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R E S U M O D O CA P Í T U LO
Compreendendo a psicopatologia
O que é transtorno psicológico?
A ciência da psicopatologia
Conceitos históricos do comportamento 
anormal
A tradição sobrenatural
Demônios e bruxas
Estresse e melancolia
Tratamentos para possessão
Histeria em massa
Histeria em massa em tempos modernos
A lua e as estrelas
Comentários
A tradição biológica
Hipócrates e Galeno
O século XIX
O desenvolvimento dos tratamentos 
biológicos
Consequências da tradição biológica
A tradição psicológica
Terapia moral
Reforma psiquiátrica e declínio da terapia 
moral
Teoria psicanalítica
Teoria humanista
O modelo comportamental
O presente: o método científico e uma 
abordagem integradora
Comportamento anormal no 
contexto histórico1
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2 PsicoPatologia
Compreendendo a psicopatologia
Hoje, você pode ter saído da cama, tomado seu café, ido para suas 
aulas, estudado e, no final do dia, gozado da companhia de seus 
amigos antes de cair no sono. Provavelmente, não ocorreu a você 
que muitas pessoas fisicamente saudáveis não são capazes de fazer 
algumas ou nenhuma dessas coisas. O que elas têm em comum é 
um transtorno psicológico, uma disfunção psicológica associa-
da a sofrimento ou prejuízo no funcionamento e uma resposta 
que não é típica ou culturalmente esperada. Antes de examinar 
o que isso significa, vamos observar a situação de um indivíduo.
JUDY• • • A garota que desmaiava ao ver sangue
Judy, 16 anos, foi levada à nossa clínica para tratamento de transtornos de ansiedade após crescentes episódios 
de desmaio. Cerca de dois anos antes, em sua primeira aula de 
biologia, o professor mostrou um filme sobre a dissecação de 
uma rã para exemplificar diversos aspectos da anatomia.
Foi um filme com imagens vívidas de sangue, tecidos e 
músculos. Mais ou menos na metade da exibição, Judy se 
sentiu um pouco zonza e deixou a sala. Mas as imagens não 
saíam da sua mente. Ela continuou a ser atormentada por 
elas e, ocasionalmente, sentia-se nauseada. Começou a evi-
tar situações nas quais poderia ver sangue ou ferimentos. 
Parou de ver revistas que poderiam trazer fotos de violên-
cia e sangue. Começou a achar difícil olhar carne vermelha 
crua, ou até mesmo curativos, porque eles traziam lembran-
Descrever os conceitos-chave, os princípios 
e os temas gerais em psicologia
• Explicar por que a psicologia é uma ciência com objetivos 
primários de descrever, compreender, prever, controlar 
comportamentos e processos mentais (APA SLO 5.1b) 
• Utilizar a terminologia básica da psicologia, os conceitos e 
as teorias em psicologia para explicar o comportamento e 
os processos mentais (APA SLO 5.1a)
Desenvolver um conhecimento prático dos 
domínios de conteúdos da psicologia
• Resumir aspectos importantes da história da psicologia, 
incluindo figuras-chave, interesses centrais, métodos 
utilizados e conflitos teóricos (APA SLO 5.2C) 
• Identificar as características-chave dos principais 
domínios de investigação em psicologia (ex.: cognição e 
aprendizagem, psicologia do desenvolvimento, aspectos 
biológicos e socioculturais) (APA SLO 5.2a) 
Utilizar o raciocínio científico para interpretar 
o comportamento
• Ver APA SLO 5.1a, supracitado
• Incorporar vários níveis pertinentes de complexidade (ex.: 
celular, individual, grupo/sistema, social/cultural) para 
explicar o comportamento (APA SLO 1.1C) 
*Parte deste capítulo disserta sobre os resultados finais de aquisição de conhecimento sugeridos pela American Psychological Association (2012), inclusos 
nas diretrizes para bacharéis em Psicologia. O escopo do capítulo concernente aos resultados está identificado acima pela APA Goal e pela APA Resultados de 
Aprendizado Sugeridos (RAS).
Resultados finais de assimilação do conteúdo pelo aluno*[ ]
ça das imagens de sangue que a amedrontavam. Por fim, 
qualquer coisa que seus amigos ou parentes lhe diziam que 
trazia imagem de sangue ou ferimento fazia com que Judy 
tivesse a sensação de desmaio. A situação ficou tão séria que, 
se um de seus amigos gritasse “corta essa!”, ela se sentia fraca.
Seis meses antes de visitar a clínica, Judy desmaiou de 
fato quando inevitavelmente viu alguém ensanguentado. 
Nem o médico da família nem outros médicos conseguiam 
achar nada de errado com ela. Quando foi encaminhada à 
nossa clínica, ela desmaiava de cinco a dez vezes por sema-
na, frequentemente durante suas aulas. É óbvio que isso era 
problemático para ela e que a atrapalhava na escola; cada 
vez que Judy desmaiava, os outros estudantes se aglomera-
vam ao redor, tentando ajudá-la, e a aula era interrompida. 
Pelo fato de ninguém ter encontrado nada de errado, o dire-
tor concluiu que ela estava sendo manipuladora e a suspen-
deu, mesmo sendo uma aluna excelente.
Judy estava sofrendo do que chamamos fobia de san-
gue-injeção-ferimentos. Sua reação era bastante severa e, em 
razão disso, preenchia critérios para fobia, um transtorno 
psicológico caracterizado por medo intenso e persistente de 
um objeto ou de uma situação. Muitas pessoas têm reações 
semelhantes, mas não tão graves, quando tomam injeção ou 
veem alguém ferido, com sangue visível ou não. Para aque-
las que possuem um comportamento tão severo quanto 
Judy, essa fobia pode ser incapacitante. Elas devem evitar 
certas profissões, como medicina ou enfermagem, e têm tan-
to medo de agulhas e de injeções que as evitam mesmo quando 
precisam delas, o que coloca sua saúde em risco.
3Capítulo 1 – Comportamento anormal no Contexto históriCo
O que é transtorno psicológico?
Tendo em mente os problemas reais enfrentados por Judy, olhe-
mos mais atentamente para a definição de transtorno psicológico 
ou comportamento anormal: esse transtorno é uma disfunção 
psicológica em um indivíduo, que está associada a sofrimento 
ou prejuízo no funcionamento, bem como a uma resposta que 
não é típica ou culturalmente esperada (ver Figura 1.1). Super-
ficialmente, esses três critérios podem parecer óbvios, mas não 
foram facilmente caracterizados, e, dessa forma, vale explorar o 
que significam. Você verá, sobretudo, que ainda não foi desen-
volvido nenhum critério que defina plenamente a anormalidade.
Disfunção psicológica
Disfunção psicológica refere-se a uma desordem no funciona-
mento cognitivo, emocional ou comportamental. Por exemplo, 
ter um encontro deveria ser divertido. Mas se você experimenta 
um forte medo a noite toda e só quer voltar para casa, mesmo 
que não haja nada para temer, e se o medo ocorre a cada en-
contro, suas emoções não estão funcionando adequadamente. 
Entretanto, se todos os seus amigos concordam que a pessoa que 
convidou você para sair é perigosa de alguma forma, não seria 
“disfuncional” ter medo e evitar o encontro. 
A disfunção estava presente em Judy: ela desmaiava ao ver 
sangue. Muitas pessoas experimentam uma versão em menor 
grau dessa reação (sentem-se enjoadas ao ver sangue), sem 
preen cherem os critérios para o transtorno; assim, estabelecer 
o limite entre disfunção normal e anormal é difícil. Por essa 
razão, esses problemas são, com frequência, considerados em 
um continuum ou em uma dimensão em vez de categorizá-los 
como presentes ou ausentes (McNally, 2011; Stein, Phillips, Bol-
ton, Fulford, Sadler e Kendler, 2010; Widiger e Crego, 2013). Esse 
também é o motivo pelo qual apenas ter uma disfunção não é o 
suficiente para preencher critérios para um transtorno psicológico.
Sofrimento subjetivo ou prejuízo
Parece evidente que o comportamento deve estar associado a 
sofrimento para ser classificado como anormal, o que incorpora 
um componente importante: o critério é cumprido se o indiví-
duo está demasiadamente perturbado. Podemos dizer que sem 
 Angústia e sofrimento fazem parte da vida e não constituem em si 
um transtorno psicológico.
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dúvida Judy estava muito aflita e sofria em razão de sua fobia. 
Contudo, devemos lembrar que somente esse critérionão define 
o comportamento anormal. É bastante comum ficar angustiado 
– por exemplo, se alguém próximo vier a falecer. A condição 
humana é tal que o sofrimento e a angústia fazem parte da vida. 
E isso provavelmente não vai mudar. Além disso, para alguns 
transtornos, por definição, há ausência de sofrimento e angús-
tia. Considere uma pessoa que se sente eufórica ao extremo, po-
dendo agir impulsivamente como parte de um episódio maníaco. 
Como veremos no Capítulo 7, uma das principais dificuldades em 
relação a esse problema é que algumas pessoas gostam tanto do 
estado maníaco que relutam em começar um tratamento ou em 
segui-lo por muito tempo. Assim, definir um transtorno psico-
lógico apenas pelo sofrimento subjetivo não funciona, embora o 
seu conceito contribua para uma boa definição.
O conceito de prejuízo é útil, embora não inteiramente sa-
tisfatório. Por exemplo, muitas pessoas se consideram tímidas 
ou preguiçosas. Isso não significa que elas sejam anormais. No 
entanto, se você é tão tímido que acha impossível namorar ou 
mesmo interagir com outras pessoas, e se você tenta impedir as 
interações mesmo que desejasse ter amigos, então seu funciona-
mento social está prejudicado.
Judy foi claramente prejudicada por sua fobia, mas muitas 
pessoas que têm reações semelhantes, menos graves, não são. 
Essa diferença ilustra mais uma vez a importante questão de 
que a maioria dos transtornos psicológicos são simplesmente 
expressões extremas de emoções, comportamentos e processos 
cognitivos considerados normais.
Disfunção psicológica
Sofrimento ou prejuízo
Resposta atípica
FIGURA 1.1 O critério que define um transtorno psicológico.
Transtorno 
psicológico
4 PsicoPatologia
Atípico ou socialmente não esperado
Finalmente, o critério para o qual a resposta seja atípica ou so-
cialmente não esperada é importante, mas também insuficien-
te para determinar a anormalidade por si só. Às vezes, algo é 
considerado anormal porque não ocorre com frequência; e se 
desvia da média. Quanto maior o desvio, maior a anormalidade. 
