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CAROLINE PRISCILA DA SILVA ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO FACULDADE SÃO BRAZ CURITIBA/2018 Sumário Apresentação ................................................................................... 03 Iconografia ....................................................................................... 04 Aula 1 – Concepções de alfabetização e letramento ........................ 05 Aula 2 – Necessidade de repensar o termo alfabetização ................ 20 Aula 3 – Considerações históricas sobre a alfabetização no Brasil . 33 Aula 4 – Métodos de alfabetização utilizados no Brasil .................... 46 Aula 5 – Elementos psicolinguísticos relacionados à alfabetização 60 Aula 6 – Diferenciação nos modos de representação da escrita ....... 73 Aula 7 – Metodologia da alfabetização ............................................. 82 Aula 8 – Práticas pedagógicas ......................................................... 94 Referências ...................................................................................... 104 Apresentação Caro estudante, seja bem-vindo! Daremos início à disciplina de Alfabetização e Letramento, teremos bastante contato com dados históricos e conteúdos próximos de nossas vivências como estudantes, que nos “trarão” de volta ao tempo de escola. Vale lembrar que na educação a distância, o estudante tem participação ativa em sua própria construção do conhecimento, então é importante que você esteja motivado em aprender cada vez mais e também comprometido com nossas aulas e atividades propostas. Bom estudo! ICONOGRAFIA Os ícones são elementos gráficos utilizados para ampliar as formas de linguagem e facilitar a organização e a leitura hipertextual. VOCABULÁRIO Indica a utilização de um termo, palavra ou expressão no texto. IMPORTANTE Indica pontos de maior relevância no texto. REFLITA Questionamentos e reflexões sugeridas pelo autor, mas não é necessário respondê-los. SAIBA MAIS Oferece novas informações que enriquecem o assunto: textos, artigos, reportagens escritas etc. CURIOSIDADES Indica alguma curiosidade a respeito do tema de estudo, mas que não está contemplado na ementa. MÍDIAS Indica sugestões de vídeos ou reportagens para conhecimento complementar. LINK Vídeos e textos para aprofundar o assunto. Dica: Para facilitar clique com o botão direito do mouse e abra uma nova janela. Aula 1 – Concepções de alfabetização e letramento Fonte: Pixabay (2018) Olá! Seja bem-vindo a nossa primeira aula. A partir de agora, faremos uma introdução à história da alfabetização, conceituando-a através dos anos, partindo da pré-história até a atualidade. Veremos também as muitas discussões que levaram aos avanços no campo educacional, como formas de ensinar e desenvolver no aluno a autonomia em construir seu conhecimento, assim como no conceito de letramento que será amplamente abordado dentro do tema e, também, o que podemos considerar como descasos e retrocessos diante das possibilidades dentro da alfabetização. Bom estudo! Quando pensamos no termo alfabetização, podemos relembrar do momento de nossa entrada na escola como alunos do sistema de ensino que compreende os anos iniciais da educação básica. Qual lembrança se tem do primeiro contato com a leitura e a escrita, seriam lembranças boas ou lembranças traumáticas de alguma dificuldade em aprender, de não acompanhar os demais colegas ou mesmo da necessidade de desistir da escola por motivos financeiros ou familiares? De fato, prezado estudante, remeter-se ao período da alfabetização é lembrar do momento de escola e sala de aula, de quando ainda pequenos, de alguma forma, sentamos em uma cadeira, conhecemos nossa professora, demais amigos e os mais variados símbolos colados pelas paredes, presos por grampos em pequenos varais ou mesmo escritos um a um no quadro com giz. Símbolos esses que, no decorrer dos dias, com atividades lúdicas ou bastante mecânicas, deixavam aos poucos de serem apenas símbolos, tornavam-se mais íntimos, apresentavam-se como letras com sua grafia exata, dissociando depois entre letras e números, sons e quantidades. Criavam sons específicos, depois se juntavam a mais letras formando mais sons e, como mágica, destes sons formavam-se novas palavras, ainda pequenas e simples. Depois, como em um jogo, apareciam novas etapas, destas palavras curtas, aparecia o treino cada vez mais complexo para a formação de palavras mais Fonte: Deposit Photos (2018) extensas e o uso do conjunto de todas elas para formação de pequenas frases e depois a produção de textos. Essas lembranças diferem-se de pessoa para pessoa, como podemos observar nas palavras a seguir, de Graciliano Ramos (1953): Diante das diferentes lembranças que podemos ter de nossa própria fase da alfabetização, aparece a primeira noção do quanto as formas de se alfabetizar acontecem, suas interfaces, a questão sociocultural e econômica que a permeiam e as várias concepções originadas nas últimas décadas, além das críticas referentes ao processo de alfabetizar ou mesmo a distância existente entre ensinar e aprender. Estudante, você conhecerá a amplitude deste processo no decorrer deste estudo. Alfabetização, uma reflexão sempre necessária Figura 1.1: Estudantes em processo de ensino-aprendizagem Fonte: Deposit Photos (2018) Ao pensar em alfabetização, é preciso primeiramente, lembrar o que é trabalhado nesta etapa de ensino; logo é possível chegar ao entendimento de que no processo de alfabetização é trabalhada a aquisição e produção da linguagem oral e escrita. Ao falar de linguagem é importante saber que ela é um dos principais fatores que diferem os seres humanos dos demais animais. A capacidade de comunicação, o uso social da linguagem e a produção de diferentes formas de usá-la é o que lhe propiciou grandes descobertas e sua própria evolução. Agora você pode estar se perguntando, qual a relação entre a evolução da espécie humana a alfabetização e sua reflexão? O fato é que o homem foi capaz de produzir ao longo do tempo a linguagem como forma de perpetuação de sua espécie, história, descobertas e até mesmo sobrevivência. Como toda produção humana, a linguagem foi desenvolvida a partir de necessidades pré-existentes; assim como a descoberta do fogo é um marco importante na história da humanidade, a necessidade de comunicação entre os indivíduos e a criação da linguagem seja ela oral, escrita ou mesmo desenhada nas paredes das cavernas marca o primeiro passo dado para algo que exige uma reflexão permanente dos processos de ensino e aprendizagem da linguagem. Proponho a você uma reflexão rápida comparando os itens que temos atualmente, com o que tínhamos antigamente. Quantas utilidades evoluíram com o passar dos anos? Evoluíram com a capacidade de criação humana diante de suas necessidades. Diante desta perspectiva, o que temos para dizer a respeito da educação, do processo de aquisição e uso da linguagem? O indivíduo que temos hoje no processo de alfabetização tem as mesmas condições e necessidades daqueles de uma década ou século atrás? Atualmente temos uma constante mudança e aceleração do uso da informação, do acesso a ela por meio da comunicação e da linguagem. Neste âmbito, a alfabetização precisa passar pelo processo de reflexão a todo tempo, permitindo a ela a adequação correta às diferentes formas de se ensinar e aprender. Reflita, por exemplo, comparando os antigos aparelhos de telefone, os quais a única função e de extrema importância e descoberta para a época era a de ligar e conversar a distância com a pessoa no outro lado da “linha”, aos atuais e requisitados celulares com acesso a inúmeros aplicativos que cada vez mais são atualizados, conforme a evolução da tecnologia. O que define a alfabetização Figura 1.2: Estudante em processo de assimilação de observações Fonte: Deposit Photos (2018) É verdade que a criança desde a sua formação faz observações do mundo ao seu redor, isso ocorre a partir da compreensão da linguagem como forma de comunicação. Nos primeiros dias de vida, ao identificar uma voz já conhecida, ela é capaz de acalmar-se e sentir-se mais segura. Com o passar dos meses, faz observação da linguagem oral transmitida entre as pessoas, sendo capaz de tentar, por imitação, o balbuciar de alguns sons e ver que, desta forma, consegue ser ouvida, atendida ou até mesmo interpretada. Com o exemplo da linguagem como interação e interpretação, mesmo de um ser ainda tão imaturo, é possível compreender a importância desta na colocação do indivíduo dentro de uma sociedade. Não falo da linguagem formal, adquirida na escola, na leitura de artigos e textos informativos, mas sim da própria linguagem materna, ou seja, aquela que é adquirida dentro do convívio social da criança em questão. A criança aprenderá a linguagem conforme sua família ou comunidade. Diante da linguagem materna, esta que é natural da criança, surge os primeiros contrapostos e discussões a respeito da alfabetização. Qual a melhor forma de ensinar e qual o melhor método diante de tantos? Você saberia apontar qual método trabalharia em uma turma de alfabetização? Será que existe uma única forma de ensinar totalmente eficaz na alfabetização ou mesmo uma receita pronta para aplicar? Soares (2013) aponta o conceito de alfabetização como o processo de aquisição do código escrito. Segundo ela, não se constatou nenhum método pedagógico coerente que juntasse a decodificação do código escrito, ou seja, decifrar o alfabeto, conhecendo e diferenciando letras e números, da