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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ-UESPI
CAMPUS POETA TORQUATO NETO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS
CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM HISTÓRIA
MARCOS ANTONIO MACIEL DE OLIVEIRA
JOÃO GABRIEL BAPTISTA E O SEU LEGADO PARA A
HISTORIOGRAFIA PIAUIENSE (1971-1994)
2
TERESINA-PI
2015
MARCOS ANTONIO MACIEL DE OLIVEIRA
JOÃO GABRIEL BAPTISTA E O SEU LEGADO PARA A
HISTORIOGRAFIA PIAUIENSE (1971-1994)
Monografia exigida como requisito para a
conclusãodo curso de Licenciatura Plena
em História naUniversidade Estadual do
Piauí, sob a orientação do professor Dr.
Raimundo Nonato Barbosa da Silva.
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TERESINA-PI
2015
MARCOS ANTONIO MACIEL DE OLIVEIRA
JOÃO GABRIEL BAPTISTA E O SEU LEGADO PARA A
HISTORIOGRAFIA PIAUIENSE (1971-1994)
COMISSÃO EXAMINADORA
APROVADO EM: ____ / ____/ _____
_________________________________________________
Professor Dr. Raimundo Nonato Barbosa da Silva (orientador)
__________________________________________
Professor MS. Moisés Barros de Andrade
(Examinador)
__________________________________________
Professor MS. Antonio Maureni Vaz Verçosa de Melo
(Examinador)
4
Teresina_____de________________2015
5
Dedico este trabalho a uma das pessoas
mais extraordinárias que conheci na
minha vida, minha amiga e educadora,
Socorro Baptista, sinônimo de humildade
e competência.
RESUMO
Objetivo principal é apresentar acontribuição do professor João Gabriel Baptista na
construção de uma identidade física e humana do estado do Piauí através dos livros
de Geografia e História publicados no período de 1971 a 1994. Esta pesquisa não
teve como objetivo uma analise da obra do= Baptista, e, sim a busca por aplainar da
obscuridade as mesmas, tendo em vista, um profundo desconhecimento do seu
legado pela população local, inclusive professores, na área que ele mais contribuiu e
que fora um dos criadores do curso de Geografia do estado do Piauí. Bem como a
contribuir para ampliação de conhecimentos sobre a historiografia piauiense no
concernente a temática da territorialidade e identidade locais.
Palavras-chaves: Historiografia, Identidade, Território, João Gabriel Baptista.
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ABSTRACT
Main objective is to present the teacher John Gabriel Baptista contribution in building
a physical and human identity of the state of Piauí through the Geography and
History books published from 1971 to 1994. This study did not aim a work of analysis
of = Baptista, and yes the search for dark flatten the same, with a view, a profound
ignorance of his legacy by local people, including teachers, in the area that he
contributed most and that was one of the state's geography course creators of Piauí.
As well as helping to increase their knowledge about the historiography in Piauí
concerning the issue of territoriality and local identity.
Keywords: Historiography, Identity, Territory, John Gabriel Baptista.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................08
CAPÍTULO I:BAPTISTA E A EXTENSA OBRA NA ÁREA DA GEOGRAFIA ........17
1.1 O livro Nascentes de um rio.................................................................................17
1.2 O livro Resumo Corográfico do estado do Piauí..................................................19
1.3 O livro Geografia física do Piauí...........................................................................21
1.4 O livro A origem do rio Parnaíba..........................................................................24
1.5 O livro Mapas Geohistóricos................................................................................26
CAPÍTULO II: BAPTISTA E A SUA CONTRIBUÍÇÃO PARA A HISTÓRIA ............27
1.1 O livro Etno-história indígena piauiense...............................................................27
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................38
REFERÊNCIAS..........................................................................................................39
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho pretende apresentar a contribuição do professor João
Gabriel Baptista na construção de uma identidade física e humana do estado do
Piauí através dos livros de Geografia e História publicados no período de 1971 a
1994. Livros raros como Nascentes de um rio (1971), Resumo corográfico do estado
do Piauí (1971); Geografia física do Piauí (1975), Origem do rio Parnaíba (1986);
Mapas geohistóricos (1986) e o Etno-história indígena piauiense (1994).
A pesquisa foi divida em dois capítulos: O primeiro aborda a extensa obra na
área da Geografia e no último é exposta a sua contribuição para a História.
O interesse por esse objeto de estudo surgiu em 2010, quando estava
sentado na frente da minha sala de aula na Universidade Estadual do Piauí, e
observei algumas pessoas comentando sobre um grande mestre que tinha falecido;
encostei-me e ouvi que falavam de João Gabriel Baptista, que tinha mal de
Alzheimer, e que devido a complicações respiratórias teve uma parada cardíaca no
dia 20 de março do mesmo ano, vindo a falecer aos 89 anos, em Teresina.Logo,
comecei a fazer pesquisas ao seu respeito.
Ele nasceu em Teresina, em 4 de agosto de 1920,filho de Ernesto José
Baptista e Raimunda Nonata de Carvalho, Concluiu a escola básica (ensino
fundamental) em Teresina, fez o colegial (ensino médio) no Rio de Janeiro e
formou-se em engenharia civil na escola Politécnica da Universidade Federal da
Bahia.
Depois de formado retornou a sua cidade natal, e trabalhou como professor
no Colégio Liceu piauiense onde assumiu as disciplinas de Matemática e Física de
1959 a 1970 e de Geografia em 1959 a 1982. No colégio das irmãs ministrou aulas
de Física e desenho em 1958. Também exerceu a função de engenheiro fiscal de
Obras do nordeste e do Serviço nacional da malária ; chefe da Divisão de
locomoção da estrada de ferro central do Piauí, engenheiro do Departamento de
estradas e rodagens (DER). Foi secretário de estado da Viação e Obras públicas,
Agricultura, Indústria e Comércio no governo Gayoso e Almendra (1955-1959). Era
membro da Sociedade interamericana de engenharia, do Instituto histórico e
geográfico piauiense e da Academia piauiense de letras desde 1978. Esses foram
9
alguns cargos ocupados pelo João Gabriel Baptista.
O escritor Jesualdo Cavalcante Barros no seu discurso de posse na Academia
piauiense de letras em 06/08/2010, onde passou a assumir a cadeira de número 3,
que pertencia ao Baptista. O define assim:
Professor ele foi a vida inteira. Professor do ensino secundário em
colégios públicos e privados de Teresina, lecionando Geografia,
Física, Química e Matemática. Professor de Geografia, Cartografia e
Etnografia da antiga Faculdade Católica de Filosofia e da
Universidade Federal do Piauí. Aluno do velho Liceu piauiense
conheci-o nos idos de 1958. Ensinava Geografia, após concurso
público em que defendera tese, em 1951, sob o título Vulcões do
Brasil. Tempos gloriosos aqueles. Professor do Liceu ou da Escola
Normal Antonio Freire era Catedrático, isto é, falava de cátedra, eis
que portador de amplo conhecimento da disciplina que lecionava. Se
homem, quase sempre usava paletó e gravata em sala de aula. Mas
não era respeitadoapenas pela aparência indumentária. Tinha
postura de formador de homens e condutor de ideias. Irradiava certa
aura de ciência, técnica, conhecimento, sabedoria (BARROS, 2010).
Para seguir um raciocínio lógico da pesquisa faremos discussões sobre os
conceitos de Historia tradicional e cultural, historiografia e identidade.
A Escola dos Annales foi um movimento inovador que surgiu na França em
1929, pelos historiadores franceses Lucien Febvre e Marc Bloch, dando origem ao
que conhecemos hoje de Nova História. Tudo começou com a criação da revista Les
Annales d' Histoire Économiqueet Sociale, a qual tinha como objetivo: eliminar o
espirito de especialidade, promover a pluridisciplinaridade¹, favorecer a união das
ciências humanas, passarda fase dos debates teóricos para a fase das realizações
concretas, nomeadamente inquéritos coletivos no terreno da história contemporânea
e como público alvo os grandes estudiosos das ciências sociais, a exemplo dos
historiadores, sociólogos, geógrafos, etc. Embora tenha surgido na França o
movimento dos Annales , conseguiu ao longo do século XX, expandir-se por todo o
mundo adquirindo novos adeptos, os quais iriam contribuir para o crescimento dessa
nova abordagem historiográfica.
