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2 ÉTICA PROFISSIONAL NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA 3 ÉTICA PROFISSIONAL NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA DÚVIDAS E ORIENTAÇÕES editorafamart@famart.edu.br TUTORIA ONLINE Segunda a Sexta de 09:30 às 17:30 Acesse a aba Tutoria EaD em seu portal do aluno. mailto:editorafamart@famart.edu.br SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 3 2 ÉTICA COMO FUNDAMENTO SOCIAL .................................................. 10 3 ÉTICA PROFISSIONAL E SUAS TENDÊNCIAS SOCIAIS ..................... 17 3.1 Ética profissional: quando se inicia esta reflexão? ............................. 19 3.2 Ética profissional: como é esta reflexão? ............................................ 20 3.3 Ética profissional e relações sociais .................................................... 21 3.4 Ética profissional e atividade voluntária .............................................. 22 3.5 Ética profissional: pontos para sua reflexão ....................................... 22 3.6 Sigilo de Informações ............................................................................ 24 4 ÉTICA PROFISSIONAL NO CAMPO ARISTOTÉLICO ........................... 25 4.1 Ética na sociedade brasileira ................................................................ 27 4.2 O meio profissional e empresarial ........................................................ 29 5 ÉTICA DO DISCURSO EM JÜRGEN HABERMAS: A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM PARA UM AGIR COMUNICATIVO ................................... 31 5.1 Significado do discurso para Habermas .............................................. 32 5.2 Ética do discurso e a importância do agir comunicativo .................... 33 5.3 Os valores morais na modernidade ...................................................... 39 5.4 Relação entre os valores vigentes na sociedade e os valores que regem os grupos particulares .......................................................................... 42 5.5 Características da ética profissional hoje ............................................ 44 ENCERRAMENTO ................................................................................... 49 REFERÊNCIAS ........................................................................................ 50 1 INTRODUÇÃO A ética tem sido um dos temas mais trabalhados nos últimos tempos, pois a corrupção, o descaso social e os constantes escândalos políticos e sociais expostos na mídia diariamente suscitam que a sociedade exija o resgate de valores morais em todas as suas instâncias, sejam elas políticas, científicas ou econômicas. Desse conflito de interesses pelo bem comum ergue-se a ética, tão discutida pelos filósofos de toda a história mundial. Ética é uma palavra com duas origens possíveis. A primeira advém do grego éthos, literalmente "com e curto", que pode ser traduzida por "costume"; a segunda também se escreve éthos, porém se traduz por "com e longo", que significa "propriedade do caráter". A primeira serviu de base para a tradução latina moral, enquanto que a segundaé a que, de alguma forma, orienta a utilização atual que damos à palavra ética. O vocábulo foi assimilado à língua portuguesa por intermédio do latim. O primeiro registro de seu uso é do século XV. Conceitua-se ética como sendo o estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana, do ponto de vista do bem e do mal. É um conjunto de normas e princípios que norteiam a boa conduta do ser humano. A ética é a parte da filosofia que aborda o comportamento humano, seus anseios, desejos e vontades. É a ciência da conduta humana perante o ser e seus semelhantes e de uma forma específica de comportamento humano, envolvendo estudos de aprovação ou desaprovação da ação dos homens. É a consideração de valor como equivalente de uma medição do que é real e voluntarioso no campo das ações virtuosas. Ela ilumina a consciência humana, sustenta e dirige as ações do homem, norteando a conduta individual e social. Como um produto histórico-cultural, define em cada cultura e sociedade o que é virtude, o que é bom ou mal, certo ou errado, permitido ou proibido. Segundo Heller (1999, p. 29), "ética é a ciência normativa dos comportamentos humanos". Já Maximiano a define como: [...] a disciplina ou campo do conhecimento que trata da definição e avaliação de pessoas e organizações, é a disciplina que dispõe sobre o comportamento adequado e os meios de implementá-lo, levando-se 3 em consideração os entendimentos presentes na sociedade ou em agrupamentos sociais particulares. (MAXIMIANO, 1974, p. 28) Adolfo Sánchez Vázquez afirma que: [...] valor não é propriedade dos objetos em si, mas propriedade adquirida graças à sua relação com o homem como ser social. Mas, por sua vez, os objetos podem ter valor somente quando dotados realmente de certas propriedades objetivas. (VÁZQUEZ, 2005, p. 41) Ética é basicamente uma questão de estudo dos valores, porque diz respeito aos valores em que o humano do ser, em linguagem fenomenológica, se sobrepõe ao ser humano. Como interpretar os valores éticos? Maximiano (1974, p. 299) diz que "a interpretação de valores éticos pode ser absoluta ou relativa". A primeira "baseia-se na premissa de que as normas de conduta são válidas em todas as situações", e a segunda "de que as normas dependem da situação". No que tange à ética relativa, os orientais entendem que os indivíduos devem dedicar-se inteiramente à empresa, que constitui uma família à qual pertence a vida dos trabalhadores. Já para os ocidentais, o entendimento é de que há diferença entre a vida pessoal e a vida profissional. Assim, por exemplo, encerrado o horário normal do trabalho em uma empresa, o restante do tempo é do trabalhador e não do patrão. Quanto à ética absoluta, parte-se do princípio de que determinadas condutas são intrinsecamente erradas ou certas, qualquer que seja a situação e, dessa maneira, devem ser apresentadas e difundidas como tal. Maximiano ainda ressalta que "um problema sério da ética absoluta é que a noção de certo e errado depende de opiniões" (ibid., p. 299). Cita como exemplo, os bancos suíços, que construíram uma reputação de confiabilidade com base na preservação do sigilo sobre suas contas secretas. Sob a perspectiva absoluta, para o banco, o correto é proteger a identidade e o patrimônio do cliente. Durante muito tempo, os bancos suíços foram admirados por essa ética, até ficar evidente que os clientes nem sempre eram respeitáveis. Traficantes de drogas, ditadores e nazistas haviam escondido nas famosas contas secretas muito dinheiro ganho de maneira ilícita. Os bancos continuaram 4 insistindo em sua política, enquanto aumentavam as pressões internacionais, especialmente, dos países interessados em rastrear a lavagem de dinheiro das drogas ou recuperar o que lhes havia sido roubado. Para as autoridades desses países, a ética absoluta dizia que o sigilo era intrinsecamente errado, uma vez que protegia dinheiro obtido de forma desonesta. Finalmente, as autoridades suíças concordaram em revelar a origem dos depósitos e iniciar negociações visando à devolução do dinheiro para os seus donos (ORIVES, 2008). É possível perceber que os valores predominantes na sociedade brasileira, refletidos nas práticas de seus governantes e políticos, são fatores determinantes para a qualidade dos serviços públicos. Ilusões e esperanças têm se desmoronado e é possível distinguir três fatores responsáveis por esta questão. Antes de tudo, destaque-se que cada um carrega consigo mesmo uma hierarquia abstrata de valores que orienta suas escolhas. Pode colocar no ápice da cadeia hierárquica a solidariedade, a comunhão, o interesse públicoou, em vez disso, a rivalidade ostensiva, o individualismo exacerbado e o interesse pessoal. Em segundo lugar, possui uma visão, mais ou menos esquemática, das forças em competição, avaliando as que se sintonizam com seus valores, opondo-se e rejeitando aquelas que se afastam de si. Esses dois fatores são condicionados por um terceiro: o fluxo de informações que se registram no cérebro humano. A globalização da informação pode conduzir à desinformação à medida que a agilidade e a rapidez desse fluxo, além de sua quantidade em prejuízo da qualidade, levem administradores públicos a filiar-se a forças destruidoras de seus valores, impedindo sua realização. A ética pode ser interpretada como um termo genérico que designa aquilo que é frequentemente descrito como a "ciência da moralidade". Seu significado, derivado do grego, quer dizer "Morada da Alma", isto é, suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinadasociedade, seja de modo absoluto. Em Filosofia, o comportamento ético é aquele que é considerado bom. Sobre a bondade, os antigos diziam que o que é bom para a leoa, não pode ser bom à gazela. E o que é bom à gazela, fatalmente não será bom para a leoa. Este é um dilema ético típico. Portanto, no campo filosófico, a ética, ao lado da 5 metafísica e da lógica, não pode ser descrita de forma simplista. O objetivo de uma teoria da ética é determinar o que é bom tanto para o indivíduo como para a sociedade como um todo. Os filósofos antigos adotaram diversas posições na definição do que é bom: como lidar com as prioridades em conflito dos indivíduos versus o todo, e a universalidade dos princípios éticos versus a "ética de situação". Nesta, o que está certo depende das circunstâncias e não de uma lei geral qualquer. E ainda se a bondade é determinada pelos resultados da ação ou pelos meios pelos quais os resultados são alcançados. O homem vive em sociedade, convive com outros homens e, portanto, cabe lhe pensar e responder