as Bandeiras de São José, Santo Antônio, São 
João, São Pedro, São Paulo e Santana, todas organizadas pela 
diretoria do Bloco Carnavalesco Lírico O Bonde, é possível 
observar o empenho do seu presidente, o Sr. Alcides Campelo 
Cavalcanti, conhecido como “Cid do Bonde” em levar para as ruas 
um desfile onde se destaque a beleza estética, a luminosidade e 
o brilho nos adereços e nas vestimentas. 
Conceição Andrade, representante da Bandeira de Santo Antônio 
de Água Fria, por sua vez, diz que o figurino da sua Bandeira 
varia conforme a ocasião: “quando a gente sai com a Bandeira, 
no primeiro dia, a gente tem uma farda que é uma roupinha 
marrom e bege e uma fitinha com o nome de Santo Antônio. Mas, 
quando a gente sai na festa profana, a roupa é uma roupa tipo 
de São João, uma saia longa, estampada, uma camisetinha.”18 
Partindo desse pressuposto, podemos observar como a forma 
de expressão das Bandeiras está intimamente relacionada com 
a vida cotidiana dos seus praticantes, interligada com as 
histórias de vida particulares, a ponto de indeterminar quais 
as fronteiras que definem o que é privado e acontecem no 
interior dos lares com o momento festivo, o qual preenche os 
espaços públicos das cidades com expressões de religiosidades.
18
Entrevista com Maria da 
Conceição Andrade Silva - 
Bandeira de Santo Antônio 
de Água Fria. Realizada por 
Déborah Callender. Recife, 
06 de julho de 2018.
SAGRADO E PROFANO
No decorrer da pesquisa, encontramos vários registros em 
jornais e até mesmo nas entrevistas, que colocam em lados opostos 
sagrado e profano. Ficamos a nos perguntar: onde está a linha 
divisória que estabelece limites, que confronta esses dois lados? 
Nessarelação, onde está o limite que reserva de um lado o que é 
profano e o sagrado do outro? Será mesmo que existe essa relação 
dicotômica ou eles se misturam, embricam-se de tal maneira que não 
conseguimos definir onde começa um e termina o outro? 
PARA
SABER
MAIS
30
Entre festas e louvações, devoção 
aos Santos e Orixás: a prática 
religiosa nas Bandeiras dos Santos 
Juninos e nos Acorda Povo de 
Pernambuco
O calendário festivo do Nordeste brasileiro traz, no mês de 
junho, um livre curso ao sentimento regionalista; nesse contexto, 
Pernambuco se distingue pela diversidade de celebrações. Em 
quase todos os dias do mês, na capital e no interior do estado, 
são realizadas diversas práticas culturais que perpetuam a 
vivência social das pessoas. 
Os festejos juninos são caracterizados pela fartura de alimentos, 
músicas de variados ritmos, danças, encenações, receitas 
culinárias, trajes com cores e adereços específicos, brincadeiras 
de adivinhações, queima de fogos, rituais sagrados, promessas, 
missas, procissões, trezenas, entre tantas outras demonstrações de 
fé, devoção e preservação de tradições culturais. As expressões de 
natureza religiosa são provenientes, principalmente, do catolicismo 
e do candomblé, também conhecido como Xangô pernambucano.
As Bandeiras dos Santos Juninos e os Acorda Povo estão 
inseridas nesse amplo conjunto de práticas e representações. 
Trata-se de uma forma de expressão da religiosidade em louvor 
aos santos católicos mais reverenciados no mês de junho, são 
eles: Santo Antônio de Pádua, no dia 13; São João Batista, no 
dia 24; São Pedro e São Paulo, no dia 29; e também ao Orixá 
Xangô, detentor do fogo, da fartura, da justiça, divindade 
do Candomblé homenageado comumente no mês de junho, por ser 
relacionado, localmente, a São João Batista.
Essa disponibilidade para mesclar culturas é dita pelo 
historiador João José Reis (1996) como um imperativo de 
 POR ESTER
MONTEIRO
DE SOUZA
31
sobrevivência dos povos escravizados; um exercício de sabedoria, 
também refletida na habilidade de compor alianças sociais, 
as quais inevitavelmente se traduziam em transformações e 
interpenetrações culturais. 
Observamos que o vínculo entre as Bandeiras dos Santos 
Juninos e os Acorda Povo, advém dessas “alianças”, das quais 
denota a referida “mescla” de culturas revelando hibridismos de 
variados tipos e situações, características “muito presentes 
na religiosidade, nas procissões, nas comemorações dos santos, 
nas diversas formas de pagamento de promessas, nas festas 
populares em geral, como em diversos elementos da religião 
oficial, por exemplo, no Catolicismo”.19
O Acorda Povo da Vila das Lavadeiras, também conhecido como 
Acorda Povo de Dona Nenzinha, localizado no bairro de Areias, 
Recife, exemplifica integralmente essa afirmação. Durante setenta 
e oito anos de vigência, tem prestado igualmente devoção ao Santo 
e ao Orixá, resguardando simbolismos e preceitos do catolicismo 
e do candomblé, mantido tradições e vivenciado transformações 
decorrentes da conjuntura social e dos valores culturais das 
gerações que vêm liderando essa forma de expressão.
19
FERRETTI, Sérgio F. 
Sincretismo e Religião na 
festa do Divino. In. Revista 
Anthropológicas, ano 11, 
vol. 18(2), 2007. p.112
Dona Nenzinha - Acorda Povo 
da Vila das Lavadeiras.