capacidade de compreender o que se lê e escreve. Desta forma, o conceito de alfabetização se dá pelo ato mecânico de aprender gradualmente as letras do alfabeto, separar as vogais, juntar sons e formar palavras. Depois de dominar o código alfabético, conseguir transformar o que se fala ou se ouve em linguagem escrita e também transformar o que se escreve em linguagem oral. Prática de Alfabetização no Brasil Ao adentrar um pouco sobre como se desenvolveram os processos de ensinar e alfabetizar no Brasil, é possível observar as várias interfaces as quais a educação brasileira passou neste período, até as práticas e teorias que conhecemos e utilizamos atualmente. Até mesmo você estudante, já tendo ou não um pouco da prática pedagógica, pode defender ou criticar alguma forma de ensino, pode se familiarizar com alguma em especial. As primeiras práticas de ensino brasileiras se baseavam na decodificação e memorização como ferramentas de ensino. É importante ressaltar as antigas e famosas cartilhas tão utilizadas por professores da época, como as conhecidas “Caminho Suave”, “Cartilha Sodré”, “Método da Abelhinha”, dentre outras. Por mais que muitos se refiram a elas com críticas, é válido verificar a sua participação na história das práticas de alfabetização. Clique aqui para ver a cartilha de alfabetização “Caminho Suave”, que ainda é impressa e distribuída atualmente. Se você analisar uma dessas cartilhas e métodos de ensino com base na memorização, verá que tal prática não favorece a participação do aluno no processo de ensino-aprendizagem. Temos dentro dela a visão do aluno como verdadeira “tabula rasa”, ou seja, um papel em branco, em que era permitido somente transferir a ele informações já previstas dentro de determinado currículo e plano de estudo, sem que houvesse a valorização dos próprios conhecimentos do aluno. Independentemente da faixa etária e do nível de ensino em que o aluno esteja, ele tem conhecimentos adquiridos no decorrer de sua vida, sejam eles por meio de observações ou vivências, os quais interferem em sua aprendizagem e devem ser valorizados dentro da prática pedagógica. A prática, a qual não favorece a participação do aluno nas aulas, não permitindo que ele questione e pontue conhecimentos que agreguem o aprendizado, gera desmotivação do aluno com o decorrer do tempo. Esse aluno, que antes esperava ansioso a capacidade de decodificar aquele código alfabético, passar a ler, mas poderia esperar pelo que depois de aprender a decodificar? Conteúdos descontextualizados de suas vivências, os quais não instigavam a procurar saber mais ou mesmo, não agregavam valor dentro do seu próprio cotidiano. Na década de 80, após muitos anos sem conseguir concluir um método que funcionasse de forma efetiva com todos os alunos, temos no Brasil, a inserção dos estudos trazidos por Emília Ferreiro e Ana Teberoski. Com http://www.smeourinhos.com.br/Gestao_Educadores/Caminho%20Suave.pdf ramificações na psicologia e muita observação nos estudos de Jean Piaget, conceituado nome dentro do campo da psicologia da educação. Emília Ferreiro propõe uma mudança de foco dentro dos processos de ensinar, enxergando o aluno como agente ativo de sua aprendizagem e não só receptor de informações como era tratado até então. Importante ressaltar a necessidade da reflexão a respeito da alfabetização como prática de ensino e aprendizagem. Se passamos por um tempo que pouco se observaram mudanças e progressos relacionados ao ensino, temos com o passar dos anos uma mudança de foco, o qual observa e valoriza além do ensino a forma como se aprende. Logo, é retirado do professor a única responsabilidade nesse processo, onde o educando somente recebe informações, decodifica, memoriza e pouco as utiliza para suas vivências. Desta forma, ensinar a ler e a escrever são responsabilidades que preocupam e assustam a princípio, como diz CARVALHO (2013). Não existe uma receita pronta para se ensinar, assim como também não existe uma única forma de aprender! É dentro dessa perspectiva que podemos pensar no papel do professor como alfabetizador. Mais que decodificar letras, juntando-as em sílabas e depois formando pequenas palavras desconexas entre si, como, por exemplo, “A vovó viu a uva”, presente por muitos anos nas formas de ensinar, é necessário ensinar para a vida, para a sociedade em questão, para o contexto em que está inserido cada aluno, seja este, criança, jovem ou adulto. Para isso, o professor precisa conhecer seu aluno, suas particularidades, visto que, pessoas são diferentes, com características, personalidade, facilidades, dificuldades e formas e tempos diferentes de aprender. Quando A partir dessa percepção, inicia-se um novo olhar para o aluno, que passa a ser reconhecido como estudante, capaz de interferir e produzir o próprio conhecimento. É importante observar que não fora desqualificado o papel do professor, o que na verdade passou a ser reconhecido, é que ambos, professor e estudante, exercem papel fundamental na aprendizagem. existe o conhecimento e a conscientização dessas diferenças, começa-se a tratar a educação, o professor e o aluno com mais respeito e seriedade, fazendo com que haja uma busca por novas práticas que atendam melhor às necessidades que surgem. O que precisa estar sempre ativo no pensamento de quem realiza a prática pedagógica é a capacidade de observação dos contextos e necessidades presentes nos sistemas de ensino e na sociedade. Além de respeitar os tempos de aprendizagem, o conhecimento do contexto em que alunos estão inseridos, faz parte do planejamento e atuação do professor em sala de aula, visto que, nem todas as pessoas fazem parte da mesma cultura, da mesma posição social e financeira ou mesmo faixa etária. Diante disso, é preciso que o professor tenha consciência da necessidade de planejar o que ensina, não somente visando a organização e sistematização de cada conteúdo, mas sim a reflexão do que será preparado para esta aula, para quais estudantes ela será objetivada. Ao pensar no estudante o professor exerce a capacidade de empatia, ou seja, se coloca no lugar deste individuo, pensando em quais suas dificuldades, habilidades e necessariamente, formas de instigá-lo a buscar mais sobre o assunto que será trabalhado. Empatia: capacidade de se colocar no lugar do outro. Significa a capacidade psicológica para sentir o que sentiria outra pessoa caso estivesse na mesma situação vivenciada por ela. Consiste em tentar compreender sentimentos e emoções, procurando experimentar de forma objetiva e racional o que sente outro indivíduo. Por que ser alfabetizado? Figura 1.3: O aluno como agente ativo de uma educação libertadora Fonte: Deposit Photos (2018) Por que é preciso frequentar a escola? Por que é preciso de alfabetização? As respostas para essas perguntas variam de pessoa para pessoa, num primeiro momento é possível sanar essas dúvidas logo na infância, quando, rapidamente, no pensamento de criança, lembramos de que vamos para a escola por ordem de nossas famílias, mas não seria possível aprender a decodificar o código alfabético em nossas casas, com os próprios familiares? Como você viu, a linguagem é adquirida desde o nascimento da criança. Mesmo antes de ter o contato com a escola, a criança já participa do universo letrado e ela pouco a pouco faz observações das escritas a sua volta, faz a leitura de símbolos, rótulos de produtos já conhecidos ou mesmo a familiarização com as letras de seu nome e demais familiares. No entanto, não se pode afirmar que só por esse conhecimento adquirido que ela esteja alfabetizada. A escola e o professor exercem papel fundamental na formação global do estudante, atuando como mediadores do conhecimento. É no espaço escolar que são proporcionadas as trocas de culturas, de conhecimento, de vivências e até mesmo das próprias diferenças entre um indivíduo e outro. A partir dessas trocas que se dá o enriquecimento do que é aprendido pelo estudante, em uma classe de alfabetização, por exemplo, a troca de conhecimento entre uma criança que já aprendeu um pouco mais pode ser compartilhada com as demais que ainda não têm o mesmo intelecto. É fato que as crianças aprendem umas com as outras, o ser humano aprende com o outro; diante disso, é dada a importância de proporcionar espaços que ampliem os conhecimentos e as trocas entre os alunos. Assim como podemos pensar em uma turma de intercâmbio com o objetivo de adquirir uma língua estrangeira, em que as pessoas ali envolvidas ? ? vão praticar e aprender com essas trocas de experiências, da mesma forma deve ser pensada qualquer etapa de ensino. Fonte: Deposit Photos (2018) O direito de frequentar a escola não esteve sempre presente na vida da população, como vimos anteriormente, a educação evoluiu a partir de novas necessidades presentes no mundo. O Brasil mostra um extenso passado de descaso com a educação, heranças que estão presentes em muitas características do ensino brasileiro. O direito de acesso à educação escolar foi conquistado aos poucos e por muito tempo somente para atender a fins políticos e comerciais. Caminhou juntamente com os progressos sociais, a abolição da escravatura, o direito das mulheres e a chegada da industrialização. Com isso, houve um aumento gradativo no número de alunos nas escolas, principalmente com a chegada da industrialização no país, a qual originou grande migração da população das zonas rurais para as zonas urbanas. Uma grande parcela da população que até então não havia pensado na necessidade da alfabetização em suas