à seguinte pergunta: Como devo agir perante os outros?". Trata-se de uma pergunta fácil de ser formulada, mas difícil de ser respondida. Ora, esta é a questão central da a Moral e da Ética. Enfim, a ética é o julgamento do caráter moral de uma determinada pessoa (BRASIL, s/ d). No nosso dia a dia, não fazemos distinção entre ética e moral, usamos as duas palavras como sinônimas, mas os estudiosos da questão fazem uma distinção entre as duas palavras. Assim, a moral é definida como o conjunto de normas, princípios, preceitos, costumes, valores que norteiam o comportamento do indivíduo no seu grupo social. A moral é normativa. Já a ética é definida como a teoria, o conhecimento ou a ciência do comportamento moral, que busca explicar, compreender, justificar e criticar a moral ou as morais de uma sociedade. A ética é filosófica e científica. Não se pode falar de ética sem falar de moral, pois ambas estão interligadas na vida do ser humano. A palavra moral origina-se do latim morus, significando os usos e os costumes. Moral é o conjunto das normas para o agir específico ou concreto. Estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como uma forma de garantir o seu bem viver. Segundo Vázquez (2005), se por moral entendemos um conjunto de normas e regras destinadas a regular as relações dos indivíduos numa comunidade social, o seu significado, função e validade não podem deixar de variar historicamente, nas diferentes sociedades. A moral é um fato histórico e, por conseguinte, a ética, como ciência da moral, não pode concebê-la como 6 dada de uma vez para sempre, mas tem de considerá-la como um aspecto da realidade humana mutável com o tempo. Mas a moral é histórica precisamente porque é o modo de um ser - o homem - se comportar, uma vez que é histórico por natureza, ou seja, é um ser cuja característica é a de estar-se fazendo ou se autoproduzindo constantemente, tanto no plano de sua existência material, prática, como no de sua vida espiritual (ibid.). A moral independe das fronteiras geográficas, que garante uma identidade entre pessoas que não se conhecem, mas utilizam o mesmo referencial moral comum. "Nenhum homem é uma ilha." Esta famosa frase do poeta inglês do século XVI John Donne ajuda-nos a compreender que a vida humana é convívio. Para o ser humano, viver é conviver. É justamente na convivência, navida social e comunitária, que o ser humano se descobre e se realiza enquanto um ser moral e ético. É na relação com o outro que surgem os problemas e as indagações morais: o que devo fazer? Como agir em determinada situação? Como comportar-me perante o outro? Diante da corrupção e das injustiças, o que fazer? Constantemente no nosso cotidiano nos defrontamos com problemasmorais. São problemas práticos e concretos da nossa vida em sociedade, ou seja, problemas que dizem respeito às nossas decisões, escolhas, ações e comportamentos - os quais exigem uma avaliação, um julgamento, um juízo de valor entre o que é socialmente considerado pela moral vigente bom ou mal, justo ou injusto, certo ou errado. A sociedade brasileira é historicamente marcada pela injustiça socioeconômica, pelo preconceito racial e sexual, pela exploração da mão-de- obra infantil, pelo "jeitinho brasileiro", pela "Lei de Gerson", etc. Tal realidade, nos coloca diante de problemas éticos bastante sérios. Contudo, já estamos por demais acostumados com nossas misérias de toda ordem. Na vida pública, exemplos não faltam na nossa história recente: anões do orçamento, impeachment de presidente por corrupção, compra de parlamentares para a reeleição e para apoio ao governo, compra de ambulâncias superfaturadas, "caixa dois" de campanhas eleitorais, máfia do crime organizado, desvio de dinheiro público, entre outros. 7 Os princípios éticos são normas que nos obrigam a agir em função do valor do bem visado pela nossa ação, ou do objetivo final que dá sentido à vida humana; e não de um interesse puramente subjetivo, que não compartilhamos com comunidade. Esse valor objetivo deve ser considerado em todas as suas dimensões: no indivíduo, no grupo ou classe social, no povo, ou na própria humanidade. O alcance dos princípios éticos é ilimitado: na História, eles tendem a alcançar uma vigência universal. A qualidade própria dos princípios éticos nada mais é, na verdade, que uma decorrência lógica do fato de se fundarem na dignidade da pessoa humana, vista como componente essencial para a vida social. A classificação desses princípios obedece à sua ordem de abrangência. O respeito à dignidade da pessoa humana deve abrangê-la em todas as suas dimensões: em cada indivíduo, com a sua característica irredutível de qualidade; em cada grupo social; no interior dos povos politicamente organizados; em cada povo ou nação independente, nas relações internacionais; na reunião de todos os povos do mundo numa unidade política suprema em construção. É igualmente em todas as dimensões da pessoa humana que atuam os princípios fundamentais da verdade, da justiça e do amor, desdobrando-se especificamente, nos princípios de liberdade, igualdade, segurança e solidariedade. A norma técnica se alicerça na dignidade da pessoa humana como componente principal para a convivência em sociedade, diferenciando-se de regra técnica, que diz respeito aos meios aptos a se conseguir determinado resultado que, obviamente desejado pelo agente, pode ser bom ou mau para outros indivíduos ou para a coletividade em geral. A regra técnica, considerada em si mesma, é eticamente neutra. Kant bem salientou que: [...] as prescrições que deve seguir o médico para curar totalmente o paciente, e as que deve seguir um assassino para envenenar letalmente sua vítima têm o mesmo valor, na medida em que umas e outras lhes são úteis para realizarem, de maneira cabal, os desígnios. (KANT,2003) A técnica guia-se, pois, exclusivamente, pelo valor da utilidade ou eficiência dos meios na produção de um resultado, ao passo que a ética acentua 8 o fim último visado pelo agente e o seu valor, relativamente a outras pessoas que com ele se relacionam, ou em relação à coletividade. Na perspectiva técnica, o agente deve atuar de certa maneira para poder obter o efeito por ele desejado, não necessariamente valioso à coletividade. No ambiente ético, o agente deve agir em vista de determinadas finalidades consideradas obrigatórias para todos, e o seu modo de agir há de adaptar-se ao valor ético dos fins visados. Na presente apostila, iremos abordar a ética, como fundamento social, as suas variações e possibilidades de uso no contexto da sociedade contemporânea. Iremos também trabalhar, especificamente, o conceito de Ética profissional, bem como a sua importância para as relações sociais consolidadas no contexto em que o sujeito está inserido. 9 2 ÉTICA COMO FUNDAMENTO SOCIAL Deve-se, pois, antes de tudo, estar de acordo sobre o gênero de vida que todos os homens – para servir-me desta expressão – devem preferir, e depois resolver se esse gênero de vida é o mesmo para os indivíduos em particular e para sociedade em geral. (ARISTÓTELES, 2009, p. 229-230, grifo nosso). Diremos, em princípio, os fundamentos culturais da sociedade são sua essência elementar. Identificar essa essência faz com que consigamos observar sedimentos de valores ou virtudes de outras épocas preservados na atualidade. Ainda que não aprovemos esses valores ou virtudes como harmonias em relação aquilo considerado por nós como moral ou ético, o comportamento ou a conduta recorrente do povo pode revelar essa contradição. Daí a necessidade de se ter em mente (ou se buscar) os motivos, a condição de mobilidade histórica como registro dos fatos que mantiveram inalterado determinado comportamento em detrimento da evolução material concreta e condicionada como elemento que dá importância à preservação de certos fundamentos sociais, dentre eles, a ética. Admitamos que as relações econômicas, consideradas como leis imutáveis, princípios eternos, categorias ideais, sejam anteriores aos homens ativos e atuantes; admitamos ainda que essas leis, esses princípios, essas categorias tivessem, desde o princípio dos tempos, dormitado “na razão impessoal da humanidade”. (MARX, 2006c, p. 103). Assim como Marx: Já vimos que, com todas essas eternidades imutáveis e imóveis deixa de haver história, há quando muito história na ideia, ou seja, a história que se reflete no movimento dialético da razão pura. (MARX, 2006, p. 103) E podemos também, com Marx, dizer que, referindo-nos não somente ao sr. Proudhon, mas ao conjunto hegemônico de senhores que domina as relações de valores para além da esfera econômica, que, ao dizerem que: [...] no movimento dialético, as ideias não se ‘diferenciam’” anulam “[...] quer a sombra do movimento quer o movimento das sombras, por meio 10 dos quais se poderia ainda criar um simulacro de história, quando muito. (MARX, 2006c, p. 103) Em vez disso, eles atribuem “[...] à história a sua própria impotência’, atribuem ‘culpas a tudo […]” (MARX, 2006c, p. 103). Não bastasse essa tentativa recorrente e histórica de se apartarem dos males dos quais podemos até afirmar que são seus legítimos mentores, feitores e carrascos ao mesmo tempo, complementam suas concepções na certeza de que a percepção concreta de suas ideias perpassa pela história de maneira incólume, afinal, como Marx e Engels mencionam: Sem dúvida – se dirá – as ideias religiosas, morais, filosóficas, políticas, jurídicas etc., modificaram-se no curso do desenvolvimento histórico, mas [por mais paradoxal e inteligível que isso represente], a religião, a moral, a filosofia, a política e o direito mantiveram-se sempre através dessas transformações. (MARX; ENGELS, 1988, p. 94.) São institutos ou