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1 São José/SC 2021 Diretrizes para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Rede Regular de Ensino de Santa Catarina GOVERNADOR DO ESTADO Carlos Moisés da Silva VICE-GOVERNADORA Daniela Cristina Reinehr SECRETÁRIO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO Luiz Fernando Cardoso PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO CATARINENSE DE EDUCAÇÃO ESPECIAL (FCEE) Janice Aparecida Steidel Krasniak DIRETORIA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO (FCEE) Jeane Rauh Probst Leite DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃO (FCEE) Edilson dos Santos Godinho GERÊNCIA DE CAPACITAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO - GECAE/FCEE Wesley Knochenhauer Carvalho GERÊNCIA DE PESQUISA E CONHECIMENTOS APLICADOS - GEPCA/FCEE Juliana Paula Buratto SUPERVISORA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL - DEPE/FCEE Kelly Christina Gelsleuchter SUPERVISORA DE ATIVIDADES EDUCACIONAIS EXTENSIVAS - GECAE/FCEE Fabiana de Melo Giacomini Garcez SUPERVISORA DE ATIVIDADES EDUCACIONAIS NUCLEAR - GEPCA/FCEE Kátia Regina Ladewig INTEGRADORA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL - GECAE/FCEE Maria Stela Lopes de Simas Sumienski INTEGRADORA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL - GEPCA/FCEE Karla Simoni Martins Dias DIRETORA DE ENSINO - SED Zaida Rabelo Jerônimo Petry GERENTE DE MODALIDADES, PROGRAMAS E PROJETOS EDUCACIONAIS - GEMPE/SED Beatris Clair Andrade EQUIPE DE COORDENAÇÃO DE EDUCAÇÃO ESPECIAL- SED Tania Maria Fiorini Geremias Ketryn Fabiana Cidade Beseke Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) Rua Paulino Pedro Hermes, 2785 | Bairro Nossa Senhora do Rosário | São José | SC | Brasil | CEP 88110-694 | Telefone +55 (48) 3664-4860 | fcee@fcee.sc.gov.br COORDENAÇÃO GERAL Fabiana de Melo Giacomini Garcez ORGANIZAÇÃO Fabiana de Melo Giacomini Garcez REVISÃO Paula Sanhudo da Silva - Revisora Técnica Mara Aparecida A. R. Siqueira - Revisora Textual COLABORADORAS Kátia Regina Ladewig Tania Maria Fiorini Geremias CAPA Martina Hotzel ILUSTRAÇÃO Martina Hotzel DIAGRAMAÇÃO Martina Hotzel ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO Aline Buaes Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Paula Sanhudo da Silva – CRB-14/959, com os dados fornecidos pelo(a) autor(a) Santa Catarina. Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE). Diretrizes para o atendimento educacional especializado (AEE) na rede regular de ensino de Santa Catarina [livro eletrônico] / Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE). – São José/SC : FCEE, 2021. 30 Mb ; PDF Inclui bibliografias. Modo de acesso: https://www.fcee.sc.gov.br/informacoes/biblioteca-virtual/ educacao-especial/temas-gerais/1400-diretrizes-para-o-atendimento-educacio nal-especializado-aee-na-rede-regular-de-ensino-de-santa-catarina/file 1. Educação especial – Diretrizes. 2. Educação especial – Santa Catarina. I. Título. II. Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE). CDD 371.98164 https://www.fcee.sc.gov.br/informacoes/biblioteca-virtual/educacao-especial/temas-gerais/1400-diretr https://www.fcee.sc.gov.br/informacoes/biblioteca-virtual/educacao-especial/temas-gerais/1400-diretr https://www.fcee.sc.gov.br/informacoes/biblioteca-virtual/educacao-especial/temas-gerais/1400-diretr APRESENTAÇÃO É com grande satisfação que apresentamos as “Diretrizes para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Rede Regular de Ensino de Santa Catarina”, docu- mento inédito e de fundamental importância para Santa Catarina, resultado do com- promisso com a qualificação do processo de inclusão dos estudantes com deficiências, Transtorno do Espectro Autista, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD). Elaborado em conjunto pelas instituições responsáveis pela política de Educação Especial no estado, a Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) e a Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina (SED/SC), este documento tem por objetivo oferecer embasamento teórico e conhecimentos específicos para que professores dos serviços de Atendimento Educacional Especializado na rede estadual de ensino possam planejar e orientar as atividades dos seus alunos, embasando sua prática pedagógica com metodologias, técnicas, estratégias e recursos específicos. Esta publicação vem ao encontro das demandas do setor que, desde a publicação da Política de Educação Especial de Santa Catarina, em 2006, aguarda orientações espe- cíficas para atuação nas diferentes áreas de atendimento. Atualmente, a rede estadual de ensino de Santa Catarina possui quase 19 mil alunos elegíveis para o Atendimento Educacional Especializado, espalhados por mais de 1000 escolas em todo o Estado. É para este público que nosso olhar se volta, para que cada vez mais estes estudantes possam ter acesso aos conhecimentos historicamente produzidos pela humanidade. Luiz Fernando Cardoso Secretário de Estado da Educação de Santa Catarina Janice Aparecida Steidel Kraniak Presidente da Fundação Catarinense de Educação Especial LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AAIDD American Association on Intellectual and Developmental Disabilities ABA Análise do Comportamento Aplicada AH/SD Altas Habilidades/Superdotação AEE Atendimento Educacional Especializado AF Apoio Físico AG Apoio Gestual APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais ARASAAC Centro Aragonês de Comunicação Aumentativa e Alternativa AT Análise de Tarefas ATP Assistente Técnico Pedagógico AV Apoio Verbal AV/R+ Apoio Visual e Reforçamento Combinados CA Comunicação Alternativa CAA Comunicação Alternativa e Aumentativa CAESP Centro de Atendimento Educacional Especializado CDC Center of Disease Control and Prevention CEE/SC Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina CENAP Centro de Estudos Normativos para o Atendimento Pedagógico CID Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Re- lacionados à Saúde CIF Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde CM Configuração de Mão COESP Coordenação de Educação Especial CRE Coordenadoria Regional de Educação CSA Comunicação Suplementar e Alternativa DA Deficiência Auditiva DF Deficiência Física DI Deficiência Intelectual DM Deficiência Múltipla DV Deficiência Visual EdEA/UFSM Educação Especial e Autismo da Universidade Federal de Santa Maria ENM Expressões Não-Manuais FCEE Fundação Catarinense de Educação Especial FE Função Executiva FPS Funções Psicológicas Superiores Fundeb Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação IBA Intervenção Baseada no Antecedente IIMP Instrução e Intervenção Mediada por Pares IL1 Interlíngua I IL2 Interlíngua II IL3 Interlíngua III IN Intervenção Naturalística INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira LBI Lei Brasileira de Inclusão LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação LIBRAS Língua Brasileira de Sinais LIVIAH/SD Lista de Verificação de Indicadores de AH/SD MD Modelagem MD Modeling MEC Ministério da Educação MEE Modelo de Enriquecimento Escolar NAAH/S Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação NAAH/S-SC Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação do esta- do de Santa Catarina NI Naturalistic Intervention NPDC National Professional Development Center OBF Olimpíadas Brasileiras de Física OBM Olimpíada Brasileira de Matemática OBQ Olimpíada Brasileira de Química OBR Olimpíada Brasileira de Robótica OBMEP Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas e Privadas OM Orientação e Mobilidade Or Orientação da mão ORM Olimpíada Regional de Matemática ORMM Olimpíada Regional de Matemática Mirim OMS Organização Mundial de Saúde PA Ponto de Articulação PAE Plano de Atendimento e Evolução PBE Práticas Baseadas em Evidências PC Paralisia Cerebral PcD Pessoa com Deficiência PDI Plano de Desenvolvimento Individual PEATE Potencial Evocado Auditivo do Tronco Encefálico PECS Picture Exchange Communication System PEP-R Perfil Psicoeducacional Revisado PP Prompting L1 Primeira Língua L2 Segunda Língua PAEE Público-alvo da Educação Especial PPP Projeto PolíticoPedagógico QIIAHSD-A-1º-4º Questionário de Autonomeação QIIAHSD-A Questionário de Identificação de Indicadores de AH/SD-Aluno QIIAHSD-Pr Questionário de Identificação de Indicadores de AH/SD-Professor QIIAHSD-R Questionário de Identificação de Indicadores de AH/ SD-Responsáveis RI Realizou com Independência R+ Reinforcement Seesp Secretaria de Educação Especial SAEDE Serviço de Atendimento Educacional Especializado SED/SC Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina SISGESC Sistema de Gestão Educacional de Santa Catarina SGPe Sistema de Gestão de Processos Eletrônicos SRV Serviço de Reabilitação Visual SUS Sistema Único de Saúde TA Task Analysis TA Tecnologia Assistiva TDAH Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade TEA Transtorno do Espectro Autista TIC Tecnologia de Informação e de Comunicação ToM Teoria da Mente UBS Unidades Básicas de Saúde VC Visual Support SUMÁRIO INTRODUÇÃO __________________________________________________________________________ 011 CAPÍTULO 1 O PROCESSO HISTÓRICO DE CONCEPÇÃO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE): MARCOS LEGAIS _______________________________________________ 013 CAPÍTULO 2 CARACTERIZAÇÃO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) __________ 018 CAPÍTULO 3 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL (DI) _________________________________________________ 024 CAPÍTULO 4 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA VISUAL (DV) _______________________________________________________ 061 CAPÍTULO 5 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM SURDEZ E DEFICIÊNCIA AUDITIVA (DA) _________________________ 086 CAPÍTULO 6 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA FÍSICA (DF) _________________________________________________________ 