É possível dizer que alguém é baixo ou alto de forma anormal, 
significando que a altura da pessoa se desvia substancialmente 
da média, mas isso não é uma definição de transtorno. Muitas 
pessoas estão longe da média no que se refere aos seus com-
portamentos, mas poucas seriam consideradas transtornadas. 
Poderíamos chamá-las de talentosas ou excêntricas. Muitos artis-
tas, astros de cinema e atletas se encaixam nessa categoria. Por 
exemplo, não é normal planejar jatos de sangue saindo das suas 
roupas, mas quando Lady Gaga fez isso durante sua performance 
apenas aprimorou seu status de celebridade. O romancista J. D. 
Salinger, que escreveu O apanhador no campo de centeio, refu-
giou-se em uma cidadezinha em New Hampshire e recusou-se a 
ver outras pessoas durante vários anos, mas continuou a escre-
ver. Alguns cantores de rock homens usam maquiagem pesada 
no palco. Essas pessoas são bem pagas e parecem adorar suas 
carreiras. Na maioria dos casos, quanto mais produtivo você é 
aos olhos da sociedade, mais excentricidades a sociedade tolera-
rá. Por conseguinte, “desvio da média” não serve como uma boa 
definição para comportamento anormal.
Outra visão considera que seu comportamento é anormal se 
você violar as normas sociais, mesmo se um número de pessoas 
for solidário com seu ponto de vista. Essa definição é muito útil, 
levando-se em conta importantes diferenças culturais nos trans-
tornos psicológicos. Por exemplo, entrar em um estado de transe 
e acreditar estar possuído refletem um transtorno psicológico 
na maioria das culturas ocidentais, mas não em muitas outras 
sociedades, nas quais esses comportamentos são aceitos e espe-
rados (ver Capítulo 6). (A perspectiva cultural é um importante 
aspecto de referência no decorrer deste livro.) Um exemplo des-
sa visão é oferecido por Robert Sapolsky (2002), proeminente 
neurocientista que, durante seus estudos, trabalhou de perto 
com a tribo Masai da África Oriental. Certo dia, Rhoda, ami-
ga masai de Sapolsky, pediu-lhe que trouxesse o seu jipe o mais 
rapidamente possível para o vilarejo, onde uma mulher estava 
agindo com muita agressividade e ouvia vozes. A mulher tinha 
matado um bode com as próprias mãos. Sapolsky e diversos ma-
sai foram capazes de dominá-la e transportá-la para um centro 
médico local. Notando que aquela era uma oportunidade de 
aprender mais sobre a visão dos transtornos psicológicos dos 
masai, Sapolsky manteve o seguinte diálogo:
“Então, Rhoda”, comecei laconicamente, “o que você 
acha que tinha de errado com aquela mulher?”
Ela olhou para mim como se eu fosse maluco.
“Ela está louca.”
“Mas como você sabe?”
“Ela está louca. Você não percebe isso nas atitudes 
dela?”
“Mas como você conclui que ela está louca? O que 
ela fez?”
“Ela matou aquele bode.”
“Oh”, eu disse com um desinteresse antropológico, 
“mas os masai matam bodes o tempo todo.”
Ela olhou para mim como se eu fosse um idiota. “So-
mente os homens matam bodes”, disse ela.
“Bem, por qual outro motivo você acredita que ela 
esteja louca?”
“Ela ouve vozes.”
Novamente, fiz-me de bobo. “Oh, mas os masai ou-
vem vozes às vezes.” (Em cerimônias antes de longos per-
cursos conduzindo gado, os masai dançam em transe e 
dizem ouvir vozes.) E em uma sentença, Rhoda resumiu 
metade do que alguém precisa saber sobre psiquiatria 
transcultural.
“Mas ela ouve vozes no momento errado.” (p. 138)
Entretanto, um padrão social de normalidade tem sido erro-
neamente usado. Considere, por exemplo, a prática de confinar 
dissidentes políticos em instituições de saúde mental, em razão 
de seus protestos contra as atitudes políticas de seus governos, o 
que era comum no Iraque antes da queda de Saddam Hussein e 
agora ocorre no Irã. Embora tal comportamento dissidente viole 
as normas sociais, por si só não seria causa de confinamento.
Jerome Wakefield (1999, 2009), em uma análise muito cuida-
dosa sobre o assunto, usa a definição taquigráfica de disfunção 
prejudicial. Um conceito relacionado também útil é determinar se 
o comportamento está ou não fora do controle do indivíduo (al-
guma coisa que a pessoa não queira fazer) (Widiger e Crego, 2013; 
Widiger e Sarkis, 2000). Variantes dessas abordagens são mais 
frequentemente usadas na prática de diagnóstico atual, como foi 
ressaltado na quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de 
 Nós aceitamos comportamentos extremados de celebridades, tais 
como Lady Gaga, que não seriam tolerados em outros membros de 
nossa sociedade.
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5Capítulo 1 – Comportamento anormal no Contexto históriCo
Transtornos Mentais (DSM-5) (American Psychiatric Association, 
2013), que apresenta a listagem atual dos critérios para os trans-
tornos psicológicos (Stein et al., 2010). Essas abordagens condu-
zem nossa linha de pensamento no presente livro.
Uma definição aceita
Enfim, é difícil definir “normal” e “anormal” (Lilienfeld & Ma-
rino, 1995, 1999) – e o debate continua (Houts, 2001; McNally, 
2011; Stein et al., 2010; Spitzer, 1999; Wakefield, 2003, 2009). A 
definição mais amplamente aceita utilizada no DSM-5 descreve 
disfunções comportamentais, psicológicas ou biológicas que são 
inesperadas em seu contexto cultural e associadas à presença de 
sofrimento e prejuízo no funcionamento ou aumento de risco 
de sofrimento, morte, dor ou prejuízo. Essa definição pode ser 
útil para equiparar culturas e subculturas se prestarmos atenção 
ao que é “funcional” ou “disfuncional” (ou fora de controle) em 
determinada sociedade. No entanto, nunca é fácil decidir o que 
representa disfunção, e alguns acadêmicos argumentam que as 
profissões da área de saúde nunca serão capazes de definir sa-
tisfatoriamente doença ou transtorno (ver, por exemplo, Lilien-
feld e Marino, 1995, 1999; McNally, 2011; Stein et al., 2010). O 
melhor que podemos fazer é considerar de que forma a doen-
ça ou o transtorno aparente se encaixa em um perfil típico de 
umtranstorno – por exemplo, transtorno depressivo maior ou 
esquizofrenia –, quando todos ou a maioria dos sintomas que 
os especialistas concordariam ser parte do transtorno estão 
presentes. Chamamos esse perfil típico de protótipo e, como 
descrito no Capítulo 3, os critérios de diagnóstico do DSM- 
IV-TR, bem como aqueles emergentes do DSM-5 encontrados 
no decorrer deste livro são todos protótipos. Isso significa que 
o paciente pode ter apenas algumas características ou sintomas 
do transtorno (um número mínimo) e ainda preencher critério 
para o transtorno porque seu conjunto de sintomas está próximo 
do protótipo. Mas uma das diferenças entre DSM-IV e DSM-5 
é o acréscimo de estimativas dimensionais de gravidade dos 
transtornos específicos no DSM-5 (American Psychiatric Asso-
ciation, 2013; Regier et al., 2009; Helzer et al., 2008). Assim, para 
os transtornos de ansiedade, por exemplo, a intensidade e a fre-
quência de ansiedade dentro de um determinado transtorno, tal 
como o transtorno de pânico, são classificadas em uma escala 
de 0 a 4, em que 1 indicaria sintomas leves ou ocasionais e 4 in-
dicaria sintomas contínuos e graves (Beesdo-Baum et al., 2012; 
LeBeau et al., 2012). Esses conceitos são descritos de forma mais 
detalhada no Capítulo 3, no qual se discute o diagnóstico de 
transtorno psicológico.
Para um desafio final, leve o problema da definição de um 
comportamento anormal um passo adiante e considere o se-
guinte: e se Judy vivesse aquela situação com tanta frequência 
que, após um tempo, nem seus colegas nem seus professores no-
tassem, porque ela recuperava a consciência rapidamente? Além 
disso, e se Judy continuasse a obter boas notas? Desmaiar o tem-
po todo ante a mera ideia de sangue seria um transtorno? Estaria 
lhe causando prejuízo? Seria disfuncional? Angustiante? O que 
você pensa a respeito?
A ciência da psicopatologia
A psicopatologia é o estudo científico de transtornos psicológi-
cos. Nesse campo atuam profissionais especialmente treinados, 
incluindo psicólogos clínicos e de aconselhamento, psiquiatras, 
assistentes sociais e enfermeiras especializados em psiquiatria, 
bem como terapeutas de casais e de família e conselheiros de 
saúde mental. Nos Estados Unidos, psicólogos clínicos e de acon-
selhamento podem receber o grau de Ph.D. (ou, às vezes, de 
Ed.D., doutor em educação, ou de Psy.D., doutor em psicologia) 
e fazem um curso de graduação com duração de aproximada-
mente cinco anos, que os prepara para conduzir pesquisas sobre 
causas e tratamento de transtornos psicológicos e para diagnos-
ticar, avaliar e tratar esses transtornos. Embora haja uma gran-
de quantidade de sobreposições, psicólogos de aconselhamento 
tendem a estudar e tratar ajustes e assuntos vocacionais relacio-
nados a indivíduos relativamente saudáveis; já os psicólogos clí-
nicos se concentram usualmente nos transtornos psicológicos 
mais graves. Além disso, os programas em cursos profissionais 
de psicologia, em que o título é frequentemente Psy.D., doutor 
em psicologia, têm como foco o treinamento clínico e a diminui-
ção ou eliminação do treino em pesquisa. De maneira oposta, os 
programas de Ph.D. nas universidades integram o treinamen-
to clínico e em pesquisa. Psicólogos com outras especialidades, 
como os psicólogos experimentais e sociais, concentram a inves-
tigação nos determinantes básicos do comportamento, mas não 
avaliam nem tratam os transtornos psicológicos1.
Em um primeiro momento, os psiquiatras obtêm um grau 
de M.D. em um curso de Medicina, então, ao longo de três a 
quatro anos de residência médica, especializam-se em Psi-
quiatria. Psiquiatras também investigam a natureza e as cau-
sas dos transtornos psicológicos, frequentemente com base em 
um ponto de vista biológico; fazem diagnósticos; e oferecem 
tratamentos. Muitos desses profissionais enfatizam drogas ou 
outros tratamentos biológicos, embora a maioria também use 
tratamentos psicossociais.