princípios simbólicos, mantidos e reproduzidos em sua forma, cuja tradição ideológica burguesa tem conseguido sustentar como pilares estruturantes da sociedade e como sustentáculo necessário ao processo evolutivo civilizacional. Acrescentam Marx e Engels (1998, p. 94) (nesse sentido), “[...] além disso, há verdades eternas, como a liberdade, a justiça, etc., que são comuns a todos os regimes sociais.” Considerando, inclusive, por se tratar de uma forma de postulado que vige quase em estado de perenidade por toda a civilização e é disseminado como válido à diversidade das classes sociais, pode-se arguir se o bem e a justiça professados são valores estabelecidos e distribuídos desigualmente entre os desiguais (beneficiários) para promover algum tipo de equilíbrio não captado pela racionalidade universal terrena ainda em estágio de evolução material. Assim, é fundamental levarmos em conta que distinguir quem são os beneficiários dessa evolução material faz toda a diferença. Por se tratar de processo evolutivo condicionado, temos que ter em mente a existência da realidade contraditória. Alguns ditam a condição e outros a cumprem ou seguemsem a percepção de seu estado. A universalidade do bem ou valor cuja 11 imanência é a representação da singularidade ligada a subjetividade humana não pode ser indutiva para a coletividade sem que seja antes algo que opere na realidade de valores como possibilidade comum, em que pesem as contradições adstritas da sociedade capitalista. Contradições essas, cada dia maisacentuadas e ascendentes. O homem tem sua humanidade integrada quando o ente social incorpora em si virtudes cujas características podem ser presenciadas em sua individualidade. O significado dessa percepção faz que o homem se estabeleça e seja notado a partir de si e daí se transforme juntamente de suas próprias produções e transformações que o caracterizam como ser racional e materializador da história. É no trabalho e com ele que essa condição vigora como precursora e instrumento (ao mesmo tempo) de mudanças da natureza. O aumento geral da produtividade do trabalho (em consequência do desenvolvimento da criação de gado, da agricultura e dos serviços manuais), bem como o aparecimento de novas forças de trabalho (pela transformação dos prisioneiros de guerra em escravos), elevou a produção material até o ponto de se dispor de uma quantidade de produtos excedentes, isto é, de produtos que se podiam estocar porque não eram exigidos para satisfazer necessidades imediatas. Criaram- se, assim, as condições para que surgisse a desigualdade de bens entre os chefes de família que cultivavam as terras da comunidade e cujos frutos eram repartidos até então com igualdade, de acordo com as necessidades de cada família. (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 1993, p. 30). É nos atributos e nas virtudes humanas que é possível encontrar um diferencial em que as relações podem ser admitidas como sociais e, também, válidas como objetos históricos observáveis. Situação vigente desde o momento em que a ação e comportamento são integrados no tempo e no espaço (ou ambiente), onde o trabalho se realiza sob condições comparáveis em todas as épocas, sobretudo, quando a realização humana passa a transformar a natureza, introduz necessidades e subjaz o homem à condição de explorado e explorador, induzindo à lógica de uma estranhada forma (principalmente para a época) de consumo e da propriedade privada como valor ascendente na história da humanidade. 12 Com a desigualdade de bens tornou-se possível a apropriação privada dos bens ou produtos do trabalho alheio, bem como o antagonismo entre pobres e ricos. Do ponto de vista econômico, o respeito pela vida dos prisioneiros de guerra, que eram poupados do extermínio para serem convertidos em escravos, transformou-se numa necessidadesocial. Com a decomposição do regime comunal e o aparecimento da propriedade privada, foi-se acentuando a divisão de homens livres e escravos. A propriedade – dos proprietários de escravos, em particular – livrava da necessidade de trabalhar. O trabalho físico acabou por se transformar numa ocupação indigna de homens livres. Os escravos viviam em condições espantosas e arcavam com o trabalho físico, particularmente o mais duro. […] Os escravos não eram pessoas, mas coisas, e, como tais, seus donos podiam comprá-los, vendê-los, apostá-los nos jogos de cartas ou inclusive matá-los. (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 1993, p. 30). Podemos até dizer, acerca da presença do valor moral ou ético, sob a lógica do consumo e da propriedade privada, já em sua origem, que se trata dos primeiros fundamentos sociais para as contradições que serão reveladas ao longo do percurso histórico. O homem traz em si a mobilidade adaptativa em que sua percepção moral ou ética em diversos momentos da história se contradiz e se relativiza – “relativismo ético” – em certos sentidos sem, entretanto, ceder em alguns valores que o acompanham pela história. Foi o que pudemos observar em nossa pesquisa e nas referências teóricas cotejadas desde a antiguidade até a atualidade. A caracterização do gênero humano como espécie racional distinta das demais espécies perde sua distinção se são impostas ao homem reações e relações de subsistência admitidas, mais diretamente, como definidoras das outras espécies. Considerar como real essa hipótese, ou melhor, o comportamento do homem como impulso reacional, peculiar aos instintos irracionais (apenas), como definidor de sua conduta, desconstitui a condição humana. Pode-se dizerque há, propositadamente, uma espécie de involução teleológica do conhecimento das espécies vivas, sobretudo dos animais (racionais eirracionais), admitindo-se uma forma de condicionamento social (gregarismo) aogênero humano nivelando suas ações a reações desconstituídas da razão. A desconstituição de sua relação racional com a natureza, como se suas produções e transformações históricas não detivesse um processo evolutivo que a diferencia das outras espécies, especialmente, se referirmo-nos aos animais 13 irracionais. Como se as condições evolutivas do gênero humano se repetissem, fossem estacionárias, primitivas, admitindo-se (ainda) que suas necessidades se limitassem à nutrição e às sensações condizentes ao alívio da dor e ao estímulo do prazer. Os vários métodos específicos pelos quais os animais levam a efeito o processo de procura do alimento, da nutrição, a série de instintos que constituem o acasalamento, a criação e educação da prole, a elaboração dos vários dispositivos de locomoção, o funcionamento dos primitivos mecanismos defensivos e ofensivos, tudo isto constituem instintos. Em cada caso podemos correlacionar o instinto com um aparelho anatômico, com um mecanismo fisiológico e uma finalidade específica no vasto processo biológico da existência individual e racial. No conjunto da espécie cada indivíduo comportar-se-á de maneira idêntica, desde que se achem presentes as condições de seu organismo e as circunstâncias externas para desencadearem o instinto. (MALINOWSKI, 2000, p. 159). O caráter inato presumido por Malinowski passa a ser movido e sustentado pela exterioridade, mas não como algo a que instintivamente ou por impulso reagimos contra ou perseguimos como vital à subsistência, pois se tornou obstáculo ou ameaça à dor ou ao prazer e compromete a existência. Não é isso. A plasticidade dos instintos se dá sob a ótica citada em função de que já não são mais o prazer ou a dor de quem instila seus impulsos em sua própria defesa que prevalece. O que prevalece, de fato, é sustentação do prazer e todas as ações dirigidas para impossibilitar a dor de quem (ou do que) externamente impõe, como propriedade sua, a integridade (corpo e alma) do outro como instrumento para defender-se de um mal ou para produzir um bem ou um serviço do qual é ó único beneficiário. Trata-se da condição na qual as virtudes se tornam comprometidas pela dor e pelo prazer. Os instintos, nessa hora, sustentam essa condição, afinal, a dor e prazer movem os sentidos perceptivos dos excessos e da carência, dos quais Aristóteles sublinha como designativos para o vício e para a virtude. As virtudes têm a ver com ações e paixões e toda paixão e toda ação são acompanhadas por prazer e dor, isso constitui uma demonstração adicional de que a virtude diz respeito ao prazer e à dor. Os seres humanos se corrompem através de prazeres e dores, a saber, quer perseguindo e evitando os prazeres e dores equívocos, quer os 14 perseguindo e evitando no momento equívoco, ou da maneira equívoca, ou em um dos outros meios equívocos entre os quais erros de conduta podem ser logicamente classificados […]. A suposição de que a virtude moral é a qualidade segundo a qual se age da melhor forma em relação aos prazeres e dores e que o vício é o oposto. (ARISTOTELES, 2002, p. 68-69) Kant (2003, p. 77), em sentido semelhante, ao referir-se às “[...] faculdades de apetição superior e inferior”, insere elementos importantes para definir a condição com a qual a subsistência pode ser condicionante às questões de valor (moral ou ético) e da felicidade a partir das necessidades (carências). Os sentimentos de prazer e de desprazer são reflexo (reação instintiva) e constructo (reação condicionada) ao mesmo tempo para que em determinadas situação se consiga verificar o quanto as virtudes ou os vícios implicam ou comprometem a percepção moral e o comportamento ético em um determinado ambiente ou na sociedade na busca pela felicidade. O que se pensava e se pensa sobre os valores ou virtudes pode ser um bom exemplo dessa expressão aristotélica ao longo da história, no entanto, tal reflexão precisa de outro espaço teórico ou