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Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) HIPERTENSÃO INTRACRANIANA Definição Hipertensão Intracraniana (HIC) é o aumento da Pressão Intracraniana (PIC) acima de 15 mmHg (ou 20 cmH2 O). Valor normal: 5-15 mmHg ou 10-20 cmH2 O. A HIC é definida como uma elevação sustentada (>5min) da PIC para acima de 20-22mmHg, com detecção por monitorização invasiva. A PIC depende da quantidade de líquido no interior do encéfalo, incluindo aquele contido no interior das células, interstício e ventrículos. Aumentos agudos deste líquido, como no edema cerebral (vasogênico ou citotóxico) e na hidrocefalia (edema intersticial), podem elevar a PIC. Lesões expansivas do tipo hemorragia, tumor ou abscesso também elevam a PIC, principalmente pelo edema que se forma ao redor destas lesões. Etiologias As principais causas de HIC podem ser divididas em: 1. Lesões expansivas cerebrais, hemorragia, abscesso, toxoplasmose, tumor; 2. Meningoencefalites e encefalites; 3. Encefalopatia metabólica, com destaque para a insuficiência hepática aguda e a hiponatremia aguda; 4. Hidrocefalia hiperbárica; 5. Trombose do seio sagital superior; 6. HIC benigna (pseudotumor cerebri). Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) Fisiopatologia A pressão intracraniana (PIC) é normalmente menor que 10-15 mmHg em adultos e hipertensão intracraniana com potencial efeito deletério está presente quando a pressão for ≥ 20 mmHg. Elevações ocasionais e transitórias da PIC, acompanhadas de tosse, espirro ou manobras de Valsalva, são normalmente estabilizadas por mecanismos homeostáticos. Em adultos, o compartimento intracraniano é protegido pelo crânio, uma estrutura rígida com um volume interno fixo de 1400 a 1700 ml. Sob condições normais, o conteúdo intracraniano inclui (em volume): • Parênquima cerebral – 80-85% • Líquido cerebroespinhal (líqüor) – 5 a 10% • Sangue – 8 a 12 % Entretanto, volumes patológicos, como lesões com “efeito de massa”, por exemplo, abscessos ou hematomas, podem estar presentes dentro do compartimento intracraniano. Considerando que o volume total do compartimento intracraniano não pode mudar, o aumento no volume de um dos componentes ou a presença de um componente patológico, necessita ser compensado pelo deslocamento de outra estrutura ou a PIC aumentará. Então, a PIC é uma função do volume e da complacência de cada um dos componentes intracranianos. Esta relação foi reconhecida há mais de 150 anos e é denominada de doutrina de Monro-Kellie. A HIC surge sempre que tiver edema cerebral significativo, ou uma massa ocupando espaço que surgiu de forma aguda (ex.: hematoma), ou ainda um acúmulo rápido de fluido no interior dos ventrículos cerebrais, isto é, um aumento do conteúdo sem aumentar o continente (crânio). Em crianças pequenas, as suturas entre os ossos cranianos são flexíveis o bastante para permitir o aumento da cavidade craniana, um fenômeno impossível em crianças maiores e adultos. Por outro lado, quando um edema, uma hidrocefalia ou uma lesão se expande lentamente, a adaptação do tecido cerebral pode evitar uma HIC grave, permitindo que o paciente permaneça assintomático ou oligoassintomático. MECANISMO O espaço intracraniano é considerado invariável em volume e o seu conteúdo é praticamente incompressível. O aumento do volume de um dos componentes da cavidade intracraniana ou o aparecimento de um processo expansivo determina o deslocamento dos seus constituintes naturais para que a PIC se mantenha inalterada. Quando o novo volume acrescentado é maior do que a possibilidade de deslocamento de líquido Há aumento da PIC, levando a hipertensão intracraniana Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) Quando um determinado volume é acrescido ao conteúdo normal da cavidade intracraniana há: 1. De início, diminuição do espaço subaracnóideo periencefálico; 2. Seguida de redução das cavidades ventriculares por diminuição do LCR; 3. Posteriormente, caso essa medida não seja suficiente, há uma diminuição do volume sanguíneo e 4. Finalmente, se não for suficiente, há redução do parênquima encefálico por compressão e atrofia. AH! O tempo de instalação desse novo volume influencia na capacidade de acomodação dele: Quanto mais lento o aumento, melhores serão os mecanismos compensatórios Quanto mais agudos forem os aumentos, pior será utilização