Define-se como Nova Historia a história sobre a influência das ciências sociais
e não mais sobre a influência das ciências naturais, isto é, até o surgimento dos
Annales a história tradicional regia-se pela metodologia positiva, inspirada nas
ciências naturais. Os Annales veio abrir os caminhos para a evolução das diversas
10
fases da vigente ciência histórica.
_____________
¹Éa justa posição de diversas disciplinas situadas geralmente no mesmo nível hierárquico e
agrupadas de modo a fazer aparecer relações existentes entre eles um tipo de sistema de um só
nível e de objetivos múltiplos onde existe cooperação mas não coordenação.
Os Annales veio abrir os caminhos para a evolução das diversas fases da
vigente ciência histórica.
A História Nova propõe uma compreensão dos fatos históricos na sua
totalidade, não restringindo fontes ou abordagens, ampliando as possibilidades de
comprovações a partir de documentos, sendo estes devidamente catalogados e
questionados quanto á sua origem, contexto e onde foram redigidos.
Portanto, a nova história privilegia a documentação massiva e involuntária em
relação aos documentos voluntários e oficiais. Nesse sentido, os documentos são
arqueológicos, fotográficos, cinematográficos, orais, enfim, de todo tipo. Todos os
meios são tentados para vencer as lacunas e o silêncio das fontes.Veremos a
opinião de alguns teóricos sobre essa nova metodologia.
Le Goff (1996) reconstrói a evolução do conceito de História, indaga e
confronta as etapas dessa contínua pesquisa sobre a vida do homem, suas relações
com o ambiente, os eventos e sua diferente temporalidade. Resultado que constitui
uma nova perspectiva para as principais questões da historiografia contemporânea.
Dualidades que foram historicamente utilizadas para conceber a História
interpretá-la, por exemplo: antigo/moderno, passado/presente, progresso/reação e
que a partir dos documentos disponíveis o historiador faz as representações
possíveis de um determinado tempo. Segundo ele o conceito de História veio
mudando conforme o tempo e avalia como fundamental, a busca incessante para
renovar os estudos e métodos do trabalho histórico, e que o campo da História é
complexo, cheio de controvérsias, desafios e interrogações.
Le Goff define que o passado é recriado com o que temos de fontes não
importando quais sejam elas, e que ao longo do tempo os historiadores foram se
adaptando a essas novas fontes e que cada historiador deve seguir o seu tempo e
encontrar formas para superar as suas adversidades.Devemos trabalhar de forma
que a maneira coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens (LE
GOFF, 1996, p.471). Essa citação reflete bem o papel do historiador como agente de
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informação que é libertar as pessoas das amarras conservadoras de pensamento
histórico tradicional e levá-las a várias maneiras de se entender os fatos históricos.
... ampliou-se a área dos documentos, que a história tradicional
reduziu aos textos e aos produtos da arqueologia, uma arqueologia
muitas vezes separada da História. Hoje os documentos chegam a
abranger a palavra, o gesto. Constituem-se arquivos orais; são
coletados etnotextos (Le Goff, 1996, p.10).
Com o surgimento da escola dos Annales a História passa a ser
problematizada, se caracteriza pela construção teórica, visto que o texto histórico é
feito basicamente de teorias e não mais de forma narrativa, a base agora seria o
problema, as hipóteses. Isso é o que vai marcar o rompimento da história narrativa
com a história-problema, o fato de se despertar da objetividade para se prender á
teoria, seguindo o caminho da ciência social. Nas palavras de Lucien
Febvre: ... nunca se façam colecionadores de fatos, ao acaso (…) nos deem uma
História não automática, mas sim problemática(FEBVRE, 1989, p.49).
A História problema construída pela escola dos Annales é de fato uma “nova
história”. Houve uma inovação no trabalho do historiador, nas condições e
concepções, se antes ele escolhia, mas não podia admitir agora ele escolhe e expõe
suas críticas, assim também, suas fontes e técnicas.
A memória coletiva e a sua forma científica, a história, aplicam-se a dois tipos
de materiais: os documentos e os monumentos.De fato, o que sobrevive não é o
conjunto daquilo que existiu no passado, mas uma escolha efetuada quer pelas
forças que operam no desenvolvimento temporal do mundo e da humanidade, quer
pelos que se dedicam à ciência do passado e do tempo que passa, os historiadores.
Estes materiais da memória podem apresentar-se sob duas formas principais: os
monumentos, herança do passado, e os documentos, escolha do historiador.
O monumento é tudo aquilo que pode evocar o passado, perpetuar a
recordação, por exemplo, os atos escritos. Ele tem como característica ligar-se ao
poder de perpetuação voluntaria ou involuntária, das sociedades históricas e o
reenviar a testemunhos que só numa parcela mínima são testemunhos escritos.
O termo latino documentum, derivado de docere ‘ensinar’, evoluiu para o
significado de ‘prova’ e é amplamente usado no vocabulário legislativo. É no século
XVII que se difunde, na linguagem jurídica francesa, a expressão titresetdocuments
12
e o sentido moderno de testemunho histórico data apenas do início do século XIX. O
significado de “papel justificativo”, especialmente no domínio policial, na língua
italiana, por exemplo, demonstra a origem e a evolução do termo.
O documento que, para a escola histórica positivista do fim do século XX, será
o documento do fato histórico, ainda que resulte da escolha, de uma decisão do
historiador. Ele apresenta-se por si mesmo como prova histórica. A sua objetividade
parece opor-se a intencionalidade do monumento. Além do mais, afirma-se
essencialmente como testemunho escrito. Diferente do pensamento dos adeptos da
escola dos annales.
Os fundadores da revista “Annales d’histoire économiqueetsociale” (1929),
pioneiros de uma história nova, insistiram sobre a necessidade de ampliar a noção
de documento. Segundo eles a História faz-se com documentos escritos, sem
dúvida. Quando estes existem. Mas pode fazer-se, deve fazer-se sem documentos
escritos, quando não existem. Com tudo o que a habilidade do historiador lhe
permite utilizar para fabricar o seu mel, na falta das flores habituais. Logo, com
palavras. Signos. Paisagens e telhas. Com as formas do campo e das ervas
daninhas. Com os eclipses da lua e a atrelagem dos cavalos de tiro. Com os exames
de pedras feitos pelos geólogos e com as análises de metais feitas pelos químicos.
Numa palavra, com tudo o que, pertencendo ao homem, depende do homem, serve
o homem, exprime o homem, demonstra a presença, a atividade, os gostos e as
maneiras de ser do homem.
Toda uma parte, e sem dúvida a mais apaixonante do nosso trabalho
de historiadores, não consistirá num esforço constante para fazer
falar as coisas mudas, para fazê-las dizer o que elas por si próprias
não dizem sobre os homens, sobre as sociedades que as
produziram, e para constituir, finalmente, entre elas, aquela vasta
rede de solidariedade e de entreajuda que supre a ausência do
documento escrito? (FEBVRE, 1949, ed. 1953, p. 428).
Mas os fundadores dos “Annales” davam início a uma crítica em profundidade
da noção de documento. Afirmava Lucien Febvre (1933, ed. 1953, p. 86), que
lamentava não já a ausência de sentido crítico nos historiadores, que praticavam
todos eles mais ou menos a crítica dos documentos preconizada pela École de
Chartes e a Históriapositivista do século XIX, mas o fato de que se pusesse em
discussão o documento enquanto tal. Assim, Marc Bloch teria escrito:
13
Não obstante o que por vezes parecem pensar os principiantes, os
documentos não aparecem, aqui ou ali, pelo efeito de um qualquer
imperscrutável desígnio dos deuses. A sua presença ou a sua
ausência nos fundos dos arquivos, numa biblioteca, num terreno,
dependem de causas humanas que não escapam de forma alguma a
analise, e os problemas postos pela sua transmissão, longe de
serem apenas exercícios de técnicos, tocam, eles próprios, no mais
íntimo da vida do passado, pois o que assim se encontra posto em
jogo é nada menos do que a passagem da recordação através das
gerações (BLOCH, 1941-42, p.29-30).