Os assistentes sociais da área de psiquiatria geralmente podem 
obter título de mestre em serviço social por se especializarem em 
coletar informações relevantes para a situação social e familiar do 
indivíduo que sofre de um transtorno psicológico. Assistentes so-
ciais também tratam de transtornos, frequentemente concentran-
do-se nos problemas familiares relacionados a eles. Os enfermeiros 
da área de psiquiatria têm títulos avançados, como mestrado ou 
até mesmo doutorado, e são especializados no cuidado e trata-
mento de pacientes com transtornos psicológicos, geralmente em 
hospitais, como parte de uma equipe de tratamento.
Por fim, os terapeutas de casais, terapeutas familiares e conse-
lheiros de saúde mental dedicam um a dois anos para conquistar 
um título de mestre e são contratados para prestar serviços clí-
nicos em hospitais ou clínicas, em geral sob supervisão de um 
clínico com título de doutor.
O pesquisador clínico
O mais importante desenvolvimento na história recente da psi-
copatologia é a adoção de métodos científicos para aprender 
mais sobre a natureza dos transtornos psicológicos, suas causas 
e seu tratamento. Muitos profissionais da área de saúde men-
tal seguem uma abordagem científica em seu trabalho clínico e, 
por conseguinte, são chamados de pesquisadores clínicos (Bar-
low, Hayes e Nelson, 1984; Hayes, Barlow e Nelson-Gray, 1999). 
1 RT: A descrição das profissões e carreiras que constam neste item pertencem 
a um modelo norte-americano. No Brasil, há algumas diferenças.
6 PsicoPatologia
Profissionais da área de saúde mental podem atuar como pes-
quisadores clínicos em uma ou mais dentre três maneiras (ver 
Figura 1.2). Primeiro, eles podem acompanhar os mais recen-
tes avanços científicos em sua área e, portanto, utilizar os mais 
atuais procedimentos de tratamento e de diagnóstico. Nesse 
sentido, são consumidores da ciência da psicopatologia para be-
nefício de seus pacientes. Segundo, pesquisadores clínicos anali-
sam seus próprios procedimentos de avaliação ou de tratamento 
para verificar se funcionam. Esses profissionais respondem não 
apenas por seus pacientes, mas também pelas agências governa-
mentais e seguradoras que pagam pelos tratamentos e, por essa 
razão, eles devem demonstrar claramente que seus tratamentos 
funcionam. Terceiro, pesquisadores clínicos podem conduzir 
pesquisas, geralmente em clínicas ou hospitais, que produzam 
novas informações sobre transtornos ou sobre seu tratamento, 
tornando-se, assim, imunes aos modismos que impregnam nos-
so campo de trabalho, em geral, à custa de pacientes e de suas fa-
mílias. Por exemplo, novas “curas miraculosas” para transtornos 
psicológicos que são relatadas diversas vezes por ano na mídia 
não seriam usadas por um pesquisador clínico, se não houves-
se nenhuma sondagem de dados científicos mostrando que elas 
funcionam. Tais dados são oriundos de pesquisas que tentam 
três coisas básicas: descrever os transtornos psicológicos, de-
terminar suas causas e tratá-las (ver Figura 1.3). Essas três ca-
tegorias compõem uma estrutura organizacional que perpassa 
todo este livro e que é formalmente evidente nas discussões 
concernentes a transtornos específicos que discutiremos a par-
tir do Capítulo 5. Um panorama geral neste momento propicia 
uma perspectiva mais nítida dos nossos esforços para compre-
ender a anormalidade.
Descrição clínica
Em hospitais e clínicas, frequentemente dizemos que um pa-
ciente “apresenta” um problema específico ou um conjunto de 
problemas, ou simplesmente discutimos a apresentação do 
problema. Apresentação é um atalho tradicional para indicar 
porque a pessoa procurou a clínica. Descrever a apresentação 
do problema em Judy é o primeiro passo para determinar sua 
descrição clínica, que representa a combinação específica de 
comportamentos, pensamentos e sentimentos que constituem 
um transtorno específico. A palavra clínica refere-se tanto aos 
tipos de problema ou transtorno que você poderia encontrar em 
uma clínica ou hospital quanto às atividades relacionadas à ava-
liaçãoe ao tratamento. No decorrer deste texto, existem excertos 
de muitos outros casos individuais, a maioria deles extraída de 
nossos arquivos pessoais.
Evidentemente, uma função importante da descrição clínica 
é especificar o que torna o transtorno diferente do comporta-
mento normal ou de outros transtornos. Dados estatísticos tam-
bém podem ser relevantes.
Por exemplo, quantas pessoas na população total apresen-
tam o transtorno? Esse número é chamado de prevalência do 
transtorno. As estatísticas de quantos novos casos ocorrem du-
rante determinado período, como em um ano, representam a 
incidência do transtorno. Outras estatísticas incluem a propor-
ção entre sexos – ou seja, qual é a porcentagem de homens e mu-
lheres que têm o transtorno – e a idade típica de manifestação, o 
que frequentemente difere de um transtorno para outro.
Além de apresentarem sintomas diferentes, idade de mani-
festação e, possivelmente, uma proporção diferente entre os se-
xos e prevalência, a maioria dos transtornos segue um padrão 
individual, ou curso. Por exemplo, alguns transtornos, como 
a esquizofrenia (ver Capítulo 13), seguem um curso crônico, 
o que significa que tendem a durar um longo tempo, algumas 
vezes, toda a vida. Outros transtornos, como os do humor (ver 
Capítulo 7), seguem um curso episódico, ou seja, o indivíduo 
provavelmente se recupera dentro de alguns meses e sofre uma 
recorrência do transtorno posteriormente. Esse padrão pode se 
repetir no decorrer da vida de uma pessoa. Ainda assim, outros 
transtornos podem ter um curso limitado, e isso significa que 
o transtorno vai melhorar sem tratamento em um período de 
tempo relativamente curto.
As diferenças na manifestação inicial estão diretamente rela-
cionadas às diferenças no curso dos transtornos. Alguns têm um 
início agudo, começam repentinamente; outros se desenvolvem de 
forma gradual no decorrer de longo período, às vezes, chamado 
início insidioso. É importante conhecer o curso típico de um trans-
torno para que possamos saber o que esperar no futuro e como 
melhor agir em relação ao problema. Essa é uma parte importante 
da descrição clínica. Por exemplo, se alguém está sofrendo de um 
transtorno leve com início agudo, que persistirá por um tempo 
limitado, podemos aconselhar a pessoa a não se preocupar com 
um tratamento dispendioso, porque o problema desaparecerá em 
breve, como se fosse um resfriado comum. Entretanto, se for pro-
vável que o transtorno dure um tempo longo (tornando-se crô-
nico), o indivíduo pode querer buscar tratamento e tomar outros 
caminhos apropriados. O curso antecipado de um transtorno 
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FIGURA 1.2 O exercício do pesquisador clínico.
Profissional 
de saúde 
mental
Consumidor da ciência
• Aprimora a prática
Avaliador da ciência
• Determina a efetividade da 
prática
Criador da ciência
• Conduz pesquisas 
que levam a novos 
procedimentos úteis na 
prática
Foco
Descrição clínica
Causa (etiologia)
Tratamento e resultado
FIGURA 1.3 As três principais categorias que compõem o estudo e a 
discussão sobre transtornos psicológicos.
Estudando os 
transtornos 
psicológicos
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7Capítulo 1 – Comportamento anormal no Contexto históriCo
é conhecido como prognóstico. Então, poderíamos dizer, “o 
prognóstico é bom”, ou seja, o indivíduo provavelmente vai se 
recuperar; ou “o prognóstico requer cuidados”, isto é, o resultado 
provável não parece bom.
A idade do paciente é muito importante na descrição clíni-
ca. Um mesmo transtorno psicológico específico que ocorre na 
infância pode se apresentar de forma diferente na vida adulta 
ou na velhice. Crianças que experimentam ansiedade e pânico 
graves supõem estar sofrendo de algum mal físico, pois têm di-
ficuldade de entender que, na verdade, o mal de que sofrem não 
é físico, mas psíquico. As crianças experimentam pensamentos e 
sentimentos diferentes dos adultos e, por isso, ansiedade e pâni-
co nelas geralmente são erroneamente diagnosticados e tratados 
como transtornos médicos.
Chamamos o estudo das mudanças no comportamento ao 
longo do tempo psicologia do desenvolvimento, e nos referimos 
ao estudo das mudanças no comportamento anormal como 
psicopatologia do desenvolvimento. Quando você pensa sobre a 
psicologia do desenvolvimento, provavelmente imagina pesqui-
sadores estudando o comportamento das crianças. Entretanto, 
em virtude do fato de mudarmos no decorrer de nossas vidas, 
os pesquisadores também estudam o desenvolvimento nos ado-
lescentes, nos adultos e nos idosos. O estudo do comportamento 
anormal durante um ciclo de vida inteiro é chamado de psicopa-
tologia do desenvolvimento do ciclo de vida. Esse campo é relati-
vamente novo, mas está se expandindo com rapidez.
Resultados de causa, tratamento e etiologia
A etiologia, ou o estudo das origens, tem a ver com o porquê 
de o transtorno começar (o que o causa) e inclui dimensões 
biológicas, psicológicas e sociais. Em razão de a etiologia dos 
transtornos psicológicos ser tão importante para essa área, dedi-
camos ao assunto um capítulo inteiro (Capítulo 2).
O tratamento é fundamental para o estudo dos transtornos 
psicológicos. Se uma nova droga ou tratamento psicossocial for 
bem-sucedido no tratamento de um transtorno, isso pode nos 
propiciar algumas pistas sobre a natureza do transtorno e suas 
causas. Por exemplo, se uma droga com um efeito específico 
conhecido dentro do sistema nervoso alivia certo transtorno 
psicológico, sabemos que alguma coisa naquela parte do siste-
ma nervoso poderia também estar causando o transtorno ou 
ajudando a mantê-lo. De forma semelhante, se um tratamento 
psicossocial designado para ajudar os pacientes a recuperar o 
sentido do controle sobre suas vidas é efetivo para determinado 
transtorno, um senso de controle diminuído pode ser um com-
ponente psicológico importante do transtorno em si.
