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CENTRO UNIVERSITÁRIO INTERNACIONAL UNINTER CURSO DE BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL OZIANE RIBEIRO BEDIM 2649547 NEGLIGÊNCIA INTRAFAMILIAR CONTRA A PESSOA IDOSA RONDON DO PARÁ- PA 2022 OZIANE RIBEIRO BEDIM RU: (2649547) NEGLIGÊNCIA INTRAFAMILIAR CONTRA A PESSOA IDOSA Trabalho de Conclusão de Curso de graduação, apresentado à disciplina e Orientação de Trabalho de Conclusão de Curso - OTCC, do curso de Bacharelado em Serviço Social do Centro Universitário Internacional UNINTER, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel. Orientador: Prof. Esp. João Paulo Moreira Fernandes RONDON DO PARÁ- PA 2022 OZIANE RIBEIRO BEDIM RU: (2649547) NEGLIGÊNCIA INTRAFAMILIAR CONTRA A PESSOA IDOSA Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação, apresentado à disciplina de Orientação de Trabalho de Conclusão de Curso - OTCC, do curso de Bacharelado em Serviço Social do Centro Universitário Internacional UNINTER / Curitiba-PR, como requisito final para a obtenção do título de Bacharel. Aprovado em: ____ de ___________ de 2022. BANCA EXAMINADORA _____________________________________ Professor 1(Titulação e nome completo) Instituição 1 _____________________________________ Professor 2 (Titulação e nome completo) Instituição 2 _____________________________________ Professor 3 (Titulação e nome completo) Instituição 3 (Orientador) Dedicatória deve ficar no final da página e alinhada á direita. AGRADECIMENTOS Começo por agradecer a Deus por, ao longo deste processo complicado e desgastante, me ter feito ver o caminho, nos momentos em que pensei em desistir. Não posso deixar de agradecer a esta universidade por ser um espaço que privilegia o conhecimento e onde todas as ideias são bem recebidas. Deixo também um agradecimento especial aos meus professores, pois sem eles esta monografia não teria sido possível. Aos meus pais, eu devo a vida e todas as oportunidades que nela tive e que espero um dia poder lhes retribuir. Agradeço ainda aos meus amigos e familiares que ao longo desta etapa me encorajaram e me apoiaram, fazendo com que esta fosse uma das melhores fases da minha vida. A conquista é um acaso que talvez dependa mais das falhas dos vencidos do que do gênio do vencedor. (Madame de Staël) RESUMO O presente artigo tem, como objeto de estudo, a Negligência Familiar Contra o Idoso. Questionando-se qual é a concepção que os idosos têm em relação à negligência e o que a mesma causa em suas vidas. O interesse quanto a essa temática se deu mediante a realização do estágio supervisionado, em que se observaram várias situações de negligência contra o idoso. Partiu-se do pressuposto de que esses idosos, em grande parte, sofrem ou já sofreram algum tipo de negligência, dentro ou fora de suas casas, principalmente, no seio familiar, e na participação de grupos de conviência pode-se ter acesso às informações sobre eles e, assim, possivelmente, identificar quando ou se já sofreram algum tipo de desmazelo. Desta forma, esta obra tem por objetivo mostrar a negligência familiar contra a pessoa idosa e qual o papel fundamental da Assistência Social na solução da problemática. Como metodologia, além da experiência obtida no campo de estágio, partiu de uma revisão bibliográfica sobre o assunto. Os resultados obtidos, percebeu-se que os idosos, ao longo de suas vidas, perdem alguns sentidos, têm as dificuldades da idade, e também, muitas vezes, têm problemas com a audição, visão, baixa mobilidade, enfim, necessitam que as informações sejam apresentadas a eles com diversas estratégias e metodologias. Palavras-chave: Idoso. Negligência. Assistência Social. ABSTRACT This article has, as its object of study, Family Negligence Against the Elderly. Questioning what is the conception that the elderly have in relation to neglect and what the same causes in their lives. The interest in this theme was based on the supervised internship, in which several situations of negligence against the elderly were observed. It was assumed that these elderly people, for the most part, suffer or have already suffered some type of negligence, inside or outside their homes, especially within the family, and in the participation of groups of conviviality, one can have access to information. about them and, thus, possibly identify when or if they have already suffered some type of neglect. In this way, this work aims to show family negligence against the elderly and the fundamental role of Social Assistance in solving the problem. As a methodology, in addition to the experience obtained in the internship field, it started with a literature review on the subject. The results obtained, it was noticed that the elderly, throughout their lives, lose some senses, have the difficulties of age, and also often have problems with hearing, vision, low mobility, in short, they need the information be presented to them with different strategies and methodologies. Key-words: Old man. Negligence. Social assistance. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 09 2 A VIOLÊNCIA CONTRA A PESSOA IDOSA ............................................ 122 3 O PAPEL DO ASSISTENTE SOCIAL NA AÇÃO CONTRA A VIOLÊNCIA A PESSOA IDOSA ....................................................................................................... 20 4 DIREITOS E GARANTIAS DA PESSOA IDOSA..........................................25 5 O SERVIÇO SOCIAL NO TRATAMENTO DA NEGLIGÊNCIA CONTRA A PESSOA IDOSA........................................................................................................34 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 37 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 39 9 1 INTRODUÇÃO O Presente Trabalho de Conclusão de Curso é fruto de uma revisão bibliográfica que busca salientar, argumentar e exaltar a importância da assistência social na necessidade negligência intrafamiliar contra a pessoa idosa. Para tanto, torna-se importante levantar as causas da ocorrência da negligência intrafamiliar contra a pessoa idosa a fim de subsidiar a elaboração de políticas públicas que deem conta de enfrentar esta questão, considerando o aumento e expansão do envelhecimento populacional e as transformações decorrentes disso. Além, de subsidiar a atuação dos profissionais, especialmente os Assistentes Sociais que trabalham no cotidiano da intervenção profissional com a questão da violação dos direitos da pessoa idosa. As pesquisas na área de Gerontologia e Geriatria estão em desenvolvimento considerável, devido ao crescimento da população de idosos a nível mundial. Segundo a definição da Organização das Nações Unidas (ONU), são consideradas idosas todas as pessoas com idade superior a 65 anos que residem nos países desenvolvidos e 60 nos países em desenvolvimento. O processo de envelhecimento populacional é um fenômeno nos países desenvolvidos que se tem consolidado nos países em desenvolvimento (QUINTANA et al., 2014). De acordo com estimativas elaboradas e divulgadas pelo IBGE (2018) o número de idosos deverá aumentar. Por volta do ano de 2050, haverá, no Brasil, 73 idosos para cada 100 crianças. O estudo divulgou ainda que no ano de 2050 a população brasileira será de aproximadamente 215 milhões de habitantes.Um fator que permite o envelhecimento da população é o aumento na expectativa de vida dos brasileiros, hoje de 72,78 anos. Mas apesar disso, ocasionou como consequência negativa o aumento de ocorrência em maus-tratos, omissão de cuidados, abandono, violência contra este estrato populacional, pois quanto maior a população, maior os índices de negligências geradas. Os autores Minayo (2003) e Faleiros (2007), conceituam a negligência como à recusa ou à omissão de cuidados devidos e necessários a pessoa idosa, por parte dos responsáveis familiares ou institucionais. É uma das formas de violência contra a pessoa idosa mais presente no país, se manifesta tanto no âmbito doméstico quanto institucional, frequentemente, associada a outros abusos que geram lesões e traumas físicos, emocionais e sociais, em particular, para as que se encontram em situação de múltipla dependência e vulnerabilidade. 