A concepção do documento/monumento é, pois, independente da revolução
documental e entre os seus objetivos está o de evitar que esta revolução necessária
se transforme num derivativo e desvie o historiador do seu dever principal: a crítica
do documento – qualquer que ele seja – enquanto monumento. O documento não é
qualquer coisa que fica por conta do passado, a sociedade que o fabricou segundo
as relações de forças que aí detinham o poder. Só a análise do documento enquanto
monumento permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo
cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de causa.
A História, na sua forma tradicional, dedicava-se a memorizar os monumentos
do passado, a transformá-los em documentos e em fazer falar os traços que, por si
próprios, muitas vezes não são absolutamente verbais, ou dizem em silêncio outra
coisa diferente do que dizem; nos nossos dias, a história é o que transforma os
documentos em monumentos e o que, onde dantes se decifravam traços deixados
pelos homens, onde dantes se tentava reconhecer em negativo o que eles tinham
sido, apresenta agora uma massa de elementos que é preciso depois isolar,
reagrupar, tornar pertinentes, colocar em relação, constituir em conjunto. Veremos a
importância da construção e conservação de uma identidade.
A identidade cultural e a memória reforçam-se mutuamente. Conhecemos as
nossas raízes, distinguimos o que nos une e o que nos divide. Estamos aptos a
entender que a cultura e a memória são faces de uma mesma moeda e que a
atitude cultural por excelência e com o que nos rodeia, desde os testemunhos
construídos ou das expressões da natureza aos testemunhos vivos aos quais são
imprescindíveis para a construção desta identidade.A memória é um elemento
essencial da identidade e contribui para a formação da cidadania
A definição da própria identidade cultural implica em distinguir os princípios,
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os valores e os traços que a marcam, não apenas em relação a si própria, mas
frente a outras culturas, povos ou comunidades. Memória e identidade estão
interligadas, desse cruzamento, múltiplas pelas possibilidades poderão se abrir ora
produção de imaginário histórico-cultural.
Na linguagem do senso comum, a identificação é construída a partir
do reconhecimento de alguma origem comum, ou de características
que são partilhadas com outros grupos ou pessoas, ou ainda a partir
de um mesmo ideal. (HALL, 2000, p. 106).
Essa construção da identidade ou identidades vai se moldando quando um
determinado grupo se apropria de seus valores, manifestações perpetuando-os na
sua história, passando de geração a geração. A identidade é uma categoria
extremamente diferenciada dentro das Ciências Humanas e Sociais. Pode ser
abordada em relação à questão de gênero, pode ser definida a partir da religião que
se professa, pode ser construída, e geralmente o é, com a contribuição da atividade
profissional que uma pessoa exerce, está intimamente ligada ao grupo étnico ao
qual pertencemos, o que já inclui outras categorias como língua, costumes, etc.
As identidades parecem invocar uma origem que residiria em um
passado histórico com o qual elas continuariam a manter a uma certa
correspondência. Elas têm a ver, entretanto, com a questão da
utilização dos recursos da história, da linguagem e da cultura para a
produção não daquilo que nós somos, mas daquilo no qual nos
tornamos (HALL, 2000, 109).
A historiografia tem passado, nas últimas décadas, por reformulações e
questionamentos, em um processo de rupturas e adequações frente a si próprias e
as outras ciências, humanas e sociais. A falência dos modelos analíticos como o
Marxismo e o Estruturalismo e a ascensão da Nouvelle Histoire estimularam o
aparecimento de múltiplas abordagens, métodos e alianças interdisciplinares que
pareceram, para alguns, o esfacelamento da História (Dosse, 1989) e até mesmo
seu fim como uma forma de conhecimento específico. Michel de Certeau também
aborda esse novo modelo historiográfico.
Um primeiro aspecto a ser abordado é a importância que De Certeau dava a
multidisciplinaridade e interdisciplinaridade, principalmente a aproximação com a
Linguística e a Antropologia – como já foi salientado anteriormente, os estudos de
linguagem são centrais para as teorias pós-modernas. Para De Certeau, a
15
multidisciplinaridade possibilitaria captar o momento histórico de um ponto de vista
mais amplo (De Certeau, 1995, p.8).
A relevância que este historiador depositava na escrita da História pode ser
notada por suas preocupações com a Linguística. Para De Certeau (1982) a escrita
da História seria o discurso da separação, através do qual o historiador pretendia
aprisionar o que da realidade que estuda transparece em seus resquícios. O
discurso histórico seria produzido de uma maneira deslocada em relação à realidade
passada, uma vez que, para o autor, o passado não poderia ser apreendido
plenamente, não só pelas limitações dos métodos historiográficos (recortes, triagem,
inteligibilidade do presente), mas, principalmente, devido ao lugar de onde fala o
historiador.Para De Certeau, a produção do historiador, portanto, deveria ser
considerada “(...) como a relação entre um lugar (um recrutamento, um meio,
umofício, etc.), procedimentos de análise (uma disciplina) e a construção de um
texto (uma literatura)”.
Nesta perspectiva, deve-se concentrar a análise em dois pontos:
primeiramente, os instrumentos metodológicos dos quais o historiador se utiliza
foram desconsiderados pelos autores pós-modernos. Hayden White afirmou que o
trabalho historiográfico faria parte de uma encenação, um teatro acadêmico que
visaria dar objetividade e caráter científico à produção histórica (White, 1995, p. 65).
Contudo, De Certeau, mesmo alertando para as limitações do trabalho
historiográfico, não o desabilitou. O trabalho do historiador seria compreender, e
nessa busca pela compreensão os limites metodológicos seriam constantes, mas
trazendo em si a continuidade da produção historiográfica, naquilo que estaria
ausente ou no que foi observado apenas de uma maneira.
O segundo ponto refere-se ao lugar do historiador, os pressupostos que
fazem parte da produção do historiador. De Certeau salientou que o historiador
produz seu trabalho a partir do presente, das preocupações de sua realidade,
fazendo de seu discurso um "discurso particularizado", que tem um emissor, o
historiador, e um destinatário, seja ele qual for, a academia, a sociedade de forma
geral ou um grupo específico (De Certeau, 1995, p. 224). Essa discussão implicou
numa constatação vital para De Certeau: não se pode falar de uma verdade, mas de
verdades (no plural).
16
Para De Certeau, essa problemática teria outro patamar e outro caminho. A
ideia de uma verdade universal foi igualmente refutada, porém, para o autor, o que a
História poderia produzir eram verdades, subjugadas aos limites das pesquisas
históricas e influenciadas pelo presente do historiador: "A historiografia mexe
constantemente com a história que estuda e com o lugar onde se elabora" (De
Certeau, 1982, p. 126). O que se apreende é a preocupação de DeCerteau em não
negar a possibilidade de alcançar alguma verdade.
A objetividade do discurso do historiador nãoestaria, portanto, mais
relacionada com visões acabadas, definitivas ou fechadas; o trabalho do historiador
residiria na busca de possibilidades, hipóteses de abordagem ligadas as suas
preocupações específicas, daí a existência de verdades. A maior parte dos aspectos
aqui citadas das teorias de DeCerteau fazem parte dos questionamentos da
historiografia. As saídas apontadas pelo autor encontram eco, em maior ou menor
grau, nos trabalhos de vários historiadores, principalmente aqueles ligados à História
Cultural. A multiplicidade cultural e a consciência da participação do historiador na
construção deverdadeshistóricas são preceitos já presentes nos debates da
disciplina.
A partir do breve quadro exposto das ideias de De Certeau em relação à
História e sua construção, pode-se apreender uma exemplificação (mesmo que o
termo tenha uma força muito grande para o que se deseja dizer) de como as teorias
podem ser aplicadas sem que o trabalho histórico seja deformado até o limite.
Num balanço mais geral do papel da pós-modernidade na História, suas
discussões parecem já fazer parte do cotidiano dos historiadores. E, arriscando
desvalorizar demais sua importância, a historiografia já trouxe possibilidades de
abordagem para os problemas levantados pela pós-modernidade e Michel De
Certeau deve ser incluído como um contribuinte nesse caso.
