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FACULDADE ESTÁCIO - FASE LUANA RÍLLAY SANTOS SOUZA A SÍNDROME DE ESTOCOLMO E SEUS REFLEXOS NO DIREITO PENAL ARACAJU/SE 2018 LUANA RÍLLARY SANTOS SOUZA A SINDROME DE ESTOCOLMO E SEUS REFLEXOS NO DIREITO PENAL Trabalho Científico apresentado à Faculdade Estácio de Sergipe, como requisito final para obtenção do Diploma de Graduação em Direito. Orientador (a): Prof.(a). Stella Luiza Moura Aranha Carneiro. ARACAJU/SE 2018 AGRADECIMENTOS A Deus; Por ter me dado força e confiança para acreditar no meu sonho, e por ter me amparado em momentos difíceis abrindo portas onde imaginei que não houvessem saídas. Sem ele nada disso seria possível. Aos Pais; A vocês, que me deram a vida e me ensinou a vivê-la com dignidade, não bastaria um obrigado. A vocês, que iluminaram os caminhos obscuros com afeto e dedicação para que eu trilhasse sem medo e cheios de esperanças, não bastaria um muito obrigado. A vocês, que se doaram inteiros e renunciaram aos seus sonhos, para que, muitas vezes, pudesse realizar o meu. Pela longa espera e compreensão durante longas viagens, não bastaria um muitíssimo obrigado. A vocês, pais por natureza, por opção e amor, não bastaria dizer, que não tenho palavras para agradecer tudo isso. Difícil não é falar muito, mas dizer tudo, mostrando o que é essencial. Alegrem-se, pois se hoje sou Lua é porque vocês sempre foram o sol da minha vida. A minha prima, que carinhosamente chamo de Lili, obrigada por ser uma das cinco pessoas com qual mais convivo, sabemos o quanto isso é importante. A minha tia Mema, pelo conforto dos seus abraços apertados que me deixam sempre melhor e pela confiança que depositou em mim. Amo vocês! A uma pessoa especial; A Rodrigo, meu namorado, por todos os “monumentos” que passamos construir juntos, e por me ajudar a sempre ser alguém melhor, me aturando nos momentos difíceis, e me ensinando com a amor a ter paciência. Aos amigos de faculdade; Aos meus amigos de faculdade que sempre alegraram minhas tardes, eu quero gritar bem alto meu agradecimento porque sempre estiveram ao meu lado e não duvidaram da minha capacidade, em tornar tudo possível. Essa vitória é nossa! Aos mestres; A todos os mestres, que me instigaram a zelar pela justiça, pela partilha de conhecimentos, e ao incentivo de sempre usar o conhecimento para o bem. Aos amigos de Estágio; Pelos amigos e colegas que construí durante meu Estagio, nos quais sempre alegraram as minhas manhãs a cada bom dia. . Dedico à minha família, por ter construído a base de princípios e valores sobre a qual estou construindo minha vida, em especial aos meus pais, e avôs pela serenidade no amor, e por darem sentido ao meu desejo em transformar o mundo em algo melhor. A Deus, por me amparar e coloca-los em minha vida. “A mais bela função da humanidade é a de administrar a justiça”. (Voltaire) RESUMO O presente trabalho tem como finalidade explanar sobre os aspectos psicológicos e a incidência dos danos psíquicos causados em vitimas que passam por momentos traumáticos durantes crimes em que sua liberdade encontra-se ameaçada, tal incidência psicológica que ocorre de forma inconsciente é definida na Psicologia como a Síndrome de Estocolmo, onde como meio de sobrevivência a vitima acaba criando laços afetivos pelo seu algoz. Diante disso serão analisados as consequências da Síndrome no âmbito jurídico, analisando seu conceito e os fatores que influenciam este fenômeno. Palavras-Chave: Psicologia Jurídica. Síndrome do Estocolmo. Direito Penal. Vitimologia. SUMÁRIO 1. Introdução; 2. Psicologia Aplicada no Direito Penal; 2.1. Vitimologia sob a ótica do Direito Penal; 2.2. A importância da Psicologia no Direito Penal; 3. Síndrome de Estocolmo; 3.1. Fenômeno que deu origem a Síndrome; 4. Efeitos do comportamento da vitima a Luz do Código Penal Brasileiro; 5. Acontecimentos que elucidam a Síndrome de Estocolmo; 5.1. Casos da Síndrome no Brasil; 5.2. A Síndrome em outros lugares; 5.3. A Síndrome na ficção; 6. Impactos da Síndrome em casos de Violência Domestica; 7. Considerações finais; 8. Referências 1 INTRODUÇÃO O estudo ora promovido é relevante na medida em que busca fazer a junção do direito