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2013 POLÍTICAS PÚBLICAS AMBIENTAIS Prof.ª Luciana Borba Benetti Prof.ª Francieli Stano Torres Copyright © UNIASSELVI 2013 Elaboração: Prof.ª Luciana Borba Benetti Prof.ª Francieli Stano Torres Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: 363.7 B465p Benetti, Luciana Borba Políticas públicas ambientais / Luciana Borba Benetti; Francieli Stano Torres. Indaial : Uniasselvi, 2013. 192 p. : il ISBN 978-85-7830-685-4 1.Proteção Ambiental. 2. Desenvolvimento sustentável. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. III ApresentAção Prezado acadêmico! Iniciaremos, agora, o estudo das Políticas Públicas Ambientais. Trata- se de um dos principais temas da atualidade. Será, sem dúvida, de grande valia para a formação acadêmica global, pois trataremos do ambiente numa visão integral, isto é, considerando todos os seus elementos. Pensar em políticas públicas, de uma forma geral, significa pensar em instituições de uma sociedade, ou ainda, significa pressupor a existência de um interesse comum, que consolide e justifique a existência dessas instituições. Maximizar o bem-estar social requer a elaboração de planos gestores que visem à mitigação de conflitos e obtenção de ganhos, o que resultará no alcance do interesse comum. Caberá sempre ao Estado se empenhar para alcançar os fins da sociedade, sejam eles no âmbito da educação, da ordem social ou da conservação do meio ambiente. Considerando que o ser humano é um ser de ação e relação e não pode ser percebido fora de suas relações com os outros e com o mundo, ele é capaz de se transformar e de transformar a sua realidade. Dentro desta visão, as políticas públicas ambientais devem ser baseadas, principalmente, na participação popular, que resgata os valores humanos como: a solidariedade, a ética, a responsabilidade, a honestidade, a democracia, entre outros. A tarefa da descoberta dos valores e da busca de novos valores, que tornem a sociedade humana mais justa, é de todos. Assim sendo, um dos principais objetivos deste caderno sobre Políticas Públicas Ambientais consiste em permitir que o ser humano compreenda a natureza complexa do meio ambiente, resultante de suas interações, levando-o a promover uma ação reflexiva e prudente sobre os recursos naturais, satisfazendo as presentes e futuras gerações. As atividades sensibilizadoras despertam emoções que visam ao melhor aproveitamento da informação que está sendo transmitida, sendo um processo não terapêutico, mas educativo. Portanto, mãos à obra! Professora Luciana Borba Benetti Professora Francieli Stano Torres IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA V VI VII UNIDADE 1 – AS POLÍTICAS PÚBLICAS ........................................................................................ 1 TÓPICO 1 – POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO ................................. 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 SURGIMENTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................................... 3 3 COMO PODEMOS DEFINIR POLÍTICAS PÚBLICAS? .............................................................. 4 4 TIPOLOGIAS DE POLÍTICA PÚBLICA ......................................................................................... 7 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 12 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 16 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 17 TÓPICO 2 – FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS ............................ 19 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 19 2 FASES DE FORMULAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS ......................................................... 19 3 AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ...................................................................................... 22 3.1 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO ........................................................................................................ 22 3.2 INDICADORES DE AVALIAÇÃO ................................................................................................ 24 4 O QUE DEVEMOS AVALIAR E ANALISAR NOS PROGRAMAS? ........................................ 26 5 TIPOS DE AVALIADORES ................................................................................................................ 30 6 ESTUDO DE CASO .............................................................................................................................. 32 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 44 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 45 TÓPICO 3 – ATORES DO PROCESSO DE FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS................................................................................................... 47 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 47 2 ATORES DE POLÍTICAS PÚBLICAS .............................................................................................. 47 2.1 ATORES ESTATAIS .......................................................................................................................... 48 2.2 ATORES PRIVADOS ........................................................................................................................ 49 2.3 EXEMPLIFICANDO A PARTICIPAÇÃO DOS ATORES ........................................................... 49 3 VOCÊ É UM ATOR E PODE PARTICIPAR .................................................................................... 52 3.1 CONSELHO MUNICIPAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................53 3.2 TIPOS DE CONSELHOS ................................................................................................................. 54 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 58 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 61 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 62 UNIDADE 2 – POLÍTICA PÚBLICA AMBIENTAL BRASILEIRA ............................................... 63 TÓPICO 1 – A EVOLUÇÃO E OS PRINCÍPIOS DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA ............................................................................................ 65 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 65 2 MARCOS DA EVOLUÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS AMBIENTAIS NO BRASIL ............................................................................................................... 65 sumário VIII 3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS ....................................................................................................... 67 3.1 PRINCÍPIO DO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO COMO DIREITO FUNDAMENTAL DA PESSOA HUMANA ................................................. 68 3.2 PRINCÍPIO DA NATUREZA PÚBLICA DA PROTEÇÃO AMBIENTAL ............................... 68 3.3 PRINCÍPIO DO CONTROLE DO POLUIDOR PELO PODER PÚBLICO .............................. 69 3.4 PRINCÍPIO DA CONSIDERAÇÃO DA VARIÁVEL AMBIENTAL NO PROCESSO DECISÓRIO DE POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO ............................ 69 3.5 PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA .................................................................. 70 3.6 PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR .................................................................................... 70 3.7 PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO ...................................................................................................... 71 3.8 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE ................................... 71 3.9 PRINCÍPIO DO DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................................ 72 3.10 PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO ENTRE OS POVOS ............................................................. 72 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 73 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 79 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 80 TÓPICO 2 – TUTELA CONSTITUCIONAL DO AMBIENTE ........................................................ 81 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 81 2 CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS E O TEMA AMBIENTAL ..................................................... 82 3 MEIO AMBIENTE COMO BEM JURÍDICO .................................................................................. 84 4 DEVERES ESPECÍFICOS DO PODER PÚBLICO ......................................................................... 87 5 O DIREITO ADQUIRIDO EM MATÉRIA AMBIENTAL ............................................................ 88 6 REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS: ADMINISTRATIVA E LEGISLATIVA ....................... 89 6.1 COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA OU COMUM ................................................................. 90 6.2 COMPETÊNCIA LEGISLATIVA ................................................................................................... 91 7 PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA NA TUTELA DO AMBIENTE ........................................... 92 8 O PAPEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DO PODER JUDICIÁRIO ........................................ 