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Entre tais especificidades, podemos citar: sempre é o soberano que decide a instituição do Estado de Exceção; o Estado de Exceção sempre é motivado por uma necessidade; mesmo com grande esforço de teóricos por conceituá-lo, ainda se trata de uma forma indeterminada de Estado; é um Estado em que temos a suspensão da lei; e, nesse formato de constituição estatal, temos presente o luto, a anomia e a festa anômica. Bem, se podemos compreender a Biopolítica como uma forma de o Estado gerir e controlar a vida humana, que teve seu início no século XVII, manteve-se no século XVIII e se mantém atualmente, podemos nos questionar: o que seria o Biopoder? Como resposta a essa pergunta, Foucault nos diz que o Biopoder é a forma de a Biopolítica se expressar. Na verdade, isso nos leva a outros conceitos que estão vinculados à questão do poder, sendo estes o de punição e de vigilância. Foucault nos coloca que até meados do século XIX vigiar era considerado melhor do que punir. A partir desse período surgiu uma nova expressão do poder, para além de vigiar, em que a punição assumiu um papel de destaque. A punição também funciona como um exemplo para que outras pessoas não cometam o mesmo erro. O corpo múltiplo representa os corpos coletivos controlados pelo Estado. O Neoliberalismo foi uma doutrina econômica e de regulação do Estado que em tese pressupõe a diminuição da intervenção estatal em viabilizar o acesso da população mais vulnerável às políticas e aos direitos sociais. Nesse período surgiu o que Foucault denominou pelo termo Homo economicus, que seria o ser humano estimulado para atender as novas exigências do mercado. O Biopoder é a forma de o Estado exercer a Biopolítica Biopoder – Destina-se ao controle das vidas – Relaciona-se ao controle de natalidade, mortalidade e longevidade – Forma de expressão da Biopolítica Disciplina -Controle dos corpos e estímulo de comportamentos – Orientada para o corpo Na obra Die diktatur, Schmitt orientou seus estudos para a questão da ditadura; chegou até a indicar que há duas imagens de ditaduras que podem ser construídas: a ditadura comissária e a ditadura soberana. Conforme o autor, a ditadura comissária defende a reforma da Constituição, ao passo que a ditadura soberana faz menção aos modelos em que o soberano torna-se um ditador. No ano de 1922, entretanto, Schmitt passou a se referir a esse formato de organização estatal com o termo “Estado de Exceção” (AGAMBEN, 2004). Gasparetto Junior (2014) nos coloca que a primeira menção ao Estado de Exceção no Brasil surgiu na Carta Magna de 1824. Nesse contexto, entretanto, o termo utilizado não era Estado de Exceção, e sim Estado de Sítio. Na Carta Magna de 1824, especialmente no artigo 179, dizia-se que o Estado de Sítio era um recurso que deveria ser usado sempre que fosse necessário garantir a segurança do Estado, que poderia estar comprometida em caso de rebeliões ou invasões. Nessa época, cabia ao Legislativo solicitar o Estado de Sítio. Conforme a Carta Magna de 1824, artigo 179, no Estado de Sítio poderia haver a suspensão de todas as formalidades que garantissem a liberdade individual. Vale lembrar que nesse período o termo utilizado para designar Estado de Exceção era Estado de Sítio. Gasparetto Junior (2014) nos diz que na Constituição de 1891 era permitido o “desterro” em território nacional. Melhor dizendo, permitia-se a expulsão de todos os que o Estado desejasse fora do país. Também passava a ser permitida a detenção e ainda se disciplinava uma série de atribuições para os diversos entes, a fim de fazer cumprir o Estado de Sítio. Para melhor compreendermos o conteúdo do texto constitucional em voga, observe o artigo 80 da Constituição de 1891: Art. 80. Poder-se-á declarar em Estado de Sítio qualquer parte do território da União, suspendendo-se aí as garantias constitucionais por tempo determinado quando a segurança da República o exigir, em caso de agressão estrangeira, ou comoção intestina (art. 34, nº 21). § 1º. Não se achando reunido o Congresso e correndo a Pátria iminente perigo, exercerá essa atribuição o Poder Executivo federal (art. 48, nº 15). § 2º. Este, porém, durante o Estado de Sítio, restringir-se-á às medidas de repressão contra as pessoas a impor: 1º) a detenção em lugar não destinado aos réus de crimes comuns; 2º) o desterro para outros sítios do território nacional. § 3º. Logo que se reunir o Congresso, o Presidente da República lhe relatará, motivando-as, as medidas de exceção que houverem sido tomadas. § 4º. As autoridades que tenham ordenado tais medidas são responsáveis pelos abusos cometidos (BRASIL, 1891). O primeiro mandato político de Getúlio Vargas teve início em 1930 e perdurou até 1934, no chamado Governo Provisório. Depois, no período de 1934 a 1937, tivemos o Governo Constitucionalista, e no período de 1937 a 1945, tivemos o Estado Novo. Para isso, Vargas se apoiou no artigo 175 da Constituição de 1934, em que era permitido ao presidente solicitar o Estado de Sítio. Para decretar tal