109 CAPÍTULO 7 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) DE ESTUDANTES COM SURDOCEGUEIRA ______________________ 120 CAPÍTULO 8 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) ____________________________________ 139 CAPÍTULO 9 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE (TDAH) _____________ 185 CAPÍTULO 10 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM ALTAS HABILIDADES/ SUPERDOTAÇÃO (AH/SD) _________________________________ 213 11 INTRODUÇÃO O documento Diretrizes para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Rede Regular de Ensino de Santa Catarina é resultado das ações voltadas às demandas dos serviços e atendimentos da Educação Especial, na rede regular ensino, desenvolvidas pelos órgãos gestores da política estadual de Educação Especial, quais sejam, a Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) e a Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina (SED/SC). Desde a publicação da Política de Educação Especial de Santa Catarina, no ano de 2006, e sua atualização no ano de 2009, importantes marcos legais e conceituais, que lhe deram sustentação, sofreram alterações, expressando o movimento histórico mais amplo que determina as formas de se compreender os temas relacionados a esse campo da Educação. Dentre esses marcos, destacam-se resoluções publicadas pelo Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina (CEE/SC) para a Educação Especial; a atualização da Proposta Curricular de Santa Catarina; alterações na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; e a própria Política de Educação Especial adotada pelo Ministério da Educação (MEC). Novos marcos também foram publicados, como: Plano Nacional e Plano Estadual de Educação; a Base Nacional Comum Curricular; e, um con- junto de leis, decretos e resoluções federais e estaduais. Frente às demandas que se desdobram a partir desses novos referenciais e, em consonância com suas atribuições relacionadas à política estadual de Educação Espe- cial, representantes da FCEE e da SED entendem como pertinente avançar nas ações voltadas à orientação de professores e de gestores de escolas de Educação Básica para a oferta do Atendimento Educacional Especializado (AEE). Nesse sentido, este documento tem como: Objetivo Geral Apresentar a professores e a gestores as diretrizes para o AEE ofertado a es- tudantes com deficiências, Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtor- no de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) e Altas Habilidades/Super- dotação (AH/SD), matriculados na rede regular de ensino de Santa Catarina. E, como: Objetivos Específicos • Fomentar a implementação do serviço de AEE nas escolas da rede regu- lar de ensino; • Orientar a prática pedagógica para o AEE, no que tange a metodologias, técnicas, estratégias e recursos que podem ser utilizados pelo professor deste serviço. 12 O presente documento está organizado em dez capítulos. O capítulo introdutório, intitulado O processo histórico de concepção do Atendimento Educacional Especiali- zado: marcos legais, apresenta uma síntese de como o AEE assumiu o status de serviço complementar ou suplementar ao processo de aprendizagem dos estudantes que inte- gram o público da Educação Especial. No Capítulo 2, que trata da caracterização do AEE, seus objetivos e as atribuições do professor do AEE, são concentradas as diretrizes gerais para o desenvolvimento da prática pedagógica em AEE, sem adentrar nas especificidades de cada área. Nos capítulos subsequentes são abordadas as especificidades das áreas do AEE, são elas: Deficiência Intelectual, Deficiência Visual, Deficiência Auditiva e Surdez, Defi- ciência Física, Surdocegueira, Transtorno do Espectro Autista, Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade e Altas Habilidades/Superdotação. São capítulos constituídos por textos elaborados pelas equipes técnicas da FCEE, nos quais são apresentadas defi- nições e conceitos específicos, objetivos de cada atendimento, critérios de elegibilidade, estrutura e funcionamento, atribuições dos professores, metodologias de ensino, práti- cas, estratégias e recursos. Importante destacar, por fim, que as Diretrizes para o Atendimento Educacional Especializado na Rede Regular de Ensino de Santa Catarina se constitui em um docu- mento norteador dirigido à equipe escolar, sobretudo, aos professores do AEE e, portan- to, não se esgota em si mesmo. A sugestão é que o estudo do conteúdo aqui apresentado seja enriquecido por consulta ao amplo referencial bibliográfico indicado; constituin- do-se, dessa forma, como base para projetos de formação continuada alinhados com a transformação dos espaços escolares em lócus de reflexão crítica da sociedade. 13 CAPÍTULO 1 O PROCESSO HISTÓRICO DE CONCEPÇÃO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE): MARCOS LEGAIS Autoras: Rita de Cássia Kleber • Mestra em Educação – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) • Especialista em Tecnologias Educacionais – Pontifícia Universidade Católica (PUC/RJ) • Especialista em Psicopedagogia – Universidade do Sul do Estado de Santa Catarina (UNISUL) • Graduada em Pedagogia – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Liliam Guimarães de Barcelos • Mestra em Educação – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) • Especialista em Educação Especial – Faculdade do Grupo UNIASSELVI • Graduada em Pedagoga – Centro Universitário Municipal de São José (USJ) 14 1 O PROCESSO HISTÓRICO DE CONCEPÇÃO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE): MARCOS LEGAIS A adesão do Brasil às políticas internacionais de educação para todos - Conferência Mundial de Educação para Todos (1990); Conferência de Salamanca (1994); Fórum Mun- dial da Educação (2000); Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006) - direcionou, nas últimas três décadas, as reformas políticas nacionais, na perspectiva da implantação de sistemas educacionais inclusivos. Não obstante,às transformações con- ceituais em relação à educação dos estudantes com deficiências, TEA, TDAH e AH/SD, já apresentadas no documento Política de Educação Especial de Santa Catarina (SANTA CATARINA, 2018), os documentos normativos e orientadores da Educação Especial desse período indicam, também, transformações conceituais em relação ao Atendimento Edu- cacional Especializado (AEE) para esses estudantes. O marco inicial, que fundamenta o AEE como um serviço, ofertado na modalidade Educação Especial, é a instituição, em 2003, do Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, pelo governo federal. Esse programa, que teve como objetivo transformar os sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos (BRASIL, 2005) teve, como um de seus desdobramentos, o Programa de Implantação de Salas de Recursos Multi- funcionais, cujo objetivo foi “[...] apoiar os sistemas públicos de ensino na organização e oferta do atendimento educacional especializado e contribuir para o fortalecimento do processo de inclusão educacional nas classes comuns de ensino” (BRASIL, 2007, p. 1). Por meio desse programa, os municípios e estados brasileiros passaram a receber auxílio téc- nico e financeiro para a implantação de salas de recursos multifuncionais para a oferta do AEE, o que permitiu a expansão dessa proposta para todo o país. Em 2008, com a publicação da Política Nacional de Educação Especial na Perspec- tiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008a), o AEE foi reafirmado como um serviço, ofer- tado na modalidade Educação Especial. O Decreto n. 6.571, de 17 de setembro de 2008, que dispõe sobre o AEE, o define como “[...] o conjunto de atividades, recursos de acessibi- lidade e pedagógicos organizados institucionalmente, prestado de forma complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular” (BRASIL, 2008b). Os objetivos do AEE, elencados nesse documento, são: prover condições de acesso, participação e aprendizagem no ensino regular aos estudantes da Educação Especial, matriculados na rede pública de ensino regular; garantir a transversalidade das ações da Educação Especial no ensino regular; fomentar o desenvolvimento de recursos didáticos e pedagógicos que eliminem as barreiras no processo de ensino e aprendizagem; e asse- gurar condições para a continuidade dos estudos desses estudantes nos demais níveis de ensino (BRASIL, 2008b). A fim de instituir Diretrizes Operacionais para o AEE na Educação Básica, a Resolu- ção CNE/CEB n. 4, de 2 de outubro de 2009, passou a definir a sala de recursos multifun- cionais como lócus prioritários do AEE, cuja função é “[...] complementar ou suplementar a formação do aluno por meio da disponibilização de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias que eliminem as barreiras para sua plena participação na sociedade e de- senvolvimento de sua aprendizagem” (BRASIL, 2009, p. 1). Nesse documento, em seu Art. 5º, ficou estabelecido que o [...] AEE é realizado, prioritariamente, na sala de recursos multifuncio- nais da própria escola ou em outra escola de ensino regular, no turno inverso da escolarização, não sendo substitutivo às classes comuns, po- dendo ser realizado, também, em centro de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confes- sionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, conveniadas com a Secreta- ria de Educação ou órgão equivalente dos Estados, Distrito Federal ou dos Municípios (BRASIL, 2009, p. 2). 