investigativo, para o qual esta tese não está direcionada e tampouco dá conta de abarcar. Ato subjetivo que incorpora a tendência do comportamento no qual a singularidade é influenciada diretamente por elementos particulares da cultura e da história, mas que ganham peso e participação circunstancial, de acordo com o momento ou a condição em que se situa na constituição de sociedade a partir do trabalho. Sánchez Vázquez (1993, p. 27) nos diz que “A moral só pode surgir – e efetivamente surge – quando o homem supera a sua natureza puramente natural, instintiva, e possui já uma natureza social […]”; uma superação que se dá, de fato, na produção e na transformação da própria natureza com o uso da força humana de trabalho como ação provedora das necessidades que não são mais adstritas à coleta e à caça, mas que representam um processo transformador da humanidade conferindo à espécie humana, as possibilidades da manifestação das suas virtudes e nelas se intensificam sua racionalidade. Os meios de produção, a precarização e o ambiente de trabalho – assunto tratado mais detidamente adiante, onde estão presentes e em exercício, se 15 levarmos em conta (pelo menos), às condições de subsistência, concordaremos que a forma como certos trabalhadores são tratados, suas condições degradadas de trabalho e de saúde, a invisibilidade social em que vivem, são condizentes quando muito (direta e objetivamente) à (sub)existência nos polos de exclusão ou 85 de indigência marginal consentida e mantida sob a subserviência social do Estado regido pela lógica do poder capitalista. No entanto, visando estabelecer uma primeira abordagem à ética como fundamento social, é importante lançarmos um olhar naquilo que Aristóteles (2009, p. 253- 254) considera como as “três coisas fazem os homens bons e virtuosos: a natureza, os costumes e a razão”. Primeiramente, é preciso que a natureza faça nascer homem e não outra espécie qualquer de animal. É preciso também queela dê certas qualidades de alma e de corpo. Muitas destas qualidades não têm utilidade alguma; porque os costumes fazem com que elas mudem e se modifiquem. Os costumes desenvolvem, por vezes, as qualidades naturais, dando-lhes uma tendência para o bem ou para o mal. Os outros animais seguem principalmente o instinto da natureza; alguns mesmos, em pequeno número, obedecem ao império dos costumes. O homem segue a natureza e os costumes. Segue também a razão. Só ele é dotado da razão. É preciso que haja acordo e harmonia entre essas três coisas. Porque a razão leva os homens a fazerem muitas coisas contrárias ao hábito e à natureza, quando eles se convencem de que é melhor fazer de outra forma. (ARISTÓTELES, 2009, p. 253- 254) 16 3 ÉTICA PROFISSIONAL E SUAS TENDÊNCIAS SOCIAIS No presente capítulo pretendemos abordar o conceito da ética profissional, buscando trazer suas principais características e reflexões para que o discente possa, teoricamente, compreender o seu papel social nos contextos em que estão inseridos. As lideranças sociais têm um poder e uma responsabilidade decisivos em relação à ética. Nenhuma nação, povo ou grupo social pode realizar seu projeto histórico sem lideranças. A liderança social é o elemento de ligação entre os interesses do grupo social e as oportunidades históricas disponíveis para realizá- los. A responsabilidade ética da liderança, portanto, se pudesse ser medida, teria o tamanho e o peso dos direitos reunidos de todos aqueles que ela representa e lidera. A liderança social tem uma dupla responsabilidade ética: institucional e pessoal. a) Institucional: porque devem cumprir fiel e estritamente os deveres que lhe são atribuídos. b) Pessoal: porque devem ser cada uma delas, um exemplo de cidadania: justas e eticamente íntegras. De forma sintética, João Baptista Herkenhoff (2001) exterioriza sua concepção de ética: o mundo ético é o mundo do “deve ser” (mundo dos juízos de valor), em contraposição ao mundo do “ser” (mundo dos juízos de realidade). Todavia, “a moral é a parte subjetiva da ética”. O homem nem sempre pode o que quer, nem quer sempre o que pode. Ademais, sua vontade e seu poder não concordam com seu saber. Quase sempre as circunstâncias externas determinam a sua sorte. (D’HONDT, 1966, p. 105). O estudo e o conhecimento da Deontologia (do grego deontos = dever e logos = tratado) se voltam para a ciência dos deveres, no âmbito de cada profissão. É o estudo dos direitos, emissão de juízos de valores, compreendendo 17 a ética como condição essencial para o exercício de qualquer profissão. A ética é indispensável ao profissional, porque na ação humana “o fazer” e “o agir” estão interligados. O fazer diz respeito à competência, à eficiência que todo profissional deve possuir para exercer bem a sua profissão. O agir se refere à conduta do profissional, ao conjunto de atitudes que deve assumir no desempenho de sua profissão. Tanto a moral como o direito baseiam-se em regras que visam estabelecer certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém, se diferenciam. A moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como uma forma de garantir o seu bem-viver. Independe das fronteiras geográficas e garante uma identidade entre pessoas que sequer se conhecem, mas utilizam este mesmo referencial moral comum. O direito busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada pelas fronteiras do Estado. As leis têm uma base territorial, que valem apenas para a área geográfica onde uma determinada população ou seus delegados vivem. A ética é o estudo geral do que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo ou injusto, adequado ou inadequado. Um dos seus objetivos é a busca de justificativas para as regras propostas pela Moral e pelo Direito. Ela é diferente de ambos – Moral e Direito – pois não estabelece regras. É extremamente importante saber diferenciar a Ética da Moral e do Direito. Estas áreas de conhecimento se distinguem, porém, têm grandes vínculos e até mesmo sobreposições. Tanto a Moral como o Direito baseiam-se em regras que visam estabelecer uma certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém, se diferenciam. A Moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como uma forma de garantir o seu bem-viver. A Moral independe das fronteiras geográficas e garante uma identidade entre pessoas que sequer se conhecem, mas utilizam este mesmo referencial moral comum. O Direito busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada pelas fronteiras do Estado. As leis têm uma base territorial, elas valem apenas para aquela área geográfica onde uma determinada população ou seus delegados vivem. Alguns autores afirmam que o Direito é um subconjunto da Moral. Esta perspectiva pode gerar a conclusão de que toda a lei é moralmente aceitável. Inúmeras situações demonstram a existência de conflitos entre a Moral 18 e o Direito. A desobediência civil ocorre quando argumentos morais impedem que uma pessoa acate uma determinada lei. Este é um exemplo de que a Moral e o Direito, apesar de referirem-se a uma mesma sociedade, podem ter perspectivas discordantes. A Ética é o estudo geral do que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo ou injusto, adequado ou inadequado. Um dos objetivos da Ética é à busca de justificativas para as regras propostas pela Moral e pelo Direito. Ela é diferente de ambos, pois não estabelece regras. Esta reflexão sobre a ação humana é que caracteriza a Ética. 3.1 Ética profissional: quando se inicia esta reflexão? Esta reflexão sobre as ações realizadas no exercício de uma profissão deve iniciar bem antes da prática profissional. A fase da escolha profissional, ainda durante a adolescência muitas vezes, já deve ser permeada por esta reflexão. A escolha por uma profissão é optativa, mas ao escolhê-la, o conjunto de deveres profissionais passa a ser obrigatório. Geralmente, quando você é jovem, escolhe sua carreira sem conhecer o conjunto de deveres que está preste a assumir tornando-se parte daquela categoria que escolheu. Toda a fase de formação profissional, o aprendizado das competências e habilidades referentes à prática específica numa determinada área, deve incluir a reflexão, desde antes do início dos estágios práticos. Ao completar a formação em nível superior, a pessoa faz um juramento, que significa sua adesão e comprometimento com a categoria profissional onde formalmente ingressa. Isto caracteriza o aspecto moral da chamada Ética Profissional, esta adesão voluntária a um conjunto de regras estabelecidas como sendo as mais adequadas para o seu exercício. Mas pode ser que você precise começar a trabalhar antes de estudar ou paralelamente aos estudos, e inicia uma atividade profissional sem completar os estudos ou em área que nunca estudou, aprendendo na prática. Isto não exime você da responsabilidade assumida ao iniciar esta atividade. O fato de uma pessoa trabalhar numa área que não escolheu livremente, o fato de “pegar o que 19 apareceu como emprego”, por precisar trabalhar, o fato de exercer atividade remunerada onde não pretende seguir carreira, não isenta da responsabilidade de pertencer, mesmo que temporariamente, a uma classe, e há deveres a cumprir. Um jovem que, por exemplo, exerce a atividade de auxiliar de almoxarifado durante o dia e, à noite, faz curso de programador de computadores, certamente estará pensando sobre seu futuro em outra profissão, mas deve sempre refletir sobre sua prática atual. 