10 A negligência familiar acontece devido à sobrecarga do cuidador familiar, falta de condições físicas e financeiras, conflitos familiares, vínculos familiares fragilizados e o despreparo do cuidador familiar para prestar os cuidados à pessoa idosa aliada a políticas públicas incipientes e centralizadas no papel da família como cuidadora. O assistente social é um ator de extrema importância para o cidadão que envelhece. A ação desse profissional é totalmente sustentada pela legislação destinada a este segmento etário. Seu papel fundamental é buscar a viabilização das Políticas Públicas, estimulando o protagonismo social dos idosos e seus familiares no que tange ao exercício dos direitos a eles destinados. Diante o exposto, a Constituição Federal de 1988, bem como o Estatuto do Idoso no artigo 3º e, a Política Nacional do Idoso centralizam na família a garantia da proteção social, da sociedade e do Estado. Ressalta também a responsabilidade da sociedade e do Estado, juntamente com a família de amparar as pessoas idosas e que isto deve ser feito, preferencialmente, nos lares, em detrimento do “asilar”. Conforme artigo 230 da CF/88 que dispõe: “A família, a sociedade e o Estado tem o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo o direito à vida”. (CF/88). Como objetivo do estudo que é identificar os fatores que contribuem com a negligência intrafamiliar contra a pessoa idosa do município de Rondon do Pará e o papel do assistente social, iremos caracterizar o perfil da pessoa idosa vítima de negligência e, além disso, também analisar a situação socioeconômica e a legislação. Teremos também que conhecer as dificuldades encontradas pela família em prestar cuidados e o papel do assistente social para que dessa forma, possamos traçar possibilidades para a resolução da problemática. Apresenta uma abordagem qualitativa, onde o método empregado corresponde ao estudo de caso, que como conceitua Gil (2007, p.58) é um estudo aprofundado sobre objetos que podem ser um indivíduo, uma organização, um grupo ou um fenômeno e que pode ser aplicando nas mais diversas áreas do conhecimento. Para tanto, torna-se importante levantar as causas da ocorrência da negligência intrafamiliar contra a pessoa idosa a fim de subsidiar a elaboração de políticas públicas que deem conta de enfrentar esta questão, considerando o aumento e expansão do envelhecimento populacional e as transformações decorrentes disso. Além, de subsidiar a atuação dos profissionais, especialmente 11 os Assistentes Sociais que trabalham no cotidiano da intervenção profissional com a questão da violação dos direitos da pessoa idosa. Esta fase da vida é única e importante, e que traz modificações biopsicossociais as quais devem ser respeitadas. Essa etapa de vida não pode ser vista como negativa, pois os idosos ainda têm muito a nos ensinar sobre ela. São vários os fatores que influenciam e promovem uma certa desordem na família, os quais coagulam em uma vulnerabilidade ao desenvolvimento de doenças no idoso, pois traz sequelas, provoca isolamento social, depressão, abala a autoestima e o bem-estar, gera gastos com a saúde e causa danos irreparáveis. Segundo o IESB (2021) no Brasil, as denúncias de violações contra essa parcela da população registraram nos primeiros meses de 2021, 33,6 mil casos de violência através do Disque 100. Assim, os assistentes sociais trabalham diariamente com questões sociais, que os indivíduos vivenciam no trabalho, na família, na saúde, habitação, dentre outras, pois comprometido com as causas sociais, assumem como agentes políticos de transformação social, ultrapassam a execução das políticas sociais e aliam-se aos movimentos sociais que garantam o usufruto da cidadania. Porém, é necessário que medidas preventivas sejam empregadas no intuito de que haja uma maior conscientização sobre assunto, para que assim a problemática seja amenizada. Dessa forma, o estudo deste tema torna-se importante e é imprescindível que aconteçam outros referentes à temática abordada, considerando que o envelhecimento populacional é um fenômeno mundial e, em processo de expansão. Em relação ao meio acadêmico esse trabalho serve como um instrumento de apoio a estudantes e pesquisadores, que objetivam entender a situação da população idosa no país. No que concerne ao meio social, o trabalho poderá ser útil, para associações, centros, e demais departamentos que tem por finalidade o acolhimento e promoção da qualidade de vida para o idoso, podendo ser um recurso informativo para diferentes públicos. 12 2 A VIOLÊNCIA CONTRA A PESSOA IDOSA É natural julgar ser jovem, moço, mas é natural que muitos guardem em segredo a sua velhice, neste mundo abraçado pela modernização é de praxe viver a contemporaneidade no decorrer dos dias. No entanto, a velhice repousa na humanidade, é destinada a todos os que têm vida e não a alguns, em silêncio se aposenta para tomar os poucos que lhe resta. Já que a humanidade não pode ser imortal, diante de tanta tecnologia, há meios para retardar esse estado de velhice, mas que um dia vai chegar. Dessa forma, de acordo com Carbone; Reis (2014): A expectativa de vida cresceu enormemente durante o século XX, dando um salto nunca antes observado. Em 1900, a expectativa média do brasileiro ao nascer era de 33 anos. Hoje é de 68, mais do que o dobro. Nos Estados Unidos, evoluiu de 47 para 75 anos no mesmo período, chegando ao índice de 80 anos em vários países no fim do século passado. Esse incrível aumento da expectativa de vida faz muita gente sonhar em chegar ativo e saudável aos 100 ou 120 anos de idade, buscando modos de prevenir ou retardar o envelhecimento de nossos corpos. (CARBONE; REIS, 2014 p. 269). A individualidade é uma das características mais contraditórias da velhice. BEAUVOIR (1990) a considera como “aventura individual” e Teixeira (2008) a define como “diferenciada e desigual”. No entanto, essa noção de individualidade, compreendida como diferenciação entre as classes sociais, adquire características típicas da lógica do capital, no tratamento às questões relacionadas ao envelhecimento, nas quais o sujeito velho vem a ser, na contemporaneidade, o principal ou o único responsável pelo seu envelhecimento bem-sucedido. Essa realidade, segundo Campelo e PAIVA (2012, p.116), tem a ver com a “lógica do longo e árduo processo de vida e trabalho, desumanizando a velhice dos trabalhadores; lógica que responsabiliza e culpabiliza o indivíduo pela tragédia da qual é parte”. O processo de trabalho que medeia o envelhecimento da classe trabalhadora vai além das suas atividades laborais. Em acordo com Guerra (2011), nas concepções teórico-metodológicas marxianas, a relação entre natureza e sociedade encontra-se mediada pelo processo de Trabalho, este apreendido enquanto objetivação fundante do ser sociale que incorpora a intencionalidade das ações humanas e o desenvolvimento da sua essência. Difere da forma como o trabalho foi reduzido ao perverso, desigual, competitivo meio de subsistência, servindo aos 13 interesses do capital através da apropriação da mais-valia do trabalhador e de outras formas de desvalorização. Dessa forma, as condições materiais e objetivas do processo de envelhecimento da classe trabalhadora são desenvolvidas no caótico cenário marcado pelo desemprego estrutural, baixos salários, empregos temporários ou informais, contratos de trabalho precarizados, escassez ou ausência de diversos bens e serviços básicos. Ou seja, são as expressões de um fenômeno mais amplo, crivado nas sociedades capitalistas chamado de “Questão Social”, associadas às tensões da luta de classes, advindas das relações de produção e reprodução fundadas na sociedade moderna. Este estudo adota a expressão encontrada em Iamamoto (2001, p.10), a qual considera a “questão social enquanto parte constitutiva das relações sociais capitalistas, apreendida como expressão ampliada das desigualdades sociais: o anverso do desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social”. Netto (2001) esclarece que a expressão “questão social” surgiu no século XVIII para dar conta do fenômeno do pauperismo, fruto da primeira onda industrializante na Inglaterra e afirma não haver uma “nova questão social” e sim, desdobramentos históricos, novas expressões da velha “questão social”, iniciada no processo de industrialização. O fenômeno da violência é universal, pois está presente nas diversas sociedades. Manifesta-se nas relações sociais entre classes, gêneros, etnias, grupos etários, relações afetivas e até mesmo em esferas específicas: Família, instituições, comunidades e poder político. Em virtude de tudo isso, sua natureza é complexa e multifatorial. Contudo, há grupos especificamente mais vulneráveis a sofrer violências, como mulheres, crianças, pessoas com deficiência e pessoas idosas. No Brasil, o crescente envelhecimento populacional chama a atenção da sociedade, das famílias e do poder público para as diversas formas de violência sofridas pelo segmento idoso. Em acordo com Minayo (2005), as diversas formas de violência contra os velhos agrupam-se em três tipos: Estrutural, institucional e interpessoal ou familiar. A pobreza e a discriminação associadas à desigualdade social resultam na violência estrutural. Dessa forma, a violência estrutural, associada à violência institucional adquire centralidade neste estudo. A velhice, aqui abordada, atende a uma perspectiva de classe, qual seja a da classe trabalhadora. Neste sentido, Alves (2011, p.32) informa: “A classe 14 trabalhadora não se define pelo nível de empregabilidade, mas pela condição dos sujeitos sociais que dependem da sua força de trabalho para se reproduzir social e materialmente”. Exposta a condições aviltantes, desempregada, com empregos temporários ou informais, a classe trabalhadora enfrenta maiores dificuldades para a satisfação de suas necessidades. Na velhice, experimenta o resultado do acúmulo do processo de exploração do