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1 CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI HISTÓRIA DA FILOSOFIA ANTIGA GUARULHOS – SP 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 4 2 A HISTÓRIA DA FILOSOFIA ................................................................................. 5 2.1 FILOSOFIA E SEUS PERÍODOS HISTÓRICOS ................................................................. 5 2.2 PERÍODOS HISTÓRICOS DA FILOSOFIA E AS ESCOLAS FILOSÓFICAS ............................... 7 2.3 DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO HUMANO ........................................................ 12 3 HISTÓRIA E FILOSOFIA...................................................................................... 14 3.1 CONFLUÊNCIA ENTRE FILOSOFIA, HISTÓRIA DA FILOSOFIA E FORMAÇÃO ...................... 15 3.2 O FUNDAMENTO E A NATUREZA HISTÓRICA DA FILOSOFIA........................................... 20 4 FILOSOFIA GREGA ............................................................................................. 25 4.1 CONHECIMENTO E MISTICISMO ................................................................................ 25 4.2 FILOSOFIA NA GRÉCIA ANTIGA ................................................................................ 28 4.3 INFLUÊNCIA DA FILOSOFIA NO ESTADO/GOVERNO .................................................... 30 4.4 PRINCIPAIS FILÓSOFOS DA GRÉCIA ANTIGA .............................................................. 31 4.5 O MÉTODO DOS PRINCIPAIS FILÓSOFOS DA GRÉCIA ANTIGA ...................................... 34 5 PRÉ-SOCRÁTICOS, SÓCRATES E SOFISTAS .................................................. 36 5.1 OS FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS ............................................................................ 37 5.2 TALES DE MILETO .................................................................................................. 39 5.3 HERÁCLITO.... ....................................................................................................... 39 5.4 PARMÊNIDES ......................................................................................................... 40 5.5 PITÁGORAS.. ......................................................................................................... 41 5.6 OUTROS PRÉ-SOCRÁTICOS ..................................................................................... 42 5.7 SÓCRATES..... ....................................................................................................... 42 5.8 SOFISTAS..... ........................................................................................................ 45 6 PLATÃO, AS IDEIAS E O REALISMO ARISTOTÉLICO ..................................... 46 6.1 REFLEXÕES FILOSÓFICAS ASSOCIADAS AO PENSAMENTO GREGO CLÁSSICO ................ 47 6.2 O PENSAMENTO DE PLATÃO E ARISTÓTELES ............................................................ 50 6.3 TEORIAS DO CONHECIMENTO DE PLATÃO E ARISTÓTELES ......................................... 53 7 PLATÃO E ARISTÓTELES .................................................................................. 55 7.1 A INFLUÊNCIA DE PLATÃO E ARISTÓTELES NO CONHECIMENTO CIENTÍFICO ATUAL........ 55 7.2 O PENSAMENTO DE PLATÃO E ARISTÓTELES ............................................................ 58 7.3 ÁREAS DO CONHECIMENTO INICIADAS POR PLATÃO E ARISTÓTELES ........................... 60 8 FILOSOFIA ANTIGA E A FORMAÇÃO DO PENSAMENTO OCIDENTAL ......... 61 3 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 64 4 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 5 2 A HISTÓRIA DA FILOSOFIA A história da filosofia é a disciplina responsável por estudar o pensamento filosófico, ordenado cronologicamente para se identificar o debate entre as ideias filosóficas no tempo. Neste capítulo, você vai ver os principais períodos históricos e as escolas filosóficas. A partir daí, acessará a trajetória histórica do desenvolvimento do pensamento humano. 2.1 Filosofia e seus períodos históricos Você sabe o que significa filosofia? Boécio (1998) nos lembra que, segundo a etimologia dessa palavra, filosofia significa “amor à sabedoria”. Ou seja, o desejo de conhecer, compreender e explicar as coisas da vida de forma mais profunda e reflexiva faz parte dessa disciplina. Mas como filosofar? Por meio da própria reflexão sobre o pensar e o agir humano. Então qualquer pessoa pode propor questões filosóficas? Sim, qualquer pessoa pode fazer suas questões diante do mundo, inclusive você. Indagar sobre a vida cotidiana também nos permite desenvolver o pensamento reflexivo, uma vez que as ideias do senso comum são questionadas, e, por meio da investigação filosófica, pode-se constituir o pensamento crítico. Desse modo, é preciso tomar distância do que conhecemos costumeiramente, a fim de analisar como se conhecêssemos aquilo pela primeira vez, como nos provoca Chauí (2000, p. 9): A Filosofia começa dizendo não às crenças e aos preconceitos do senso comum e, portanto, começa dizendo que não sabemos o que imaginávamos saber; por isso, o patrono da Filosofia, o grego Sócrates afirmava que a primeira e fundamental verdade filosófica é dizer: “Só sei que nada sei”. Para o discípulo de Sócrates, o filósofo grego Platão, a Filosofia começa com a admiração; já o discípulo de Platão, o filósofo Aristóteles, acreditava que a Filosofia começa com o espanto. Sendo assim, você pode realizar análises filosóficas a partir de muitas questões e ainda englobar inúmeras abordagens nessa reflexão, como enfatiza Aranha e Martins (2009, p. 21): 6 A filosofia é um tipo de reflexão totalizante, de conjunto, por que examina os problemas relacionando os diversos aspectos entre si. Mais ainda, o objeto da filosofia é tudo, por que nada escapa a seu interesse. Por exemplo, o filósofo se debruça sobre assuntos tão diferentes como a moral, a política, a ciência, o mito, a religião, o cômico, a arte, a técnica, a educação e tantos outros. Daí o caráter transdisciplinar da filosofia, ao estabelecer o elo ente diversas expressões do saber e do agir. Fonte: https://www.significados.com.br/filosofia-antiga/ Logo, pode-se imaginar que, desde o surgimento do homem, as preocupações sobre o modo de vida em sociedade e as explicações possíveis para os problemas da convivência no meio social se tornaram grandes estímulos para iniciar e aprofundar questões filosóficas. Contudo, o que orienta as respostas para essas explicações também marca uma época histórica em nossa sociedade. Ou seja, estudar a história da filosofia nos leva a estudar a história da constituição da nossa sociedade, que, por questões históricas de migrações, guerras e construçãode nações, faz com compreendamos também a história do pensamento Ocidental. Assim, ao conhecer e apreender a história desta disciplina, também compreendemos como se dão as mudanças de ideias ao longo do tempo. Nesse sentido, Moura (1988, p. 152) nos lembra que: Como é um fato que o passado da filosofia é relevante para a reflexão do presente – dirá Gueroult –, o estudo da história da filosofia tem interesse para a filosofia, e essa história, bem compreendida, é sempre uma história sapientiae, que nos mostra o passado como contemporâneo ao presente – sem com isso deformá-lo. 7 Por consequência, o estudo dos períodos históricos na filosofia corresponde ao estudo dos períodos históricos na história da sociedade Ocidental. Assim, baseado em Marcondes (2010), podemos periodizar a história da filosofia da seguinte forma. Filosofia Antiga corresponde à História Antiga, datada entre o surgimento do homem até o fim do século IV. Nessa época, passou-se do pensamento mítico- religioso para o pensamento filosófico-científico, evidenciando a noção da natureza, da causalidade e da racionalidade. Coube buscar as primeiras respostas para os dilemas existenciais humanos. Filosofia Medieval corresponde à Idade Média, período entre os séculos V e XV. Nesse momento, deu-se a transição do helenismo para o cristianismo, que veio acompanhando de uma deterioração cultural e econômica na Europa em decorrência do Império Romano do Ocidente. Filosofia Moderna corresponde à História Moderna, indo do século XV até o século XVIII. Nessa época, ocorre a descoberta das Américas, há uma ruptura com a tradição e valoriza-se o progresso e a individualidade. Na questão da fé, é a reforma protestante que entra em voga, questionando a autoridade institucional da Igreja. Filosofia Contemporânea corresponde à Contemporaneidade, período a partir do final do século XVIII até os dias atuais. Sua concepção busca encontrar respostas para a crise do projeto filosófico da modernidade, pretendendo-se, assim, atualizar o racionalismo, trazer novas alternativas para o questionamento da subjetividade e evidenciar questões de linguagens. 