vidas, se viu pressionada a ter este pré-requisito para conseguir um emprego e garantir sua subsistência nos grandes centros urbanos. Por muito tempo imperou a visão de que a escola servia para o preparo de um indivíduo para o mercado de trabalho, ou seja, era necessário ensinar as pessoas a decodificar o alfabeto e seu uso na formação de palavras e, a partir disso, fazer a leitura de pequenas comandas, placas ou a realização de operações simples da matemática para o cotidiano. Para essa função existiam as antigas classes chamadas “classes de instrução” cujo objetivo era bastante notório: preparar o aluno para operar uma máquina e fazer parte da linha de produção de uma empresa. Clique aqui para assistir ao vídeo de Viviane Mosé falando sobre a escola de massa. O número de alunos para serem alfabetizados aumentou consideravelmente, ter acesso à escola passou a ser tratado como direito de todo cidadão e apesar de a palavra “direito” soar agradavelmente, é preciso refletir com que qualidade a população teve acesso à educação. Ser alfabetizado poderia significar também que além de estar apto ao mercado de trabalho, o indivíduo poderia votar e ajudar a eleger seus representantes políticos. Qual a condição de uma pessoa que aprendeu apenas a decodificar o alfabeto tem para buscar mais conhecimento e participar das decisões de seu país, isto é, qual a condição dessa pessoa que foi instruída para o mercado de trabalho e passa o seu dia operando maquinários tem de buscar mais conhecimento? https://www.youtube.com/watch?v=GLS1gAwTo0k Diante da crescente demanda de alunos no sistema de ensino e da sua ineficiência em formar além da alfabetização, milhares de pessoas são formadas pela escola sem adquirir a real condição de aplicar o que aprendeu em sala de aula, sem a aptidão para produzir e compreender pequenos textos. Compreende-se que a função da escola vai além do ensino da decodificação e uso do alfabeto, da instrução de conteúdos desconexos do contexto dos alunos, do estudo dos quocientes e equações matemáticas, é preciso fazer com que os alunos apliquem esses conhecimentos no dia a dia, na vida deles. Síntese Nesta aula, você viu o conceito de alfabetização e sua utilização nas práticas pedagógicas no decorrer dos anos no Brasil. Viu também qual é o papel da escola e a nova visão a respeito de como se ensina e como se aprende, além da importância de proporcionar ao estudante condições e estratégias de construir seu próprio conhecimento. A partir das próprias lembranças do tempo de alfabetização de cada um é possível valorizar a necessidade da constante reflexão da prática pedagógica na alfabetização, para que esta seja satisfatória e acompanhe a evolução do próprio ser humano. Atividades de Aprendizagem Reflita a respeito do seu tempo de alfabetização, tentando lembrar a forma como ela foi abordada pela instituição de ensino que você frequentou. A partir de suas lembranças das facilidades e dificuldades com a escrita, pense em cinco pontos negativos e cinco pontos positivos do modelo didático utilizado na sua alfabetização. Aula 2 – Necessidade de repensar o termo Alfabetização Fonte: Pixabay (2018) Para compor nossa aula sobre Concepções de Alfabetização e Letramento abordaremos o conceito de Letramento e sua prática, pesquisado e defendido por professores e teóricos da educação brasileira. Necessidade de um novo conceito? Figura 2.1: Magda Soares Fonte: Foto de Ronaldo Guimarães / Disponível em: <https://editoracontexto.com.br/autores/magda-soares.html>. Acesso em: 19/09/2018, às 14h34min (fins pedagógicos). Dentro do campo da educação e mais especificamente dentro da abordagem da alfabetização, temos como referência Magda Soares, principalmente por sua atuação diante das discussões a respeito das diferenças entre alfabetizar e letrar. O que de fato difere a alfabetização para Magda Soares é que existe na Língua Portuguesa duplo sentido para os verbos ler e escrever. Dizer que alguém sabe ler não caracteriza que ela adquiriu a habilidade de ler e compreender o que leu, assim como não é possível afirmar que uma pessoa sabe escrever simplesmente porque decifrou o código alfabético e faz a escrita de palavras. A habilidade de escrever se dá na capacidade de realizar diferentes produções textuais, como ao ler um texto, saber fazer a síntese de um texto, ser capaz de compreender e destacar os pontos mais importantes etc. É a partir deste duplo sentido que temos a discussão e inserção do termo letramento como definição da capacidade do indivíduo ler, escrever e ter compreensão do que fora lido dentro dos contextos e conclusões esperadas em tal ação. Leia a seguir ao poema de Kate M. Chong sobre Letramento. O que é Letramento? Letramento não é um gancho em que se pendura cada som enunciado, não é treinamento repetitivo de uma habilidade, nem um martelo quebrando blocos de gramática. Letramento é diversão é leitura à luz de vela ou lá fora, à luz do sol. São notícias sobre o presidente O tempo, os artistas da TV e mesmo Mônica e Cebolinha nos jornais de domingo. É uma receita de biscoito, uma lista de compras, recados colados na geladeira, um bilhete de amor, telegramas de parabéns e cartas de velhos amigos. É viajar para países desconhecidos, sem deixar sua cama, é rir e chorar com personagens, heróis e grandes amigos. É um atlas do mundo, sinais de trânsito, caças ao tesouro, manuais, instruções, guias, e orientações em bulas de remédios, para que você não fique perdido. Letramento é, sobretudo, um mapa do coração do homem, um mapa de quem você é, e de tudo que você pode ser. Ao ler este poema você pode ter a dimensão do que é Letramento. Em resumo, os dois últimos versos mostram o quanto ser letrado difere uma pessoa dentro de uma sociedade, o indivíduo que lê e se apropria da leitura começa a ter concepções e olhares diferentes dentro da sociedade em que vive, dentro de suas escolhas e ações. Diante da reflexão da capacidade de apropriação da linguagem falada e escrita, viu-se a necessidade de discussão do que se caracteriza como alfabetizar, assim como a necessidade da inclusão de um novo termo que defina a pessoa com desenvolvimento de leitura e escrita. Vejamos as definições que aparecem no dicionário Aurélio: Você consegue perceber a necessidade de não só alfabetizar uma pessoa, mas permitir a ela conhecimento do mundo em que vive? Estado ou condição de analfabeto a(n) + alfabet + ismo i zar: sufixo, indica: tornar, fazer com que. Ação de alfabetizar, de tornar “alfabeto”. Alfabet + iza(r) + cão Sulfixo ção: indica uma ação. Versado em letras, erudito Que não tem conhecimentos literários. Analfabetismo Alfabetismo Letrado Iletrado Muitas são as políticas públicas para diminuir o índice de analfabetismo no Brasil, como, por exemplo, campanhas como o “pacto pela idade certa”. No entanto, o que se observa, na prática, é o ensino da decodificação do alfabeto, a grafia das letras e a junção delas para a formação de pequenas palavras. O Brasil reduziu em 4,3 pontos percentuais o número de analfabetos entre os anos de 2001 a 2014, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), de 2014, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por essa amostragem, teríamos então 2,5 milhões de pessoas analfabetas a menos em relação a 2001. Esses números podem parecer positivos, contudo, é preciso entender que ter a capacidade de decodificar palavras dentro de uma frase ou texto não caracteriza esse indivíduo como letrado, com domínio da leitura e escrita, tendo compreensão do que foi lido. Segundo Carvalho (2013), a análise desses dados se torna ainda mais desfavorável quando compreendemos que quanto maior o número de pessoas alfabetas, maior o índice de pessoas não letradas. Assista ao filme “Central do Brasil” e tente relacionar as condições da personagem ao analfabetismo e acesso à educação. Surge então a necessidade de um novo termo que defina a pessoa que saiu da condição de analfabeta, mas não desenvolveu conhecimento linguístico capaz de utilizar da leitura e escrita para mudar sua condição dentro da sociedade. Exemplo: O sujeito que entra para as estatísticas como pessoa alfabetizada pode ser o mesmo que apresenta dificuldade em atividade simples de leitura simples, como a leitura de um anúncio de compra ou venda de um item de uma página de mídia social. A capacidade de compreensão do que se expressa no pensamento de quem fala ou daquele que escuta resulta no que é definido por letramento. Logo, temos definido que alfabetização se caracteriza pela ação de ensinar ou aprender a ler e escrever, enquanto que letramento é a condição daquele que além de saber ler e escrever ainda as pratica dentro da sociedade, se dedica às práticas de leitura e escrita, é capaz de ler, interpretar e produzir leituras e escritas de maneira a serem compreendidas. Com a definição de letramento não temos somente o ganho de mais uma palavra ou conceito, temos um novo olhar sobre o estudante e novas responsabilidades. É enxergar o contexto que ele está inserido; quais as suas necessidades, identificar o que já alcançou dentro da leitura e escrita e oferecer oportunidades e condições para que este continue se desenvolvendo. Diferente do termo alfabetizar, o conceito letramento apresenta questionamentos a serem observados, pois não temos como concluir que o indivíduo já completou o processo de letramento; por exemplo, existem pessoas que no decorrer de sua aprendizagem já conseguem escrever ou interpretar um bilhete ou uma pequena mensagem, mas ainda sentem dificuldade