desses mecanismos, acarretando no desequilíbrio precoce da relação volume/pressão intracraniana. Na HIC grave, surge o rebaixamento do nível de consciência, que pode chegar ao estado de coma. Dois fenômenos explicam o estado de coma na HIC: (1) compressão uni ou bilateral do tálamo e do mesencéfalo (estes são os dois componentes do sistema reticular ascendente, responsável pelo estado de vigília); (2) hipofluxo cerebral, pela redução da pressão de perfusão cerebral, responsável pelo fluxo sanguíneo cerebral. A inter-relação entre mudanças no volume dos conteúdos intracranianos e as variações na PIC definem a complacência do compartimento intracraniano. A complacência intracraniana pode ser modelada matematicamente como uma relação entre alterações de volume pelas alterações de pressão Fluxo Sanguíneo Cerebral (FSC): É determinado pela Pressão de Perfusão Cerebral (PPC) e pela Resistência Arteriolar (R). O fluxo é proporcional à pressão de perfusão e inversamente proporcional à resistência. PAM = Pressão Arterial Média. Para garantir uma perfusão cerebral adequada, este gradiente deve ser mantido acima de 70 mmHg. Por exemplo, se a PAM for 100 mmHg, uma PIC superior a 30 mmHg já pode ser responsável por um importante hipofluxo cerebral, levando à perda da consciência. Auto-regulação: o FSC normalmente é mantido num nível relativamente constante pela auto- regulação da RVC dentro de uma faixa da PAM (60 a 150 mmHg). Elevações da PAM são acompanhadas de vasoconstrição e diminuições da pressão arterial são compensadas com vasodilatação. Então, a RVC mantém o FSC estável, dentro dos seus limites de compensação, protegendo a perfusão cerebral das pequenas e moderadas variações fisiológicas da PAM. Entretanto, a auto-regulação da RVC pode se tornar disfuncionante em certos estados patológicos, principalmente no trauma e na doença cerebrovascular. Nestas situações, o cérebro pode se tornar muito sensível mesmo a pequenas variações da PAM e da PPC. PPC = PAM - PIC Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) AH! Caso a PIC se iguale com a PAM, ocorrerá uma interrupção do fluxo sanguíneo cerebral O coma profundo, as alterações respiratórias (Cheynes-Stokes, hiperpneia central) e o reflexo de Cushing (hipertensão arterial + bradicardia) são sinais indicativos de HIC grave, considerada uma emergência médica, pois pode ser fatal!! A compressão do hipotálamo (onde estão localizados os centros neuronais do sistema nervoso autônomo) pode explicar os componentes deste reflexo. O reflexo de Cushing, de certa forma, teria o intuito de proteger o fluxo cerebral: ao elevar a PAM, pode trazer de volta a pressão de perfusão para acima de 70 mmHg. A HIC grave mata através de sua principal devastadora complicação: a herniação cerebral. Quadro Clínico O quadro de HIC, no paciente acordado, já se manifesta por: 1. Cefaleia 2. “Vômitos em jato” (vômitos não precedidos de náusea, não necessariamente em jato) 3. Papiledema 4. Paralisia do VI par craniano, ou nervo abducente (pseudolocalização). 5. Outros sinais como: hipertensão arterial, bradicardia e arritmia respiratória (tríade de Cushing), embora a concordância de todos os três sinais seja um achado incomum e muitas vezes tardio. A cefaleia pode ser holocraniana, occipital ou mesmo frontal; tem acaracterística de piorar pela manhã, quando a PIC atinge o seu valor máximo, e de se exacerbar com o esforço físico, tosse, espirro, evacuação ou qualquer manobra que eleve a pressão intratorácica subitamente. Costuma ser o primeiro sintoma e o mais constante. O vômito em jato, não precedido por náusea, costuma ser considerado como sinal patognomônico de HIC. O papiledema é um sinal de HIC grave. Ocorre devido à resistência imposta à drenagem venosa da retina por meio da veia central da retina em direção ao seio cavernoso, o que acarreta maior pressão nas veias retinianas. No exame de fundo de olho é possível notar aumento do diâmetro das veias retinianas, com desaparecimento do pulso venoso e borramento dos bordos da papila, evoluindo, posteriormente para edema, presença de focos hemorrágicos e, mais tardiamente, atrofia da papila, com possível perda definitiva da visão. É importante ressaltar que o papiledema não se instala abruptamente, necessitando de um tempo para ser visualizado na avaliação de fundo de olho. É tradicionalmente reportado em casos onde há uma