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Unid I - Etica - responsabilidade social - Mario Sergio Cort

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Questões sobre ética têm sido bastante debatidas no processo de elaboração da Norma 
Internacional de Responsabilidade Social - ISO 26000. Tudo indica que o tema deve 
entrar nos capítulos sobre princípios, governança e implementação. No entanto, ainda 
não foi possível chegar a um consenso sobre o que a norma entende por ética. É muito 
provável que esse seja um dos principais assuntos debatidos na V Reunião Internacional 
de Responsabilidade Social da ISO, que acontece entre os dias 5 e 9 de novembro de 
2007, em Viena, na Áustria. Por esse motivo, o Instituto Ethos convidou o filósofo e 
educador Mario Sergio Cortella para falar sobre ética com as empresas do Grupo de 
Trabalho Ethos para a IS0 26000, ocasião em que deu esta entrevista para Notícias da 
Semana. 
Dono de um extenso currículo, Cortella foi secretário municipal de Educação, 
apresentador do programa Diálogos Impertinentes, da TV Senac e autor de diversas 
obras. Atualmente é professor titular do Departamento de Teologia e Ciências da 
Religião e da Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-
SP). Versátil e inspirador, tem sido altamente demandado pelas empresas para fazer 
palestras sobre ética empresarial e desenvolver códigos de ética e de conduta. Nas 
palavras de Paulo Freire, "Cortella é um dos raros filósofos da educação que pensam o 
novo". 
Instituto Ethos: Qual é a melhor definição de ética para o senhor? 
Mário Sérgio Cortela: Ética é o conjunto de valores e princípios que utilizamos para 
decidir nossa conduta em sociedade. É o que orienta nossas ações em relação às três 
grandes questões da vida humana - querer, dever e poder -, que são exatamente os 
territórios da nossa ação. Em última instância, a palavra ética, de origem grega, remonta 
ao vocábulo "ethos", do século 6 a.C, o qual significa "a morada do humano", isto é, o 
que nos dá identidade, o que nos separa do mundo selvagem, do mundo animal. Aquilo 
que nos faz conviver de forma fraterna. A palavra "ethos" significa, portanto, o lugar 
onde nos abrigamos, no qual é preciso haver princípios e valores que permitam a 
convivência. Esse conjunto de princípios e valores é exatamente o que chamamos de 
ética, ou seja, as regras da casa. A palavra "ética" remonta à idéia de vida coletiva. Seria 
impossível pensar em ética se só existisse o indivíduo. A ética faz sentido apenas 
porque vivemos em conjunto. Portanto, ética tem a ver com o plural, não com o 
singular. Aliás, não existe ética individual. A ética é sempre de um grupo, de um 
coletivo maior ou de uma sociedade. Nosso sonho é que exista uma ética universal, mas 
isso ainda é um projeto. 
IE: Porque é tão difícil chegar em uma ética universal? 
MSC: Porque as sociedades em geral produzem seus valores e princípios de acordo 
com seu tempo histórico. De certa forma, a ética é circunstancial ao modo de vida da 
sociedade. Por exemplo, há 50 anos, a sociedade brasileira entendia como eticamente 
aceitável que um docente espancasse uma criança em sala de aula. Também se entendia 
que um empregado poderia ser demitido sem nenhum tipo de ressarcimento ou que uma 
empresa poderia utilizar os recursos naturais no limite de sua capacidade. Há 150 anos, 
dentro da nossa lógica de sociedade de dominação, era permitido ter escravos, embora 
estes não pudessem ser espancados em público, por causa da humilhação. A ética da 
época colocava as coisas dessa forma. 
IE: É por isso que a ISO está encontrando dificuldade em estabelecer um conceito de 
ética na norma de responsabilidade social (ISO 26000)? 
MSC: A ISO 26000 toca não só em princípios, mas diz respeito às ações diretas dos 
indivíduos. Ela exige alguns comportamentos que traem a lógica empregada há séculos 
em relação ao uso que se faz das pessoas e dos recursos da natureza. Por outro lado, 
essa norma é muito mais do que uma ISO. É um princípio ético fortíssimo e, portanto, 
encontra resistência à medida que sua implantação requer uma alteração de mentalidade. 
Essa ISO exige algo muito difícil em algumas culturas, que é a substituição da idéia de 
ganância pela idéia de ambição. O ambicioso é aquele que quer mais, enquanto o 
ganancioso é aquele que quer só para si. A visão dessa ISO é mais comunitária e admite 
a presença da ambição, de mais recursos, maior lucratividade, maior rentabilidade, 
maior produtividade. Mas, ao mesmo tempo, requer também sustentabilidade. E a 
sustentabilidade, para ser colocada como a preservação da vitalidade no seu conjunto, 
exige, antes de qualquer coisa, a possibilidade de diminuir a base dessa estrutura para 
preservar aquilo que é mais importante. A ISO 26000 preocupa-se sobretudo com o que 
é importante e não com o que é urgente. Algumas das outras normas da ISO, 
especialmente as relacionadas à capacidade de proteção ambiental e à qualidade do 
produto, estavam mais ligadas aos aspectos urgentes, enquanto a ISO 26000 se 
preocupa com a perenidade. 