com a psicologia, no intuito de demostrar o quanto essas ciências devem ser analisadas em conjunto para que assim sejam observados aspectos objetivos e subjetivos presentes em determinados crimes, transcendendo e tendo uma visão mais ampla, não se restringindo apenas ao delito, mas sim as consequências psicológicas presentes na vitima. Será abordado comportamentos encontrados em vitimas diante de crimes, onde existe certa subordinação entre o agressor e o ofendido, fazendo assim um estudo psicológico a cerca das condutas apresentadas pela vitima, onde diante de toda tensão e sofrimento psicológico tende a tomar atitudes de forma inconsciente com o intuito de se proteger de determinado perigo, tal reação é denominada de Síndrome de Estocolmo. Neste viés é importante mencionar que a Síndrome esta interligada a vários fatos ou acontecimentos, como um conjunto de sinais, que acabam por gerar sequelas psicológicas no individuo. Ademais, vale frisar que os efeitos presentes na vitima, diante de casos em que envolvam a Síndrome do Estocolmo, refletem no Direito Penal na medida em que esta deixa de promover a Ação Penal, ou não colabora com as informações necessárias durante o processo, protegendo assim o agressor. Serão também abordados acontecimentos que elucidam a Síndrome de Estocolmo que apesar de não ser muito conhecida esta presente em diversos casos publicados através da mídia. E também relacionados em casos onde há violência doméstica prevalece. Diante deste contexto, o presente trabalho tem como objetivo definir a importância da Psicologia no âmbito do Direito, em vista que o ser humano deve ser analisado não através das suas condutas, mas sim dos seus pensamentos, busca também conceituar a Síndrome do Estocolmo tendo como base autores renomados e especialistas no assunto, identificar o impacto que a Síndrome gera diante do Direito Penal, descrevendo casos reais que elucidam tal Síndrome, tal como seu impacto diante de casos relacionados à violência doméstica. A metodologia aplicada neste trabalho é de cunho bibliográfico, utilizando o método de abordagem dedutivo, pautada em doutrinas, artigos e na legislação. 2 A PSICOLOGIA APLICADA NO DIREITO PENAL “Somente quando o Direito deixar de negar que os atos e fatos objetivos passam pelo inconsciente... poderemos estar mais próximo do ideal de justiça” (Rodrigo da Cunha Pereira) O termo “psicologia” advém do grego “psyché” que significa alma, e “logos” que significa razão, etimologicamente sua junção é compreendida como “estudo da alma”, podendo também ser definida como ciência na qual examina os comportamentos humanos e processos mentais. Neste sentido, a Psicologia é uma área na qual possui várias faces, sendo uma delas definida como Psicologia Jurídica. Esta ciência tem como foco analisar o ser humano extraindo seus comportamentos diante das normas impostas, partindo de uma premissa psicológica dando atenção não apenas a infração, mas também a todas as esferas mentais do indivíduo, sendo abertos questionamentos acerca da motivação do ato. Na medida em que normas são impostas comfim de limitar certa conduta, nasce não apenas a ciência jurídica, mas também a psicológica, pois comportamentos devem ser analisados como fenômenos psicológicos para que assim ocorra a justiça de forma eficaz, com análise interligada não apenas ao fato. 2.1 VITIMOLOGIA SOB A ÓTICA DO DIREITO PENAL Ao fazer a junção entre psicologia jurídica e direito penal, deverá não apenas ser observados a conduta do agressor, mas também os comportamentos da vítima, que influenciam no decorrer do ato. A ciência responsável por analisar a vitima tendo como base a sua relação com o crime e ate mesmo com o criminoso é chamada por sua vez de vitimologia. Para que se tenha uma maior compreensão do delito, muitas vezes se faz necessário à investigação do ofendido em todas as suas feições. O poder do inconsciente é o ápice das relações interpessoais, e na sociedade hodierna a mente humana a cada dia vem se tornando algo ainda mais indecifrável e imprevisível, o que se faz necessário conhecer todo o cenário do crime, desde fato material até mesmo ao comportamento da vitima. Existem dispositivos no Código Penal (1940), que demostram a importância do comportamento do ofendido. Exemplo disso encontra-se na Parte Geral do Código Penal, Capítulo III – DA APLICAÇÃO DA PENA, em seu art. 59, caput no qual detém a seguinte redação: Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como o comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime. 2.3 A IMPORTANCIA DA PSICOLOGIA NO DIREITO PENAL “As leis nem sempre definem justiça.” (David Ben Schwantes) Sua importância é notável na medida em que parte de um pressuposto subjetivo, onde será necessário analisar não apenas a conduta, mas principalmente a sua motivação. Neste viés, será necessário abordar questionamentos tanto jurídicos como psicológicos, devendo ser observado todo aparato mental tanto do agressor como da vitima, pois o direito surge na medida em que a equidade é observada em seu aspecto subjetivo. Antes de indagar sobre a justiça em seu aspecto material devem ser levantados questionamentos acerca de todos os atos que contribuíram durante e após o crime. É de grande importância se atentar aos efeitos pelos quais o delito causou na vitima, não é adequado se prender apenas ao agressor, mas sim, dar maior atenção a quem foi agredido. Nesta linha de pensamento o foco maior será em analisar os efeitos psicológicos que são gerados na vitima, individuo que necessita de uma maior atenção, tendo em vista que foi lesado psicologicamente, lesões estas que refletem no Direito, e que precisam ser analisadas a partir de cada caso concreto, pois muitas vezes os danos psicológicos gerados em razão da lesividade do bem jurídico da vitima vão além da simples reparação do Estado que rotineiramente pune o agente isoladamente esquecendo-se de analisar e tentar minimizar os aspectos que afetam diretamente o psicológico da vítima. Portanto, não basta apenas punir o agente causador do dano, faz-se necessário uma analise individual do real potencial da lesão psicológica sofrida pela vitima, dando a esta suporte necessário para que estes danos não se perpetuem, possibilitando que a vitima retorne suas atividades com o mínimo de sequelas possível. 3 SINDROME DE ESTOCOLMO A Síndrome de Estocolmo está ligada a reações psicológicas que a vitima sofre durante o crime, em que normalmente acontece em casos de sequestro. Porém pode estar presente quando existe certa subordinação, onde o agredido se encontra em situação de perigo, dependendo da compaixão do seu agressor para que sobreviva. Esta Síndrome tem como principal característica a formação de empatia que a vitima acaba criando pelo seu algoz. Esse estado é formado inconscientemente na intenção de proteção de iminente perigo. TRINDADE (2011, p. 223), conceitua a Síndrome da seguinte maneira: Quando uma pessoa passa por uma situação extremamente crítica em que sua existência fica completamente à mercê de outra, que detém o poder de vida ou de morte sobre ela, pode-se estabelecer um tipo de relação dependente em que a vitima adere psicologicamente ao agressor. Nesses casos, pode-se estabelecer uma espécie de amor ou paixão que decorre de um processo inconsciente de preservação cujo mecanismo mais evidente se expressa pela idealização e pela identificação, notadamente pela identificação projetiva, através da quais características da vítima são projetadas no agressor, com o fim de manter o controle do outro, defender-se dele e proteger-se de um mal grave e inesperado que ele pode causar. Segundo o referido autor, para que ocorra a presença da Síndrome de Estocolmo deverão ser analisadas algumas condições, como: a) “Evento traumático (assalto, sequestro, roubo, abuso sexual, violência, acidente, catástrofe) com ameaça física ou psicológica; b) Crença de que o desfecho irá ocorrer; c) A vitima, no contexto de terror, percebe um mínimo de gesto de atenção (carinho, amabilidade, gentileza) por parte do agressor; d) Sentimento de impotência para escapar”. A Síndrome do Estocolmo pode se tornar cada vez mais expressiva devido às modalidades extremamente traumáticas de que se reveste a delinquência nos dias de hoje, sendo muito frequente os denominados sequestros relâmpagos e cárcere privado, além de outras formas de violência elaboradas em tempos de guerra e paz (TRINDADE, 2017, p. 241). Convém ressaltar, que diante da perturbação mental e do sofrimento da vitima, pequenos atos que partem do agressor são vistos como gentis, seja a permissão de ir ao banheiro, ou ate mesmo o direito a um copo de água. Quando se trata desta síndrome qualquer mínimo ato é visto pelo ofendido como gentileza, criando certo sentimento de afeto, gesto que diante da psicologia se interpreta como um “socorro” para a preservação pessoal. 