trabalho, vivido ao longo de toda a vida. A pobreza que vulnerabiliza a classe trabalhadora deve ser entendida para além da ausência de renda. É também representada pela precariedade ou insuficiência de diversos bens e serviços básicos, tais como os de saúde, saneamento básico, educação, transporte, assistência social, cultura e lazer. Diante desse cenário, evidencia-se a omissão1 do Estado2 na oferta dos mecanismos necessários para responder à totalidade das demandas do envelhecimento, via Políticas Sociais. Uma vez que, a velhice não é uma fase isolada das demais, e sim resultante do que foi construído ao longo de toda a vida. Em outras palavras, no Brasil, a classe trabalhadora envelhecida de hoje não contou, como ocorreu em países do norte americano e europeus, com o necessário aparato do Estado para a sua reprodução, desde o nascimento, ou até mesmo antes dele, e agora experimenta a negação da satisfação de suas necessidades, principalmente na fase da vida demandante dos maiores gastos. A violência contra a pessoa idosa está se tornando cada vez mais frequente atualmente e tomando rumos exacerbadores, de forma serena as mazelas entram em destaque, ganham formas e de maneira evidente repercutem uma realidade ainda não tão levada a sério, mas assistida pelas autoridades governamentais, sociedade, pelos vizinhos e até mesmo por parte dos familiares a quem compete zelar sem limites ao seu nonagenário. Há os que prezem e se sensibilizem de forma a compreender que, ainda de cabelinhos brancos, curvado, de suaves passadas e _______________ 1 Há o reconhecimento da ausência de Políticas Sociais aos Idosos em situação de risco, ou seja, aqueles que estão com os seus direitos violados, no Plano de Ação para o enfrentamento da violência contra a pessoa idosa (Brasil, 2005). Ao mesmo tempo em que se afirma essa ausência, reconhece a obrigação constitucional e moral do País da proteção aos seus idosos, haja vista os diversos tratados internacionais dos quais é signatário. 2 “[...] Conceito de Estado no capitalismo maduro, que pode ser entendido na perspectiva de que possui uma autonomia relativa, e é marcado por diretiva política com consciência de classe, ou seja, trata-se de um Estado ampliado com hegemonia burguesa; [...]” (Boschetti & Behring, 2009, p.19.) 15 de gestos brandos, sobre essas características há um ser humano que postula devido a alguns fatores de ser compreendido, de ser integrado aos moldes contemporâneos de sociedade os quais lhe proporcionará a viver com dignidade e de ser feliz até o momento do encerramento do seu ciclo nesta fase da vida. Há casos em que a vulnerabilidade se completa com uma face enrugada, sinônimo de uma fisionomia cansada e intrínseca aos períodos passados já vivenciados e de diversas formas foram desfrutados sem receio algum. Não só a violência física, mas psicológica, a negligência e dentre outras mais atingem um patamar sem nível e sem receio no sentido de despojá-los a beira das calçadas, nas instituições seja ela qual for e de acolhimento. No entanto, a violência é um ato que está em todas as esferas sociais, que acontece diariamente em todo o país e no mundo. Se tornando um ato corriqueiro, além de ser um constrangimento quando de forma físico ou moral, ela atinge todas as categorias sendo familiares ou não, de pouca ou média idade, ou que seja idoso, podendo chegar até mesmo, a um recém- nascido inocente que há pouco, não teve a oportunidade de saudar no novo mundo. Logo, entende-se violência segundo Segalla (2005, p. 871) “violência s.f. 1. ímpeto; arrebatamento: impressionou-me a violência do abraço. 2. Força; Vigor. 3. Agressividade. 4. Agressão; Ataque. 5. Transgressão; Violação: violência contra os Direitos Humanos”. Para Mattos (2005, p. 626) violência s.f. 1. Força usada contra pessoa ou coisa. 2. Força muito grande. Logo sobrepondo à clareza do significado de violência, para o Segalla (2005, p. 871) e Mattos (2005, p. 626) dicionário da língua portuguesa, ressalvando Michaud (1989, p. 81): A definição de violência é o ato de violentar; e violentar é exercer violência sobre; estuprar; forçar, arrombar; desrespeitar; constranger-se, desrespeitar-se. Conforme a definição vê-se que a violência é um dos atos mais abomináveis da humanidade e que ela se desdobra de várias maneiras, em outras palavras, a violência tem várias faces (MICHAUD, 1989, p. 81). Se tratando da violência contra a pessoa idosa, quase sempre de um ser humano indefeso, em alguns casos apresenta total fragilidade pelo estado que se encontra se, estando acamados, sendo cadeirantes, com suas limitações ou não. A depender da gravidade desse ato de violência, esta pode causar danos irreversíveisà saúde do idoso, tanto fisicamente ou psicologicamente. Enfim, todos esses tipos 16 de ação ou omissão podem provocar lesões graves e levar o idoso até a morte. Em todos esses conceitos acordados, a violência caracteriza-se um ato antissocial humano, sem formas e sem limites, desumanas e muitas das vezes impiedosas. Consequentemente no sentido de esmiuçar a respeito da temática, violência contra a pessoa idosa. Segundo Faleiros (2005) nesse sentido, a violência contra a pessoa idosa pode assumir várias formas e correr em diferentes situações, é possível dimensioná-la em toda a sua abrangência: A-Violência sociopolítica: refere-se principalmente às relações sociais mais gerais que envolvem grupos e pessoas consideradas delinquentes comuns e as estruturas econômicas e políticas da desigualdade nas relações de exclusão/exploração/periferização de conglomerados humanos significativos. Dessa violência a os idosos e idosas falam, denunciam, tratando-se de uma “violência falada” nos debates, nas denúncias comuns nas Delegacias de Polícia. Essa violência atinge idosos e não idosos, mas tem sua especificidade ao se aproveitar de situações de fragilização ou vulnerabilidade das pessoas idosas para a prática de furtos, assaltos, roubos, discriminação aos transportes, discriminação no transporte, descriminação social. B-Violência institucional: refere-se a um tipo de relação existente nos abrigos e instituições de serviços, privadas ou públicas, nos quais se negam ou atrasa o acesso, não se leva em conta a prioridade legal, não se ouve com paciência, devolve-se para casa, humilha-se por incontinência ou alguma perda, infantiliza-se o idoso, hostiliza-se a pessoa idosa, não se ouve sua palavra e não se respeita sua autonomia. C-Violência intrafamiliar: é a “violência calada”, sofrida em silencio muitas vezes, praticadas por filho, filhas, cônjuges, netos, netas, irmãos, irmãs ou parentes e vizinhos próximos, conhecidos da vítima (FALEIROS, 2005, p. 43). Observa-se que o idoso está sujeito a ser violentado de várias formas e esses atos violentos denominam-se de vários tipos distintos. Para a violência sociopolítica, ela está dentro da sociedade em geral, a um desrespeito perante a pessoa idosa quando, por exemplo, ao sair necessitar de um transporte. Mas se esse idoso for posto em uma instituição pública ou privada que ofertem serviços à pessoa idosa, refere-se à violência institucional e para a violência intrafamiliar, a mais preocupante, está centrada dentro da própria família, familiares próximos ou não. Por sua vez, a natureza da violência sobre o idoso pode se manifestar de várias formas. Segundo Minayo (2005) diante deste contexto, pretende de forma parcial facilitar o entendimento sobra à temática, violência contra a pessoa idosa. A seguir em destaque a definição das formas de violência, às quais se destacam comumente contra a pessoa Idosa: A-Violência Física: é o uso da força física para compelir os idosos a fazerem o que não desejam, para feri-los, provocar dor, incapacidade ou 17 morte. B-Violência Psicológica: corresponde a agressões verbais ou gestuais como objetivo de aterrorizar, humilhar, restringir a liberdade ou isolar do convívio social. C-Violência Sexual: refere-se ao ato ou jogo sexual de caráter homo ou hetero-relacional, utilizando pessoas idosas. Esses abusos visam a obter excitação, relação sexual ou práticas eróticas por meio de aliciamento, violência física ou ameaças. D-Abandono: é uma de violência que se manifesta pela ausência ou deserção dos responsáveis governamentais, institucionais ou familiares de prestaremos corro a uma pessoa idosa que necessite de proteção e assistência. E-Negligência: refere-se à recusa ou à omissão de cuidados devidos e necessários aos idosos por parte dos responsáveis familiares ou institucionais. A negligência é uma das formas de violência mais presente no país ela se manifesta, frequentemente, associada a outros abusos que geram lesões e Traumas físicos, emocionais e sociais, em particular, para as que se encontram em situação de múltipla dependência ou incapacidade. F-Violência Financeira ou econômica: consiste na exploração imprópria ou ilegal ou ao uso não consentido pela pessoa idosa de seus recursos financeiros e patrimoniais. G-Autonegligência: diz respeito à conduta da pessoa idosa que ameaça sua própria a saúde ou segurança, pela recusa