situação seria necessário, para atender à solicitação, que os seguintes requisitos fossem observados: a) a iminência de agressão estrangeira; e b) a emergência de insurreição armada. Diferentemente do regime constitucional anterior, não havia a previsão do Estado de Sítio preventivo, instituto tão criticado por Rui Barbosa na Primeira República (MARQUES, 2013, p. 356). No dia 19 de março de 1936 o Decreto 702 substituiu o Estado de Sítio pelo Estado de Guerra. Entre as medidas adotadas, a que ficou mais célebre foi a prisão de Carlos Lacerda, que era líder do Partido Comunista Brasileiro e teria sido um dos opositores de maior destaque do governo de Vargas. A prisão de Prestes teria acontecido sob o argumento de que ele estaria de posse de materiais considerados subversivos. Luis Carlos Prestes, como membro do Partido Comunista Brasileiro, assumiu papel de destaque no Movimento Intentona Comunista. Aliás os argumentos de Vargas para constituir o Estado de Sítio e depois o Estado de Guerra estavam assentados no combate ao Comunismo, compreendido na época dos fatos como uma doutrina extremamente subversiva e prejudicial. Vargas conseguiu o apoio das Forças Armadas para a manutenção da ordem social. Marques (2013) nos coloca que em 1937 surgiu o Plano Cohen, descrito pelo Estado como um plano comunista. Esse teria sido um dos motivos para que Vargas decretasse o Estado de Guerra. No Brasil o Estado de Exceção assume, conforme a Constituição Federal, dois formatos: o Estado de Defesa e o Estado de Sítio. O Estado de Defesa é garantido na Constituição de 1988, especificamente no artigo 136: Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza. § 1º. O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes: I - restrições aos direitos de: a) reunião, ainda que exercida no seio das associações; b) sigilo de correspondência; c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica; II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes. § 2º. O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação. § 3º. Na vigência do estado de defesa: I - a prisão por crime contra o Estado, determinadapelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial; II - a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação; III - a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário; IV - é vedada a incomunicabilidade do preso. § 4º. Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República, dentro de vinte e quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta. § 5º. Se o Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no prazo de cinco dias. § 6º. O Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contados de seu recebimento, devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa. § 7º. Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa (BRASIL, 1988). Assim, o Estado de Defesa pode ser requerido pelo Presidente, no entanto é necessário que sejam ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. Compete, entretanto, ao Congresso Nacional analisar tanto a instauração quanto a prorrogação do Estado de Defesa. O Estado de Defesa pode ser requisitado pelo Presidente apenas para restabelecer a ordem ou a paz social em casos de contingência ou calamidades públicas. Para ser instituído é necessário, entretanto, delimitar o tempo de duração do Estado de Defesa, que poderá ser prorrogado uma única vez e tem como tempo máximo 30 dias. No decreto deve constar ainda quais direitos serão restritos. O artigo 136 coloca que no Estado de Defesa são permitidas prisões em crimes que porventura sejam praticados contra o Estado. Já o Estado de Sítio tem garantia constitucional, é citado no artigo 137 da Constituição de 1988, onde lemos: Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o Estado de Sítio nos casos de: I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira. Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o Estado de Sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta (BRASIL, 1988). De acordo com o artigo posto, vemos que cabe ao Presidente requerer ao Conselho da República e ao Conselho da Defesa Nacional avaliação quanto ao Estado de Sítio. Nesse caso, após o parecer desses órgãos o Estado de Sítio pode ser solicitado ao Congresso Nacional. A requisição do presidente precisa, entretanto, estar fundamentada. O Estado de Sítio só poderá ser requerido se o Estado de Defesa não se mostrar eficiente e deverá ser adotado sempre que se constar grande comoção nacional. Vemos que o Estado de Sítio poderá também ser requisitado se o país estiver sob ataque ou envolvido em alguma guerra. Assim, o entendimento do conceito de Multidão nos reporta à compreensão do termo sujeito político. O sujeito político, em Spinoza, cria o espaço político. Por conseguinte, sem o sujeito político não há espaço político e não há poder. Esse sujeito político, para Spinoza, é a Multidão. Multidão, por outro lado, pode ser entendida como o grupo de pessoas que vive em uma dada sociedade De tal maneira, compreende Spinoza que é a multiplicidade que funda