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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE MEDICINA UNIDADE CURRICULAR VI SEMINÁRIO DO MÓDULO DE SAÚDE DA MULHER IV TIPOS DE BACIA OBSTÉTRICA E COMO AVALIAR E CONDUZIR AS DISTOCIAS Cuiabá- MT Novembro 2021 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE MEDICINA Anadiely Moreira Danilo de Assis Pinheiro Fabiula Pereira Gabriella Fernanda Moraes Giulia Carolina Pretto Guilherme Henrique Andrioni Higor Rafael Motta Iris Alvina Guarim Soares Vitória Maria Canton Seben TIPOS DE BACIA OBSTÉTRICA E COMO AVALIAR E CONDUZIR AS DISTOCIAS: Seminário do módulo de saúde do adulto apresentado aos professores da Unidade Curricular VI da Faculdade de Medicina da Universidade de Mato Grosso como pré-requisito de avaliação. Professor tutor: Profº. Dr. Antonio José Amorim Cuiabá- MT 2021 1. INTRODUÇÃO Distocia pode ser definida como anormalidade no desenrolar do trabalho de parto e sua causa pode estar relacionada com a alteração em um ou mais dos três fatores determinantes para o parto: o trajeto, a força e o objeto. A determinação do fator causal da distocia é o que permite a correção das anormalidades para que sejam tomadas medidas seguras que levem à evolução do parto vaginal ou à condução necessária para a cesárea, diminuindo, dessa forma, os riscos maternos e fetais relacionado ao diagnóstico de distocia1,2,3. Quanto à classificação das distocias, podemos fazer de acordo com os fatores determinantes do parto dividindo-as em: anormalidades na força contrátil, anormalidades do trajeto e anormalidades do objeto1. As anormalidades na força contrátil, também chamadas de distocias funcionais, podem ser classificadas em: distocia por hipoatividade, por hiperatividade, por hipertonia e por dilatação. Em relação ao trajeto, podemos dividir as distocias em ósseas, as quais se subdividem em anormalidades do estreito superior, do médio e do inferior, ou distocias de partes moles as quais incluem as anormalidades em vulva, períneo, vagina, colo e tumores prévios. Desse modo, é necessário que se conheça a anatomia da pelve feminina, em particular a óssea e suas alterações que podem levar às distocias1,4. Os dois ossos ilíacos, o sacro e o cóccix, com suas respectivas articulações (sínfise púbica, articulação sacroilíaca e sacrococcígea) formam a pelve óssea a qual se divide em grande e pequena bacia1,3. A grande bacia, limitada, anteriormente, pelos músculos abdominais, lateralmente, pelas fossas ilíacas e, posteriormente, pela coluna vertebral, é de pouca importância para a obstetrícia, quando comparada com a pequena pelve (ou escavação). A pequena pelve é limitada, acima, pelo estreito superior e, abaixo, pelo inferior. Além disso, entre os dois estreitos, está localizada a escavação1. O estreito superior é delimitado pelo promontório, pela borda anterior da asa sacral, pela articulação sacroilíaca, pela linha inominada, eminência iliopectínea e borda superior do corpo do púbis e da sínfise púbica1,4. O estreito inferior é composto da borda inferior dos ossos púbis (as quais são revestidas pelo ligamento arcuatum), pelos ramos isquiopúbicos, tuberosidades isquiáticas, borda interna dos grandes ligamentos sacrociáticos e extremidade do cóccix1,5. O estreito médio é delimitado, posteriormente, pelo ápice do sacro, passando pelas apófises transversas de S5, pela borda inferior dos pequenos ligamentos sacrociáticos, espinhas ciáticas, arcos tendíneos do elevador do ânus e terminando na face posterior do púbis1. 