3.2 Ética profissional: como é esta reflexão? Algumas perguntas podem guiar a reflexão, até ela tornar-se um hábito incorporado ao dia-a-dia. Tomando-se o exemplo anterior, esta pessoa pode se perguntar sobre os deveres assumidos ao aceitar o trabalho como auxiliar de almoxarifado, como estácumprindo suas responsabilidades, o que esperam dela na atividade, o que ela deve fazer, e como deve fazer, mesmo quando não há outra pessoa olhando ou conferindo. Pode perguntar a si mesmo: Estou sendo bom profissional? Estou agindo adequadamente? Realizo corretamente minha atividade? É fundamental ter sempre em mente que há uma série de atitudes que não estão descritas nos códigos de todas as profissões, mas que são comuns a todas as atividades que uma pessoa pode exercer. Atitudes de generosidade e cooperação no trabalho em equipe, mesmo quando a atividade é exercida solitariamente em uma sala, ela faz parte de um conjunto maior de atividades que dependem do bom desempenho desta. Uma postura proativa, ou seja, não ficar restrito apenas às tarefas que foram dadas a você, mas contribuir para o engrandecimento do trabalho, mesmo que ele seja temporário. Se sua tarefa é varrer ruas, você pode se contentar em varrer ruas e juntar o lixo, mas você pode também tirar o lixo que você vê que está prestes a cair na rua, podendo futuramente entupir uma saída de escoamento e causando uma acumulação de água quando chover. Você pode atender num balcão de informações respondendo estritamente o que lhe foi perguntado, de forma fria, e estará cumprindo seu dever, mas se você se mostrar mais 20 disponível, talvez sorrir, ser agradável, a maioria das pessoas que você atende também serão assim com você, e seu dia será muito melhor. Muitas oportunidades de trabalho surgem onde menos se espera, desde que você esteja aberto e receptivo, e que você se preocupe em ser um pouco melhor a cada dia, seja qual for sua atividade profissional. E, se não surgir, outro trabalho, certamente sua vida será mais feliz, gostando do que você faz e sem perder, nunca, a dimensão de que é preciso sempre continuar melhorando, aprendendo, experimentando novas soluções, criando novas formas de exercer as atividades, aberto a mudanças, nem que seja mudar, às vezes, pequenos detalhes, mas que podem fazer uma grande diferença na sua realização profissional e pessoal. Isto tudo pode acontecer com a reflexão incorporada a seu viver. E isto, é parte do que se chama empregabilidade: a capacidade que você pode ter de ser um profissional que qualquer patrão desejaria ter entre seus empregados, um colaborador. Isto é, ser um profissional eticamente bom. 3.3 Ética profissional e relações sociais O varredor de rua que se preocupa em limpar o canal de escoamento de água da chuva, o auxiliar de almoxarifado que verifica se não há umidade no local destinado para colocar caixas de alimentos, o médico cirurgião que confere as suturas nos tecidos internos antes de completar a cirurgia, a atendente do asilo que se preocupa com a limpeza de uma senhora idosa após ir ao banheiro, o contador que impede uma fraude ou desfalque, ou que não maquia o balanço de uma empresa, o engenheiro que utiliza o material mais indicado para a construção de uma ponte. Todos estão agindo de forma eticamente em suas profissões, ao fazerem o que é correto, mesmo quando não estão sendo observados, preocupando-se assim, não só com os deveres profissionais, mas também, com as pessoas. As leis de cada profissão são elaboradas com o objetivo de proteger os profissionais, a categoria como um todo e as pessoas que dependem daquele profissional, mas há muitos aspectos não previstos especificamente, e que 21 fazem parte do comprometimento do profissional em ser eticamente correto, aquele que, independente de receber elogios, faz a coisa certa. 3.4 Ética profissional e atividade voluntária Outro conceito interessante de examinar é o de Profissional, como aquele que é regularmente remunerado pelo trabalho que executa ou atividade que exerce, em oposição a Amador. Nesta conceituação, se diria que aquele que exerce atividade voluntária não seria profissional, e esta é, uma conceituação polêmica. Em realidade, voluntário é aquele que se dispõe, por opção, a exercer a prática Profissional não-remunerada, seja com fins assistenciais, ou prestação de serviços em beneficência, por um período determinado ou não. Aqui, é fundamental observar que só é eticamente adequado, o profissional que age, na atividade voluntária, com todo o comprometimento que teria no mesmo exercício profissional se este fosse remunerado. Seja esta atividade voluntária na mesma profissão da atividade remunerada ou em outra área. Por exemplo, um engenheiro que faz a atividade voluntária de dar aulas de matemática. Ele deve agir, ao dar estas aulas, como se esta fosse sua atividade mais importante. É isto que aquelas crianças cheias de dúvidas em matemática esperam dele. Se a atividade é voluntária, foi sua opção realizá-la. Então, é eticamente adequado que você a realize da mesma forma como faz tudo que é importante em sua vida. 3.5 Ética profissional: pontos para sua reflexão É imprescindível estar sempre bem informado, acompanhando não apenas as mudanças nos conhecimentos técnicos da sua área profissional, mas também, nos aspectos legais e normativos. Vá e busque o conhecimento. Muitos processos ético-disciplinares nos conselhos profissionais acontecem por desconhecimento, negligência. 22 Competência técnica, aprimoramento constante, respeito às pessoas, confidencialidade, privacidade, tolerância, flexibilidade, fidelidade, envolvimento, afetividade, correção de conduta, boas maneiras, relações genuínas com as pessoas, responsabilidade, corresponder à confiança que é depositada em você. Comportamento eticamente adequado e sucesso continuado são indissociáveis. Quem é o melhor colaborador? a) Não é o mais “inteligente” e “brilhante” – é o mais “comprometido”; b) É o que atende aos pedidos imediatamente – tanto dos chefes quanto dos clientes e colegas de trabalho; c) É o sempre pronto a colaborar com seus colegas de trabalho – mesmo quando a tarefa não é sua; d) É o que participa, dá opiniões, “briga pela empresa” – mesmo correndo o risco de não ser bem compreendido; e) É o que termina as coisas que começa; f) É aquele presta atenção aos detalhes nas coisas que faz – procura fazer tudo bem feito em seus detalhes; g) É o que demonstra estar feliz – abaixo os “entediados” no trabalho; h) É o que estar constantemente procurando saber mais sobre a empresa – para poder servir melhor, clientes e colegas; i) É aquele que repassa as informações relevantes a seus subordinados e chefes – não “guarda” informações relevantes para si como forma de demonstrar “poder”; j) É aquele que “não fica olhando o tempo todo para o relógio” – para saber a hora de ir embora; k) É o ético – no sentido mais amplo da palavra – não mente, respeita os clientes e os colegas – sejam superiores ou subordinados; l) É o “comprometido com a marca e com os produtos da empresa”; m) É aquele que “respeita” o ambiente de trabalho desde como se veste, até como se comporta, até o que fala; n) É o mais “polido” e “educado” – além de competente. 23 3.6 Sigilo de Informações Uma empresa independente de ser pequena, média ou uma grande corporação tem sua forma própria trabalhar, metas, dados estatísticos, etc. As informações que tomamos conhecimento com nosso trabalho, devem ser restritas a empresa, pois não é ético divulgar assuntos de interesse da empresa a pessoas externas. Pode ocorrer de um colaborador tomar conhecimento de um assunto que não lhe diz respeito, pois ficou sabendo “por acaso” e sair falando a todos inclusive dentro da própria empresa a outros colegas, depois se o fato de forma diferente ou não ocorre, todos ficarão sabendo da notícia e por onde ela começou. Exemplos de comportamento inadequados: a) Um colaborador do departamento de pessoal ouviu seu gerente falar com o diretor que teriam um aumento de 10%, pronto a notícia se espalhoue aumento só era para os cargos de chefia. As consequências, não poderiam ser piores, uma insatisfação enorme. b) Na fila do banco dois “boys” conversando, um deles divulga uma estratégia de marketing da venda de sabonete SPERT e o outra escuta calmo e tranquilo, quando chega de volta a empresa em que trabalha procura seu chefe e divulga o fato, pois se tratam de empresas concorrentes, cujo principal produto é o tal do sabonete. 24 4 ÉTICA PROFISSIONAL NO CAMPO ARISTOTÉLICO O discurso exposto pelo realismo aristotélico, considerava o universo como ordenado por leis constantes e imutáveis. Essa ordem rege não só fenômenos naturais, mas também, os de ordem política, moral ou estética. Alegando existir uma ciência "primeira", a metafísica, que estuda o ser e procura enunciar que essa ordem torna inteligíveis todos os fenômenos. Neste cenário, a teoria ética filosófica objetiva estabelecer o bem tanto ao indivíduo quanto à sociedade num todo. Então, o comportamento ético é o que se considera prudente. Porém, uma questão central que a moral e a ética tratam, e que é muito difícil de responder, é "como devo agir para com os outros?". A visão sob a ética na filosofia grega clássica se faz mais empírica, claramente exposta nas obras de Aristóteles. A ética, segundo Aristóteles (2009), serve como condução do ser humano à felicidade, no sentido mais amplo da palavra. E é em toda interação, na dinâmica do convívio social, que se possibilita transparecer os valores éticos e morais humanos, assim como o desenvolvimento destes. Aristóteles acreditava que o exagero é motivador para a criação de conflitos com outros indivíduos ou com a sociedade, e enquanto tal pode afetar o nosso caráter, com isso os excessos prejudicam a imagem do homem social. E é na observação e reflexão de tais fatos que irá surgir, originar-se a doutrina do justo meio, onde a virtude intermedia pontos extremos, os vícios ou defeitos de caráter. O comedimento, a moderação, o afastamento do excedente vêm para amparar a conduta virtuosa. Em a Ética a Nicômaco, principal obra de Aristóteles sobre ética, o pensador esclarece que a finalidade suprema que governa e justifica a maneira do ser humano conduzir seus atos e sua vida é a felicidade, que não está correlatada com os prazeres, nem implícita nas honrarias recebidas pelo ente agraciado, mas numa vida repleta de posturas e comportamentos virtuosos. E o homem dotado de prudência e habituado ao exercício de tal, encontra no justo meio entre os extremos de seus atos e decisões a virtude. 