Como veremos no próximo capítulo, a psicopatologia é 
raramente simples. Isso porque o efeito não necessariamente 
implica a causa. Para usar um exemplo comum, você poderia 
tomar uma aspirina para aliviar uma cefaleia de tensão desen-
volvida durante um dia estressante fazendo exames. Se você 
então se sente melhor, isso não significa que a cefaleia foi cau-
sada pela ausência de aspirina. Não obstante, muitas pessoas 
procuram tratamento para transtornos psicológicos, e o trata-
mento pode oferecer indicações importantes sobre a natureza 
do transtorno.
No passado, os livros enfatizavam abordagens de tratamento 
em um sentido geral, com pouca atenção para o transtorno tra-
tado. Por exemplo, um profissional de saúde mental poderia ser 
 As crianças experimentam o pânico e a ansiedade de maneira 
diferente dos adultos, por isso suas reações podem ser confundidas 
com sintomas de doença física.
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capacitado para uma única abordagem teórica, como psicanáli-
se ou terapia comportamental (ambas descritas posteriormen-
te no capítulo), e então usar aquela abordagem para todos os 
transtornos. À medida que nossa ciência tem avançado, desen-
volvemos tratamentos efetivos específicos que nem sempre ade-
rem completamente a uma abordagem teórica ou a outra, mas 
acrescentam uma compreensão mais profunda do transtorno 
em questão. Por esse motivo, não existem capítulos separados 
neste livro sobre tais tipos de abordagem de tratamento, como 
o psicodinâmico, o cognitivo-comportamental ou o humanis-
ta. Em vez disso, a mais recente e eficiente droga e tratamentos 
psicossociais (tratamentos não medicamentosos que focam em 
fatores psicológicos, sociais e culturais) são descritos no contex-
to de transtornos específicos de acordo com nossa perspectiva 
multidimensional integradora.
Após pesquisarmos muitas tentativas iniciais de descrever e 
tratar o transtorno mental, e, mais ainda, de compreender suas 
causas, podemos proporcionar uma perspectiva mais ampla das 
abordagensatuais. No Capítulo 2, examinamos interessantes 
concepções contemporâneas sobre causa e tratamento. No Ca-
pítulo 3, discutimos os esforços para descrever, ou classificar, o 
comportamento anormal. No Capítulo 4, revemos métodos de 
pesquisa – nossos esforços sistemáticos para descobrir os fatos 
subjacentes à descrição, à causa e ao tratamento que permitem 
que atuemos como pesquisadores clínicos. Do Capítulo 5 ao Ca-
pítulo 15, examinamos transtornos específicos; nossa discussão 
está organizada, em cada caso, na familiar tríade de descrição, 
causa e tratamento. Por fim, no Capítulo 16, examinamos os 
aspectos legais, profissionais e éticos relevantes em relação aos 
transtornos psicológicos e seu tratamento atualmente. Com essa 
visão panorâmica em mente, voltemos ao passado.
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8 PsicoPatologia
Conceitos históricos do comportamento anormal
Por centenas de anos, os seres humanos têm tentado explicar e 
controlar o comportamento problemático. No entanto, nossos 
esforços sempre advieram de teorias ou modelos de compor-
tamento popular em determinada época. A finalidade desses 
modelos é explicar por que alguém está “agindo daquela ma-
neira”. Três modelos principais nos fizeram voltar até os pri-
mórdios da civilização.
Os seres humanos sempre supuseram que agentes externos 
a nossos corpos e o ambiente influenciavam nosso comporta-
mento, pensamento e emoções. Esses agentes – que podem ser 
divindades, demônios, espíritos ou outros fenômenos, tais como 
campos magnéticos, a lua ou as estrelas – são as forças propul-
soras por trás do modelo sobrenatural. Além disso, desde a era 
da Grécia antiga, a mente tem sido frequentemente chamada 
de alma ou psique e considerada como algo separado do corpo. 
Embora muitos possam pensar que a mente pode influenciar o 
corpo, e, por sua vez, o corpo pode influenciar a mente, a maio-
ria dos filósofos procuraram as causas do comportamento anor-
mal em um ou noutro. Essa separação traz à luz duas tradições 
de pensamento sobre o comportamento anormal, resumidas 
como modelo biológico e modelo psicológico. Esses três modelos 
– o sobrenatural, o biológico e o psicológico – são muito antigos, 
mas continuam a ser utilizados até os dias de hoje.
 Verificação de conceitos 1.1
Parte A
Escreva a letra de uma ou todas as seguintes definições de 
anormalidade nas lacunas: (a) violação da norma social, 
(b) prejuízo no funcionamento, (c) disfunção e (d) sofri-
mento.
1. Miguel, recentemente, começou a ficar triste e solitário. 
Embora ainda seja capaz de trabalhar e cumprir com 
outras responsabilidades, ele acha que está sempre desa-
nimado e anda preocupado com o que está acontecendo 
consigo. Qual das definições de anormalidade se aplica à 
situação de Miguel? 
2. Há três semanas, Jane, de 35 anos, executiva da área de 
negócios, parou de tomar banho, recusa-se a sair de seu 
apartamento e começou a assistir a programas de audi-
tório na televisão. Ameaças de que seria demitida falha-
ram em trazê-la de volta à realidade, e ela continua a 
passar seus dias olhando fixamente para a tela da tele-
visão. Qual das definições pode descrever o comporta-
mento de Jane? 
Parte B
Associe as seguintes palavras usadas em descrições clínicas 
com seus exemplos correspondentes: (a) apresentação do 
problema, (b) prevalência, (c) incidência, (d) prognóstico 
(e) curso e (f) etiologia.
3. Maria deveria recuperar-se rapidamente sem que nenhu-
ma intervenção fosse necessária. Sem tratamento, John 
vai piorar rapidamente. 
4. Três novos casos de bulimia foram relatados neste muni-
cípio no último mês e apenas um no município vizinho. 
5. Elizabeth visitou o centro de saúde mental do campus 
em razão de seus crescentes sentimentos de culpa e an-
siedade. 
6. Influências biológicas, psicológicas e sociais contribuem 
para uma variedade de transtornos.
 
7. O padrão que um transtorno segue pode ser crônico, li-
mitado ou episódico. 
8. Quantas pessoas na população sofrem com o transtorno 
obsessivo-compulsivo? 
A tradição sobrenatural
Em grande parte de nossa história, o comportamento desviante 
tem sido considerado um reflexo da batalha entre o bem e o 
mal. Quando confrontadas com o inexplicável, com o compor-
tamento irracional e com o sofrimento e a revolta, as pessoas 
entendiam como o mal. Na verdade, no Império Persa de 900 a 
600 a.C., todos os transtornos físicos e mentais eram considera-
dos manifestação demoníaca (Millon, 2004). Barbara Tuchman, 
notável historiadora, escreveu uma crônica sobre a segunda me-
tade do século XIV, período particularmente difícil para a hu-
manidade, em Um espelho distante: o terrível século XIV (1978). 
Nesse texto, ela, com muita propriedade, capturou as tendências 
de opinião sobre as origens e o tratamento da insanidade duran-
te aquele período tumultuado e desesperançoso.
Demônios e bruxas 
Uma forte corrente de opinião colocou, de maneira forçada, as 
causas e o tratamento dos transtornos psicológicos no domínio 
do sobrenatural. Durante o último quartel do século XIV, reli-
giosos e autoridades laicas apoiaram as superstições populares, 
e a sociedade passou a acreditar na realidade e no poder dos de-
mônios e das bruxas. A Igreja Católica se dividiu, e um segundo 
segmento, com a inclusão de um papa, surgiu no sul da França 
para competir com Roma. Em reação a esse cisma, a Igreja Ro-
mana lutou contra o mal no mundo que acreditava estar por trás 
daquela heresia.
As pessoas recorriam cada vez mais à mágica e à bruxaria 
para resolver seus problemas. Durante essa época turbulenta, o 
comportamento bizarro das pessoas atormentadas pelos trans-
tornos psicológicos era visto como ação do diabo ou das bru-
xas. Seguiu-se que os indivíduos dominados por maus espíritos 
eram considerados responsáveis por qualquer infortúnio experi-
mentado pelos moradores das cidades, o que inspirou uma ação 
drástica contra os possuídos. Os tratamentos incluíam exorcismo, 
em que diversos rituais religiosos eram desenvolvidos para livrar 
9Capítulo 1 – Comportamento anormal no Contexto históriCo
a vítima dos maus espíritos. Outras abordagens incluíam tosar 
o cabelo da vítima em formato de cruz e amarrá-la a um muro 
próximo ao adro de uma igreja de maneira que pudesse se bene-
ficiar ao ouvir a missa.
A convicção de que a bruxaria e as bruxas eram causas de 
loucura e de outros males continuou durante o século XV, e o 
mal continuou a ser o responsável por comportamentos inexpli-
cáveis, mesmo após a fundação dos Estados Unidos, como ficou 
evidenciado pelos julgamentos das bruxas de Salem.
Estresse e melancolia
Uma opinião igualmente forte, mesmo durante esse período, re-
fletiu a visão esclarecida de que a insanidade era um fenômeno 
natural, causado pelo estresse mental ou emocional, e que ela era 
curável (Alexander e Selesnick, 1966; Maher e Maher, 1985a). 
A depressão e a ansiedade foram reconhecidas como doenças 
(Kemp, 1990; Shoeneman, 1977), embora sintomas como deses-
pero e letargia fossem frequentemente identificados pela Igreja 
com o pecado da apatia ou preguiça (Tuchman, 1978). Trata-
mentos comuns eram repouso, sono e ambiente alegre e saudá-
vel. Outros tratamentos incluíam banhos, unguentos e diversas 
poções. De fato, durante os séculos XIV e XV, pessoas insanas, 
juntamente com as pessoas com deformidades físicas ou incapa-
citadas, eram transferidas de casa em casa nos vilarejos medie-
vais, de forma que os vizinhos se revezavam para cuidar delas. 
Hoje, sabemos que é benéfica a prática de manter as pessoas que 
têm distúrbios psicológicos em sua própria comunidade (ver 
Capítulo 13). (Voltaremos a este assunto quando discutirmos os 
modelos biológico e psicológico adiante neste mesmo capítulo.)
No século XIV, Nicholas Oresme, bispo, filósofo e um dos 
conselheiros-chefe do rei da França, também sugeriu que a 
doen ça da melancolia (depressão) era a fonte de comporta-
mentos bizarros, em vez de ser causada por demônios. Oresme 
ressaltou que muito da evidência de haver bruxaria e feitiçaria,particularmente entre aqueles considerados insanos, advinha de 
pessoas que eram torturadas e que, compreensivelmente, con-
fessavam qualquer coisa.