2. METODOLOGIA Este trabalho trata-se de uma revisão de literatura não sistemática que tem como objetivo agregar conhecimento acerca das principais distócias que podem ocorrer durante o trabalho de parto. Para o presente trabalho foram usados os principais livros textos brasileiros de obstetrícia conjunto a artigos selecionados nas plataformas PubMed, Scielo e Google Scholar dos últimos 10 anos a partir dos termos “distocia”, “anormalidades de trajeto”, e “anormalidades do objeto” e seus correspondentes em inglês. Os artigos tiveram seus resumos lidos primeiramente e, posteriormente, foram utilizados apenas os que traziam informações relevantes para o tema e complementassem os livros textos utilizados. 3. DESENVOLVIMENTO 3.1 TIPOS DE BACIA OBSTÉTRICA No estudo da obstetrícia, antes de aprofundarmos o conhecimento sobre as distocias, é importante compreender a classificação tradicional dos tipos de bacias realizada por Caldwell e Moloy em 1933, em que estas foram classificadas com base na forma do estreito superior em ginecoide, antropoide, androide e platipeloide1. A formação da bacia sofre influência de diversos fatores relacionados à raça, condições socioeconômicas, atividade física, características nutricionais da infância e da adolescência. Desse modo, atualmente acredita-se que existam formas mistas de bacias obstétricas e não apenas as quatro tradicionalmente descritas1, sendo que os tipos puros ocorrem menos frequentemente que os mistos, os quais são originados de combinações entre os vários grupos fundamentais3,4. A bacia ginecoide constitui a pelve feminina típica (corresponde a 50-62% das bacias femininas), apresenta estreito superior arredondado e diâmetro anteroposterior grande. O sacro é largo, côncavo e com inclinação média. O ângulo subpúbico é médio e o occipício fetal à insinuação é anterior. O diâmetro bituberoso é grande e o prognóstico para o parto vaginal é excelente1,4. Já o tipo antropoide é semelhante à bacia dos antropoides superiores (gorilas), representando 11-25% das bacias femininas. Apresenta estreito superior elíptico, com maior diâmetro no sentido anteroposterior e diâmetro transverso diminuído. O sacro é estreito e longo, o ângulo subpúbico é levemente estreitado e o occipício fetal à insinuação é posterior. O diâmetro bituberoso é pequeno e o prognóstico é favorável caso ocorra a insinuação, ou seja, não havendo distocia no estreito superior, ocorrerá boa evolução no restante da bacia1,3,4. O tipo androide possui as características da bacia masculina e ocorre em aproximadamente 20% das bacias femininas6. Apresenta estreito superior triangular e diâmetro anteroposterior pequeno. O sacro é estreito, plano, longo e inclinado para frente. As paredes pélvicas são convergentes, as espinhas ciáticas salientes, o ângulo subpúbico é estreito e o occipício fetal à insinuação é posterior. O diâmetro bituberoso é estreitado e o prognóstico é de distocias crescentes conforme a apresentação progride1,4. A bacia do tipo platipeloide ou bacia achatada é rara (possui incidência de 5-8%), contando com estreito superior ovalado, caracteriza-se pelo maior diâmetro no sentido transverso sobre o anteroposterior6. O diâmetro anteroposterior é menor e o sacro é largo, curto e côncavo. O ângulo subpúbico é amplo e o occipício fetal à insinuação é transverso. O diâmetro bituberoso é aumentado e o prognóstico descreve distocia maior na insinuação, que será amenizada posteriormente1,3. 3.2 ANORMALIDADES DO OBJETO As anormalidades de objeto são situações que envolvem o feto podendo prejudicar a progressão normal do parto, dentre estas podemos citar o tamanho fetal e a distócia biacromial1. 