32
Os depoimentos sobre a história desse bem cultural apontam 
que o mesmo é uma herança familiar, fundado em 1941 por Adalgisa 
Marques de Almeida (Dona Dida). Mulher festeira, declaradamente 
católica e do candomblé, devota de São João Batista e do Orixá 
Xangô, falecida no início dos anos 1970. É possível presumir que 
as perseguições às religiões afro-brasileiras e às manifestações 
culturais correlatas20, recorrentes durante o período de liderança 
de Dona Dida, tenham motivado a mesma a não exaltar publicamente 
sua devoção a Xangô, deixando mais evidentes no Acorda Povo, 
representações relativas a São João. Kesinho, neto da matriarca 
fundadora, explica: “eu acho assim: minha avó, antigamente, 
tinha essa ligação [com o Candomblé], mas ela não fazia como a 
gente faz, a gente faz para o Orixá”.21
Dona Nenzinha, filha que, desde a infância, esteve junto a 
Dona Dida conduzindo o Acorda Povo, recorda que, naquela época, 
as orientações da Igreja Católica eram seguidas com maior 
rigor; muitas mulheres se mantinham virgens até o casamento, 
faziam promessas para conseguir casar. Por isso, durante a 
procissão do Acorda Povo, “quem carregava o andor de São João 
era uma moça vestida de noiva e uma criança vestida de anjo e, 
na frente da bandeira, tinha um menino vestido de São João, 
levando um carneiro”. Com o passar dos anos, o uso do animal 
foi extinto, pois o mesmo ficava assustado com o barulho dos 
fogos de artifício e, devido ao peso, os homens passaram a 
transportar o andor.
Após o falecimento de Dona Dida, sua filha perdeu o ânimo de 
conduzir essa forma de expressão, por isso o deixou no Terreiro 
de Dona Vanda, localizado no Bairro da Mustardinha, no Recife. 
Somente no início dos anos 1990, a pedido de Kesinho, a citada 
manifestação cultural volta à residência de Dona Nenzinha, 
tendo seu retorno festejado pelo Orixá Xangô. Kesinho relata: 
Quando o Acorda Povo retornou por aqui, a gente fez 
a obrigação pra Xangô e tal, quando foi na hora de 
Xangô sair, na hora que o Acorda Povo saiu, uma senhora 
20
Sobre as perseguições às 
religiões e manifestações 
culturais afro-brasileiras 
ver, entre outros, os estudos 
de: SANTOS, Mário Ribeiro 
dos. Trombones, tambores, 
repiques e ganzás: a 
festa das agremiações 
carnavalescas nas ruas do 
Recife (1930-1945) / Mário 
Ribeiro dos Santos. – 2010. 
SOUZA, Ester Monteiro 
de. Ekodidé: relações 
de gênero do contexto 
dos afoxés de culto nagô 
no Recife. Dissertação 
(Mestrado). Programa 
de Pós-Graduação em 
Antropologia, UFPE, 
(2010); MENEZES, Lia. 
As Yalorixás do Recife. 
Recife: Funcultura, 2005; 
QUEIROZ, Martha Rosa 
Figueira. Religiões Afro-
brasileiras no Recife: 
intelectuais, policiais e 
repressão. Dissertação 
(Mestrado em História) 
– Centro de Filosofia 
e Ciências Humanas, 
Universidade Federal de 
Pernambuco, Recife, 1999; 
A coletânea de artigos de 
autoria de LIMA, Ivaldo 
Marciano de França. 
GUILLEN, Isabel Cristina 
33
baixou Xangô na praça e ele dizendo que tava muito 
feliz de ter voltado, que aqui era o lugar dele.22
 
Há mais de trinta anos o Acorda Povo da Vila das Lavadeiras 
vem sendo coordenado por Aurelina Marques de Almeida (Dona 
Nenzinha), junto com seu filho Clésiton José Genésio de Almeida 
(Kesinho), respectivamente, filha e neto de Dona Dida. Tanto 
ela, quanto seu filho confessam fé religiosa ao candomblé e 
profunda devoção a Xangô. Com força, Dona Nenzinha diz:
Minha ligação é com meu pai Xangô, que merece, [o 
Acorda Povo] é em reverência a Ele. Xangô é tudo na 
minha vida, é meu pai, num momento é meu filho, meu 
amor. Ele significa minha família, muito bom pra mim. 
[...] Quando solta aquela giranda [girândola] parece 
que ele incorporou em mim, me dá aquela vontade de 
chorar tão grande, com aquela alegria que eu sinto.23
Martins. Cultura Afro-
descendente no Recife: 
maracatus, valentes e 
catimbós. Recife: Bagaço, 
2007. O documentário 
Irôco: a árvore sagrada, 
realizado pelo Núcleo da 
Cultura Afro-brasileira 
da Secretaria de Cultura 
do Recife, em parceria 
com a Fundação Cultural 
Palmares - Recife, 2006, 
é uma importante fonte 
audiovisual sobre o tema.
21
Entrevista com Clésito 
José Genésio de Almeida 
(Kesinho) – Acorda Povo 
Vila das Lavadeiras. 
Realizada por Alice Alves. 
Recife, 31 de maio de 2018.
22
Idem
23
Entrevista com Dona 
Nenzinha – Acorda Povo 
Vila das Lavadeiras. 
Realizada por Alice Alves. 
Recife, 31 de maio de 2018.
Dona Nenzinha apresenta com orgulho a coroa de 
Xangô - Acorda Povo da Vila das Lavadeiras.
34
Tamanho amor ao orixá, junto ao exercício da liberdade de 
culto, motiva Dona Nenzinha a exaltar com notoriedade o nome 
de Xangô e, ao mesmo tempo, manteros saberes de sua mãe, 
preservando as referências ao catolicismo. A cada ano, durante 
o mês de junho, são realizadas diversas ações preparatórias 
à saída da Bandeira de São João e do Acorda Povo, como 
a confecção das roupas ritualísticas do candomblé, escolha 
das residências onde serão hasteadas as bandeiras, a casa 
onde o andor será resguardado, também são realizados rituais 
católicos e do candomblé com oferendas para os orixás, pedidos 
de permissão, proteção e licença para sair nas ruas, limpeza 
ritual do bombo (instrumento utilizado no cortejo).