A leitura de autores pós-modernos parece ter alcançado grandes proporções
nos centros de pesquisa, gerando muitos debates, porém é difícil dizer se seus
principais pressupostos serão aceitos e seguidos. A crítica a pós-modernidade tem
vindo de historiadores renomados e reconhecidos por suas capacidades. E mesmo
quando a crítica, de alguma forma, apoia algumas visões pós-modernas, essas são
redimensionadas, trazidas à prática historiográfica e então testadas.
17
 Como qualquer nova proposta teórica, a pós-modernidade trouxe, e talvez
ainda traga, contribuições para a prática historiográfica. Os debates parecem estar
se multiplicando, o que nos deixa uma margem de expectativa em relação às
potencialidades, ou não, da pós-modernidade dentro das ciências humanas, mais
especificamente, da História.
Ao estabelecer relações entre História, historiografia, memória e identidade
tratadas pelos teóricos: Le Goff, De Certeaue Hall. Passei a ter uma clareza teórica e
suporte para o desenvolvimento da minha pesquisa. Tendo vista que a escrita do
Baptista e o modo de lidar com as fontes são semelhante a dos teóricos aqui,
apresentados.
 
 
CAPITULO I
BAPTISTA E A EXTENSA OBRA NA ÁREA DA GEOGRAFIA
1.1 O livro Nascentes de um rio
18
Imagem 1: Capa do livro Nascentes de um rio
Fonte: O livro Nascentes de um rio (1971)
Livro escrito em 1971 descreve a importância dos rios na formação
estruturaldos solos por onde corre, na criação das civilizações ou na evolução da
flora e da fauna. O autorensina como nasce qualquer rio, além de questionar a tese
do filósofo e geógrafo alemão Gustavo Dot que defendia como sendo nascente
principal do rio Parnaíba o riacho corriola em um lugar chamado Pau cheiroso, na
serra da Tabatinga.
Ele relaciona uma série de fatos que são atribuídos aos rios como a
modelagem do relevo, as assolações laterais por efeito das cheias, a navegação, o
transporte dos produtos e a irrigação de suas margens. E enfatiza a importância de
alguns rios do Brasil como o São Francisco no passado e o Amazonas no presente,
rios navegáveis com enorme potencial hidrográfico e propício a produção de
energia. E não deixou de citar a influência de alguns rios regionais como o Piauí,
Canindé, o Poti e o Gurgueia como exemplo dos grandes e pequenos cursos.
Segundo o autor o estudo dos rios deve ser levado em consideração uma série de
fatores que se interligam e determinam a sua importância. Entre eles destaca:
nascentes, lençóis freáticos, regime, evaporação; volume, margens, delta ou
estuário, vazante e outros. Destaca o regime, que determina a navegação e o
aproveitamento das margens, e define-se pela descarga média e as variações que
esta sofre em face às precipitações, as estiagens e as infiltrações.
19
Imagem 2: Nascentes de lençol superficial diretas
Fonte: O livro Nascente de um rio(1971)
Segundo Baptista para determinar o rio principal em um curso de água que
tem vários confluentes tem que ser considerado os afluentesque nascem perto um
dos outros, sendo oriundos de uma só nascente e os que têm início longe uns dos
outros e vêm de várias nascentes. Citando exemplos como o Nilo que vem do lago
Vitória Nianza e o São Lourenço da América do Norte, que é sangradouro dos lagos.
O autor através de uma pesquisa bibliográfica questiona a tese do geógrafo
Gustavo Dot, sobre a nascente principal do rio Parnaíba. Segundo ele o Parnaíba
nasce na chapada das Mangabeiras, no limite sul do Piauí, com o nome de água
quente, a cerca de 709 metros de altitude.
20
Imagem 3: Nascentes do Parnaíba
Fonte: O livro Nascentes de um rio (1971)
Neste livro nota-se a preocupação do autor com os rios, em plena década de
setenta, já alertava a sociedade piauiense sobre os problemas que viriam com o
tempo, caso os nossos rios não fossem preservados. Ele utiliza o poder de
problematização para chamar a atenção dos seus leitores e da sociedade em geral.
1.2 O livro Resumo corográfico do estado do Piauí
O livro publicado em 1971, destinado às escolas primárias. É a primeira
descrição sistemática do relevo piauiense.
O autor situa o Piauí no nordeste brasileiro, na parte nordeste ocidental ou
meio norte, tendo forma irregular. Estreito ao norte, alagando-se para o sul, limita-se
ao norte com o oceano atlântico, a leste com os estados do Ceará e Pernambuco;
ao sul com os estados da Bahia e Goiás e a oeste com o Maranhão. Tendo um litoral
que mede apenas 66 quilômetros de extensão, sendo o menor do Brasil em relação
aos outros estados marítimos. Vai da barra das Canárias, na fronteira com o
Maranhão, a barra do rio São João, na fronteira com o Ceará, e que dois municípios
21
do estado são litorâneos: Parnaíba e Luiz Correia, segundo Baptista o Piauí possui
uma superfície calculada em 250.934 quilômetros quadrados, ficando em nono lugar
em extensão comparado com os demais estados do Brasil.
Imagem 4: Limites do Piauí
Fonte: O livro Resumo corográfico do estado do Piauí (1971)
E que o sistema corográficopiauiense pertence ao maciço nordestino, não
existindo montanhas. Existindo apenas serras, morros, chapadas e chapadões.
Sendo a fronteira piauiense a serra do Ibiapaba, a chapada do Araripe, as serras
Dois irmãos, Piauí, Caracol; Semitumba, Tabatinga e a Chapada das Mangabeiras.
22
Imagem 5: Sistema orográfico piauiense
Fonte: O livro Resumo corográfico do estado do Piauí (1971)
O autor classifica o clima local como seco e quente, porém sadio, e que não
possui as quatros estações do ano. Apresenta duas fases climáticas o inverno, que
é o período chuvoso e o verão que é a estação seca. Existindo locais com clima frio
durante todo o ano, como as cidades serranas de Pedro II, Paulistana e Corrente.
Com base no senso de 1970 estimou a população geral do Piauí em 1971
com cerca de 1.735.568 habitantes, sendo 540.000 nas cidades e 1.195.568 no
interior e que estava em décimo sétimo em população no Brasil, e que a sua
densidade demográfica era de 6,95 habitantes por quilômetro quadrado. Sendo
Teresina, Parnaíba, Floriano, Piripiri, Picos e Campo Maior, as cidades mais
populosas com cerca de 10.000 habitantes em sua área urbana.
Ele escreve um pouco sobre a história de Teresina, segundo o mesmo, o
conselheiro Saraiva em visita a vila do Poti, concordou com os moradores locais a
criação da nova vila do Poti, no local chamado chapada do corisco, fato que se
concretizou em 1851. E que no ano seguinte, elevou à vila a categoria de cidade,
com o nome de Teresina em homenagem a Teresa Cristina. E a partir do dia 16 de
agosto de 1852, Teresina passou a ser a capital do estado. Tendo sido assolada pela
varíolanos de 1866 e 1875, ganhou iluminação pública noturna e telégrafo em 1882,
mas, só foi inaugurado em 1884, foi cercada pela coluna Prestes em 1923 e 1930,
transformou-se em praça de guerra, até a chegada do então tenente Landri Sales.
Nota-se que o autor está à frente do seu tempo, criando o Resumo
corográfico do estado do Piauí, ele preencheu uma lacuna existente no ensino
primário da época, ele cria uma identidade espacial do Piauí e demonstra uma
escrita diversificada, envolvendo questões geográficas e históricas.
1.3Geografia física do Piauí
O autor mostra nos capítulos da segunda edição do livro Geografia física do
Piauí (1981) um volumoso conteúdo, tendo como base a sua tese vulcões (1952), os
livros Nascentes de um rio (1971), Resumo corográfico do estado do Piauí (1971), e
a primeira edição do livro Geografia física do Piauí (1975).
23
O ponto máximo do livro são os relatórios de sua pesquisa de campo feita em
1977 com apoio da UFPI para definir a região onde nasce o principal rio do estado
edeterminar qual seria realmente o principal formador do Parnaíba, uma vez que as
afirmações eram contraditórias em torno do assunto.