3.1 FENÔMENO QUE DEU ORIGEM A SINDROME DE ESTOCOLMO Esta síndrome surgiu durante um assalto em 23 de agosto de 1973, na cidade de Estocolmo capital Sueca, onde ladrões mantiveram três mulheres e homens como reféns durante um assalto ao banco. O ato aconteceu por seis dias, tempo em que foi desenvolvido certa relação afetiva das vitimas com os seus sequestradores, relação esta que se tornou conhecida como Síndrome do Estocolmo pelo psiquiatra e criminologista Nils Bejerot. Segundo TRINDADE (2011), o fato despertou a atenção da imprensa, e no momento em que um dos reféns foi libertado, um fotógrafo surpreendeu-se ao flagrar uma das vitimas se beijando com um dos assaltantes. 4 EFEITOS DO COMPORTAMENTO DA VITIMA A LUZ DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO Na medida em que a vitima cria um sentimento de afeto pelo seu algoz, está tende a não colaborar muito durante o processo ou resgate, neste viés o legislador pátrio a luz do Código Penal Brasileiro resolveu analisar o comportamento da vitima na dosimetria da pena de acordo com o Sistema Trifásico, onde será analisado em três etapas. Sobre este Sistema, o art. 68 do Código Penal Brasileiro (1940), reforça: Art. 68: A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. A primeira fase consiste na aplicação da pena abstrata cominada pelo legislador, onde será analisada as circunstancias judiciais em cada caso. O art. 59 do Código Penal de 1940 menciona de forma expressa a importância do comportamento da vitima como critério de aplicação de pena base. Vejamos: Art. 59: O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como aocomportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Na segunda fase serão observadas as circunstâncias responsáveis por atenuar ou agravar a pena. Novamente no art. 65 o legislador demostrou a importância do estudo do comportamento da vitima de forma a beneficiar o agente, onde descreve as circunstâncias que atenuam. Analisemos: Art. 65: São circunstâncias que sempre atenuam a pena: III - ter o agente: c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima. O mencionado art. usou-se da expressão “violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima” de forma em que busca justificar e menorizar a conduta criminosa valorizando a conduta do agente que age motivado por uma injusta provocação daquele que vem a ser vitimizado. Considera-se também o comportamento da vitima como causa de diminuição de pena, no principal crime doloso contra a vida, previsto no art. 121 § 1º, sendo assim necessário analisar inteiro a conduta e a motivação do agente. Observemos: Art. 121: Matar alguém: § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Fica a critério do juiz sem parâmetros fixos, aplicar as circunstancias conforme o seu convencimento. Deve-se observar também as causas excludentes de punibilidade do agente, presentes no art. 107 do Código Pena de 1940 no qual mencionam as excludentes de punibilidade, seja “pela prescrição, decadência ou perempção; pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada”. BITENCOURT (2007, p. 489) descreve: a) Prescrição decoado o prazo que a própria lei estabelece, observadas suas causas modificadoras, prescreve o direito estatal á punição. b) Decadência: É a perda do direito de ação privada ou do direito de representação em razão de não ter sido exercido dentro do prazo legal previsto. c) Perempção é a perda do direito de prosseguir no exercício da ação penal privada isto é, uma sanção jurídica aplicada ai querelante pela inercia, ou seja, pelo mau uso da faculdade que o Poder Público lhe concedeu de agir, privativamente, na persecução de determinados crimes. Na perempção, o querelante, que já iniciou a ação de