lesão crônica como, por exemplo, em lesões tumorais. Em casos mais agudos (como em hemorragias intracranianas e trauma crânio- encefálico), a avaliação do fundo de olho pode ser normal em um primeiro momento. A lesão do VI par se dá pela compressão deste nervo em seu longo trajeto pelo espaço subaracnoide (é o nervo de maior comprimento dentro do espaço liquórico). O comprometimento pode ser uni ou bilateral, caracterizando-se pelo estrabismo convergente, com pupilas preservadas e fotorreagentes. A evolução dos sintomas e sinais da HIC pode ser dividida em quatro fases: • A primeira fase é assintomática porque há deslocamento de um dos componentes normais do conteúdo intracraniano para compensar o volume acrescido. Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) • No segundo estágio os mecanismos de compensação já estão se esgotando, há comprometimento do fluxo sanguíneo cerebral, isquemia de centros bulbares, surgem as ondas em platô e os primeiros sintomas e sinais da HIC, com redução da frequência cardíaca. • Na terceira fase as ondas em platô já são mais frequentes e de maior amplitude, e o comprometimento do tonus vascular e a paralisia do mecanismo vasopressórico acarretam aumento do volume sanguíneo encefálico, acentuando a HIC; os sintomas e sinais da HIC tornam-se exuberantes, há comprometimento do nível de consciência, alterações da PA, da frequência cardíaca e ritmo respiratório. Nesta terceira fase ainda há possibilidades de regressão do quadro clínico, desde que a HIC possa ser tratada adequadamente. • Na quarta e última fase a PA cai, o ritmo respiratório e os batimentos cardíacos são irregulares, surge o coma, as pupilas tornam-se midriáticas e paralíticas e a morte ocorre por parada cardiorrespiratória Complicações Herniação Cerebral: É a protrusão de um tecido ou massa cerebral através de um forame, levando à compressão de uma outra estrutura do encéfalo. A dura-máter divide o encéfalo através de septos fibrosos: A foice do cérebro separa a porção superior dos dois hemisférios e o Tentório (ou “tenda do cerebelo”) separa o cérebro do cerebelo (separa a fossa média, onde pousam os lobos temporais, da fossa posterior do crânio). A parte central anterior do tentório apresenta uma abertura, por onde o tronco cerebral tem continuidade anatômica com o diencéfalo e cérebro. Por este “buraco do tentório” (fenda tentorial), um tecido cerebral (supratentorial) pode herniar, empurrado por uma lesão expansiva ou pelo edema cerebral, na vigência de HIC grave. 1. Herniação do Tálamo e Mesencéfalo: Quando a compressão se dá no sentido vertical, de cima para baixo, do tálamo sobre o mesencéfalo, denominamos HÉRNIA TRANSTENTORIAL CENTRAL. A compressão acentuada do mesencéfalo (achatamento) causa coma profundo e pupilas médio-fixas, devido à perda do reflexo fotomotor e consensual, dependentes do núcleo do oculomotor (III par), presente no tegmento mesencefálico. Alterações respiratórias aparecem na hérnia transtentorial, sendo a respiração de Cheynes- Stokes numa fase bem precoce (compressão do tálamo), e a hiperventilação central (compressão do mesencéfalo), quando a hérnia está instalada. Raramente surge a postura de decorticação nesse momento (flexão dos braços, punhos e flexão dos dedos da mão). O aumento do efeito compressivo acaba por atingir progressivamente a ponte e depois o bulbo, levando à postura de descerebração (compressão da ponte), à respiração apnêustica pontina (pausa após a expiração), à respiração atáxica de Biot (ponte e bulbo), até chegar à apneia (compressão bulbar). A hérnia transtentorial central pode ocorrer no sentido caudocranial, por uma lesão expansiva na fossa posterior (infratentorial), como num hematoma cerebelar que comprime a ponte. Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) 2. Herniação do Uncus: A compressão de uma lesão expansiva sobre o lobo temporal leva à HÉRNIA DE UNCUS. Através da fenda tentorial, o uncus, giro cerebral do lobo temporal medial, pode herniar, comprime o nervo oculomotor (3º par) ipsilateral à lesão e o mesencéfalo no sentido laterolateral. Esta grave complicação pode ser facilmente reconhecida pela midríase paralítica ipsilateral à lesão expansiva, além do aprofundamento do coma, seguindo também a evolução da hérnia transtentorial central. Ainda há mais duas consequências da hérnia uncal. A compressão da artéria cerebral posterior, em sua origem, determina isquemia do mesencéfalo, que pode acarretar um grande infarto mesencefálico, tornando o estado de coma irreversível. 