A informação tradicional era que o rio Parnaíba nascia na serra da Tabatinga,
no lugar denominado Pau Cheiroso, a expedição da universidade confirma outra
versão, desfazendo a mais tradicional.
A viagem teve como participantes o autor Baptista professor de Geografia
física da Universidade federal do Piauí, Noé Mendes de Oliveira (pesquisador e
professor na área de Ciências humanas da Universidade federal do Piauí), Jason
Bahia (Biólogo e professor de História natural), Antônio João Dumbra (Biólogo e
professor do departamento de Biologia da Universidade federal do Piauí) e o
fotógrafo profissional da expedição David Louis Olson. A expedição superou muitos
obstáculos, uma viagem cansativa, clima quente e local desconhecido por muitos.
Segundo Baptistaa viagem teve início no dia 3 de setembro e terminou no dia
13 de setembro e teve o seguinte roteiro: ida (Teresina-Gilbués-Santa Filomena-Alto
Parnaíba-Gurupá-Nascentes) e a volta (Nascentes- Gurupá-Alto Parnaíba-Teresina).
E os transportes utilizados foram a camioneta, jipe, montaria, montaria, balsa, avião
e ainda andaram cerca de 2 km a pé. Como vemos no relatório abaixo.
24
Imagem 6: relatório II
Fonte: Geografia física do Piauí (1981)
Baptista descreve os objetivos alcançados como o reconhecimento da
extensa área onde estão localizadas as nascentes do rio Parnaíba, uma
documentação completa da área através de fotos preto e branco, slides, filmes super
8 e gravações de fita cassetes. Observa-se a preocupação do autor em utilizar uma
variedade de recursos para registrar o momento.
Aproveitou e avaliou os recursos naturais, condições socioeconômicas e
culturais do lugar. Identificou o lugar exato da nascente principal como sendo o
riacho Água quente, que nasce ao pé da chapada das Mangabeiras em local de
cerrado ralo, em um boqueirão de alturavariável do qual desce uma galeria verde
central. E que este riacho percorre 50 km aproximadamente, quando recebe o
Corriola, a partir desta junção começa a receber o nome de Parnaíba, tendo cerca
de 10 a 15 metros de largura e uma média de 2 a 3 metros de profundidade. Sendo
bem evidentes no local da junção entre os dois riachos, que o riacho Água quente é
mais largo e desce direto, enquanto o Corriola demonstra claramente ser afluente.
Além do mais, o riacho Água Quente possui uma bacia hidrográfica de 45 km² e o
Corriola de 22 km².
25
Imagem 7: Relatório III
Fonte: Geografia Física do Piauí (1981)
1.4 A Origem do rio Parnaíba
Neste trabalho, que classificou como uma tese e que apresentou no I
seminário de preservação do rio Parnaíba, em 1987, onde apresenta a hipótese de
que o rio Parnaíba tenha sido um prolongamento final do curso do rio São Francisco
rumo ao litoral norte-atlântico, antes que se levantasse ao impacto, quem sabe de
vulcões, o espinhaço da serra do arco divisor dos tempos atuais.
26
Imagem 8: Capa do livro Origem do rio Parnaíba
Fonte: O livro A Origem do rio Parnaíba (1986)
O autor deixa claro que aventou uma hipótese sobre a origem do rio Parnaíba.
E que não sabe como vai ser recebido, e que pode ser correta ou não, sendo difícil
determinar. Segundo o mesmo com a criação do escudo brasílico surgiram os dois
grandes rios que cortavam de sul para o norte: o Tocantins, a oeste, e o São
Francisco a leste. Iam desaguar naquilo que, àquele tempo, seria o golfão
amazonense, o primeiro caracterizado como afluente do Amazonas e o segundo
paralelo a este, em direção ao oceano.
Sendo possível supor que o São Francisco antes da existência do arco da
fronteira, seguia pelo vale da Pedra branca. As nascentes deste afluente do Piauí,
situam-se a 500 metros de altitude e a pouco mais de 3 quilômetros das nascentes
do rio Jiboia, com a mesma altitude, que despeja para o atual açude do Sobradinho,
e daí, pelo rio Piauí, Canindé e Parnaíba, desaguando no oceano. Assim, o
Parnaíba foi originalmente o trecho final do rio São Francisco.
27
Imagem9: Mapas que possibilitam a tese
Fonte: A origem do rio Parnaíba (1986)
A bacia do Meio-norte é formada de duas partes: o embasamento dobrado e a
cobertura da plataforma, em consequência do que se formou, é denominado Arco da
fronteira. Tem sua parte mais profunda no Maranhão a cinco graus de latitude sul e
quarenta e cinco graus de longitude oeste de Greenwich. A consolidação das terras
do Meio-norte se deu após uma série de movimentos eustáticos (transgressões e
regressões marítimas).
Vemos um escritor movido por problematizações, por questionamentos, que
busca respostas as suas duvidas, que manuseia todo tipo de fonte, não se
prendendo apenas as oficiais. A sua escrita é parecida com a dos adeptos da escola
dosAnnales, onde se passou a aceitar uma diversidade de ideias, e que tudo pode
ser pesquisado e analisado, não existindo barreiras para a historiografia.
1.5 Mapas Geohistóricos
Nesta obra o autor inicia com as lendas que se referem à presença dos
28
árabes e fenícios em território piauiense, passando pelos desbravadores do sertão
de dentro, pela ocupação efetiva da terra, pelas questões fronteiriças, pela criação e
instalação das primeiras vilas, pelas lutas da independência, pelo movimento da
Balaiada alcançando o período republicano, as pesquisas arqueológicas em São
Raimundo Nonato, trazendo ao texto mapas antigos do Piauí, além daqueles
elaborados pacientemente, por ele próprio, fundamentados historicamente e
enriquecidos com dados coletados e levantados com seriedade.
Este trabalho deveria ser o capítulo inicial de uma Geografia
humanado Piauí. Entretanto, as despesas com a obra completa
ficariam a preço tão inacessível, que resolvemos apresentá-lo
isoladamente. Trata-se de um esboço sobre mapas históricos
antigos, descrições tradicionais, lutas e posicionamento municipal em
ocasiões especiais da História (BAPTISTA, 1986, p.3).
O estudo deste livro ficou focado nas questões fronteiriças por serem muito
antigas e ao mesmo tempo atuais, Baptista destaca: Mesopotâmia entre o Balsas e
o Alto Parnaíba, litoral de Amarração, zona de Crateús, serra de Ibiapaba e zona
litigiosa, delta e nascentes do Parnaíba, zona do morro Cabeça no Tempo.
Segundo Baptista as terras piauienses de 1635 até o ano de 1714 eram da
jurisdição ora de Pernambuco, ora da Bahia, pois somente em 1715 passaram por
ato régio à jurisdição do Maranhão, quando já em 1718, foi criada a colônia sob
jurisdição e dependência do governo maranhense até 1811, quando se tornou
independente.
E esse problema só teve solução no fim do século XVIII, quando os
maranhenses ocuparam as terras, o marco disso foi a criação do município de Alto
Parnaíba. Amarração era um povoado de pescadores piauienses, foi ocupado, aos
poucos, pelos padres da freguesia de Granja (Ceará), sob a alegação de batizar os
moradores, em 1823, a expedição de Andrade Pessoa, com a alegaçãode proteger
os moradores locais das tropas portuguesas, tomou conta do local e não devolveu
mais. Mesmo sob vários protestos o governo Cearense criou em 1865 a freguesia de
Nossa senhora da Amarração, mas somente em 1880, as duas províncias chegaram
a um acordo, o Piauí cedia Crateús (Príncipe imperial) e Independência em troca de
Amarração (Luís Correia). O Ceará não cumpriu o decreto, assumiu Crateús e não
permitiu a delimitação das terras, provocando o caso da zona litigiosa que se
29
eterniza.