de prover cuidados necessários a si mesma. H-Violência Medicamentosa: é administração por familiares, cuidadores e profissionais dos medicamentos prescritos, de forma indevida, aumentando, diminuindo ou excluindo os medicamentos. J- Violência Emocional e Social: refere-se à agressão verbal crônica, incluindo palavras depreciativas que possam desrespeitar a identidade, dignidade e autoestima. Caracteriza-se pela falta de respeito à intimidade; falta de respeito aos desejos, negação do acesso a amizades, desatenção a necessidades sociais e de saúde (MINAYO, 2005, s.p.). Desta forma, podemos frisar que as condições de vida que o idoso se submete ou aquelas que o idoso é submetido, referentes ao já abordado anteriormente, devem ser consideradas situações de risco. Considerando-se o seguinte: a violência física além das graves lesões pode levar até a morte, a psicológico são todas as formas de menosprezo, de desprezo e de preconceito e discriminação que trazem como consequência tristeza, isolamento, solidão, sofrimento mental e, frequentemente, depressão, por exemplo, expressões como: “você já não serve para nada”; “você já deveria ter morrido mesmo”. A violência sexual são práticas eróticas e pornográficas, costumam sofrer também de violência física, psicológica e negligência. O abandono a mais comum, caracterizada pela própria família. A negligência, por exemplo, na área da saúde, o desleixo e a inoperância dos órgãos de vigilância sanitária em relação aos abrigos e clínicas. A financeira ou econômica, que pode vir também da própria família, pela posse dos bens, pensões, aposentadoria e outras ações cometidos por órgãos públicos e privados. A autonegligência, o idoso comete suicídio, atitude de se isolar, fica acamado. A medicamentosa, medicação indevida. Emocional e Social, agressão verbal, incluindo palavras depreciativas. 18 O Estatuto do Idoso (Brasil, 2003, p.9), homologado há dez anos, prevê no seu artigo 9º: “É obrigação do Estado, garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade”. Todavia, esse direito não contempla a velhice miserável, isolada, abandonada e adoecida. A precariedade ou a completa omissão do Estado, mediante as Políticas Sociais Públicas, rebate diretamente nas famílias, as quais têm o papel, legitimado socialmente, da assistência e cuidado para com os seus velhos. No entanto, os diversos arranjos familiares atuais, somados ao pauperismo da classe trabalhadora, não permitem ao velho isolado, debilitado e dependente a satisfação de suas necessidades e o recebimento dos devidos cuidados por parte da sua família, na qual sempre haverá sobrecarga do cuidador. Normalmente esse cuidador é mulher e precisa dar conta de uma série de outros papeis, além da assistência ao velho dependente de seus cuidados. Ente a população idosa brasileira, no ano de 2010, observou-se3 que havia 16,6% de pessoas com 60 anos e mais vivendo em alguma condição de dependência e 13, 59% dessa mesma faixa etária residindo em domicílios na condição de outro parente. Tal realidade caminha na contramão do que preconiza a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), a qual incorpora o caráter da Proteção Social articulada com outras políticas. Apontam-se a velhice e a pobreza, dentre outras vicissitudes, como indicadores que necessitam de formas Institucionalizadas de proteção, a partir de então asseguradaspela Política de Assistência Social, através das Proteções Sociais Básica e Especial, organizadas no Sistema Único da Assistência Social (SUAS). Conforme está posto na PNAS (Brasil, 2004), essas Proteções devem dar conta de fortalecer vínculos familiares e comunitários, dentre outras atribuições. Sobre a frouxidão desses vínculos, Teixeira (2008) alerta ser advinda da pobreza em que vive a classe trabalhadora. Não se pode deixar de registrar a herança histórica da Política de Assistência Social, ainda presente nos dia de hoje, marcada pelas concepções da caridade, da benemerência e da filantropia, nas quais longe de garantir direitos, subjuga os seus usuários a patamares que impossibilitam melhorias efetivas da sua condição e _______________ 3 Fonte IBGE. Censos demográficos 1991, 200 e 2010. Recuperado em 05 dezembro, 2012, de: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2011/matriz.htm#socio. 19 principalmente, inviabiliza transformações estruturais na perspectiva da sua classe social. Outros entraves da Política de Assistência Social são os parcos recursos investidos e a sua utilização enquanto instrumento político partidário, o que não permite à política avançar de ações pontuais, focais, descontinuadas, marcas da lógica capitalista. Diante desses argumentos, é possível afirmar que a classe trabalhadora envelhecida (principalmente a parcela sobrevivente na condição de dependência, isolamento, miséria e abandono) permanece aguardando vivenciar o sonho dourado denominado “envelhecimento ativo”, ilustrado na recente Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (Brasil, 2006), a qual além de trazer tal conceito, preconiza o envelhecimento ativo dentre as suas diretrizes. Fundamenta-se nos princípios da independência, participação, dignidade, assistência e autorrealização, além do reconhecimento dos direitos das pessoas idosas. Entende a saúde da pessoa idosa a partir da “interação entre a sua saúde física, a saúde mental, a independência financeira, a capacidade funcional e o suporte social.” (Brasil, 2006, p.04). É possível observar também que a velhice da classe trabalhadora sofre o estigma da naturalização das diversas formas de violência. A pobreza à qual está submetida tende a mascarar essas violações de direitos e, no máximo, a família é a culpabilizada pela complexa totalidade do fenômeno. Quando a família não consegue dar conta de cumprir o seu legitimado papel do cuidado e da assistência aos seus velhos, cabe ao Estado atender suas demandas e oferecer o suporte necessário, seja ao idoso ou à sua família. Ao menos seria o caminho caso fosse concretizado o conteúdo das Legislações em vigor no País. 20 3 O PAPEL DO ASSISTENTE SOCIAL NA AÇÃO CONTRA A VIOLÊNCIA A PESSOA IDOSA Segundo a Classificação Internacional de Doenças - CID (OMS, 1995) tanto a violência quanto os acidentes são classificados como originados por causas externas que englobam, agressões (físicas, psicológicas e sexuais), lesões autoprovocadas, acidentes de trânsito e de trabalho, quedas e envenenamentos. Porém, a diferença crucial entre as categorias violência e acidente está no fato de a primeira, além de causar danos à vida de forma geral, é também fruto de um ato proposital, enquanto que o acidente é um evento não-intencional. É possível então considerar que violência contra o idoso é um ato intencional, que pode ser perpetrado tanto por outra pessoa quanto por ele mesmo, como é o caso do suicídio ou autonegligência. Destaca-se também que a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu durante a Convenção sobre Violência e Saúde, na cidade de Genebra em 2002, a violência contra o idoso como: O abuso pode ser de natureza física ou psicológica ou pode envolver maus tratos de ordem financeira ou material. Qualquer que seja o tipo de abuso, certamente resultará em sofrimento desnecessário, lesão ou dor, perda ou violação dos direitos humanos e uma redução na qualidade de vida do idoso (OMS, 2002, p. 5). É importante salientar que em um ato de violência pode se considerar que o agressor possui não somente a necessidade de machucar o idoso, mas também a necessidade de reafirmar o seu poder sobre ele. Minayo (2004) destaca como os mais frequentes tipos de violência a física, que se trata de uso de força física com o intuito de machucar o idoso; a violência psicológica, que se trata de agressão verbal ou gestual contra o idoso; a violência sexual, que é o ato ou jogo sexual realizado contra a vontade do idoso, ou que ele não tenha capacidade de consentir; o abandono, que é a ausência de cuidados por parte do responsável legal; a negligência, que se refere à recusa de cuidados por parte do responsável pelo idoso; a exploração financeira e/ou material, que é o uso não consentido dos bens financeiros e/ou materiais do idoso; e por fim, a autonegligência, que é uma conduta da pessoa idosa que põe em risco sua própria saúde e segurança. 