em compreender um artigo de jornal. Ler e escrever envolve um conjunto de habilidades a serem aprendidas e desenvolvidas constantemente. Segundo Soares (1998, p. 47), Qual a idade certa para a alfabetização e letramento? Diante das discussões sobre a necessidade de letrar além do alfabetizar, chegamos a mais um ponto: a partir de quando começar a trabalhar o letramento? Em 2013 foi lançado, no Brasil, o PNAID (Pacto Nacional pela Idade Certa) em resultado do que constatou o Censo de 2010: 15,2% dos alunos matriculadas no terceiro ano do Ensino Fundamental ainda não sabiam ler ou escrever. Portanto, são crianças que frequentam a escola e, apesar da idade, ainda não apresentam domínio do código escrito, ou seja, ainda não foram alfabetizadas. A proposta do Pacto Nacional pela Idade Certa era de que, em até três anos a partir do seu lançamento, 100% das crianças em idade escolar estivessem alfabetizadas ao final do terceiro ano do Ensino Fundamental, isto é, até os oito anos de idade. Veja o trecho da Resolução nº 12, de 8 de maio de 2013: É certo que a educação é um direito a todos os cidadãos, no entanto, ela precisa ser efetiva e realizada com qualidade. Quando entendido que é preciso respeitar o contexto em que cada cidadão está inserido, abre-se a oportunidade de observar um pouco mais o aluno que ingressa nos primeiros passos da leitura e escrita. Ao desenvolver a prática pedagógica em sala de aula é preciso olhar do ponto de vista do aluno. As crianças nos surpreendem com sua capacidade de assimilar e criar informações, fazer conexões com fatos vividos, falas ouvidas para tentar chegar à conclusão de algo que seja desconhecido delas. Muitas vezes, muito mais criativos que nós adultos, que já consideramos ter uma boa experiência de vida. Fonte: Unslash (2018) Assim acontece com exemplos simples do dia a dia, em que o aluno compreende que um conjunto de letras (às vezes por suposição, números também) formam alguma palavra e que aquilo que se escreve pode ser lido ou falado. Desta forma, em sua tentativa de fazer parte do mundo letrado, junta seus conhecimentos prévios com aquele desafio de ler as desconhecidas letras. Surge então o que nós, pessoas já familiarizadas com aquele mundo de letras e leituras, podemos chamar de “adivinhação”. O indivíduo aprende a ler ainda antes de ser alfabetizado. Da mesma forma que a criança aprende a ler por meio de assimilação, também é esse o processo com o adulto, ele utiliza as ferramentas de comunicação que tem para aprender; ele faz assimilações e suposições, conectando imagens familiarizadas a palavras conhecidas naquele contexto e assim, entre acertos e erros, constrói sua comunicação com o mundo. Portanto, cabe ao professor mediar e valorizar as tentativas de cada estudante nesse processo de ensino e aprendizagem, observar de que ponto de vista o estudante formulou determinada tentativa, estimulando a participação efetiva do estudante em seu aprendizado. Explorar o ponto de vista e as experiências entre os estudantes estimula e desenvolve a confiança e a autonomia em cada um, fazendo com que o ambiente escolar seja um facilitador da aprendizagem e um espaço de trocas de vivências em que não se aprende só o que o professor planejou ensinar, mas sim o que ambos construíram juntos. Você sabia que estimular a participação do estudante na construção da aula não representa mudar o que foi planejado para aquele estudo? Essa prática desenvolve a autonomia no estudante e também sua confiança no aprendizado. O professor pode traçar estratégias que busquem a participação ativa de cada estudante, não importando a faixa etária em que estejam. Vamos aos exemplos! Uma pesquisa é uma ótima estratégia. Desde recorte de figuras, para crianças, até pequenas pesquisas, para os maiores. Pequenas ações que despertem o interesse do estudante ainda antes de ele estar no ambiente escolar. Ao trazer aquele item pedido, por exemplo, o professor pode orientar que, em determinado dia, todos deverão observar o caminho de ida para a escola e trazer algo que encontrou. Os objetos trazidos poderão variar entre: pedras, folhas, grãos de areia e até mesmo um reciclável que não deveria estar jogado na rua. Com os itens trazidos, são inúmeras as formas que poderão ser utilizados, desde catalogar os itens, até mesmo uma conversa sobre a importância de separar o lixo. Falar de mudar o foco do ensinar para como se aprende não se refere a métodos melhores ou piores, diz respeito a planejar de forma que a aprendizagem faça sentido a quem está na condição de aluno. Leitura e escrita com sentido Na prática pedagógica nada é imutável e fechado, vai depender do modo de conceber o processo de aprendizagem. As mudanças necessárias para a alfabetização inicial não se resolvem com um novo método, novos teste e materiais didáticos. Na realidade, é preciso mudar essa imagem em relação à escrita e à criança. A escrita é uma representação da linguagem e a criança não é: “um par de olhos, um par de ouvidos, uma mão que pega, um instrumento para marcar e um aparelho fonador que emite sons”. (FERREIRO, 2001, p. 40). A leitura e a escrita precisam ter sentido. Se aprender a ler e escrever, ou mesmo qualquer outro conteúdo proposto no currículo escolar não fizer sentido, ele gerará um ato mecânico de decorar o conteúdo por um curto período de tempo. Um exemplo simples da escrita sem sentido é a cópia de textos, frases ou mesmo palavras desconexas. Alfabetizar visando o letramento requer desenvolver o desejo pelo que se lê e pelo que se escreve. Saber sobre o que se lê, em que gênero textual se enquadra, possibilitar ao estudante até mesmo reconhecer suas afinidades, saber que está lendo um romance fictício ou mesmo ter a capacidade de ler uma sátira ou texto com sarcasmo e saber distinguir o contexto da realidade. Na língua portuguesa existe também o que é chamado de polissemia, quando uma palavra pode ter dois ou mais sentidos. Imagine como fica confuso para alguém que não tem total compreensão do que se lê, quando a palavra luva, por exemplo, aparece com significado diferente dependendo do contexto em que está inserida. Outra reflexão que podemos fazer aqui é o estudante ler um livro ou artigo de jornal e não saber diferenciar partes semânticas do texto pode acarretar na compreensão errada ou até mesmo em o aluno não entender o que leu. Enfim, promover o letramento significa mais do que ensinar a escrever bem e falar bem, é possibilitar ao estudante conquistar seu espaço dentro da sociedade, promover a liberdade de pensamento para que ele tenha autonomia de buscar conhecimento. 1. Leia o livro “O menino que aprendeu a ver”, de Ruth Rocha. Ele aborda a história de um menino que inicia a fase de alfabetização na escola vai descobrindo novas letras, começando a enxerga-las dentro das palavras e dentro do seu mundo. Aos poucos, aquela variedade de figuras e desenhos que antes o menino via nas placas, na televisão e materiais impressos, passam a ter significado, deixando de ser desenhos para ser símbolos com nomes. 2. Sugiro que você assista ao filme “Aprender a aprender” e reflita como é o processo de aprendizado do aluno por meio da observação e interação com o contexto em que ele vive. Analise como ele pode ir mais além se forem dadas boas condições para o seu desenvolvimento. Síntese Nesta aula, foram trabalhadas as definições dos termos alfabetização e letramento. Você viu a respeito da alfabetização como decodificação e a necessidade de se ofertar aos alunos possibilidades de liberdade a partir da leitura, e a escrita a partir do conceito de letramento. Você viu também a importância de o professor desenvolver estímulos no estudante a fim de contribuir cada vez mais no processo de ensino- aprendizagem. Atividades de Aprendizagem A partir da década de 90, a forma de alfabetizar utilizando as cartilhas tradicionais de alfabetização foi amplamente discutida e criticada pelo fato de ela não promover letramento, ou seja, não permitir que o aluno desenvolvesse autonomia e a construção de seu próprio conhecimento. A partir do estudo desta aula e de suas vivências, reflita a respeito de como a prática do letramento desenvolve no educando o sentimento de pertencimento à sociedade. Aula 3 – Considerações históricas sobre a alfabetização no Brasil Fonte: Pixabay (2018) Bem-vindo a nossa terceira aula. Avançaremos um pouco mais no estudo da história da alfabetização no Brasil, afinal, são mais de 500 anos de educação brasileira que perpassa no mesmo contexto da formação de toda uma sociedade. Ouve-se muito falar sobre alfabetização, métodos melhores ou piores, retrocessos e progressos, mas de onde vieram todas essas falas?; qual seria a importância desses dados históricos, dos erros e acertos? Responder a essas perguntas será o objetivo desta aula. Bom estudo! Contextualizando Ao estudar alfabetização e letramento, entendemos o significado do termo alfabetização, definido como aprendizado do código escrito. O ato de ler vem a partir da escrita, desta forma, ler se descreve como a capacidade de reconhecer a grafia do código escrito e representá-lo a partir da fala. A escrita surge da necessidade de comunicação entre os seres humanos, ou seja, da necessidade de socialização do código escrito, de transmitir o conhecimento para o outro. Temos como marco de seu início os traços desenhados em pedras e cavernas no tempo da Pré-História, quando o homem contava sua história, suas conquistas e descobertas usando desenhos e símbolos pintados de forma rupestre. No entanto