Textualmente diz o decreto que o Ceará aceitou que todas as vertentes
ocidentais pertenciam ao Piauí, à área piauiense seria outra, que foi incorporada ao
estado vizinho. O decreto 3.012 diz que serve de linha divisória das duas províncias
a serra Grande ou da Ibiapaba, sem outra intervenção além do Poti, no ponto do
boqueirão e pertencendo a província do Piauí, todas as vertentes ocidentais da
mesma serra e a do Ceará, as orientais. Em 1912, o governador Miguel Rosa tentou
a demarcação do local, sem resultado. Em 1923, Lima Rebello achava que crescia a
invasão, pois segundo ele eram do nosso estado os vales do Ubatuba e do
boqueirão da Palmeira, do município de Parnaíba. Afirmava que os cearenses
ocupavam a importante povoação de algodões.
Em 1960, a ocupação era inconteste, o recenseamento deste ano foi feito
pela secção piauiense nas duas partes setentrionais, na do sul, deve ter sido feito
pelo Ceará. Não foram reconhecidas as razões desta separação. Nada mudou
praticamente essas questões fronteiriças ficaram na História. João Gabriel Baptista
define assim, a situação das terras da zona litigiosa:
As terras da zona litigiosa continuam sem demarcação. Foram feitas
tentativas para a solução, mas não há interesse, principalmente por
parte do Ceará, que está de posse das terras e não quer cedê-las. É
uma área de 2.614 km², distribuída em três parcelas: uma ao norte,
com 354, outra ao centro, com 545 e a última, ao sul, mais
importante, com 1.715 km², aproximadamente (BAPTISTA, 1981,
p.28).
Outro problema que persistiu até 1923, era um problema dividido em duas
partes: a fronteira com o Maranhão, em dois lugares: o delta e as nascentes do
Parnaíba. O delta composto de sessenta ilhas, várias riquíssimas, como a do Caju, a
do Igoronhom, as das canárias e tantas outras, além da maior delas: a Grande de
Santa Isabel. O autor confirma que o Parnaíba desemboca por cinco barras. O Piauí
pleiteava que a fronteira fosse pela embocadura, o Maranhão pelas Canárias. E que
teve nosso estado brilhantes defensores pela imprensa nas pessoas de Antonino
Freire e Pereira da Costa, que em jornais e publicações diversas, defenderam suas
pretensões justas e bem documentadas. E o professor afirma que até os
maranhenses acreditavam ser nosso o delta, referindo-se ao senador Joaquim Cruz
que em pleno senado, em 1895, declarou o delta piauiense.
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Imagem 10: questões fronteiriças
Fonte: Mapas Geohistóricos (1986)
O autor afirma que o Parnaíba desemboca por cinco barras. O Piauí
contestava que a fronteira fosse pela embocadura, e o Maranhão pelas Canárias. E
que teve nosso estado brilhantes defensores pela imprensa nas pessoas de
Antonino Freire e Pereira da Costa, que em jornais e publicações diversas,
defenderam suas pretensões justas e bem documentadas. E o professor afirma que
até os maranhenses acreditavam ser nosso o delta, referindo-se ao senador
Joaquim Cruz que em pleno senado, em 1895, declarou o delta piauiense.
A última questão fronteiriça tratada pelo autor é a zona do Morro Cabeça no
Tempo, região que limita o Piauí e a Bahia, nas vertentes do Curimatá. Um acordo
de 4 de setembro de 1919, confirmado no governo de Eurípedes de Aguiare
revigorado em 1952, com Pedro Freitas, determinou que os limites deixam para o
nosso lado os povoados Morro Cabeça no Tempo, Lagoa de Dentro, Lagoa do Arroz
e outros, passando a fronteira pelo divisor das águas do Parnaíba e do São
Francisco, mais propriamente pelos interflúvios que separam o Curimatá(PI) e o
Pilão Arcado(BA). E que a criação do município de Avelino Lopes, no povoado
Lagoa de Dentro, em 1961, pelo governador Chagas Rodrigues, foi para proteger os
31
interesses piauienses. É que o problema não era com o estado da Bahia, mas com
os moradores, que diz que a terra pode ser piauiense, mas quem lá nasce é baiano.
Com a criação de Avelino Lopes e de um posto fiscal nesse povoado diminuiu o
problema e que as terras, pelos menos as terras, são piauienses.
O autor consegue unir História e Geografia em um assunto que é ainda hoje,
é muito polêmico, e que impressionou educadores e intelectuais do nosso estado.
No próximo capítulo será apresentado a sua contribuição para a História piauiense.
:
32
CAPÍTULO II
BAPTISTA E A SUA CONTRIBUÍÇÃO PARA A HISTÓRIA
Em 1994, ele escreve a sua última obra, o livro Etno-história indígena
piauiense, onde reconstitui o brutal processo de aniquilamento das populações
nativas.
Imagem 11: capa do livro Etno-história indígena piauiense
Fonte: livro Etno-história indígena piauiense (2009)
Baptista escreve sobre um assunto que até então era tratado por alguns
historiadores apenas de modo superficial, demonstrando ser um adepto da História
cultural utilizando-se de todo tipo de fontes, como documentos oficiais e a utilização
de uma vasta bibliografia. O autor consegue resgatar a memória dessa raça extinta
e o relatocontundente de umdos episódios mais dramáticos da História colonial
donosso país.
33
Influenciado pelocontexto social, político e cultural da época. A sua escrita
aproxima-se a do seu contemporâneo o padre Monsenhor Chaves, que em 1950,
escrevera “O índio no solo piauiense”, obra que rompe com os padrões
historiográficos da época, deixando de lado o tradicionalismo historiográfico que
prestigiava os grandes feitos e as grandes personalidades,dando ênfase aos menos
favorecidos e esquecidos da historiografia piauiense, fazendo uma analise profunda
do processo de colonização do Piauí e as arbitrariedades sofridas pelos índios
locais. Afirmando e provando através de uma pesquisa minuciosa que os gentios
foram perseguidos, escravizados e massacrados pelos colonizadores.
Nosso índio foi a grande vítima do civilizado. O branco tomou-lhe as
terras para povoá-lo a seu modo. Escravizou-o, no princípio.
Cometeu contra ele graves injustiças, que o fizeram levantar-se em
armas, em grandes federações tribais ofensivas e também
defensivas. Tremendas represálias se praticaram, então, de ambos
os lados. Afinal o índio capitulou. Tinha que ser. Foi assim em toda
parte. A diferença de cultura e a inferioridade de armas conspiraram
contra eles. (CHAVES, 1984, p.30).
O autor inicia com uma discussão sobre as origens do índio americano
destacando duas correntes de teses contrárias, uma considera os índios
comoautóctones e a outra como alóctones, sendo que a segunda supera a outra e
aparecem as mais diversas origens, assim, o homem teria vindo da Àsia menor,
Argentina, Fenícia, Cartago, Suméria, Escandinávia, Grécia, Roma, Europa, França,
Península Ibérica, África, Egito, Judeus, Irlanda, Inglaterra, Oceania, Austrália, Mista
e da Atlântica. A última tese caiu, quando os paleontólogos determinaram que o
homem surgiu na face da terra depois que os continentes já apresentavam a atual
configuração.
Ele enfatiza que a arqueóloga NièdeGuidon (1990) levanta outra possibilidade
que é a das populações pré-históricas de São Raimundo Nonato terem chegado ao
continente pelo mar, ou se vieram do norte, passando pela América Central. Mas
segundo a USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto, com bases em
amostras de sangue colhidas entre 1989 -1990 e a comparação com outras
amostras chegaram à conclusão de que a tese da vinda dos índios brasileiros pelo
estreito de Behring é a correta. Os pesquisadores desta instituição acreditam que
aconteceu entre 30 e 40 mil anos atrás, e que o homem teria atravessado o estreito
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de Behring aproveitando a quarta glaciaçãoda terra (Wurn) e que terminou entre 22
e 12 mil anos atrás. Graças aos trabalhos realizados em São Raimundo Nonato
desde a década de 1970, a maioria dos pesquisadores não duvida mais que o
homem tenha chegado à América do Sul, há pelo menos, creca de 70 mil anos
atrás.
Segundo Baptista, a classificação dos índios americanos foi e continua sendo
objeto de fortes discussões entre Antropólogos e etnólogos, e que existe vários para
uma definição do que é índio. Mas expõe em seu livro alguns critérios definidos pelo
Mellati (1970) são eles: Racial, legal, cultural, econômico e étnico. O último critério,
graças ao II Congresso Indigenista interamericano (1949) realizado no Peru (Cuzco)
definiu índio como “o descendente dos povos e nações pré-colombianas que tem a
mesma consciência social de sua condição humana”.