 Durante a Idade Média, às vezes, pensava-se que indivíduos 
com transtornos psicológicos estavam possuídos por espíritos 
demoníacos e, por essa razão, tentava-se fazer exorcismos 
por meio de rituais.
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Esses fluxos transversais conflituosos de explicações naturais 
e sobrenaturais para os transtornos mentais eram representados 
com maior ou menor veemência em diversos trabalhos histó-
ricos, dependendo das fontes consultadas pelos historiadores. 
Algumas pessoas presumiam que as influências demoníacas 
eram as explicações predominantes de comportamento anormal 
durante a Idade Média (por exemplo, Zilboorg e Henry, 1941); 
outros acreditavam que o sobrenatural teria pouca ou nenhuma 
influência. Como poderemos ver no tratamento do transtorno 
psicológico grave experimentado pelo rei da França, Carlos VI, 
no final do século XIV, ambas as influências eram fortes e, às 
vezes, alternavam-se no tratamento do mesmo caso.
O rei loucoCARLOS VI• • •
No verão de 1392, o rei da França, Carlos VI, estava sob 
forte estresse, em parte pela divisão da Igreja Católica. En-
quanto conduzia seu exército à província da Bretanha, um 
ajudante militar próximo deixou sua lança cair, fazendo um 
ruído estrondoso. O rei, pensando ser um ataque, voltou-
-se contra seu próprio exército e matou diversos cavaleiros 
proe minentes antes de ser subjugado pelas costas. O exérci-
to marchou imediatamente de volta a Paris. Os tenentes e os 
conselheiros do rei concluíram que ele estava louco.
Nos anos seguintes, em seus piores momentos, o rei es-
condia-se em um canto do seu castelo, acreditava que seu 
corpo era feito de vidro, ou perambulava pelos corredores 
uivando como um lobo. Em outros momentos, não conse-
guia se lembrar quem ou o que era. Ele tornou-se medroso; 
e ficava irado sempre que via seu próprio brasão real e ten-
tava destruí-lo caso fosse trazido para perto dele.
O povo de Paris estava arrasado com a aparente loucu-
ra de seu líder. Alguns pensavam que isso refletia a ira de 
Deus, porque o rei falhou ao tomar armas para acabar com 
o cisma da Igreja Católica; outros pensavam que isso fosse 
o aviso de Deus contra a tomada das armas; havia ainda os 
que pensavam que era a punição divina contra os impostos 
pesados (uma conclusão a que algumas pessoas poderiam 
chegar hoje). Contudo, a maioria pensava que a loucura do 
rei era causada por bruxaria, uma crença intensificada pela 
forte seca que havia atingido açudes e rios, fazendo com que 
o gado morresse de sede. Os mercadores lamentavam suas 
piores perdas em 20 anos.
Naturalmente, era dado ao rei o melhor tratamento dis-
ponível. O mais famoso curador da época era um médico de 
92 anos, cujo programa de tratamento incluía mudar o rei 
para uma de suas residências no campo, onde se supunha 
que o ar era o mais puro do país. O médico prescreveu des-
canso, relaxamento e recreação. Após algum tempo, Carlos 
VI pareceu estar recuperado. O médico recomendou que 
o rei não fosse sobrecarregado com as responsabilidades 
de administrar o reino, alegando que, se ele tivesse poucas 
preo cupações ou irritações, sua mente, aos poucos, se forta-
leceria e, assim, melhoraria ainda mais.
Infelizmente, o médico morreu, e a insanidade do rei vol-
tou mais séria do que antes. Desta vez, entretanto, ele ficou 
10 PsicoPatologia
sob a influência da causa transversal e conflitante do sobre-
natural. “Um charlatão rude de más intenções e pseudomís-
tico, chamado Arnaut Guilhem, teve permissão para tratar 
de Carlos sob a alegação de possuir um livro dado por Deus 
a Adão por meio do qual o homem poderia superar toda a 
aflição resultante do pecado original” (Tuchman, 1978, p. 
514). Guilhem insistiu que a doença do rei era causada por 
bruxaria, mas seu tratamento não trouxe a cura.
Uma variedade de remédios e rituais de todos os tipos 
foi aplicada, mas nada funcionou. Oficiais de alto escalão 
e doutores da universidade que chamavam por “feiticei-
ros” eram descobertos e punidos. “Em certa ocasião, dois 
frades agostinianos, após não obterem nenhum resultado 
de encantamentos mágicos e de um líquido feito de péro-
las poderosas, propuseram fazer incisões na cabeça do rei. 
Quando isso não foi permitido pelo conselho real, os frades 
acusaram de bruxaria aqueles que se opuseram às suas reco-
mendações” (Tuchman, 1978, p. 514). Mesmo o próprio rei, 
durante seus momentos lúcidos, voltava a acreditar que a 
fonte da loucura era o mal e a bruxaria. “Em nome de Jesus 
Cristo”, ele gritava, pranteando em sua agonia, “se houver 
algum de vocês que tenha relação com este mal de que eu 
sofro, eu lhe imploro não mais me torturar, antes, deixe-me 
morrer!” (Tuchman, 1978, p. 515).
Tratamentos para possessão
Com a conexão entre feitos malignos e o pecado de um lado e os 
transtornos psicológicos de outro, é lógico concluir que a pessoa 
que sofre do distúrbio é responsável pelo transtorno, que pode-
ria, por sua vez, ser uma punição por feitos malignos. Isso parece 
familiar? A síndrome epidêmica da imunodeficiência adquirida 
(AIDS/SIDA) foi associada a uma crença similar entre algumas 
pessoas, em particular no final dos anos 1980 e início dos anos 
1990. Pelo fato de o vírus da imunodeficiência humana (HIV) 
ser, nas sociedades ocidentais, mais prevalente entre indivíduos 
com orientação homossexual, muitas pessoas acreditavam que a 
doença advinha da punição divina pelo que eles consideravam 
um comportamento imoral. Essa concepção tornou-se menos 
comum quando o vírus da AIDS se disseminou por outros seg-
mentos da população, mas ainda persiste.
A possessão, contudo, não está relacionada ao pecado, mas 
pode ser vista como involuntária e o indivíduo possuído, como 
inocente. Além disso, os exorcismos pelo menos têm a virtude 
de ser relativamente indolores. Curiosamente, eles às vezes fun-
cionam, como também funcionam outras formas de cura pela fé, 
por razões que exploraremos nos capítulos subsequentes. Mas 
e se eles não funcionassem? Na Idade Média, se o exorcismo 
falhasse, algumas autoridades pensavam que algumas atitudes 
eram necessárias para tornar o corpo inabitável pelos espíritos 
maus, e muitas pessoas eram confinadas, surradas e sofriam ou-
tras formas de tortura (Kemp, 1990).
Em algum momento, um “terapeuta” criativo achou que pen-
durar pessoas sobre um poço cheio de cobras venenosas poderia 
assustar os espíritos demoníacos para fora de seus corpos possuí-
dos (sem mencionar o quanto isso assustava as próprias pessoas). 
Por incrível que pareça, essa abordagem às vezes funcionava; ou 
seja, indivíduos com comportamentos mais perturbadores e es-
tranhos de repente voltavam a si e vivenciavam o alívio dos sin-
tomas, mas temporariamente. Naturalmente, tal procedimento 
era encorajador ao terapeuta e, assim, poços de serpentes foram 
construídos em muitas instituições. Vários outros tratamentos 
baseados no elemento terapêutico hipotético de choque foram 
desenvolvidos, incluindo imersão em água gelada.
Histeria em massa
Um outro fenômeno fascinante é caracterizado pelos surtos 
de comportamento bizarro em larga escala. Até os dias de hoje, 
esses episódios confundem historiadores e profissionais de saú-
de mental. Durante a Idade Média, eles apoiaram a noção de 
possessão demoníaca. Na Europa, grupos inteiros de pessoas 
eram simultaneamente compelidas a saírem na rua, dançando, 
gritando, delirando e pulando em padrões como se estivessem 
em uma festa selvagem tarde da noite (hoje é a chamada festa 
rave, mas acompanhada de música). Esse comportamento era 
conhecido por diversos nomes, inclusive Dança de São 
Vito e tarantismo. O mais interessante é que muitas pes-
soas se comportavam dessa maneira estranha de uma 
vez. Em uma tentativa de explicar o inexplicável, foram 
dadas várias razões além da possessão. Umahipótese 
razoável foi a reação a picada de insetos. Outra possi-
bilidade foi o que nós chamamos agora de histeria em 
massa. Considere o exemplo que segue.
Histeria em massa em tempos modernos
Em uma sexta-feira à tarde, um alarme soou avisan-
do todos os médicos de um hospital comunitário para 
que comparecessem à sala de emergência imediatamen-
te. De uma escola local em uma frota de ambulâncias 
chegavam 17 alunos e 4 professores que diziam sentir 
tontura, cefaleia, náusea e dores de estômago; uns vomi-
tavam e outros hiperventilavam.
Todos os alunos e professores haviam estado em 
quatro salas de aula, duas de cada lado do corredor. O 
 Na hidroterapia, pacientes eram submetidos ao choque para voltarem a si por 
aplicação de água gelada.
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11Capítulo 1 – Comportamento anormal no Contexto históriCo
incidente começou quando uma garota de 14 anos disse que sen-
tia um cheiro estranho que vinha de um respiradouro. Ela caiu 
no chão, gritando e reclamando que seu estômago doía e seus 
olhos ardiam. Logo, muitos alunos e a maioria dos professores 
das salas de aula adjuntas, que podiam ver e ouvir o que estava 
acontecendo, vivenciaram sintomas semelhantes. De 86 pessoas 
suscetíveis (82 alunos e 4 professores das quatro salas de aula), 
21 pacientes (17 alunos e 4 professores) vivenciaram sintomas 
graves suficientes para serem atendidos em um hospital. A ins-
peção do prédio da escola pelas autoridades de saúde pública 
revelou que não houve causa aparente para tais reações, e os 
exames físicos realizados pela equipe de médicos não revelaram 
anormalidade física. Todos os pacientes receberam alta e rapida-
mente se recuperaram (Rockney e Lemke, 1992).