2.2 Períodos históricos da filosofia e as escolas filosóficas Agora, aprofundaremos nosso conhecimento sobre cada um dos períodos históricos da filosofia, a fim de compreender o desenrolar histórico do pensamento humano na sociedade Ocidental. Em cada período, também será destacada a principal escola que o representa. Cada escola é determinada por um pensador que teve suas ideias ecoadas na época em que viveu. Entretanto, devemos lembrar que estas “caixas” da história são apenas referências e que, quando falamos da história da filosofia, estamos na verdade falando sobre filosofar, como nos indica Merleau-Ponty (1980, p. 212): “[...] a ‘explicação’ 8 histórica é apenas uma maneira de filosofar sem dar na vista, disfarçar as ideias em coisas e pensar sem precisão. Uma concepção da história só explica as filosofias sob a condição de tornar-se também filosofia, e filosofia implícita”. A Filosofia Antiga engloba todo o pensamento filosófico anterior ao século V. Esse momento corresponde à Antiguidade, que vai da invenção da escrita (4000 a.C. a 3500 a.C.) até a queda do Império Romano do Ocidente (476 d.C.). Surgiu, então, a formação do Estado, e as civilizações existentes nesse período eram Egito, Grécia, Roma, Persas, Fenícios, povos germânicos, entre outros. Quanto ao desenvolvimento da filosofia, sobre esse período histórico Braz (2005) enfatiza o período pré-socrático, que faz referência ao período anterior à existência de Sócrates e destaca filósofos que se focavam com aspectos da natureza para responder suas questões; o período socrático, que, na figura de Sócrates, estimulava o diálogo para filosofar; o período sistemático, que é um período atribuído a Aristóteles; e período greco-romano, que destacou aspectos da cosmologia para buscar responder aos problemas da época. Segundo Marques (2007), as principais preocupações neste momento eram compreender a origem do universo, os fenômenos da natureza e os comportamentos humanos a partir da razão. Assim, não se aceita mais as explicações míticas e busca- se observar, analisar e fundamentar as explicações por meio da racionalidade humana. Uma das escolas mais representativas deste período da Filosofia Antiga é a Escola Socrática. Seu representante é Sócrates, que viveu durante o ano de 470 a.C. em Atenas, na Grécia. Dentre as preocupações centrais deste filósofo estavam a ética, a razão, a verdade e o questionamento. O discípulo mais conhecido de Sócrates foi o filósofo Platão que, inclusive, foi responsável por compilar e escrever as ideias de seu mestre (visto que Sócrates nada de escrito deixou). Sócrates foi um filósofo que agiu pela fala e por ela influenciou seus concidadãos – e se um indivíduo se define como político na medida em que age e influencia os demais por meio da palavra viva, em ato (isto é, a fala), Sócrates foi sem dúvida o mais público, o mais político, o mais cidadão de todos os filósofos. E, embora só possamos ter e construir imagens dele a partir do que se escreveu a seu respeito – o que é inevitável –, a imagem que predomina sobre as demais – ou as monopoliza – é a de um filósofo em ação e sobretudo da ação: um cidadão que agiu sobre outros cidadãos falando, conversando e discutindo com eles; um cidadão que sustentou e defendeu a palavra falada, viva (em contraposição à palavra escrita, que tinha na conta de morta), como meio de ação na e para a pólis. 9 O método utilizado por ele ficou conhecido como método socrático. Esse método visava à construção de conhecimento pelo homem a partir de questionamentos sobre questões banais. Assim, o diálogo entre professor e aluno não era mais um processo de simples transmissão de ideias, mas uma profusão de trocas em que se podia realizar novas aprendizagens. A Filosofia Medieval comporta o período que é determinado entre os séculos V e XV. Sua correspondência histórica se deu com a Idade Média, que começou com a queda do Império Romano do Ocidente, em 476 d.C., e foi até a tomada de Constantinopla, capital do Império Bizantino. Esse período ficou conhecido como Idade das Trevas, visto que se opôs à difusão de conhecimento existente no período anterior, o Renascimento, como desenvolve Franco Júnior (2001, p. 9-10): Admirador dos clássicos, o italiano Francesco Petrarca (1304-1374) já se referira ao período anterior como de tenebrae: nascia o mito historiográfico da Idade das Trevas. Em 1469, o bispo Giovanni Andrea, bibliotecário papal, falava em media tempestas, literalmente “tempo médio”, mas também com o sentido figurado de “flagelo”, “ruína”. A idéia enraizou-se quando em meados do século XVI Giorgio Vasari, numa obra biográfica de grandes artistas do seu tempo, popularizou o termo “Renascimento”. [...] De qualquer forma, o critério era inicialmente filológico. Opunha-se o século XVI, que buscava na sua produção literária utilizar o latim nos moldes clássicos, aos séculos anteriores, caracterizados por um latim “bárbaro”. A arte medieval, por fugir aos padrões clássicos, também era vista como grosseira, daí o grande pintor Rafael Sanzio (1483-1520) chamá-la de “gótica”, termo então sinônimo de “bárbara”. Na mesma linha, François Rabelais (1483-1553) falava da Idade Média como a “espessa noite gótica”. Nessa época, a cultura greco-romana é recuperada, e a igreja Católica tem uma forte influência sobre a produção de conhecimento. Sendo assim, a figura de Deus torna-se base para as explicações, e a filosofia leva em consideração as orientações teológicas da época. Um dos principais expoentes nesse período é Santo Agostinho, que viveu de 354 a 430 na Argélia. Para ele, era Deus que atuava na vida do homem, de modo que essa relação era considerada fundamental paracompreender o comportamento humano e até mesmo outros fenômenos. Nesse sentido, Franco Júnior (2001, p. 145) enfatiza que “[...] é preciso lembrar que para ele as verdades da fé não podem ser demonstráveis pela razão, mas esta pode confirmar aquelas: ‘compreender para crer, crer para compreender’”. 10 Outro expoente é São Tomás de Aquino, que viveu de 1225 a 1274 na Itália. Ele retomou a escola aristotélica a partir de princípios do cristianismo. Este último é definido por Santos (2017, p. 139): Trata-se de Tomás de Aquino, inteligência única na história humana, um pensador que, além de demonstrar a compatibilidade entre as ideias de Aristóteles e a fé cristã, desenvolveu um sofisticado sistema racional que apresenta e demonstra, de forma racional, as mais profundas questões que envolvem o ser humano (ética, estética, lógica, etc) e sua respectiva relação com Deus (fé, salvação da alma, missão da Igreja, etc.). A Filosofia Moderna começa no século XV e vai até o século XVIII. Com a queda do Império Romano do Ocidente, o poder da igreja Católica diminuiu, e, então, a filosofia passa a valorizar a reflexão humana como partida do raciocínio filosófico. Para aprofundar a discussão, Dias (2005, p. 87) afirma que: A modernidade, caracterizada como uma ordem pós-tradicional, ao romper com as práticas e preceitos preestabelecidos, enfatiza o cultivo das potencialidades individuais, oferecendo ao indivíduo uma identidade “móvel”, mutável. É, nesse sentido, que, na modernidade, o “eu” torna-se, cada vez mais, um projeto reflexivo, pois aonde não existe mais a referência da tradição, descortina-se, para o indivíduo, um mundo de diversidade, de possibilidades abertas, de escolhas. O indivíduo passa a ser responsável por si mesmo e o planejamento estratégico da vida assume especial importância. Logo, o homem ganha centralidade nas respostas das indagações da época, e as questões humanas passam a ser o centro de preocupações filosóficas. Assim, o homem não é mais passivo do mundo em que vive, pelo contrário, ele é agente do seu processo de existência e aos poucos vai se dando conta disso, como reforça Chauí (2000, p. 57): “[...] A realidade é um sistema de causalidades racionais rigorosas que podem ser conhecidas e transformadas pelo homem”. A escola identificada neste período envolve o racionalismo clássico. O filósofo que encabeçou as bases filosóficas neste momento foi René Descartes. Ele foi um filósofo francês, nascido em 1596, que propôs uma obra intitulada “discurso do método”. Nessa publicação, Descartes aposta em uma metodologia racional para se buscar a verdade, contrapondo-se à autoridade eclesiástica. Seu método é nomeado cartesiano. Sobre esse método, Battisti (2010, p. 575) enfatiza que: 11 O método cartesiano brota da reflexão sobre a matemática como paradigma metodológico e, ao mesmo tempo, da reflexão sobre os poderes resolutivos espontâneos possuídos por nossa razão. A matemática serve de ocasião para que a racionalidade revele seu modo de operar e seus poderes. [...] Assim, a resposta para esse conjunto de dificuldades parece ser o seguinte: o método de análise cartesiano não é de natureza matemática. A matemática serve de ilustração ao método e, como tal, é uma fonte importante para compreendê-lo. A matemática é o horizonte privilegiado de atuação da razão, graças a suas características inerentes e, por isso, merece lugar de destaque na investigação metodológica do filósofo. Descartes é um praticante da análise, método que espontaneamente emergiu no interior da ciência matemática, mas que deverá ser justificado na medida em que revela o modus operandi de nossa capacidade de conhecer. A Filosofia Contemporânea é considerada desde o final do século XVIII – que tem como marco a Revolução Francesa em 1789 – e vai até os dias de hoje. No entanto, enfocaremos o começo do período para refletir como ele é determinante de toda uma reflexão acompanhada de experiências de lutas e reivindicações por direitos e expressões políticas. Podemos dizer que esse foi um período de agitação política que questionou as estruturas de Estado na época, e, após derrubarem o governo vigentes, na França, definiram-se novos valores para a sociedade, como liberdade, igualdade e fraternidade. Essa situação política ecoou em outros países e transformou o modo de pensar da população como um todo. Desse modo, o eco da Revolução Francesa reverberou adiante: A literatura e o discurso propriamente político continuaram sendo muito naturalmente o lugar onde se inscreve a referência à Revolução Francesa, permanecendo até o início do século XX a referência maior a uma modificação violenta da ordem social e institucional, como o lugar fundador de toda uma filosofia política. Lembrança da herança dos valores-chaves - liberdade, igualdade, fraternidade - reflexão sobre as vias da passagem de um estado social a um outro, pela riqueza das experiências históricas da qual era portadora, a Revolução Francesa pôde ser reclamada sucessivamente pelos movimentos liberais do século XIX nacionais, assim como conheceu, a partir de 1848, uma espécie de apropriação pelas correntes socialistas, e o movimento operário, integrando em seu patrimônio a referência a essa experiência coletiva. No que definimos como plasticidade da herança revolucionária, é evidente que não foram considerados os mesmos aspectos da herança, ou os mesmos heróis, de 1789 ou 1793, Mirabeau ou Robespierre (VOVELLE, 1989, p. 44). Quanto ao ponto de vista da filosofia, de forma geral, as afirmações universais da tradição filosófica foram colocadas em xeque, e novas reinvindicações filosóficas entraram em voga. Nesse momento, a ênfase de análise é dada para condição de vida do homem na sociedade e diversas escolas a compõem. 