93 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 95 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................100 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................102 TÓPICO 3 – POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE – PNMA ....................................103 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................103 2 PRINCÍPIOS ........................................................................................................................................105 3 OBJETIVOS .........................................................................................................................................106 4 DIRETRIZES ........................................................................................................................................107 5 INSTRUMENTOS ..............................................................................................................................108 5.1 INSTRUMENTOS DE COMANDO E CONTROLE - ICC .......................................................109 5.2 INSTRUMENTOS DE MERCADO – IM ....................................................................................111 6 SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE – SISNAMA ...................................................115 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................119 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................121 UNIDADE 3 – INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL..............................................123 TÓPICO 1 – INSTRUMENTOS DA POLÍTICA NACIONAL DE MEIO AMBIENTE ............125 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................125 2 PADRÕES DE QUALIDADE AMBIENTAL..................................................................................125 3 ZONEAMENTO AMBIENTAL ........................................................................................................129 4 AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL ..................................................................................130 4.1 ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL - EIA ............................................................................132 IX 4.1.1 Requisitos técnicos ...............................................................................................................133 4.1.2 Requisitos formais ................................................................................................................134 5 LICENCIAMENTO AMBIENTAL ...................................................................................................136 5.1 ITINERÁRIO PARA O LICENCIAMENTO ...............................................................................138 6 IMPLANTAÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ..........................................................138 6.1 UNIDADES DE PROTEÇÃO INTEGRAL .................................................................................140 6.2 UNIDADES DE USO SUSTENTÁVEL .......................................................................................142 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................145 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................147 TÓPICO 2 – POLÍTICA NACIONAL DOS RECURSOSHÍDRICOS - PNRH .........................149 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................149 2 HISTÓRICO .........................................................................................................................................150 3 O CÓDIGO DAS ÁGUAS ................................................................................................................151 4 OBJETIVOS DA PNRH .....................................................................................................................153 5 FUNDAMENTOS E DIRETRIZES DA PNRH ..............................................................................154 6 INSTRUMENTOS DAS PNRH........................................................................................................155 6.1 PLANOS DE RECURSOS HÍDRICOS ........................................................................................156 6.2 ENQUADRAMENTO DOS CORPOS D’ÁGUA .......................................................................156 6.3 OUTORGA DE DIREITOS DE USO DE RECURSOS HÍDRICOS ..........................................157 6.4 A COBRANÇA PELO USO DE RECURSOS HÍDRICOS .........................................................158 6.5 SISTEMA DE INFORMAÇÕES SOBRE RECURSOS HÍDRICOS ...........................................159 7 GERENCIAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS ...................................................................159 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................161 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................167 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................169 TÓPICO 3 – ESTATUTO DAS CIDADES.........................................................................................171 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................171 2 HISTÓRICO .........................................................................................................................................171 3 DIRETRIZES E OBJETIVOS ............................................................................................................173 4 INSTRUMENTOS DE POLÍTICAS URBANAS ...........................................................................176 5 PLANO DIRETOR E GESTÃO DEMOCRÁTICA .......................................................................177 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................178 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................184 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................185 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................187 X 1 UNIDADE 1 AS POLÍTICAS PÚBLICAS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade, você estará apto: • conhecer o processo de surgimento das políticas públicas; • reconhecer as tipologias de políticas públicas; • entender como se formula uma política pública; • identificar suas fases e seus critérios de avaliação; • definir os elementos necessários para avaliar programas originários de políticas públicas; • identificar os atores do processo de formulação de políticas públicas. Esta primeira unidade está dividida em três tópicos. Você encontrará, no final de cada um deles, atividades que contribuirão para a compreensão dos conteúdos explorados. TÓPICO 1 – POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO TÓPICO 2 – FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS TÓPICO 3 – ATORES DO PROCESSO DE FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO 1 INTRODUÇÃO As políticas públicas ganham espaço a partir dos anos 50 e desse período em diante registraram o ressurgimento da importância desse campo de conhecimento denominado políticas públicas, bem como das instituições e das regras e modelos que regem sua decisão, elaboração, implementação e avaliação. Diversos foram os fatores que contribuíram para sua expansão e desdobramento em planos, programas, projetos e pesquisas, fazendo parte da agenda de muitos países. É nesse contexto que estudaremos a partir desse tópico, conhecendo o surgimento das políticas públicas, conceitos e ideologias de seus fundadores, os formatos das tipologias, bem como, as tipologias existentes de políticas públicas e suas características dentro do processo de decisão. Vamos lá? 2 SURGIMENTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS As pesquisas em políticas públicas começaram a se estabelecer no início dos anos 1950, nos Estados Unidos, com a expressão “policy science”. Enquanto na Europa, especialmente na Alemanha, as pesquisas voltadas para esse campo tomaram força a partir do início dos anos 1970, quando surgiu como desdobramento dos trabalhos baseados em teorias explicativas sobre o papel do Estado e de uma das mais importantes instituições do Estado – o governo – principal agente indutor e produtor de políticas públicas. UNI A política pública, como ferramenta das decisões do governo, é produto da Guerra Fria e da valorização da tecnocracia como forma de enfrentar suas consequências (SOUZA, 2006). UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 4 No contexto histórico, podemos elencar os principais fundadores da área de políticas públicas e a abordagem de pesquisa desenvolvida, ou seja, a contribuição desses pesquisadores para o surgimento das mesmas (SOUZA, 2006): • Laswell (1936): introduziu o conceito de análise de política pública (policy analysis), como forma de conciliar conhecimento científico e acadêmico com a produção empírica dos governos e também como forma de estabelecer o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo. • Simon (1957): introduziu o conceito de racionalidade limitada dos decisores públicos (policy makers), argumentando, todavia, que a limitação da racionalidade poderia ser minimizada pelo conhecimento racional. • Lindblom (1959; 1979): propôs a incorporação de outras variáveis à formulação e à análise de políticas públicas, tais como as relações de poder e a integração entre as diferentes fases do processo decisório. • Easton (1965) contribuiu para a área ao definir a política pública como