A culminância da festa ocorre nos dias 23 e 24, respectivamente, 
véspera e dia de São João. Às 4h do dia 23, uma queima de fogos 
de artifício anuncia a saída do Acorda Povo. O cortejo segue 
cantando pelas ruas da comunidade saudando as residências das 
pessoas que fizeram promessas e como pagamento se dispuseram a 
Obrigação ritualística do bombo no 
quarto sagrado dos orixás (Peji) - 
Acorda Povo da Vila das Lavadeiras.
35
“levantar” uma bandeira de São João pela graça alcançada. De 
maneira prévia, essas pessoas costumam procurar Dona Nenzinha 
para ter a honraria. Em 2018, treze bandeiras foram hasteadas 
na comunidade. Com altivez, Dona Nenzinha relata: “o povo 
é que vem aqui [na casa dela] me procurar, [para saber] se 
pode levantar a bandeira. [...] Pra ser juíza também vem me 
procurar, [para] saber se pode, se tem a vaga”.24 É chamada de 
“juíza” a mulher que acolhe em sua residência o andor com a 
imagem de São João, lá também fica hasteada uma bandeira com a 
imagem de São João. Apenas uma juíza é escolhida a cada ano.
Por voltas das 6h da manhã, o percurso é finalizado com o 
retorno à casa de Dona Nenzinha, onde será “levantada” a 
última bandeira. Depois disso, é puro divertimento ao dançar 
o coco25 em frente à casa da matriarca, regado à distribuição 
de mungunzá26 para todos que participam. Ainda no dia 23, 
perto das 18 horas, o grupo sai para buscar a bandeira e o 
andor na casa da juíza, para os objetos pernoitarem na casa 
de Dona Nenzinha.
24 
Idem
25
Manifestação cultural 
nordestina, influenciada 
pelas culturas indígena e 
afrobrasileira, vivenciada 
com muita evidência 
durante o período junino.
26
Iguaria à base de milho e 
leite de coco, apreciada 
comumente na culinária 
junina.
Bandeiras dos santos hasteadas nas frentes das casas.
36
A festa é retomada às 20 horas do dia 24, quando são 
“arriadas” todas as bandeiras que foram hasteadas na comunidade 
e guardadas com cada família. Logo após esse ato, todos saem 
em procissão transportando o andor e a bandeira até a casa da 
juíza que guardará as relíquias até o mês de junho do próximo 
ano. É uma tradição que vem sendo mantida para renovação da fé 
dos seus praticantes e promoção da alegria entre a comunidade 
da Vila das Lavadeiras.
A transmissão de saberes também se faz presente na relação 
familiar da Mestra Ana Lúcia, líder do Acorda Povo do Amaro 
Branco, localizado no bairro de mesmo nome, no município 
de Olinda. Ela ressalta o seu envolvimento com diversas 
manifestações da cultura popular, tendo aprendido tudo com seu 
pai, Francisco Nunes, que, por sua vez, teria aprendido com 
o pai dele, que teria aprendido com o avô, em Nazaré da Mata, 
região da Mata Norte de Pernambuco.
Acorda Povo de Amaro Branco - Mestra Ana Lúcia.
37
 Uma particularidade dessa expressão cultural era a realização 
do banho do rio, uma referência ao batismo de Jesus por João 
Batista, no rio Jordão. Ela recorda que, no passado, seu pai 
promovia o ritual do banho de São João:
O Acorda Povo ía para o rio, só que não existe mais 
rio, você não pode se jogar ali dentro pra tomar um 
banho que tá contaminado, muito sujo, mas o rio era 
tudo limpo e tinha pouca casa. Eu nasci aqui, isso era 
mato e as casas distantes. E levava [os participantes 
do acorda povo para tomar banho de rio] lá pra Casa 
Caiada, levava pra Rio Doce [bairros de Olinda]. Saía 
cantando, fazia o coco. Aí saía cantando pra levar o 
andor com a bandeira para o rio. Quando chegava no rio, 
arriava a bandeira, o andor, todo mundo mergulhava, as 
pessoas de idade faziam os seus pedidos, as pessoas 
novas era [pedido de] casamento. E depois que terminava 
isso tudinho, o pessoal saía cantando com a procissão.27
Aos doze anos de idade, Mestra Ana Lúcia começa a participar 
mais ativamente do Acorda Povo tocando ganzá, cantando coco, 
época na qual ocorre o falecimento de seu pai e pouco tempo 
depois a mesma assume a liderança. 
O Acorda Povo, a Trezena para Santo Antônio e o Coco formam 
um conjunto de manifestações culturais que compõe os festejos 
juninos realizados pela Mestra e seu filho Stênio Oliveira. 
Ela é praticante do catolicismo; já seu filho dedica sua fé ao 
candomblé e à umbanda, motivo pelo qual os festejos agregam a 
prática das três religiões, com rezas, obrigações, cânticos, 
procissão, andor e bandeira de São João.
Em 2018, a procissão saiu no dia 23 de junho, véspera do 
dia de São João, partindo do Palácio de Yemanjá, terreiro de 
Candomblé localizado no Alto da Sé, sítio histórico de Olinda, 
em direção à Casa das Matas do Rei Malunguinho, terreiro de 
Jurema situado no Largo do Amparo, no mesmo sítio histórico. 
27
Entrevista com Mestra 
Ana Lúcia – Acorda Povo 
Amaro Branco, Olinda-PE. 
Realizada por Alice Alves e 
Raquel Araújo. Olinda, 11 
de junho de 2018.
38
Como indica a tradição, em junho de 2019 o Acorda Povo do Amaro 
Branco saiu do citado Terreiro de Jurema com destino a ser 
previamente anunciado por Mestra Ana Lúcia.
O vínculo ao Candomblé e a Jurema, assim como a sucessão 
familiar, também estão presentes na história do Acorda Povo 
de Seu Manoel, localizado no Bairro Sapucaia de Dentro, 2ª 
Região Político-Administrativa de Olinda. O falecimento de 
Seu Manoel, em 2012, permitiu a Dona Célia do Coco, sua filha 
biológica, assumir a liderança dessa expressão cultural, a qual 
permanece com o nome de seu fundador. Dona Célia é membro do 
Terreiro Xambá28 e responsável pelos rituais de preparação para 
a saída do Acorda Povo nas primeiras horas do dia 23 de junho.