15 Por meio dessa Resolução, ficou estabelecido, também, que os estudantes matricu- lados em classe comum de ensino regular público, que tivessem matrícula concomitante no AEE, passariam a ser contabilizados duplamente, para fins de distribuição de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) (BRASIL, 2009). Tal medida garantiu a ampliação do repasse de recursos financeiros para escolas e Centros de Atendimento Educacional Es- pecializados (CAESPs) para implantação e oferta do AEE. O Decreto n. 7.611, de 17 de novembro de 2011, que revogou o Decreto n. 6.571/2008, passou a caracterizar o AEE como […] o conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucional e continuamente, prestado das seguintes formas: I – complementar à formação dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, como apoio permanente e li- mitado no tempo e na frequência dos estudantes às salas de recursos multifuncionais; ou II – suplementar à formação de estudantes com altas habilidades ou superdotação (BRASIL, 2011, online). Essa definição aprofundou conceitualmente os termos “complementar” e “su- plementar”, apresentados no Decreto n. 6.571/2008 e na Resolução CNE/CEB n. 4/2009, indicando que o primeiro se refere aos apoios prestados para favorecer a formação de estudantes com deficiência e estudantes com transtornos globais do desenvolvimento, enquanto o segundo é direcionado à formação do grupo de estudantes com AH/SD. Tendo em vista as mudanças legais e conceituais em relação à Educação Especial, o Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei n. 13.005/2014, instituiu como a meta n. quatro (4) a universalização do acesso à educação básica e ao AEE para os estudantes da Educação Especial, “[...] preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados” (BRASIL, 2014, online). Para alcançar essa meta é prevista, dentre outras ações, a garantia de “[...] atendimen- to educacional especializado em salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou ser- viços especializados, públicos ou conveniados, nas formas complementar e suplementar” a todos os estudantes que compõem o público da Educação Especial (BRASIL, 2014, online). Em consonância com as políticas nacionais para a Educação Especial, o estado de Santa Catarina definiu, em 2006, a Política de Educação Especial do Estado de Santa Ca- tarina, denominando as salas de recursos multifuncionais como Serviço de Atendimen- to Educacional Especializado (SAEDE). Esse serviço, caracterizado pelas áreas de atendi- mento específicas, teve como objetivo promover o “[...] atendimento das especificidades dos educandos com deficiência, com condutas típicas e, com altas habilidades matricu- lados na rede regular de ensino” (SANTA CATARINA, 2006, online). O Programa Pedagógico, que estabeleceu diretrizes para os serviços de Educação Especial no estado de Santa Catarina, define o SAEDE como “[...] uma atividade de caráter pedagógico, prestado por profissional da Educação Especial, voltado ao atendimento das especificidades dos alunos com deficiência, condutas típicas ou com altas habilidades, matriculados na rede regular de ensino” (SANTA CATARINA, 2009b, p. 25). O Programa orientou, ainda, que as atividades e recursos propostos no SAEDE não devem substituir as atividades e recursos disponibilizados no contexto da sala de aula regular, não podendo ser configurado como reforço escolar, mas como um “[...] conjunto de procedimentos es- pecíficos mediadores do processo de apropriação e produção de conhecimentos” (SANTA CATARINA, 2009b, p. 13). 16 Alinhado aos encaminhamentos em nível nacional, o Plano Estadual de Educação de Santa Catarina (2015-2024) manteve praticamente os mesmos termos da meta qua- tro, buscando garantir a universalização, para o público da Educação Especial em idade escolar obrigatória, do acesso à educação básica e ao AEE, preferencialmente na rede regular de ensino. Para atingi-la são previstas, dentre outras estratégias: o fomento, a im- plantação e a manutenção de salas de recursos multifuncionais; a promoção de formação continuada de professores para o AEE; a garantia de AEE em salas de recursos multi- funcionais, preferencialmente em escolas da rede regular de ensino ou em instituições especializadas, públicasou conveniadas; a ampliação da oferta de AEE, complementar e suplementar à escolarização dos estudantes, público da Educação Especial matriculados na rede pública e privada de ensino. Tais encaminhamentos apontam o AEE como ferra- menta para a promoção da Educação Especial nas escolas. Com base nesse aparato normativo e orientador da Educação Especial é possível constatar que, na última década, o AEE assumiu protagonismo, dentre os serviços ofere- cidos nessa modalidade de ensino, para os estudantes que compõem seu público-alvo. Dados apresentados no Plano Estadual de Educação de Santa Catarina apontam que houve crescimento no número de matrículas no AEE, uma vez que, em 2013, foram regis- tradas 10.886 matrículas, em 1.020 estabelecimentos escolares, com oferta majoritária nas escolas públicas. O Censo Escolar de Santa Catarina, por sua vez, evidencia que, entre os anos de 2010 e 2019, foram registradas matrículas de 35.350 estudantes catarinenses nes- se serviço. Esses dados expressam a relevância da proposta do AEE para os estudantes da Educação Especial no estado. Diante das necessidades emergentes no campo da Educação Especial, após dez anos da implantação da Política de Educação Especial do Estado de Santa Catarina, o Governo do Estado instituiu a Resolução CEE/SC n. 100, de 13 de dezembro de 2016, que revogou a Resolução CEE/SC n. 112/2006, a fim de estabelecer normas para a Educação Especial no Sistema Estadual de Educação de Santa Catarina. A partir dessa Resolução, a Educação Especial ficou entendida como […] a modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para o atendimento das necessidades educa- cionais especiais de alunos com deficiência, transtorno do espectro autista, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e altas habili- dades/superdotação (SANTA CATARINA, 2016, online). De forma a aproximar a proposta política para a Educação Especial do estado de Santa Catarina às políticas para a Educação Especial nacionais, a Resolução CEE/SC n. 100/2016 passou a definir o SAEDE como AEE que, disponibilizado na rede regular de en- sino, no contraturno, tem como objetivo “[...] complementar ou suplementar o processo de aprendizagem dos alunos especificados nesta Resolução, não configurando como en- sino substitutivo nem como reforço escolar” (SANTA CATARINA, 2016, online). No documento Política de Educação Especial de Santa Catarina, publicado pela SED/SC em 2018, esse conceito é aprofundado, com base na política nacional de Educação Especial, sendo o AEE definido como “[...] um serviço da Educação Especial que tem por objetivos identificar, elaborar, e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade, que eliminem as barreiras para a plena participação dos estudantes, considerando suas neces- sidades específicas” (SANTA CATARINA, 2018, p. 47). O documento pontua, também, que o [...] ensino oferecido no AEE é necessariamente diferente do ensino escolar e não pode caracterizar-se como um espaço de reforço ou complementação das atividades escolares. São exemplos práticos de atendimento educacional especializado: o ensino da Língua Brasilei- ra de Sinais (LIBRAS) e do Sistema Braille, a introdução e formação 17 do estudante na utilização de recursos de tecnologia assistiva, como a comunicação alternativa e os recursos de acessibilidade ao com- putador, a orientação e mobilidade, a preparação e disponibilização ao estudante de material pedagógico acessível, entre outros (SANTA CATARINA, 2018, p. 45). Tal perspectiva delineia para o AEE uma função específica, que difere do ensino es- colar ofertado na sala de aula regular: assume o caráter de oferta de apoios necessários para que os estudantes da Educação Especial possam se apropriar do conhecimento sis- tematizado no ambiente da sala de aula regular, assim como os demais estudantes. Nesse contexto, a atuação do(a) professor(a) do AEE assume também um caráter específico, tendo em vista a necessidade de se conhecer as especificidades das áreas de atendimento da Educação Especial, com base em uma perspectiva teórica que permita planejar e orientar as atividades a serem desenvolvidas com os estudantes que compõem seu público-alvo, visando que esses possam ter acesso aos conhecimentos historicamen- te produzidos pela humanidade. 18 CAPÍTULO 2 CARACTERIZAÇÃO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) Autoras: Rita de Cássia Kleber • Mestra em Educação – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) • Especialista em Tecnologias Educacionais – Pontifícia Universidade Católica PUC/RJ) • Especialista em Psicopedagogia – Universidade do Sul do Estado de Santa Catarina (UNISUL) • Graduada em Pedagogia – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Liliam Guimarães de Barcelos • Mestra em Educação – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) • Especialista em Educação Especial – Faculdade do Grupo UNIASSELVI • Graduada em Pedagoga – Centro Universitário Municipal de São José (USJ) 19 2 CARACTERIZAÇÃO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) O Atendimento Educacional Especializado (AEE), na Rede Regular de Ensino de Santa Catarina, caracteriza-se como um serviço, disponibilizado pela escola, para ofere- cer o suporte necessário às necessidades educacionais dos estudantes com Deficiên- cias, Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperativi- dade (TDAH) e Altas habilidades/Superdotação (AH/SD). Entende-se que, devido às questões inerentes à sua deficiência, transtorno ou al- tas habilidades, os estudantes que compõem o público da Educação Especial experi- mentam barreiras que podem interferir em sua aprendizagem escolar. Nessa perspec- tiva, as atividades desenvolvidas no AEE não têm caráter de ensino substitutivo, nem de reforço escolar, mas, sim, de complementação e/ou suplementação da formação desses estudantes, por meio da disponibilização de métodos, estratégias e recursos de aces- sibilidade que eliminem as barreiras de aprendizagem, de forma a favorecer o acesso desses estudantes ao conhecimento sistematizado no ambiente escolar. A complementação refere-se ao conjunto de métodos, estratégias e/ou