um sistema, ou seja, como uma relação entre formulação, resultados e o ambiente. Para esse pesquisador, as políticas públicas recebem inputs dos partidos, da mídia e dos grupos de interesse, que influenciam seus resultados e efeitos. Você conheceu até aqui um breve histórico dos motivos da expansão das políticas públicas no Brasil. O que se tem visto nos últimos anos é um crescimento dos estudos da área de políticas públicas no Brasil (ARRETCHE, 2003; SOUZA, 2003). Conforme Arretche (2003), multiplicaram-se as dissertações e teses com o aprofundamento de temas relacionados às políticas governamentais; disciplinas de políticas públicas foram criadas ou inseridas nos programas de graduação e pós-graduação; linhas de pesquisa e agências de fomento foram criadas especialmente voltadas para essa área. Você pode notar que as políticas públicas ganharam espaço e aprofundamento. Mais adiante vamos conhecer como e quais foram as políticas públicas pensadas e construídas voltadas ao meio ambiente, foco desse Caderno de Estudo. Mas antes de aprofundarmos sobre as Políticas Públicas Ambientais, deve-se perguntar o que são políticas públicas. Vamos avançar nesse contexto a partir do próximo item.3 COMO PODEMOS DEFINIR POLÍTICAS PÚBLICAS? Existem distintas abordagens voltadas às políticas públicas, logo defini- las torna-se complexo, uma vez que cada pesquisador incorpora diferentes ideologias para seu processo de desenvolvimento e entendimento. Desta forma, se faz importante conhecer as diferentes definições e refletir sobre o contexto em que se pretende aplicá-las. TÓPICO 1 | POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO 5 Assim, temos Mead (1995) que as define como um campo dentro do estudo da política que analisam o governo à luz de grandes questões públicas. Lynn (1980) as define como um conjunto de ações do governo que irão produzir efeitos específicos. Peters (1986) segue o mesmo veio: política pública é a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos. Dye (1984) sintetiza a definição de política pública como “o que o governo escolhe fazer ou não fazer”. Höfling (2001) define como formas de interferência do Estado, visando à manutenção das relações sociais de determinada formação social e Jobert e Muller (1987) como o ‘Estado em ação’. Outras definições enfatizam o papel da política pública na solução de problemas. Entretanto, um dos aspectos críticos dessas definições está voltado ao processo de que superestimam aspectos racionais e procedimentais das políticas públicas. Isso remete ao argumento de que elas ignoram a essência da política pública: a luta em torno de ideias e interesses. Pode-se também acrescentar que, por concentrarem o foco no papel dos governos, essas definições deixam de lado o seu aspecto conflituoso e os limites que cercam as decisões dos governos. Deixam ainda de lado a possibilidade de cooperação que podem existir entre os governos, instituições e grupos sociais (SOUZA, 2006). No entanto, as definições de políticas públicas, mesmo aquelas um tanto quanto reducionistas, guiam o nosso olhar, focalizando-o no entorno onde a luta por interesses, preferências e ideias se desenvolvem, isto é, os governos. Apesar de optar por abordagens diferentes, as definições de políticas públicas assumem, em geral, uma visão holística, uma perspectiva de que o todo é mais importante do que a soma das partes. Além do mais, assume que os indivíduos, instituições, interações, ideologia e interesses contam, mesmo que existam diferenças sobre a importância relativa destes fatores (SOUZA, 2006). Assim, do ponto de vista teórico-conceitual, a política pública em geral está inserida no campo multidisciplinar, tendo um foco central as explicações sobre a natureza da política pública e seus processos. Visto dessa forma, a teoria geral da política pública implica a busca de sintetizar teorias construídas no campo da sociologia, da ciência política e da economia. As políticas públicas repercutem de várias formas sobre a economia e nas sociedades, logo se tem a explicação do por que qualquer teoria da política pública precisa também explicar as inter- relações existentes entre Estado, política, economia e sociedade. Por essa razão, pesquisadores de tantas disciplinas – economia, ciência política, sociologia, antropologia, geografia, planejamento, gestão e ciências sociais aplicadas – partilham um interesse comum na área e têm contribuído para avanços teóricos e empíricos (SOUZA, 2006). UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 6 UNI Diante dos conceitos vistos, em suma, podemos definir as políticas públicas como o campo do conhecimento que coloca o governo em ação, ou ainda, analisa essa ação e, quando necessário, propõe alterações na trajetória dessas ações. É importante destacar ainda que as políticas públicas correspondem a cursos de ação e fluxos de informação relacionados a um objetivo público definido de forma democrática e com frequente participação da comunidade e setor privado (figura a seguir) (BESEN, 2006). FIGURA 1 – CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS SE DÁ PELA PARTICIPAÇÃO E AÇÃO FONTE: <http://oglobo.globo.com/blogs/arquivos_upload/2008/12/138_155- justi%C3%A7arestaurativa.jpg>. Acesso em: 8 fev. 2013. Depois de desenhadas e formuladas, as políticas públicas se desdobram em planos, programas, projetos, bases de dados ou sistema de informação e pesquisas (Figura 2). Quando postas em ação, são implementadas, ficando daí submetidas a sistemas de acompanhamento e avaliação (SOUZA, 2006). FIGURA 2 – DESDOBRAMENTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DEPOIS DE FORMULADAS Políticas Públicas desdobram em: Base de Dados Planos Programas Projetos Pesquisa FONTE: As autoras TÓPICO 1 | POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO 7 UNI A idealização de políticas públicas que não partem do compartilhar interesses comuns, “fazendo com” e não apenas “para” a pessoa atendida, ajudando-a a reconhecer e tornar mais fácil a realização do seu desejo, tenderá a ser ineficaz (SAWAYA, 2006). Com o intuito de avançar no entendimento sobre políticas públicas, vamos conhecer as tipologias existentes nesse campo. 4 TIPOLOGIAS DE POLÍTICA PÚBLICA Com a ideologia “política pública faz a política”, Theodor Lowi (1964; 1972) desenvolveu a talvez mais conhecida tipologia sobre política pública, na qual revela que cada tipo de política pública vai encontrar diferentes formas de apoio e de rejeição e que disputas em torno de sua decisão passam por arenas diferenciadas (SOUZA, 2006). Dessa forma, a tipologia pode assumir quatro formatos (Figura a seguir): FIGURA 3 – FORMATO DAS TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS Políticas distributivas Políticas regulatórias Políticas constitutivas Políticas redistributivas Formato das tipologias FONTE: As autoras Mas o que representa cada formato de tipologias no contexto das políticas públicas? Vamos ver cada uma delas (AZEVEDO, 1991): • Políticas distributivas: representam decisões tomadas pelo governo que desconsideram a questão dos recursos limitados, gerando impactos mais individuais do que universais. As políticas distributivas são o tipo de política majoritário no Brasil e grande parte das políticas desenvolvidas pelo Poder Legislativo tem caráter distributivo. • Políticas regulatórias: representam ações mais visíveis ao público, envolvendo burocracia e grupos de interesse. A política regulatória se refere à legislação e UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 8 é um instrumento que permite regular (normatizar) a aplicação de políticas redistributivas e distributivas. As políticas regulatórias se diferenciam por atingirem as pessoas enquanto indivíduos ou pequenos grupos, e não grandes grupos sociais ou membros de uma classe. • Políticas redistributivas: representam ações que visam atingir maior número de pessoas, de forma que impõem perdas concretas e ganhos incertos para diferentes grupos sociais. Em geral, são as políticas sociais universais, de sistema tributário e de sistema previdenciário. Essas são garantidas por programas governamentais e/ou por projetos de lei, e percebidas pelos beneficiários como direitos sociais. As políticas redistributivas têm efeitos de longo prazo e, em geral, não trazem benefícios imediatos, já que precisam ser implementadas. • Políticas constitutivas: representam ações que lidam com procedimentos de caráter obrigatório. Cada uma dessas políticas públicas vai gerar pontos ou grupos de vetos e de apoios diferentes, processando-se, portanto, dentro do sistema político de forma também diferente. Nesse formato, as políticas públicas se desdobram em uma série de tipologias com características diferentes, que variam conforme o interesse dos envolvidos e o processo de construção. Assim iremos estudar as tipologias elencadas na figura a seguir. FIGURA 4 – TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS Ciclo deliberativo: a política pública passa por várias etapas: definições de agenda, identificação de alternativas, avaliação e seleção das opções, implementação e avaliação. Garbage can ou "lata de lixo": escolhas de políticas públicas são realizadas como se as alternativas estivessemem uma "lata de lixo", ou seja, com base na tentativa e erro. Coalizão de defesa: concebida como um conjunto de subsistemas relativamente estáveis, que se articulam com os acontecimentos externos. Incrementalismo: processo incremental em que recursos governamentais para um programa, não