exclusiva iniciativa privada, deixa de realizar atos necessários ao seu prosseguimento, deixando de movimentar o processo, levando à presunção de desistência. A decadência e a Síndrome de Estocolmo estão vinculadas na medida em que a vitima tem a possibilidade de permanecer inerte durante o lapso temporal de 6 meses da ação Penal Privada. Isto ocorre na medida em que o ofendido ainda mantém certo laço afetivo com o agressor. Já a renúncia, de acordo ainda com BITENCOURT (2007, p. 500), é definida como: A manifestação de desinteresse de exercer o direito de queixa, que só pode ocorrer em ação de exclusiva iniciativa privada, e somente antes de inicia-la. Perdão do ofendido consiste na desistência do querelante de prosseguir na ação penal de exclusiva iniciativa privada. O perdão é ato bilateral e só se completa com sua aceitação pelo querelado. Diante disto, a renúncia ocorre quando a vitima demostra desinteresse da ação, podendo esta ocorrer de forma expressa, ou tácita. A primeira ocorre com declarações perante a autoridade, já a tácita será quando a vitima praticar atos incompatíveis com a intenção de punir. 5 ACONTECIMENTOS QUE ELUCIDAM A SINDROME DE ESTOCOLMO 5.1 CASOS DA SINDROME NO BRASIL Um dos casos que ganhou os noticiários gira em torno de Patrícia Abravanel filha de Silvio Santos. Em agosto de 2001, aos 24 anos, a mesma foi sequestrada em São Paulo, sendo mantida em cativeiro por uma semana, neste período foi exigido pelos sequestradores certa quantia em dinheiro em troca de sua liberdade. Após o resgate, Patrícia surpreende a todos com suas declarações a respeito do evento traumático, mostrando que foram criados durante o sequestro laços afetivos. Tais revelações foram descritas por alguns especialistas como Síndrome do Estocolmo. Uma matéria relacionada ao fato e sua ligação com a Síndrome foi feita pelo Jornal Nacional em 29 de agosto de 2001, descreve: As declarações de Patrícia Abravanel sobre as pessoas que a sequestraram foram interpretadas por especialistas como a reação típica de vítimas de um grande trauma. Ela escapou do pior, mas depois de sete dias nas mãos de bandidos, não criticou os sequestradores. Pelo contrário: “Me alimentaram, me levaram chá, me levaram pipoca". A alegria da vítima às vezes esconde sintomas mais profundos - aquilo que os especialistas chamam de Síndrome de Estocolmo. Ainda durante a matéria a Doutora Isa Kabacznik especialista em pessoas que sofreram traumas, discorre: "Ela criou um vínculo com o sequestrador que é fora da realidade. O sequestrador não foi bonzinho com ela, ele sequestrou, ele prendeu, amarrou, deu as mínimas condições de vida, ir no banheiro, dar um chá. Ele tinha o poder de vida ou morte e só deixou viver por alguma razão, seja financeira ou medo de ser preso". Como outros que sofreram violências, Patrícia provavelmente precisará de ajuda profissional: "Passada a euforia, depois de algum tempo, eles passam por uma fase depressiva, e aí o tratamento psicoterápico, o apoio psicológico é muito importante. Na verdade o sequestro ficou como uma coisa mais distante, ainda não está muito clara para ela. É como se tivesse uma cortina que ainda não foi desvendada. Pelo menos é essa a impressão que está dando". 5.2 A SINDROME EM OUTROS LUGARES Natascha Kupush, em 1998, aos 10 anos de idade foi sequestrada durante o percurso até a Escola na Áustria, e só foi encontrada após 8 anos. Este acontecimento houve grande repercussão da mídia, sendo objeto do filme e livro “3096 DIAS”. A vítima sofria agressões físicas e psicológicas constantemente, e vivia de forma precária em uma cela de 54 m², sem janelas e a prova de som, com tratamento degradante, sendo obrigada a realizar atividades domésticas. Em 23 de agosto de 2006, por um descuido do agressor, Natascha consegue fugir. A síndrome foi identificada após o Suicídio do agressor, onde Natascha se comove com o ocorrido. A mesma discorre: “Eu senti uma grande pena por ele, por ter achado vantajoso prender uma pessoa mais fraca para que dessa maneira concretizasse os seus sonhos”. 