3.2.1 Tamanho fetal Situações em que o feto pesa acima de 4000g ou em casos que mesmo abaixo desse peso, o feto apresenta desproporção cefalopélvica, podem atrapalhar o desenvolvimento do parto normal. Alguns sinais podem ser vistos na hora do parto ou no pré-natal demonstrando que o crescimento fetal pode estar alterado, por exemplo, medida da altura uterina acima do percentil- 95 para a idade gestacional e outros sinais como edema em membros inferiores, edema suprapúbico e polo cefálico móvel, com problemas para insinuação adequada. Manobras como a de Pinard e de Muller permitem avaliar a proporcionalidadeentre polo cefálico e estreito superior1,7: a) Palpação mensuradora de Pinard; caracterizada como uma manobra bimanual, na qual uma das mãos do obstetra abaixa a cabeça fetal em direção à pelve via palpação abdominal, e a outra mão do obstetra verifica se o polo cefálico adentra o estreito superior. b) Toque palpatório de Muller; resume-se a forçar o polo cefálico rumo ao estreito superior da pelve, e simultaneamente avaliar a via vaginal, observando se há descida do polo e sua interação com a pelve. No caso de exames, a ultrassonografia pode auxiliar nessa mensuração do peso fetal, e viabilidade do parto vaginal. Há de se considerar que de todo modo, ainda que o peso fetal esteja acima de 4000g, apenas a prova de parto é capaz de determinar se o parto vaginal é passível de acontecer4. 3.2.2 Distócia de Biacromial Quando a apresentação é cefálica, o polo cefálico já se desprendeu, mas os ombros não se desprenderam, dá-se o nome de distócia de biacromial. Trata-se de uma complicação grave, porém rara, com incidência de 1% dos partos, aumentando em número expressivo em fetos com peso acima de 4000g. Alguns fatores de risco para essa anormalidade são o pós-datismo, obesidade materna e diabetes mellitus gestacional 6,8,9. 3.2.2.1 Riscos maternos e fetais Algumas das complicações que a distocia de biacromial pode causar à gestante são lacerações do canal de parto, atonia uterina com possíveis hemorragias e, em certos casos, rotura uterina. As complicações fetais mais comuns são lesões de plexo braquial, fratura de úmero e clavícula que podem evoluir para morte intraparto ou neonatal9. 3.2.2.2 Mecanismo da distocia de biacromial Geralmente a distocia biacromial se dá por conta do diâmetro biacromial entrar na pelve de encontro ao diâmetro anteroposterior do estreito superior. Comumente, a espádua anterior fica travada na sínfise púbica, o que leva ao desenvolvimento dessa anormalidade1. 3.2.2.3 Medidas preventivas Algumas medidas podem ser tomadas principalmente durante o acompanhamento do pré- natal a fim de se evitar o desenvolvimento dessa complicação grave. Algumas dessas medidas são o controle do ganho de peso materno, investigar diabetes mellitus gestacional, além de identificar fetos macrossômicos através de exames complementares, sendo a ultrassonografia a mais utilizada1,3. 3.2.2.4 Assistência a distócia biacromial Algumas manobras podem ser utilizadas a fim de se resolver tal complicação. Algumas das medidas que podem ser adotadas são: ● Não tracionar a cabeça fetal, uma vez que pode lesionar o plexo braquial ou bulbo; ● Ampliar episiotomia; ● Realizar a manobra de McRoberts que consiste na hiperflexão das pernas com conjunta aplicação de pressão suprapúbica na parturiente, com consequente deslocamento cranial da sínfise púbica e retificação da lordose lombar, liberando o ombro impactado; ● Realizar manobra de Rubin, que consiste na aplicação de pressão suprapúbica contínua sobre o ombro anterior fetal; ● Realizar o giro dos ombros fetais de uma posição sagital para oblíqua a fim de se liberar o ombro posterior e anterior; O ombro posterior também pode ser travado e para liberá-lo pode se utilizar a manobra de Jacquemier. Essa manobra consiste em suspender o polo cefálico, e a partir disso o obstetra deve introduzir a mão pela concavidade do sacro, pegando o antebraço fetal, e por deslizamento este é retirado pela face anterior do tórax, posteriormente abaixa-se o tronco liberando o ombro anterior1. Outra manobra muito utilizada é a de Woods, a qual consiste em girar o tronco fetal em 180 graus no sentido horário, liberando o ombro posterior. Em seguida gira-se o tronco em mais 180 graus no sentido anti-horário a fim de se liberar o outro ombro1,4. A manobra de Matthes consiste em colocar a parturiente em posição genupeitoral, tornando