A histeria em massa pode simplesmente demonstrar o fenô-
meno de contágio emocional, em que a sensação de uma emoção 
se dissemina para outros ao nosso redor (Hatfield, Cacioppo, e 
Rapson, 1994; Wang, 2006). Se alguém perto de nós ficar com 
medo ou triste, é bem possível que por um momento você tam-
bém sentirá medo ou tristeza. Quando esse tipo de experiên-
cia chega a um completo surto de pânico, comunidades inteiras 
são afetadas (Barlow, 2002). Pessoas são também sugestionadas 
quando estão em estados emotivos elevados. Portanto, na medi-
da em que uma pessoa identifica a “causa” do problema, outras 
provavelmente presumem que suas próprias reações têm a mes-
ma origem. Numa linguagem popular, essa reação compartilha-
da é, às vezes, chamada de psicologia das massas.
A lua e as estrelas
Paracelso, um médico suíço que viveu de 1493 a 1541, rejeitou 
as concepções de possessão demoníaca e sugeriu, em vez dis-
so, que os movimentos da lua e das estrelas exerciam profun-
do efeito no mecanismo mental das pessoas. Trazendo à luz o 
pensamento similar da Grécia antiga, Paracelso especulou que 
os efeitos gravitacionais da lua nos fluídos corporais poderiam 
ser uma causa possível de transtornos mentais (Rotton e Kelly, 
1985). Essa teoria inspirou a criação da palavra lunático, que de-
riva do latim luna, que significa “lua”. Você pode ouvir alguns 
amigos comentarem sobre algo louco que fizeram durante a noi-
te quando dizem: “Deve ter sido a lua cheia”. A crença de que 
corpos celestiais afetam o comportamento humano ainda exis-
te, embora não haja evidência científica para apoiá-la (Raison, 
Klein, e Steckler, 1999; Rotton e Kelly, 1985). Apesar de muita 
zombaria, milhões de pessoas ao redor do mundo estão conven-
cidas de que seu comportamento é influenciado pelas fases da 
lua ou pela posição das estrelas. Essa crença é mais perceptível 
hoje em pessoas que são adeptas à astrologia e afirmam que seu 
comportamento e a maioria dos acontecimentos em suas vidas 
podem ser previstos pela relação entre o dia a dia e a posição dos 
planetas. Entretanto, nenhuma evidência séria tem confirmado 
tal conexão.
Comentários 
A tradição sobrenatural está bem presente e viva na psicopato-
logia, embora esteja relegada, em sua maior parte, a pequenas 
seitas religiosas e a culturas primitivas. Membros de religiões 
organizadas na maior parte do mundo procuram a psicologia e 
a ciência médica para ajudar nos principais transtornos psicoló-
 Emoções são contagiosas e podem se transformar em histeria em 
massa.
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gicos; de fato, a Igreja Católica Romana requer que se esgotem 
todos os recursos médicos antes que soluções espirituais, como 
exorcismo, possam ser consideradas. Além disso, curas miracu-
losas são, às vezes, alcançadas por exorcismo, poções mágicas e 
rituais e outros métodos que parecem ter pouca ligação com a 
ciência moderna. É fascinante explorá-las quando elas de fato 
acontecem, e iremos voltar a esse tópico em capítulos posterio-
res. No entanto, tais casos são relativamente raros, e quase nin-
guém defenderia o tratamento espiritual para transtornos psico-
lógicos graves, exceto, talvez, como último recurso.
A tradição biológica
Buscam-se as causas físicas dos transtornos mentais desde os 
primórdios da história. Foram importantes para a tradição psi-
cológica: um homem, Hipócrates; uma doença, a sífilis; e as 
primeiras consequências da crença de que os transtornos psi-
cológicos tinham causa biológica.
Hipócrates e Galeno
O médico grego Hipócrates (460-377 a.C.) é considerado o pai 
da medicina moderna ocidental. Ele e seus discípulos deixaram 
um conjunto de obras chamado Corpo Hipocrático, escrito entre 
450 e 350 a.C. (Maher e Maher, 1985a), no qual eles sugeriam 
que os transtornos psicológicos poderiam ser tratados como 
qualquer outra doença. Eles não limitaram suas pesquisas para 
as causas da psicopatologia à área geral de “doença”, porque acre-
ditavam que os transtornos psicológicos pudessem também ser 
causados por patologias cerebrais ou por traumas na cabeça e 
que poderiam ser influenciados pela hereditariedade (genéti-
ca). Essas são deduções notavelmente astutas para aquela época 
e têm sido apoiadas até anos recentes. Hipócrates considerava 
o cérebro a sede da sabedoria, da consciência, da inteligência 
e da emoção. Por conseguinte, os transtornos envolvendo essas 
funções estariam claramente localizados no cérebro. Hipócrates 
também reconheceu a importância das contribuições psicoló-
gicas e interpessoais para a psicopatologia, como os efeitos por 
vezes negativos do estresse familiar; em determinadas ocasiões, 
ele isolou pacientes de suas famílias.
12 PsicoPatologia
O médico romano Galeno (por volta de 129-198 d.C.) ado-
tou posteriormente as ideias de Hipócrates e de seus discípulos 
e as desenvolveu ainda mais, criando uma escola poderosa in-
fluente do pensamento dentro do contexto da tradição biológica 
que se estendeu até o século XIX. Um dos legados mais interes-
santes e influentes da abordagem hipocrático-galênica é a teoria 
humoral dos transtornos. Hipócrates afirmava que o funciona-
mento normal do cérebro estava relacionado aos quatro fluidos 
corporais, ou humores: o sangue, a bílis negra, a bílis amarela e 
a linfa (ou fleuma). O sangue vinha do coração; a bílis negra, 
do baço; a linfa, do cérebro; e a bílis amarela ou cólera, do fíga-
do. Os médicos acreditavam que a doença resultava de um dos 
humores em excesso ou em escassez; por exemplo, pensava-se 
que muita bílis negra causava a melancolia (depressão). De fato, 
o termo melancólico, que significa “bílis negra”, ainda é usado 
em sua forma derivativa melancolia para se referir a aspectos da 
depressão. A teoria humoral foi, talvez, o primeiro exemplo de 
associação de transtornos psicológicos com desequilíbrio quí-
mico, uma abordagem muito difundida hoje.
Os quatro humores foram relacionados ao conceito grego 
das quatro qualidades básicas: calor, secura, umidade e frio. 
Cada humor foi associado a uma dessas qualidades. Os termos 
derivados dos quatro humores ainda são aplicados a traços de 
personalidade. Por exemplo, o sanguíneo (com significado literal 
“vermelho, como sangue”) descreve alguém que é muito cora-
do em suacompleição, presumivelmente em função do sangue 
abundante que flui pelo corpo, e alegre e otimista, embora se 
pensasse que a insônia e o delírio eram causados por fluxo ex-
cessivo de sangue no cérebro. Melancólico significa depressivo 
(pensou-se que a depressão fosse causada pela bílis negra inun-
dando o cérebro). Uma personalidade fleumática (originada do 
humor fleuma, linfa) indica apatia e morosidade, mas também 
 A sangria, remoção de sangue de pacientes, intencionava restaurar 
o equilíbrio de humores no corpo.
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pode significar calma em situações de estresse. Uma pessoa co-
lérica (da bílis amarela ou cólera) é de temperamento quente 
(Maher e Maher, 1985a).
O excesso de um ou mais dos humores era tratado regulan-
do-se o ambiente para aumentar ou diminuir o calor, a secura, 
a umidade ou o frio, dependendo de qual humor estivesse em 
desequilíbrio. Um motivo para que o médico tivesse transferi-
do o Rei Carlos VI para uma localidade campestre menos es-
tressante foi o de restaurar o equilíbrio de seus humores (Kemp, 
1990). Além de descansar, ter boa alimentação e exercícios, dois 
tratamentos foram desenvolvidos. Um deles era a sangria, ou fle-
botomia, em que uma quantidade cuidadosamente mensurada 
de sangue era removida do corpo, na maior parte das vezes com 
sanguessugas. O outro era a indução do vômito; de fato, em um 
tratado muito conhecido sobre depressão, publicado em 1621, 
Anatomia da melancolia, Robert Burton recomendava comer ta-
baco e um repolho semicozido para induzir o vômito (Burton, 
1621/1977). Há três séculos, Judy poderia ter sido diagnosticada 
com uma doença, um transtorno cerebral ou algum outro pro-
blema físico, provavelmente relacionado a algum humor excessi-
vo, e, como tratamentos médicos adequados da época, seriam in-
dicados repouso, dieta saudável, exercícios e demais prescrições.
Na China antiga e em toda a Ásia, existia uma ideia similar. 
Mas, em vez de “humores”, os métodos chineses se concentra-
vam no movimento do ar ou do “vento” em todo o corpo. Trans-
tornos mentais inexplicáveis eram causados pelos bloqueios do 
vento ou presença de frio, vento negro (yin) em oposição ao 
quente, vento que sustenta a vida (yang). O tratamento consistia 
em restaurar o fluxo adequado de vento por meio de vários mé-
todos, inclusive a acupuntura.
Hipócrates também cunhou a palavra histeria para descrever 
um conceito que aprendeu com os egípcios, que tinham identi-
ficado o que hoje chamamos transtornos de sintomas somáticos. 
Nesses transtornos, os sintomas físicos parecem ser resultado de 
uma patologia médica para a qual nenhuma causa física pode ser 
encontrada, como paralisia e alguns tipos de cegueira. Pelo fato 
de que esses transtornos ocorriam primariamente em mulheres, 
os egípcios (e Hipócrates) erroneamente presumiram que eles se 
restringiam a mulheres. Eles também presumiram uma causa: o 
útero vazio perambulava por várias partes do corpo em busca 
de concepção (a palavra grega para “útero” é hysteron). Nume-
rosos sintomas físicos refletiam a localização do útero ambulan-
te. A cura prescrita poderia ser casamento ou, ocasionalmente, 
fumigação da vagina para atrair o útero de volta ao seu lugar 
original (Alexander e Selesnick, 1966). O conhecimento da fisio-
logia eventualmente desaprovava a teoria do útero ambulante; 
entretanto, a tendência de estigmatizar as mulheres dramáticas 
como “histéricas” continuou imbatível até os anos 1970, quan-
do os profissionais da saúde mental tornaram-se sensíveis ao 
estereótipo prejudicial do termo empregado. Como você verá 
no Capítulo 6, os transtornos de sintomas somáticos (e traços 
associados) não são limitados a um sexo ou outro.
O século XIX
A tradição biológica aumentou e diminuiu durante os séculos 
após Hipócrates e Galeno, mas foi revigorada no século XIX de-
vido a dois fatores: a descoberta da natureza e da causa de sífilis 
e o apoio forte advindo do psiquiatra norte-americano bem con-
ceituado John P. Grey.