recursos de acessibilidade que permita aos estudantes com deficiências e transtornos acessa- rem o currículo escolar. A suplementação refere-se ao conjunto de estratégias de enri- quecimento curricular desenvolvido para os estudantes com AH/SD. São exemplos de métodos, estratégias e/ou recursos de acessibilidade a serem desenvolvidos para a complementação do processo educacional dos estudantes atendidos no AEE: Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e LIBRAS tátil; alfabeto digital; Tadoma; Língua Portuguesa na modalidade escrita; Sistema Braille; orientação e mobilidade (OM); informática acessível; Sorobã (ábaco); estimulação visual; Comunicação Alternativa e Aumentativa (CAA); e, desenvolvimento de atividades pedagógicas que favoreçam a atividade cognitiva (SANTA CATARINA, 2018). São exemplos de estratégias a serem desenvolvidos para a suplementação do processo educacional dos estudantes atendidos no AEE: atividades de enriquecimento curricular. São recursos previstos para o AEE: materiais di- dáticos e pedagógicos acessíveis (livros, desenhos, mapas, gráficos e jogos táteis, em LIBRAS, em Braille, em caráter ampliado, com contraste visual, imagéticos, digitais, entre outros); Tecnologias de Informação e de Comuni- cação (TIC) acessíveis (mouses e acionadores, teclados com colmeias, sinteti- zadores de voz, linha Braille; recursos ópticos; pranchas de CAA, engrossado- res de lápis, ponteira de cabeça, plano inclinado, tesouras acessíveis, quadro magnético com letras imantadas (SANTA CATARINA, 2018), dentre outros. A oferta do AEE deve constar no Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola, prevendo, na sua organização: o espaço físico, os mobiliários, os materiais didáticos, os recursos pedagógicos e de acessibilidade e os equipamentos específicos, necessários ao desenvolvimentoda prática pedagógica com os estudantes atendidos nesse ser- viço; o Plano do AEE, contendo a identificação das necessidades educacionais espe- cíficas de todos os estudantes público da Educação Especial matriculados na escola e a definição dos recursos necessários e das atividades a serem desenvolvidas com 20 os estudantes atendidos no AEE; cronograma de atendimento dos estudantes; pro- fessor para o exercício da docência do AEE e demais profissionais que atuam com os estudantes da Educação Especial na escola (segundo professor de turma, tradutor e intérprete de LIBRAS, guia-intérprete, profissionais de apoio para as atividades de ali- mentação, higiene e locomoção). 2.1 ELEGIILIDADE O AEE deverá ser disponibilizado aos estudantes com deficiências, TEA, TDAH e AH/ SD, matriculados na rede regular de ensino de Santa Catarina, no contraturno da escola- rização regular, prioritariamente, na própria escola onde o(a) estudante estiver matricula- do(a), ou em outra escola de ensino regular, podendo ser realizado, também, em Centros de Atendimento Educacional Especializados (CAESPs), conveniados com a Fundação Ca- tarinense de Educação Especial (FCEE) (SANTA CATARINA, 2016). Os critérios para inclu- são de cada grupo de estudantes estão elencados nas Diretrizes específicas de cada área. Não poderão ser incluídos no AEE: • Estudantes com idade entre 4 e 5 anos que frequentam o Programa de Estimula- ção Precoce nas instituições especializadas; e, • Estudantes com idade superior a 14 anos que estiverem frequentando Programa de Educação Profissional nas instituições especializadas. 2.2 OBJETIVO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) Conforme a Resolução CEE/SC n. 100/2016, o AEE tem como objetivo complemen- tar ou suplementar o processo de aprendizagem dos estudantes com deficiências, TEA, TDAH e AH/SD, matriculados na rede regular de ensino de Santa Catarina (SANTA CATARINA, 2016). 2.3 ATRIBUIÇÕES DO PROFESSOR DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) A seguir estão listadas as atribuições do professor do AEE em relação ao atendimen- to ao(s) estudantes(s), às assessorias e orientações na escola e à organização do espaço e da documentação dos estudantes, previstas no documento Política de Educação Espe- cial (SANTA CATARINA, 2018). Além das atribuições destacadas neste capítulo, são previs- tas outras atribuições nas Diretrizes específicas de cada área de atendimento. Atribuições em relação ao atendimento ao(s) estudantes(s): a) Realizar avaliação inicial do estudante para planejamento do atendimento. Essa avaliação deve identificar o nível de desenvolvimento real do estudante, quanto à estrutura da percepção, atenção, pensamento e linguagem. Identificar ainda os recursos de acessibilidade utilizados pelo estudante, bem como as com- petências para a realização das atividades de vida prática escolar; b) Elaborar e executar planejamento de atividades, conforme as especificidades dos estudantes; 21 c) Elaborar relatório pedagógico descritivo do desenvolvimento de cada estudante; d) Realizar avaliação processual para analisar o desenvolvimento do estudante e revisão do planejamento; e) Organizar os agrupamentos por área de deficiência, Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) ou altas habilidades, considerando a necessidade de metodologias diferenciadas para o atendimento de cada uma destas áreas; f) Avaliar e decidir, em articulação com equipe técnico-pedagógica da escola, o desligamento do(s) estudante(s) deste serviço (SANTA CATARINA, 2018, p. 47). Atribuições relacionadas às assessorias e orientações na escola: a) Promover, sistematicamente, junto à equipe gestora e docente da unidade escolar, repasses técnicos referentes ao atendimento; b) Realizar assessorias sistemáticas na escola em que o estudante do Atendi- mento Educacional Especializado (AEE) está matriculado, registrando as ques- tões elencadas, as orientações e os encaminhamentos realizados durante a assessoria; c) Orientar e subsidiar, quando solicitado, a equipe gestora e docente da unida- de escolar onde está implantado o AEE, a respeito dos estudantes considerados da Educação Especial, matriculados na escola, mas que não são atendidos por este serviço; d) Registrar por escrito as orientações realizadas durante a assessoria deixando uma cópia com a escola e outra no arquivo do estudante no AEE; e) Realizar reuniões com as famílias, com o objetivo de informar sobre a finali- dade do atendimento e orientar sobre a importância da participação da família neste trabalho, realizando registros escritos das orientações realizadas, com a assinatura de todos os envolvidos; f) Participar de reuniões e conselhos de classes na unidade escolar onde o estu- dante está matriculado; g) Participar da elaboração do Projeto Político-Pedagógico (PPP); h) Participar de reuniões com o profissional responsável pela Educação Especial da Coordenadoria/Supervisão Regional de Educação, para estudo e orientação técnica referente ao trabalho realizado no AEE; i) Orientar o professor da classe regular quanto às adequações curriculares no contexto da metodologia avaliação (SANTA CATARINA, 2018, p. 48). 22 Atribuições quanto à organização do espaço e da documentação dos estudantes: a) Zelar para que os materiais da sala de recursos multifuncionais cedidos pelo Ministério da Educação (MEC) sejam de uso exclusivo dos estudantes, públi- co da Educação Especial, os quais devem permanecer na sala do Atendimento Educacional Especializado (AEE), bem como pela sua preservação. Caso algum material seja emprestado para uso na sala de aula dos demais estudantes, cabe ao professor do AEE controlar esta movimentação; b) Realizar um levantamento, a cada início e final de ano letivo, dos materiais e recursos da sala do AEE, que deverá ser entregue à direção da unidade escolar; c) Organizar a sala do AEE de acordo com as especificidades de cada grupo de atendimento, procurando evitar a exposição do estudante a muitos estímulos que podem interferir no desenvolvimento das atividades; d) Organizar um arquivo de cada estudante contendo todos os documentos atualizados: cópia do diagnóstico, parecer de inclusão emitido pela equipe téc- nica da Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) e Secretaria de Es- tado da Educação (SED), relatório de cada assessoria/orientação realizada na escola, avaliação inicial, planejamento, registros dos atendimentos e relatório final. Este arquivo deve permanecer na sala do AEE com cópia na secretaria da escola que o estudante está matriculado (SANTA CATARINA, 2018, p. 48). 2.4 REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Especial (Seesp). Educa- ção inclusiva: direito à diversidade. Brasília, DF: MEC; SEESP, 2005. BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Especial (Seesp). Salas de recursos multifuncionais: espaço para atendimento educacional especializado. Brasília, DF: MEC; SEESP, 2006. BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Portaria Normativa n. 13, de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a criação do “Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncio- nais”. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 abr. 2007. BRASIL. Política nacional de educação especial na perspectiva inclusiva. Brasília, DF: MEC/SEESP, 2008a. BRASIL. Decreto n. 6.571, de 17 de setembro de 2008. Dispõe sobre o Atendimento Edu- cacional Especializado, regulamenta o parágrafo único do art. 60 da lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e acrescenta dispositivo ao Decreto no 6.253, de 13 de novembro de 2007. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 set. 2008b. BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Conselho Nacional de Educação. Câmara de Edu- cação Básica. Resolução n. 4, de 2 de outubro de 2009. Institui Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educa- ção Especial. Diário Oficial da Educação, Brasília,DF, Seção 1, p. 17, 5 out. 2009. BRASIL. Decreto n. 7.611, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providências. Brasília, DF: PR, 2011. BRASIL. Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá outras providências. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2014. (Edições Câmara). 23 SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Proposta Curricular de Santa Catarina: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio. Temas multidiscipli- nares. Florianópolis, SC: COGEN, 1998a. SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Proposta Curricular de Santa Catarina: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio. Formação docente para educação infantil e séries iniciais. Florianópolis, SC: COGEN, 1998b. SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Proposta Curricular de Santa Catarina: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio. Disciplinas curricu- lares. Florianópolis, SC: COGEN, 1998c. SANTA CATARINA. Conselho Estadual de Educação. Resolução CEE/SC n. 112, de 12 de dezembro de 2006. Fixa normas para a Educação Especial no Sistema Estadual de Edu- cação de Santa Catarina. Florianópolis, SC: CEE, 2006. SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Educação. Fundação Catarinense de Educa- ção Especial. Programa pedagógico. São José, SC: FCEE, 2009. SANTA CATARINA. Lei n. 16.794, de 14 de dezembro de 2015. Aprova o Plano Estadual de Educação (PEE) para o decênio 2015-2024 e estabelece outras providências. Florianópolis, SC: [s. n.], 2015. SANTA CATARINA. Conselho Estadual de Educação. Resolução CEE/SC n. 100, de 13 de dezembro de 2016. Estabelece normas para a Educação Especial no Sistema Estadual de Educação de Santa Catarina. Florianópolis, SC: [s. n.], 2016. SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Educação. Política de Educação Especial. Florianópolis, SC: Secretaria de Estado da Educação, 2018. 24 CAPÍTULO 3 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL (DI) Autores: Fabiana de Melo Giacomini Garcez • Especialista em Psicopedagogia – Faculdade Internacional de Curitiba • Especialista em Educação Especial - Formação Continuada de Professores para o Atendimento Educa- cional Especializado - Universidade Federal do Ceará (UFC) • Graduada em Pedagogia com Habilitação em Educação Especial – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Luciana da Silva • Cursando Aprimoramento em Avaliação e Intervenção nos Transtornos de Aprendizagem – Instituto La Via • Especialista em Prática Interdisciplinar: Educação Infantil e Séries Iniciais – Faculdade de Capivari (FUCAP) • Especialista em Educação Especial - Formação Continuada de Professores para o Atendimento Educacional Especializado - Universidade Federal do Ceará (UFC) • Especialista em Psicopedagogia Clínica – Institucional pela Universidade Candido Mendes (UCAM) • Graduada em Pedagogia – Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC) Joicelane Silva • Especialista em Práticas Pedagógicas Interdisciplinares: Educação Infantil, Series do Ensino Fun- damental e Médio – FACVEST • Especialista em Neuropsicopedagogia Clínica – CENSUPG • Graduada em Ciências Sociais – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) • Graduada em Pedagogia – Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) Daiane Antunes Duarte • Graduada em Educação Especial – Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Mariele Finatto • Mestranda em Educação - Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) • Especialista em Recursos Estruturados e Estratégias Clínicas no Autismo – Faculdade PolisCivitas (FPC) • Especialista em Neuropsicopedagogia Clínica - Centro Sul Brasileiro de Pesquisa Extensão e Pós- Graduação Ltda (CENSUPEG) • Especialista em Neuropsicopedagogia e Educação Especial Inclusiva - Centro Sul Brasileiro de Pesquisa Extensão e Pós-Graduação Ltda (CENSUPEG) • Graduada em Pedagogia - Universidade de Caxias do Sul (UCS) Maria Cristina de Souza Santos • Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional - Instituto de Estudos Avançados e Pós- graduação/PR (ESAP) • Especialista em Educação Especial: Atendimento às Necessidades Especiais – UNIVALE/PR • Graduada em Pedagogia - Faculdade Intermunicipal do Noroeste do Paraná Juliana Torres de Rosso Barbat • Especializanda em Transtorno do Espectro Autista - Faculdade de Rhema • Graduada em Educação Especial - Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Sandra Montedo • Especialista em Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes – Universidade de São Paulo (USP) • Graduada em Pedagogia com Habilitação em Educação Especial – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) 25 3 DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL (DI) De acordo com dados obtidos no Sistema de Gestão Educacional de Santa Catari- na (SISGESC) referentes ao mês março de 2021, a rede pública estadual de ensino regis- tra um total de 8.273 (oito mil, duzentos e setenta e três) matrículas de estudantes com diagnóstico de Deficiência Intelectual (DI). Esse público forma o maior contingente de estudantes que frequentam o Atendimento Educacional Especializado (AEE), no estado de Santa Catarina. Levando-se em consideração esse público e suas especificidades, é possível cons- tatar a necessidade de mais estudos concernentes às práticas e às metodologias desen- volvidas para tal atendimento, uma vez que essa clientela exige ajustes e adaptações no contexto escolar, sendo necessário o aprofundamento teórico pautado em evidências científicas e em mudanças de práticas pedagógicas descontextualizadas, pois “[...] o in- sucesso se deve, entre outros, ao fato do ambiente não proporcionar a esses alunos um ambiente que minimize suas limitações, [...] ou ainda a carência de alternativas metodoló- gicas ou curriculares que favoreçam a aprendizagem” (TEIXEIRA et al., 2018, p. 244). Outro aspecto diz respeito ao número expressivo de estudantes com DI que, devido às suas especificidades, permanecem segregados no próprio ambiente escolar por falta de oferta de atendimento adequado que leve em consideração os vários domínios de funcionamento adaptativo, como as habilidades sociais, independência em atividades da vida diária e habilidades acadêmicas (TEIXEIRA et al., 2018, p. 244). Nesse sentido, é importante ressaltar que o serviço de AEE não deve focar apenas nos recursos a serem utilizados, mas, acima de tudo, é preciso ter claro que as metodo- logias, as estratégias e os recursos objetivam instrumentalizar o estudante possibilitan- do-lhe compreensão e construção do pensamento, elaboração de conceitos e, com isso, acesso ao conhecimento sistematizado do ensino regular. Considerando esse universo de estudantes, o qual integra o público da Educação Especial em Santa Catarina, pretende-se, com o presente documento, demonstrar a ne- cessidade de atualização e de qualificação da prática pedagógica que vem sendo realiza- da no AEE, a fim de que “[...] os serviços e recursos de acessibilidade sejam transversais a todas as etapas de ensino e garantam [...] acesso, permanência, participação e aprendiza- gem” do estudante com DI (TEIXEIRA et al., 2018, p. 244). 3.1 DEFINIÇÃO DE DEFICIÊNCIA INTELECTUAL (DI) Objetiva-se por meio das reflexões aqui apresentadas, aprofundar a concepção De- ficiência Intelectual e, para tal, serviremo-nos do manual desenvolvido pela American Association on Intellectual and Developmental Disabilities (AAIDD) 2010 e do “Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais” (DSM-5) (AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION, 2014), ambos documentos norteadores quando o assunto é DI. Chama atenção a concepção de DI proposta pela AAIDD (2010), já que consiste numa concepção multidimensional, funcional e bioecológica de deficiência, com enfo- que em inovações e reflexões teóricas que possibilitem evoluções. Tal concepção prevêa identificação das limitações de um sujeito para justificar e indicar os apoios de que necessita, ou seja, diferente do diagnóstico orientado pela inca- pacidade, o foco não é a deficiência em si, mas os apoios que irá necessitará para evoluir nas áreas que precisam ser qualificadas e estruturadas. A AAIDD (2010) tem como eixo principal o estudo sobre DI, definindo terminologias, conceitos, orientações e sistema de classificações. Nesse contexto, 26 [...] deficiência intelectual é caracterizada pela limitação significativa tanto no funcionamento intelectual como no comportamento adap- tativo que se expressam nas habilidades conceituais, sociais e práticas. A deficiência origina-se antes dos 18 anos de idade (AAIDD, 2010, p. 1). Para compreensão de DI, a AADID (2010) propõe cinco dimensões. São elas: • Dimensão I - Habilidades intelectuais: inclui raciocínio, planejamento, re- solução de problemas, pensamento abstrato, compreensão de ideias com- plexas, rapidez de aprendizagem e aprendizagem pela experiência; • Dimensão II - Comportamento adaptativo: conjunto de habilidades con- ceituais, sociais e práticas desenvolvidas para responder adequadamente ao ambiente físico e social. Várias outras competências são exigidas nessa dimensão, conforme segue: habilidades conceituais (linguagem receptiva e expressiva, aspectos acadêmicos e cognitivos, leitura e escrita, uso do di- nheiro); habilidades sociais (responsabilidade social, prudência, cautela, evi- tar ser vitimizado); habilidades práticas (alimentar-se, deslocar-se, higieni- zar-se, segurança); • Dimensão III – Saúde: considerar fatores etiológicos, de saúde física e mental; • Dimensão IV – Participação: refere-se às interações do deficiente na vida familiar, no trabalho, na educação e no lazer; e, • Dimensão V – Contexto: relaciona-se à bagagem de vida da pessoa, le- vando-se em consideração a família, a comunidade, os serviços de apoio, as influências culturais. Vale ressaltar que a análise dessas dimensões deve levar em consideração os se- guintes aspectos: primeiramente, as limitações no funcionamento atual da pessoa de- vem ser consideradas em relação aos contextos comunitários, à faixa