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Aula 3: O Nordeste e a Oligarquia Agrária 1. O que é o Planejamento? Para Oliveira (1977), planejamento é, sem sombra de dúvida, uma forma técnica da divisão do trabalho; mas não é apenas isto, nem principalmente isto. Enquanto forma técnica da divisão do trabalho, num sistema capitalista, é uma forma técnica da divisão do trabalho improdutivo que comanda o trabalho produtivo; já num sistema socialista, é ele uma forma indissociável do novo caráter da propriedade dos meios de produção. 2. Qual é o papel do capital internacional no Nordeste brasileiro? Para Oliveira (1977), no Nordeste, o grande capital internacional-associado estaria, a seu ver, desempenhando o mesmo papel daquelas ferrovias, destruindo para sempre a servidão, a ignorância e as relações sociais que as fundavam. 3. A SUDENE como marco de mudança do curso da história do Nordeste. Para Oliveira (1977), a SUDENE foi um empreendimento de uma audácia inédita na história nacional. Ela anunciava um dos dois novos: se os vencedores tivessem sido as forças populares, o Nordeste e o Brasil de hoje seriam muito diferentes; tendo sido vencedoras as forças do capitalismo monopolista, chamadas a socorrer combalidos latifundiários e barões do açúcar, essa vitória também mudou o curso da história. A SUDENE, na sua ambiguidade, anunciava as duas possibilidades. Não cabe aos que nela continuam trabalhando qualquer sentimento de culpa, de traição. 4. A SUDENE hoje (1977). Para Oliveira (1977), a SUDENE de hoje encarna apenas a vontade social do capitalismo monopolista e do Estado no Brasil; não encarna mais as aspirações populares. 1. Qual é o objetivo central de Elegia para uma Religião? Se propõe a examinar as relações do Estado brasileiro com a sociedade brasileira e nordestina, através da janela propiciada pelo estudo da emergência do planejamento regional, particularmente pelo exame das causas próximas e remotas da criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, mais conhecida pela sigla SUDENE. 2. Qual era o objetivo inicial da SUDENE? A própria SUDENE, em suas formulações iniciais, pensava muito mais num fortalecimento e expansão da burguesia regional que se somaria às demais frações burguesas nacional e internacional no processo da expansão capitalista em todo o país. 3. Qual é o conceito de região para Oliveira (1977)? Para Oliveira (1977), uma “região” seria, em suma, o espaço onde se imbricam dialeticamente uma forma especial de reprodução do capital, e por consequência uma forma especial da luta de classes, onde o econômico e o político se fusionam e assumem uma forma especial de aparecer no produto social e nos pressupostos da reposição. 4. Para Oliveira, qual é a tendência das regiões no sistema econômico capitalista? Para Oliveira (1977), em um sistema econômico de base capitalista, existe uma tendência para a completa homogeneização da reprodução do capital e de suas formas, sob a égide do processo de concentração e centralização do capital, que acabaria por fazer desaparecer as “regiões”. 5. Qual é o processo de mudança da ideia de Nordeste brasileiro? É possível constatar que o Nordeste como “região” somente é reconhecível a partir de meados do Século XIX, e sobretudo no século XX. Reconhecia-se, no período da Colônia, “regiões” dentro do que hoje é o Nordeste, com amplitudes muito mais restritas: sobretudo no que corresponde hoje aos Estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Alagoas, a “região” era reconhecível como o locus da produção açucareira, enquanto os espaços dos Estados que hoje correspondem ao Ceará e Piauí eram relativamente indiferenciados, desenvolvendo atividades econômicas de pouca expressão na economia colonial e quase nunca assimilados ao que se poderia chamar de “Nordeste”. As primeiras décadas do século XX, e quase todo o século XIX, vão configurar outro Nordeste, ou outros “Nordestes”, Essas novas configurações estão marcadas sobretudo pela emergência, consolidação e hegemonia de outras formas de produção e conflito de interesses em outros espaços; em suma, pela constituição de outra “região” no contexto da nação que se independentizava. Essa outra “região” é a do café, constituída preliminarmente pela mesma determinação exjerna, isto é, pelas suas relações com as potências imperialistas, e fundada também preliminarmente pelo mesmo modo escravista de produção, mas que se diferenciava na mesma medida em que a circularidade