este registro ainda não foi considerado como tipo de escrita, devido não conter uma organização ou mesmo padronização. \ O primeiro tipo de escrita a ser considerado foi chamado de escrita cuneiforme. Ela foi elaborada aproximadamente há 4.000 a.C. pelos sumérios para registrar o cotidiano e os acontecimentos políticos e financeiros em placas feitas de argila. A curiosidade desse tipo de escrita é que ela era feita com objetos pontiagudos em formato de cunha, dando origem a pronúncia de seu nome, além disso, seu registro era feito sempre na ordem da direita para a esquerda. Figura 3.1: Escrita Cuneiforme Fonte: © Wikimedia Commons (2018) Ao registrar seu cotidiano, descobertas e acontecimentos, o homem contribuiu para o desenvolvimento da civilização. Para que você compreenda melhor, um exemplo clássico é a descoberta do fogo; a observação e as técnicas desenvolvidas em seu manuseio permitiram que o homem tivesse controle sobre os animais, sobre o calor em dias frios, sobre a capacidade de se guiar mesmo durante a noite, bem como no preparo de alimentos. Os primeiros registros de escritas foram fáceis de ser interpretado pelos pesquisadores. Depois, por causa da evolução da escrita que eram em forma gráficas e depois passou a outros símbolos, as interpretações foram mais difíceis. A escrita foi usada para representar a contagem dos anos, uma estação para colheita, fatos ambientais, história de famílias, entre outras. Clique aqui para assistir ao documentário que retrata a história da escrita. A capacidade de saber ler o que cada símbolo representava e ser capaz de reproduzi-lo, torna-se o primeiro significado do termo alfabetização. Temos então um conjunto de símbolos que formam um código composto de regras e formas de utilização. A aprendizagem por transmissão de conhecimentos e o treino da grafia dos variados símbolos e seus significados passaram de geração em geração. Com o desenvolvimento das civilizações e o cultivo da terra e animais temos mais um dado importante no que diz respeito à história da alfabetização. O crescimento do comércio fez com que o homem procurasse cada vez mais formas de controle de suas posses. Se em determinado momento da história das civilizações temos como principal prática de comércio o escambo, em uma sociedade com mais desenvolvimento são necessários outros símbolos que produzam significado no registro e contagem de bens. A partir do código https://www.youtube.com/watch?v=TVxmJoi-DDg escrito se desenvolveram outros códigos e regras até que chegamos ao que temos hoje. Escambo é a prática ancestral de se realizar uma troca comercial sem o envolvimento de moeda ou objeto que se passe por esta, sem equivalência de valor. Aprender o código alfabético a princípio não era uma ação escolar, era uma prática realizada em família, repassada por aqueles que tinham o domínio sobre a leitura e a escrita. Baseava-se em regras simples, tais como: Com uma análise rápida sobre o desenvolvimento da escrita até os padrões conhecidos atualmente é possível entender sua importância para a sociedade por meio da capacidade do homem em observar, enxergar necessidades, interagir e criar estratégias para solucionar problemas. Memorizar a grafia dos símbolos, aprender como se configurava a forma da letra ou número. Depois saber reproduzir no mesmo formato. Memorizar o nome de cada símbolo relacionando com o som produzido por ele. Juntar cada um, com objetivo de formar palavras ou histórias. 1 2 3 Escrita além da contagem de números e registro da história A capacidade de produzir história e a partir dela conhecimento abriu um leque cada vez maior no desenvolvimento da sociedade, as pessoas começaram a enxergar além da simples interpretação do código escrito. Existem mais possibilidades a partir da leitura e da escrita, é possível viajarmos para outros países sem sair de casa, abrir janelas mesmo em dias mau tempo, contar histórias. A partir da criação da máquina de imprensa, em 1430, por Johann Gutenberg, houve uma grande difusão de modelos escritos, pois o artefato possibilitava a reprodução de textos inteiros sem que houvesse a necessidade de copiar palavra por palavra a mão. A Bíblia sagrada foi o primeiro livro a ser reproduzido inteiramente, sendo vendida no idioma alemão. Ao falar de imprensa, provavelmente pensamos em canais de comunicação: sejam eles de televisão, rádio ou jornal. No entanto, o nome imprensa foi dado originalmente à máquina de impressão tipográfica. Figura 3.2: Imprensa de Gutenberg Fonte: © Wikimedia Commons (2018) Os livros, antes escritos à mão, eram expressivamente caros e ficavam sob a posse da elite da época. Com a invenção da imprensa, a produção e o acesso a textos, livros e folhetos se tornaram cada vez mais efetivos, com isso, a necessidade de o número maior de pessoas com a capacidade de ler e escrever. Diante dessa necessidade, foi usado em maior escala o método de ensinar o código escrito, já conhecido e passado de geração em geração. Assim, o conjunto de regras para aprender o alfabeto formando palavras e sons ganha aliados, como, por exemplo, cartilhas com exercícios de aprendizagem. Alfabetização contextualizada no Brasil Ao estudar a história da Alfabetização no Brasil, a primeira impressão que você pode ter é uma instabilidade no campo educacional, devido à quantidade de críticas aos sistemas e métodos usados ou mesmo uma incerteza de tudo o que foi desenvolvido até então. Olhar para a história permite avaliar vantagens e desvantagens de cada didática ou método desenvolvido e usado, indicar suas influências nas práticas pedagógicas atuais e extrair o melhor de cada um para desenvolver práticas que acompanhem as necessidades educacionais. Muitos autores destacam o descaso com a educação brasileira. Com a chegada dos portugueses ao Brasil, em 1500, houve grandes mudanças, o país que até então era habitado apenas por povos indígenas, os quais tinham sua própria linguagem e cultura, passa a receber os portugueses já com conhecimento, tecnologias da época e a religião cristã. Em 1549, temos a chegada dos Jesuítas da “Companhia de Jesus” e o primeiro indício do sistema de alfabetização, ainda com objetivo de catequização e aculturação do povo, ensinando a eles as primeiras letras e cultura europeia, vestimentas e socialização. Companhia de Jesus, A Companhia de Jesus é uma ordem religiosa fundada em 1534, por um grupo de estudantes da Universidade de Paris, liderados pelo conhecido Inácio de Loyola. A Congregação foi reconhecida conhecida principalmente por seu trabalho missionário e educacional. Aculturação, processo de modificação cultural de indivíduo, grupo ou povo que se adapta a outra cultura ou dela retira traços significativos. A aculturação leva muitas vezes à desintegração de uma ou de várias culturas, sob a influência dos contatos que se estabelecem entre os seus integrantes. Por cerca de 200 anos a alfabetização jesuítica foi voltada ao público masculino, índios, seus filhos e filhos de colonos, ao mesmo tempo em que tinha o objetivo de alfabetizar para converter os índios à religião católica. As mulheres não tinham acesso às classes de instrução e eram educadas somente para a vida doméstica e religiosa. Os jesuítas desenvolveram um sistema de ensino elaborado com regras e o expandiram em várias casas de acolhimento, conhecidas por “escolas de ler e escrever”. No decorrer de todo o século XIX e nas primeiras décadas do século XX, o termo mais comum para designar o ensino das primeiras letras, como também todo o processo de escolarização, era instrução. Os jesuítas seguiam um documento curricular, o Ratio Studiorium, o qual constava o ensino da gramática média, da gramática superior, das humanidades, da retórica, da filosofia e da teologia. Figura 3.3: O Ratio atque Institutio Studiorum Societatis Iesu (Plano e Organização de Estudos da Companhia de Jesus), normalmente abreviada como Ratio Studiorum Fonte: © Wikimedia Commons (2018) O ensino ficava dividido entre as “escolas de ler e escrever”, onde eram ministradas as primeiras instruções, ou seja, as primeiras letras e noções de boas maneiras. Posteriormente, para aqueles que tinham condições financeiras, existiam os colégios, instituições de ensino também jesuítas em formato de seminário, onde era ensinado: Moral, Filosofia e Línguas Clássicas. Depois, podia-se estudar Teologia, Direito ou Medicina na Universidade de Coimbra, dirigida pelos jesuítas. A partir do ensino das letras, começava a se formar no país a hierarquização da sociedade brasileira, pois tinha acesso e continuidade ao ensino das letras somente aqueles que tinham posses, sendo assim, de forma planejada pelo governo, poderiam ter mais chances de prosperar aqueles que podiam pagar pelo acesso à educação. Em 1759, houve o término da educação jesuíta no Brasil, por ordem do Ministro de Portugal, Marquês de Pombal, os padres da Companhia de Jesus tiveram suas “escolas de ler e escrever” destruídas, bem como todo material de ensino que haviam produzido. A partir disso haveria a remodelação do ensino no país, colocando disciplinas mais práticas e apresentando um modelo de escola pública. Em 1808, com a chegada da família portuguesa ao Brasil, temos um marco importante que coloca a educação como lei no país, apesar disso, poucos foram os investimentos para que ela de fato ocorresse. Priorizou-se principalmente a formação da elite brasileira com colégios de ensino superior e até mesmo a formação fora do país, ao contrário disso, a maior parte da população ficou perdida e o cenário educacional desorganizado, em que até mesmo os professores passaram a ser responsáveis pela complementação de sua formação, segundo os novos requisitos exigidos. Em 1827, após a Independência do Brasil, entra em vigor a primeira lei brasileira que tratava exclusivamente da educação, decretava que haveria escolas em todas as cidades mais populosas para o serem ensinadas as primeiras letras de forma pública e gratuita. No entanto, o resultado com a expulsão dos jesuítas foram anos de desorganização do sistema de ensino e maior segregação da população mais pobre e indígena, que ficaram praticamente de fora dos planos de alfabetização. Além da falta de investimentos na construção de novos prédios para abrigar as escolas, que passaram a ser na casa dos próprios professores contratados para ministrar as disciplinas. Art. 1.