corpos, e também incluía mentes. A multiplicidade também é preponderante para desenvolver os sujeitos políticos. Assim, as vivências comuns às pessoas, as experiências que as pessoas experimentam, são importantes para fundar uma subjetividade coletiva que as converte em sujeitos políticos, atores sob a realidade. “É a pluralidade das forças e das formas de vida presentes no social que configura o espaço político, também marcado pela pluralidade originária [...]” (GUIMARAENS, 2006, p. 161). Partindo desse princípio, Spinoza destacava que o poder é efeito da ação da Multidão. Melhor dizendo, o poder conferido ao Estado provém da Multidão, é conferido ao Estado por um grupo de pessoas, por uma sociedade. Entendia também que o poder estaria subjugado à Multidão, ou seja, dependia da coletividade para ser exercido e para ser mantido (GUIMARAENS, 2006). O filósofo compreendia ainda que o poder poderia ser exercido via representação. Assim, a Multidão poderia ser representada. Poderia possuir representantes de suas necessidades e de seus interesses se fazendo presente nos espaços de Poder. A obra Multidão: Guerra e Democracia na Era do Império, de Hardt e Negri (2012), foi construída sob três grandes eixos: Guerra, Multidão e Democracia. Esse trabalho seria a continuação da obra Império (2000), em que os autores deram início à discussão sobre a forma global de Soberania, que tem sido instituída no Mundo. Hardt e Negri entendem que a Multidão não é apenas um aglomerado de pessoas. Antes, os autores nos colocam que a Multidão deve ser definida com base em três aspectos: imanência, classe e potência. A imanência se refere à Multidão como construída sob várias singularidades, subjetividades, que são agregadas em prol do comum. A classe representa todas as classes sociais que integram a Multidão. No entendimento dos autores, para a Multidão concorrem todos os seres humanos, empregados ou não, que colaboram com o grupo constituído. A potência seria a capacidade que a Multidão possui de criar condições efetivas de provocar mudanças na realidade, não só local, mas também global A Multidão é constituída com base no tipo de trabalho que as pessoas desempenham, na forma que vivem e na localização geográfica. Podemos ter então a junção de pessoas com base no trabalho que desenvolvem, em como vivem etc. A Multidão decorre das relações sociais que o homem desenvolve durante a sua vida. Por conseguinte, segundo os autores, pobres e desempregados também integram a Multidão e têm muito a oferecer no que se refere à ação política. O povo é uno. A multidão, em contrapartida, é múltipla. A multidão é composta de inúmeras diferenças internas que nunca poderão ser reduzidas a uma unidade ou identidade única – diferentes culturas, raças, etnias, gêneros e orientações sexuais; diferentes formas de trabalho; diferentes maneiras de viver; diferentes visões de mundo; e diferentes desejos. A multidão é uma multiplicidade de todas essas diferenças singulares (HARDT; NEGRI, 2012, p. 12). A singularidade é reforçada como algo positivo, ou seja, as individualidades não são consideradas algo nocivo à Multidão. A existência das individualidades é, aliás, condição necessária e inextinguível à Multidão. A Multidão tem potencialidade de influir em diferentes expressões de poder existentes na sociedade, condicionando assim o corpo político global e provocando alterações na Sociedade Global “A ação política voltada para a transformação e a libertação só pode ser conduzida hoje com base na multidão” (HARDT; NEGRI, 2012, p. 139). Hardt e Negri nos indicam que o ser social é construído por meio da comunicação, da colaboração e da partilha, que é também fundamental à Multidão. No que diz respeito à colaboração, os autores indicam que a Multidão é construída e orientada pelo que é comum. Para os teóricos em questão, no entanto, a única forma de consolidar o poder da Multidão é por meio da Democracia, sendo essa a Democracia Global, ou seja, uma maneira de Biopoder que deveria estar presente em todo o mundo. Além disso, os autores defendem que a Multidão poderia também fortalecer as expressões e os movimentoscríticos ligados à esquerda, os quais estariam, no dizer de ambos, desarticulados. Por conseguinte, podemos inferir que a Multidão é um conceito biopolítico que refere-se à potencialidade que temos por meio da junção de múltiplas singularidades, as quais têm poder de alcançar projetos políticos que serão importantes para a Sociedade Global. Por assim dizer, indicam que os pensadores ligados à social-democracia compreendem que a globalização econômica traz prejuízos à organização democrática, sobretudo, porque corrói a força das funções representativas ocupadas pelos sujeitos e também porque compromete, em nome do lucro, as estruturas previdenciárias, antes sob gestão democrática do Estado. Por globalização econômica buscamos designar um conjunto de procedimentos que buscam realizar a integração econômica de todos os países, minimizando assim todos os possíveis entraves para o livre-comércio entre os povos. O