5.3. A SÍNDROME NA FICÇÃO Esta Síndrome também esta presente em literaturas, exemplo disso advém do conto “A Bela e a Fera”, narrativa esta que gira em torno de uma donzela na qual mantinha um relacionamento abusivo, sendo mantida em cativeiro. Durante este evento traumático criou-se de forma inconsciente certa empatia, na qual a vítima (Bela) passa a ver seu agressor (Fera), como seu amigo e protetor. Ao final da história, ambos acabam criando um sentimento de afeto e se casam. 6 IMPACTO DA SÍNDROME EM CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA É de grande importância debater o efeito da Síndrome do Estocolmo e seu impacto em casos de violência doméstica, pois são incontáveis as mulheres que sofrem com essa realidade. Inúmeros são os anúncios, palestras ou eventos que incentivam em agir em prol do seu bem estar, denunciando seus agressores, porém como aconselhar sem se postar psicologicamente diante da situação? É notável a suposta existência da violência doméstica, porém seus efeitos psicológicos são de suma importância e devem ser debatidos. Não se trata apenas do corpo, mas sim também de alma. Em relacionamentos abusivos pequenos atos de afeto por parte do agressor, são vistos pelas mulheres como esperança de uma futura mudança, e em cada pequena gentileza existe a utopiade um provável relacionamento sereno, onde o amor não deixe espaço para tantas agressões. Assim muitas mulheres se prendem e assim acabam por não denunciar. O trauma psicológico pode ser tão intenso, que muitas se culpam por serem agredidas, começam a se pôr no lugar do agressor, aceitando e concordando com suas atitudes, e com ego inflamado através do sentimento da culpa começam a analisar os fatos de acordo com o ponto de vista do agressor tendo isto como meio de sobrevivência. Destaca José Barroso Filho em seu artigo publicado em 17 de marco de 2018 que “na medida em que essa mulher fica isolada, sem alguém que possa ajudá-la a entender o que está acontecendo nem garantir-lhe a segurança de que precisa, ela passa a se adaptar a essa situação, para manter um bom relacionamento com o agressor. Tal é a desesperança que busca segurança no próprio agressor”. 6.1 LEI MARIA DA PENHA Não se pode abordar tal temática sem fazer referencia sobre a Lei 11.340 (7 de Agosto de 2006), conhecida popularmente como Lei Maria da Penha. Esta lei foi criada através de um acontecimento real, onde Maria da Penha sofria violência doméstica praticada por seu ex-marido, a mesma foi vitima de duas tentativas de homicídio. Nesse aspecto essa Lei foi de grande importância na medida em que resguardava direitos e protegia as mulheres nas quais passavam pela mesma situação. Vejamos a art. 2º da referida lei: Art. 2o Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo- lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. Convém ressaltar, a inefetividade presente nesta lei, em que nem sempre será aplicado ao caso concreto de forma pragmática, pois muitas são as mulheres que renunciam o direito de queixa por medo de que algo maior lhe venha acontecer, ou ate mesmo na esperança de que as agressões tenham fim, sendo restruturada a família. Assim, TRINDADE (2011, p. 227) destaca: A assistência policial poderá ser preventiva, isto é, atuante na “iminência” da agressão, ou repressiva. As diretrizes baseiam-se numa autoridade policial mais participativa, protetiva e zelosa no atendimento á vitima. Esses cuidados foram incluídos porque a pratica demostrou que muitas mulheres não denunciam as agressões por medo de vingança do agressor contra si ou contra os filhos. Não raro, também, quando registram a ocorrências, as mulheres retornam a sua residência, pois não tem outro local para irem. Ali se submetem novamente ao ambiente agressivo e comumente são vitimas de novas agressões. Por isso, também é corriqueiro não parecerem as audiências no JECrim, forçando o Ministério Publico a pedir o arquivamento dos processos criminais. Caso a vitima ofereça a queixa, ainda terá a possibilidade de renunciar seu direito, oportunidade descrita no art. 16 da Lei 11.340/06, vejamos: Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público. Portanto, desde que admitida perante o juiz em audiência especialmente designada para esse fim, ouvido o Ministério Publico e antes do recebimento da denúncia a renuncia