etária e à cultura. Da mesma forma, um processo de avaliação somente pode ter validade se levar em conta a diversidade cultural e linguística, formas de comunicação, aspectos sensoriais, motores e comportamentais. Pode-se exemplificar tais aspectos quando do emprego de testes verbais com crianças que não falam, ou quando colocamos todos dentro de um mesmo contexto cultural, social e de oportunidades, mesmo diante da diversidade social, econô- mica e cultural. Um exemplo claro são as crianças que vivem em cidades urbanas e outras em cidades rurais (GARCEZ, 2016). Depois, deve-se levar em conta que, em cada sujeito, existem limitações e poten- cialidades, e essas limitações devem ser percebidas no sentido de oportunizar os apoios necessários para minimizar as dificuldades. Por fim, os apoios individualizados permitem a melhora da funcionalidade da pessoa com deficiência (PcD). Quanto às necessidades de apoio, trata-se, segundo Carvalho (2010) de um constru- to psicológico referente ao padrão e à intensidade de apoios necessários para que as pes- soas com deficiência participem de atividades como as demais pessoas. Nesse sentido, a intensidade do apoio leva em conta as necessidades específicas de cada sujeito, suas condições pessoais, situações de vida e faixa etária. Importante ressaltar que a abordagem da AAIDD (2010) tem influenciado sistemas de classificação, no caso o DSM-5, o qual estabelece especificadores de gravidade para 27 fins diagnósticos, que foram divididos em três domínios: conceitual, social e prático. Os domínios estão relacionados ao funcionamento adaptativo, voltados para os níveis de apoio que cada pessoa necessita para desenvolver suas capacidades. No primeiro domínio estão contidos agrupamentos de déficits em ha- bilidades de raciocínio, solução de problemas, planejamento e apren- dizagem escolar, dentre outros, que podem ser auferidos por testes de inteligência, por exemplo. O domínio social aponta para as dificulda- des nas relações sociais que se expressam, geralmente, nos prejuízos em competências para perceber, com precisão, pistas sociais dos pares, déficits para se comunicar, déficits para manter conversas de acordo com o esperado para a idade, dificuldades em regulação da emoção e do comportamento, dentre outros. O domínio prático descreve um conjunto de dificuldades em habilidades relacionadas a tarefas com- plexas da vida diária, em comparação com os pares, que resulta em prejuízos no desenvolvimento da independência pessoal (TEIXEIRA et al., 2018, p. 246, grifo nosso). Os aspectos levados em consideração nos sistemas conceituais são importantes para que se compreenda a condição da DI para além de uma concepção biológica, ou seja [...] relacionada diretamente à prática social, à cultura e à história, portanto, não é possível considerá-la apenas a partir de parâmetros biológicos, como marcas específicas da pessoa, visto que o sentido para qualquer uma das condições hu- manas é impregnado nas relações entre os homens com sua história e seu tempo (PLETSCH; OLIVEIRA, 2013, p. 64). Traçando-se um paralelo entre a concepção atual de DI, adotada nos manuais refe- ridos anteriormente, e a obra de Lev Vygotsky, é notável a contribuição desse autor, visto que ele valoriza as potencialidades e capacidades da PcD, não atribuindo ênfase ou des- taque às impossibilidades dela e, além disso, ressalta a importância que se deve dar às relações, bem como, à qualidade destas. Nessa perspectiva, [...] [o] sistema conceitual da AAIDD aproxima-se dos preceitos vigotskianos, visto que enfatiza a prática social e considera a deficiência intelectual complexa [...]. Isso significa dizer que a deficiência intelectual não representa um atributo da pessoa, mas um estado particular de funcionamento e, portanto, para funcionar bem, depende das condições ofertadas a ela, que são sociais e não, exatamente, às condições primarias do seu desenvolvimento, ou seja, de suas condições bioló- gicas (PLETSCH; OLIVEIRA, 2013, p. 65). Segundo Garcia (1999), Vygotsky defende a concepção de desenvolvimento que se orienta do plano social para o individual, intimamente relacionada ao modo como o sujei- to vive e às interações sociais com as quais está envolvido. Portanto, é preciso considerar que as limitadas oportunidades de interação das pessoas com deficiência, no seu contex- to social, podem interferir na aprendizagem e no desenvolvimento delas. Dessa forma, a DI em si não define a vida do sujeito, é um dos aspectos que o com- põem e que terá influência sobre ele de igual forma a diversas outras características, tanto biológicas quanto sociais. Baseado nessa premissa, Vygotsky propõe, em relação à concepção de deficiência, os conceitos de deficiência primária e secundária. Desse modo, para ele, [...] [a] deficiência primária é compreendida como biológica e a secundária como social. Nestes termos, a deficiência primária compreende as lesões orgânicas, le- sões cerebrais, mal formações orgânicas, alterações cromossômicas, ou seja, as 28 características físicas apresentadas pelo sujeito considerado portador de defi- ciência. A deficiência secundária, por sua vez, compreende o desenvolvimento do sujeito que apresenta estas características, com base nas interações sociais (GARCIA, 1999, p. 3). Assim sendo, concebe-se que a natureza humana não é dada apenas de forma bio- lógica, mas produzida nas relações intersubjetivas, o que remete à necessidade de se pensar cada sujeito, já que a humanidade é constituída nas relações sociais e nos proces- sos de mediação. Cabe entender o conceito de DI tendo-se, como prognóstico, que o sujeito que apre- senta essa deficiência irá se desenvolver com maior ou menor grau de qualidade de vida, principalmente, conforme os estímulos e compensaçõesque, a ele, forem oferecidas. A sociedade, e aqui mais diretamente a escola de ensino regular e o AEE, deve pre- ver caminhos de acesso ao conhecimento para todos os estudantes e, em sendo assim, [...] [o] apoio é compreendido como um conjunto de recursos e estratégias que visam a promover o desenvolvimento, a educação, os interesses e o bem-estar de uma pessoa e que melhoram o funcionamento individual. Nesse sentido, aproxima-se da própria definição ou ideia do suporte a ser oferecido por meio do Atendimento Educacional Especializado, já que os serviços podem ser entendi- dos como um tipo de apoio (AMERICAN ASSOCIATION ON INTELLECTUAL..., 2010 apud PLETSCH; OLIVEIRA, 2013, p. 65-66). Por fim, é primordial que se possa, como educadores, seguir uma concepção de DI pautada nos apoios e nas possibilidades de evolução do sujeito com DI, ou seja, com o olhar direcionado à capacidade dele, tendo como fundamento estudos de práticas e de metodologias voltadas para o processo de ensino e de aprendizagem, acesso ao currículo escolar e aos processos de avaliação, essenciais para a garantia de uma edu- cação de qualidade. 3.2 OBJETIVOS DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) 3.2.1 Objetivo Geral Promover o desenvolvimento de habilidades conceituais, sociais e práti- cas, possibilitando a melhora do funcionamento adaptativo dos estudan- tes com DI. 29 3.2.2 Objetivos Específicos • Ampliar a funcionalidade dos estudantes, qualificando os domínios conceitual, social e prático a partir de estratégias que estimulem o desenvolvimento cognitivo; • Qualificar as Funções Psicológicas Superiores (FPS) dos estudantes, com ações intencionais e mediação pedagógica; • Qualificar as Funções Executivas (FEs) dos estudantes, por meio de estraté- gias que desenvolvam o planejamento, a capacidade de raciocínio e a integra- ção de pensamentos e ações; • Elaborar e manter atualizado o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI), a partir de avaliações cognitivas sistemáticas e processuais; • Verificar a necessidade da utilização de Tecnologias Assistivas (TA), utilizan- do-as de maneira eficiente, apropriada e funcional; • Implementar recursos de TA, como a Comunicação Alternativa (CA), recur- sos de acessibilidade ao computador e a materiais pedagógicos acessíveis, orientando professores e familiares quanto ao uso; • Oferecer recursos pedagógicos e estratégias diferenciadas, de acordo com a necessidade de cada estudante, a fim de proporcionar a aprendizagem, o aprimoramento e o desenvolvimento de habilidades indispensáveis para sua escolarização, respeitando-se a idade cronológica; • Envolver o estudante em atividades lúdicas, funcionais e simbólicas, desenvol- vendo o processo de compreensão de conceitos abstratos e trocas com os pares; • Assegurar a utilização de metodologias pedagógicas, que vão ao encontro do perfil cognitivo de cada estudante, a fim de proporcionar a aprendizagem dos conceitos pretendidos; • Desenvolver a independência e a autonomia, reduzindo os apoios e opor- tunizando o desenvolvimento de atividades da vida prática, promovendo a ampliação de seu funcionamento adaptativo; • Identificar o nível de apoio necessário para cada estudante e propor tarefas que envolvam planejamento e organização, aumentando, gradativamente, as exigências com o propósito de ampliar sua autonomia; • Orientar a família sistematicamente quanto às estratégias que possam be- neficiar a autonomia e a independência do estudante, a fim de promover o seu desenvolvimento global; • Trabalhar colaborativamente, envolvendo a comunidade escolar no proces- so de ensino e aprendizagem dos estudantes, possibilitando a formação de redes de apoio que contemplem docentes, gestores escolares, famílias e pro- fissionais de saúde; • Realizar assessorias sistemáticas e orientações acerca de adequações, de adaptações e de metodologias necessárias ao processo de ensino e aprendi- zagem de cada estudante; • Elaborar registros de assessorias e de orientações realizadas para profes- sores, familiares e profissionais da saúde, registrando pontos específicos que foram discutidos; e, • Produzir relatório pedagógico ao final de cada ano letivo, contemplando o desenvolvimento do estudante, as habilidades trabalhadas, as dificuldades encontradas, os elementos do trabalho colaborativo realizado e demais aspec- tos observados. 