movimento socialista propunha ainda que um governo democrático deveria partilhar a gestão da vida em sociedade com as pessoas. Essa gestão deveria acontecer sobre os aspectos políticos, mas também a respeito do que estivesse relacionado ao desenvolvimento econômico. No âmbito da participação política, o movimento propunha que fosse constituído um partido único, desde que não fosse para representar apenas os interesses burgueses. Além da organização partidária, defenderam que deveriam ser instituídos outros espaços que viabilizassem a democracia direta, por exemplo, por meio dos conselhos participativos e pela instituição de dispositivos de autogestão de serviços comunitários. Há hoje três tipos de movimentos que reclamam a melhoria da organização da sociedade global, que poderiam ser subdivididos da seguinte maneira: críticas às formas de representação; oposição à pobreza; expressões contrárias às guerras. Hardt e Negri nos colocam que os movimentos sociais de queixas de direitos e justiça, no âmbito global, apresentam três níveis, ou tipos, de organização. No primeiro nível temos as Comissões da Verdade, no segundo os Tribunais Internacionais e no terceiro os Tribunais Internacionais Permanentes. Os Tribunais Internacionais Permanentes seriam organizações constituídas e com funcionamento contínuo que funcionaram como uma corte internacional para julgar crimes cometidos contra a humanidade. Esse dispositivo foi criado pela ONU, mas os Estados Unidos não ratificaram o acordo, e, por isso, os autores nos dizem que nem sempre esses organismos são, de fato, espaços democráticos. Já as queixas biopolíticas, no âmbito global, seriam aquelas presentes em movimentos sociais que reclamam acerca de condições dignas de vida da população. A título de exemplo, Hardt e Negri destacam os movimentos em prol da defesa ecológica, as lutas feministas, as lutas antirraciais, as reivindicações de povos indígenas, entre outros afins. Nesse rol de movimentos sociais, os autores relacionam todas as organizações que buscam defender a vida do gênero humano. Entre as recomendações de Hardt e Negri para a realização da reforma econômica podemos indicar a necessidade de diminuir a dívida internacional de países pobres, visto que é impossível pensar em democracia se não tivermos uma socialização da riqueza produzida pela sociedade. Já as reformas biopolíticas seriam aquelas orientadas a estimular a organização de poderes e políticas que visem à proteção da vida. Conforme nos colocam os autores, o principal problema a ser enfrentado no âmbito da reforma biopolítica seria a constante instituição do Estado de Guerra por vários Estados-Nação. Assim, é impossível realizar uma reforma no âmbito do poder se o país está com Estado de Guerra decretado, mesmo porque nessas circunstâncias, via de regra, as mudanças não são aceitas. Conforme tais teóricos, atualmente temos a possibilidade de o Estado assumir três formatos de gestão: monarquia, aristocracia e democracia. Para tanto, apesar de tal possibilidade, o que vemos, na atualidade, em grande parte dos países, é o Estado monarca. Nesse formato o Estado governa de forma soberana e sem construir espaços efetivos de participação popular. Os autores ainda nos dizem que as decisões têm a potencialidade de construir redes de cooperação, de comunicação e de manter laços colaborativos. Dessa forma, as decisões adotadas conferem à Democracia da Multidão a potencialidade de constituir-se como um poder. Isso porque na Democracia da Multidão temos a tomada de decisões. EM BUSCA DA POLÍTICA: O DIAGNÓSTICO DE ZYGMUNT BAUMAN Zygmunt Bauman foi um sociólogo polonês vinculado ao movimento de esquerda, pelo qual militou entre 1940 e 1950, e professor universitário. Sua obra é vasta e aborda uma série de conceitos que vão desde a liquidez observada no gênero humano à organização política. A abordagem de Bauman nos indica o pano de fundo sob o qual se desenham as ações políticas contemporâneas, indicando o que o autor denominou crenças contraditórias presentes na sociedade contemporânea. Essas crenças que o autor indica predominam junto à sociedade ocidental e, apesar de serem consideradas por ele como incoerentes, têm orientado as pessoas em relação a seu posicionamento em relação à política. No sentido posto, o autor nos diz que essas crenças têm resultado em uma perda de legitimidade da ação política, assim como provocado o enfraquecimento das expressões políticas que deveriam emanar da sociedade. Por um lado, a sociedade moderna acredita que a liberdade foi alcançada, ou seja, não há mais, ao menos teoricamente, Estados totalitários, e por isso não seriam necessárias mais lutas. Disso decorre uma desarticulação dos movimentos de reivindicação. O autor nos diz que o aumento da liberdade corresponde ao aumento da impotência coletiva de se articular e reivindicar os direitos coletivos. Esse tem sido um pensamento hegemônico na sociedade. A outra crença, conforme Bauman, é complementar à primeira e consiste em compreender que a economia e a política desenvolvidas