o ombro posterior em anterior, sendo, dessa forma, mais fácil de se apreender o braço e trazê-lo para fora da vagina. Para isso, caso o dorso fetal esteja à direita, introduz-se a mão direita, caso esteja à esquerda se introduz a mão esquerda. Após retirado o braço sacral, realiza- se uma rotação de 180 graus, levando-o para o púbis. Feito isso, retira-se o ombro anterior, que está sacral, e depois o braço1,3. Algumas outras manobras podem diminuir o diâmetro de biacromial como a fratura de clavícula ou a clidotomia, na qual se utiliza uma tesoura para cortar a clavícula. Quando se é impossível alcançar o ombro, a cesárea é indicada. Para isso, o obstetra deve rodar a cabeça fetal para a variedade occipito pública, fleti-la e reintroduzir lentamente na pelve materna, até as espinhas isquiáticas (manobra de Zavanelli)10. 3.3 ANORMALIDADES DO TRAJETO As principais anormalidades do trajeto são as distocias ósseas ou de partes moles e estas podem dificultar ou impedir a passagem fetal1. 3.3.1 Distocias ósseas São definidas como alterações na forma, na dimensão ou na inclinação da pelve que dificulte ou impossibilite o parto vaginal. Para a avaliação da pelve óssea, usa-se a pelvimetria que é realizada por meio de medidas externas e exames de toque vaginal visando estimar as dimensões da pelve. Apesar de a avaliação da pelve óssea permitir o diagnóstico de vício pélvico, muitas vezes só poderemos determinar a impossibilidade de parto por via vaginal na vigência do trabalho de parto1,6. 3.3.1.1 Anormalidades (vícios) do estreito superior Os diâmetros anteroposterior e transverso médio são os mais importantes aqui. Se o diâmetro anteroposterior for inferior a 10 cm ou diâmetro transverso médio com menos de 12 cm haverá vício do estreito superior1,4. O diâmetro anteroposterior pode ser inferido medindo-se a conjugata diagonalis, por meio do toque vaginal buscando ao fundo o promontório e depois medindo a distância entre a ponta do dedo médio e a parte proximal do dedo que está encostado na sínfise púbica. Ao obter essa medida, subtrai-se 1,5 cm e assim encontra-se o valor do diâmetro anteroposterior ou conjugata vera obstétrica. Valores de conjugata diagonalis inferiores a 11,5 cm correspondem aos diâmetros anteroposteriores inferiores a 10 cm definindo a presença de vício do estreito superior. Na ocorrência de distocia de estreito superior, a apresentação se mantém alta, mesmo se houver contrações uterinas eficientes; observa-se também maior frequência de apresentações defletidas e de situação transversa1,3. 3.3.1.2 Anormalidades (vícios) do estreito médio O estreito médio é o local mais frequente de distócias. Neste vício há parada progressiva da descida e associam-se, assim, a partos prolongados. Há tentativa de acomodação fetal com surgimento de bossa serossanguínea1. A avaliação do estreito médio é inferida pelo diâmetro bituberoso, o qual pode ser medido localizando a borda interna das tuberosidades isquiáticas e mensurando-se a distância entre estas com fita métrica, aplicada tangencialmente à borda superior do ânus. Considera-se que medidas do bituberoso inferiores a 10 cm sejam um indício de distocia do estreito médio1. 3.3.1.3 Anormalidades (vícios) do estreito inferior Essa forma de distócia deve ser considerada quando o diâmetro bituberoso se encontra com medida inferior a 8 cm. É raro e determina traumatismos perineais1. 3.3.2 Distocia das partes moles A distocia de partes moles é definida pela existência de irregularidades em uma das partes que integram o canal de parto – seja colo, vagina ou vulva, de forma que tais anormalidades criem dificuldade ou impedem a continuação do trabalho de parto3. 