A cada ano, as saias em chita, de uso tradicional no citado 
Terreiro, compõem o cenário do cortejo que percorre algumas 
ruas da comunidade, cantando coco, transportando a Estrela, 
a Bandeira de São João, anunciados pelos estouros de fogos de 
artifício, mantendo a tradição de reverenciar algumas pessoas da 
comunidade e seguir ao Terreiro Xambá, onde ocorre uma saudação 
religiosa e um lanche, que é oferecido aos participantes.
28
Sobre o Terreiro Xambá ver: 
COSTA, Valéria Gomes. 
É do Dendê! História e 
memórias urbanas da 
Nação Xambá no Recife 
(19501992). São Paulo: 
Annablume, 2009.
Saída do Acorda Povo de 
Amaro Branco - Palácio de 
Yemanjá (Olinda).
39
Na noite do dia seguinte, a alegria permanece com a realização 
do Coco de Seu Manoel, organizado por Dona Célia, em frente à 
sua casa. É ela quem compõe e canta as toadas do coco junto 
com sua filha, netos, amigas e amigos da família, que também 
cantam, tocam instrumentos e se envolvem nos festejos.
Os grupos de Acorda Povo têm em si, além da devoção, o estado 
e a condição de alegrar, de comemorar os ciclos festivos que 
compõem a cultura popular pernambucana. Aqui, os brincantes 
caminham de mãos dadas, fortalecendo as mais variadas formas 
de expressão da cultura local e suas relações com o sagrado; 
é prática comum essa imbricação, essa vivência, seja no natal, 
no carnaval ou no São João.
Alguns grupos de Acorda Povo e Bandeiras dos Santos Juninos 
têm suas lideranças à frente de agremiações carnavalescas, de 
grupos de dança e de outras manifestações culturais correlatas. 
Um forte exemplo é o Acorda Povo Bandeira de São João Cambinda 
Estrela, ligado a um Maracatu Nação de mesmo nome, ao Afoxé 
Omolu Pa Kérù Awo e ao Coco dos Pretos, todos agregados em 
Acorda Povo de Seu 
Manoel - Sapucaia de 
Dentro (Olinda).
40
sede única no Bairro de Chão de Estrelas, no Recife. Embora 
esses grupos culturais tenhamcaráter distinto, vários dos 
seus membros são comuns, assim como as práticas religiosas 
fundamentadas nos preceitos do Candomblé e do Catolicismo.
Wanessa Santos, presidenta do Centro Cultural Cambinda 
Estrela, informa que “a priori, quem leva a bandeira [de São 
João] é tia Ana, Ana Maria Barbosa de Sena, que é nossa dama do 
paço no maracatu. Ela é Ialorixá de Oxum. Isso foi questão de 
decisão do próprio Santo”29 e detalha a realização de rituais 
precedentes à saída do cortejo. 
29
Wanessa Paula Conceição 
Quirino dos Santos _ 
Acorda Povo Bandeira de 
São João Cambinda Estrela. 
Entrevista realizada por 
Déborah Callender em 07 
de junho de 2018.
30
O Xirê consiste numa roda 
de dança, cânticos e toques 
percutidos em tambores, 
apropriados aos Orixás, 
sequenciado conforme o 
culto de cada Terreiro de 
Candomblé.
31
Wanessa Paula Conceição 
Quirino dos Santos _ 
Acorda Povo Bandeira de 
São João Cambinda Estrela. 
Entrevista realizada por 
Déborah Callender em 07 
de junho de 2018.
 
No mês de maio, é feita uma reunião para verificar as questões 
relativas às oferendas a Xangô e ao Xirê.30 “A gente vai listar 
tudo o que vai ser usado; ver quantos bichos vai ser, quais 
materiais vai usar, quanto a gente vai gastar, o que a gente vai 
ofertar no banquete de Xangô [...]”31. A obrigação ocorre duas 
Obrigação para Xangô.
41
semanas antes da saída do Acordo Povo; nela “é feita a matança, 
tem os dias de resguardo das pessoas que são de candomblé e os 
simpatizantes que participam também mantêm esse resguardo até 
o dia da festa, quando o Pai de Santo libera todas as pessoas 
envolvidas nesse processo”.32 O dia da saída do cortejo, dia 
22/06, se inicia com os preparativos da montagem do andor que 
servirá de suporte para a imagem de São João, da alimentação que 
será consagrada ao Orixá e depois servida aos participantes e 
com a decoração do salão do Centro Cultural. “Dezoito horas, a 
gente acende a fogueira e começa o Xirê para o patrono da Casa 
que é Xangô e quando dá 11:30h [23:30h] mais ou menos, a gente 
já começa se preparar para a saída do cortejo do Acorda Povo.”33
Wanessa ressalta que o Acorda Povo e Bandeira de São João 
Cambinda Estrela “é uma festa voltada para homenagear e falar 
da história de São João com aquela visão católica, porém a 
gente deixa bem claro que o sentido da festa é para Xangô 
realmente”.34
32
Idem
33
Idem
34
Idem
Acorda Povo e 
Bandeira de São João 
Cambinda Estrela - 
Chão de Estrelas.
42
 São muitas as expressões culturais que vivenciam essa 
“mistura, junção ou fusão” de religiões.35 A Bandeira de São 
João do Terreiro de Mãe Amara, com endereço jurídico no 
Bairro do Arruda, Recife, está inscrita nesse contexto e 
agrega particularidades decorrentes das circunstâncias de sua 
existência. Esse bem cultural nasceu no Ilê Obá Aganjú Okoloyá36, 
tornou-se itinerante e parte integrante de um importante ciclo 
de oferendas e festividades dessa Casa de culto, denominado 
“Amalá de Xangô, o Banquete do Rei”.