na sociedade ocidental contemporânea estão postas e são imutáveis. Assim, não há nada mais para ser alterado porque, em tese, a sociedade já conseguiu desenvolver-se de forma que alcançasse o desenvolvimento econômico e político e, portanto, não há nada mais para ser alterado. O autor nos coloca que a seu ver a sociedade não alcançou ainda a liberdade de forma plena, posto que Bauman compreende que a liberdade deveria orientar o homem a pensar sempre em melhorar, em alcançar uma sociedade melhor. Por conseguinte, diz que podemos acreditar que estejamos em uma sociedade livre se nossas perspectivas de vida futura são podadas. Correlato a esse fenômeno temos a instituição da sociedade do espetáculo. Bauman, por esse termo, designa os traumas coletivos, os festivais de compaixão que são organizados na sociedade atual. O conceito de sociedade de espetáculo é compreendido por Bauman como fortemente influenciado pela mídia e pelas tecnologias contemporâneas. Enfim, o que o autor nos coloca é que a mídia usa, de forma apelativa, os eventos que condicionam de forma crítica a vida de muitas pessoas. Podemos citar como evento de tal magnitude a ocorrência de fenômenos como as enchentes ou então os assassinatos em massa em escolas, por exemplo. Essa inércia da população decorre, conforme o autor, de uma série de fatores, e não apenas das duas crenças que retratamos acima. Um desses fatores é a crescente individualização dos problemas sociais. A individualização acontece em decorrência da globalização econômica e do amplo desenvolvimento tecnológico, mas também em virtude do papel que passa a ser assumido pelo Estado. Bauman compreende que o Estado Moderno constituiu o que chama de política da incerteza, posta pela adesão ao Neoliberalismo e que resulta no desmantelamento das redes de proteção públicas orientadasao socorro dos indivíduos que vivenciam situações de dificuldades. O Neoliberalismo defende, entre outras questões, a ausência do Estado em administrar problemas sociais. No entanto, o autor nos diz que essa ausência estatal não é total, ou seja, há áreas em que temos a intervenção do Estado, entre as quais Bauman destaca o controle dos pobres, das classes consideradas como subversivas e prejudiciais à ordem social vigente e ao desenvolvimento da segurança. Na verdade, o que surge é um medo generalizado em relação ao outro, sobretudo no que diz respeito à classe pobre e à classe considerada como perigosa. Há, portanto, grande investimento em segurança. Para tanto, a globalização econômica não garante que todas as pessoas tenham as mesmas oportunidades. Ao contrário, vemos que a globalização econômica tende a ampliar as desigualdades sociais. Nesse sentido, cabe destacar que a inserção da tecnologia nos processos produtivos colabora para a ampliação do desemprego. Em tese, na globalização econômica, vários processos são constituídos para viabilizar a economia de trabalho vivo, resultando em desemprego e subemprego. De tal forma, a globalização da economia não possibilita as mesmas oportunidades de desenvolvimento para toda a população. A PERSPECTIVA DE BOAVENTURA SANTOS SOBRE A PARTICIPAÇÃO SOCIAL E O CONTEXTO HISTÓRICO DO BRASIL A democracia e a participação popular de Boaventura Santos Atualmente, além de advogado, Boaventura é sociólogo, e suas produções têm sido orientadas para discutir a globalização, os direitos humanos e as questões afetas à democracia. A participação popular só é possível em um regime, de fato, democrático. Segundo Santos, em Renovar a Teoria Crítica e Reinventar a Emancipação Social (2007), democracia não é apenas o governo de todos e para todos, mas o governo em que todos tenham voz e todos tenham visibilidade. Assim, a democracia, para ser efetivada, demanda que as pessoas de uma determinada sociedade exponham suas necessidades e construam uma nova forma de diálogo entre Estado e Sociedade Civil. No atual cenário, o autor nos coloca que o que temos é uma democracia liberal. Santos (2007) entende que a democracia liberal seria a democracia condicionada à liberdade viabilizada pelo mercado, ou seja, há muitas escolhas que só estão acessíveis aos segmentos que possuem certa situação financeira, o que os permite escolher. Eventualmente, faz concessões no sentido de partilhar o poder, buscando assim evitar embates da população excluída dos processos decisórios, assim, partilha algumas instâncias de poder com a população geral, mas mantém seu controle e predomínio dos espaços mais relevantes de poder. Os movimentos sociais também são espaços de participação política e, consequentemente, dispositivos de democratização. O conceito de emancipação social é fundamental ao entendimento da democracia contida na abordagem de Boaventura Santos. Santos (2007) nos diz que a emancipação social é constituída por meio de uma série de relações emancipatórias nas quais o ser humano é estimulado, de forma coletiva, a participar das relações de poder. Quanto às relações de poder, de acordo com Santos (2007), é necessário destacar que só se tornam