IE: A ISO 26000 define ética como o comportamento considerado correto ou 
aceitável numa sociedade em particular. 
MSC: Essa é uma possibilidade, pois a palavra "ética" tem uma multiplicidade de 
definições. Em minha opinião, a definição usada pela ISO pode ter alguns problemas. 
Primeiro, por limitar-se a ser uma definição e não um conceito. Uma definição é apenas 
a expressão imediata do sentido de algo. Penso que seria preciso aprofundar-se no 
conceito que essa definição encerra, ou seja, trabalhar os aspectos que ela envolve. Por 
exemplo, o que ela quer dizer com "aceitável"? O comportamento seria aceitável por 
seu conjunto, aceitável mundialmente? Para algumas sociedades, a excisão clitoriana é 
algo aceitável. O trabalho infantil também é considerado aceitável em determinadas 
sociedades. Em alguns países o suborno é considerado usual. Entendo que a grande 
questão nessa definição da ISO é a palavra "aceitável", que coloca em jogo a permissão 
para que as coisas aconteçam. Talvez ela possa ser entendida como eticamente saudável 
ou defensável, não sei. Mas há uma particularização excessiva da noção de ética que 
dificulta sua internacionalização. 
IE: Como o senhor vê a ética empresarial? 
MSC: A ética empresarial passa por um momento que mistura um pouco de 
oportunismo com necessidade e urgência. Esse oportunismo surge quando se percebe 
que uma parcela da sociedade entende a ética como um valor agregado importante para 
os negócios. Muitas empresas entraram surfando nessa nova onda. A pequena ética é a 
etiqueta. E algumas empresas têm ética apenas como etiqueta, que é a capacidade de ser 
diplomático, uma coisa de fachada. Por outro lado, é preciso ressaltar que há uma 
grande parcela de empresas inteligentes e honestas, que, além de se preocupar com a 
manutenção de seus negócios, cuidam da multiplicidade do conjunto da vida. Ou seja, 
cuidam para que suas atividades não interfiram na capacidade de sustentar a vida nas 
suas múltiplas faces. Em outras palavras, algumas empresas têm a ética como horizonte 
da sua perenidade. E é nisso que eu acredito. O grande compositor Ari Barroso escreveu 
uma frase que serve perfeitamente para essas empresas que têm a ética como 
cosmética: "Creia, toda quimera se esfuma, como a brancura da espuma que se 
desmancha na areia". Ou seja, aquilo que é mera fachada uma hora vai desabar. 
IE: Qual é sua opinião sobre o movimento de responsabilidade social empresarial no 
Brasil? 
MSC: A responsabilidade social é uma grande urgência neste momento. Há uma 
agressividade muito grande das empresas em relação ao lucro, enquanto o lado social é 
pouco considerado. Acredito que as práticas de responsabilidade social devem ser 
monitoradas, assim como as empresas fazem com seus processos de produção e de 
qualidade. O movimento de responsabilidade social precisa ultrapassar a fase do mero 
ativismo e ser compartilhado pelo conjunto da sociedade. A partir dos anos 1990, 
quando o capitalismo financeiro começoua tropeçar, as leis da sociedade societária do 
mercado de ações trouxeram a necessidade de um controle maior para o conjunto todo 
da sociedade. Portanto, minha visão e expectativa são positivas quanto ao movimento 
de RSE. Esse debate tem um impacto muito grande na área da educação, na qual milito 
mais diretamente. Entendo que a RSE requer um trabalho no campo educativo e de 
formação. As escolas estão se beneficiando com o movimento, pois as empresas não se 
limitam mais a doar alguns recursos ou a pintar a fachada das escolas. Hoje as empresas 
olham para a educação e enxergam necessidades que precisam ser construídas 
coletivamente. Por isso, tenho uma grande expectativa em relação a esse movimento. 
Não tenho uma visão triunfalista, que seria uma tolice. Mas acredito que estamos 
fortalecendo uma visão de futuro. 
IE: Por que as academias estão levando tanto tempo para incluir a RSE como uma 
disciplina? 