poderá ocorrer. Ainda sobre o tema posiciona-se Dias (2007, p 105) que “estar nas mãos da vitima a faculdade de suspender o inquérito policial colocando-a em situação privilegiada. Há verdadeira inversão de papeis. Assim terá mais facilidade para obter sucesso na conciliação, com maiores chances do agressor aceitar os termos que lhe são propostos para evitar o prosseguimento da ação penal.” Com isso mostra-se a importância em explanar este tema tendo em vista que são inúmeras as mulheres que acabam por sofrer desse mal, tendo como consequências danos psíquicos que influenciam no decorrer da ação penal, na medida em que acabam por renunciar seus direitos na intenção de proteger seu algoz. 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho possibilitou fazer uma análise a cerca das consequências psicológicas que surgem de forma inconsciente em vitimas que passam grandes tensões em determinados crimes, onde o agressor mantém o poder sobre sua sobrevivência. É com base neste contexto de aflição em decorrência do medo, e do desespero pela sobrevivência, que advém a Síndrome do Estocolmo, fazendo com que o individuo construa grande conexão e sentimentos de afeto pelo seu algoz. Dada à importância desse assunto, torna-se necessário avaliar em cada caso concreto as circunstancias e distúrbios psicológicos que foram refletidos na vitima durante todo o trauma, fazendo assim a menção de como os reflexos desta Síndrome influenciam no Direito Penal. Neste viés, convém ressaltar que deverão ser abordados estudos vitimológicos, com intuito de identificar a conduta da vitima, e quais são as consequências que acabam por influenciar de certa forma na ação criminosa e no decorrer do processo. Nem sempre apenas quem detém o poder de influenciar na situação é o criminoso, mas a vitima pode no decorrer do crime ser influenciada por atitudes que servem de estratégia de sobrevivência criada pelo inconsciente. Com isso, verifica-se a importância da junção do Direito com a Psicologia, na medida em que deverá ser levantado questionamento a cerca não somente da agressão, mas sim ao estudo da manifestação do inconsciente, que influenciam de maneira direta na prática delitiva. REFERÊNCIAS BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 11. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. Vol. 1. DIAS, M.B. Manual de Direito das Familias. 4ª ed. Ver, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais 2007. GLOBO.COM. Disponivel em <http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL537596-10406,00- A+EXPLICACAO+MEDICA+PARA+O+ELOGIO+DE+PATRICIA+AOS+CRIMINOSO S.html> Acessado em: 29 de Ago 2018. BARROSO, José. Disponivel em <http://www.cnj.jus.br/agencia-cnj-de- noticias/artigos/13325-o-perverso-ciclo-da-violia-domica-contra-a-mulher-afronta-a- dignidade-de-todos-n> Acessado em: 29 de Ago de 2018. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponivel em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acessado em: 02 de Nov de 2018. TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia jurídica para operadores do direito. 5º. Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2011. http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL537596-10406,00-A+EXPLICACAO+MEDICA+PARA+O+ELOGIO+DE+PATRICIA+AOS+CRIMINOSOS.html http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL537596-10406,00-A+EXPLICACAO+MEDICA+PARA+O+ELOGIO+DE+PATRICIA+AOS+CRIMINOSOS.html http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL537596-10406,00-A+EXPLICACAO+MEDICA+PARA+O+ELOGIO+DE+PATRICIA+AOS+CRIMINOSOS.html http://www.cnj.jus.br/agencia-cnj-de-noticias/artigos/13325-o-perverso-ciclo-da-violia-domica-contra-a-mulher-afronta-a-dignidade-de-todos-n http://www.cnj.jus.br/agencia-cnj-de-noticias/artigos/13325-o-perverso-ciclo-da-violia-domica-contra-a-mulher-afronta-a-dignidade-de-todos-n http://www.cnj.jus.br/agencia-cnj-de-noticias/artigos/13325-o-perverso-ciclo-da-violia-domica-contra-a-mulher-afronta-a-dignidade-de-todos-n http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/DEL%202.848-1940?OpenDocument http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm
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