emancipatórias caso se transformem em relações de poder compartilhadas. Essas relações de poder compartilhadas seriam possíveis por meio da ampliação de esferas públicas, espaços de debate, de interlocução de diversos atores sociais e que também possibilitassem a decisão dos participantes. Quando englobar os diferentes atores sociais, teremos a partilha do poder, dos espaços de decisão e, somente a partir de então, poderemos construir uma sociedade mais justa. O actual contexto apagou a velha tensão entre a democracia e o capitalismo, justamente porque as instituições financeiras internacionais que propagam o capitalismo, nomeadamente o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Mundial, são hoje as reguladoras da democracia. “O capitalismo floresce onde há democracia”, declarou o Professor Catedrático da Universidade de Coimbra. O Brasil e a Democracia Behring e Boschetti (2010) nos dizem que a constituição democrática no Brasil teve seu início na década de 1980. Na verdade, retomando brevemente a história de nosso país, veremos que nunca foram instituídas possibilidades efetivas de participação popular. O PODER DAS REDES: A FORTUNA CRÍTICA DE MANUEL CASTELLS Por mundialização da economia Castells faz menção ao desenvolvimento capitalista globalizado. Dessa definição podemos extrair ainda outros conceitos sobre as redes, ou seja, além de se constituírem como mecanismos fundamentais na economia capitalista globalizada, são um dispositivo de expressão de relações de poder. Ainda visando entender a relação estabelecida entre o desenvolvimento capitalista e as redes, Castells nos coloca que a rede só é possível no mercado capitalista globalizado e por meio do surgimento do capital financeiro. O capital financeiro é um produto composto por títulos, certificados e outros documentos que representam produtos. Para concluir nossas considerações, é preciso destacar que, conforme Castells (1999), as redes não apenas transformam o comércio, mas também provocam alterações significativas em toda experiência humana. O homem é, portanto, profundamente influenciado pela nova forma de organização em questão, e as redes passam a delimitar todas as relações humanas. CAPITALISMO GLOBAL E TECNOLÓGICO Dupas (1998) nos diz que as bases iniciais do que denominamos capitalismo global nos levam ao século XV, quando tivemos o início do comércio marítimo no mundo. Para o autor, os primórdios do capitalismo global no mundo aconteceram no século XV. Nesse período teve início o comércio marítimo no mundo, ou seja, a partir de então alguns países se direcionaram para outros espaços, nos quais pudessem ter acesso a bens não produzidos em sua economia local. Santos (2007) nos diz que a globalização econômica, no que concerne a ampliar as possibilidades de comércio, deu um novo salto a partir da emergência da Revolução Industrial, no século XVIII. A produção deixa o caráter manufatureiro e passa para o industrial, e em grande quantidade. O surgimento da energia a vapor e a introdução de novos maquinários faz que a produção seja ampliada e que seja possível assim alcançar o lucro. O capitalismo global ou o mercado global fazem menção ao livre-comércio, que é potencializado a partir de meados dos anos 1990. O capitalismo global é construído e solidificado por meio da possibilidade da livre-circulação de capitais, agora livre de controle. Dupas (1998) nos diz que isso faz aumentar também os serviços de home care, ou seja, a prestação de serviços em casa, destinados a um público específico. Já Santos (2007) nos coloca que isso resulta na ampliação substancial de problemas sociais, como a fome, o desemprego, a discriminação das classes sociais e o aumento generalizado e total da miséria. NEOLIBERALISMO O sufixo neo, que compõe a palavra Neoliberalismo, como bem sabemos, significa “novo”. Por conseguinte, Neoliberalismo faz menção a novo liberalismo. Assim, quando nos referimos ao Neoliberalismo estamos nos reportando às novas bases ideológicas que foram consideradas como sustentação ao formato de Estado, e que conduziram sua ação. Essas bases ideológicas em questão provêm da doutrina liberal. O Liberalismo, o papel do Estado e o Welfare State O Liberalismo teria surgido entre os séculos XVI e XVII na Europa, tendo como seus principais defensores os filósofos David Ricardo e Adam Smith. Associaram-se a essa corrente de pensamento também teóricos como Maquiavel, Hobbes e Rousseau. Podemos dizer que o Liberalismo é uma corrente teórica e filosófica que entende o mercado como instância máxima e suprema para a atenção de todas as necessidadesapresentadas pelo ser humano. Assim, cada indivíduo tem condições igualitárias de se desenvolver e deve usar todas as suas potencialidades. As oportunidades, segundo essa corrente de pensamento, estariam abertas a todas as pessoas. Caberia a cada um saber aproveitar as oportunidades que a vida lhe conferisse, extraindo dela o que houvesse de melhor e assim preenchendo as suas necessidades (BEHRING; BOSCHETI, 2010). . O trabalho, assim como o mercado, não demanda