Direcionando-se ao Piauí, o autor utiliza estudos realizados pelo Artur Ramos
(1967) e Odilon Nunes (1966). O primeiro trabalha com a concepção de que no Piauí
teve apenas quatro representantes, de etnias: Tupi-guarani, Jê, Cariri e Caraíbas
que eram distribuídas por sete nações indígenas: Jês (Acroá, GueguêS, Jaicó e
Timbira), Tupi-guarani (Tabajara), uma Cariri(Tremembé) e uma Caraíba
(Pimenteira). E o segundo estudioso afirma que eram cinco etnias, acrescentando a
Aruaque as outras quatro, mas enfatiza que esta não teve nação e nem tribo na
capitania. Para Baptista as comunidades indígenas que viveram no espaço
piauiense pertencia a etnias com hábitos culturais diferentes.
A etnia Tupitinha em média 1,80 de altura, cabelos lisos, cabeça comprida,
nariz afilado, face larga, pele amarelo-bronzeada e olhos de aparência mongólica.
Cortavam o cabelo da cabeça e depilava o corpo, as mulheres deixavam crescer o
cabelo, que lavavam pela manhã e pintavam com óleo de coco e urucu. Andavam
nus, mas tinham protetor para o sexo.Habitava em aldeias ou malocas que
formavam retângulos com praça central, essas habitações eram construídas
próximas do litoral ou perto. Era costume deles, de cinco e cinco anos, mudarem de
local, alimentavam-se de caça e pesca; destacavam-se pelo uso do anzol, do arpão,
cabaça, urupema de barragem e a mão. Esses índios praticavam a agricultura,
plantando mandioca, milho e batata. Confeccionavam tambores, utilizando toras de
árvores escavadas a fogo, redes de algodão, bancos e cadeiras. Nas guerras
35
usavam lanças e tacapes, sendo que nas lanças costumavam usar material
inflamável nas pontas, as cabeças dos inimigos eram espetadas na entrada da
maloca, uma espécie de troféu de guerra e nas cerimônias era comum o uso do
cachimbo.
A etnia Jêtinha em média 1,58 de altura, cabelos lisos, cabeça comprida ou
arredondada, nariz afilado ou chato, face média, pele amarelo-clara e olhos de
aparência mongólica. Os cabelos eram cortados formando coroas de frade, alguns
tingiam o corpo todo, colocavam penas no corpo e usavam batoques nos lábios e
orelhas, também andavam nus, mas com proteção para o sexo.Habitava cabana
com paramenta e algumas malocas, na região do interior, pois fora expulsa do litoral
pela Tupi, dormiam em cama de pés baixos e raramente usavam rede. Alimentação
era caça e pesca esta última feita com uma espécie de tarrafa rudimentar. O fogo
era pouco utilizado, o alimento era guardado em camadas numa escavação coberta
com terra, eram bons cantores e costumavam fazer festas nas quais o uso do
cachimbo se fazia presente. Fabricavam canoas de junco ou de cascas de árvores,
provavelmente de jatobá, para enfrentar os combates com os inimigos, ingeria uma
bebida, considerada um estimulante, produzida com a jurema, árvore característica
da flora local. O arco e a flecha eram utilizados nas atividades de guerra e caça.
A etnia Cariri habitava casa de barro armada de pau-a-pique ou choupanas e
rancho de palha. Viviam na região do Paraguaçu ao São Francisco, vindo até ao
Gurupi. Usavam como armas arco, flecha, azagaia e pequenos machados de mão.
Conheciam e praticavam a navegação em pequenas canoas ou balsas, cultivavam
milho, abóbora, feijão e algodão, do qual faziam redes, e dedicavam-se à caça e a
pesca.
A etnia caraíba tinham em média 1,50 de altura, cabelos ondulados, cabeça
média, nariz convexo, face média, pele argilo-amarelo-cinzenta e olhos sem traços
mongólicos. Andavam nus, com pequenos dispositivos de proteção ao sexo, os
cabelos eram tonsurados, as mulheres tinham os cabelos da frente em franjas,
pintavam o corpo com desenhos lineares e pequenas tatuagens. Habitavam malocas
circulares com pátio de dança, na região sul do Piauí. Alimentavam-se de caça e
pesca e praticavam agricultura, cultivando mandioca, milho, e feijão.
Confeccionavam redes, abanadores e esteiras, usavam cuias feitas de cabaça,
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construíam canoas de casca de jatobá e eram hábeis canoeiros, utilizavam-se de
arco, flecha, e faziam machados de pedras e furadores. Eram diferentes de todos os
demais índios, tanto por sua inteligência como por sua robustez, estatura e
proporcionadas formas; seus olhos revelavam inteligência e o hábito de raciocinar e
refletir.
Observa-se a preocupação do autor em criar uma identidade às etnias que
existiram no Piauí e sua territoriedade destacando características de cada etnia,
aparência, estilos de habitação, localização geográfica, alimentação e suas distintas
culturas.
Difícil também é nomear os índios de determinada região, pois,dum
modo geral, eram nômades; podemos, todavia, nomear os ocupantes
num determinado período, ou ainda os que nela se fixaram por mais
longo tempo, a testemunhar a prodigalidade da terra ocupada e a
valentia de seus defensores (NUNES, 1965, p.29).
Nota-se a dificuldade dos pesquisadores de definir as etnias indígenas em
solo piauiense, pois os governantes nos primórdios da colonização do estado, não
tinham o interesse em estudar a raça, a sua cultura, as suas etnias, as suas nações
e muito menos as suas tribos; o único intuito dos desbravadores era eliminar as
tribos que resistiam e que supostamente impediam o progresso da capitania.
37
Imagem 13: Nações indígenas
Fonte: O livro Etno-história indígena piauiense
Processo que fora Sabiamente analisado pelo padre Monsenhor Chaves
(1950) e que trouxe uma nova visão para a questão das consequências do processo
de povoamento do estado do Piauí.
Baptista segue uma concepção do processo de povoamento parecido a do
padre Monsenhor Chaves, influenciado pelo novo modelo historiográfico, baseado
numa analise crítica da bibliografia local e dando uma nova visão dos
acontecimentos da região. Segundo o mesmo, foi o confronto de interesses que
caracterizou a conquista e o aniquilamento indígena, de um lado os catequistas e
colonizadores que queriam aldear e trazer o índio, mesmo à força para a civilização.
Do outro, os interessados em massacrá-los, prendê-los como escravos e torturá-los
para que informassem onde havia minas de ouro e pedras preciosas. Mesmo
existindo decretos desde o século XVI, que decretavam os índios nas Américas,
como livres e independentes, e que as pessoas que infringissem essa lei, seriam
sujeitas a fortes punições, inclusive com a pena de morte.Os índios eram bichos do
mato, que se podia escravizar quando apanhados no campo de batalha, e que se
podia matar quando roubando o gado das fazendas. Eles foram as pobres vítimas
de um choque de culturas (CHAVES, 1984, p.22).
Não haviam procurados os primeiros colonizadores obter aliança das
tribos deparadas. Pelo contrário, declaram-lhes guerra de extermínio,
provocaram represálias sanguinolentas e cruéis. E tal foi o ardor em
as combater que as que não fugiram, estavam completamente
exterminadas, antes de decorridos dois séculos. O morticínio em
massa, a fuga, o alcoolismo, a sífilis, o cruzamento-foram as causas
principais de sua extinção. Hoje, nem um sobrevivente resta desta
raça viril e belicosa, que não desapareceu sem nos deixar, energias
do caráter, um pouco de sua bravura serena (NEVES, 1921, 29-30).