30 3.3 ELEGIBILIDADE São elegíveis os estudantes com diagnóstico de DI/Transtorno do Desenvolvimento Intelectual (DSM-5, 2014) associada, ou não, a outras deficiências, matriculados na rede regular de ensino. 3.4 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO 3.4.1 Atendimentos O atendimento deve acontecer de forma individual ou em grupos, conforme a espe- cificidade dos estudantes; considerando-se a faixa etária, os objetivos, os recursos especí- ficos e as atividades pensadas para o processo de aprendizagem. Obrigatoriamente, este atendimento deve ser realizado, no período oposto à fre- quência escolar, duas vezes por semana, variando de 50 minutos a uma hora e meia, le- vando-se em consideração o PDI, a tolerância e a adaptação de cada estudante. 3.4.2 Espaço Físico O espaço físico deve ser exclusivo para o AEE. O mesmo ambiente, quando utilizado para diferentes serviços, pode modificar a disposição de mobiliários e de objetos de forma a atrapalhar o bom funcionamento da proposta de atendimento; deve contar, ainda, com a distribuição de materiais didáticos, pedagógicos e de equipamentos na sala. A sala deve estar situada nas dependências da escola, com acessibilidade arqui- tetônica, dispondo de espaço apropriado para circulação de uma ou mais cadeiras de rodas, em local mais silencioso, arejado, com boa iluminação, evitando-se estímulos vi- suais em excesso. 3.4.3 Organização do Atendimento O atendimento está organizado conforme as seguintes etapas: a) Entrevista com a família/cuidadores A entrevista com a família/cuidadores deve ser o primeiro procedimento a ser reali- zado, pois tem por objetivo colher informações importantes sobre o estudante, relativas ao seu desenvolvimento, à escolarização, aos atendimentos especializados, ao contexto em que vive, aos aspectos da saúde física, ao uso de medicação, ao lazer, às atividades de vida diária, à autonomia dele, dentre outras informações. O professor de AEE precisa estar atento às dúvidas e às queixas familiares, por isso é importante envolver a família no planejamento, a fim de que possa colaborar para o alcance dos objetivos traçados. No Apêndice A, deste documento, encontra-se disponível a sugestão de entrevista com a família/cuidadores. b) Estudos de caso Trata-se de uma estratégia que analisa a situação real do estudante, consideran- do o contexto no qual ele está inserido, identificando os fatos mais importantes com o intuito de encontrar alternativas assertivas sobre situações-problemas que possam difi- cultar o desenvolvimento do estudante. Deve acontecer de forma sistemática, reunindo, preferencialmente, todos os profissionais envolvidos com o estudante (professor do AEE, 31 professor do ensino comum, segundo professor, equipe de reabilitação, dentre outros). A partir dos estudos de caso, o professor de AEE deve elaborar o PDI com elementos des- tacados pelo grupo e que são objetivos do serviço. Os estudos de caso precisam ser registrados em documentos descritivos, con- tendo as discussões, os elementos que deverão compor o PDI e os encaminhamentos definidos. c) Avaliação inicial, processual e final Ao iniciar os atendimentos, o professor de AEE deverá destinar sessões para reali- zar a avaliação inicial, com o objetivo de identificar o nível de desenvolvimento real dos estudantes; nível esse relacionado aos seguintes aspectos: linguagem (compreensiva e expressiva), alfabetização, letramento, raciocínio lógico, estrutura de pensamento, fun- ções cognitivas, habilidades adaptativas, dentre outros. A avaliação, neste contexto, é empregada no sentido de reunir elementos, verifi- cando as possibilidadese o potencial de aprendizado de cada estudante para a elabo- ração do PDI. Algumas atividades pedagógicas, testes e protocolos abertos aos pedagogos podem ser instrumentos dessa sondagem inicial. Para estudantes com comprome- timentos mais graves, o emprego de instrumentos ecológicos são uma boa opção de avaliação inicial e, conforme Paz et al. (2017, p. 54), “[...] são caracterizados pela forma padronizada de aplicação associada a tarefas que simulam situações diárias de de- manda cognitiva [...]”. Auxiliam, ainda, na observação dos prejuízos cognitivos, por meio de ferramentas que se aproximam de situações reais pertinentes ao cotidiano. Ao longo dos atendimentos, deve ser realizada a avaliação processual com o pro- pósito de definir ou redefinir objetivos e estratégias para a elaboração do planejamen- to. O processo de avaliação ocorre de forma dinâmica, na prática diária, e deve ser re- gistrada. A avaliação é um requisito para o professor analisar sua prática pedagógica, verificar se os objetivos estão sendo alcançados e detectar o que precisa ser modifi- cado para atingir os objetivos traçados. O professor tem a oportunidade de rever seus procedimentos pedagógicos e, dessa forma, atender as necessidades de aprendiza- gem apresentadas pelos estudantes diante das avaliações processuais. A avaliação processual, nesse sentido, tem como objetivo analisar as mudanças que devem ocorrer no processo de pensamento, de cognição e das FE; contribuindo para a compreensão acerca de como intervir para promover o acesso do estudante a novos conhecimentos e/ou melhorar sua funcionalidade, pensando-se, continuamen- te, acerca do “que fazer para remover os obstáculos” relativos ao processo de aprendi- zagem, afinal, trata-se de “[...] uma avaliação do pensamento, da percepção da apren- dizagem e da resolução de problemas por meio de um processo ativo e dinâmico de ensino”, de acordo com Seabra et al. (2014, p. 185). A avaliação de pessoas com deficiência deve ser concebida como processual e sempre levando-se em conta a avaliação inicial e os objetivos que foram traçados, bem como, a qualidade das estratégias e das interações que foram oportunizadas. Pode-se afirmar também, que a avaliação é um procedimento que favorece a tomada de de- cisões e a diversificação das intervenções pedagógicas e não apenas como forma de identificar o desempenho do estudante. d) Elaboração do Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) O PDI é um instrumento com o objetivo de projetar as ações do professor, retra- tando as metas de aprendizagem que devem ser priorizadas nas intervenções de acor- do com as características de cada estudante. Tal plano deve contemplar os objetivos, 32 as estratégias, as atividades que serão realizadas, as habilidades que serão desenvolvi- das, os apoios dos quais o estudante precisou para finalizar a atividade e deve dispor de um espaço para o registro das observações realizadas pelo professor. Neste sentido, o PDI permitirá ao professor de AEE perceber e ampliar as possibi- lidades de aprendizado; tais possibilidades se evidenciam nas relações que ocorrem no decorrer do processo de mediação, possibilitando, assim, identificar a necessidade de adequações quanto a procedimentos e estratégias. Para tanto, deve conter as áreas que serão abordadas, descritas a partir da ava- liação inicial do estudante, tendo-se por base os domínios conceitual, social e prático. Além das áreas, deve conter os objetivos pretendidos, as estratégias que serão utiliza- das para o alcance destes objetivos, e os registros de avaliação processual para com- preender o desenvolvimento do estudante. As áreas são preestabelecidas de acordo com as habilidades que devem ser con- templadas, são elas: linguagem (expressiva e compreensiva), imaginação criativa (imi- tação, abstração), atenção (focalizada, seletiva, compartilhada), percepção (categorial, sensorial, orientação espacial, orientação temporal, percepção sinestésica, análise-sín- tese), memória (curto prazo, longo prazo, memória de trabalho), elaboração concei- tual (abstração, generalização), atividades motoras (equilíbrio, força, motricidade fina, motricidade ampla), FEs (controle inibitório, flexibilidade cognitiva, iniciação/volição, organização, planejamento, condução, autocontrole, automonitoramento e autorregu- lação), atividades de vida diária (atividades de vida básica e prática, autonomia) e o uso de TAs (CA e outras tecnologias). No Apêndice B, deste documento, encontra-se disponível a sugestão de PDI. e) Planejamento e registro diário O planejamento e registro de evolução diária deve conter todas as propostas que são realizadas com o estudante, elaboradas de acordo com os objetivos e as estra- tégias descritas no PDI. Diariamente o professor deve preenchê-lo com: o objetivo do atendimento, a descrição das atividades realizadas e o nível de apoio que o estudante necessitou para realizar a proposta e alcançar o objetivo. Para esse fim, entende-se como nível de apoio: Apoio Físico (AF), Apoio Gestual (AG), Apoio Verbal (AV) ou se o Realizou com Independência (RI). Há também a possi- bilidade de o estudante não ter realizado a tarefa, sendo, então, assinalado como NR. Uma sugestão de planejamento e de registro diário está no Apêndice C deste documento. f) Reavaliação e estudos de caso As reavaliações dos estudantes e estudos de caso devem ser realizados sistema- ticamente e de forma processual, para a atualização do PDI , bem como para proce- der os encaminhamentos que se fizerem necessários. Sugere-se que a reavaliação seja realizada semestralmente, seguida de estudos de caso; estas ações possibilitam que os profissionais envolvidos com o estudante possam analisar sua real situação, para, então, elencar novas metas e estratégias, eliminando possíveis barreiras impeditivas ao desenvolvimento do estudante. Nesses momentos de reavaliação e de estudo de caso o professor, junto aos de- mais membros da equipe, pode refletir sobre a necessidade, ou não, de rever os obje- tivos, as estratégias e as práticas pedagógicas. É importante que o professor regente e o segundo professor, caso haja, também participem desse momento, uma vez que o trabalho realizado no AEE deve subsidiar as habilidades necessárias para o trabalho realizado na rede regular de ensino. 