13Capítulo 1 – Comportamento anormal no Contexto históriCo
Sífilis
Os sintomas comportamentais e cognitivos daquilo que hoje 
conhecemos como sífilis avançada, doença sexualmente trans-
missível causada por um microrganismo bacteriano que entra 
no cérebro, incluem a crença de que alguém está tramando con-
tra você (delírio de perseguição) ou que você é Deus (delírio de 
grandeza), bem como outros comportamentos bizarros. Embora 
esses sintomas sejam muitos semelhantes aos da psicose – trans-
tornos psicológicos caracterizados em parte por crenças que não 
estão baseadas na realidade (delírios), percepções que não se ba-
seiam na realidade (alucinações), ou ambos – os pesquisadores 
reconheceram que um subgrupo de pacientes aparentemente 
psicóticos deterioravam permanentemente, tornando-se para-
lisadas e morriam dentro de cinco anos a contar dos primeiros 
sintomas. Esse curso dos eventos contrastava com o da maioria 
dos pacientes psicóticos, que permaneciam bastante estáveis. 
Em 1825, a condição foi designada como doença, paresia geral, 
porque ela mostrava sintomas consistentes (apresentação) e um 
curso consistente que resultava em morte. A relação entre a pa-
resia geral e a sífilis foi estabelecida gradualmente. A teoria de 
germe de doença de Louis Pasteur, desenvolvida por volta de 
1870, facilitou a identificação do microrganismo bacteriano es-
pecífico que causava a sífilis.
De igual importância foi a descoberta de uma cura para a pa-
resia geral. Os médicos observaram uma recuperação surpreen-
dente em pacientes com paresia geral que tinham contraído 
malária e deliberadamente injetaram em outros o sangue de um 
soldado que estava com malária. Muitos se recuperaram porque 
a febre alta “queimou” a bactéria da sífilis. Obviamente, esse tipo 
de experimento não seria eticamente possível nos dias de hoje. 
Posteriormente, os investigadores clínicos descobriram que a 
penicilina curava a sífilis, mas com a malarioterapia, “a loucura”, 
e seus sintomas comportamentais e cognitivos associados, pela 
primeira vez foi relacionada a uma infecção tratável. Muitos pro-
fissionais da saúde mental supuseram, então, que causas e curas 
comparáveis poderiam ser descobertas para todos os transtor-
nos psicológicos.
John P. Grey
O campeão da tradição biológica nos Estados Unidos foi o psi-
quiatra norte-americano mais influente da época, John P. Grey 
(Bockoven, 1963). Em 1854, Grey foi nomeado superintendente 
do Utica State Hospital, em Nova York, o maior do país. Ele tam-
bém se tornou editor do American Journal of Insanity, precursor 
do atual American Journal of Psychiatry, publicação carro-chefe 
da American Psychiatric Association. Na concepção de Grey, as 
causas de insanidade eram sempre físicas. Portanto, o paciente 
mentalmente doente deveria ser tratado como fisicamente doen-
te. A ênfase estava novamente no descanso, na dieta, em sala 
com temperatura ambiente e ventilação adequados, abordagens 
usadas há séculos pelos terapeutas anteriores da tradição bio-
lógica. Grey até inventou um aparelho rotatório para ventilar o 
complexo hospitalar.
Sob a liderança de Grey, as condições nos hospitais foram 
bastante aprimoradas, e eles se tornaram instituições mais hu-
manizadas e dignas de serem habitadas. Entretanto, nos anos 
posteriores, essas instituições se tornaram tão grandes e impes-
soais que não era mais possível dar atenção individual.
De fato, os psiquiatras, no final do século XIX, ficaram alar-
mados com o tamanho e a impessoalidade crescentes dos hos-
pitais psiquiátricos, e foi recomendado que fossem reduzidos. 
Quase cem anos antes, o movimento da comunidade de saúde 
mental foi bem-sucedido em reduzir a população dos hospitais 
psiquiátricos com a política muito controversa de “desinstitu-
cionalização”, em que os pacientes eram reintegrados em suas 
comunidades. Infelizmente, essa prática tem consequências tan-
to negativas quanto positivas, incluindo o grande aumento do 
número dos pacientes cronicamenteincapacitados sem lar, nas 
ruas de nossas cidades.
O desenvolvimento dos tratamentos biológicos
Pelo lado positivo, o interesse renovado na origem biológica dos 
transtornos psicológicos levou, recentemente, a um aumento 
grandioso da compreensão sobre as contribuições biológicas 
para a psicopatologia e para o desenvolvimento de novos trata-
mentos. Na década de 1930, as intervenções físicas da eletrocon-
vulsoterapia e da cirurgia cerebral eram frequentes. Seus efeitos 
e os efeitos das novas drogas foram descobertos por acidente. 
Por exemplo, a insulina era ministrada para estimular o apetite 
em pacientes psicóticos que não estivessem comendo, mas tam-
bém parecia acalmá-los. Em 1927, um médico vienense, Man-
fred Sakel, começou a ministrar dosagens cada vez mais altas até 
que os pacientes convulsionavam e ficavam temporariamente 
comatosos (Sakel, 1958). Alguns recuperavam a saúde mental, 
para a surpresa de todos, e sua recuperação era atribuída às con-
vulsões. O procedimento tornou-se conhecido como terapia por 
choque insulínico, mas foi abandonado por ser muito perigoso, 
pois era comum resultar em coma prolongado ou até em morte. 
Outros métodos utilizados para produzir convulsões deveriam 
ser encontrados.
Benjamin Franklin fez numerosas descobertas durante sua 
vida com as quais estamos familiarizados, mas a maioria das pes-
soas não sabe que ele acidentalmente descobriu, e depois confir-
mou experimentalmente em meados de 1750, que um eletrocho-
que leve e moderado na cabeça produzia uma breve convulsão e 
perda de memória (amnésia), mas que de outro modo era pouco 
prejudicial. Um médico holandês que era amigo e colaborador de 
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 No século XIX, os transtornos psicológicos foram atribuídos 
a estresse mental e emocional, então os pacientes eram 
frequentemente tratados de maneira solidária em ambientes 
calmos e higiênicos.
14 PsicoPatologia
Franklin tentou tal procedimento nele mesmo e descobriu que 
o choque também o fazia sentir-se “estranhamente eufórico” e 
ficou pensando se ele não poderia ser utilizado no tratamento 
da depressão (Finger e Zaromb, 2006, p. 245).
Nos anos 1920, o psiquiatra húngaro Joseph von Meduna 
observou independentemente que a esquizofrenia raramen-
te era encontrada em epiléticos (o que posteriormente não se 
provou verdadeiro). Alguns de seus seguidores concluíram que 
convulsões cerebrais induzidas poderiam curar a esquizofrenia. 
Seguindo as sugestões sobre os possíveis benefícios de se apli-
car o choque elétrico diretamente no cérebro – em especial, por 
dois médicos italianos, Ugo Cerletti e Lucio Bini, em 1938 –, um 
cirurgião em Londres tratou um paciente deprimido aplicando 
seis choques pequenos diretamente em seu cérebro, produzindo 
convulsões (Hunt, 1980). O paciente se recuperou. Embora bas-
tante modificado, o tratamento de choque ainda existe. Os usos 
modernos e controversos da eletroconvulsoterapia estão descri-
tos no Capítulo 7. É interessante que mesmo hoje ainda temos 
pouco conhecimento de como funciona.
Durante os anos da década de 1950, as primeiras drogas efe-
tivas para transtornos psicóticos graves foram desenvolvidas de 
maneira sistemática. Antes dessa época, um número de subs-
tâncias medicinais, incluindo ópio (derivado da papoula), havia 
sido usado como sedativo, juntamente de incontáveis ervas e 
remédios populares (Alexander e Selesnick, 1966). Com a des-
coberta da Rauwolfia serpentine (mais tarde, renomeada, reserpi-
na) e de outra classe de drogas chamadas neurolépticas (tranqui-
lizantes maiores), pela primeira vez os processos alucinatórios 
e delirantes puderam ser reduzidos em alguns pacientes; essas 
drogas também controlaram a agitação e a agressividade. Outras 
descobertas incluíram as benzodiazepinas (tranquilizantes me-
nores), que pareciam reduzir a ansiedade.
Nos anos 1970, as benzodiazepinas (conhecidas por nomes 
comerciais como Valium e Librium) estavam entre as drogas mais 
prescritas no mundo. Como as desvantagens e os efeitos colaterais 
dos tranquilizantes tornaram-se aparentes, além da sua efetividade 
limitada, as prescrições diminuíram um pouco (discutiremos as 
benzodiazepinas em mais detalhes nos Capítulos 5 e 11).
Ao longo dos séculos, como Alexander e Selesnick demons-
traram, “O modelo geral da terapia de drogas para doenças men-
tais foi de um entusiasmo inicial seguido por decepção” (1966, p. 
287). Por exemplo, as bromidas, uma classe de drogas sedativas, 
foram usadas no final do século XIX e início do século XX para 
tratar a ansiedade e outros transtornos psicológicos. Na década 
de 1920, foram reportadas como efetivas para muitos sintomas 
psicológicos e emocionais graves. Em 1928, uma de cada cin-
co prescrições nos Estados Unidos era para bromidas. Quando 
seus efeitos colaterais, incluindo diversos sintomas físicos in-
desejáveis, tornaram-se conhecidos, e a experiência começou a 
mostrar que sua efetividade geral era relativamente modesta, as 
bromidas saíram de cena.
Os neurolépticos também têm sido menos usados em razão 
de seus diversos efeitos colaterais, como tremores e movimentos 
involuntários. Entretanto, os efeitos positivos dessas drogas em 
alguns pacientes com sintomas psicóticos de alucinações, de-
lírios e agitação revitalizou tanto a pesquisa das contribuições 
biológicas para os transtornos psicológicos quanto a pesquisa 
para novas e mais poderosas drogas, uma pesquisa que tem pago 
muitos dividendos, como documentado em capítulos posteriores.
Consequências da tradição biológica
No final do século XIX, Grey e seus colegas, ironicamente, redu-
ziram ou eliminaram o interesse no tratamento de pacientes psi-
quiátricos porque pensavam que os transtornos mentais eram 
consequências de algumas das até então desconhecidas patolo-
gias cerebrais e seriam, portanto, incuráveis. O único curso dis-
ponível de ação era internar esses pacientes. Por volta da virada 
do século, algumas enfermeiras documentaram o sucesso clíni-
co no tratamento de pacientes psiquiátricos, mas foram impedi-
das de tratar outros, pois receavam dar esperanças de cura para 
os familiares. No lugar do tratamento, o interesse se concentrou 
no diagnóstico, nas questões legais em relação à responsabili-
dade dos pacientes quanto às suas ações durante os períodos de 
insanidade e no estudo da própria patologia cerebral.