O Amalá é uma celebração anual, realizada por Mãe Amara, 
que conta com ritual religioso ao Orixá Xangô e oferenda de um 
farto banquete com duas de suas comidas prediletas: o Amalá e 
o Beguíri37. Maria Helena Sampaio, filha biológica de Mãe Amara 
e Yákekeré (Mãe Pequena) do Terreiro, conta que a Bandeira de 
São João:
 
Surgiu há muito tempo, foi uma promessa que minha 
mãe fez ao orixá dela, que é o patrono da casa, 
de oferecer um Amalá com Beguirí a Xangô, chamando 
‘O Banquete do Rei’. Antigamente minha mãe saía do 
terreiro dela [com a Bandeira de São João] e ia pro 
terreiro de Dona Biu [Terreiro Xambá Xangô Fúniké, 
próximo ao Terreiro de Mãe Amara, no Bairro de Dois 
Unidos – Recife-PE], elas eram irmãs [irmãs de santo] 
desde novinha, de criança no terreiro de mãe Luíza 
[Mãe de Santo de Mãe Amara e de Dona Biu] e as duas 
eram filhas de Xangô; minha mãe é de Xangô Aganjú 
e ela [Dona Biu] era de Xangô Funiké, e como ela 
também reverenciava Xangô nessa mesma época, minha 
mãe, em devoção a essa amizade, que era uma amizade 
tanto espiritual como amizade material, ela levava 
a bandeira tradicionalmente de ano em ano para o 
terreiro dela; um ano saía do Terreiro de mainha, no 
outro ano retorna do terreiro de lá para cá. Então 
havia essa aliança, essa irmandade entre elas.38 
35
FERRETTI, Sérgio. F. 
Repensando o sincretismo. 
São Paulo: Edusp: 
Fapema,1995. p.78
36
O Ilê Obá Aganjú Okoloyá, 
também conhecido como 
Terreiro de Mãe Amara, 
de Nação Nagô, fundado 
em 1945, no Bairro de 
Dois Unidos, Recife-PE. 
Sobre essa Casa de culto, 
ver: MEIRA, Fernanda. 
Ilê Obá Aganjú Okoloyá 
– Terreiro de Mãe Amara: 
Desafios e estratégias hoje. 
Monografia (Bacharelado 
em Ciências Sociais) 
Universidade Federal de 
Pernambuco, Recife, 2008.
37
Amalá e Beguiri são 
iguarias preparadas no 
Terreiro de Mãe Amara para 
oferenda ritual ao Orixá 
Xangô. O Beguiri é feito 
basicamente com quiabo, 
castanha, amendoim, 
camarão e carne bovina, 
fartamente regado com 
azeite de dendê, temperado 
com pimenta, sal, cebola e 
cebolinha. O Amalá consiste 
num espécie de papa feita 
43
Mãe Amara relata que, na saída da bandeira, acendia-se uma 
enorme fogueira e soltava-se fogos, para anunciar a partida. Ao 
ouvir o sinal, todos saíam de dentro de casa, para recepcionar 
alegremente a chegada do cortejo.
com farinha de mandioca 
e água. Ambas são 
servidas ao Orixá em alta 
temperatura. Disponível 
em: http://www.unicap.br/
observatorio2/?p=4252 – 
Acesso em: 21/08/2018
38
Maria Helena Sampaio. 
Bandeira de São João do 
Terreiro de Mãe Amara. 
Entrevista realizada por 
Ester Monteiro. Recife, 11 
de setembro de 2018.
Essa animação aconteceu durante muito tempo, nos dois 
terreiros. Porém, com o falecimento de Dona Biu, Mãe Amara 
deixou de sair com a Bandeira por um longo período, até que, em 
2001, um filho de santo de Mãe Amara, ouvindo ela falar de sua fé 
em Xangô e do saudoso cortejo da Bandeira de São João, sugeriu 
que a mesma voltasse a realizar essa grande festa. Aceitando 
a ideia, Mãe Mara conversou com sua filha Maria Helena e esta 
restabeleceu o bem cultural, mantendo a tradição nagô iniciada 
por sua mãe. O Terreiro Xambá Xangô Funiké, atualmente liderado 
pelos descendentes de Mãe Biu, acolheu a notícia com muita 
alegria organizando uma grande festa para o reinício de uma 
histórica tradição entre as duas Casas.
Em 2014, a celebração do “Amalá de Xangô – O Banquete do 
Rei” foi reconhecido com o Prêmio Patrimônio Cultural dos Povos 
e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, promovido pelo 
Bandeira de São João do Terreiro de Mãe Amara - UNICAP 2018.
44
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN. 
Essa premiação veio ampliar a programação para o ano seguinte, 
quando foram comemorados 70 anos da realização do evento. 
Em 2016, por questões familiares, Mãe Amara saiu do endereço 
que sediou tantos rituais. Contudo, a celebração do Amalá e da 
Bandeira de São João foi preservada; se dá em caráter itinerante, 
sendo realizada em espaços culturais e de formação, a exemplo da 
Torre Malakof, da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE e da 
Universidade Católica. 
Atualmente, a configuração do Amalá compreende um dia inteiro de 
atividades, promovendo a integração não apenas com a comunidade 
religiosa do terreiro, mas com escolas, universidades, movimentos 
sociais e a sociedade em geral. Ao raiar do dia, uma alvorada com 
queima de fogos e o toque do Alujá39 anunciam a festa. É servida uma 
farta refeição com comidas juninas; em seguida, realiza-se um Xirê 
com cânticos aos orixás para seguir com a programação previamente 
estabelecida, geralmente, seminário com temas relacionados à 
religiosidade e à cultura afro-brasileira; durante a tarde, são 
realizadas oficinas e apresentações culturais de grupos convidados, 
até a noite, quando a festa se encerra com o cortejo da Bandeira 
de São João. Os participantes saem em cortejo tocando, dançando 
e cantando toadas de Candomblé, cantigas decoco e de domínio 
público, fazendo menção ao santo (São João) e ao orixá (Xangô). 