3. Compressão do pedúnculo cerebral: A compressão do pedúnculo cerebral mesencefálico contralateral causa hemiparesia do lado da lesão expansiva (que já havia provocado hipoparesia contralateral); esta é a síndrome de Kernohan. 4. Herniação Subfálcica: A HÉRNIA SUBFÁLCICA é a protrusão do giro cingulado por baixo da foice do cérebro (é uma herniação laterolateral). Pode levar à compressão das fibras piramidais contralaterais, causando hemiparesia do lado da lesão expansiva (semelhante ao que ocorre na síndrome de Kernohan). 5. Herniação do Forame Magno: A HÉRNIA DO FORAME MAGNO é a protrusão da amígdala cerebelar (por lesão expansiva de cerebelo) pelo forame magno, comprimindo o centro respiratório bulbar, provocando apneia súbita. Esta é a complicação mais temível da hemorragia cerebelar, por ser traiçoeira. SINDROMES DE HERNIAÇÃO CEREBRAL NA HIC HIC Cefaléia (se consciente) Diminuição do nível de consciência Tríade de Cushing (hipertensão arterial, bradicardia e irregularidade respiratória) Hérnia Transtentorial Central Piora maior do nível de consciência (coma profundo) Perda progressiva dos reflexos de tronco Pupilas médio fixas Atitude de decorticação seguida de descerebração Hérnia Uncal Piora progressiva do nível de consciência (infarto mesencefálico – coma irreversível) Midríase paralítica ipsilateral Hemiplegia e Babinski contralateral Hérnia por compressão do Pedúnculo Cerebral e Hérnia Subfálcica Hemiparesia do lado da lesão expansiva Hérnia Tonsilar (Forame Magno) Coma profundo Tetraplegia flácida Parada respiratória Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) MONITORAMENTO A monitoração da PIC no TCE está indicada em pacientes com escala de Glasgow de 8 ou menos e uma tomografia de crânio (TC) alterada. Pacientes comatosos, com uma TC normal têm uma menor incidência de HIC, a menos que tenham dois ou mais dos seguintes critérios: • Idade > 40 anos • Resposta motora alterada unilateral ou bilateral • Pressão arterial sistólica abaixo de 90 mmHg • Piora de 2 ou mais pontos na escala de Glasgow A monitoração da PIC não está regularmente indicada em pacientes acordados e capazes de seguir comandoverbal. Uma exceção pode ser o paciente com risco de HIC e que será submetido à anestesia geral ou sedação profunda prolongada, tornando impossível a monitoração clínica durante algumas horas. A PIC deve ser mantida abaixo de 20 mmHg e a PPC acima de 50 mmHg ou, idealmente, acima de 60 mmHg em pacientes com HIC para evitar hipoperfusão e isquemia cerebral. O FSC não parece se elevar acima de níveis perigosos até uma PPC de aproximadamente 120 mmHg. Indicações: o diagnóstico de PIC elevada é geralmente baseado nos achados clínicos e suportado por estudos radiográficos e pela história clínica do paciente. O TCE é uma das mais freqüentes e melhor estudadas indicações de monitoração da PIC. A prática atual da monitoração da PIC é grandemente derivada da experiência clínica com TCE. Outras indicações potenciais incluem doença cerebrovascular aguda, hidrocefalia, hemorragia subaracnoídea, síndrome de Reye, encefalopatia hepática e trombose venosa. Monitoramento ICP invasivo A HIC está associada a resultados ruins e, particularmente, ao aumento da mortalidade, portanto, parece razoável medir a PIC. As diretrizes mais recentes recomendam o manejo de pacientes com TCE grave usando informações do monitoramento de PIC para reduzir a mortalidade intra-hospitalar e de 2 semanas após a lesão. A medida invasiva da PIC é realizada por cateteres específicos, inseridos no espaço intraventricular, intraparenquimatoso, epidural, subdural ou subaracnóideo. O dispositivo de monitoramento de PIC ideal deve ser confiável, preciso, econômico e estar associado a morbidade mínima. O cateter intraventricular continua sendo o método mais confiável (padrão ouro) para a monitoração da PIC, pois mede a PIC global, desde que não ocorra obstrução do fluxo do LCR. Monitoramento ICP não invasivo Nenhum método de monitoramento não invasivo da PIC pode substituir o monitoramento invasivo, mas pode ser útil como uma ferramenta complementar ou na decisão de iniciar o monitoramento invasivo. Tomografia computadorizada de cérebro (TC) A TC avalia rapidamente a presença de achados específicos que aprimoram o diagnóstico de HIC. Estes incluem efeito de massa, deslocamento da linha média, edema cerebral, hidrocefalia, compressão das cisternas basais e alterações na diferenciação da substância branca-acinzentada. Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) Imagem de ressonância magnética do cérebro (MRI) A ressonância magnética mostra com mais detalhes as lesões do tecido mole e do parênquima cerebral, que podem não ter sido detectadas na TC, por exemplo, lesão axonal difusa. Porém, o tempo prolongado de triagem e a permanência do paciente em decúbito dorsal, que podem agravar a PIC, tornam seu uso limitado a pacientes com suspeita de HI. Ultrassonografia Doppler transcraniana (TCD) O TCD é uma técnica útil, à beira do leito e não invasiva, para detectar o FSC (Fluxo sanguíneo Cerebral) inadequado e avaliar a autorregulação cerebral. Pode indicar a necessidade de monitoramento cerebral invasivo e tratamento direto em uma abordagem de neuromonitoramento multimodal multifatorial. O TCD detecta a velocidade do fluxo sanguíneo (FV) através dos principais vasos intracranianos, mais comumente a artéria cerebral média (MCA). Nos casos de PIC elevada, a pressão externa nos vasos cerebrais aumenta, o que se reflete nas alterações do FV. A detecção de FV reduzido indica impedimento ao CBF e aumento indireto de ICP. Diâmetro da bainha do nervo óptico (ONSD) O espaço entre o nervo óptico e sua bainha é preenchido com LCR e, portanto, sua pressão é igual a PIC. Assim, o ONSD medido por ultrassom transocular é aumentado em pacientes com HI. Vários estudos mostraram que ONSD> 5 mm corresponde a PIC ≥ 20 mmHg. No entanto, essa associação pode ser afetada por condições, como tumores, inflamação. A técnica de medição ONSD é barata, eficiente e não demorada, mas dependente do operador. Deslocamento da membrana timpânica (TMD) Devido à comunicação do LCR e da perilinfa através do aqueduto coclear, o aumento da PIC é transmitido diretamente para a placa do estribo, deslocando a membrana timpânica de sua posição inicial. O deslocamento para dentro indica alta, e para fora normal ou baixa ICP. No entanto, essa técnica carece de precisão e é um método não confiável de avaliação quantitativa da PIC na prática clínica. TRATAMENTO Toda HIC sintomática deve ser tratada, especialmente quando a TC mostrar desvio de linha média por efeito de massa de alguma lesão expansiva. O tratamento da HIC pode ser dividido sistematicamente em 3 fases: abordagem geral, tratamento de 1ª linha e tratamento de 2ª linha. A abordagem geral é composta de uma série de condutas que devem ser instituídas em todos os pacientes com injúria neurológica e risco de HIC. Nos pacientes com HIC estabelecida, as condutas da abordagem geral devem ser otimizadas ao máximo e servem de base ao acréscimo de qualquer outra forma de tratamento. As formas de tratamento de 1ª linha devem ser rapidamente instituídas quando as condutas gerais não forem suficientes para controlar a HIC. Quando estes tratamentos também não forem suficientes, estes pacientes podem ser considerados refratários ao tratamento geral da HIC e algumas das formas de tratamento de 2ª linha devem ser instituídas. ABORDAGEM GERAL O melhor tratamento para a HIC é a resolução imediata da causa da elevação da PIC. Exemplos incluem: drenagem de um hematoma, ressecção de um tumor, derivação liqüórica nas hidrocefalias e tratamento das alterações metabólicas subjacentes. Qualquer outra forma de tratamento da HIC é secundária quando existir uma causa cirurgicamente tratável. Por isso, a Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) abordagem de uma paciente com suspeita de HIC ou com HIC confirmada sempre tem uma TC no início. Além do tratamento específico da causa básica existem manobras que devem ser aplicadas a todos os pacientes e outras que devem ser reservadas para algumas situações específicas. Ressuscitação clínica: a avaliação e o suporte da ventilação, oxigenação, pressão arterial e perfusão tecidual são fundamentais e aplicáveis a todos os pacientes indistintamente. Hipoventilação, hipoxemia e hipotensão arterial devem ser imediatamente corrigidas (ABCs). Se uma PIC elevada for suspeitada, cuidado deve ser tomado para minimizar maior elevação durante a intubação, com posicionamento correto do paciente e sedação adequada. Hipotensão arterial e