25 Então, seguindo a concepção do realismo aristotélico de que uma ordem subjacente rege as coisas, a virtude aparece como a medida determinada por esta ordem e pelos fins que a sobre determinam visando o desenvolvimento pleno do ser humano. Costuma-se dizer que nada há que acrescentar nem tirar nas coisas bem-feitas, considerando-se que o excesso ou a falta destrói a perfeição e a justa medida a conserva [...]. E a virtude que é mais perfeita e melhor que toda a arte, do mesmo modo que a natureza, tenderá para o meio. [...] Chamo meio da coisa o igualmente distante dos extremos, que é um e idêntico para todos, meio a respeito de nós, o que não é excesso nem falta. E este não é único nem idêntico para todos. (ARISTÓTELES, 2009) A virtude é uma disposição adquirida voluntariamente, consistindo, em relação a nós, em uma medida, definida pela razão conforme a conduta de um homem que age refletidamente. Ela consiste na medida justa entre dois extremos, um pelo excesso, outro pela falta. (ARISTÓTELES, 2009) Portanto, a virtude está no meio termo das decisões de comportamento, de como atuar para uma situação específica, e o vício se dá pela falta ou pelo excesso. Procurando estabelecer uma aplicação de tal conceito, creio que não seria um equívoco dizermos que, em um processo de negociação onde as partes têm interesses diferentes, chegar à satisfação desejável destas (cliente e empresa) é o que podemos chamar de virtude, enquanto que seus opostos são: a exploração do poder aquisitivo do cliente aproveitando o seu desconhecimento quanto ao custo-benefício do objeto da venda e o valor monetário de mercado comum ao mesmo objeto (excessos na margem de lucratividade sobre o custo do produto); e a concessão de descontos maiores que o lucro obtido na negociação na tentativa de fidelizar este cliente desvalorizando o valor monetário de mercado do objeto da venda e seu custo-benefício (ausência de lucratividade sobre o custo do produto). [...] a virtude está em nosso poder, do mesmo modo que o vício, pois quando depende de nós o agir, também depende o não agir, e vice- versa. de modo que quando temos o poder de agir quando isso é nobre, também temos o de não agir quando é vil; e se está em nosso poder o não agir quando isso é nobre, também está o agir quando isso é vil. logo, depende de nós praticar atos nobres ou vis, e se é isso que se 26 entende por ser bom ou mau, então depende de nós sermos virtuosos ou viciosos. (ARISTÓTELES, 2009) Em suma, para Aristóteles a ética é tratada como a ciência das condutas humanas, objetivando enfim comprometer-se em possibilitar ao homem a garantia da felicidade através de uma vida regida por virtudes morais e éticas. Pois, a razão deve direcionar o cotidiano, e com isso dominar os vícios e criar bons hábitos, e a mediana entre as atitudes, as condutas e as decisões, é o mais importante para estabelecer o equilíbrio e proporcionar o bem, assim como o desenvolvimento harmonioso do ser em seu meio. 4.1 Ética na sociedade brasileira Trazendo a teoria ética aristotélica para a nossa realidade atual, parece- nos à primeira vista que o cidadão brasileiro, em grande parte, esqueceu ou optou por distanciar-se de certos "valores formadores". Ressaltando que, o comportamento ético é o ato de agir, de decidir, de fazer o bem de fato, por uma conduta virtuosa na comunidade em que estamos inseridos, deste modo conduzimos uma vida mais harmoniosa em sociedade, na busca da felicidade, da liberdade e da justiça. E na filosofia moderna, a conduta virtuosa designa uma disposição moral para o bem individual e comum. A sociedade brasileira, nas últimas décadas, vem sofrendo grandes alterações, principalmente se considerarmos o comportamento dos cidadãos, as crenças e os valores culturais. Modificações estas, que veem deixando perplexa uma gama cada vez maior de seus cidadãos, no entanto, seria aceitável, ou melhor, seria consciente esta perplexidade, uma vez que esta transformação se não foi por ela motivada, não deixou de por ela ser aceita? Portanto, vive-se hoje em nosso país em uma imensa e profunda crise moral e ética. O que falar dos sucessivos escândalos na política, que alcançam da mais baixa a mais alta esfera dos cargos públicos? Da utilização de verbas públicas para interesses particulares e enriquecimentos ilícitos? O que dizer do cidadão que se diz indignado com a corrupção dos políticos, no entanto, em suas ações 27 particulares age dentro da mesma lógica, por exemplo, furar fila em bando? Ou pagar propina para receber a carteira de motorista sem fazer o teste? Comprar o voto de eleitores "inconscientes" ou "indecentes" por meio de programas assistencialistas? Assim como, vender a sua cidadania e perder a sua dignidade em prol de quantias irrisórias e ou a obtenção de uma subsistência pelo menor esforço? Outro exemplo desta inversão: hoje, interpretar a criminalidade como principal causa da exclusão social e da heterogeneidade na concentração de renda é entender apenas parte da dimensão desta realidade, devido a estas não serem causas e sim, consequências. O problema da exclusão não é somente social, é, principalmente, moral. Pois, vemos que, não é a vontade de seguir em conformidade com normasde conduta ética ou leis estabelecidas para a sociedade que faz com que os cidadãos brasileiros se comportem como espera o meio social, e sim, o medo de sansões punitivas originárias de desvios de conduta. Neste quadro, seguem "impregnados" na rotina dos brasileiros, novamente sem generalismo, atos imorais e antiéticos, o que não concede direitos de julgamento e crítica a transgressões corruptas em qualquer ordem social, pois o "jeitinho brasileiro" também se configura inserido numa moral oportunista, onde o individualismo ampara o interesse do triunfo conveniente em detrimento do interesse do outro ou da coletividade. Passando o Brasil a carregar consigo a imagem de uma sociedade corruptora e corruptível, descrente das práticas virtuosas de seu povo e das suas instituições. Contudo, existem os íntegros em que se pode confiar; àqueles que não pensam egoisticamente, que se incomodam com o rompimento dos valores éticos e morais na dinâmica das relações sociais. E, ainda, no íntimo ou explicitamente, ninguém quer ser flagrado em desvios de conduta, transgredindo a posturas esperadas pela coletividade a que está inserido, ou a valores culturais preestabelecidos. É a partir desta moral da integridade que se emoldura o homem virtuoso, honesto, leal, idôneo, amparado por uma postura ética fundamentada nos princípios aristotélicos para a busca da convivência harmônica do ser com seu meio em prol do bem individual e comum. 28 4.2 O meio profissional e empresarial Atualmente, a ética se faz essencial para a interação no meio social comum, e assim, também se faz primordial na regulação e regulamentação das relações profissionais e empresariais, numa contextualização que deixa de ser mais empírica, filosoficamente como tratava Aristóteles, e passa a ser mais descritiva na conduta ética regida por códigos normativos. A aplicação da ética é sumariamente importante para a efetividade profissional e organizacional, principalmente no Brasil, que traz em seu povo valores deturpados do que é moral e virtuoso, e a descrença no que se afirma responsável socialmente. No âmbito profissional, a ética é relevante por estar presente nas menores atitudes e fica claro que em todas as profissões existe uma maneira certa, prudente e justa, de decidir, de conduzir e fazer uma específica tarefa em uma determinada atividade profissional. Assim, a ética auxilia no desenvolvimento do bem-estar individual e coletivo por caminhos regidos pela virtude nos atos funcionais e administrativos dentro de uma empresa, no segmento liberal ou no segmento autônomo, em prol da harmonia social. E para tal, existe o código de ética profissional, um instrumento regulador que apresenta normas de conduta para o cumprimento de determinada profissão. Sendo de interesse geral dos inseridos naquela classe, na tentativa de levar o profissional ao cumprimento do exercício de uma virtude obrigatória, com existência de órgãos fiscalizadores e controladores do respeito ao referido código na execução das atividades pertinentes a profissão. Abaixo, o juramento do administrador: Prometo dignificar minha profissão, consciente de minhas responsabilidades legais, observar o Código de Ética, objetivando o aperfeiçoamento da Ciência da Administração, o desenvolvimento das instituições e a grandeza do homem e da pátria. (CFA, s.d.) No meio empresarial, as instituições públicas ou privadas passaram a perceber como a ética é necessária para que o mercado tenha uma visão mais positiva da sua missão para com o público alvo de seus negócios e a sociedade, como exemplo, partindo a tratar com maior ênfase mecanismo que efetivamente 29 maximize a responsabilidade social e ambiental das organizações, a fim de afirmar uma imagem de comprometimento com o futuro da coletividade e do bem comum para desenvolvimento e sustentabilidade tanto da instituição quanto de sua relação com o meio inserido. Enfim, a ética empresarial condiz com um valor