 
39
Alujá é um ritmo executado 
em tambores em louvação 
ao Orixá Xangô
Bandeira de São João do Terreiro de Mãe Amara.
45
A Bandeira de São João do Terreiro de Mãe Amara participa da 
Exposição da Culinária Afro brasileira, evento que integra o 
ciclo junino da Prefeitura do Recife, onde são servidas diversas 
iguarias, comidas de santo preparadas nos terreiros de candomblé.
No bairro de Água Fria, foram identificadas três bandeiras 
organizadas por duas pessoas da mesma família: são as Bandeiras 
de São João e de São Pedro, lideradas pela carnavalesca Cristina 
Andrade, e a Bandeira de Santo Antônio, criada por sua filha, 
Maria da Conceição. Mãe e filha são católicas, integrantes 
de grupo assistencialista da Igreja Matriz de Santo Antônio, 
localizada no mesmo bairro, onde atuam na arrecadação de 
donativos para idosos da comunidade.
40
Maria Cristina Andrade 
– Bandeira de São João 
e Bandeira de São Pedro 
de Água Fria. Entrevista 
realizada por Déborah 
Callender. Recife, 06 de 
julho de 2018.
Para Cristina, o diferencial entre as Bandeiras de Santos 
Juninos e o Acorda Povo, é que, comumente, as primeiras têm 
relação com a religião católica e o segundo com o candomblé; 
por isso assegura: “tudo que eu faço é católico. Eu sou da 
Igreja de Santo Antônio de Água Fria, eu e minha filha. Sempre 
que eu vou, eu rezo e faço meu grupo rezar comigo; eu agradeço 
a Deus a minha ida e peço que leve e traga tudo em paz”.40 
Bandeira de São João de Água Fria. Bandeira de Santo Antônio de Água Fria.
46
Conceição reitera que a dinâmica de apresentação de sua 
Bandeira é regida pelos ritos católicos que são realizados no 
mês de junho para Santo Antônio. Assim, a Bandeira participa da 
Trezena de Santo Antônio organizada pela igreja do bairro – são 
treze dias de oração durante o mês de junho dedicados ao citado 
Santo. O trajeto do cortejo também toma como referência a 
mencionada matriz, de onde sai percorrendo as ruas do bairro e 
a ela retorna para o encerramento. Conceição entende que a fé 
é o elemento mais importante na existência dessa manifestação 
cultural, “a fé com que você faz aquilo é o mais importante que 
você está mostrando na sua Bandeira”. 
Na Bandeira de São João e Acorda Povo da Várzea, foram 
identificadas outras circunstâncias. Essa expressão cultural 
assume formatos distintos e mesmo havendo uma forte presença 
de hibridismo e tradição, já houve demarcação de lugar na 
realização da prática religiosa. A mesma explica que:
 
Anos atrás, ao iniciar o mês do mês de junho, a 
bandeira de São João era hasteada na frente da igreja 
[Igreja Matriz da Várzea - Paróquia Nossa Senhora do 
Rosário] e ali tinha as orações, os cultos a São João 
Batista, tinha todo esse ritual da igreja católica. E 
o acorda povo existia, só que separado, mais ligado ao 
Candomblé. Mas, quando terminava o cortejo da Bandeira 
de São João, que chegava na frente da igreja para ser 
entregue aos padrinhos, o grupo de acorda povo também 
entrava nessa festa e como [o Acorda Povo] era uma 
festa mais profana, tinha bebidas, tinha todas aquelas 
danças diferentes da procissão de São João, que só 
cantava músicas religiosas, e o acorda povo trazia 
toda essa festividade de alegria, de muita zoada, de 
muita dança ligado a Xangô, ao Orixá Xangô.
Cabe apontar que no candomblé a dança, a música, a festa, 
são afirmações do sagrado, assim como o ato de confraternizar, 
47
que potencializa os laços de fraternidade e a promoção de 
alegria. Rita Amaral explica que
a ideia de que a vida é festa marca de modo profundo a 
visão de mundo do povo de santo e é perceptível também 
fora da religião. [...] Assim, o povo de santo será 
visto no candomblé, mas também nos afoxés, nas escolas 
de samba, nos pagodes, [...] na capoeira, nos shows 
de música afro [nas bandeiras de São João, nos acorda 
povo – grifo nosso] e em várias outras atividades 
ligadas à festa de um modo ou de outro.41
 
As pessoas que outrora acompanhavam o Acorda Povo da Várzea 
pertenciam ao Terreiro da conhecida “Tia Zu”, Ialorixá que 
residia na comunidade Ambolê, próxima ao bairro da Várzea. Até 
falecer, a Ialorixá passou por sérios problemas de saúde e suas 
filhas acharam por bem retirar a bandeira do Terreiro, “ela se 
emocionava muito e fazia uma força imensa para ficar de pé e 
fazer a louvação a Xangô, então a gente evitava passar por lá 
e por esse motivo a bandeira começou a ficar guardada na minha 
casa”, diz Antonieta. Quando aconteciam os ensaios, etapa 
precedente à saída da bandeira, bem como no dia do cortejo, a 
filha de Tia Zu passou a realizar a “louvação a Xangô”, mas após 
o falecimento da Ialorixá, as atividades do terreiro foram 
suspensas. “Entristeceu o terreiro, entristeceu as pessoas, 
as filhas dela não tiveram muita garra para continuar”.
Desse modo, houve maior prevalência do catolicismo, “As 
pessoas que assumiam a bandeira permitiam que a gente cantasse 
o louvor a Xangô, mas de maneira tradicional, não de fé”.
Durante a pesquisa, foi possível observar, em um dos ensaios, 
a atenção do casal padrinho com a recepção aos convidados, 
a bandeira de São João hasteada em frente à casa, o andor 
iluminado, a decoração local e uma mesa farta com comidas 
regionais, denominada “lanche solidário”. Houve, ainda, uma 
oficina de manipulação do “quentão”, aperitivo à base de 
41
AMARAL, Rita. O tempo 
de festa é sempre. In. 