Emil Kraepelin (1856-1926) foi a figura dominante durante 
esse período e um dos fundadores da psiquiatria moderna. Ele 
era extremamente influente na defesa das principais ideias sobre 
a tradição biológica, mas era pouco envolvido com tratamen-
to. Sua última contribuição foi na área de diagnóstico e classi-
ficação, que discutiremos em detalhes no Capítulo 3. Kraepelin 
(1913) foi um dos primeiros a distinguir os diversos transtornos 
psicológicos, constatando que cada um poderia ter o início dos sin-
tomas em determinada idade e ter tempo de curso diferente, que 
de alguma forma havia grupos diferentes de sintomas e que pro-
vavelmente eram provocados por causas diferentes. Muitas dessas 
descrições de transtornos esquizofrênicos ainda são úteis hoje.
No final de 1800, a abordagem científica para transtornos 
psicológicos e sua classificação havia começado com a busca 
por causas biológicas. Além disso, o tratamento era baseado em 
princípios humanizados. Havia muitos inconvenientes, entre-
tanto, e o mais lamentável de todos foi que a intervenção ativa e 
o tratamento foram eliminados em alguns contextos, apesar da 
disponibilidade de algumas abordagens efetivas. É para eles que 
agora voltaremos nossa atenção.
 Verificação de conceitos 1.2
Por milhares de anos, os seres humanos tentaram compreen-
der e controlar o comportamento anormal. Verifique se 
compreendeu as teorias históricas e associe-as com os tra-
tamentos usados para “curar” o comportamento anormal: 
(a) flebotomia; vômito induzido; (b) paciente colocado em 
ambientes socialmente facilitadores; e (c) exorcismo; ser 
queimado na estaca.
1. Causassobrenaturais; demônios entravam nos corpos 
das vítimas e controlavam seus comportamentos.
 
2. A teoria humoral refletiu a crença de que o funciona-
mento normal do cérebro requeria um equilíbrio dos 
quatro fluidos ou humores corporais.
 
3. O comportamento mal adaptativo era causado por in-
fluências culturais e sociais precárias do ambiente. 
15Capítulo 1 – Comportamento anormal no Contexto históriCo
A tradição psicológica
É um grande salto dos espíritos maus até a patologia do cérebro 
como causa para os transtornos psicológicos. Nos séculos in-
termediários, qual era a linha de pensamento que impulsionou 
o desenvolvimento psicológico, tanto normal quanto anormal, 
em um contexto interpessoal e social? De fato, essa abordagem 
tem uma tradição longa e distinta. Platão, por exemplo, pensava 
que as duas causas do comportamento mal adaptativo eram as 
influências sociais e culturais na vida de alguém e a aprendiza-
gem que ocorria naquele ambiente. Se algo estivesse errado no 
ambiente, como o fato de os pais serem abusivos, os impulsos e 
as emoções da pessoa dominariam a razão. O melhor tratamen-
to era reeducar o indivíduo por meio da discussão racional de 
maneira que o poder da razão predominasse (Maher & Maher, 
1985a). Isso foi, em grande parte, um precursor das abordagens 
do tratamento psicossocial moderno, que focalizam não ape-
nas fatores psicológicos, mas também sociais e culturais. Outros 
filósofos anteriores muito famosos, incluindo Aristóteles, tam-
bém enfatizaram a influência do ambiente social e da aprendi-
zagem precoce em psicopatologias posteriores. Esses filósofos 
escreveram sobre a importância das fantasias, dos sonhos e das 
cognições e, assim, anteciparam, em certa extensão, desenvolvi-
mentos posteriores da ciência cognitiva e do pensamento psi-
canalítico. Eles também defenderam o cuidado humanizado e 
responsável das pessoas com transtornos psicológicos.
Terapia moral
Durante a primeira metade do século XIX, uma forte aborda-
gem psicossocial dos transtornos mentais, chamada terapia 
moral, tornou-se influente. O termo moral, na realidade, signi-
ficava “emocional” ou “psicológico”, em vez de ser um código de 
conduta. Seus princípios básicos incluíam tratar pacientes insti-
tucionalizados da forma mais normal possível em um ambiente 
que encorajasse e reforçasse interações sociais normais (Bocko-
ven, 1963), de forma que lhes garantisse muitas oportunidades 
de adequar seu contato social e interpessoal. Os relacionamentos 
eram cuidadosamente estimulados. A atenção individual clara-
mente trazia consequências positivas para interações e compor-
tamentos adequados, e restrição e isolamento eram eliminados.
Como com a tradição biológica, os princípios da terapia mo-
ral remontam a Platão e vão além dele. Por exemplo, os tem-
plos gregos de Asclepíades do século 6 a.C. alojavam os doentes 
crônicos, inclusive aqueles com transtornos psicológicos. Ali, os 
pacientes eram bem cuidados, massageados e ouviam música 
suave. Práticas similares e esclarecedoras foram evidenciadas 
em países mulçumanos no Oriente Médio (Millon, 2004). Mas 
Em 1822, no encontro anual que ocorria na cidade de Nantucket, uma pequena 
ilha a 30 milhas da costa de Massachusetts, 
votou-se a favor da construção de manicô-
mios-fazendas permanentes na cidade (Gavin, 
2003). Após a guerra de 1812, Nantucket pros-
perou. O comércio se desenvolveu e foi o iní-
cio da era da caça às baleias. Nesse mesmo 
contexto, os cidadãos queriam tomar conta 
dos menos afortunados. Inspirados pelas 
crenças modernas da época concernentes 
ao tratamento da insanidade, decidiu-se 
que os manicômios ficariam situados em um 
lugar longínquo da cidade, onde os pacien-
tes poderiam trabalhar de maneira produ-
tiva em um cenário rural calmo e agradável, 
com ar fresco, atendimento individualizado 
e condições de exercer atividades produti-
vas. Como era característico daqueles dias, 
os manicômios também cuidavam de pobres 
e idosos. Visto que o abuso de álcool era 
considerado a principal causa da pobreza, 
deslocar os manicômios o mais longe pos-
sível das tavernas parecia lógico e também 
um motivo para estabelecer a sua localiza-
ção no campo. Mas o mais importante era 
que, tanto o abuso de álcool quanto a insa-
nidade eram considerados curáveis depois 
que a terapia moral e seus resultados posi-
tivos advindos do manicômio de McLean, 
próximo à Boston, chegaram à ilha. Assim, 
instituiu-se um planejamento de atividades 
que envolvia os pacientes em trabalho agrí-
cola, na produção de vegetais, ovos e lati-
cínios ou em trabalho nos campos de trigo 
e centeio ou em atividades pecuárias. Os 
idosos ou aqueles que não conseguiam tra-
balhar externamente trabalhavam de forma 
produtiva dentro dos quartos do manicômio, 
como com tecelagem. Em consonância com 
o tratamento da terapia moral, pensou-se 
que a maioria dos internos poderia recupe-
rar-se em meio a essa atmosfera saudável e 
reparadora. E as fazendas, que tinham pou-
cos recursos, passaram a ser bem geridas e se 
tornaram rentáveis para a cidade!
Após a construção do manicômio, os 
oficiais da cidade nomearam um Conselho 
de supervisores, líderes responsáveis em 
Nantucket, que logo se preocupou com o 
número de pessoas que visitavam o mani-
cômio e ficavam presumivelmente atônitos 
com os insanos. Numa tentativa a mais de 
proteger os pacientes, a cidade aprovou uma 
lei que restringia as visitas apenas àqueles 
que as solicitavam por escrito e tinham uma 
boa razão para entrar no local. Infelizmente, 
no inverno de 1844, houve um grave incên-
dio. Apesar dos esforços heroicos de muitas 
pessoas da cidade, dez internos foram mor-
tos e a estrutura foi destruída.
Por fim, outro manicômio foi construído, 
mas, dessa vez, apenas abrigava doentes e 
idosos que não conseguiam cuidar de si 
mesmos. Àquela altura, um novo manicô-
mio do estado para insanos foi aberto longe 
da ilha e entendeu-se que seria de bom tom 
transferir pessoas que sofriam de insani-
dade para essa grande (e impessoal) institui-
ção estatal. Foram adotadas novas políticas 
em relação aos casos de pobreza (prova-
velmente para aqueles que não sofriam de 
nenhum vício de qualquer natureza), cujas 
medidas eram prover controle e assistência 
aos pobres, mantendo-os em suas casas e 
propiciando-lhes materiais e recursos míni-
mos, porém suficientes. Um novo “departa-
mento de assistência ao pobre” foi criado na 
cidade para tal propósito. Dessa maneira, 
a terapia moral teve o seu momento de 
ascensão e decadência em uma pequena 
zona rural da Nova Inglaterra, que refletiu a 
tendência daquela época (Gavin, 2003).
 
Manicômios-fazendas2 nos Estados Unidos rural
2 O termo original é “poor farm”, um termo usado para fazendas mantidas por dinheiro público para pessoas necessitadas. Trata-se de algo específico dos Estados 
Unidos, não havendo instituição equivalente no Brasil.
16 PsicoPatologia
a terapia moral como um sistema originou-se com Philippe Pinel 
(1745-1826), um famoso psiquiatra francês, e seu colaborador pró-
ximo Jean-Baptiste Pussin (1746-1811), superintendente do hospi-
tal parisiense La Bicêtre (Gerard, 1997; Zilboorg e Henry, 1941).
Quando Pinel chegou em 1791, Pussin já havia instituído re-
formas marcantes removendo todas as correntes utilizadas para 
restringir pacientes e instituindo intervenções psicológicas posi-
tivas e humanizadas. Pussin persuadiu Pinel a colaborar com as 
mudanças. Grande parte do crédito de Pinel, ele obteve primeiro 
em La Bicêtre e depois no hospital para mulheres Salpétrière, 
onde convidou Pussin para juntar-se a ele (Gerard, 1997; Maher 
e Maher, 1985b; Weiner, 1979). Ali, novamente, eles instituíram 
uma atmosfera humana e socialmente facilitadora que produzia 
resultados “miraculosos”. 
Após William Tuke (1732-1822) ter seguido o exemplo de 
Pinel na Inglaterra, Benjamin Rush (1745-1813), geralmente 
considerado o fundador da psiquiatria norte-americana, intro-
duziu a terapia moral em seus trabalhos iniciais no Hospital

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