3.3.2.1 Distocia cervical Trata-se de quando o colo uterino impede a continuidade do parto. As alterações podem ser decorrentes de uma anormalidade funcional (espasmo de orifício interno) ou anatômico (colo rígido ou aglutinado após cervicites, cirurgias, cauterizações ou mesmo em primigestas idosas. Vale ressaltarque o colo uterino, em algumas situações, pode ficar completamente delgado ou apagado, levando a confusões com dilatação completa ou presença de bolsa amniótica íntegra. Em partos prolongados pode surgir o edema de colo, podendo ser sinal de DCP, o que dificulta a dilatação cervical. Em todo caso, em situações em que a dilatação permanece estacionária, faz-se necessário cesariana3,8. 3.3.2.2 Distocia de vulva e períneo Nesse caso, são situações que podem atrapalhar a evolução do parto: veias varicosas, edema ou estenose vulvar e condiloma acuminado são exemplos. Geralmente, essas condições não impedem o parto de via baixa, mas a maioria propicia maiores riscos para hemorragias e infecções1. 3.3.2.3 Distocia de vagina Os septos vaginais, nesse caso, são os maiores empecilhos para parto de via baixa. Septos transversos comumente impedem o parto vaginal, já os longitudinais, caso não se desloquem com a passagem fetal, podem ser seccionados durante o parto, não impedindo que este ocorra. A literatura mostra a importância de se pesquisar por essas anormalidades genitais antes da gestação, além de possíveis malformações uterinas associadas, possibilitando, dessa forma, tratamento adequado e evitando possíveis impedimentos de parto via vaginal1,6. FONTE: https://www.febrasgo.org.br/pt/noticias/item/184-distocias 3.4 ANORMALIDADES DE SITUAÇÃO E APRESENTAÇÃO Podem acontecer anormalidades de situação e apresentação durante o trabalho de parto (TP), no entanto, são situações raras5. Situação transversa e apresentação pélvica podem ser resolvidas realizando-se uma versão externa ou, dependendo do obstetra e do serviço, indicando-se uma cesárea. As anormalidades de apresentação devem ser observadas e avaliadas durante TP uma vez que essa apresentação pode se modificar. O fórcipe pode ser instrumento utilizado para rotacionar o feto para a variedade de posição occipito pública diante de uma variedade occipto transversa ou occipito posterior2,3. 3.4.1 Situação transversa A situação transversa tem correlação com a prematuridade, multiparidade, placenta prévia, polidrâmnio e anormalidades da pelve materna. Essa situação define-se quando o eixo longitudinal mais longo do feto está perpendicular ao maior eixo uterino, ou quando o feto se encontra oblíquo1. Usando as manobras de Leopold, durante a palpação abdominal, pode-se identificar essa situação. Por meio desta, consegue-se palpar em uma das fossas ilíacas o polo cefálico do feto e na outra o polo pélvico. Quando realiza-se o toque vaginal, no início do TP, não se percebe nenhuma parte apresentada. Apenas com a progressão do parto é que se pode identificar o acrômio fetal pelo toque, ou até mesmo um membro superior deste.1 Pode-se usar como ferramenta para confirmação dessa situação a ultrassonografia. Além disso, ela pode auxiliar no diagnóstico de uma placenta prévia e de tumores pélvicos, mais raramente. Identificar uma situação transversa torna necessária uma indicação de cesárea, uma vez que a progressão do trabalho de parto, diante desta, pode levar à complicações como hemorragia, infecção materna e sofrimento fetal1,2. 3.4.2 Apresentação pélvica. No início do trabalho de parto a apresentação pélvica pode estar presente em 3 a 4% dos casos2. Diante de uma apresentação pélvica, é necessário que se considerem os riscos à mãe e ao feto da progressão de um parto via vaginal. A gestante deve receber orientações a respeito dos possíveis riscos, além da importância de se avaliar peso fetal, presença de malformações, se as condições de saúde maternas são favoráveis. Pode-se realizar uma versão externa (pelo abdome materno, guia-se o polo pélvico para o fundo uterino fazendo a apresentação tornar-se cefálica), a qual na maioria dos casos evolui de forma satisfatória e reduz as taxas de cesáreas para este grupo de pacientes. Ademais, diante da exposição dos riscos, pode-se optar por realizar uma cesárea eletiva 1,4,5. 