da organização que proporciona sua reputação e, consequentemente, seus bons resultados. A ética empresarial é "[...] o comportamento da empresa - entidade lucrativa - quando ela age de conformidade com os princípios morais e as regras do bem proceder aceitas pela coletividade (regras éticas)". (MOREIRA, 1999) 30 5 ÉTICA DO DISCURSO EM JÜRGEN HABERMAS: A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM PARA UM AGIR COMUNICATIVO O discurso e o agir comunicativo na ética de Habermas é desenvolvido a partir da sua obra intitulada “consciência moral e agir comunicativo”, onde o autor desenvolve sua teoria a partir do discurso e do consenso desenvolvido pela comunicação. O agir comunicativo nasce na tentativa de fundamentar a ética a partir do discurso, levando em consideração a comunicação entre os sujeitos. Assim, a ética pautada no agir comunicativo busca a legitimidade das normas morais na intersubjetiva. De acordo com Lima: [...] a ética do discurso emerge dentro da filosofia alemã a partir dos anos 70 do século XX – com Apel e Habermas – como uma tentativa de oferecer uma fundamentação para o agir moral, fundamentação esta que busca transcender os limites das alternativas éticas de cunho metafísico-subjetivista. (LIMA, 2015, p. 2013) Este capítulo pretende demonstrar uma análise sobre a questão ética do discurso dentro do pensamento de Habermas, e sobre o consenso desenvolvido em uma comunidade (sociedade), que vise uma pragmática universal com o discurso; quais os pressupostos que conduzem o discurso para que se tenha validade universal normas morais, onde todos os interlocutores possuem direitos de expressarem seus pensamentos sobre as leis e ética vigente na comunidade. Na primeira parte será explicitado o significado do discurso no pensamento de Habermas, levando em consideração a importância que o discurso desempenha no agir comunicativo. O discurso desta forma torna-se a ação exercida pelos falantes para que aconteça o consenso; o discurso bem elaborado cria as possibilidades racionais para a existência do agir comunicativo. Na segunda parte, é feita uma análise sobre o agir comunicativa e qual a importância que essa ação exerce para a existência de uma ética que vise o consenso entre os interlocutores. Na terceira parte, é desenvolvida uma verificação sobre a importância da linguagem na ética discursiva de Habermas, tendo como principal característica a dependência que a ética tem da linguagem. 31 5.1 Significado do discurso para Habermas Antes de tudo é necessário entender o que Habermas quer dizer com o sentido do “Discurso”. De acordo com Peres Filho (2012, p. 13), em sua dissertação de mestrado, Habermas entende o “Discurso” “como sendo a ação social, comunicativa e consensual, que se dá por meio da linguagem e é orientada para o entendimento de participantes”. Diante disso, citando como exemplo dois indivíduos que estejam em quaisquer momentos, com desejo de se comunicarem, expõem, em qualquer tipo de ato de fala, presunções de validades universais. Segundo Lubenow: [...] todas as morais se movimentam em torno dos princípios relativos à igualdade de tratamento, à solidariedade e ao bem-estar geral. Estas são noções fundamentais que se reportam às condições de simetria e às expectativas de reciprocidade da ação comunicativa. (LUBENOW, 2011, p. 63) Habermas também em sua Ética do Discurso procura sair daquilo que se prende somente à consciência. Ética do Discurso procura o ponto de partida kantiano, meramente interior e monológico procura superar a perspectiva monológica do paradigma da consciência, que atribui unicamente ao indivíduo singular à capacidade de examinar em seu foro interno as máximas da ação (LUBENOW, 2011, p. 65). O outro passo dado na Ética pensada por Habermas é tirar a razão como sendo ocentro do julgamento e colocando o diálogo como possibilidade de entendimento para os debates. Isso para não se cair em uma filosofia da consciência que incorre em solipsismo, quando uma consciência estaria adequada para projetar normas. Para Habermas o sentido das tradições deve ser antes de tudo, compartilhada em um diálogo consensual para que se chegue a leis com validade universal. É na argumentação que acontece a troca de ideias, no diálogo que surge o consenso em meio a tantos pensamentos. Aqui conta basicamente a intersubjetividade de entendimento que se desenvolve na rede comunicativa política. E na busca pelo sentido da verdade na ética do discurso, o diálogo deve 32 estar isento de qualquer ato de dominação, pois o consenso deve ser racional onde ambas as partes devem ser ouvidas. Vale ressaltar que a participação deve ser ativa e não de meros participantes que se deixam conduzir por diálogos que não condizem que a validade das normas éticas da comunidade. A argumentação deve estar desprovida de qualquer barganha ou incentivo negativo ligado à regalia. Dessa forma, a argumentação não está ligada com a consciência subjetiva, mas com ideia coletiva, onde os participantes discutem sobre o dever moral de maneira a facilitar a existência do consenso. 5.2 Ética do discurso e a importância do agir comunicativo A Ética do discurso de Jürgen Habermas trata das questões filosóficas morais e políticas, onde a ética tem espaço dentro do discurso comunitário frente a um agir comunicativo que, para ele, se caracteriza como a oportunidade que todos os falantes têm para se expressarem frente às normas e condutas morais. Nessa ação, deve se ter como ideia fundamental, a interação mútua entre os sujeitos, para que só assim, seja possível acontecer uma ética pautada no discurso. Quanto a isso Habermas, esclarece o significado fundamental de interação comunicativa: [...] chamo comunicativa as interações nas quais as pessoas envolvidas se põem de acordo para ordenar seus planos de ação, o acordo alcançado em cada caso medindo-se pelo reconhecimento intersubjetivo das pretensões de validez. (HABERMAS, 1989, p. 79) Dessa maneira, a ideia fundamental do agir comunicativo é norteada pela interação entre os interlocutores dando oportunidades para que a ação seja exercida por todos sem que haja repreensão. A validez das normas possui sentido aceitável somente a partir do consenso entre os interlocutores. E esse consenso surge como a ação comunicativa de maneira racional exercida por todos aqueles que fazem parte da comunidade. Com isso, a validez nasce da discussão e ação elaborada pelos participantes. Segundo o próprio Habermas (1989), essa discussão serve para justificar os argumentos que forem discutidos dentro da comunidade, e fazer com 33 que tais argumentos tenham validade. O agir comunicativo por sua vez vai dar possibilidades a existência da validade das normas dentro da comunidade e possibilita uma ética ligada à linguagem. Assim, a ética discursiva de Habermas se torna dependente da linguagem exercida pelos participantes, pois é diante da linguagem coordenada que se compreende e se chega ao entendimento mútuo. Habermas (1990, p. 72), coloca que “uma vez que o agir comunicativo depende do uso da linguagem dirigida ao entendimento, ele deve preencher condições mais rigorosas”. E a partir dessas condições os participantes discutem suas ideias e fazem suas argumentações deliberando um planejamento de ações e normas. Apesar de a linguagem ter participação na ética discursiva habermasiana, não é qualquer discurso que se torna válido e nem muito menos qualquer participação por parte dos falantes. Tal ação deve ser coordenada e exercida racionalmente. Vale lembrar que a razão comunicativa aqui empregada, não é mesma razão expressa por Kant, quando o mesmo coloca a ação moral sobre a parte subjetiva. Em relação à maneira como deve ser apreendida à ação exercida sobre as questões normativas, Habermas esclarece, e faz a distinção entre o agir comunicativo e o agir estratégico: No agir estratégico um atua sobre o outro para ensejar a continuação desejada de uma internação, no agir comunicativo um é motivado racionalmente pelo outro para uma ação de adesão, e isso em virtude do efeito ilocucionário de comprometimento que um ato de fala suscita. Que um falante possa motivar racionalmente um ouvinte à aceitação de semelhança não se explica pela validade do que é dito, mas, sim pela garantia assumida pelo falante, tendo um efeito de coordenação, de que se esforçará, se necessário, para resgatar a pretensão erguida. (HABERMAS, 1989, p. 79) É sobre o agir comunicativo e não tão importante, o agir estratégico, que Habermas trabalha sua teoria da ética do discurso. Somente numa ação exercida racionalmente é possível encontrar adesões dentro da comunidade, pois é diante da intersubjetividade que o ato do falante terá grande respaldo e poderá ser tido como válido. A validez a que Habermas explica na citação é a de que só é aceitável o discurso que apresente validade racional, não sendo apenas algo dito de forma arbitrária ou que sofra influências externas. As forças que manterão as normas com validade dentro da comunidade não estão é um plano teleológico, 34 mas na própria ação comunicativa que se desenrola em “força racional motivadora de atos de entendimento” (HABERMAS, 1990, p. 72). Diante disso, é na razão comunicativa que surge um acordo pautado no consenso. Essas argumentações são desenvolvidas através do conhecimento moderno de mundo, frente à existência de uma sociedade com seres coerentes, mas com princípios segmentados pelo pluralismo desenvolvido dentro de cada espaço, sendo dessa maneira não inevitável, mas às vezes acaba por ser desejável, principalmente de acordo com modelos de vida específicos, desenvolver um ponto de vista moral, onde os interlocutores possam definir as ações de maneira cooperativa. De acordo com