partem do zero e sim, de decisões marginais e incrementais. TÓPICO 1 | POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO 9 Arenas sociais: tipologia que trabalha com diagnósticos da realidade das comunidades, o que possibilita a elaboração de políticas públicas voltadas ao contexto real. Equilíbrio interrompido: concebida com base em subsistemas que permitem ao sistema político-decisório processar as questões de forma paralela, fazendo mudanças a partir da experiência de implementação e de avaliação. FONTE: As autoras Vamos estudar a base conceitual e a visão de cada uma dessas tipologias das políticas públicas no processo de tomada de decisão. Vejamos o que Souza (2006) nos apresenta com relação a essas tipologias. Na tipologia do incrementalismo a base das pesquisas é um tanto quanto empírica, uma vez que partem do contexto de que recursos governamentais para um programa, órgão ou uma dada política pública não partem do zero. Isso quer dizer que as decisões são tomadas sem considerar as mudanças políticas ou mudanças substantivas nos programas públicos. Portanto, considera-se que as decisões dos governos seriam somente incrementais e pouco substantivas. Por meio do incrementalismo que se tem a visão de que decisões tomadas no passado constrangem decisões futuras e limitam a capacidade dos governos de adotar novas políticas públicas ou de reverter a trajetória das políticas atuais. Na tipologia de ciclo deliberativo, a política pública passa por várias etapas, o que lhe confere um processo de aprendizado. O ciclo da política pública se dá pelas seguintes etapas: definição de agenda, identificação de alternativas, avaliação das opções, seleção das opções, implementação e avaliação. Dentre essas etapas, a definição de agenda é uma das mais importantes, já que algumas questões entram na agenda política, enquanto outras são ignoradas. Logo, quando o início da política pública ocorre na política, o consenso é construído, geralmente, por barganha. Entretanto, quando o início da política pública se encontra no problema a ser enfrentado, ocorre a persuasão para a construção do consenso. Há, ainda, outro ponto importante, que é o foco nos participantes, que podem ser classificados como visíveis (políticos, mídia, partidos, grupos de pressão, entre outros) e invisíveis (acadêmicos e burocracia). Dentro dessa perspectiva os participantes visíveis definem a agenda e os invisíveis, as alternativas. Na tipologia garbage can ou “lata de lixo”, as escolhas de políticas públicas são realizadas como se as alternativas estivessem em uma “lata de lixo” (SOUZA, 2006). O que isso significa? Significa que há muitos problemas e poucas soluções, e que as soluções não seriam devidamente analisadas. Essa tipologia considera que as organizações compõem um conjunto de ideias de pouca consistência, trabalhando em um sistema de tentativa e erro. Isso, porque, as soluções é que UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 10 procuram por problemas. As escolhas compõem um garbage can nos quais vários tipos de problemas e soluções são colocados pelos participantes à medida que eles aparecem. Na tipologia da coalizão de defesa, a política pública deveria ser concebida como um conjunto de subsistemas relativamente estáveis. Esses subsistemas passariam a se articular com os acontecimentos externos, parâmetros então coletados para base dos constrangimentos e os recursos de cada política pública. Logo, esta tipologia não vai ao encontro do contexto da política pública trazida pelo ciclo da política e pelo garbage can, uma vez que as consideram com escassa capacidade explicativa sobre por que mudanças ocorrem nas políticas públicas. Na tipologia das arenas sociais, a política pública se dá como uma iniciativa dos chamados empreendedores políticos. Isto ocorre, já que para que uma determinada circunstância se transforme em um problema, é preciso que as pessoas se convençam de que alguma coisa deve ser feita para solucionar o problema. Essa tipologia busca diagnosticar a realidade das comunidades, levantando os problemas e então permitindo que as políticas públicas sejam elaboradas conforme a realidade da sociedade. Nesse processo há três mecanismos que servem para chamar a atenção dos decisores e formuladores de políticas públicas: a) divulgação de indicadores que expõem a dimensão do problema; b) eventos tais como desastres ou repetição continuada do mesmo problema; c) feedback, ou informações que mostram as falhas da política atual. Já, a última tipologia que iremos estudar tem base em noções de biologia e computação, sendo essa a chamada tipologia de equilíbrio interrompido. “Da biologia veio a noção de “equilíbrio interrompido”, isto é, a política pública se caracteriza por longos períodos de estabilidade, interrompidos por períodos de instabilidade que geram mudanças nas políticas anteriores. Da computação vem a noção de que os seres humanos têm capacidade limitada de processar informação, daí por que as questões se processam paralelamente e não, de forma serial, ou seja, uma de cada vez” (SOUZA, 2006). São os subsistemas de uma política pública que permitem ao sistema político-decisório conferir as questões de forma paralela, e assim fazer mudanças conforme a experiência do processo de implementação e avaliação. Logo, uma mudança em série e mais profunda somente se dará em períodos de instabilidade. Das diversas definições e modelos sobre políticas públicas, podemos extrair e sintetizar seus elementos principais, conforme identificado por Souza (2006, p. 36): • A política pública permite distinguir entre o que o governo pretende fazer e o que, de fato, faz. • A política pública envolve vários atores e níveis de decisão, embora seja materializada através dos governos, e não necessariamente se restringe a participantes formais, já que os informais são também importantes. TÓPICO 1 | POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO 11 • A política pública é abrangente e não se limita a leis e regras. • A política pública é uma ação intencional, com objetivos a serem alcançados. • A política pública, embora tenha impactos no curto prazo, é uma política de longo prazo. • A política pública envolve processos subsequentes após sua decisão e proposição, ou seja, implica também implementação, execução e avaliação. UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 12 ESTADO E GOVERNO: DIFERENÇA CONCEITUAL E IMPLICAÇÕES PRÁTICAS NA PÓS-MODERNIDADE Manoel Ilson Cordeiro Rocha Resumo É comum e indevido confundir o Estado com o governo. O Estado é toda a sociedade política, incluindo o governo. O governo é principalmente identificado pelo grupo político que está no comando de um Estado. O Estado possui as funções executiva, legislativa e judiciária. O governo, dentro da função executiva, se ocupa em gerir os interesses sociais e econômicos da sociedade, e de acordo com sua orientação ideológica, estabelece níveis maiores ou menores de intervenção. Assim, governo também não se confunde com o poder executivo, este é composto pelo governo, responsável pela direção política do Estado, e pela administração, como conjunto técnico e burocrático que auxilia o governo e faz funcionar a máquina pública. A administração pública dá execução às decisões do governo. Na pós-modernidade as funções do Estado continuam as mesmas, até mesmo o pragmatismo de sua separação é aceito, entretanto no limite de sua eficiência, e não na necessidade de garantir um Estado Democrático e de Direito. Introdução É comum e indevido confundir o Estado com o governo. O Estado é toda a sociedade política, incluindo o governo. O governo é principalmente identificado pelo grupo político que está no comandode um Estado. O Estado possui as funções executiva, legislativa e judiciária. O governo, dentro da função executiva, se ocupa em gerir os interesses sociais e econômicos da sociedade, e de acordo com sua orientação ideológica, estabelece níveis maiores ou menores de intervenção. Assim, governo também não se confunde com o poder executivo, este é composto pelo governo, responsável pela direção política do Estado, e pela administração, como conjunto técnico e burocrático que auxilia o governo e faz funcionar a máquina pública. Estado e governo A diferença entre Estado e governo é atualmente mais acentuada com a personalização jurídica do Estado, porque o Estado como pessoa tem vontade própria, distinta da vontade individual do governante. No Estado Democrático e de Direito há a perspectiva de reduzir a participação do governo ao máximo possível. Fazem parte deste Estado e não fazem parte do seu governo a Constituição, o conjunto de servidores públicos estáveis, o patrimônio público, a máquina burocrática pública, as forças públicas etc. Isto porque a sociedade precisa que estas instituições sejam estáveis e impessoais, que não estejam sujeitas às mudanças de governo no processo eleitoral e que sejam republicanas – pertencente ao conjunto LEITURA COMPLEMENTAR TÓPICO 1 | POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO 13 da sociedade e não aos interesses de quem está no poder. Isto é uma peculiaridade da democracia constitucional, nos regimes autoritários a ausência de limites aos governos os levam absorver ao máximo o Estado. O princípio republicano de responsabilidade política dos governos está presente nas constituições modernas das democracias e das monarquias, como limite ao poder e como identificação da coisa pública distinta do governo. A personalização jurídica do Estado