º – Em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos, haverá escolas de primeiras letras que forem necessárias. BRASIL. Lei de 15 de outubro de 1827. In: LIMA, N. dos S. Um século de ensino primário. Natal: Typografia d’A República, 1927. Outro fato importante para ser destacado pela inserção desta lei é o primeiro passo para o acesso das meninas às escolas, não para o aprendizado das letras a princípio, mas para as práticas domésticas. A criação de leis que garantissem o acesso às primeiras instruções é considerada como avanço para o momento histórico do país, no entanto, o contexto político e econômico que vinha de Portugal e mesmo depois da Independência não foi favorável a avanços ou mesmo preocupação com a educação brasileira. Por anos, o cenário continuou quase o mesmo, resumido novamente à falta de investimento em estrutura e material pedagógico, falta da elaboração de um currículo que atendesse as necessidades educacionais e favorecimentos para classes nobres. Em 1889, temos a Proclamação da República do Brasil, instaurada logo após a abolição da escravatura de 1988. A partir de então a escola assume importante papel como instrumento de modernização e progresso da nação. Nesse contexto, surgem as novas tecnologias trazidas pela Revolução Industrial que ocasionam uma grande movimentação nas formas de trabalho e na vida da sociedade. Escola para todos Depois de séculos de descaso com a educação, promover uma mudança que atingisse a grande maioria da população tornava-se algo cada vez mais difícil, contudo, em pouco tempo a demanda nas escolas mais que multiplicou. Faltavam ainda escolas, professores, material e, inclusive, uma forma de alfabetização eficaz. Art. 11.º – Haverá escolas de meninas nas cidades e vilas mais populosas, em que os Presidentes em Conselho, julgarem necessário este estabelecimento. BRASIL. Lei de 15 de outubro de 1827. In: LIMA, N. dos S. Um século de ensino primário. Natal: Typografia d’A República, 1927. Até então a alfabetização era destinada a uma pequena parte da população, além disso, era feita por cartilhas e memorização de conteúdos. Esse mesmo método, como você já viu na aula anterior, era ineficaz quanto à construção da aprendizagem do aluno. As chamadas cartilhas de alfabetização tiveram seu papel na alfabetização ou pelo menos na apresentação do código escrito, no entanto eram estáticas quanto às novas necessidades da sociedade. Em um contexto de Revolução Industrial, tinha-se também uma revolução no mercado de trabalho, mas sem trabalhadores capazes de suprir a demanda. A maioria dos campos de trabalho advinha das grandes fazendas, com destaque para a grande produção de café no país. Figura 3.4: O motor a vapor foi essencial para aumentar a produção das máquinas Fonte: © Wikimedia Commons (2018) Assim chegamos ao século XXI, com cerca de vinte milhões de analfabetos, aos quais se somam outros tantos cidadãos com apenas rudimentos de leitura e escrita. No entanto, espera-se que os trabalhadores urbanos das funções mais modestas tenham no mínimo condições de ler e entender avisos, ordens, instruções. Para as funções qualificadas, exigem-se pessoas capazes de usar a leitura e a escrita para obter e transmitir informações para comunicar-se, para registrar fatos. Daí a responsabilidade da escola, especialmente da escola pública, de oferecer oportunidades de alfabetização e letramento a todos. (CARVALHO, 2011) Para os requisitos dos novos campos de trabalho, não bastava apenas ter força braçal, era exigido que o trabalhador apresentasse um mínimo de entendimento e compreensão de comandas, isto é, leitura e escrita básicas. O cidadão que até então não percebia a importância de saber ler e escrever, por não ter tido contato com a linguagem escrita, se vê diante da nova necessidade intelectual. Logo, se inflam as salas de aula com jovens e adultos que nunca tiveram contato com as letras. Em primeira instância, você pode pensar que, enfim, fora dada importância ao cidadão e seu acesso à leitura e à escrita, infelizmente o que poderia ser um bom dado estatístico para o país torna- se um grande problema e pauta de muitas discussões a respeito das formas de ensinar. O incentivo à educação e ao trabalho voltado às pesquisas nesta área foram escassos no decorrer da história da educação até então, e, assim, as escolas da época esbarraram em um problema sem saber a forma de solucioná- lo. O trabalhador braçal que veio em grande parte do campo tentava uma colocação no mercado de trabalho, e mais do que isso, condições de se instalar na cidade. A realidade do trabalhador era ir à classe de alfabetização depois de longas e exaustivas horas de trabalho. Ao chegar à escola, tinham contato com as cartilhas descontextualizadas de sua realidade, com ensinamentos didáticos baseados no “Ba Be Bi Bo Bu”. Parte dos alunos compreendia o código escrito e, logo, começaram a utilizá-lo em seu cotidiano, incluindo a compreensão de comandos no local de trabalho. Contudo, era grande a parcela dos alunos que deixavam a escola sem conseguir compreender a leitura escrita. Sem valorizar a educação, sem pesquisas e novas didáticas, o centro do problema existente passou a ser a forma como o professor ensinava. Deu-se início a várias discussões avaliando os métodos utilizados na época. Síntese Nesta aula, você pôde saber um pouco mais do cenário histórico que se constituiu a alfabetização no mundo, valorizada a partir da escrita primitiva até a constituição do código escrito e sua socialização. Vimos a história da alfabetização, assim como as formas de ensinar desenvolvidas no Brasil até meados da década de 90. Você viu que muito do atraso tido na educação atual é herança de um extenso período de abandono e descaso com a situação educacional, pouco investimento em ensino público, assim como, por muitos anos, não quererem a ascensão das classes mais desfavorecidas. Atividades de Aprendizagem Você viu, nesta aula, alguns dos descasos com a educação brasileira De acordo com o que aprendeu, o que precisaria ser feito para que tivesse educação com qualidade para todos os cidadãos? Aula 4 – Métodos de alfabetização utilizados no Brasil Fonte: Deposito Photos (2018) Nesta aula, você vai ver quais são os métodos de alfabetização utilizados no Brasil desde o período colonial até as formas sugeridas e usadas atualmente. Estudaremos a importância e o reflexo desses métodos na educação atual, de acordo com os estudos de importantes nomes da educação. Métodos de alfabetização Vamos iniciar a aula refletindo: o que são métodos de ensino e o quão distante eles são de nossa vivência? Método, normalmente nos remete a algo organizado, que possa ser padronizado e seguido. Na ação de alfabetizar, é muito comum utilizar sequências de ações caracterizadas no método tradicional, recorrendo à memorização e treinos até que se alcance o objetivo de identificar as letras, depois saber reproduzi-las e, por fim, juntá-las formando palavras. Essa forma de ensinar foi permanente por séculos no Brasil, utilizada desde o modelo jesuíta, tendo continuidade nas cartilhas e ainda presente, em partes, no ensino atual. Conhecendo um pouco mais de como se configura cada método, você poderá elaborar suas críticas e visão sobre a forma de alfabetizar. Método Sintético O método sintético parte de um grau de dificuldade considerado menor para o entendimento de quem está iniciando o aprendizado da leitura e da escrita, por isso pode, a princípio, ser colocado como um dos mais rápidos, simples e antigos métodos de alfabetização. Sintético: criado de maneira resumida. Tende a ser artificial. Neste método, parte-se do ensino das estruturas menores de uma palavra para, então, progressivamente, elevar os níveis de dificuldade até chegar à leitura e à escrita. Dentro do sistema de progressão, o estudo é iniciado pelo reconhecimento das vogais; depois, consoantes; junção para a formação de sílabas; e a formação de palavras. Existe a fixação do som e da grafia de cada letra; depois, de cada sílaba, até que sejam compostos o alfabeto e as “famílias silábicas” em seus vários formatos, conhecidos por: Tendo o domínio dos sons pertinentes a cada letra, independentemente do formato a qual ela esteja, o aluno pode começar a juntá-las para a formação de sílabas e pequenas palavras. Apresar da decodificação das letras e da capacidade de formação de palavras, a produção e a leitura de textos ainda ficam em grau mais elevado e de maior complexidade dentro deste formato de ensino. Ao aprender pela decodificação de pequenas partes, o aluno se condiciona a ter sempre a mesma linha de pensamento em que B mais A resultará sempre em BA, limitando a criação ou mesmo a leitura de outras