regulação, aliás, esses aspectos econômicos possuiriam um desenvolvimento natural, independentemente de qualquer intervenção de mecanismos externos. Dessa maneira, as relações econômicas seriam reguladas por uma suposta “mão invisível” do mercado. Ao Estado caberia viabilizar serviços que não fossem interessantes para a iniciativa privada e para o mercado. Podemos citar como exemplo desses serviços a construção de presídios, de infraestrutura mínima para o florescimento da economia capitalista e a ampla extração do lucro. Behring e Boschetti (2010) nos dizem que era atribuída ao Estado a responsabilidade de administrar situações de guerra, além de ser a ele atribuída a gestão de conflitos individuais, ou seja, o Estado não deveria intervir no sentido de administrar problemas sociais, como: “[...] a defesa contra os inimigos externos; a proteção de todo o indivíduo de ofensas dirigidas por outros indivíduos; e o provimento de obras públicas, que não possam ser executadas pela iniciativa privada” (op. cit., 2010, p. 60). Aliás, um dos teóricos que defendiam a doutrina liberal, Malthus, chegava até a propor que para a vida em sociedade seguir o seu curso seria fundamental a eliminação de alguns pobres. De forma que o Liberalismo pressupunha que o Estado não realizasse qualquer intervenção junto à pobreza ou qualquer outro problema social. É o chamado “Estado Mínimo”, por meio do qual se designou que o Estado faz intervenções mínimas, sobretudo junto aos problemas sociais. As únicas possibilidades de intervenção estatal permitidas à doutrina liberal seriam em caso de emergência, ou seja, as políticas sociais seriam paliativas. Por exemplo, no caso de uma situação de calamidade pública ou na ocorrência de uma endemia, nesses casos, a ação do Estado não só era permitida quanto era necessária. Nesse contexto, de acordo com Behring e Boschetti (2010), vivenciamos uma grande crise capitalista de elevadíssimas proporções. Para minimizar os impactos dessa crise, vários teóricos, filósofos e economistas passaram a elaborar pesquisas, mas nenhum deles foi tão influente quanto John Maynard Keynes, tanto que as formulações de Keynes ficaram conhecidas por keynesianismo. A análise de Keynes identificou que o Estado deveria alterar o seu papel, ou seja, sua forma de agir, como um mero observador da realidade. Para Keynes era necessário que o Estado interviesse na economia, oferecendo a ela todos os meios necessários para se desenvolver. Mas, segundo esse pensador, também caberia ao Estado intervir nos problemas sociais. Keynes propunha ainda que caberia ao Estado a criação do pleno emprego, que seria, como o nome sugere, a possibilidade de que todos com condições pudessem trabalhar. Dessa maneira, Keynes acreditava que o mercado seria reestimulado, que haveria novamente consumo e que a crise capitalista seria superada. As formulações de Keynes encontraram grande assento nos Estados, que passaram, aos poucos, a constituir Estados interventores. Esse formato de Estado, diferente do Estado de influência liberal, ficou conhecido pela terminologia Welfare State, ou Estado de Bem- Estar Social. Se na década de 1930 o Estado de Bem-Estar Social começou a ser implementado, foi após a Segunda Guerra Mundial que ele se fez mais presente, quando países do eixo capitalista se organizaram pela reestruturação da economia ocidental, devastada pelos horrores da guerra. O Neoliberalismo no cenário internacional Assim, a obra que demarca o surgimento da doutrina neoliberal foi escrita em 1944, por Hayek, chamada O Caminho da Servidão. Isso porque nela temos os pilares do Neoliberalismo muito bem delimitados e construídos pelo autor. Nessa obra temos também grande ataque ao Estado, de Bem-Estar Social, defendido por Keynes e que vinha sendo aceito em grande parte dos Estados. Como nos diz Anderson (1995, p. 9), era “[...] um ataque apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado, denunciada como uma ameaça letal à liberdade, não somente econômica, mas também política”. o, Hayek nos diz que o Estado, além de não intervir nos problemas sociais deveria também ser antidemocrático. O autor entende que sindicatos e partidos políticos eram nocivos ao Estado e deveriam ser suprimidos ou então severamente controlados. Portanto, o Neoliberalismo não se restringe, em suas bases iniciais, à ausência de um Estado interventor, mas prima também por um Estado antidemocrático. Além disso, Hayek, entendia que a intervenção do Estado na economia resultava na diminuição da concorrência necessária e natural ao desenvolvimento econômico capitalista. Hayek entendia que era necessário que o Estado mantivesse um nível mínimo de desigualdade e de desemprego. Seriam, segundo o autor, essas condições desfavoráveis que deveriam impulsionar o ser humano que as experimenta a agir, buscando assim melhorar as suas condições de vida. Uma sociedade desigual, com pessoas ricas e pobres, era considerada como positiva pelo o autor (ANDERSON, 1995). Em linhas gerais, a argumentação de Hayek em contraposição ao Welfare