hipoxemia podem induzir a vasodilatação cerebral reativa, hipertensão intracraniana e hipoperfusão cerebral. Abordagem de emergência: alguns pacientes com herniação cerebral podem se apresentar com manifestações clínicas evidentes de HIC e herniação. Nestes casos, após ressuscitação clínica adequada (ABCs), medidas imediatas podem ser instituídas até que um detalhamento maior possa estar disponível, através dos estudos radiológicos e da monitoração da PIC. A abordagem de emergência, indicada para todos os pacientes com sinais clínicos de herniação, inclui: • Elevação da cabeceira do leito até 30º e posição neutra da cabeça • Manitol intravenoso (1 a 2,0 g/Kg) • Hiperventilação otimizada para manter PaCO2 em 25 a 30 mmHg Concomitantemente, uma avaliação clínica mais detalhada deve ser implementada, incluindo história clínica, exame neurológico detalhado e neuroradiologia. Pacientes com sinais clínicos de deterioração devem ser tratados e rapidamente levados para um diagnóstico tomográfico e para um tratamento cirúrgico, se indicado. AH!! Hiperventilação pode ter efeitos deletérios por isquemia cerebral e somente deve ser usada na fase inicial do tratamento da HIC, nos pacientes que estão rapidamente descompensando, apesar das outras medidas instituídas. Do contrário, a PaCO2 inicial deve ser mantida entre 35 e 40 mmHg. Monitoração da PIC e a decisão de tratar:se um diagnóstico de PIC elevada for suspeitado e uma causa imediata não é identificada, então a PIC deve ser monitorada. Qualquer intervenção somente deve ser instituída após a PIC manter-se acima de 20 mmHg por mais de 5 a 10 minutos, desde que elevações transitórias da PIC podem ocorrer com a tosse, movimento, períodos de aspiração e assincronia com o ventilador. A identificação de ondas patológicas, com rápidas e repetitivas elevações da PIC também indica necessidade de intervenção. Administração de líquidos e controle metabólico: em geral, pacientes com PIC elevada não necessitam de restrição de líquidos. Eles devem ser mantidos euvolêmicos e com a osmolaridade plasmática de normo a hiperosmolar. Rotineiramente, eles devem receber solução salina normal e restrição de água livre. Hipovolemia acarreta diminuição do FSC e lesão neurológica secundária e deve ser evitada a todo custo. Uma atenção especial deve ser dirigida para evitar hiperglicemia nos pacientes com doença neurológica grave. Uma glicemia abaixo de 150 mg/dl deve ser perseguida. A osmolalidade sérica deveria ser mantida acima de 280 mOsm/l e o melhor é mantê-la entre 295 e 305 ou até 320 mOsm/l. Hiponatremia é comum nos pacientes com HIC, principalmente nos pacientes com hemorragia subaracnoídea, e deve ser evitada ou prontamente tratada. Sedação e analgesia: a manutenção de uma sedação e analgesia apropriadas podem diminuir a PIC por redução da demanda metabólica, da assincronia com o ventilador, da congestão venosa e da resposta simpática de hipertensão e taquicardia. Propofol é utilizado com bons efeitos e pode ser Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) titulado rapidamente para permitir um nível de sedação desejado e permitir reavaliação neurológica freqüente, devido a sua meia-vida curta. Outras drogas como midazolam, geralmente associado a fentanil contínuo ou morfina intermitente também tem bons efeitos. Os bloqueadores neuro-musculares só devem ser usados por curtos períodos, e se possível, evitados completamente. Controle da pressão arterial (PA): em geral, a PA deve ser suficiente para manter uma PPC maior que 60 mmHg. Adequada ressuscitação de volume e uso de drogas vasopressoras parecem seguras e não acarretam maior elevação da PIC. O controle da PA é particularmente relevante nos pacientes sedados, onde hipotensão iatrogênica pode ocorrer. Hipertensão arterial deve ser tratada somente se a PPC exceder 120 mmHg. Posicionamento: pacientes com risco de PIC elevada ou com PIC certamente alta devem ser posicionados para maximizar o retorno venoso cerebral, sem causar queda significativa na PPC. Em geral, nos pacientes hemodinamicamente estáveis, uma elevação da cabeceira a 30º satisfaz estas duas exigências e tem-se demonstrado que a PIC apresenta uma queda nesta posição. Além disso, a cabeça deve ser mantida numa posição neutra, evitando flexão ou rotação excessiva do pescoço (para não bloquear o fluxo jugular) e minimizando qualquer manobra que acarrete