é a sua identificação como pessoa, com vontade própria, caracterizada nos princípios de sua constituição. Um governo de um Estado que se legitima pelos princípios desse Estado terá uma margem de discricionariedade menor, sempre dentro destes princípios. Excepcionalmente e geralmente em momentos de crise, os governos buscam legitimação no carisma de seus líderes e de seus programas, mas é a legalidade conferida na ordem pública estatal a principal fonte de legitimidade moderna. Também o processo eleitoral de composição dos governos, com a distinção entre situação e oposição legitimando- se reciprocamente, contribui para a separação entre o Estado e o governo e para a sua legitimação. O governo antecede ao Estado, pois é toda forma de organização do poder para a orientação de uma sociedade. Ainda que ocupe parte da estrutura do poder executivo, o governo é mais do que o executivo, pois se caracteriza por se estabilizar institucionalmente no Estado e assumir a responsabilidade da orientação política geral. As funções do estado e o governo As funções do Estado se confundem com os seus poderes, porque o Estado se legitima pela sua utilidade. Ao assumir um poder específico o associa a uma respectiva função social, ou seja, à ideia de que aquela capacidade é útil e necessária. Mas aqui não será identificado como poder, e sim por essa utilidade e necessidade. O Estado é um conjunto de órgãos responsáveis pelo desempenho de suas funções. Os órgãos do Estado fazem o que é do seu interesse, pois exercem o poder do Estado, não possuem vontade própria, por isso são órgãos. As funções são a executiva, a legislativa e a judiciária. A função executiva é composta pela administração pública, como organização da burocracia estatal, e pelo governo, como conjunto de órgãos decisórios. O governo possui a discricionariedade, que é a liberdade de ação e de escolha nos limites da legalidade, mas o Estado possui princípios que limitam a opção ideológica dos governos. As opções ideológicas dos governos correspondem à fonte soberana do poder, que nas democracias é expressa pelo voto popular, mas é definida por um conjunto complexo de forças sociais que compõe uma elite efetivamente poderosa. Por isso o executivo não é um mero executor das decisões legislativas. A função legislativa é a essência do poder. É a fonte última das decisões e por isso se confunde com o poder soberano. Nas democracias que justificam o poder na vontade popular afirma-se que o legislador é o representante do povo. A prática tem demonstrado que o poder executivo é muito mais influente. O exercício do poder legislativo UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 14 é geralmente atribuído a colegiados, para se obter uma maior distribuição da representatividade e para obter soluções mais discutidas e amadurecidas. A função judiciária é de controle. Controle sobre os atos públicos e privados para a garantia da legalidade. Pela teoria de freios de contrapesos de Montesquieu, os atos judiciários são atos especiais como os atos do executivo. Eles estão na mesma categoria de identificação da lei com a realidade. Mas o judiciário não se limita à identificação da legalidade na sociedade, a produção de jurisprudência no preenchimento das lacunas da lei é uma verdadeira ação decisória. No Estado de Direito as funções do Estado, caracterizadas na forma de poder, devem ser separadas para não caracterizar o benefício do poder para o indivíduo que a ocupa, segundo a teoria de freios e contrapesos. É neste sentido que as funções do Estado não devem também se confundir com os ocupantes do governo. A separação de poderes e as implicações no estado e no governo A Democracia Moderna, fundada no Estado de Direito e no constitucionalismo, se utiliza da Separação de Poderes e da garantia dos Direitos fundamentais do homem. Junto com o seu presidencialismo, os EUA simbolizam o modelo de democracia que combina a separação de poderes em executivo, legislativo e judiciário com a responsabilidade política republicana de uma Constituição material, acima da vontade arbitrária dos governantes. A separação formal dos poderes é uma característica de alguns Estados Democráticos e de Direito para a realização desta condição. De regra, os Estados antigos centralizaram as decisões das funções públicas. Em parte isto é decorrência do modelo de Estado Democrático e de Direito, mas em parte contribuiu o rol restrito de funções públicas, além de sociedades menores e menos burocratizadas. Para ocorrer a separação, a cada poder foram atribuídos órgãos respectivos, com personalidade jurídica e independência, a ponto de muitas vezes se confundir o órgão com o poder. Entretanto a doutrina nos ensina que órgão público é um espaço dentro da administração, destinado a um fim. O órgão se caracteriza pela estrutura de organização, com os seus critérios de preenchimento, funcionamento e execução da finalidade, combinados com esta finalidade. Entretanto um órgão pode ser substituído por outro diferentemente caracterizado, permanecendo a finalidade. A função legislativa é comumente desempenhada por colegiados em órgãos como Assembleias, Câmaras, Congressos, Parlamentos, etc., a função executiva é comumente desempenhada por órgãos como presidências, gabinetes, prefeituras, etc. e a função judiciária possui órgãos como tribunais, varas, fórum etc. Em alguns Estados a Separação de Poderes é ainda maior, com órgãos com um grau de autonomia em relação aos demais a ponto de politicamente serem reconhecidos como um novo poder. É o que ocorre com o Ministério Público no Brasil, ainda que a Constituição não indique assim expressamente. TÓPICO 1 | POLÍTICAS PÚBLICAS: HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO 15 Assim, a Separação de Poderes não é apenas a divisão de funções, ainda que esta pareça lógica e eficiente. É, na verdade, um mecanismo de autocontrole do Estado, com independência e atribuição de fiscalização recíproca entre os poderes. É inspirada na Teoria de Freios e Contrapesos de Montesquieu, segundo o qual os atos do Estado podem ser divididos em atos gerais e atos especiais. Os primeiros se caracterizam por serem indistintos, impessoais,e destinam-se a estabelecer regras gerais para a sociedade, é a ação de legislar, e os segundos se caracterizam por serem concretos, individualizados, e identificam os atos gerais com o comportamento das pessoas em sociedade, é a ação executiva. Para ocorrer a separação de poderes, que garante o autocontrole do Estado, é imperioso que os responsáveis pelos atos gerais não tenham controle e conhecimento sobre os destinatários destes atos, bem como os responsáveis sobre os atos especiais não tenham participação exclusiva na elaboração dos atos gerais e sejam apenas aplicadores da lei. Este mecanismo garante hipoteticamente que o indivíduo responsável pelo ato público não se beneficie individualmente da sua atribuição pública. Conclusões - A separação de poderes e a pós-modernidade Este modelo que garante a democracia e o Estado de Direito com a imposição de uma separação de poderes é aplicável e própria da modernidade. Na pós-modernidade o Estado perde a sua capacidade de articulação das funções, que estão engessadas, burocratizadas e sobrecarregadas. Gradativamente, os Estados que adotaram a separação de poderes estão criando normas que implicam a ingerência de um poder no outro. E a razão é muito simples: na pós-modernidade o fundamento moderno de legitimidade produzido por legalidade é substituído pelo fundamento da eficiência produzida pela operatividade. A atual crise do Estado afeta indistintamente todas as suas instituições. As funções do Estado continuam as mesmas, até mesmo o pragmatismo de sua separação é aceito, entretanto no limite de sua eficiência, e não na necessidade de garantir um Estado Democrático e de Direito. A democracia e o Estado de Direito, por consequência também estão afetados, não somente pela inviabilidade da absoluta separação de poderes, mas porque a pós-modernidade está produzindo outros parâmetros para a política. Quando o indivíduo abandona o sentido de cidadania como uma ação para a realização de interesses públicos comuns e o substitui por uma cidadania de ação pública de realização de interesses privados a democracia tal qual como foi idealizada para a modernidade já não faz mais sentido. Isto atinge todas as suas instituições, não somente a separação de poderes, mas também tudo que implica na relação entre Estado e governo. O governo será muito mais um gestor das tensões produzidas pelo individualismo e a serviço de um ideal de eficiência tipicamente privado, do que uma equipe promotora dos ideais ideológicos de um grupo, segmento ou classe social. FONTE: ROCHA, Manoel Ilson Cordeiro. Estado e Governo: diferença conceitual e implicações práticas na pós-modernidade. Revista UNIARA, n.0 p. 21/22. 2008/2009. Disponível em: <http:// www.uniara.com.br/revistauniara/pdf/21/09_manoel_ilson.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2012. 