State pode estar assim sistematizada, sob os seguintes aspectos: 1) [...] o Estado Social é despótico porque, além de impedir a economia de funcionar, nega aos usuários dos serviços sociais oportunidades de escolhas e autonomia de decisão; 2) [...] o Estado Social, comparado ao mercado, é ineficiente e ineficaz na administração de recursos; 3) [...] o Estado Social é paternalista e, por isso, moralmente condenável porque incentiva a ociosidade e a dependência, ao mesmo tempo que, com a sua carga de regulamentações, desestimula o capitalista de investir; 4) [...] o Estado Social é perdulário porque gasta vultosos recursos para obter modestos resultados; 5) [...] que o Estado Social é corrupto (PEREIRA, 2001, p. 37). Além de impedir a economia de funcionar, ser ineficiente, ser paternalista e estimulador do ócio, é perdulário e também corrupto. O Estado de Bem-Estar Social passa a ser comparado a tudo o que é ruim em uma sociedade. O ideal neoliberal promove conjuntamente uma satanização do Estado, visto que tudo o que é público passa a ser visto como de má qualidade, como ruim. O Estado passa a ser considerado como o responsável por tudo de “ruim” que existe na sociedade. Já o mercado, como no dizer de Iamamoto, passa a ser associado a tudo o que é bom e ágil, ou seja, representa a perfeição. No argumento de Hayek que tem grande aceitação pelos Estados, as empresas públicas deveriam ser transferidas para a iniciativa privada, na qual seriam mais bem-administradas. Para encerrar nossas considerações, desejamos indicar que apesar de Hayek ter sido considerado o principal representante da corrente neoliberal no mundo, não foi o único. Na verdade, já em meados da década de 1940, após a publicação da obra O Caminho da Servidão, Hayek reuniu um grupo de pensadores que possuíam a mesma perspectiva sobre o Estado que ele. A primeira reunião desse grupo aconteceu em 1947, quando Hayek organizou uma reunião na pequena estação de Mont Pèlerin, na Suíça, convocando para tal um grupo seleto de teóricos, entre eles: “[...] Milton Friedman, Karl Popper, Lionel Robbins, Ludwing Von Mises, Walter Eupken, Walter Lipman, Michael Polanui, Salbador de Madariaga [...]” (ANDERSON, 1995, p. 10). Destes, os que mais se destacaram, além de Hayek, foram Friedmane Popper. Brasil e Neoliberalismo De uma forma sintética, podemos dizer que no Brasil, desde o regime colonial, não tivemos um Estado interventor, um Estado de Welfare State tal como foi proposto por Keynes. Antes, analisando nosso formato de regulação econômica e social, Couto nos diz que tivemos um Estado mais afinado com os princípios liberais. No entanto, no contexto da década de 1980, em decorrência do elevado número de pressões sociais, além da crise econômica e política que se desenhava no Brasil, tivemos a Constituição de 1988, que determinou a intervenção do Estado por meio das políticas sociais, sobretudo por um sistema de Seguridade Social advindo das políticas sociais de saúde, Assistência Social e Previdência Social. Mas, ao assumir a presidência, Collor mudou rapidamente o discurso. Entendia que o Estado estava ingovernável e que os gastos desse órgão eram extremamente elevados. Como alternativa, indicava o corte de recursos destinados às áreas básicas de saúde, assistência social e educação, as quais tinham sido recém-conquistadas pela população brasileira e expostas por meio da Constituição de 1988. O que motivaria o Estado brasileiro a promover tal reforma embasado nos princípios neoliberais? Se você disse que há algo oculto, acertou. O que foi preponderante nesse processo foi o chamado Consenso de Washington. O documento-síntese, denominado Consenso de Washington, propunha que os países subdesenvolvidos, para alcançarem o desenvolvimento, restringissem seus gastos na área social. Essa restrição passa a ser imposta aos países como uma condição para que o país possa, futuramente, receber recursos do FMI. Melhor dizendo, o país que não reduzisse os gastos na área social poderia, futuramente, ter um empréstimo negado pelo FMI. Além das privatizações, observamos que durante o governo de Fernando Henrique Cardoso também tivemos a redução de gastos na área social, que vem vinculada à consolidação de ações pautadas pela organização da sociedade civil. Como o Estado diminui os gastos sociais, passa a chamar a sociedade para intervir nos problemas sociais. Por isso, nesse período, observamos no Brasil a expansão das organizações não governamentais, essas instituições destinadas a atender problemas sociais não contemplados pela ação do poder público. Assim, vemos que o Estado brasileiro assume o formato neoliberal quando nos referimos aos serviços e às políticas sociais, porém, não é neoliberal quando é necessário o socorro a bancos e empresas capitalistas privadas que encontrem dificuldades na extração do lucro. Tanto o Movimento Zapatista quanto o MST têm um projeto de tornar a distribuição da terra mais justa, tornando a propriedade e o uso acessíveis a todos.
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