12 Para compreender este momento histórico, Domingues (2006, p. 9-10) entende que: Trata-se de uma época em que as distinções dos campos disciplinares eram mais elásticas, as especializações mais fluidas e a filosofia moral garantia a ligação da filosofia e da ciência com o mundo da ação, ligação requerida por toda a sabedoria que se preze, do Oriente e do Ocidente. Ora, é justamente esse liame da filosofia, da ciência e da sabedoria que se rompeu no curso da modernidade, gerando a conhecida situação de uma ciência sem filosofia e sem sabedoria, bem como de uma filosofia sem sabedoria e sem ciência. Minha tentativa ao longo da conferência, uma vez convencido de que esse estado de coisas não pode persistir, sob pena de pôr tudo a perder, será justamente a de restabelecer as pontes entre a filosofia, a ciência e a sabedoria (bem entendido: a sabedoria não é uma disciplina, mas um olhar e uma atitude), tendo por foco a filosofia contemporânea e por eixo os grandes desafios do pensamento no século XXI. Uma das escolas que se destacou nessa época é a escola marxista. Karl Marx nasceu na Alemanha, em 1818, e morreu no Reino Unido, em 1883. Sua proposta de metodologia envolvia a análise socioeconômica das relações sociais e visava à dialética para a transformação. Para Marx, é a contradição das próprias ideias que levam a novas ideias. Portanto, a proposição da dialética é de refletir acerca da realidade, e não mais de interpretá-la. 2.3 Desenvolvimento do pensamento humano A partir da filosofia, podemos perceber que o pensamento humano passa por transformações tanto no sentido de negar ideias que antes eram consideradas corretas como de retomar conceitos e proposições antigas em novos contextos. Sendo assim, o que é considerado verdade é ressignificado com o passar do tempo, e o estudo da história da filosofia nos apresenta as características que são evidenciadas em cada período. Desse modo, a história da filosofia explicita uma sequência histórica do pensamento humano, mostrando questões relevantes em cada período histórico da sociedadeOcidental, como reforça Porta (2002, p. 25), [...] trata-se de ter opiniões sobre certos temas bem definidos e sustentá-las em algo diferente de uma convicção pessoal; mais ainda, o núcleo essencial da filosofia não é constituído de crenças tematicamente definidas e racionalmente fundadas, senão de problemas e soluções. 13 Contudo, só podemos ter certeza da pertinência de “problemas e soluções” que marcam um período quando temos certo distanciamento sobre essa época, pois também estamos contaminados por diversas outras questões que julgamos pertinentes. Ainda se deve levar em conta que os acontecimentos históricos são marcadores de mudanças de paradigmas, o que torna ainda mais importante compreender a história do homem e o desenvolvimento da sociedade. Assim, evidencia-se também que a filosofia se constitui como atributo humano, possibilitando tanto o acúmulo de saber como a reflexividade sobre esse saber. Nesse sentido, Chauí (2000, p. 13) explica que: As indagações filosóficas se realizam de modo sistemático. Que significa isso? Significa que a filosofia trabalha com enunciados precisos e rigorosos, busca encadeamentos lógicos entre os enunciados, opera por conceitos ou ideias obtidas por procedimentos de demonstração e prova, exige a fundamentação do que é enunciado e pensado. Somente assim a reflexão filosófica pode fazer com que nossa experiência cotidiana, nossas crenças e opiniões, alcancem uma visão crítica de si mesmas. Não se trata de dizer “eu acho que, mas de poder afirmar “eu penso que”. Nesse sentido, o estudo do pensamento humano nos permite compreender quais são as bases para as explicações das questões filosóficas e buscar novas soluções para problemas da sociedade. Contudo, para isso temos de partir de algum lugar, de alguma pergunta, de algo que nos intrigue, como a dúvida, assim como todos esses pensadores explicitados ao longo do capítulo o fizeram para iniciar suas reflexões. Como enfatiza Fernandes (1994, p. 341): “Parte-se da dúvida, fazem-se conjecturas e aplica-se o raciocínio explicativo causal. Chega-se assim a à ‘certeza’ possível”. Dessa forma, é preciso reconhecer nossa ignorância diante do mundo, a fim de que possamos construir conhecimento sobre ele. Chauí (2000, p. 111) também enfatiza uma questão relevante: Ignorar é não saber alguma coisa. A ignorância pode ser tão profunda que sequer a percebemos ou a sentimos, isto é, não sabemos que não sabemos, não sabemos que ignoramos. Em geral, o estado de ignorância se mantém em nós enquanto as crenças e opiniões que possuímos para viver e agir no mundo se conservam como eficazes e úteis, de modo que não temos nenhum motivo para duvidar delas, nenhum motivo para desconfiar delas e, consequentemente, achamos que sabemos tudo o que há para saber. [...] A incerteza é diferente da ignorância porque na incerteza, descobrimos que somos ignorantes, que nossas crenças e opiniões parecem não dar conta da 14 realidade, que há falhas naquilo em que acreditamos e que, durante muito tempo, nos serviu como referência para pensar e agir. Na incerteza não sabemos o que pensar, o que dizer ou o que fazer em certas situações ou diante de certas coisas, pessoas, fatos, etc. Temos dúvidas, ficamos cheios de perplexidade e somos tomados pela insegurança. No entanto, como manifestar essas questões, expor as dúvidas sobre o mundo e apresentar os problemas mais profundos que o ser humano espera resolver? Um desses meios seria a própria linguagem, pois é por meio dela que se dá a comunicação entre os homens e que se explicita o raciocínio lógico para desvendar questões que nos inquietam. Sobre a linguagem, Pokorski (2010, p. 97) afirma que: A linguagem é um meio pelo qual se comunica algo a outra pessoa. Essa comunicação pode ser expressa de várias formas. A mais utilizada é a linguagem verbal, ou seja, as palavras faladas ou escritas. A comunicação também se dá através da linguagem não verbal expressa em gestos, desenhos, músicas, pinturas, mímicas, silêncios, sonhos, etc. [...] A linguagem é um meio pelo qual se comunica algo a outra pessoa. Essa comunicação pode ser expressa de várias formas. A mais utilizada é a linguagem verbal, ou seja, as palavras faladas ou escritas. A comunicação também se dá através da linguagem não verbal expressa em gestos, desenhos, músicas, pinturas, mímicas, silêncios, sonhos, etc. Assim, entendemos a importância da linguagem para canalizar as nossas dúvidas, apresentar possibilidades de reflexões sobre elas e também construir conhecimento sobre o mundo. Chauí enfatiza que: “[...] para se relacionarem com o mundo e com os outros humanos, os homens devem valer-se de um outro instrumento – a linguagem – para persuadir os outros de suas próprias ideias e opiniões” (2000, p. 139). Um dos atributos da linguagem é que ela nos ajuda a encontrar a verdade, a expor nossas ideias e a chegar a conclusões sobre o mundo. Sendo o homem questionador sobre si e o mundo em que vive, cabe a ele desvendar o desenvolvimento humano por meio da linguagem e buscar novas verdades. Essa troca entre os seres humanos é fundamental, e o que é construído como saber pode ser acumulado como conhecimento não só para o homem que a descobriu, mas também para as gerações futuras. 3 HISTÓRIA E FILOSOFIA Podemos dizer que a história é filosófica ou a filosofia é histórica? Ao longo dos anos, essas disciplinas existiram mútua e complementarmente. Isso significa que a 15 história da filosofia participa da história e vice-versa, uma vez que a história é a narrativa sobre os fatos e tais fatos só podem ser narrados por uma consciência reflexiva. Assim, a filosofia existe e é feita a partir de sua própria história, que se mescla à história dos fatos, lhes atribuindo sentido. 