16 Nesse tópico, você estudou: • As pesquisas em políticas públicas começaram a se estabelecer no início dos anos 1950, nos Estados Unidos com a expressão policy science. • Os motivos da expansão das políticas públicas no Brasil: deslocamento na agenda pública; obstáculos para estabelecer políticas sociais; e difusão internacional de reforma do Estado. • Uma definição de políticas públicas: campo do conhecimento que coloca o governo em ação, ou ainda, analisa essa ação e, quando necessário, propõe alterações na trajetória dessas ações. • As políticas públicas depois de formuladas se desdobram em planos, programas, projetos, bases de dados ou sistema de informação e pesquisas. • As políticas públicas se apresentam na tipologia de quatro formatos: políticas distributivas, políticas regulatórias, políticas redistributivas e políticas constitutivas. • Os processos de tomada de decisão podem ser regidos por diferentes tipologias de políticas públicas, tendo, cada uma delas, uma base conceitual que justifica sua adoção naquele contexto. • A diferença entre Estado e governo é atualmente mais acentuada com a personalização jurídica do Estado, porque o Estado como pessoa tem vontade própria, sendo esta distinta da vontade individual do governante. RESUMO DO TÓPICO 1 17 Ao final deste tópico, para testar seus conhecimentos adquiridos, resolva as questões que seguem: 1 As políticas públicas ganharam espaço a partir dos anos 50 e desse período em diante registraram o ressurgimento da importância desse campo de conhecimento denominado políticas públicas. Comente sobre o processo de surgimento das políticas públicas. 2 Algumas abordagens distintas vêm sendo trabalhadas ao conceituar políticas públicas devido às ideologias diferentes adotadas por pesquisadores. Analise os diferentes conceitos e descreva o que são políticas públicas. 3 Depois de desenhadas e formuladas, quais são os desdobramentos que as políticas públicas podem adotar? AUTOATIVIDADE 18 19 TÓPICO 2 FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Você já ouviu falar em “construção ou formulação de políticas públicas”? Pois bem, uma lei, um programa, um plano, um projeto são resultados da construção participativa de uma proposta de interesse comum e que quando bem formulada é colocada em prática por meio de alguns desdobramentos. Mas para que se tenham leis, programas, planos, projetos é preciso formular uma política pública e, nesse processo, existem algumas fases importantes que auxiliam na orientação para tal. É comum que todas as propostas de políticas públicas passem por fases que vão da formulação à implementação e ao controle e/ou avaliação dos impactos das políticas. A avaliação sistemática, contínua e eficaz surge como ferramenta de gerenciamento, fornecendo aos formuladores de políticas públicas e aos gestores de programas e projetos, condições para aumentar a eficiência e efetividade dos recursos aplicados. É com base nesse contexto que iremos nos aprofundar no segundo tópico dessa unidade. Vamos conhecer as fases de formulação de uma política pública, bem como, o processo de avaliação com seus critérios e indicadores e a importância para o sucesso de implementação. Vamos lá! 2 FASES DE FORMULAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS O processo de formular uma política pública pode ser estruturado em cinco fases conforme sugere Frey (1999), que correspondem a uma sequência de elementos do processo político-administrativo. Segundo esse autor, em cada fase podem ser investigadas constelações de poder, redes políticas e sociais e práticas político-administrativas. Dentre as fases, podemos elencar: identificação do problema, formulação, legitimação, implementação e avaliação (figura a seguir). UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 20 FIGURA 5 – AS CINCO FASES DO PROCESSO DE FORMULAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS • Formular um plano de ação, com metas para enfrentar o problema. • Legitimar a proposta, decidir e escolher as ações prioritárias com obtenção de comprometimentos, participação de grupos de interesse e apoios. • Identificar um problema a ser resolvido ou um conjunto de direitos a serem efetivados, a partir de um diagnóstico do problema. • Implementar a proposta por meio de leis e procedimentos administrativos com vistas à obtenção de metas definidas no processo de formulação. Identificação Implementação Legitimação Formulação AVALIAÇÃO FONTE: As autoras A figura acima nos remete as cinco fases da formulação das políticas públicas. Note que a descrição ao lado de cada etapa confere a ação para que a mesma possa ser desenvolvida. No centro da figura temos uma importante fase – a avaliação, que permeia as demais fases, ou seja, a avaliação deve acontecer em todas as fases, desde a identificação do problema até a implementação. A presença da avaliação em todas as fases possibilitará um aumento na eficiência e na efetividade da ação em questão. Para que possamos melhor exemplificar essas fases, segue detalhamento de acordo com Frey (1999): • Identificaçãoou reconhecimento do problema: fase de estudo dos antecedentes (evolução conjuntural, tendência, diferenças regionais e setoriais, séries históricas e dados estatísticos, valores qualitativos). • Formulação: fase na qual se estabelecem as alternativas da ação governamental: a) escolha de instrumentos de política; b) ordenamento temporal; c) ordenamento geográfico; d) intensidade de aplicação/dosagem; e) identificação de objetivos a serem atingidos; f) simular possíveis efeitos; g) pressão de grupos; h) conjuntura política, i) econômica e social; definir priorização. • Legitimação: fase em que ocorrem as decisões e as escolhas das ações prioritárias com obtenção de comprometimentos, abertura para participação de grupos de interesse e apoios. É uma oportunidade para a melhoria de proposta, correção de eventuais deficiências, adequação de parâmetros e redução de possíveis obstáculos à respectiva implementação. TÓPICO 2 | FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS 21 • Implementação: fase em que a proposta já está elaborada e então é posta em prática e operacionalizada, conforme as prioridades estabelecidas. Assim, a implementação corresponde à execução de atividades que permitem que ações sejam implementadas com vistas à obtenção de metas definidas. De tal forma, pode-se dizer ainda que a implementação mostra resultados que servem de ensinamentos para os formuladores, orientando novas políticas. Como a implementação implica tomada de decisões, passa a se constituir em fonte de informação para a formulação de políticas (SILVA; MELO, 2000). Estes autores mencionam que as decisões na maioria das políticas setoriais constituem apenas inovações em relação à política existente ou manutenção de políticas existentes realizando-se ajustes incrementais de metas, recursos e prazos de execução. • Avaliação ou monitoramento: fase em que se avaliam os impactos efetivos do projeto e seus resultados e também se propõem correções, adequações ou adaptações. A avaliação ou controle de impacto pode, no caso dos objetivos do programa ter sido alcançado, levar à suspensão ou ao fim do ciclo político, ou caso contrário, à iniciação de um novo ciclo, ou seja, uma nova fase de percepção e definição e à elaboração de um novo programa político ou à modificação do programa anterior. FIGURA 6 – CLAREZA E CORRELAÇÃO OCORREM EM TODAS AS FASES DAS POLÍTICAS PÚBLICAS FONTE: Agenda Pública (2011) Como a fase de avaliação permeia as demais fases, vamos conhecer e nos aprofundar mais como se dá essa importante fase com os itens que seguem. UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 22 3 AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS 3.1 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO Antes mesmo de estudar os critérios adotados para se avaliar uma política pública, pergunto: você sabe o que é avaliar? De acordo, com o UNICEF (1990), avaliar trata do exame sistemático e objetivo de um projeto ou programa, finalizado ou em andamento, que contemple o seu desempenho, implementação e resultados, com o olhar voltado a sua eficiência, efetividade, seu impacto, sustentabilidade e a relevância de seus objetivos (COSTA; CASTANHAR, 2003). UNI A finalidade da avaliação é guiar os tomadores de decisão, orientando-os quanto à continuidade, necessidade de adequações, correções ou interrupção de uma determinada política, programa ou projeto. Podemos citar algumas razões que nos levam a avaliar uma política pública, como: • Permitir o aperfeiçoamento de atividades, das instituições e dos indivíduos. • Garantir que recursos escassos são utilizados de maneira eficiente. • Garantir que objetivos perseguidos estão sendo atingidos. • Evitar prejuízos tanto à sociedade como aos indivíduos. • Evitar a exploração dos cidadãos. • Evitar a repetição de erros. Se a avaliação é uma forma de mensurar o desempenho de programas e assim poder evitar prejuízos, então é necessário definir critérios que levem a essa mensuração. Existe uma lista de critérios para serem aplicados ao se avaliar um programa, e a escolha de um, ou de vários deles, depende dos aspectos que se deseja privilegiar na avaliação. Na figura a seguir vamos destacar alguns dos critérios mais comuns, segundo o manual do UNICEF. TÓPICO 2 | FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS 23 FIGURA 7 – CRITÉRIOS APLICADOS NA AVALIAÇÃO DE UM PROGRAMA Eficiência Significa a menor relação entre custo e benefício possível para o alcance dos objetivos estabelecidos no programa. Eficácia Medida do grau em que o programa atinge os seus objetivos e metas. Efetividade Indica se o projeto tem efeitos (positivos) no ambiente externo em que interveio, em termos técnicos, econômicos, socioculturais, institucionais e ambientais. Sustentabilidade Mede a capacidade de continuidade dos efeitos benéficos alcançados com o programa social após o seu término. Análise custo-efetividade Similar à ideia de custo de oportunidade e ao