Travessia. Revista do 
Migrante n. 15, janeiro/
abril, Centro de Estudos 
Migratórios – CEM, São 
Paulo, 1993.
48
aguardente, frutas e ervas, consumida tradicionalmente nos 
ensaios e durante o cortejo. Um coral de mulheres, acompanhado 
por um jovem tocando atabaque, ensaiava cantigas juninas e 
entre as canções, apenas uma fez menção ao Orixá Xangô, sendo 
a estrofe repetida várias vezes:
Meu pai São João Batista é Xangô
Dono do meu destino até o fim
Se um dia me faltar a fé no meu senhor
Derrame essa pedreira sobre mim.
Antonieta Vidal, além de coordenar a Bandeira de São João e 
Acorda Povo da Várzea, criou a Bandeira de Santo Antônio, em 
agradecimento pela superação de algumas dificuldades ocorridas 
no interior de sua família. Ela relata:
Sempre pedi a Santo Antônio, como padroeiro da família, 
a me orientar, me dar essa sabedoria, estar à frente da 
minha família, porque fiquei viúva muito cedo e meus filhos 
pequeninos ficaram comigo. Então, era Santo Antônio, São 
José e São Francisco, a quem eu pedia muita sabedoria 
para educá-los, para orientá-los. E aí o surgimento da 
Bandeira foi um agradecimento; minha filha disse: vamos 
pedir a Santo Antônio; ele vai nos orientar e a oração 
do Responsório de Santo Antônio é uma oração muito forte 
e por toda a história que eu fui educada pela minha mãe, 
ela colocava pra gente esse amor pelo santo. Eu quis 
fazer a bandeira em forma de agradecimento. Eu digo, 
verdadeiramente, que o momento especial foi agradecer a 
Santo Antônio a vida da minha netinha.
Durante três dias consecutivos, precedentes ao desfile 
da Bandeira, Antonieta organiza em sua casa uma reunião de 
pessoas. com o propósito de fazer preces, leituras e citações 
49
sobre a vida e os milagres de Santo Antônio de Pádua. Elas 
mentalizam as suas súplicas e recitam o “Responsório”, oração 
de grande força para a realização dos pedidos. Ela denomina 
“Trido(sic) de Santo Antônio, etapa preparatória à saída da 
Bandeira, [...] é justamente para mostrar o agradecimento, a 
alegria [pela graça alcançada], que a gente desfila na rua e 
faz a festa para nossa comunidade”. O “Responsório de Santo 
Antônio” é o seguinte: 
“Se milagres desejais,
Recorrei a Santo António;
Vereis fugir o demónio
E as tentações infernais.
Recupera-se o perdido.
Rompe-se a dura prisão
E no lugar do furacão
Cede o mar embravecido.
Todos os males humanos
Se moderam se retiram,
Digam-no aqueles que o viram,
E digam-no os lusitanos.
Recupera-se o perdido.
Rompe-se a dura prisão
E no auge do furacãoCede o mar embravecido.
Pela sua intercessão
Foge a peste, o erro, a morte,
50
O fraco torna-se forte
E torna-se o enfermo são.
Recupera-se o perdido.
Rompe-se a dura prisão
E no auge do furacão
Cede o mar embravecido.
Glória ao Pai, e ao Filho, e ao Espírito Santo.
Recupera-se o perdido.
Rompe-se a dura prisão
E no auge do furacão
Cede o mar embravecido.
Rogai por nós, bem-aventurado António.
Para que sejamos dignos das Promessas de Cristo.”
 
O desfile da Bandeira de Santo Antônio percorre com muita 
animação algumas ruas do bairro da Várzea, acompanhado por um 
grupo tocando instrumentos percussivos, cantando músicas do 
ciclo junino, enquanto uma imagem de Santo Antônio é passada 
de mão em mão. Numa demonstração de fé, as pessoas oram, fazem 
seus pedidos olhando a imagem, repassando-a continuamente. 
Finalizamos esses apontamentos observando a grandeza dos 
saberes que fazem dos Acorda Povo e das Bandeiras dos Santos 
Juninos de Pernambuco uma construção social permeada de 
sentimentos e de subjetividades. Os símbolos e significados 
existentes na prática desses bens culturais estabelecem uma 
linha tênue entre as festas e as louvações. Elas se irmanam, 
misturam-se de uma maneira a ponto de indeterminar limites 
para vivenciar o estado de alegria.
51
 
52
Os símbolos da festa e as 
subjetividades do sagrado
Impregnados de elementos simbólicos e afetivos, as Bandeiras 
dos Santos Juninos e os Acorda Povo estabelecem relações 
identitárias e de pertencimento com os sujeitos sociais; estes 
compartilham experiências na esfera da religiosidade, da 
sociabilidade, da produção artística e do simbólico, presentes 
em cada elemento da manifestação, quer seja no seu fazer ou na 
sua representação. O cenário é composto por diversos símbolos 
revestidos de sentidos não cristalizados, formando um campo 
imagético para o qual convergem e proliferam os significados 
atribuídos pelos sujeitos. 
A bandeira é um dos elementos principais da celebração, 
encarregando-se de abrir o préstito, trazendo na frente as 
imagens dos santos ligados ao ciclo junino: São José, Santo 
Antônio, São João, São Pedro, São Paulo e Sant’Ana. Elas 
são feitas com diversos materiais: tecidos diversos, fitas de 
cetim, paetês, lona de vinil, flores, veludos, folhas de ouro, 
fitas de led, chenile, pedrarias e aviamentos diversos, erguida 
por um mastro feito de madeira. São conduzidas por homens ou 
mulheres e geralmente vêm presas a um mastro. Há grupos que 
trazem três bandeiras presas num só mastro. Em geral com as 
imagens de Santo Antônio, São João e São Pedro.