21 Em todos os tipos de violências descritas há a necessidade de um cuidadoso atendimento ao idoso, pois nem sempre os sinais de violência estão aparentes, e é frequente também negação do idoso de denunciar seu agressor. Um dos fatores que pode dificultar essa denúncia de violência por parte do idoso é que muitas vezes o seu agressor é alguém de sua família, o que é caracterizado como violência intrafamiliar. Esse tipo de violência pode ser definido como ações de violência realizadas dentro ou fora de casa por algum membro da família, ou ainda por pessoas com as quais o idoso não possui laços de consanguinidade, mas com que ele tenha estabelecido uma relação de afetividade, sendo que o ato de violência em si pode dar-se de diversas maneiras, algumas mais perceptíveis, outras menos. Nos casos de violência intrafamiliar, o ato da denúncia pode ser muito mais delicado, pois existem laços afetivos entre a vítima e o agressor, quando não, uma dependência entre as partes. Nessas situações, é frequente que a vítima não queira falar sobre o episódio, e surge a necessidade de uma figura profissional que seja capaz de realizar um atendimento detalhado, no qual são analisadas, além das condições físicas do idoso, também suas condições psicológicas e sociais. Além disso, existe a necessidade de que esse profissional esteja em um ambiente ao qual o idoso possa ter fácil acesso, como é o caso dos hospitais, por exemplo. Nesse sentido, é fundamental ressaltar que o Estatuto do Idoso, Lei Federal nº 10.741 de 2003, em seu artigo 19, define que: Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra o idoso serão obrigatoriamente comunicados pelos profissionais de saúde a quaisquer um dos seguintes órgãos: I) Autoridade policial, II) Ministério Público; III) Conselho Municipal do Idoso, IV) Conselho Estadual do Idoso, V) Conselho Nacional do Idoso (BRASIL, 2003). No entanto, observa-se na fala dos próprios profissionais do HRPA a dificuldade existente na denúncia de violência contra o idoso dentro da instituição por diversos motivos. Esse fato deve ser questionado à medida que existe uma legislação que lança como compulsória a notificação da violência contra o idoso. Tendo em vista que no Brasil existe uma legislação que se refere aos direitos sociais do idoso, é válido questionar por que ainda existem denúncias de que essa parcela da 22 população – principalmente a que sofre violência – não é devidamente atendida pelo sistema de saúde. Uma possibilidade levantada nesta pesquisa é que não está explícito no cotidiano da saúde as verdadeiras implicações de um ato de violência contra o idoso e o seu não atendimento adequado pelo sistema de saúde. Além do mais, ao se estudar e analisar o fenômeno da violência contra o idoso, pode se conjecturar que muitos profissionais da saúde consideram a violência contra essa parcela da população como um reflexode relações familiares frágeis ou falta de preparo de cuidadores de idosos, quando, na verdade, a violência contra o idoso pode ser considerada como produto de uma série de implicações sociais, frutos do sistema econômico vigente, visões estereotipadas dos idosos e falta de amparo pelo Estado. Sanches (2008) afirma que: A violência envolve todo um contexto que vai desde a família até os profissionais que prestam serviço ao idoso, bem como o sistema de saúde que presta cuidados procurando abarcar as implicações que a situação do idoso violentado acarreta (Araújo et AL, 2012, p.108, apud SANCHES, 2008). Sendo assim, concorda-se com Zimmerman (2000) ao afirmar que se pode dizer que o ato de o idoso dar entrada no HRPA com sinais de violência e não ter seu caso denunciado é uma segunda vitimização do usuário, em que existe a negligência e o descaso para com aquele usuário, que é detentor de direitos. Tal colocação irá explicitar a necessidade de uma articulação de políticas sociais no âmbito da saúde para o atendimento de idosos vítimas de violência, de um fluxo de atendimento bem articulado nesse contexto e, principalmente, de atuação de um profissional que trabalhe em prol da garantia dos direitos do cidadão; ou seja, há a necessidade latente da atuação do assistente social. É possível, inclusive, considerar o atendimento do Serviço Social aos idosos vítimas de violência tão importante quanto o atendimento médico, por abordar a garantia de direitos e não só o cuidado de ferimentos físicos. Nesse caminho, o assistente social tem papel fundamental no atendimento ao idoso vítima de violência pois, como já foi discutido no capítulo I, o ato da violência pode ser considerado um fenômeno social, e o assistente social é capacitado para atuar nesse âmbito. O assistente social também é peça chave no atendimento ao 23 idoso vítima de violência por sua da sua potencialidade em trabalhar as funções educativas, informativas e o fortalecimento social. Um exemplo de tal atuação do assistente social ocorre quando, por exemplo, ele utiliza-se do instrumento do encaminhamento para orientar o idoso vítima de violência sobre quais serviços procurar e como acessá-los, evitando assim que o usuário tenha que procurar por conta própria o atendimento necessário em diversas outras instituições. Essa é uma ação cotidiana do assistente social no Programa Girassol e é a demonstração efetiva da garantia do direito à informação estabelecida pelo Estatuto do Idoso. Sendo assim, este trabalho considera o Programa Girassol como um potencial garantidor dos direitos do idoso vítima de violência, pois as ações realizadas pelo assistente social contribuem para que esse profissional oriente o idoso sobre a garantia de seus direitos sociais através de políticas sociais, ações e serviços. No HRPA, a figura do assistente social, além de ter a possibilidade de responder a todas essas demandas apresentadas, ainda tem a potencialidade de investigar e atuar sobre o fato de que poucos casos de violência contra o idoso são denunciados pelos profissionais de saúde que ali trabalham. Tal afirmação pode ser observada pelo fato de que entre os 131 casos notificados no HRPA no período compreendido entre fevereiro e setembro de 2011, 76 eram referentes à violência contra crianças e adolescentes, 41 contra mulheres e apenas 09 contra idosos, sendo que dos casos referentes a idosos, não foi realizado nenhum atendimento psicossocial, devido às falhas no preenchimento da ficha de notificação6 . Tal dado, no entanto, se mostra contraditório uma vez que, no mesmo período, foram denunciados na Defensoria Pública do Distrito Federal 336 casos de violência contra idosos. Esses dados levaram ao questionamento: por que o número de casos de violência contra idosos denunciados dentro do Hospital Regional do Paranoá é relativamente menor do que o número de casos denunciados de violência contra crianças, adolescentes e mulheres? Outro fato que é importante frisar é que o número de casos de violência contra idosos que são notificados da maneira correta no HRPA é menor do que o número real de atendimentos a idosos vítimas de violência. O assistente social pode atuar abordando aspectos da problemática, como por exemplo, fazer uma entrevista social com a família para tentar entender por que esse idoso está sendo mal alimentado. Esse tipo de abordagem é muito importante, 24 pois a possibilidade é que esse idoso passe fome não por ser uma vítima de maustratos, mas sim, por que essa é uma família de baixa renda que não tem recursos para ter uma boa alimentação. A atuação do assistente social nesse contexto seria benéfica ao apontar políticas sociais para combater essa problemática no âmbito familiar, de forma que não houvesse uma culpabilização da família, mas sim uma discussão construtiva que aumentasse a qualidade de vida desse idoso, e também da sua família. O assistente social tem a possibilidade de se tornar o agente que garantirá o direito do idoso de não ser objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, como preconiza o artigo 4º do Estatuto do Idoso. Porém, essa ação não está atrelada somente à denúncia efetiva da violência e consequente punição do agressor, mas também a um trabalho de conscientização da rede de apoio a esse idoso. 25 4 DIREITOS E GARANTIAS DA PESSOA IDOSA Nos censos demográficos de 1991, 2000 e 2010, o Brasil registrou uma população com 189.467.328 pessoas vivendo na condição de baixa renda. Ou ainda pior: 16,2 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, conforme foi publicado no Plano Brasil sem miséria (2012), do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, com referência ao Censo de 2010. Quanto ao segmento idoso, apenas 25% dos aposentados têm renda equivalente a três salários mínimos ou mais, caracterizando que a maioria dos velhos é pobre ou miserável, ou seja, se reproduz socialmente sem os mínimos necessários. No Censo demográfico de 2010, consta uma população idosa de 20.590.599, dos quais, 1.623.196 recebiam o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Em 2013, observa-se o aumento do número dos velhos beneficiários do BPC passando para 1.751.989 em janeiro; 1.758.906 em fevereiro; e 1.763.297 idosos, no mês de março. Esse benefício socioassistencial corresponde a um salário mínimo mensal, sendo um dos critérios para sua concessão a renda mensal inferior a ¼ de salário mínimo per capita. Ou seja, para pleitear o BPC, a pessoa idosa tem o seu direito à previdência social negado e apresenta contexto de miséria individual ou familiar, que não cessa com a simples concessão do BPC. Outro dado necessário para dar conta dos objetivos deste estudo (Brasil, 2008 – 2009) revela o percentual de renda familiar utilizado com a assistência à saúde. Esse percentual atinge o maior índice nas famílias com renda mensal de até dois salários mínimos, perfazendo 7,50%. Entre os que recebem dois e três salários mínimos, os gastos atingem