3.1 Confluência entre filosofia, história da filosofia e formação A relação entre filosofia e história existe a partir de uma necessidade mútua que acaba por confluir em um ideal, ou busca, de formação. Ou seja, primeiramente, a sistematização histórica da filosofia só é possível pela característica histórica da própria filosofia. Nesse contexto, cabe dizer que a história alimenta as questões filosóficas e vice-versa. Portanto, a própria filosofia, enquanto reflexão constante sobre a realidade e tudo que a envolve, já tem a posição de um trabalho sobre o pensamento, de uma formação de um pensamento que nunca se conclui ou se esgota. Do mesmo modo, a história contribui para o ideal de formação em um sentido mais hegeliano, segundo o qual, por meio da dialética, o acúmulo de conhecimento levaria o homem à síntese, quando não haveria mais a necessidade histórica. Com isso, Hegel (1770–1831) via na relação entre filosofia e história uma possibilidade messiânica: a reflexão filosófica levaria o indivíduo à evolução extrema e a história cumpriria seu papel demonstrando quais caminhos anteriores tiveram melhor e menor desempenho. Assim, o indivíduo, enfim, apreenderia com seus erros e chegaria ao seu ápice. Fonte: https://www.ex-isto.com 16 Entretanto, vale resgatar a relação tríplice desde os primórdios, no pensamento antigo. Os gregos já pensavam a educação, a formação do cidadão da polis, por meio da história e da filosofia. Em Paideia, Jaerger (1995) elucida os ideais de educação do homem grego, vinculados à filosofia e à história, principalmente às narrativas míticas que, por mais irreais que fossem, promoviam uma concepção de tradição em que os valores culturais, morais e éticos eram passados de geração a geração. A decadência da narrativa mítica se deu muito por conta do caráter racionalista/ filosófico que o pensamento pré-socrático trouxe para o contexto grego. No entanto, tal decadência não distanciou o homem grego de um ideal de tradição e formação; na verdade, intensificou a intersecção entre ambos os estudos. Platão (2000), emA República, por exemplo, confia o governo da polis aos filósofos, pois estes seriam os detentores do conhecimento do mundo das ideias e responsáveis por governar a cidade, tendo como ideal a organização social de acordo com as capacidades de cada cidadão. Já no diálogo Menon, Platão (2001) apresenta o modelo de formação educativa que deveria ser aplicado na polis: o homem grego deve ser educador por um saber-virtude. Ou seja, a arete — a excelência virtuosa — só pode ser alcançada por meio do saber. Nesse contexto, como ressalta Jaerger (1995), a problematização do que é virtude, o que é virtude por excelência (Bem) e quais são as virtudes menores (prudência, coragem, etc.) segue a tradição histórica desde os poetas antigos: Hesíodo, Homero, Teógnis, Simônides e Píndaro. Entretanto, mesmo a filosofia estando na história, tendo uma história e dependendo da história para se organizar, a filosofia não é empírica. Isso significa que a filosofia pode partir de escolas de pensamento, de tradições filosóficas e de fatos políticos (o que leva um Estado, ou mesmo um país, a guerrear com outro? Sendo a morte moral e eticamente reprovável, por que o indivíduo é autorizado/legitimado a matar em situação de guerra?), socioculturais, socioeconômicos e estéticos, mas sua função se mantém aberta a refletir novos sistemas que abarquem tais problemáticas. Nesse sentido, as questões filosóficas se constroem por meio da história, ou seja, a construção do conhecimento humano, no sentido filosófico e histórico, depende da intersecção dessas duas áreas do conhecimento: uma não existe sem a outra. Com isso, pode-se dizer que a história em sua factualidade alimenta o lastro do conhecimento, enquanto a filosofia alimenta o pensamento de uma época que, por sua vez, se torna histórico. A formação, nesse sentido, depende de ambas áreas do 17 saber, na medida em que o conhecimento formador é acumulado pela história e deve ser pensado, questionado ou ainda endossado, por meio da reflexão crítica filosófica. Outro conceito bastante caro à tradição filosófica, histórica e pedagógica, e que abarca a correspondência entre esses três pilares, é o conceito de Bildung. Tal termo designa o conceito alemão de formação. Contudo, ao longo da história, ele assume um sentido mais amplo: torna-se um ideal de formação que tem por fundamento tanto o racionalismo do filósofo francês René Descartes (1596–1650), segundo o qual o sujeito é autônomo e depende somente de sua razão, quanto uma concepção metafísica amparada no desenvolvimento da alma, como no movimento classicista, que buscava por meio do teatro e da literatura educar o homem moralmente. Tal conceito assume um caráter ainda mais racionalista a partir da filosofia de Immanuel Kant (1724–1804). Para Kant, especificamente em Resposta à pergunta: o que é o esclarecimento? (1783), o homem pode se emancipar intelectualmente. Ou seja, os indivíduos devem ser educados, ou formados, para fazerem uso de sua razão e serem, desta forma, autônomos. Mas é com Jean-Jacques Rousseau (1712–1778) que Bildung ganha um caráter fortemente pedagógico: trata-se de criar uma teoria da formação com orientações pedagógicas e regras que visam formar o indivíduo virtuoso por meio da história, da cultura e da filosofia. Nesse contexto, a formação, a filosofia e a história se retroalimentam, visto que a construção de um destes pilares está vinculada à construção dos outros, interseccionados em sua origem e continuidade. Assim, recaímos em outra relação que a filosofia trava com a sua continuidade histórica: a de recepção. Nesse sentido, o trabalho filosófico depende da recepção de um pensamento também pela tradição, ou seja, pelo lugar de conhecimento acumulado pela história. A originalidade do conhecimento, em seu devir, só pode se estabelecer a partir da necessidade que é apontada pela construção do tempo atual mediante as necessidades que foram respondidas anteriormente. Isso significa dizer que mesmo o novo é resultado de um conhecimento que não depende apenas de quem o produziu. Sendo assim, falar de uma continuidade significa falar de qual possibilidade de continuidade pode existir. Portanto, é natural que faça parte do pensamento filosófico a formação de indivíduos capazes de suplementar o pensamento filosófico. Nesse contexto, o filósofo naturalizado francês Jacques Derrida (2005) forneceu uma 18 importante contribuição ao longo de sua obra, que servirá para pensar o conceito de suplementaridade relacionado à história, à linguagem, à formação e, em especial, à problematização da continuidade filosófica. Esse conceito aparece como ideia central da obra derridiana, e, se formos nos ater à referênciação por um rastreamento total da obra de Derrida, poderíamos dizer que esse conceito avança desde seus textos de juventude aos textos mais tardios. Contudo, pode-se ressaltar a centralidade dessa reflexão em três obras em especial: Gramatologia (1967), Escritura e Diferença (1972) e Margens da Filosofia (1979). Pensar a história a partir de sua suplementaridade é colocá-la como lugar de acontecimentos tanto do real como do pensamento. Partamos da seguinte explanação para compreendermos esse conceito: Júlia adotou um gato e batizou-o como Cartola; toda vez que Júlia busca explicar como Cartola é, tem que recorrer a outras palavras para tentar defini-lo; Cartola só é Cartola porque existem outros gatos. Fonte: https://co.pinterest.com/pin 19 Ou seja, ao nomear o gato, Júlia buscou que o gato dela fosse representado, definido, pelo nome Cartola. Entretanto, toda vez que alguém pergunta sobre o gato, Júlia tem que recorrer a outras palavras para defini-lo: “[...] o Cartola é pretinho, com duas pintas brancas, gosta de arranhar novelos de lã e comer peixes”. Este é o primeiro aspecto que define a suplementaridade: quando, por meio da linguagem, buscamos definir algo por um nome, acabamos por ter que recorrer a outras palavras para explicá-lo. Desta forma, acabamos por suplementar algo, alguém, qualquer coisa, ser ou matéria existente; esta é lei da linguagem. A segunda suplementação que há é: “Cartola só é Cartola porque existem outros gatos”. Ou seja, para que exista B deve existir A. Nesse sentido, o que faz com que exista a luz é a escuridão, e o mesmo vale para Cartola, que só pode se chamar Cartola e ser singular porque existem outros gatos. De outro modo, se não existisse mais nenhum um gato, talvez essa segunda suplementação não fosse necessária, pois ele não precisaria de um nome para diferenciá-lo dos demais, para fazê-lo saber que se trata dele e que deve atender quando o chamam pelo nome. Mas, afinal, qual a relação entre suplementaridade e história, filosofia e formação? Bom, tudo que existe, existe pela diferença. Dito de outro modo, para eu ser, é necessário que o outro seja, e que sejamos diferentes um do outro, e, por essa diferença, podemos ter nossa singularidade: “[...] quando não podemos tomar ou mostrar a coisa, passamos pelo desvio do signo [...]. A circulação dos signos difere o momento em que poderíamos encontrar a própria coisa [...]