Nas Bandeiras e nos Acorda Povo, São João é representado de 
duas maneiras: na imagem carregada no andor, o santo aparece 
como um homem adulto: barbudo, vestido com peles de animais. 
No estandarte, chamado também de bandeira, geralmente feito 
pelos integrantes do grupo, o santo é reproduzido como um 
menino, o São João do carneirinho, com rosto angelical, cabelos 
encaracolados, carregando uma cruz. Essas duas representações 
estão ligadas a momentos distintos da história do santo: como 
uma criança, remonta ao período de seu nascimento, cujo objetivo 
 POR DÉBORAH
CALLENDER
53
foi anunciar a vinda do messias, seu primo Jesus. Como adulto, 
São João Batista simboliza aquele que batizou Jesus nas águas 
do rio Jordão, sendo um de seus apóstolos. 
É relevante destacar que, em alguns grupos, a bandeira 
traz a imagem de São João, a coroa e o machado de Xangô 
juntos, representando o hibridismo religioso tão presente 
nessa celebração pernambucana. Resultado de uma confluência 
de afetos e emoções, a prática simboliza, nesse sentido, uma 
unidade entre os sujeitos, constituindo uma identidade de 
pertencimento e fé, uma maneira singular de sentir o sagrado 
e com ele se relacionar em que santo e orixá são cultuados nos 
mesmos espaços, na mesma celebração.
No que se refere à produção artística, a Bandeira organizada 
pelo Bloco Carnavalesco O Bonde, inicialmente denominada Bandeira 
de São João da Carroça, destaca-se por ter uma apresentação 
plástica que difere das demais. Constituída de materiais não 
encontrados em outros grupos, como folhas de ouro, lâmpadas de 
led, a Bandeira de São João da Carroça tem como sua “marca” a 
forma padronizada e elegante das vestimentas, assim como seus 
acessórios e adereços. Além das bandeiras dos santos juninos, 
O Bonde também traz, em seu cortejo, uma réplica da Igreja 
de São Pedro, lamparinas, uma fogueira cenográfica, estrela, 
lampiões e balões iluminados.
Todas as meninas, de oito a oitenta [anos de idade] elas 
têm uma roupa padrão, que também está muito ligada a essa 
questão do próprio simbolismo da Bandeira com as flores 
em homenagem a São João bordadas. Todos os meninos que 
participam da Bandeira também têm uma camisa padrão com 
todas as bandeiras impressas na camisa, que é uma coisa 
exclusiva da nossa Bandeira; as próprias bandeiras de 
São João que, inicialmente, eram confeccionadas assim, 
de uma forma mais simples, até por questão mesmo de 
recursos, hoje são todas bordadas e iluminadas, que é 
uma característica nossa; todas as nossas bandeiras têm 
54
iluminação com led. Então, tudo isso foi uma evolução, 
no sentido, naturalmente, dessa busca, principalmente, 
pela beleza, porque, quando a gente gosta de algo, a 
gente sempre quer que aquilo seja cada vez mais belo 
e quando a gente tem uma devoção por um Santo, a gente 
quer fazer o melhor possível para ele, que é santo; 
então a gente vai sempre nesse sentido crescente e 
as coisas vão evoluindo, vão mudando, vão aparecendo 
elementos.42
42
Cid do Bonde_ Bandeira 
de São João da Carroça. 
Entrevista realizada por 
Ester Monteiro de Souza. 
Recife, 05 de junho de 2018.
Procissão das Bandeiras dos Santos Juninos 2018 - 
Morro da Conceição.
Acorda Povo de Seu Manoel-Sapucaia de Dentro 
(Olinda).Bandeira de São João da Carroça.
55
Seguindo o préstito, após a bandeira, vem o andor, confeccionado 
de madeira, ferro, flores (naturais ou artificiais), tecidos, cola 
e aviamentos. O andor tem a função de levar a imagem do santo, 
a qual é decorada com flores nas cores, predominantemente branca 
e vermelha. Nas proximidades do andor, geralmente à frente, 
conduzido por uma criança, encontra-se a estrela, iluminada 
com lanternas feitas com garrafas plásticas. As estrelas são 
confeccionadas por integrantes dos grupos, com uma armação 
metálica de arame, que dá suporte para velas brancas, que são 
Andor de São João - BACNARÉ 
- Procissão das Bandeiras dos Santos 
Juninos 2018 - Morro da Conceição..
Procissão das Bandeiras dos Santos Juninos 2018 - 
Morro da Conceição.
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acesas no centro e revestidas, em geral, com tecidos nas cores 
vermelha e branca. Alguns Acorda Povo trazem mais de uma 
estrela em cores diversas.
Em alguns grupos, a cada ano uma pessoa da comunidade fica 
responsável por receber o andor, a imagem de São João e a 
bandeira do Acorda Povo, sendo denominada de juíza. Essas 
pessoas, geralmente, são pagadoras de promessas e assumem a 
responsabilidade com a ornamentação das ruas da comunidade, 
além de ficarem responsáveis pelos cuidados dos principais 
símbolos da celebração (andor, imagem e bandeira), por um ano.
O cortejo segue pelas ruas dos bairros, ao som de músicas 
executadas com instrumentos de sopro e percussão, junto com 
preces e louvações. Os devotos seguem em procissão, com o santo 
em cima do andor, conduzido nos ombros por homens ou em cima de 
um carro aberto, transformando naquele instante, casas, ruas, 
becos e vielas em territórios religiosos, ao estabelecer novos 
sentidos e configurações aos espaços. Esses lugares geográficos 
Á esq. Acorda Povo Cambinda Estrela e Á dir. Acorda Povo de Amaro Branco.
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(casas, ruas e avenidas) que, cotidianamente são utilizados 
com funções rotineiras: residências, caminhos dos transeuntes 
ao trabalho, pontos de comércio e lazer, em determinado 
espaço-tempo adquirem outros significados, seja por meio de 
símbolos ou por meio das condutas

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