palavras com maior complexidade, como, por exemplo, na palavra “BRAsileiro”, até que o professor explique essa nova etapa. A leitura iniciada pelo método sintético é normalmente mais pausada, não pelas vírgulas ou pontos, mas pelo processo de assimilar o som fragmentado por silabas. Letra Bastão / Caixa-alta Script Cursiva Minúscula Cursiva Maiúscula Na contramão das críticas ao método sintético, temos um aluno com bom reconhecimento da grafia e ortografia, devido às repetições e treinos até atingir a capacidade oral e escrita. Fazem parte do método sintético: Alfabético: o mais antigo e conhecido método de alfabetização no Brasil, muito popular pelo uso das cartilhas de alfabetização. Seu estudo é iniciado pelo conhecimento das letras do alfabeto e suas junções silábicas, seguindo a ordem alfabética. Clique aqui para ver primeira cartilha a abordar o método alfabético. É conhecido também por método da soletração, por compor partes pequenas de uma palavra, fazendo a leitura soletrada e depois silabada até que se tenha domínio total da leitura. Fônico: bastante presente nos sistemas educacionais da Europa e também no ensino americano, o método fônico diferencia-se pela relação direta entre fonemas e grafemas, ou seja, entre o som da fala e a escrita, existindo o entendimento de que o que é falado também é escrito. Neste sistema, são apresentados antes os sons das vogais em suas diferentes pronúncias; depois, as consoantes, tratadas aqui como letras auxiliares das vogais. Se aliado com mais formas de alfabetização, o método fônico tem uma participação efetiva no entendimento da composição das palavras, trabalha o percurso do som emitido por cada letra na boca, mostrando o movimento de lábios e língua, como demonstrado na imagem a seguir. http://educacaodialogica.blogspot.com/2016/12/metodos-de-alfabetizacao-metodo-global.html Figura 4.1: Ilustração representando a posição da língua ao emitir vogais Fonte: © Wikimedia Commons (2018) Silábico: pode ser considerado o método mais utilizado nas escolas brasileiras, defendido por ser de fácil compreensão, pois inicia o trabalho pelas partes menores da palavra. A princípio, o método era utilizado nas cartilhas de alfabetização; depois da apresentação das vogais, eram formadas as sílabas e depois compostas palavras. Apesar do método trabalhado nas cartilhas já não ser mais tão requisitado ou famoso, a silabação ainda é bastante presente dentro do material pedagógico usado na alfabetização. Foram acrescentadas a ele novas maneiras de se trabalhar, como, por exemplo, mais ludicidade e exercícios mais elaborados, como a troca de sílabas para compor uma nova palavra. No entanto, ainda se configura como a divisão das palavras em sílabas e sua composição a partir delas. Método Analítico Ao contrário do Método Sintético de alfabetização, a forma analítica trabalha com o conceito de começar pelo todo para, só depois, passar ao conhecimento das palavras pela divisão das partes, sílabas e letras. Segue pela linha de pensamento de Nicolas Adam, que, utilizando de uma metáfora simples, explica que ao apresentar um casaco para uma criança, apresenta-o somente como casaco e não pelas suas partes, apresentando separadamente as mangas, golas, botões, bolsos ou corpo. Assim também deve ser a apresentação da escrita a partir da fala, mostrando o texto como um todo e depois partir para as partes menores. Se partir do ponto de vista que a criança desenvolve sua primeira linguagem pela observação das pessoas a sua volta, fazendo assimilações e balbucios de repetições de falas prontas, formando aos poucos seu vocabulário, temos os estudos voltados ao tema e defesa da Teoria do Sincretismo Infantil, de Henri Wallon, por volta de 1920. Segundo ele, a criança pensa influenciada por dois fatores, pela capacidade cognitiva e pelas referências e informações que recebe do meio. A não capacidade de distinguir todas as informações recebidas do meio, unindo-as para compor uma resposta lógica ou conhecimento, gera na criança a necessidade de fazer suposições, muitas vezes resultando nas consideradas “pérolas”, por nós adultos. Essa elaboração de pensamento para criar respostas para um mundo ainda não totalmente assimilado é o que pode ser chamado de sincretismo infantil. O Método Analítico se compõe em: Palavração: se constitui em associar a grafia da palavra a uma imagem de figura. Após fazer a relação entre ambas, a proposta é elaborar pequenas frases e textos utilizando palavras já trabalhadas. O trabalho pode ser desenvolvido também sem a associação de figuras às palavras trabalhadas, fazendo uso de listas de palavras já conhecidas pelos alunos. Nesse caso, a partir das listas, são utilizadas as palavras na formação dos textos. A decomposição de cada palavra não tem caráter obrigatório no método de palavração, podem ser escolhidas algumas palavras com objetivo de mostrar o processo de divisão por partes e sílabas e a partir das sílabas conhecidas originar a criação de novas palavras. Assim como os demais métodos quando aplicados sozinhos, o uso somente do processo de palavração pode resultar na elaboração de frases e textos desconexos, com pouco conteúdo ou mesmo sem contexto. A leitura, assim como pela forma silábica, pode se tornar cansativa e não motivadora, no entanto, existe maior interação do aluno com o que está sendo ensinado, podendo utilizar palavras conhecidas de imediato sem ter que passar por todo o processo de decodificação do alfabeto. Sentenciação: o aprendizado é feito com sentenças prontas, frases feitas, e, a partir do conhecimento da ordem da frase, o reconhecimento das palavras que a compõem; pode-se destacar palavras principais para memorização mais prática. Depois de reconhecidas as palavras que compõem a frase, são aprimorados os conhecimentos a respeito da palavra em destaque, decomposição em silabas, formação de novas palavras e frases. Um exemplo de trabalho de sentenciação é a configuração de pequenos poemas e parlendas, trabalhadas com rimas, assimilando cada palavra por vez: “O rato roeu a roupa do rei de Roma”. As palavras podem ser substituídas por outras, pode ser incentivada a organização das frases da parlenda atentando-se para o primeiro significado explicado pelo professor. O método permite a interação com o conteúdo proposto, aparece de uma forma menos estatizada, mas precisa contar também com a criatividade do professor que fará a mediação e a apresentação de novas possibilidades com outros temas constantemente. Fonte: Deposit Photos (2018) Contos ou método de histórias O método de histórias, também conhecido como método de contos, trabalha a alfabetização na visão de que a criança aprende a escrever, escrevendo, e a ler, lendo, ou seja, aprende por estar inserida em um contexto onde a leitura e a escrita são usadas e estimuladas. Presente na forma de ensinar do educador francês Freinet, o qual apresentou seu estudo como Método Natural, a criança faz observações de seu mundo e tenta efetivar sua comunicação escrita, pode originar desenhos e garatujas simbolizando as letras vistas no mundo da escrita e, progressivamente, a cópia do próprio nome, de palavras, até chegar a sua produção. Celetin Freinet, (1896 – 1966) foi um educador francês que ficou conhecido pelo trabalho diferenciado que fazia, seu público eram crianças e jovens das classes mais pobres. Muitos profissionais realizam técnicas desenvolvidas por Freinet sem saber que partiram de seus estudos, um exemplo são as “aulas passeio” criada por ele e tão presente na didática atual. Para o educador, a aprendizagem acontece por meio da vivência. A pedagogia de Freinet se fundamenta em quatro eixos: cooperação, comunicação, documentação (conhecida pelos diários feitos por seus alunos) e afetividade, este último caracteriza muito do que Freinet percorreu em sua vida como educador. O método de histórias ficou conhecido no século XX, mas não foi usado em grande escala no Brasil por ser entendido como uma forma de ensinar muito avançada para o ensino da época. Uma das dificuldades trazidas pelos professores diante deste método é a falta de suporte presente no livro didático, o que gerava certa insegurança no trabalho desenvolvido. No Brasil, a maior ênfase do trabalho do francês ocorreu em Minas Gerais, onde foram desenvolvidos materiais específicos para seu trabalho “O livro de Lili”, por exemplo, é um dos materiais utilizados na formação de alfabetizadores no período de 50 anos (1920 – 1970). Clique aqui para ver um pouco mais sobre “O livro de Lili”. O método de histórias segue a linha de apresentação de histórias prontas e de fácil assimilação e memorização dos fatos pelas crianças ou mesmo a produção de histórias coletivas com base em acontecimentos vivenciados por elas no cotidiano escolar. A produção dos textos a serem trabalhados pode partir de inúmeras fontes e contribuem com a motivação em aprender ao participar da criação das aulas. O método também passa pelas fases da sentenciação, palavração e separação em sílabas, continua sendo bastante utilizado no Brasil, na grande maioria não de forma isolada, como no caso do “Livro de Lili”, mas como composição às aulas, promovendo aulas mais participativas e com produções escritas a partir da criação de textos ou memorização e assimilação para desenvolver o próximo passo do trabalho, como é o exemplo dos “contos de acumulação”. É importante saber em que “mundo” a criança está inserida, ou seja, saber se ela tem acesso ao mundo letrado e qual a qualidade do e quantidade de material