. O signo diferindo a presença, só é pensável a partir da presença que ele difere e em vista da presença diferida que se quer reapropriar” (SANTIAGO, 1976, p. 85). Nesse contexto, o mesmo vale para cada área de conhecimento que aqui estamos tratando. A história, nesse sentido, existe em sua continuidade pela sua suplementaridade. Ou seja, a história é marcada por acontecimentos e pela narrativa desses acontecimentos. Portanto, em relação ao Holocausto nazista, por exemplo, a história suplementa o acontecimento do nazismo ao tentar defini-lo, ainda que com fatos sobre o próprio nazismo, pois, antes de tudo, trata-se de uma narrativa (real e comprovada por documentos) que é suplementada pela história do próprio acontecimento.Em relação à filosofia, o conceito de suplementaridade tem um emprego mais forte, pois pode-se dizer que a atividade filosófica é suplementar o mundo, o ser e a 20 realidade a todo momento. Assim, não existe produção filosófica sem suplementação. A principal função da filosofia é a reflexão sobre o mundo, seja em qual categoria for. Dessa forma, sempre que a filosofia busca compreender algo, ela busca defini-lo, porque compreender é introjetar um sentido em algo que faz muito mais sentido para quem “compreende” do que em relação ao objeto em si. Ao compreender, ao versar sobre algo, suprime-se este algo e suplementa-o. Sobre o pensamento filosófico, a própria tradição filosófica é a história da suplementação filosófica na medida em que, para que se fale sobre o ser, suplementa-se todos os outros que já falaram sobre o ser a fim de trazer um caráter original à abordagem sobre o ser. Saiba mais O conceito de suplementaridade, na filosofia derridiana, é um sinônimo do conceito de différance. Em uma palestra de 1968, Jacques Derrida (1968 apud GOULART, 2017) assinala a alteridade do termo différence (diferença) pelo termo différance. Observe a alteração na substituição do “e” pelo “a” Com isso, Derrida buscou demonstrar a suplementaridade que existe pela diferença, inclusive nela mesma, tanto que se altera em sua grafia. No francês, sonoramente, não é possível distinguir a alteração. Nesse sentido, Derrida quis chamar a atenção para o plano da escritura, da tessitura textual como possibilidade de ressignificação dos signos (GOULART, 2017). É desta forma que se institui, principalmente em relação à filosofia, a necessidade de uma continuidade que deve se dar pela formação. Uma vez que não há filosofia sem suplementaridade, é ela (a suplementaridade) que garante a continuidade da história da filosofia. 3.2 O fundamento e a natureza histórica da filosofia Pode-se dizer que o fundamento da história da filosofia é o fato da filosofia ser histórica (CHAUÍ, 2000). Isso significa dizer que a filosofia está sempre atrelada a uma construção histórica dela mesma e sempre interferindo na construção do pensamento que define um período da história. Portanto, não há filosofia sem história do 21 pensamento: “Assim, por exemplo, a Filosofia teve seu campo de atividade aumentado quando, no século XVIII, surge a filosofia da arte ou estética; no século XIX, a filosofia da história; no século XX, a filosofia das ciências ou epistemologia, e a filosofia da linguagem” (CHAUÍ, 2000, p. 52). Ou seja, como podemos, enquanto indivíduos e sociedade, saber quem somos? Essa questão apresenta duas implicações que demonstram o caráter histórico da filosofia: saber quem somos depende de olharmos para o passado, o que nos construiu até aqui, tanto no âmbito individual quanto no universal; essa pergunta sempre se mantém aberta, pois depende também de como se interpreta o passado e como se reconhece o presente. Nesse sentido, a filosofia é constituída a partir de um processo que nunca cessa, que é continuo, pois trata-se de uma eterna redefinição e reelaboração de quem somos perante o passado e o presente (CHAUÍ, 2000). Desse modo, em relação às áreas do saber que incluem também a filosofia, existem obras que se tornam canonizadas e que, entretanto, são resultado constante e incessante do presente. Ou seja, pode-se afirmar que tudo é clássico comparado à ordinaridade do cotidiano. Entretanto, vale ressaltar que o processo historiográfico da filosofia, em especial quando pensado por pensadores à frente de determinada época, busca quase sempre uma contemporaneização de teorias anteriores (CHAUÍ, 2000). É como se o pensamento presente tivesse a missão de tampar as rachaduras deixadas por teóricos passados. Entretanto, outra questão suscitada por este modo de pensar e fazer filosofia é: seria possível fazer filosofia sem levar em consideração a história da filosofia? Não, pois a filosofia é construída a partir de conceitos; assim, por exemplo, como falar do conceito de virtude sem levar em consideração a história ética da filosofia? Ademais, provavelmente se chegaria a uma conclusão que já existe. Outro ponto relevante é que, ao abordar uma problemática filosófica tendo como referência uma obra clássica, não significa que se dirá repetidamente aquilo que já foi dito, mas, sim, que aquela obra e aquele pensador se inserem no horizonte de problematização que está proposto (CHAUÍ, 2000). Dessa forma, não há como contornar uma contribuição da história da filosofia, mas há como dialogar com ela e, a partir disso, dar um próximo passo. O fazer filosófico por meio da história da filosofia trata-se, então, de uma relação de continuidade e ruptura dentro de uma continuidade histórica (WEIL, 1970). Ou seja, na época X existiam problemas Y que levaram os pensadores a refletir e 22 chegar a diversas teorias sobre o surgimento, o funcionamento e, por vezes, uma solução para esses problemas. Um pensador à frente da época X avalia tais reflexões de acordo com outros problemas de sua época Z e percebe que tais problemáticas contêm similaridades, o que permite pensar a partir das teorias dos pensadores anteriores. A teoria do pensador mais contemporâneo gera uma ruptura com o pensamento anterior, no sentido de tê-lo superado em algumas questões; entretanto, gera uma continuidade, pois partiu de contribuições de autores anteriores. E, por fim, todo este gesto histórico-filosófico encontra-se inserido na história, pois interfere e estabelece modos de pensar, influenciando, assim, o tecido social como um todo (WEIL, 1970). Um exemplo contemporâneo é a obra da filósofa judia Hannah Arendt (1906– 1975). Sua obra tem como problematização, em grande parte, o Holocausto. Arendt (1975) buscou identificar o que leva os indivíduos a banalizarem o mal e serem capazes de suspender os juízos morais, éticos e humanitários e praticarem um genocídio. Atualmente, sua obra volta a tomar ares de atualidade, pois casos como o Brexit, que pede a saída da Inglaterra da União Europeia, com base em um radicalismo conservador, retoma fantasmas do passado europeu ao se mostrar intolerante com imigrantes, com discursos que se revelam homofóbicos e antifeministas. Outro país onde alguns grupos têm resgatado essas raízes totalitárias é a Itália, com a ascensão do partido de extrema direita CasaPound, que defende sem nenhuma restrição o legado do ditador Benito Mussolini. Desta forma, a filosofia se mantém aberta em relação à história, do mesmo modo que a história alimenta e organiza a filosofia. Ambas existem em uma relação mútua e necessária. Nesse contexto, o filósofo francês Gilles Deleuze (1925–1995) busca pensar a criação de conceitos a partir desta relação. Para Deleuze, fazer filosofia é fazer a própria história da filosofia. Isso significa que tanto a criação conceitual quanto os acontecimentos históricos dependem do mesmo fator: o devir. Assim, segundo Deleuze, a criação conceitual acontece frente ao deslocamento circunstancial, pelo devir, frente ao problema imposto à reflexão, ao pensamento. Assim, Deleuze propõe uma filosofia que seja pensada a partir da experimentação. Assim, quando se trata do fazer filosófico, estamos sempre diante do novo; pensar é experimentar. Não que as bases de nossa história da filosofia não contribuam, mas o que Deleuze propunha era a filosofia como um arriscar-se à 23 violência do pensamento. Portanto, as influências contribuem para o pensamento do ponto de vista formativo, mas não devem se tonar um modo de pensar a filosofia de forma enciclopédica. É a partir dessa reflexão que Deleuze propõe a noção de uma menoridade e uma maioridade como possibilidades mais abrangentes de reflexão e abertura à experimentação. A tentativa de Deleuze era sair do lugar de fala comum, ou seja, do lugar privilegiadona história do pensamento. Isso vale tanto para sistemas filosóficos quanto para os seus porta-vozes. Não se trata de negar a maioridade da história do pensamento, até porque ela é a própria condição para que haja uma menoridade. Ou seja, para falar sobre educação em filosofia devo considerar os escritos de Rousseau, mas não devo me restringir à experiência de pensamento mais padronizada que ele representa. Com isso, Deleuze busca afirmar que só há uma menoridade enquanto regime de oposição a uma padronização que tem maioria, que é chamada de maioridade. Sabemos, por exemplo, que a história do pensamento ocidental é majoritariamente escrita por homens. De Sócrates a Nietzsche, existiram pouquíssimas filósofas, sendo que a maior parte da produção filosófica feminina é datada a partir do séc. XX, após a morte de Nietzsche. Pela quase inexistência de registros, as experiências, o pensamento e a relação filosófica feminina com a realidade são praticamente inexistentes do ponto de vista histórico-filosófico. Isso tem mudado, desde a emancipação feminina originada com o movimento sufragista, e em especial no séc. XX, mais mulheres têm contribuído e tido destaque no cenário acadêmico mundial. Isto é o que Deleuze chamaria de uma filosofia menor: [...] a noção de minoria, com suas remissões musicais, literárias, linguísticas, mas também jurídicas, políticas, é bastante complexa. Minoria e maioria não se opõem apenas de uma maneira quantitativa. Maioria implica uma constante, de expressão ou de conteúdo, como um metro padrão em relação ao qual ela é avaliada. Suponhamos que a constante ou metro seja homem- -branco-masculino-adulto-habitante das cidades-falante de uma língua padrão- -europeu-heterossexual qualquer (o Ulisses de Joyce ou de Ezra Pound). É evidente que “o homem” tem a maioria, mesmo se é menos numeroso que os mosquitos, as crianças, as mulheres, os negros, os camponeses, os homossexuais... etc. É porque ele aparece duas vezes, uma vez na constante, uma vez na variável de onde se extrai a constante. A maioria supõe um estado de poder e de dominação, e não o contrário. Supõe o metro padrão e não o contrário (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 52). 