E que mesmo depois de uma leide D. José I de 1755, liberando os índios do
Piauí, Ceará e Maranhão, o governador da capitania, Pereira Caldas, recebe ordem
real para guerrear os índios. Segundo o professor Baptista, entra em cena uma das
figuras mais sinistras da história da conquista dos solos piauienses, o tenente
coronel João do Rego Castelo Branco, homem frio que tinha enorme desprezo pelos
gentios e que em sucessivos massacres praticou todas as crueldades possíveis e
inimagináveis contra os índios piauienses por mais de trinta anos. Esse
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indivíduocom apoio de alguns políticos, fazendeiros e colonos conseguiu promover
uma das histórias mais triste do Piauí, o aniquilamento dos verdadeiros donos das
terras.Não existindo qualquer interesse pelos povos nativos, os desbravadores
sucumbidos pelo desejo de cada vez mais possuir terras para a criação de gados e
para o plantio. Para enriquecer estavam dispostos a cometer qualquer tipo de
arbitrariedade.
[...] liquidava todo tipo de índio: feto, recém-nascido, criança,
adolescente, moço, maduro e velho. Fêmeas e machos. As
peripécias sangrentas desse exímio degolador ingressaram na
História. Cumpria ordens dos conquistadores de terras e cumpria-se
sem um picote de remorso, alegre sempre. Um dos mais admiráveis
genocidas da História, el grande matador, da forma que H. Dobal lhe
deu apelido (TITO FILHO, 1990, p.91).
Esses foram alguns massacres que chegaram ao público: Tribo Tacariju
(1608) todos foram mortos, tribo Gurgueia (1676) 400 mortos, tribo Tremembé
(1679) 263 mortos, tribo Paiacu (1700), tribo Acroá (1772) 1100 mortos, e 1776
atacaram novamente os Acroás, deixando 400 mortos. Os dois últimos massacres
aconteceram depois da saída dos jesuítas expulsos pela lei de 3 de setembro de
1759 e não estão relacionados em parte alguma.
Imagem 14: Os massacres das tribos de 1608-1776
Fonte: O livro Etno-história indígena piauiense
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O autor retrata o coronel João do Rego Castelo Branco, como conquistador
dos índios, e extremamente cruel. E que não se interessava em aldeiá-los ou
catequizá-los, mas em massacrá-los para obter dados sobre supostas minas de ouro
e pedras preciosas. Segundo ele o algoz começa a sua ação em 1750 e se torna
uma sequencia de violência, de massacres e de ferocidade, e tendo apoio declarado
do governador Pereira Caldas. Durante trinta e quatro anos (1750-1784)
aproximadamente, durou as suas investidas as tribos nativas, essa são as
conhecidas: Combate os Timbiras, os Gueguês e Acroás (1751), age de novo sobre
os Gueguês (1762), age novamente contra os Timbiras (1763), nova revestida aos
Acroás (1764), outra vez contra os Gueguês (1765), prende 118 Timbiras, e
persegue os Amanajus e ataca pela terceira vez os Acroás (1771), situa Acroás no
Poti e recebe a ajuda de um contingente de Jaicós para lutar contra os Pimenteiras
(1772), persegue índios que fogem para o Tocantins (1775), mesmo doente combate
os Pimenteiras (1777).
Homem de enorme prestígio torna-se membro da junta governativa trina de
1775, a partir daí, torna-se um ditador nato e cada vez mais impulsiona ataques às
tribos dos Gueguês, os Timbiras, os Jaicós e principalmente os Pimenteiras. João do
Rego Castelo Branco deixa a junta trina em 1779, e sofre investigações sobre as
chacinas realizadas por ele, mostrando-se poderoso e temível assume todas as
responsabilidades das barbaridades, mas todos se calam.
Mas, perguntarão os incrédulos, onde ficaram os efeitos da guerra de
exterminação que fizeram os conquistadores, durante 200 anos,
contra os índios selvagens, de que falam os compêndios da história?
[...]considerando estes fatos históricos documentados, ninguém pode
mais falar da suposta guerra de exterminação, pelo menos nesta
parte do norte do Brasil. Na história piauiense só existe uma página
negra, que relata as proezas do tenente-coronel João do Rego
Castelo Branco que foi mestre-de-campo nos anos de 1770 a 1780.
[...] Os cronistas contemporâneos confirmam que este mestre de
campo causou a morte de 400 indígenas inofensivos, homens,
mulheres e crianças (SHEWENNAGEN, 1928, p.71-72).
O autor defende a ideia de que não houve epidemias ou endemias que
destruíssem os índios, as nações ou as tribos, e que foi somente a ação predatória e
sistemática do branco. E que no fim, quando seus últimos membros se
desintegravam, entregando-se ao alcoolismo ou sendo atacados pela sífilis, eles já
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não tinham identificação certa. O índio não existia mais como tribo e muito menos,
como nação, estavam sendo consumidos por uma cultura que destruíra a sua e que
não compreendeu o seu modo simples de viver.
Para Baptista, o índio deixou inserida sua cultura no nosso uso diário: nos
acidentes geográficos (Aroazes, Curimatá, Gilbués...) e outros que se perdem no
tempo e no espaço. Na alimentação (o milho, o feijão, o jerimum...) e os animais que
abatiam na caça ou usavam de outra forma, eram conhecidos o cauã ou a seriema,
as onças (suçuapara, canguçu, suçuarana, pintada ou preta), e muitos outros. Mas,
o legado principal e mais significativo à sociedade piauiense foi sem dúvida o
tipofísico- o caboclo do Piauí tem de seu antepassado dos potis, gueguês,
tremembés ou pimenteiras da cabeça aos pés.
Este livro do Baptista é uma obra de grandes proporções, um trabalho
detalhista sobre os índios piauienses, sua cultura, seu habitat, sua localização,e que
tem como foco principal o modo que foram tratados os gentios pelos colonizadores,
indivíduos que conseguiram em praticamente dois séculos destruir uma raça ou pior
destruir a sua identidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apresentadas as obras do João Gabriel Baptista, e os seus pontos principais
das mesmas, tornou-se possível analisar a importância da sua escrita para a
Geografia e para a História, que foi identificar espacialmente e humanamente o povo
piauiense. Nota-se uma preocupação constante em suas obras de criar uma
identidade do povo e do estado. Onde constantemente expõe a cultura, os aspectos
físicos, a economia, a localização e o modo de viver do piauiense.
Ele tinha uma preocupação com os nossos rios, com o crescimento
desorganizado de nossas cidades que afetava diretamente o meio ambiente, com a
conservação de nossa cultura, com a nossa economia e com a preservação de
nossa História.
A contribuição do presente trabalho estende-se à academia e à sociedade,
por contemplar uma pesquisa inédita volta a sua vasta obra. A importância para a
academia encontra-se em tornar este trabalho uma fonte de consulta sobre um tema
ainda não trabalhado nos projetos acadêmicos e que a partir desse trabalho possam
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surgir novas pesquisas sobre a escrita do Baptista.
REFERÊNCIAS
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BAPTISTA, João Gabriel. Resumo Corográfico do Estado do Piauí. 1971.
BAPTISTA, João Gabriel. Geografia física do Piauí. COMEPI, 2ª edição, 1981.
BAPTISTA, João Gabriel. A origem do rio Parnaíba. Teresina: EDUFPI, 1986.
BAPTISTA, João Gabriel. Mapas Geohistóricos. Teresina: Projeto Petrônio Portela,
1986.
BAPTISTA, João Gabriel. Etno-história indígena. Teresina: APL, FUNDAC;
DETRAN, 2ª edição, 2009.
BARROS, Jesualdo Cavalcante. Discurso de posse na APL. Teresina: 06/08/10.
42
CHAVES, Pe. Joaquim Raimundo Ferreira. O índio em solo piauiense. Teresina:
Artes gráficas, 1984.
DE CERTEAU, M. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1982.
______________ A Cultura no Plural. Campinas: Papirus, 1995
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. (Tomaz Tadeu da
Silva, Guaracira Lopes Louro) 3. ed. Rio de Janeiro. DP&A, 1999.
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LE GOFF, Jacques. História e Memória. 4.ed. Campinas: Unicamp, 1996.
NEVES, Abdias. O Piauí na confederação do equador. RJ: Imprensa Nacional,
1921.
NUNES, Odilon. Pesquisas para a História do Piauí. Imprensa oficial, 1965.
SHEWENNAGEN,Ludwig. Antiga história do Brasil. Imprensa oficial, 1928.
TITO FILHO, José de Arimathea. Crônicas. Sec. Estadual da Cultura, 1990.
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