uma resposta de Valsalva (para não aumentar a pressão intratorácica). Demanda metabólica: uma diminuição na demanda metabólica pode reduzir a PIC pela redução no FSC e prevenir injúria. Se necessário, após sedação adequada, alguns pacientes podem necessitar de bloqueio neuromuscular (BNM), mas só por curtos períodos. O uso de BNM pode aumentar o risco de infecção, miopatia e escaras. Febre aumenta o metabolismo cerebral e injúria cerebral adicional em modelos animais foi demonstrada. Portanto, o tratamento da febre deve ser agressivo, incluindo antitérmicos e esfriamento físico, em pacientes com HIC. Convulsões podem complicar um quadro de HIC ou contribuir para elevá-la ainda mais. Tratamento anticonvulsivante deve ser rapidamente instituído se crises convulsivas são identificadas ou suspeitadas. Tratamento profilático pode ser necessário em casos onde a incidência de crise é alta ou quando seu aparecimento pode levar à injúria cerebral secundária significativa. Todos os pacientes com HIC devem receber tratamento profilático. TRATAMENTO ESPECÍFICO Tratamento de 1ª linha Remoção de lesão com efeito massa ou de líquor: lesão com efeito massa associada a uma elevação da PIC deve ser removida sempre que possível e rapidamente. Da mesma forma, quando hidrocefalia for identificada, uma derivação ventricular deve ser empregada. Drenagem liqüórica pode auxiliar no controle da PIC. **EM HIC POR LESÕES NÃO EXPANSIVAS – PRIMEIRA MEDIDA É DRENAR O LÍQUOR Osmoterapia: as substâncias hiperosmóticas aumentam a osmolaridade sérica e têm duas ações complementares: 1) uma expansão quase imediata do volume plasmático, elevando o FSC, diminuindo o hematócrito e a viscosidade sangüínea, com conseqüente melhora da perfusão e oxigenação cerebral; e 2) um efeito osmótico após 15 a 30 minutos, com redução do volume cerebral por drenar a água livre do tecido cerebral para a circulação, desidratando o parênquima cerebral normal e aumentando a complacência intracraniana. Esta ação das substâncias hiperosmóticas requer uma barreira hematoliqüórica intacta para exercer sua ação. O agente mais comumente Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) utilizado é o manitol, numa solução a 20% e dado em bolus de 0,5 a 2,0 g/Kg no ataque. **O uso do manitol em pacientes com insuficiência renal é relativamente contra-indicado. Parâmetros úteis na monitoração da ação do manitol são o controle do sódio sérico, da osmolalidade sérica e da função renal. Complicações freqüentes são hipernatremia, osmolalidade sérica anormalmente elevada (acima de 320mOsm/l), hipovolemia e necrose tubular aguda. Corticosteróides: os corticosteróides não são úteis no tratamento da PIC elevada por infarto, hemorragia e TCE. Eles podem ter um efeito benéfico na HIC por tumor ou infecção cerebral. Nesses casos, o uso de dexametasona (geralmente bolus de 10 mg EV, seguido por 4 a 10 mg cada 6 horas) está associado a uma diminuição na PIC. Tratamentos de 2ª linha Hiperventilação: o uso da ventilação mecânica para diminuir a PaCO2 a 26-30 mmHg demonstra reduzir rapidamente a PIC através de vasoconstrição e diminuição no volume de sangue intracraniano. Se insuficiente para controlar a HIC, e se não acarretou isquemia cerebral, valores menores de PaCO2 (20-25 mmHg), com o uso de hiperventilação otimizada (monitoração concomitante da SjO2) podem ser tentados após 15 minutos. O efeito da hiperventilação na PIC inicia-se quase imediatamente, mas é de curta duração (uma a doze horas). A alcalose respiratória induzida pela hiperventilação é o que determina seu efeito e este se perde à medida que a alcalose é revertida pela eliminação renal de bicarbonato. Após a hiperventilação terapêutica, a frequência respiratória deve ser normalizada lentamente nas próximas horas para evitar um aumento rebote da PIC. A hiperventilação terapêutica deve ser considerada uma intervenção de emergência em pacientes com HIC e que estão em evidente descompensação (síndromes de herniação), ou em pacientes com PIC elevada e não responsiva às manobras de ressuscitação, sedação, manitol, etc. Neste caso, como a hiperventilação tem o potencial de diminuir a PIC, mas também causar isquemia cerebral deletéria, a hiperventilação otimizada pode ser utilizada. Desta forma, uma monitoração concomitante da SjO2 pode ser útil na decisão de quando iniciar a hiperventilação e até quando