3.4.3 Apresentação de face. Quando o polo cefálico encontra-se em seu grau máximo de deflexão, teremos a apresentação de face, na qual o occipto fetal encontra-se em contato com o dorso e a parte que se apresenta ao toque vaginal é o mento. Estão relacionadas com esse tipo de apresentação a multiparidade, a macrossomia fetal, desproporção céfalo-pélvica, bacia do tipo platipelóide e prematuridade1,3. Quando a variedade de posição é a mento anterior, o parto via vaginal é possível embora seja mais prolongado que o usual e ofereça riscos aumentados de lacerações maternas e edema de face fetal. Caso a variedade de posição seja mento posterior o parto via vaginal só se tornaria possível caso ocorresse uma rotação e mudança de posição para mento anterior1. 3.4.4 Apresentação de fronte. Em uma apresentação de fronte, a deflexão de segundo grau, o diâmetro que assume a cabeça fetal não permite que ocorra a insinuação, logo, o parto via vaginal não acontece. No entanto, não é incomum que a cabeça assuma uma apresentação cefálica ou uma deflexão de terceiro grau, tornando-se uma apresentação de face. Nesses casos é possível a realização de parto vaginal mas deve-se atentar aos riscos de laceração materna e sofrimento fetal que já foram mencionados1,5. 3.4.5 Apresentação composta. Quando um ou mais membros fetais se insinuam na pelve materna juntamente do polo cefálico ou pelve, define-se como apresentação composta. Mais frequentemente estão associadas cabeça e mão fetais e este tipo de apresentação tem grande correlação com o risco de prolapso de cordão. O toque vaginal auxilia no diagnóstico de uma apresentação composta uma vez que se percebe a presença do membro associado. Suspeita-se de uma apresentação composta quando o trabalho de parto tem uma evolução prolongada ou quando não ocorre insinuação adequada2,3. Para dar seguimento ao parto por via vaginal deve-se avaliar a presença ou não de prolapso de cordão, além do bem estar e tamanho fetais. Pode acontecer do membro em procidência avançar para fora da pelve facilitando a evolução do parto vaginal ou ainda pode- se tentar realizar uma redução manual do membro fetal. Caso não seja possível nenhuma destas situações, opta-se pela cesárea1. 3.4.6 Variedade de posição occipito posterior ou occipto transversa. Geralmente associadas a um período expulsivo prolongado, as variedades de posição occipito posterior e occipto transversa podem ser persistentes mesmo diante de um aumento da dilatação. Nesta situação, a evolução do trabalho de parto pode se dar das seguintes formas: - Rotação para a posição occipito pública na maioria dos casos. - Rotação inversa para a variedade de posição occipito sacra. - Parada em variedade de posição occipito posterior ou occipto transversa. Pelves que possuem um estreito diâmetro transverso (como as antropóides) e distocia funcional de hipoatividade são as principais causas para a persistência da apresentação fetal nessas variedades de posição. O toque vaginal auxilia na identificação e classificação dessas variedades de posição. Para facilitar a rotação da cabeça fetal pode-se pedir para a mãe adotar a posição de decúbito lateral homônimo à apresentação além da possibilidade do uso do fórcipe de Kielland1. 