o percentual de 6,55% e entre as famílias que somam três a seis salários mínimos o percentual gasto foi de 6,19%, do orçamento familiar. A sequência apresenta uma escala decrescente de percentual gasto com saúde na medida em que aumenta a renda familiar atingindo os 4,38% para as famílias com mais de vinte e cinco salários mínimos. Ou seja, esses dados revelam um retrato da desigualdade social e da contradição em um país que dispõe de um sistema universal de saúde e mesmo assim, a classe trabalhadora, com o menor acesso à renda, compromete quase 10% do seu orçamento com a assistência à saúde. Outra realidade que convém ser apresentada aqui tem a ver com a escolaridade da população idosa, uma vez que a escolaridade incide diretamente no 26 acesso à renda e repercute sobre a saúde da população, conforme estádivulgado no site do Sistema Único de Saúde (SUS) (Brasil, 2011). Tais informações apontam os elevados índices de analfabetismo entre o segmento idoso, embora tenha havido uma redução nas últimas décadas. O ano de 2010 registrou 26% de seus velhos analfabetos, dos quais 46,5% pertencem à Região Nordeste. O analfabetismo também favorece a um contexto de vulnerabilidade aos idosos, tornando-os alvos fáceis dos diversos tipos de golpes praticados no mercado de consumo, configurando o abuso financeiro. Além disso, o fator educação incide também na percepção/compreensão que o sujeito idoso tem sobre as diversas formas de violência às quais está sujeito, refletindo assim no processo de denúncia e na sua consequente notificação. Ainda sobre o aspecto educação, tão importante para dimensionar a vulnerabilidade da classe trabalhadora envelhecida em vivenciar o contexto da negligência estrutural e institucional, o Censo de 2010, no tocante aos resultados da amostra sobre educação e deslocamento, também apresenta os números das pessoas que nunca frequentaram a escola ou a creche. Nessa publicação as pessoas com 60 anos e mais somaram os maiores números, na comparação com todas as outras faixas etárias, atingindo 4 399 254 pessoas idosas. Desse mesmo quantitativo, 1 843 925 são do sexo masculino e 2 555 329 são do sexo feminino. No que se refere ao ensino superior de graduação, o patamar de idade máximo que consta no referido Censo é de 40 anos e mais. Não há referência ao segmento idoso da população, no entanto, observa-se um decréscimo, com o aumento da idade, da quantidade de pessoas que frequentaram alguma graduação, mesmo sem concluí- la. A exemplo do exposto, os que tinham 24 anos de idade somam 3 274 256 e os que apresentam idade superior a 40 anos totalizam 653 754 (IBGE, 2010). Neste momento é conveniente recorrer mais uma vez à classificação feita pela autora Minayo (2005), sobre as formas como a violência se manifesta: (1) estrutural, decorrente da pobreza, miséria e discriminações, relacionadas à desigualdade social; (2) interpessoal, fruto das relações, comunicações e interações sociais do cotidiano; e (3) institucional, de responsabilidade do Estado e Instituições, seja pela omissão ou seja pela aplicação inapropriada de mecanismos de gestão das políticas sociais. Levando em consideração essas distinções, o presente estudo centralizou a abordagem da violência estrutural, agravada pela violência institucional, sem desconsiderar a inter-relação desses três tipos. Uma vez que este estudo 27 atende à perspectiva da classe trabalhadora, faz-se necessário dimensionar os números de alguns aspectos essenciais a essa classe, reveladores das expressões da violência estrutural e institucional que perpassam os indicadores epidemiológicos. Internacionalmente foram estabelecidas tipologias e categorias que conceituam as diversas formas de violência praticadas aos velhos. Constam na Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências, do Ministério da Saúde, do ano de 2001, as seguintes classificações: Abuso físico, maus tratos físicos ou violência física; Abuso psicológico, violência psicológica ou maus-tratos psicológicos; Abuso sexual ou violência sexual; Abandono; Negligência; Abuso financeiro e econômico e Auto-negligência (BRASIL, 2001). As reflexões sobre os idosos começaram em 1956, e a Organização das Nações Unidas (ONU) aderiu a esse tema. No entanto, as discussões sobre o envelhecimento não ganharam atenção internacional até 1982 - o "Primeiro Congresso Mundial sobre Envelhecimento" em Viena. Como resultado do debate, a região da América Latina e Caribe desenvolveu um plano de ação, além de várias reuniões, sendo uma delas realizada no Brasil. A Constituição Federal de 1988 foi a primeira legislação no Brasil a incluir o idoso em seus pré-requisitos de proteção, justiça social e direitos humanos. O Estatuto do Idoso (2003), em seu único parágrafo 3(5), enfatiza que o cuidado ao idoso deve ser realizado principalmente pela própria família, o que não é propício ao cuidado abrigado, exceto no caso do idoso. Não tem ou carece de condições especiais para se sustentar. O referido Estatuto assegura em seu artigo 23, além do amparo às pessoas idosas pela família, pela sociedade e pelo Estado, a participação dos idosos na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e assegurando o direito à vida, preferencialmente através de programas desenvolvidos em domicílio. O artigo 99 do Capítulo II do Estatuto estabelece que expor a integridade, a saúde física ou mental do idoso - submetendo-o a condições desumanas, degradantes ou privando-o de alimentação e cuidados essenciais ou trabalho excessivo/insuficiente - pode resultar em pena de prisão de dois meses a um ano e multa. Seus princípios incluem as seguintes prioridades para o atendimento ao idoso: atendimento às vítimas de violência, acolhimento de familiares de idosos 28 abandonados em instituições, apoio sociojurídico diante da exclusão social e das formas de violência, e garantindo seu direito de subsistência básico. A Lei do Idoso (Lei Federal nº 10.741) também prevê dispositivos e mecanismos para coibir a discriminação contra o idoso, estabelecer penalidades para crimes de abuso, garantir benefícios e consolidar direitos. Reafirmam-se também os princípios constitucionais e a Política Nacional do Idoso, além das políticas e programas de assistência social, serviços especiais de prevenção e atendimento às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, maus-tratos, crueldade e opressão, identificação e localização de familiares ou parentes. Tutores: Prestar proteção legal e social através de entidades para idosos abandonados em hospitais ou instituições de longa permanência, salvaguardar os direitos dos idosos, mobilizar a opinião pública e aumentar a participação social dos idosos. TIPOS DE VIOLÊNCIA A violência é uma violação dos direitos dos idosos, que podem ser tangíveis ou intangíveis. A violência visível é a violência que pode ser observada, como as marcas deixadas no corpo. Por outro lado, a violência invisível consiste em marcadores psicológicos. A violência, visível e invisível, pode deixar cicatrizes profundas nas vítimas. De acordo com a Lei do Idoso, a violência contra o idoso pode ser definida como “qualquer ato ou omissão cometido em local público ou privado que resulte em morte, lesão ou sofrimento físico ou mental” (Seção 19, Capítulo IV, Lei do Idoso), §1) . Uma das formas mais comuns de violência é a violência doméstica. Acontece em casa, em casa, e marca marcadamente a realidade de uma população cada vez mais idosa. É uma forma de violência sofrida silenciosamente, geralmente perpetrada por uma filha, filho, neto, cônjuge, irmão ou alguém próximo da vítima, implicando "[...] outro, possivelmente até vingança ou mudança. Algumas crianças acreditam que podem buscar justiça pelo seu abandono enviando os idosos para um abrigo ou abrigo e fornecendo endereços falsos para que não possam ser contatados” (FALEIROS, 2007, p. 40). A violência doméstica ocorre na casa da vítima, geralmente por familiares. Dentre as principais formas de agressão doméstica, destacam-se: física, psicológica, financeira, abuso sexual, negligência, abandono e autonegligência, que estão 29 agrupadas na rede internacional INPEA (International Network for the Prevention of Elder Abuse). O abuso físico é a forma mais óbvia de violência e pode ser definida como agressão física que causa dano, trauma, dor ou incapacidade. O abuso psicológico pode ser definido como ações que causam dor, culpa, pena ou remorso por meio de palavras ou expressões verbais. Nessa forma de violência, os familiares ou cuidadores utilizam meios emocionais contra os idosos em benefício próprio. Geralmente, os idosos nãodenunciam o abuso psicológico porque os agressores são os próprios familiares e, além de sentirem vergonha e culpa, são manipulados pelo agressor. O abuso financeiro ou de substâncias inclui o uso impróprio ou ilegal de recursos financeiros pertencentes a idosos. Os responsáveis pelos cuidados utilizam recursos financeiros para vender mercadorias e não aplicam valores aos cuidados dos idosos. Geralmente, os idosos são obrigados a assinar uma procuração