mantê-la. A hiperventilação é uma boa indicação quando a SjO2 estiver normal ou alta e, após iniciada, cuidar para que ela não caia abaixo de 55%. Barbitúricos: o uso de barbitúricos na HIC está relacionado à sua capacidade de reduzir o metabolismo cerebral e o FSC nas áreas onde o acoplamento metabólico está preservado, diminuindo a PIC. Tionembutal é geralmente usado, com uma dose de ataque de 3 a 10 mg/Kg, em bolus, seguido de 1 a 4 mg/Kg/h. O tratamentodeve ser monitorado pela resposta na PIC, na PPC e atenção aos efeitos adversos, principalmente hipotensão arterial e predisposição à infecção. Hipotermia: a hipotermia também diminui o metabolismo cerebral, o FSC e a PIC, além de poder exercer um efeito cerebral protetor potencial. A hipotermia pode diminuir a PIC quando outras terapêuticas não forem efetivas e alguns trabalhos demonstram melhora prognóstica no longo prazo. Os principais efeitos colaterais são arritmias cardíacas, coagulopatia e predisposição à infecção. Hipotermia pode ser conseguida com o esfriamento do corpo, incluindo cobertas frias, para diminuir a temperatura central até 32 a 34ºC. A melhor forma de indução da hipotermia não está definida, nem qual a melhor temperatura central a ser atingida ou por quanto tempo. Craniectomia descompressiva: remove parte dos limites rígidos do crânio, permitindo que maior volume intracraniano exerça menor pressão. Há um aumento da complacência cerebral e diminuição da PIC. A craniectomia sozinha pode diminuir em até 15% o valor da PIC e, quando Mayara Freitas (Distúrbios Sensoriais, Motores e da Consciência) associado à abertura da dura-máter, a PIC pode cair até 70% do seu valor inicial. Ela está indicada em pacientes com HIC refratária e quando o prognóstico ainda pode ser bom com o controle da PIC e a otimização da PPC. Monitoração da SjO2: Se a PIC permanecer alta, está indicada a monitorização da SjO2 para auxiliar na escolha da melhor terapêutica a partir de então. EM RESUMO 1. Monitorizar a PIC por ventriculostomia ou dispositivo intraparenquimatoso, mantendo-a < 20 mmHg. 2. Manter volemia normal e PA levemente elevada. 3. Manter a pressão de perfusão cerebral (PAMPIC) > 70 mmHg; para isso, temos que baixar a PIC mas também manter a PAM em níveis adequados (levemente elevado). 4. Cabeceira a 30º. 5. Diurético osmótico: manitol 1-1,5 g/kg IV (ataque) + 0,25- 0,5 g/kg IV 4/4h (manutenção). Manter a osmolaridade sérica < 320 mOsm/kg. 6. Dexametasona – somente em caso de tumor e abscesso – 4 mg de 6/6 horas. 7. Sedação (midazolam ou propofol). 8. Hiperventilação: manter pCO2 entre 30-35 mmHg (entubação + ventilação mecânica). 9. Em casos refratários: considerar barbitúricos (pentobarbital) – “coma barbitúrico”, hiperventilação agressiva com pCO2 < 30 mmHg e hemicraniectomia. A melhor forma de controle da hipertensão intracraniana é a resolução da causa imediata da PIC elevada. Independente da causa, o tratamento deve ser iniciado o mais rápido possível e baseia-se nos princípios de ressuscitação, controle rápido e intensivo da hipoxemia, hipoventilação e hipotensão arterial, redução do conteúdo intracraniano e reavaliação constante. Se o paciente estiver com sinais de descompensação e herniação, trate rápido com manitol e, se necessário, hiperventilação; estabeleça um diagnóstico radiológico e trate a causa imediata intensivamente. Do contrário, posicione o paciente corretamente, evite hipertermia e convulsão e administre analgésicos e sedação básica inicial. Decida as formas de monitoração e inicie a monitoração da PIC e da PPC nos casos indicados. Procure manter a PIC abaixo de 20 e a PPC acima de 60 mmHg. Se a PIC subir e as manobras básicas de posicionamento, analgesia e sedação e controle da hipertermia já estejam tomadas, otimize-as e tente retirar uma pequena quantidade de líqüor se o paciente estiver com cateter de drenagem ventricular. Se isso não for possível ou insuficiente, a administração de manitol pode ser o próximo passo. Ele pode ser repetido outras vezes, se necessário. Quando a elevação da PIC se mantiver alta após todas estas manobras, ela é dita refratária à terapêutica inicial e a monitoração da SjO2 pode auxiliar a decidir a próxima estratégia terapêutica e guiar algumas delas. A melhor alternativa, a partir de então, deve ser individualizada para cada paciente.
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