3.5 DISTOCIA FUNCIONAL As distocias funcionais consistem em uma anormalidade no fator contrátil, associada ao trabalho de parto1. Essa circunstância influencia diretamente no avanço da dilatação cervical, sendo frequente em 37% das nulíparas com gestação de baixo risco, as quais possuem uma descida estimada em 3 horas1. A indicação mais comum para a cesárea inclui a distocia de parto1,4. É importante ressaltar que a assistência ao parto, sobretudo nesses casos, precisa prognosticar situações que possam aumentar o risco da distocia funcional. Além disso, sabe-se que a utilização de ociticina não pode ser indiscriminada ou inapropriada, como quandonão há um padrão de frequência cardíaca fetal tranquilizador, uma vez que tem sido, também, responsável pela ocorrência de anormalidades no trabalho de parto1. Cita-se, ainda, fatores psicológicos e emocionais, os quais são capazes de influenciar nas contrações da parturiente, sendo necessário um suporte e um acompanhamento direcionados6,8. 3.5.1 Distocia por hipoatividade Com base na classificação de Goffi, na distocia por hipoatividade, as contrações miometriais são lentas, fracas e ineficientes, prejudicando diretamente o trabalho de parto na fase de expulsão11. Se as contrações uterinas forem menos frequentes do que a cada três minutos, pode ocorrer o início da administração de ocitocina ou aumento da dose6. Na hipoatividade primária, o trabalho de parto já se inicia de forma morosa e ineficaz. Já na secundária, a parturiente possui a diminuição da atividade, com aumento do intervalo, por falta de estímulos uterinos, após contrações adequadas ou exacerbadas no início do parto1. Deve-se avaliar o quadro de hipoatividade de forma minuciosa, uma vez que se a descida for mínima (<1 cm) e as contrações uterinas parecerem apropriadas, considera-se que a possibilidade de um problema físico, a exemplo do mau posicionamento ou da macrossomia, como causa para a descida lenta e não se inicia o aumento da ocitocina1. Quanto à indicação de cesárea, não é imediata, visto que a correção pode ser feita com o emprego de técnicas para incitação do parto normal, por exemplo, estimulando-se a deambulação e, se necessário, recorrendo à administração de ocitocina ou à amniotomia3,4,6. 3.5.2 Distocia por hiperatividade A hiperatividade consiste na atividade uterina intensificada, o que se torna um alerta para avaliar a possibilidade de um processo obstrutivo que impeça o parto. Diante disso, classifica- se em distocia por hiperatividade sem obstrução aquela que se caracteriza pela evolução rápida, com menos de 3 horas, do trabalho de parto. Lacerações do trajeto são mais frequentes nesse tipo de parto, pois não há tempo para acomodação dos tecidos pélvicos, ocorrendo descida e expulsão do feto de modo abrupto5. A terapêutica para essa tal quadro evita ou trata possíveis traumas maternos e fetais decorrentes do trabalho de parto de curta duração e, para isso, utiliza- se a amniotomia tardia, analgesia precoce, revisão cuidadosa do canal de parto e observação rigorosa do recém-nascido11. Esse tipo de distocia, geralmente, está associado à administração excessiva de ocitocina. Nesse caso, deve-se suspender a infusão de ocitocina até o retorno a um padrão de contratura normal1. Caso ocorra alguma obstrução, isto é, o trânsito do feto pelo canal de parto é prejudicado, a constante atividade do músculo uterino irá consumir todas as suas reservas metabólicas, passando a consumir ácido lático no lugar do ATP, o que acaba por reduzir a força de contração. Sendo assim, o prolongamento desse quadro, pode levar à rotura uterina, sendo a cesárea indicada para evitar tais complicações5,6. 3.5.3 Distocia por hipertonia A hipertonia uterina se subdivide em polissistolia, superdistensão e descolamento prematuro de placenta (DPP). O tônus basal do útero é aumentado (> 12 mmHg), chegando a intensidades maiores que 30 mmHg, se dividindo, de acordo com sua magnitude, em: fraca (12 a 20 mmHg), média (20 a 30 mmHg) e forte (acima de 30 mmHg). Ela é caracterizada por ser promovida pelo aumento na frequência das contrações uterinas levando ao aumento no tônus uterino basal. O aumento no tônus basal, a diminuição do intervalo entre as contrações e a alta frequência delas podem levar à diminuição do fluxo sanguíneo placentário e, consequentemente, à