24 Dessa forma, Deleuze demonstra uma menoridade que indica, do ponto de vista histórico e histórico-filosófico, a uma outra experiência: a reivindicação dos que permaneceram calados. Assim, a natureza da filosofia, desta maneira mais deslocada, se daria no próprio fazer filosófico enquanto acontecimento experimental. Esse deslocamento e suspensão da maioridade leva a outro importante conceito deleuziano que se atrela à história da filosofia: a desterritorialização. Nesse contexto, a desterritorialização se liga ao poder do discurso e aos limites traçados pela história, pela filosofia, pela formação e pela língua. Deleuze propõe que o pensamento se coloque sem-lugar e ao mesmo tempo em todos os lugares; trata-se de se desvincular de qualquer ordenamento, o pensamento se colocando como desobediente. Nesse sentido, seria uma forma de intersecção plena para o pensamento, uma experimentação dependente apenas do devir, pois, desta forma, sem a preservação de um cânone, o pensamento encontraria outros territórios, trocaria experiências, territorializaria e seria territorializado. Assim, Deleuze acreditava que a natureza da filosofia era, neste sentido, fazer submergir pensamentos e experimentações novas a partir do propiciamento de relações possíveis, ou seja, uma relação disjuntiva que implicaria no próprio fazer filosófico em relação a uma outra possibilidade de filosofia e de história da filosofia. Deleuze chegou certa vez a afirmar: “[...] comecei pela história da filosofia quando ela ainda se impunha. Não via maneira de me esquivar disso. Não suportava Descartes, os dualismos e o Cogito. Nem Hegel, as tríades e o trabalho do negativo” (DELEUZE; PARNET, 2004, p. 22). Com isso, Deleuze se esquiva de sistemas de compreensões binárias. Assim, seria preciso compreender a história e a história da filosofia por uma outra via que não a que sugere “este é A e este é B”, mas, sim, compreender as oposições entre A e B a partir das relações intrínsecas que ligam A à B e que, sem esta relação, sem este entre-lugar que liga os dois opostos, sem a diferença, A e B não existiriam. Trata-se, portanto, de pensar a história da filosofia a partir da diferença que a constitui sem que isso exija um binarismo, até porque qualquer binarismo implicaria em uma não relação. 25 Saiba mais O conceito de dobra deleuziano é uma importante forma de se pensar a subjetivação do sujeito. Ou seja, para Deleuze a subjetividade do sujeito depende da captação de códigos existentes em seu contexto. Assim, pode-se dizer que a subjetivação de um sujeito na contemporaneidade não é a mesma que a de um sujeito na Idade Média. Os estratos subjetivos atuais, por exemplo, são outros, pois vivemos em um período totalmente tecnológico em que somos afetados por experiências diversas daquelas vividas por sujeitos de outros períodos históricos, e vice-versa. Dessa forma, em sua subjetividade, quando um indivíduo conhece outro, ou uma obra, que lhe instigue o pensamento e a reflexão, realiza-se uma dobra. Toda coextensão do dentro para fora e que traz um acréscimo à subjetividade simboliza uma dobra. Exemplificando: Luís nasceu e cresceu; certo dia leu um romance do escritor francês Victor Hugo. Tal romance o fez pensar algumas questões e, assim, realizou-se uma dobra na subjetividade de Luís (DELEUZE, 2005). 4 FILOSOFIA GREGA A diferenciação entre o conhecimento efetivo acerca da realidade e o que não pode ser comprovado existe ao menos desde a Grécia Antiga. Tal problematização permitiu compreender o que é ciência e o que são questões de fé, gerando a distinção entre mito e filosofia. As correntes da filosofia, em suas mais diversas vertentes, valorizam, como você sabe, a reflexão racional. Neste capítulo, você vai verificar o que diferencia o conhecimento de crenças individuais e místicas e como tal diferenciação se deu na Grécia Antiga. Você também vai conhecer os principais filósofos da Antiguidade Clássica e ver como as suas teorias se distinguem. Além disso, você vai verificar como os métodos utilizados por esses pensadores os auxiliaram a chegar ao que acreditavam ser o conhecimento. 4.1 Conhecimento e misticismo Se hoje existe alguma diferenciação entre conhecimento e misticismo, tanto no âmbito das discussões cotidianas quanto no universo científico, os responsáveis são 26 os gregos antigos. Na atualidade, é comum diferenciar pareceres científicos de opiniões, ou mesmo distanciar crenças individuais de postulados universais científios. Crenças relacionadas a narrativas lendárias, bruxaria e discursos religiosos, por exemplo, apesar de terem um grande valor social, cultural e individual, não podem ter validade científica na medida em que não é possível comprová-las e sistematizá-las a partir da realidade factual. Assim, a ciência é cética e se fundamenta a partir de conhecimento comprovável sobre a realidade. Fonte: https://br.pinterest.com/pin Na Grécia Antiga, esse foi um dos maiores paradigmas. A separação entre verdade (aletheia) e opinião (doxa) e entre ficção/mito e realidade aconteceu devido à falência do mito frente às novas correntes de pensamento que surgiram nesse período (JAEGER, 2013). Dessa forma, o distanciamento em relação às narrativas míticas se deu principalmente por uma mudança na educação do homem grego. Em síntese, houve uma alteração no modo de vida da Grécia Antiga. No período dito mítico, a educação era voltada aos ensinamentos de Homero (928–898 a.C.) e Hesíodo (750–650 a.C.) e consistia em “[...] formar a aristocracia grega nos critérios de exaltação da coragem bélica e heroica, em elogiar a preparação para a guerra,para o cuidado da casa, treinar para o sucesso no exercício dos 27 negócios particulares” (NUNES, 2017, p. 61). Portanto, o mito era uma maneira de explicar o mundo e os fenômenos naturais, mas também uma maneira de repassar valores morais e culturais às novas gerações (JAEGER, 2013). Nesse contexto, o termo grego areté (excelência, virtude) era norteador desse ideal de educação, pois buscava-se formar o cidadão, o guerreiro, com um caráter virtuoso em todos os aspectos e tendo excelência em seu desempenho social, qualquer que fosse (NUNES, 2017). Assim, as obras de Homero e Hesíodo serviram como ideal para o cidadão grego arcaico, já que retratavam as narrativas míticas que buscavam explicar a origem e as causas da realidade, bem como dos sentimentos e das virtudes humanas. Ao conhecer figuras heroicas como Ulisses e Aquiles, o cidadão grego aprendia com as virtudes desses personagens, a quem deveria buscar assemelhar-se. Entretanto, apesar de “educarem” o cidadão, as narrativas míticas tratavam sempre de fatos e acontecimentos exteriores à vida ordinária (JAEGER, 2013). Ou seja, ao inteirar-se de mitos com personagens sobre-humanos, o cidadão vivia uma espécie de paradoxo, pois via que em si não havia nada de sobrenatural. Assim, aos poucos, o mito vai perdendo a sua validade em relação à explicação da realidade; ele adquire cada vez mais valor cultural e menos valor epistemológico. Contudo, não há como determinar uma ruptura abrupta entre essas duas perspectivas, dado que outras explicações da realidade foram sendo elaboradas aos poucos e que o cidadão ainda mantinha as suas crenças (JAEGER, 2013). Por volta do século VI a.C., o pensamento filosófico vai ganhando espaço. A princípio, advém das cidades de Mileto e Éfeso, que eram pontos comerciais por serem cidades portuárias. Portanto, nessas cidades, acontecia o entrecruzamento cultural, pois os viajantes atracavam ali. As primeiras escolas filosóficas surgiram em Mileto e Éfeso. Pensadores como Tales de Mileto e Heráclito de Éfeso foram alunos e representantes da Escola Jônica, situada na cidade de Mileto (BORNHEIM, 1998). Para os filósofos pré-socráticos, a realidade deveria ser explicada causalmente a partir da natureza, do mundo, enfim, dela mesma. Portanto, as teorias desses pensadores partiam de reflexões sobre alguns temas específicos. Veja a seguir. 28 Cosmologia: é o ramo do conhecimento que estuda a estrutura, a origem e a evolução do universo, bem como as suas causas, ou seja, o que ocasiona o surgimento, as relações, a materialidade de tudo o que existe. Kinesis: é movimento, devir. Em específico para os filósofos jônios, era possível compreender, por meio da natureza, o elemento regulador das mudanças em suas diferentes materialidades e aspectos. Physis: pode ser compreendida como natureza, entretanto o seu significado é abrangente. A physis tinha relação, para os gregos, com o movimento. Ou seja, consistia na força e no movimento de fazer surgir, de mudar e de ordenar. Assim, a physis seria a responsável pela ordem, pela forma e por dar lugar a outros devires no mundo. Por exemplo: para haver o crepúsculo, é necessário que haja dia e noite. Arché: em sua acepção geral, de acordo com o significado literal da palavra grega, a arché pode ser compreendida como aquilo que dá origem a tudo, como o começo. Nesse sentido, esse princípio originário é o que possibilita o surgimento de tudo que há na physis, assim como o fim de todas as coisas. Ainda que inapreensível, a arché grega é a própria condição da possibilidade de existência das coisas. Logos: é a reflexão racional acerca do universo, da pólis e do homem grego. Tal cenário filosófico, no entanto, acaba por se bifurcar após a ascensão de Péricles ao governo ateniense: o chamado período clássico, ou período socrático, traz a dimensão política e ética como objeto de preocupação, dividindo espaço com a filosofia pré-socrática, que aos poucos foi sendo abandonada (BORNHEIM, 1998). 