para garantir que o cuidador tenha total autoridade sobre seus bens, seja um membro da família ou um cuidador empregado da família. Às vezes, as casas e os pertences dos idosos são roubados, e muitas vezes eles não sabem que foram roubados. O abuso sexual pode ser definido como contato sexual não consensual. Invadir a privacidade e a modéstia de adultos mais velhos por meio de aliciamento, violência física ou ameaças nos cuidados de saúde ou pornografia. Geralmente, está associada a outras formas de abuso que levam a danos ou traumas físicos, emocionais e sociais, especialmente entre idosos com múltiplas dependências ou deficiências. A negligência é entendida como a falta de responsabilidade no cuidado ao idoso. São os familiares ou o Estado que cuidam do idoso sem garantir sua qualidade de vida e bem-estar, deixando o idoso em situações de vulnerabilidade como: falta de alimentação, vestuário, cuidados de higiene, abrigo, assistência médica ou odontológica adequada, e outros cuidados básicos. O abandono caracteriza-se por deixar o idoso sozinho, sem ajuda ou proteção. O abandono também se configura quando um familiar transfere a responsabilidade para uma instituição de assistência a idosos. Vale ressaltar que o abuso de idosos pode ocorrer em conjunto com outras formas de violência, o que pode levar à depressão, alienação, TEPT, culpa e negação em idosos. 30 POLÍTICAS PÚBLICAS E PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA O IDOSO De acordo com MEIRELLES (2001), dado o crescente envelhecimento da população mundial, os casos de maus-tratos e maus-tratos a pessoas idosas tornaram-se mais frequentes em todas as culturas e se tornaram mais proeminentes desde a década de 1980. A violência contra o idoso é uma realidade alarmante no Brasil. Apesar da extensa legislação, as leis que protegem os idosos não estão sendo seguidas, expondo homens e mulheres idosos a uma variedade de abusos. As políticas públicas desempenham um papel extremamente importante na abordagem do abuso de idosos. De acordo com Malagutti (2000), os artigos 10 e IV estabelecem o papel da justiça no cuidado ao idoso: promover e defender os direitos do idoso, empenhar-se em aplicar as normas relativas ao idoso, determinar ações para coibir abusos e danos a direitos . Vale ressaltar que as políticas públicas implementadas pelo governo não são suficientes para garantir os direitos e a proteção do idoso pela lei, mas apenas como medida mitigadora. A Comissão Nacional do Idoso foi instituída pela Lei nº 8.842, de 4 de janeiro de 1994, no âmbito da Política Nacional do Idoso, com o objetivo de garantir os direitos sociais dos idosos e criar as condições necessárias para os Caracterizados com 60 anos ou mais. A Política Nacional do Idoso estabelece em seus dispositivos os direitos fundamentais do idoso e o acesso a serviços nas áreas de assistência, saúde, educação, habitação e planejamento urbano, justiça, cultura, lazer e esportes. O artigo 18 do Capítulo IV da Lei do Idoso (2004) estabelece o direito à saúde: “Os estabelecimentos de saúde devem atender às necessidades dos idosos, facilitar a formação e capacitação de profissionais e orientar cuidadores, familiares e auto- ajuda. grupos”. Dessa forma, os idosos têm direito ao atendimento prioritário no Sistema Único de Saúde (SUS), bem como ao direito a próteses, órteses e medicamentos gratuitos, principalmente entre aqueles com condições crônicas. Os planos de saúde não podem reajustar as mensalidades com base na idade e, se os idosos ficarem internados por tempo determinado, têm direito a ser acompanhados por um profissional de saúde que os assista. 31 Os idosos também são protegidos pela legislação sobre violência e não podem ser vítimas de abandono, violência psicológica ou física, discriminação ou qualquer outra forma de violência. Da mesma forma, os idosos não podem ser impedidos de exercer seus direitos de cidadania, acesso ao ônibus, dificuldade em obter contas bancárias e outros casos de abuso. As instituições que cometeram abusos podem ser investigadas por responsabilidade legal nos termos da lei, e podem ser punidas com advertências, multas, suspensão parcial ou total de repasses de recursos públicos, suspensão de negócios e proibição de pensões. Relatórios de agências de refúgio expressam a necessidade de melhorar os serviços e mostram que muitas das alternativas e programas propostos são simplesmente leis que não são implementadas (Costa & Silvestre, 1999). O Regulamento do Idoso, instituído pela Lei nº 10.74.1, de 1º de outubro de 2003, estabeleceu a proteção do idoso como prioridade absoluta, estabelecendo novos direitos e mecanismos específicos de proteção. Esses mecanismos incluem a prioridade do atendimento, a melhoria contínua das condições de vida e a inviolabilidade física, psicológica e moral do idoso (CENEVIVA, 2004). A ausência de políticas públicas contribui para as diversas formas de violência que ocorrem em âmbito doméstico. A conduta negligente passa a ser interpretada como o resultado da ausência de instituições capazes de promover serviços adequados para o atendimento da pessoa idosa, ou mesmo a supervisão adequada da atenção e cuidados prestados aos idosos em sua residência ou de seus familiares (FALEIROS, 2007). Embora no Brasil esteja em vigor uma ampla legislação para o amparo legal para idosos, ainda não se observa uma articulação governamental para a efetivação de ações, deixando o Idoso sem acesso à uma assistência eficaz. A pessoa idosa conta com poucos órgãos públicos e os que existem apresentam estruturas precárias e uma comunicação deficiente. A INTERVENÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL CONTRA A VIOLÊNCIA AO IDOSO Embora seja possível observar um aumento da expectativa de vida da população brasileira, devido aos avanços tecnológicos e da medicina, não tem sido possível garantir a qualidade de vida da pessoa idosa. Acredita-se que os casos de 32 violência contra a pessoa idosa ocorram mais em instituições de longa permanência do que no ambiente familiar. Essa violência constitui uma violação aos direitos humanos, sendo uma das principais causas de lesões, doenças, diminuição da produtividade, isolamento e desesperança. O lar familiar deve ser o ambiente no qual as pessoas sintam maior segurança, paz e tranquilidade, podendo descansar com dignidade na velhice. Entretanto, tais ambientes acabam por se tornar um dos lugares onde há o domínio da violência. Ações concretas para o combate à violência contra a pessoa idosa podem ser observadas partir do ano de 1994, com a criação da Política Nacional do Idoso (Lei 8842/94 e Decreto 1948, de 1966). A Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS, de 1993, possibilitou que as pessoas a partir de 65 anos tenham acesso ao benefício de prestação continuada, correspondente a um salário mínimo vigente, desde que a renda familiar não ultrapasse a ¼ de salário mínimo per capita. De acordo com o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03) a pessoa idosa dispõe de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo a velhice um direito pessoal, e a sua proteção um direito social. Cabe ao Estado o dever de proteção dos direitos reconhecidos por Lei, fiscalizando se esses direitos são ameaçados ou violados (art. 43). O referido estatuto ainda determina em seu Art. 4 que "nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação,violência, crueldade ou opressão, e todo atentado dos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da Lei". O & 1º estabelece que "é dever de todos prevenir a ameaça ou violação aos direitos do idoso". Assim, o pacto dos direitos é consagrado como estratégia de combate à violência, embora seja possível observar uma discrepância entre a legislação e a implementação efetiva desses direitos, tendo em vista a permanente violação e a transgressão de direitos por parte do Estado, da família e da sociedade. O CREAS (Centro de Referência Especializado em Assistência Social) é o órgão responsável pelo atendimento das denúncias de violação dos direitos da pessoa idosa, sendo a equipe de Assistência Social responsável pela apuração das denúncias. Os casos mais comuns são de negligência, abandono e maus tratos. Ao se comprovar uma denúncia, as medidas necessárias são tomadas pelo CREAS, compreendendo desde uma conversa com os familiares e orientação acerca da 33 responsabilidade legal sobre o idoso até situações mais extremas, como a retirada do idoso do convívio com a família visando a preservação de sua integridade física. O Assistente Social, é o profissional capacitado para trabalhar com as políticas públicas e programas do governo que visam assegurar que as Leis estabelecidas no Estatuto do Idoso sejam efetivadas. Também é o profissional responsável pela promoção da autovalorização do idoso, fazendo com que ele se sinta parte integrante da sociedade. A realidade vivenciada pelo idoso deve ser transformada para que em um futuro próximo seja possível viver com dignidade, excluindo toda e qualquer forma de isolamento e exclusão