hipóxia fetal, sendo imprescindível aumentar a vigilância da vitalidade fetal1,3,4,6. A polissistolia é subdividida em hiperestimulação e taquissistolia. A hiperestimulação é marcada pela ocorrência de cinco ou mais contrações em 10 minutos ou contrações com duração superior a 2 minutos e intervalo inferior a 1 minuto entre as contrações. O termo taquissistolia tem sido utilizado para definir o aumento do número de contrações uterinas (mais que cinco) sem alterações na frequência cardíaca fetal. A presença da polissistolia pode ser idiopática ou mesmo provocada pelo uso inadequado de ocitocina. O uso de ocitocina deve ser descontinuado, caso a paciente apresente polissistolia. A primeira medida terapêutica é a postura lateral da paciente completada por medicamentos inibidores da contratilidade uterina 1,4. A superdistensão ocorre em casos de gestação múltipla e polidrâmnio, e em muitas situações leva à distocia funcional. Na gemelidade, o tratamento é iniciado com amniotomia e administração de ocitocina para corrigir as irregularidades da contração uterina. A retirada do excesso de líquido pela ruptura das membranas é a alternativa nos casos de polidrâmnio: decresce o tônus, incrementa a intensidade das contrações e o parto progride rapidamente1,4. O DPP classicamente é acompanhado de hipertonia, em todos os casos há nítida hipertonia autêntica do útero pela elevação do tônus primário. Em caso de feto morto ou inviável, quando se objetiva parto vaginal, sua ocorrência pode dificultar a progressão do trabalho de parto. A terapêutica indicada engloba amniotomia, analgesia e até mesmo o uso de ocitocina para que as contrações possam se sobrepor à hipertonia instalada1,4. 3.5.4 Distocia de dilatação Também denominada distocia de incoordenação, é definida pela não progressão na dilatação do colo uterino em paciente em fase ativa do trabalho de parto, a despeito da presença de contrações uterinas em intensidade e frequência adequadas para o momento, sem causas obstrutivas aparentes. A proposta de tratamento para esses casos é inicialmente a realização de analgesia de parto. Caso não obtenha resposta, a amniotomia e a ocitocina podem ser utilizadas1,6. 3.5.5 Indicação de cesárea por distocia funcional A cesárea está indicada quando a distocia funcional for diagnosticada, todas as medidas terapêuticas forem instituídas e mesmo assim não ocorrer progressão do trabalho de parto, constituindo-se, desse modo, um caso de distocia funcional não corrigível. Portanto, ter tentado sua correção é condição essencial para a indicação de cesárea1,6. (Zugaib; Febrasgo) 4. CONCLUSÃO Portanto, conclui-se que o estudo dos tipos de bacias e das distocias para uma adequada assistência ao parto e para a redução da mortalidade materno-fetal é indispensável. O parto deve ser assistido de forma apropriada e com avaliação minuciosa em relação a cada etapa, em conjunto com uma equipe preparada para tomar decisões assertivas, ágeis e transparentes diante das adversidades que podem acontecer durante o seu desenvolvimento. O registro durante o trabalho de parto, o manejo adequado e a classificação de Goffi tornam-se uma ferramenta essencial para detecção precoce das distocias. Ademais, a análise da assistência pré-natal se faz fundamental nesse momento final da gestação, uma vez que os eventos pré-parto, como surgimento de infecções, distúrbios hormonais, doenças crônicas prévias e a história patológica pregressa da gestante como um todo podem afetar a evolução normal do parto. Referências bibliogáficas 1. Zugaib M, Francisco RPV. Obstetrícia. 3ª ed. Barueri, São Paulo: Manole, 2016. 2. Domingues RMSM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, et al. Processo de decisão pelo tipo de parto no Brasil: da preferência inicial das mulheres à via de parto final. 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