conceito de pertinência. Esse critério compara as alternativas da ação social para a obtenção de determinados impactos, com o objetivo de selecionar aquela atividade/projeto que atenda as metas e objetivos com o menor custo. Satisfação do beneficiário Avalia a atitude do usuário em relação à qualidade do atendimento que está obtendo do programa. Equidade Avalia o grau em que os benefícios de um programa estão sendo distribuídos de maneira justa e compatível com as necessidades do usuário. FONTE: As autoras UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 24 A avaliação é um instrumento fundamental para o conhecimento da viabilidade de programas e projetos, uma vez que permite redirecionar seus objetivos, quando necessário, ou mesmo para a reformulação de suas propostas e atividades. Logo, é através da avaliação que o gestor tem subsídios para decidir continuar, extinguir ou modificar qualquer programa adotado (FREY, 1999). A avaliação se revela como um importante mecanismo de gestão, uma vez que fornece informações para tomada de decisão dos gestores, formuladores e implementadores de programas, pois possibilita conhecer o que está acontecendo e atuar sobre os fatos de forma a realizar ajustes necessários, aumentado a credibilidade das ações públicas. Apesar de ser indiscutível a necessidade de avaliação uma política pública, o processo de se avaliar ainda é pouco praticado. Nem mesmo os critérios de avaliação comumente conhecido como eficiência, efetividade e eficácia (figura a seguir) importantes para esse processo de qualificar um programa e de prestar contas à sociedade das ações implementadas não é colocado em prática. FIGURA 8 – CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO E O FOCO DE ANÁLISE • Metas e Objetivos • Recursos • Impactos Eficácia Eficiência Efetividade FONTE: As autoras Agora que você conheceu os critérios utilizados para avaliar, vamos aos indicadores de avaliação. 3.2 INDICADORES DE AVALIAÇÃO Para que se possa aplicar os critérios vistos anteriormente (eficiência, efetividade, eficácia, sustentabilidade, equidade, etc.) existem formas específicas de operacionalizar, já que constituem medidas indiretas, ou seja, que devem ser calculadas a partir da identificação e quantificação dos resultados obtidos. Assim, temos a denominada categoria de medidas de indicadores. Podemos elencar três tipos definidos por Schwartzman (1994 apud COSTA; CASTANHAR, 2003): • Indicador simples: aquele que é expresso em termos absolutos (por exemplo, número de professores, área construída etc.). TÓPICO 2 | FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS 25 • Indicador de desempenho: aquele que requerer um padrão ou um objetivo para comparação e são relativos (por exemplo, custo por aluno, relação aluno/ professor etc.). • Indicador geral: aquele que é gerado fora da instituição ou do programa, com base em estatísticas gerais ou em opiniões de especialistas (por exemplo, avaliar programas de pós-graduação como é feito pela Capes). Para a avaliação do desempenho de programas públicos, o Ministério de Previdência e Assistência Socialelaborou alguns indicadores, cuja proposta vai ao encontro de uma “ferramenta para a mensuração e o acompanhamento do desempenho das gerências do seguro social do INSS”. Veja o que definem e o que propõem os três tipos de indicadores: • Indicadores primários: aqueles que expressam medidas simples de eficiência (tempo médio de espera para a concessão de benefícios, participação de benefícios com demora superior a 45 dias no total de benefícios concedidos etc.). • Indicadores parciais de excelência: aqueles que procuram indicar o quão eficaz são as operações (índices de cumprimento de prazos, de velocidade na concessão etc.). • Indicadores globais de desempenho: aqueles que buscam expressar o desempenho da gestão do programa, por meio de uma medida única. O pesquisador Rob Vos (1993 apud COSTA; CASTANHAR, 2003), que na tentativa de sistematizar a discussão dos indicadores de avaliação, apresenta através de três categorias de indicadores sociais: • Indicadores de resultado: refletem os níveis de satisfação de necessidades básicas alcançadas ou de nível de vida (por exemplo, esperança de vida, mortalidade infantil, grau de alfabetização, entre outros). • Indicadores de insumo: referem-se aos recursos disponíveis para se alcançar um determinado padrão de vida. Esses meios podem incluir, por exemplo, a renda e a disponibilidade de alimentos, a disponibilidade de água potável, quantidade de médicos por habitante, número de escolas e de professores por aluno. • Indicadores de acesso: referem-se aos determinantes que permitem tornar efetivo o uso de recursos disponíveis para atender determinadas necessidades básicas. Por exemplo, a distância geográfica (sobretudo em áreas de população dispersa) e os custos privados relacionados com o uso de serviços públicos (material escolar, transporte, remédios etc.). Os indicadores desejáveis são aqueles que mostram a realidade hoje e conseguem projetar um futuro diferente. UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 26 4 O QUE DEVEMOS AVALIAR E ANALISAR NOS PROGRAMAS? Já estudamos os critérios e indicadores de avaliação e agora vamos adentrar no que é preciso elencar e/ou extrair dos programas e projetos para que se possa adequá-los ou corrigi-los. Para isso, vamos conhecer as três dimensões de análise, ou seja, as categorias que contribuem para estruturar os programas e projetos. UNI Vale ressaltar antes de tudo que, por avaliação política entende-se “a análise e elucidação do critério ou critérios que fundamentam determinada política: as razões que a tornam preferível a qualquer outra” (FIGUEIREDO; FIGUEIREDO, 1986). E por análise de políticas entende-se o exame da engenharia institucional e dos traços constitutivos dos programas A literatura sobre policy analysis ou análise de políticas diferencia três dimensões da política, conforme Klaus Frey (1999). Para detalhar essas dimensões tem-se adotado, na ciência política, o emprego dos conceitos em inglês de polity para denominar as instituições políticas, politics para os processos políticos e, por fim, policy para os conteúdos da política. Veja como se podem defini-las na figura a seguir. FIGURA 9 – DIMENSÕES DE ANÁLISE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS E SUA DEFINIÇÃO dimensão institucional polity • Refere à ordem do sistema político, delineada pelo sistema jurídico, e à estrutura institucional do sistema político-administrativo. dimensão processual politics • Refere-se ao processo político, frequentemente de caráter conflituoso, no que diz respeito à imposição de objetivos, aos conteúdos e às decisões de distribuição. dimensão material policy • Refere-se aos conteúdos concretos, isto é, à configuração dos programas políticos, aos problemas técnicos e ao conteúdo material das decisões políticas. FONTE: As autoras A diferenciação teórica percebida com a figura anterior são aspectos peculiares da política e que fornece categorias que podem se evidenciar proveitosas na estruturação de projetos de pesquisa. De toda forma, não se pode TÓPICO 2 | FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS 27 deixar de reparar que na realidade política essas dimensões são entrelaçadas e se influenciam mutuamente. Dentro do contexto das políticas, o que devemos focar ao avaliar uma política pública? Conforme Costa e Castanhar (2003), alguns pesquisadores determinam uma sequência de definições correspondentes a graus sucessivos de agregação de objetivos, no caso missão> metas> objetivos. Outros pesquisadores ainda incorporam e modificam a hierarquia ou essa sequência de agregação de compromissos, colocando depois da missão (ou propósito) os objetivos e só em seguida as metas, sendo propósito> objetivo> meta> atividade. A figura a seguir apresenta a agregação de compromissos que devemos observar e elencar ao avaliar um programa. FIGURA 10 – AGREGAÇÃO DE COMPROMISSOS QUE DEVEM SER ELENCADOS AO AVALIAR UM PROGRAMA Efeitos Resultados Produtos ImpactosMissão Objetivos Atividades Metas FONTE: As autoras Observando a agregação da figura anterior e tomando como exemplo um programa de saúde pública, a missão equivaleria à prevenção de doenças, o objetivo poderia ser definido como uma campanha de vacinação e a meta expressa como o compromisso de vacinar toda a população em idade pré- escolar. A aferição do desempenho (atividades) pode se referir aos resultados dos programas, que mediriam o alcance da missão ou os produtos gerados pela implementação dos programas (COSTA; CASTANHAR, 2003). Para facilitar e melhor visualizar o funcionamento do processo de avaliação, sugere-se a elaboração de uma matriz lógica de um programa que se pretende analisar. Observe o exemplo apresentado pelo trabalho de Costa e Castanhar (2003) nas Figuras 11 e 12. UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 28 FIGURA 11 – MODELO DE MATRIZ LÓGICA DE PROJETO – OBJETIVOS E INDICADORES Exemplo de modelo lógico Objetivo Variável Indicador Informação necessária Método de coleta de dados Aumentar a produção agrícola dos beneficiários do projeto Volume da produção agrícola Valor da produção agrícola Quantidade produzida por cultura Faturamento com a produção (por cultura) Dados sobre produção Dados sobre receita financeira Pesquisa secundária (anuários de produção) Pesquisa de campo FONTE: Costa e Castanhar (2003) Conforme você deve ter percebido na figura anterior, a matriz lógica é formada inicialmente pela