Lubenow: Para Habermas, o ponto de vista moral é o que permite uma avaliação imparcial das questões morais; ele nada mais é do que o lugar, a perspectiva, que torna possível reconstruir as intuições, os valores, as normas do mundo vital e julgar imparcialmente conflitos morais concretos, principalmente os que nascem no contexto da validade e obrigatoriedade de normas morais. (LUBENOW, 2011, p. 60) Assim, a Ética do Discurso de Habermas surge diante do pluralismo e da maneira de desenvolver validades universais em meio a tantas controvérsias e formas de pensa diferentes. Para tanto, segundo Habermas (1996, p. 15) é preciso “reconstruir a validade universal do discurso”, validade esta que está inserida em qualquer ambiente, discurso e sociedade. De acordo com Hamel: A partir de Habermas, a ética passa a implicar coletividade, remodelando também a esfera pública, que deve ser pluralista, com forte consequência para as relações sociais, consubstanciando, ainda, uma realocação do direito moderno aliado a uma nova função, qual seja, a de garantir as regras democráticas de participação popular. (HAMEL, 2011, p. 165) A ética exposta por Habermas está fundamentada na perspectiva em que, a razão comunicativa deve ser a base principal que direciona os seres humanos dentro de uma comunidade, de forma que mantenham um diálogo que se traduza válidos universalmente, e que vise o bem comum e normas que estejam de acordo com o entendimento mútuo. Habermas ao colocar a linguagem como 35 força para a existência de uma ética do discurso mostra como deve agir os participantes e como o entendimento mútuo através da linguagem acontece. Essa razão comunicativa proporciona assim, por se dizer, responsabilidade comunicativa por parte de cada indivíduo em relação ao outro. É diante das falas dos participantes que dá sentido à validade das normas e reconhecimentointersubjetivo. É cooperação e não em uma razão meramente subjetiva que se encontra a válida ou critério de verdade das normas. A busca pela validade da ação moral em Habermas não está em um sujeito isolado, mas no sujeito se relacionando com outro sujeito, existindo assim, a intersubjetividade. A ética do discurso não é embasada em um só individuo, mas na coletividade e na cooperação entre os indivíduos. Com isso, passa a se ter uma ideia de ética coletiva e normas escolhidas por todos sem uma força externa à comunidade e sem espaço para que um participante se interponha sobre o outro. Daí, pode-se dizer que existe na teoria ética habermasiana cooperação, solidariedade e uma vida que tem como pretensão o bem. Quanto a isso, comenta Zanella (2012, p. 134), Habermas traz “uma proposta de uma ética do viver bem, da felicidade e da solidariedade entre os indivíduos capazes de linguagem e ação”. Assim, essa ética foge dos moldes de uma ética meramente instrumental e passa a ser uma ética que tem a linguagem como pressuposto importante para a ação e comunicação para se chegar a uma moral dentro do agir comunicativo. O pensamento de Habermas sobre a argumentação comunitária parte do pensamento de Apel, visando uma fundamentação universalizada que possibilite leis morais escolhidas dentro de um âmbito democrático, onde todos os sujeitos poderão dar suas opiniões. Habermas retoma o pensamento sobre a ética do discurso de Karl-Otto Apel, onde o discurso dentro de uma comunidade é levado a sério. Assim, a linguagem tornaria o discurso de cada sujeito na ação prática, sendo que, o que foi escolhido por todos não seria infligido. Segundo Zanella (2012, p. 134) “Habermas defende a ideia de que a atividade argumentativa é uma ocupação eminentemente comunicativa”. 36 Desta forma, não mais seguindo uma ética direciona racionalmente como a proposta por Kant, mas uma ética que trabalhe a razão comunicativa abrindo espaço para a intersubjetividade dentro das relações dos seres que participam de determinados grupos. Assim, de acordo com Machado (1988, p. 36) “o sentido da comunidade da comunicação tem como pressuposto o reconhecimento de todos os membros com iguais direitos de discussão”, em que todos têm espaço para se expressarem de maneira livre. A pragmática é levada em consideração para Habermas, pois possibilita a ação do homem dentro dessa comunidade usando a linguagem. Vale ressaltar que a comunidade é real, sendo que, o discurso é entendido por todos do grupo. A teoria do discurso de Habermas é desenvolvida a partir do pensamento kantiano, com critérios morais racionais. Mas que depois passa por uma nova roupagem deixando de lado o indivíduo e dando possibilidades para que se pense o comunitário. Para Hamel (2011), a Ética do discurso de Habermas é uma reconfiguração do pensamento “deontológica” da Ética de Immanuel Kant, quando o dever está atrelado à razão de forma que agir racionalmente implica cumprir com obrigações éticas, sendo a razão o campo justiceiro para quem não cumpra com a moral. Ainda de acordo com Hamel ao comentar sobre Kant (2011, p. 165), “o estudo da ética deveria ser precedido da análise da metafísica da natureza e dos costumes, ressaltando a necessidade desta última para a construção de uma filosofia moral pura”. Habermas escreve sua teoria frente a um mundo pós- metafísico do pensamento. A principal via escolhida por Habermas é do universalismo moral kantiano, como uma saída possível diante de tantos debates políticos, religiosos em um mundo com várias culturas. Habermas pretende uma ética universal inserida no meio social, sendo que, neste espaço é passível de erros, levando em consideração a própria ação que é exercida na comunidade. Mas esses erros são corrigíveis dentro do entendimento mútuo. E nessa relação de entendimento mútuo é possível se compreender o sentido pragmático universal. A abertura que o agir comunicativo faz, é convertida em ação entre os participantes, sendo que tal ação torna possível a existência de dois perfis. A 37 ética do discurso de Habermas dá espaço à maneira com que a linguagem possibilita uma forma pragmática de ação. Para Peres Filho (2012, p. 11), Habermas propõe uma pragmática formal, diferente da pragmática científica que analisava os contextos da linguagem, onde essa pragmática visa principalmente a reconstrução da validade universal do discurso, sendo que essa pragmática tem seu apoio principal em Kant. Assim, Habermas ao romper com a tradição, cria uma teoria baseada na pragmática ética, onde o espaço principal de fundamentação é a linguagem. É com a comunicação entre os interlocutores que a ética do discurso de Habermas ganha força e contribui para o consenso na comunidade. Dessa maneira, a linguagem é responsável por traduzir o pensamento de todos os participantes da comunidade, fazendo com que o espaço social se torne mais compreensível e comunicativo. Dessa maneira, a linguagem torna-se importante no pensamento de Habermas e faz com que todos os seres do espaço comunicativo participem de forma ativa e esclarecedora dos fatos morais existentes na comunidade. Vive-se hoje, no Brasil, um momento de redescoberta da ética, de ânsia por incorporar valores morais nas nossas práticas cotidianas, nas atividades científicas, políticas, econômicas, etc. Isto decorre do lamento geral de que estamos vivendo uma grave crise, a qual é identificada pelo senso comum pela falta de decoro e de compostura e pelos intelectuais, como uma anomia, ou seja pela ausência de condições que garantam a interiorização do respeito às leis e às regras sociais por parte dos indivíduos. Para muitos estudiosos, esta é uma crise decorrente da pós-modernidade, onde se privilegia a heterogeneidade, a diferença, a fragmentação e a descontinuidade. Para outros, ela não ultrapassou a modernidade, ao contrário, se instalou no seu seio apesar de alicerçar-se em novas bases, onde a prática pedagógica do adestramento e da manipulação estão sendo questionadas, a supremacia da razão e a adesão cega às leis já não encontram eco e onde os homens exigem ser tratados como organismos vivos, capazes de pensar, sofrer, se organizarem e construírem valores. Neste quadro de "crise" os cidadãos se organizam e clamam por respeitabilidade, por seriedade, justiça social e por valores morais. 38 Também os indivíduos, enquanto membros de categorias profissionais, investem em criar regras de conduta que possam garantir a convivência com seus pares, seus clientes, com as instituições a que fazem parte. etc. Resta saberem que bases essas regras acham-se alicerçadas, a que elas realmente se propõem, a que elas servem. É disto que trataremos neste capítulo. Para tal iniciaremos traçando um panorama dos valores morais que vigoram nas sociedades contemporâneas; em seguida, buscaremos compreender a relação existente entre os valores gerais da sociedade e os valores particulares que regem as condutas dos indivíduos enquanto membros de grupos de trabalho, identificaremos os pilares em que se embasam os atuais códigos profissionais da ética e por último, buscaremos distinguir até onde eles podem ser tomados como deontológicos - éticos - e até onde servem apenas aos interesses instituídos. 5.3 Os valores morais na modernidade Dois fatos podem ser ilustrativos das transformações por que passaram os homens nas sociedades modernas. O primeiro diz respeito à evolução da arte de retratar e o segundo, à substituição do ato de biografar. No que se refere ao primeiro, havia uma tendência, até o advento da modernidade, a se retratar apenas os "universais concretos" - deuses, heróis e santos - com ela inaugurou- se a prática de retratar o homem em detrimento do seu nome sua condição social e outros atributos. Do mesmo modo aconteceu no campo da literatura. Antes não
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