4.2 Filosofia na Grécia Antiga A filosofia nasceu na Grécia Antiga, no século VI a. C., tempo em que Pitágoras se denominou amante do saber. A Grécia Antiga estava acostumada a encarar e a entender as coisas e situações de acordo com a mitologia, carregada da sua perspectiva primitiva. Logo todo e qualquer fenômeno da natureza ou eventos advindos das relações entre os indivíduos eram explicados com uma ideia mística. 29 Na mitologia Grega, existia um deus para cada fenômeno que eles não conseguiam explicar de forma racional. Os gregos depositavam nesses deuses as explicações sobre a origem do homem e do mundo, uma ótica que a filosofia mudou, pois os filósofos queriam refletir sobre tudo de forma crítica, a fim de encontrar uma explicação racional para os fenômenos, sem recorrer as figuras dos mitos. A filosofia surge e se desenvolve em meio a expansão comercial e marítima, a consolidação das cidades-Estados, a invenção da moeda, do calendário, entre tantos outros eventos que lhe influenciaram e inspiraram. A filosofia está inseria da história, e os temas de que se ocupa mudam de acordo com a evolução social que lhe fornece um novo campo de reflexão. Saiba Mais Alguns autores não aceitam a ideia de que a filosofia tenha nascido na Grécia, pois alegam que já antes existiam outros povos que faziam esse exercício de reflexão. Porém, se o fizeram, não foi de forma tão sistemática e influenciadora como ocorreu na Grécia. A genialidade dos gregos até hoje é muito elogiada, causando espanto e admiração, devido à época em que viveram. Eles foram precursores não só da filosofia como também das artes, política, literatura, educação, música e arquitetura. A filosofia dessa época influenciou o mundo ocidental e a religião cristã, uma vez que Aristóteles influenciou Tomás de Aquino, dando origem ao cristianismo católico, enquanto Platão influenciou Agostinho de Hipona, que veio a influenciar Martinho Lutero e Calvino no que diz respeito à reforma protestante. Esse período foi marcado por Sócrates, sendo dividido em período pré- socrático (antes de Sócrates), socrático (no período de Sócrates) e helenístico (depois de Sócrates). Durante o período pré-socrático, a filosofia foi utilizada apenas para buscar explicações sobre a origem do homem, do mundo e de tudo que nele há (coisas). Somente no período socrático é que foram iniciadas as reflexões sociais. 30 Exemplo Os gregos criavam deuses para explicar a natureza, os sentimentos e as relações entre as pessoas. Entre os principais deuses da mitologia grega, podemos citar: Zeus (deus supremo), Ares (deus da guerra), Afrodite (deusa do amor), Aristeu (protetor dos caçadores, dos pastores e dos rebanhos), Asclépio (deusa da medicina) 4.3 Influência da Filosofia no Estado/Governo A filosofia levava os pensadores a refletirem sobre as formas de Estado e Governo anteriores, identificando os seus pontos de sucesso e fracasso, para assim possibilitar a criação de um novo modelo político ideal. Platão e Aristóteles fizeram as primeiras reflexões sobre as formas de Estado e Governo anteriores, adentrando no tema de forma direta, observando o modo como vinham se organizando as cidades. Fonte: https://www.todamateria.com.br/filosofia-politica/ Segundo Platão, a ética é inseparavelmente ligada à política, como garantidora da paz de um governo. A sua tarefa seria promover o nivelamento entre os indivíduos, ajustando as duas diferenças em benefício da coletividade, limitando a liberdade entre eles, buscando suprir as diferenças econômicas e sociais. Ele era contrário à 31 democracia direta porque acreditava que a distribuição do poder desvirtuava o homem, fazendo-o buscar a felicidade individual acima da coletiva. Platão criou a ideia do Estado ideal, garantidor da liberdaderealizada por meio do exercício da justiça, ficando essa ideia conhecida como República Platônica. Esse filósofo defendia que a monarquia era a melhor forma de organização do Estado. Aristóteles defendia que os governantes deveriam ser generosos e que o Estado precisava garantir a justiça, por isso faria os cidadãos felizes e ao mesmo tempo garantiria a manutenção da ordem política em seus territórios. Acreditava que uma pessoa só seria completamente feliz com o seu total desenvolvimento intelectual. Aristóteles, que era uma linhagem socrática, buscava um equilíbrio entre liberdade e a responsabilidade do governo para compartilhar o poder com o povo. Para ele, o melhor modelo de democracia seria a representativa, devendo o sujeito ser separado em conhecimento, para governar com prudência, sabedoria e justiça. Para ele, havia três modelos de governo: Politeia, Aristocracia e Monarquia, possuindo cada um desses um desvio de finalidade, gerando outros modelos impuros: a democracia, a oligarquia, e tirania, respectivamente. Com a criação da moeda no século VIII, a sociedade começou a se reorganizar em torno das relações que tinham se modificado, surgindo grande grupos de agricultores e artesãos, que foram despertados pelas reflexões filosóficas quanto ao seu direito e necessidades, passando eles a almejar uma maior valorização. Pitágoras, pré-socrático, foi o primeiro a desenvolver estudos sobre questões políticas e religiosas. Heráclito constatou que a vida está em grande evolução e transformação, considerando que a luta entre os adversários era o que impulsionava tais mudanças. Todas essas constatações levaram ao surgimento da democracia, dando início à modificação das formas de governo. A Grécia vivenciou a monarquia, a oligarquia a tirania e a democracia 4.4 Principais filósofos da Grécia Antiga A filosofia grega é dividida em períodos. Cada período é orientado por uma compreensão e por uma problematização acerca do mundo e do ser humano. Assim, cada um deles trouxe reflexões que contribuíram para o desenvolvimento do 32 pensamento filosófico. É comum, por exemplo, surgirem, ao longo da história da filosofia, problematizações que trazem teorias do pensamento grego que, à primeira vista, parecem já ter sido esgotadas. Isso demonstra que o pensamento grego é fonte inesgotável de reflexão, oferecendo diferentes releituras e interpretações, além de novos desdobramentos. O primeiro período da filosofia grega trouxe avanços epistêmicos que contribuíram para o entendimento da natureza e para a compreensão do mundo a partir da physis. Nesse contexto, alguns pensadores se destacaram. Tales, por exemplo, foi aluno da escola de Mileto e ficou conhecido pela teoria que afirma que a água é a physis, ou seja, a origem de tudo. Tales também ficou conhecido por introduzir reflexões matemáticas de origem oriental, uma vez que Mileto era uma cidade em que acontecia uma grande confluência cultural na época (BORNHEIM, 1998). Outro pensador que ganhou destaque no pensamento grego pré-socrático foi Anaximandro, responsável por aperfeiçoar o relógio de sol, produzir o primeiro mapa geográfico e, por fim, teorizar o universo a partir de uma arché que seria o conceito de apeirón (ilimitado). Ou seja, para ele, o princípio originário do mundo seria o movimento eterno, que tenderia a equilibrar os pontos divergentes: “[...] significaria a afirmação da lei do equilíbrio universal, garantida através do processo de compensação dos excessos (por exemplo, no inverno, o frio seria compensador dos excessos cometidos pelo calor durante o verão) ” (BORNHEIM, 1998, p. 20). Outro pensador que se destaca entre os pré-socráticos é Pitágoras de Samos. Mais conhecido pelo seu teorema matemático, Pitágoras também foi autor de uma teoria que misturava divindade, harmonia, matemática e beleza. Para ele, o cosmos e o ser humano estão ligados em divindade; a harmonia de ambos depende do estudo dos números. Assim, seria possível, a partir de uma estrutura numérica, desvendar a semelhança entre o ser humano e o universo (BORNHEIM, 1998). Vários outros pensadores contribuíram para a formação do pensamento grego, principalmente para a compreensão do mundo, do homem e do cosmos a partir da reflexão racional (BORNHEIM, 1998). Entretanto, com Péricles como governante de Atenas e a instauração da democracia, as problematizações filosóficas são deslocadas (NUNES, 2017). É a partir desse momento que a filosofia deixa de se 33 ocupar dos questionamentos pré-socráticos e se volta para o comportamento ético e político do homem. Atenas se torna, então, um centro cultural e político: O papel que a educação adquire na Grécia clássica, em especial em Atenas, tem papel central, burocrático, porém democrático, tornando-se motivo e necessidade de debate, tendendo-se a universalizar-se para além dos limites da pólis (BORTOLINI; NUNES, 2018, documento on-line). Com a abertura democrática, o espaço público se torna um lugar para debates, apresentação de ideias e, inclusive, conflitos. O discurso em público se transforma em recurso pedagógico; ou seja, o local onde se expunham ideias era também o espaço em que os jovens ficavam a ouvir e aprender. É nesse período que surgem os sofistas, considerados grandes oradores. As concepções sofísticas eram extremamente relativistas, defendiam que o conhecimento é subjetivo. Assim, a verdade dependeria do ponto de vista, da doxa. Outro fator, que inclusive ocasionou uma crítica severa por parte de Sócrates, era que os sofistas, vendo a admiração e a vontade de ingresso dos mais jovens na vida política de Atenas, começaram a cobrar quantias e serem “tutores” dessa juventude ateniense (PLATÃO, 1986). Nesse contexto, Sócrates, que é considerado o pai da filosofia, ressalta que essa disciplina deve afastar os sofistas da educação da juventude ateniense, uma vez que o conhecimento deve ter como fim a verdade e não a mera opinião. Ou seja, para Sócrates, a verdade é única e só assim é possível estabelecer uma sociedade virtuosa (NUNES, 2017). Entretanto, tal