identificação dos objetivos gerais e específicos do programa, pelos indicadores (tipos de evidência) no qual o programa será avaliado e ainda pela indicação das fontes de dados (mensurações, comparações e análises necessárias). Em continuidade a metodologia de avaliação seguindo a figura a seguir, a matriz lógica ainda é formada pelos elementos como: identificação dos recursos (financeiros, humanos e de infraestrutura) para o programa; atividades previstas; resultados esperados e; relações causais (combinação de recursos que permite a realização de um determinado conjunto de atividades). Você pode perceber que um aspecto prático importante no desenvolvimento da matriz lógica é a identificação de resultados intermediários que de certa forma estão associados a determinadas atividades do programa e a um ou mais objetivos que apresenta. A figura a seguir mostra o levantamento de dados de um programa, no caso aqui um exemplo hipotético voltado à agricultura irrigada, para que se possa observar a identificação dos principais elementos para se montar a matriz lógica de um programa e visualizar como esse modelo pode contribuir para uma avaliação adequada e eficaz do mesmo. É importante que você acadêmico, tenha a noção desse esboço para que possa direcionar a avaliação de um programa, sendo que esse é apenas um exemplo, necessitando maior grau de detalhamento de um programa ao se avaliar, criando então, uma matriz definitiva. FIGURA 12 – MODELO DE MATRIZ LÓGICA DE PROJETO, COM EXEMPLO PARA AGRICULTURA Esboço da matriz lógica dos projetos de agriculturairrigada Inputs do programa Atividades do programa Resultados imediatos Resultados (impactos) de médio prazo Resultados (impactos) de longo prazo TÓPICO 2 | FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS 29 FONTE: Costa e Castanhar (2003) Fatores contextuais Recursos financeiros Pessoal alocado ao programa Recursos de treinamento (material instrucional) Infra-estrutura Financiamento à produção Apoio a comercialização Treinamento Assistência técnica Apoio a comercialização Treinamento Assistência técnica Realização de obras de irrigação Mudança nos sistemas produtivos Melhoria de volume de produção e valor agregado Melhoria de renda Manutenção de níveis adequados de endividamento Instalação de agroindústrias e serviços correlatos Mudanças nos sistemas de comercialização da produção Aumento nos níveis de associação e integração entre os usuários Mudança nos padões de vida das populações beneficiadas Redução da ingerência do setor público na operaç~~ao do programa Fatores contextuais Equipamentos Produtores rurais elegíveis para o projeto Aquisição e distribuição de equipamentos para iriigação Cadastramento e identificação dos perfis dos beneficiários Manutenção de níveis adequados de arrecadação x custos de operação Manutenção de níveis mínimos de inadimplência Manutenção de níveis mínimos de transferência de lotes UNI A avaliação de um programa pode gerar informações que afetam sua implementação, como as elencadas por Marcon (2005): 1) a descontinuidade político-administrativo; 2) o descaso com a capacidade institucional de agentes executores; 3) o atraso ou inexistência de monitoramento; 4) a busca de perfeccionismo na avaliação. UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 30 As decisões de modificação de uma política pública a partir de uma avaliação ocorrem duas vezes ao ano, uma vez, ou a cada cinco anos. A periodicidade da avaliação depende, de um lado, das características do sistema e, de outro, da decisão daqueles que são diretamente afetados pelo sistema (stakeholders) e por aqueles que detêm o poder político institucional. Do lado técnico, a avaliação não pode ocorrer antes que um ciclo completo do sistema de interesse seja completado. 5 TIPOS DE AVALIADORES A avaliação se aplica principalmente nos casos em que os mecanismos descentralizados e autorreguladores da sociedade não estão por algum motivo funcionando. Logo, a avaliação dependerá também do tipo de avaliador, uma vez que possuem olhares e formas diferentes de atuarem. Podemos citar dois tipos de avaliadores conforme Kondo (1999): • Avaliador condescendente: diz o que esperam dizer, ganha simpatia, mas não usa do seu profissionalismo, portanto, a avaliação não se faz de grande valia, pois pouco diz a verdade. • Avaliador independente: usa do profissionalismo, mostra a realidade do processo e com isso ganha inimizades e desconfianças. Este avaliador não é mais chamado para continuar avaliando. Veja no texto a seguir o dilema de ser um avaliador de programas, que caminho tomar e quais evitar. O dilema do avaliador Para evitar problemas óbvios que uma avaliação de atividades realizada pelos próprios executores pode criar, um procedimento mais objetivo é a contratação de avaliadores externos à instituição avaliada. O avaliador externo convidado a dar um parecer vê-se confrontado com a seguinte situação: cumprir com a obrigação profissional de dar um parecer independente e objetivo, ou ceder à pressão real de sobreviver como consultor e dar um parecer agradável e complacente. No primeiro caso, o avaliador corre o risco de não mais ser convidado, e no segundo caso garante seu trabalho em futuras avaliações, mas compromete sua integridade profissional. Se o avaliador for único e soberano, ele pode até ser ditatorial (é o caso do poder dado aos fiscais e inspetores em geral). No caso da avaliação de sistemas de ciência e tecnologia ou de seus subsistemas, esse dilema se coloca com força total. Considere o caso dos especialistas de ciência e tecnologia em seu próprio país. De um lado, aqueles que coletam os dados são funcionários TÓPICO 2 | FORMULAÇÃO E AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS 31 do Governo, particularmente dos Conselhos Nacionais de Ciência e Tecnologia. O responsável que ocupa uma posição de chefia necessita manter sua lealdade com os superiores que lhe dão o mandato e que são sustentados por um conjunto de forças políticas. Em alguns países, os titulares dessas posições já conseguiram se estabelecer como técnicos que atuam fora do contexto político. Nos países em que a avaliação é feita dentro da própria estrutura governamental, o avaliador se vê colocado entre fazer uma avaliação objetiva e uma condescendente, quando não enviesada e ostensivamente favorável. Conscientes desse risco, as agências internacionais que financiam projetos, sugerem que as avaliações sejam feitas por consultores independentes, geralmente das universidades. Se o consultor produz um relatório muito crítico, por maior que sejam as dificuldades financeiras dos governos, eles sempre conseguem recursos para contratar outro consultor “independente” que dará uma apreciação “mais objetiva” da situação. Assim, todos os pesquisadores sabem que avaliar constitui um dos desafios mais difíceis, e o dilema que se coloca possui a mesma estrutura do clássico dilema do prisioneiro na Teoria dos Jogos. Vejamos qual é a situação enfrentada pelo avaliador no esquema representado a seguir. Avaliador 1 ser condescendente ser independente Avaliador 2 ser condescendente ser independente (0,0) (2, – 10) (–10,2) (4,4) Cada avaliador pode ser condescendente ou ser independente (objetivo). Se os dois forem independentes, resulta uma boa avaliação, fornecendo subsídios concretos para que a instituição ou indivíduos objeto da avaliação se aperfeiçoem. Os avaliadores saem satisfeitos, pois cumpriram seu verdadeiro papel e contribuíram para os avaliados e para a sociedade. Numa escala arbitrária de valoração relativa, daremos o valor de quatro pontos positivos de ”prestígio e respeito” para esse resultado. Se apenas um dos dois for objetivo, e o outro condescendente, o primeiro corre sérios riscos de ser visto como alguém querendo prejudicar a instituição. Se já é difícil para as instituições ou indivíduos ouvirem críticas mesmo quando eles mesmos reconhecem, imagine a reação a uma crítica da qual não concordam? O avaliador independente corre o risco de ser visto como alguém possuidor de interesses escusos. No terreno fértil do ambiente político em que se encontram inseridos esses casos, as interpretações podem rapidamente ser UNIDADE 1 | AS POLÍTICAS PÚBLICAS 32 direcionadas para o conspiratório: --Talvez ele esteja planejando ser Ministro num próximo mandato, ou é um correligionário de um inimigo político meu? Ou quem sabe, é uma frente de ameaça que eu nem tinha desconfiado? Numa situação como essa o condescendente abre mão do seu profissionalismo, mas ganha uma grande simpatia do avaliado. Se considerarmos que o profissionalismo vale dois pontos e a garantia de trabalho futuro pela simpatia do cliente valem outros dois pontos, o condescendente conseguiu apenas dois pontos. Para o independente, a vida infelizmente não traz as impressões negativas e positivas com a mesma intensidade. Pois, não só irá o cliente odiá-lo, mas envidará todos os seus esforços para garantir que o avaliador independente nunca mais tenha oportunidade de avaliar. O custo de ser independente, quando há uma grande possibilidade de os outros avaliadores envolvidos não o serão, é desproporcionalmente alto. Arbitrariamente represento esse custo por dez pontos pela obtenção de inimizade e desconfiança das pessoas que estão no poder. Quando ambos decidem ser condescendentes, obtém-se a simpatia do cliente, mas o papel de avaliador não foi cumprido. Nesse caso defino como não havendo ganhado de qualquer espécie,
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