ofertado a ela. Movimento Escola Nova O Movimento da Escola Nova, conhecido também como Escola Ativa ou Escola Progressiva, teve origem na Europa, no final do século XIX, e ganhou força na metade do século XX. Defendia a renovação no campo da educação, debatendo com o método tradicional de ensino em que a criança apenas realiza a cópia e memorização de conhecimentos. Na proposta da Escola Nova, o aluno precisa ter autonomia para realizar hipóteses, segundo John Dewey (1859 – 1923), pedagogo e filósofo americano, https://lndufmg.wordpress.com/2014/08/21/o-abc-do-abc-como-as-criancas-aprendem-a-ler/ idealista do movimento e influenciador na América, a educação é uma necessidade social, para ele, a escola não deve ser uma preparação para a vida, mas a própria vida. A partir do princípio da experiência de vida como ponto de partida para aprendizagem, a capacidade de aprender é defendida pelo seu caráter biológico, devendo ser respeitada como direito de todos, possibilitando a qualquer indivíduo ser o sujeito de sua própria aprendizagem e podendo desenvolvê-la conforme capacidade e não de acordo com a classe social a que pertence. A defesa da autonomia do aluno em seu processo de aprendizagem está ligada aos novos avanços científicos da biologia e psicologia, em estudos de Jean Piaget, por exemplo, importantes nomes e teorias que mudaram a forma de pensar o aluno dentro do sistema de ensino. Escola Nova no Brasil Figura 4.2: Anísio Teixeira Fonte: © Wikimedia Commons (2018) Depois de 43 anos da Proclamação da República, o sistema de ensino brasileiro ainda não tinha uma organização que atendesse às necessidades educacionais com vista à modernização esperada para o país. Apesar dos conceitos de a Escola Nova terem sido trazidos por Rui Barbosa, em 1882, com o intuito de preparar a população para atuar no novo mercado de trabalho em constante evolução com a industrialização, o movimento ganhou forças a partir de 1932 com o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova – A reconstrução educacional no Brasil: ao povo e ao governo”. O manifesto tratava de um conjunto de princípios para reforma do sistema educacional brasileiro, composto por 26 educadores e intelectuais da época, como Anísio Teixeira, Lourenço Filho, Cecília Meireles e Fernando de Azevedo, quem redigiu o documento. É importante entender o contexto que ocasiona essa tomada pela educação. Alguns anos antes, em 1924, temos a criação da Associação Brasileira de Educação, que realizava encontros de educadores em prol da discussão de alternativas para os problemas do ensino brasileiro. Em seguida, no ano de 1930, temos importantes mudanças políticas com a posse do governo provisório de Getúlio Vargas, o qual propôs reformar o sistema educacional brasileiro. Em 1931, em um encontro da Associação Brasileira de Educação, surgiu a ideia de apresentar ao governo sugestões pertinentes à área educacional. A partir das discussões sobre as propostas que seriam apresentadas, destaca-se a elaboração do documento em formato de manifesto. Em sua composição, por exemplo, está: Princípio da escola nova de educação igual para todos e não a uma minoria privilegiada, como ocorreu por anos. Com objetivo de retirar a população do estado de marginalização social e da situação de miséria, o texto propunha o ensino obrigatório e custeado pelo governo até os dezoito anos de idade. Dentre as sugestões, também se destacavam o pedido de criação de fundos de arrecadação para a educação, a criação de universidades e a reivindicação de uma verdadeira reconstrução do ensino brasileiro, que auxiliaria na formação e construção de sociedade mais justa. As propostas feitas no Manifesto, apesar de não terem sido colocadas todas em prática, foram de grande valia para a educação brasileira na composição de sua história. Diversas mudanças ocorreram já no ano de 1934, como o direito e a obrigatoriedade da inserção de todas as crianças com idade compatível aos quatro anos iniciais do Ensino Médio; firmou-se a obrigatoriedade do recolhimento de impostos destinados à educação; houve a criação de universidades, entre outros. Como disse, nas décadas seguintes, discussões e avanços trazidos no ápice da criação do manifesto foram perdendo força gradativamente, por um lado ganhava-se o acesso da população ao sistema de ensino; por outro, ainda não se garantia a qualidade no ensino-aprendizado. Mudança de foco Em meados da década de 70, temos a importante entrada dos estudos da Psicologia na área da educação, cuja mudança é notável às pesquisas: sai o “como se ensina” para o “como se aprende”. Sendo assim, o aluno ganha destaque no processo de aprendizagem. A mudança de foco se dá a partir dos estudos de Jean Piaget e da psicolinguista Emília Ferreiro, os quais não revelam nenhum método novo de ensino, mas desvendam mecanismos de como a criança aprende. Para Piaget, a aprendizagem é um processo gradual que precisa de ser respeitado, a criança assimila novos conhecimentos e faz uma reorganização e acomodação daquilo que já conhecia com o novo aprendizado. O processo cognitivo passa por essas etapas diversas vezes e leva tempo em cada uma delas, considerando que o tempo é diferente de uma criança para outra. Diante dos saltos cognitivos necessários para o processo de aprendizagem, surge o “olhar diferenciado” ao aluno, pois até então muito se discutia do porquê de a criança não aprender. Eram culpabilizados os métodos e os professores, buscavam-se novos materiais com formas melhores de ensinar, mas não se enxergava a capacidade de o aluno aprender. Os estudos de Emília Ferreiro no Brasil ganharam prestígio entre educadores e governo, sendo aplicados até mesmo nos Parâmetros Nacionais Curriculares. Apesar de não apresentar nenhum método para trabalhar, ao contrário disso, criticava o sistema tradicional de ensino e o uso das famosas cartilhas, abre novos leques para a educação e a alfabetização. Ganhavam-se salas de aulas e conteúdos mais interativos, atividades estimulantes, alunos participativos e professores observadores e mediadores do conhecimento. O novo foco enfatiza a teoria Construtivista de ensino, confundida com método de ensino para muitos, contudo, ela não se caracteriza e também não tem como propósito o método. Para o Construtivismo, o conhecimento não é único e nem acabado, não existe uma única forma de aprender, assim como não existe um limite, um ponto final. O aprendizado tem caráter significativo, construtivo e duradouro. Síntese Nesta aula, você pôde compreender a história da alfabetização desde os primeiros rudimentos da escrita e entender a função social desse mecanismo comunicacional. Você viu também as interfaces do nosso sistema de ensino, desde o descaso, tanto com a população quanto ao interesse em desenvolver um sistema concreto e eficaz. Ao estudar a história, é possível analisar melhor o que foi construído, assim como ter parâmetros para desenvolver a alfabetização em sala de aula. Talvez em meio a tantos métodos já usados e estudados não seja possível escolher somente um para a prática pedagógica, mas já temos ciência que toda forma de ensinar deve promover a participação e o desenvolvimento do aluno. Atividades de Aprendizagem A história da alfabetização brasileira passou por vários momentos, como, por exemplo, os anos de abandono que deixaram uma herança de analfabetismo em nossa população. Depois do estudo dos diversos métodos utilizados para alfabetizar e as críticas a cada um deles, chegou a sua vez de fazer a análise crítica de um livro didático. Você deve observar: Apresentação, letra utilizada, percepção de um ou mais métodos dentro da concepção e trabalho proposto no livro. Verifique também qual foi a linguagem utilizada. Aula 5 – Elementos psicolinguísticos relacionados à alfabetização Fonte: Deposit Photos (2018) O século XX foi marcado por importantes mudanças na área educacional, por diversas influências relacionadas à modernização mundial, a educação e a forma como ela é trabalhada passou a receber novos olhares. Como vimos na aula anterior, os estudos da psicologia foram voltados à observação de como o aluno aprende. Nesta aula, veremos como os estudos de Jean Piaget e Emília Ferreiro se desenvolveram na defesa dos mecanismos de aprendizagem do aluno. Psicogênese da escrita e da leitura Para iniciar esta aula, é importante compreender o significado dos termos que abordaremos no decorrer deste estudo. Vamos às definições: Psicologia Ciência que se dedica aos processos mentais ou comportamentais do ser humano e de suas implicações em certo ambiente. Reunião dos elementos, mentais ou comportamentais, que caracterizam uma pessoa ou um grupo. A psicologia se dedica a estudar o ser humano por sua capacidade mental e seu comportamento, logo, observa as relações do indivíduo interna e externamente, assim como sua interação com a sociedade em que vive. A partir do conceito apresentado, fica fácil compreender como a psicologia passou a ser grande aliada na área educacional, trazendo compreensões ainda desconhecidas no meio pedagógico. Psicogênese Segundo o glossário da CEALE, o termo psicogênese pode ser compreendido como origem, gênese ou história da aquisição de conhecimentos e funções psicológicas de cada pessoa, processo que ocorre ao longo de todo o desenvolvimento, desde os anos iniciais da infância, e aplica-se a qualquer objeto ou campo de conhecimento. A Psicogênese será de grande valia no estudo sobre as contribuições de Emília Ferreiro
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