MSC: Existe uma desconfiança muito grande do mundo acadêmico em relação ao 
mundo empresarial. Hoje, já existem algumas parcerias entre academia e empresas. Isso 
é muito positivo, porque, afinal de contas, uma das coisas que sempre se defenderam no 
mundo acadêmico é a necessidade de colocar o conhecimento em benefício geral da 
humanidade. A ciência, que é mais pura e, portanto, menos conspurcada pela idéia do 
lucro e pela vantagem competitiva, sempre teve um pé atrás em relação ao mundo 
empresarial. Supõe-se que a universidade já tenha uma ética de benefício coletivo que a 
empresa ainda não tem. Então existe a idéia de que as empresas têm de provar a 
honestidade de seus propósitos e aí, talvez, a academia se aproxime. Por enquanto, a 
academia vai ficando encolhida, fechada dentro de seu espaço, imaginando, como diria 
um bom mineiro: "Vamos assuntar para ver se isso é sério mesmo ou se é só uma 
passagem, um cometa que trisca o céu e depois vai embora". 
IE: O senhor acredita que, depois de tantas crises sociais e econômicas, a tendência é 
de que a sociedade passe a se balizar por valores morais? 
MSC: Acho que não temos alternativas. A espiritualização do dia-a-dia e o re-
encantamento da vida são as únicas saídas. Essa tendência é decorrente de um 
esgotamento dos modelos de condução da vida, a convivência nas metrópoles e a 
desestruturação familiar. Portanto, mais do que uma tendência, balizar-se por valores 
morais é uma exigência da própria vitalidade. Não digo que a gente parta para uma 
espiritualidade do campo religioso ou místico. Refiro-me ao reconhecimento da 
necessidade de valores de qualidade de vida que não apequenem a existência. Eu gosto 
demais de uma frase dita por Benjamin Disraeli, primeiro-ministro da rainha Vitória, da 
Inglaterra. Ele dizia: "A vida é muito curta para ser pequena". 
Hoje, muita gente supõe que a vida está sendo apequenada, ou seja, que perdeu um 
pouco seu sentido. Quem leva uma vida automática e robótica, que se esgota no ato de 
acumular bens, esquece-se de que a vida é muito curta para ser pequena. Esse 
engrandecimento da vida se amarra na perspectiva do campo ético, ou seja, no 
revigoramento de valores essenciais como solidariedade, fraternidade, amizade, 
lealdade, amor aos idosos e tudo que é essencial à vida. Sempre faço distinção entre o 
essencial e o fundamental. O essencial é aquilo que não pode não ser, como a 
humanidade, a fraternidade, a sexualidade, a religiosidade, a amizade, a lealdade e a 
solidariedade. O essencial da vida é a felicidade. E a felicidade se compõe de 
fraternidade e humanidade. 
O fundamental é aquilo que ajuda a chegar ao essencial. Por exemplo, o trabalho não é 
essencial, mas fundamental, porque nos ajuda a chegar ao essencial. Com o dinheiro 
ocorre a mesma coisa. Sem ele enfrentamos dificuldades, mas não é o dinheiro em si 
que nos faz viver de forma plena. Portanto, é preciso que direcionemos nossa existência 
para o essencial. Ninguém tem uma escada para simplesmente ficar em pé em cima 
dela. A gente usa uma escada para alcançar um lugar mais acima ou mais abaixo. 
Muitas vezes as pessoas estacionam em ferramentas como dinheiro, trabalho e 
lucratividade sem perceber que isso não é o essencial. 
IE: Como o senhor fala de ética para os empresários? 
MSC: Exatamente como estamos falando, como estamos conversando. Falo de ética 
como uma coisa absolutamente humana, pois ela está ligada à idéia de liberdade e à 
noção de não-apequenamento da vida. Existe muita gente preocupada com essa 
temática. 
IE: E quanto à corrupção? O que fazer para resolver esse problema? 
MSC: Quando me perguntam se é preciso investir em formação para melhorar a política 
brasileira ou desenvolver uma formação ética para o aparelho de governo, digo que isso 
não é necessário. A principal doença de nossas relações políticas é a corrupção. Se 
fizermos um trabalho ético sério nas empresas, a corrupção na política acaba. Embora a 
gente fale o tempo todo em corrupção no governo, é preciso lembrar que para haver um 
corrupto é preciso haver um corruptor. Precisamos parar com a leitura cínica e 
imaginária de que a degradação dos costumes vem apenas de um lado. O mesmo 
cidadão que fala - Que horror! Alguém tem de fazer alguma coisa para combater 
corrupção? não hesita em comprar produto pirata e em desrespeitar os limites de 
velocidade. Tem gente que, aos 40 anos de idade, tem carteira de estudante para obter 
vantagens que seriam exclusivas de determinada classe. Ou seja, é a ética da 
conveniência, uma ética que degrada. 
Por Giselle Paulino 
Edição de Benjamin S. Gonçalves 
Fonte: www.ethos.org.br 
http://www.rts.org.br/entrevistas/entrevistas-2007/mario-sergio-cortella/ 
 
http://www.ethos.org.br/
http://www.rts.org.br/entrevistas/entrevistas-2007/mario-sergio-cortella/

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