33 Os estudos de caso devem ser registrados em documentos descritivos, conten- do as discussões, os elementos que deverão compor o PDI e os encaminhamentos definidos. g) Relatório final Entende-se como relatório final o documento contendo a descrição do trabalho rea- lizado com o estudante no AEE, ao longo do ano. Este relatório deve conter: contextuali- zação do serviço de AEE, descrição sobre a frequência do estudante nos atendimentos e descrição detalhada de aspectos referentes aos três domínios: conceitual, social e prático. É importante contemplar, sob cada domínio, aspectos referentes ao comportamen- to do estudante (socialização, respostas às regras, frustração, intolerância, atenção com- partilhada, hiperatividade, autoestima, insegurança/timidez, interação com seus pares, motivação, engajamento com as tarefas, dentre outros); aspectos referentes à aprendi- zagem (atenção, memória, percepção, simbolismo, imaginação, linguagem, concentração, raciocínio, funcionalidade, aprendizagem pelo concreto ou abstrato, noção de conceitos, nível de alfabetização, registro, leitura, escrita funcional, interpretação, coordenação moto- ra, conceitos matemáticos); aspectos referentes ao uso de recursos de TA; aspectos refe- rentes a atividades de vida diária; e, encaminhamentos e orientações para o ano seguinte. 3.5 METODOLOGIA DE ENSINO, PRÁTICAS E ESTRATÉGIAS A partir das reflexões realizadas até o momento, é de fundamental importância abordar as conceituações relacionadas à DI que prima pelo entendimento que ultrapas- sa o olhar de incapacidade e foca “[...] a escolarização de pessoas que apresentam defi- ciência intelectual e a sua apropriação dos conceitoscientíficos a partir dos referenciais da perspectiva histórico-cultural de Vygotsky e seus colaboradores” (PLETSCH; MENDES; HOSTINS, 2015, p. 8). Nesse contexto, Vygotsky defende, como pressuposto, que “[...] a criança cujo de- senvolvimento está complicado por um defeito não é simplesmente menos desenvolvida que seus pares normais, mas se desenvolve de outro modo” (VYGOTSKY, 1997, p. 12). Compreender esse “outro modo”, ou seja, as especificidades das pessoas com DI é o ponto de partida para todas as intervenções com esse público, principalmente no AEE, pois [...] o ensino oferecido às pessoas com deficiência, tendo como fundamento a Psi- cologia Histórico-cultural, deve preocupar-se com as possibilidades de desenvol- vimento, sempre no sentido de transcender a deficiência, de transpor a sua con- dição biológica, de transformar defeito em talento (DAMBRÓS et al., 2011, p. 135). Para Vygotsky, os seres humanos nascem apenas com recursos biológicos e somen- te com a inserção na cultura, por meio das relações sociais, são capazes de [...] superar funções meramente primárias ou elementares, para o de- senvolvimento de funções superiores, notadamente históricas e mar- cadas pela cultura. Esse processo é possível essencialmente por meio do ensino, que levará à aprendizagem. É no processo dialético entre o biológico e cultural que se concretizam os processos de objetivação e apropriação (PLETSCH; OLIVEIRA, 2013, p. 67). 34 Tal perspectiva teórica aponta para uma concepção de processo de ensino e apren- dizagem que remete à elaboração de uma proposta pedagógica que leve em considera- ção que os estudantes com DI “[...] possuem alterações nos processos mentais, as quais interferem na aquisição da leitura, dos conceitos lógicos- matemáticos, na realização das atividades da vida diária, no desempenho social, entre outras habilidades” (PLETSCH; OLI- VEIRA, 2013, p. 67). Sabemos das dificuldades encontradas no contexto escolar para a efetividade de uma prática pedagógica que respeite as especificidades do público da educação espe- cial, no entanto [...] acreditamos na possibilidade de superação quando professores estão instrumentalizados para desenvolver as funções psicológicas superiores dos educandos com deficiência intelectual, assim como possibilitar a apropriação de conceitos científicos (DAMBRÓS et al., 2011, p. 135). Sendo assim, é primordial que os professores do AEE, de modo consciente, com- preendam a importância de práticas que possibilitam o emprego de instrumentos me- diadores. Dessa forma, “[...] para uma ação pedagógica planejada e intencional, o pro- fessor precisa conhecer como se desenvolvem as funções psicológicas superiores e as possibilidades de intervenção com vistas à compensação da deficiência” (DAMBRÓS et al., 2011, p. 137). No trabalho com estudantes com DI é necessário superar a visão da incapacidade, marcada pelos aspectos biológicos e utilizar ferramentas capazes de “[...] reorganizar o psiquismo, buscando vias compensatórias, promovendo o desenvolvimento destes sujei- tos” (DAMBRÓS et al., 2011, p. 137). Nesse sentido, o conceito de compensação proposto por Vygotsky [...] consiste em criar condições e estabelecer interações que possibi- litem aos sujeitos com deficiência intelectual se desenvolverem. Para Vygotsky (1997), a deficiência de uma função ou lesão de um órgão faz com que o sistema nervoso central e o aparato psíquico assumam a tarefa de compensar o defeito. [...] Para ele, proporcionar elementos pedagógicos baseados na compensação não possibilita a cura da defi- ciência, mas oferece alternativas que podem contribuir para o desen- volvimento de áreas potenciais (PLETSCH; OLIVEIRA, 2013, p. 72). Além do entendimento do conceito de compensação, é indispensável que o traba- lho no AEE, com esses estudantes, tenha como premissa a qualificação das FPS e não o “reforço escolar”. Por essa razão, é construtivo compreender que o [...] desenvolvimento se dá por meio da relação e correlação das es- truturas elementares (reflexos, reações automáticas, associações sim- ples, entre outros), condicionadas principalmente por determinantes biológicos e as estruturas que emergem com a interação na cultura, denominadas processos psicológicos superiores (PLETSCH; OLIVEI- RA, 2013, p. 68). É fundamental que se adote as contribuições da Psicologia Histórico-cultural no contexto do AEE, para que os professores possam se instrumentalizar e, desse modo, pro- movam atendimentos efetivos. Para tanto, é necessário a compreensão de que os estu- dantes com DI necessitam de intervenções que desenvolvam suas funções cognitivas, conforme descreve-se a seguir. 35 3.5.1 Elaboração Conceitual Tendo-se por base a perspectiva histórico-cultural, torna-se importante compreen- der como ocorre a elaboração conceitual em estudantes com DI. Sendo assim, vejamos: O processo de elaboração conceitual em alunos com deficiência intelectual ocor- re a partir do constante processo de mediação pedagógica que se realiza através da interação entre indivíduos, professor/aluno e/ou aluno/aluno, o que envolve o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, as quais, para Vygotsky se originam das relações humanas e trocas coletivas (PIRES, 2018, p. 158). A estrutura de pensamento e a elaboração de conceitos formam-se e/ou tornam-se possíveis na interação, na dialética, na troca de experiências e nas relações interpessoais. Tais funções propiciam “[...] a estruturação da consciência, do pensamento humano e das operações abstratas” (SANTA CATARINA, 2014, p. 33), sendo construídas e reconstruídas com base no uso de instrumentos e de signos ao longo de toda a vida do sujeito. O processo de elaboração conceitual é contínuo, se apoia no desenvolvimento das FPS, ampliando a apropriação do significado das palavras e suas funções e, o modo como as pessoas desenvolvem-nas e colocam-nas em prática em seu contexto (OLIVEIRA et al., 2015); e “[...] a capacidade de elaborar conceitualmente o pensamento torna o indivíduo capaz de se relacionar com o mundo e com seus pares e interpretar a realidade que o cerca” (PIRES, 2018, p. 170). O conceito de pensamento verbal propõe a noção de conceitos, generalizações e abstrações, por meio do uso da linguagem, possibilitando a elaboração conceitual e a aquisição de conhecimentos científicos. A partir do trabalho que busca desenvolver o pensamento verbal, pretende-se que o estudante se apoie cada vez menos em instru- mentos concretos como possibilidade de aprendizagem e mais na elaboração conceitual que está em desenvolvimento. Já a percepção categorial precisa ser trabalhada no sentido de que o estudante con- siga identificar, comparar, classificar, seriar, quantificar e corresponder, parear, catego- rizar e compreender o traço essencial dos objetos, incluindo-os em categorias cada vez mais amplas e complexas. O trabalho com a percepção categorial permite ao estudante aperfeiçoar sua habilidade de análise e de síntese, ou seja, abstração e generalização. Neste sentido, trabalha-se com a elaboração conceitual para que o estudante se apoie na compreensão desses conceitos. O Método de Investigação de Luria (1986) apresenta indícios de como o pensamento se organiza pela palavra, na elaboração de conceitos (PIRES, 2018). Para o autor, [...] [o] elemento fundamental da linguagem é a palavra. A palavra de- signa coisas, individualiza suas características. Designa ações, relações, reúne os objetos em determinados sistemas. Dito de outra forma, a pa- lavra codifica nossa experiência (LURIA, 1986, p. 27). A palavra não somente designa uma coisa e separa suas características, mas fun- damentalmente generaliza, a inclui em determinada categoria, o que implica complexa função intelectual de generalização. Dito isto, deve-se compreender como acontecem tais processos de generalização, pois ao generalizar os objetos, a palavra converte-se em um instrumento de abstração, sendo a operação mais importante da consciência (LURIA,
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