visando a melhoria da qualidade de vida. 34 5 O SERVIÇO SOCIAL NO TRATAMENTO DA NEGLIGÊNCIA CONTRA A PESSOA IDOSA O Serviço Social é requisitado para intervir nas tensões oriundas da relação entre capital e trabalho, e tem como objeto de intervenção a “questão social”. Dessa forma, situações de pobreza, conflitos e violências envolvendo os velhos da classe trabalhadora apresentam-se como expressivas demandas à intervenção profissional que, despidas de mediações, aparecem como um fim em si mesmas. Diante da necessidade da competência técnica e intelectual para atuar na complexidade da realidade social, há um direcionamento crítico no interior da profissão, de mobilização da racionalidade capaz de incorporar a instrumentalidade23 do fazer profissional, construída e articulada ao seu processo de apreensão da realidade social em um movimento que parte da singularidade dos fenômenos à universalidade, através de aproximações sucessivas, guiadas pela particularidade que lhes confere (Guerra, 2011). No entanto, o universo profissional é heterogêneo de correntes de pensamento, em virtude do surgimento da profissão no Brasil, em 1936, através de um processo que, historicamente, se movimenta do conservadorismo à renovação. Segundo Silva (2009), no contexto de “abertura política” da década de 1979 a 1989, a profissão desenvolve um projeto profissional e um novo projeto de formação profissional, na intenção de romper com o seu conservadorismo histórico, marcado por protoformas de atuação do Serviço Social no seu surgimento . Nessa trajetória, a partir de 1979, a categoria de Assistentes Sociais estabelece o seu compromisso de trabalho e de luta com a classe trabalhadora brasileira, ou seja, com a classe que dispõe unicamente da sua força de trabalho para sobreviver, portanto excluída de usufruir a riqueza socialmente produzida. Segundo GUERRA (2011), o vínculo da profissão de Serviço Social com a classe trabalhadora é orgânico, uma vez que foi construído quando essa mesma classe demandou os seus serviços, desde o processo de Institucionalização da profissão. Extrapola questões partidárias, religiosas, morais e humanitárias. Trata-se de um compromisso ético de defesa intransigente dos seus direitos, em acordo com o Código de Ética profissional e com a Lei que regulamenta a profissão. Os espaços socioocupacionais reservados ao atendimento das demandas da classe trabalhadora envelhecida se desenvolvem privilegiadamente nas políticas 35 sociais. Essas se constituem em estratégias de conformação e desmobilização dessa classe ou de fragmentos de classe. Contudo, é também o terreno propício de negociações e reivindicações de direitos que lhes sejam favoráveis. Numa perspectiva totalizante, as políticas sociais são: “[...] resultados de complexas mediações (socioeconômicas, políticas, culturais) desenvolvidas pelas forças sociais que se movimentam historicamente na luta pela hegemonia nas esferas estatal, pública e privada” (Alves, 2011, p.36, como citado em Faleiros, 1986, citando Behring, 2000, p.31). E justamente no campo de atuação das Políticas Sociais é indispensável ao profissional a compreensão crítica da realidade na qual está inserido para que não seja um mero executor ou reprodutor de práticas que revitimizem os sujeitos ou, simplesmente, culpabilizem seus familiares em situações de negligência à pessoa idosa. Muitas vezes falta orientação às famílias quanto aos devidos cuidados para com os velhos, pois essas relações são reproduzidas entre as gerações, como foi defendido acima. A atuação profissional, porém, passa a ser mais desafiante quando as condições materiais e objetivas da classe trabalhadora envelhecida não se modificam na sua estrutura, e são agravadas pela omissão do Estado no cumprimento do que está posto no conteúdo das Políticas Sociais. Sendo válido ressaltar que as Políticas Sociais são frutos da fervorosa luta dos movimentos sociais organizados pela reivindicação dos direitos. Sobre a omissão Estatal, notadamente acentuada na passagem dos anos 1990 aos anos 2000, Raichelis (2010, p.759) vem afirmar: “O Estado permanece sendo a forma mais efetiva de operar a universalização dos direitos, mesmo em sociedades capitalistas periféricas e financeirizadas como a brasileira”. Portanto, mesmo tecendo as necessárias críticas ao Estado e aos seus governos, a categoria de Assistentes Sociais, que encontra nas Políticas Sociais um campo de intervenção privilegiado, precisa “formular mediações teóricas, técnicas, éticas e políticas” de natureza crítica para que não fique engessada no fazer burocrático dos seus espaços ocupacionais ou reproduzindo discursos que simplesmente lamentam o cenário caótico imposto aos velhos e às suas condições de trabalho. Raichelis (2010, p.768) alerta não ser admissível, na atualidade, a intervenção do Serviço Social à utilização de práticas “[...] conservadoras, autoritárias ou disciplinadoras, que individualizam, moralizam ou patologizam/terapeutizam a questão social, culpabilizando ou criminalizando as famílias e indivíduos pela sua 36 condição de pobreza”. Convém, ainda, registrar o recente apelo de Guerra (2012) à categoria de Assistentes Sociais, no sentido de articular, mobilizar e aplicar as dimensões técnicooperativa, teórico-metodológica, ético-política, investigativa e formativa de modo a evitar o que a autora considera “prática irrefletida”. As estratégias de intervenção profissional, sobretudo nas Políticas de Saúde e Assistência Social, aqui abordadas, podem ser potencializadas na mobilização e orientação aos usuários e familiares, em consonância com a perspectiva de classe, problematização com as equipes multidisciplinares e com a rede de proteção envolvida, realização de estudos e pesquisas, utilização de Instrumentais que viabilizem os direitos, e, principalmente, a adoção da racionalidade na instrumentalidade do exercício profissional. 37 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS O aumento da expectativa de vida e as baixas taxas de natalidade têm contribuído para o crescimento da população idosa do país, por isso é importante desenvolver políticas públicas para a terceiraidade que promovam a efetivação de seus direitos e uma vida social digna por meio de ações implementadas e garantidas pelo Estado . O alarmante crescimento da violência contra a pessoa idosa em nosso país tem exigido ações de informação e advocacia sobre a legislação de proteção à integridade física, psicológica e emocional, bem como o apoio às políticas de combate à violência contra a pessoa. Eles são respeitados e eficazes, permitindo que a sociedade combata essa forma de violência. Os assistentes sociais são profissionais qualificados para participar de políticas públicas e programas governamentais destinados a garantir que as leis estabelecidas no Regulamento de Pessoas Idosas sejam implementadas. É também um profissional, responsável por elevar a autoestima dos idosos, fazendo com que se sintam parte integrante da sociedade. A realidade vivenciada pelos idosos deve ser mudada para que possam viver com dignidade em um futuro próximo, livres de qualquer forma de isolamento e exclusão, melhorando assim sua qualidade de vida. O Elders Act (2003), em seu único parágrafo 3(5), enfatiza que o cuidado ao idoso deve ser realizado principalmente pela própria família, o que não é propício ao cuidado abrigado, exceto no caso do idoso. Não tem ou carece de condições especiais para se sustentar. O art. domesticamente.O trabalho do Serviço Social deve estar comprometido com a busca pela cidadania bem como com a defesa de direitos sociais, intervenções junto ao idoso em situação de maus tratos, a família e ao agressor, possibilitando assim, o desenvolvimento de intervenções adequadas para que os idosos possam conviver em sociedade de forma digna e com qualidade de vida. Portanto, concluiu-se que a violência doméstica contra pessoas idosas é uma questão social complexa, pois desafia as instituições públicas a combater as agressões desumanas e degradantes contra elas. As barreiras que os idosos expõem na proteção de seus agressores domésticos, por medo de condená-los, 38 medo de represálias, ou piorar sua convivência, retardam a efetivação de seus direitos protegidos pela Constituição Federal e estatutos do idoso. No entanto, diante da resistência do poder público em investigar e punir os agressores, a política nacional de envelhecimento tornou-se uma importante aliada no combate a essa violência, colocando em prática políticas públicas e sociais para melhor promover a convivência intergeracional. em ambientes sociais e familiares. Esta pesquisa possibilita compreender a importância das políticas públicas na efetivação dos direitos dos idosos, e o papel que os assistentes sociais desempenham na efetivação desse direito, com o objetivo de melhor implementar políticas e alcance para empoderar os idosos. 39 REFERÊNCIAS _______. (2004). Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Política Nacional de Assistência Social. 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