verdade não pode ser imposta ou individualizada; ela deve ser buscada por meio da dialética. Sócrates foi mestre de Platão e, apesar de não ter deixado nenhuma obra, seus diálogos estão presentes na obra platônica, assim como a sua figura é mencionada por outros autores da época, como Aristóteles, Cícero e Diógenes. A obra de Platão apresenta a decadência da democracia ateniense, bem como dos valores sociais e culturais do período. Ele é autor da obra intitulada República, em que apresenta o modelo de uma sociedade ideal: “[...] [a] tirania, contudo, é teorizada não apenas como resultado de tal decadência [democrática], mas como ‘o ideal negativo da vida política’, por ser modelo da ‘destruição da vida pública pela lógica dos desejos’ (BIGNOTTO, 1998 apud REIS, 2018, documento on-line). A decadência da democracia ateniense se dá, segundo Platão (2014), no contexto da condenação de Sócrates à morte sob a acusação de corrupção da juventude e não culto aos 34 deuses. Dessa forma, a primeira fase da obra platônica consiste em comunicar as ideias de Sócrates, bem como as críticas socráticas à política e ao estilo de vida da sociedade ateniense. Posteriormente, Platão se dedica ao estudo da geometria e à sua famosa teoria das ideias. Na última fase de sua obra, ele chega a uma reflexão mais crítica em relação ao pensamento socrático: o método desenvolvido por Sócrates se mostra insuficiente como meio para se garantir um sistema de conhecimento, pois conhecer não é só se chegar à verdade, mas também reencontrar o ser. Dito de outro modo: ao se buscar a verdade, também se busca o ser, visto que a verdade é o que é e a não verdade é o que não é. Depois de Platão, começa o período da filosofia aristotélica (NUNES, 2017). Aristóteles foi discípulode Platão, entretanto a sua filosofia tem um caráter mais realista em relação à compreensão do mundo e do homem. Ou seja, enquanto a filosofia platônica propõe um sistema de conhecimento baseado nas ideias, Aristóteles busca compreender o mundo a partir do próprio mundo e da natureza, bem como compreender os humanos a partir de suas relações entre si (JAEGER, 2013). Assim, a sua teoria apresenta uma relação empírica com a realidade e é a partir dessa interpretação que Aristóteles desenvolve a sua concepção de ética, de verdade, de ciência e de poética. 4.5 O método dos principais filósofos da Grécia Antiga A distinção entre os métodos elaborados pelos filósofos da Grécia Antiga é devida às suas diferentes formações e influências e ao avanço intelectual do período em que viveram. Ou seja, o contexto intelectual, social e cultural de cada período trazia questões e problematizações diferentes. Assim, cada período do pensamento grego emprega uma problemática, um método de pesquisa e uma estrutura de sistema de conhecimento: cada filósofo e cada período devem ser lidos de acordo com as preocupações do seu contexto. Nesse sentido, um filósofo pré-socrático não deve ser interpretado com vistas às suas semelhanças com um filósofo pós-socrático. Isso significa dizer que cada filósofo se ocupou de aspecto do conhecimento, ainda que filósofos como Platão e Aristóteles tenham desenvolvido um sistema mais amplo de conhecimento. 35 Com Sócrates, surgem os métodos mais conhecidos da história do pensamento grego antigo. Sócrates era conhecido por suas abordagens e perguntas aos cidadãos de Atenas (JAEGER, 2013). Na então jovem democracia, era comum ver oradores, sofistas e políticos debatendo publicamente. Sócrates incomodava-se com a falta de preocupação com a verdade única e com a manipulação das pessoas, principalmente dos jovens. Assim, ele andava pela cidade questionando os cidadãos com perguntas como: “o que é o bem? ”, “o que é a virtude? ”, “é possível conhecer a verdade?”. Essa abordagem ficou conhecida como dialética, que consiste em chegar a uma síntese a partir de duas posições antagônicas, ou seja, opostas. Quando você aborda alguém com perguntas, esse alguém busca respondê-las, não é? Dessa forma, se estabelece um diálogo em busca de uma síntese, que seria um parecer final acerca das duas posições iniciais. Outro aspecto da abordagem socrática é a ironia: ao perguntar aos cidadãos coisas tidas como óbvias (“o que é ser bom? ”), Sócrates se colocava como não conhecedor de nada, o que acabava levando os interlocutores a responderem, então ele devolvia com outra pergunta (o que é conhecido como método de retórica socrática). Sócrates comparava o seu método dialético à profissão de sua mãe, que foi parteira: ele dizia que dava à luz o conhecimento. Por isso, chamou seu método de “maiêutica”, termo de origem grega que faz alusão ao parto. A partir do pensamento socrático, Platão (2000), mais especificamente nos livros VI e VII, afirma que o conhecimento/essência de tudo também é alcançável por meio da filosofia. Assim, é abandonando a crença nas sensações e na experiência que se chega ao conhecimento verdadeiro. Desse modo, segundo Platão (2000), a verdade encontra-se no mundo das ideias, e é fazendo uso da racionalidade que se pode contemplar a essência das coisas para longe dos enganos das sensações. Portanto, é por meio do debate, da dialética, que se chega a uma ideia comum, universal, e desse modo se alcança o conhecimento verdadeiro, que, segundo Platão (2000), é equivalente ao bem. Mas é com Aristóteles que se vê uma compreensão que, de fato, rompe com vários ideais socráticos e platônicos. Aristóteles foi o filósofo grego que mais desenvolveu métodos (JAEGER, 1963), seja pela amplitude de sua obra ou pela divergência (à primeira vista) entre as áreas de conhecimento de que ela trata. Nesse contexto, Aristóteles ficou conhecido pelos seus estudos em lógica, em que 36 desenvolveu o silogismo. Este consiste em um argumento dedutivo, ou seja, a partir de duas premissas, chega-se à conclusão, que é a argumentação logicamente perfeita. Por exemplo: Todos os homens são mortais (premissa universal); Aristóteles é homem (premissa particular); Aristóteles é mortal (conclusão). Outros estudos e teorias aristotélicas também foram, e são, de extrema relevância para o desenvolvimento de distintas áreas do conhecimento. Em sua obra, o filósofo desloca vários conceitos platônicos para uma relação mais valorativa com as sensações. Assim, o que se faz mais distinto, de modo geral, é a dignificação das sensações e da realidade presente na abordagem aristotélica. Os métodos aristotélicos eram aplicados de forma empírica; Aristóteles buscava estabelecer o seu sistema de conhecimento a partir da realidade e das experiências (JAEGER, 1963). O mesmo vale para a sua compreensão sobre a dialética: longe de ter a finalidade idealista de Platão, Aristóteles buscava o conhecimento mediante um diálogo argumentativo que partisse de premissas e que chegasse logicamente a argumentos consistentes, por meio de deduções. Mesmo com todas as distinções metodológicas, a contribuição grega para o desenvolvimento ocidental, independentemente da área do conhecimento, é incontornável. Como você viu, os pensadores da Grécia Antiga elaboraram noções importantes a respeito de conceitos abstratos, como o de virtude, e ainda se dedicaram às ciências exatas e naturais. 5 PRÉ-SOCRÁTICOS, SÓCRATES E SOFISTAS A filosofia surge na Grécia Antiga, com os pré-socráticos. Ela nasce em oposição às narrativas mitológicas e aspira ao conhecimento racional acerca do mundo. Os pré-socráticos procuram causas naturais para explicar a origem e a ordem do universo. Mais tarde, outros temas passam a interessar aos gregos, os temas morais. Sócrates seria o precursor dessa outra maneira de se fazer filosofia, a filosofia 37 humanista. Conjuntamente e debruçando-se sobre os mesmos assuntos, surge a figura do sofista, especialista que vende o seu conhecimento em retórica e argumentação (MOREIRA, 2019). Neste capítulo, você vai estudar a origem da filosofia e conhecer os primeiros filósofos, os pré-socráticos. Além disso, vai se debruçar sobre a obra de Sócrates e os ensinamentos dos sofistas. 5.1 Os filósofos pré-socráticos Geralmente, entende-se a filosofia como uma aspiração ao conhecimento racional sobre o mundo e a realidade humana. Assim entendida, a filosofia surge entre o final do século VII e o início do século VI a.C., na Grécia Antiga. É difícil explicar por que a filosofia surgiu na Grécia, já que algumas características que parecem ter sido determinantes para o seu surgimento também estavam presentes em outras civilizações; por isso, diz-se que ocorreu um “milagre grego” (CHAUÍ, 2000). Essas características seriam: o fato de as cidades-estados gregas, as pólis, serem democráticas; o florescimento da cultura grega na época; a adoção de moedas; e a vasta troca comercial no Mediterrâneo. Os filósofos pré-socráticos são tidos como os primeiros filósofos. A principal marca do seu pensamento é a busca por explicações sobre a ordem e a origem do mundo dentro da própria natureza e de seus elementos. Por conta disso, eles são denominados “filósofos naturalistas”. Antes da filosofia, o mito era a narrativa principal do povo grego. Os mitos explicam o mundo ao descrever a sua origem, além de elucidar o porquê de alguns fenômenos naturais. Eles também apresentam os valores de um povo e a sua origem. Na Grécia Antiga, os mitos eram transmitidos principalmente de forma oral, mas foram sistematizados por dois poetas clássicos, Homero e Hesíodo. Por conta disso, até hoje você pode acessar essas histórias. (MOREIRA, 2019). Credita-se aos filósofos pré-socráticos uma insatisfação em relação às explicações mitológicas.
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