do processo de produção e apropriação do valor se esgotava na relação externa-interna e nos requisitos que essa relação recolocava como pressupostos do processo de produção; isto é, na subordinação aos interesses do capital financeiro inglês sobretudo, mas francês também, e no caráter distinto da competição inter-impérios: a disputa pelos mercados que começava a intensificar-se sobretudo entre o capital inglês e norte-americano. Internamente, a constituição da “região” do café desdobrava-se na mesma medida em que avançava desde o Vale do Paraíba até o Oeste paulista, homogeneizando-se internamente e diferenciando-se da outra “região” - o Nordeste açucareiro - na mesma medida em que esta era excluída dos novos circuitos de produção e apropriação do valor gerado pela mercadoria café. Essa hegemonia constantemente reiterava os pressupostos da produção, que por sua vez apareciam tanto no produto quanto na forma da repartição do excedente: o financiamento inglês, como pressuposto, e os juros do capital inglês como parte da repartição do excedente. O Nordeste “açucareiro” era deslocado pela competição inter-imperialista, que centrava sua disputa agora na apropriação e controle da produção do açúcar no Caribe. Em outras palavras, a forma de produção do valor da economia açucareira daquele “Nordeste” não encontrava formas de realização pela via do comércio internacional. Enquanto o Nordeste “açucareiro” semiburguês tinha sua expansão cortada pela simbiose dialética da constituição de outra “região” com o capital internacional, um outro Nordeste emergia gradualmente, submetido e reiterado pelas mesmas leis de determinação de sua relação com o capital internacional: o Nordeste “algodoeiro pecuário”. Sem penetrar na esfera da produção, o capital internacional apropriou-se da esfera da circulação, da comercialização, e por esse fato, a política econômica do Segundo Império e da República Velha, que centrava suas atenções na manutenção de uma taxa de câmbio que era simultaneamente condição da reprodução e forma da apropriação internacional de parte do produto social, compatibilizava os interesses da reprodução do capital na “região” do café e na “região” - no novo Nordeste - do algodão-pecuária. Não é sem razão que tanto o controle político da Nação começou a escapar das mãos da burguesia açucareira do “velho” Nordeste, quanto o controle político interno do “velho” e do “novo” Nordeste começou a passar às mãos da classe latifundiária que comandava o processo produtivo algodoeiro-pecuário, reiterado pela sua subordinação aos interesses do capital comercial e financeiro inglês e norte-americano. A imagem do Nordeste, que as crônicas dos viajantes de fins do Século XVIII e princípios do Século XIX descreveram em termos da opulência dos “barões” do açúcar, e que depois iria inspirar a nostálgica pseudosociologia de Gilberto Freyre, começou a ser substituída pela imagem do Nordeste dos latifundiários do sertão, dos “coronéis”; imagem rústica, pobre, contrastando com as dos salões e saraus do Nordeste “açucareiro”. Nesse rastro é que surge o Nordeste das secas. A fundamentação do Estado unitário que prevaleceu por todo o Segundo Império e continuou, República Velha adentro, sob a forma da coligação “café-com-leite” residia sobretudo na homogeneidade dos processos de reprodução do capital, na sua subordinação aos interesses do capital comercial e financeiro inglês e norte-americano: “coronéis” do algodão, pecuáriae “barões” do café e Estado oligárquico são os agentes e a forma da estrutura do poder. O andamento das leis de reprodução do capital e das relações de produção tomava rumos diversos na “região” do café. Rompido o mecanismo de reposição da economia agroexportadora, em parte pela própria inviabilidade de sua sustentação devido à porção do excedente do produto social, que era apropriado pelo capital financeiro inglês e norte-americano sob a forma de juros da dívida externa, o que impossibilitava a acumulação; e em parte devido à quebra da economia internacional capitalista na crise dos anos trinta, emerge a industrialização. Não se descreverá aqui esse processo; importa observar a mudança operada nas formas de reprodução do capital, que acarretou da mesma maneira mudanças nas leis de repartição do produto social, aumentando a fração do excedente que se acumulava internamente, e as mudanças nas relações de produção, com a explosiva emergência do proletariado urbano. Surge a diferenciação das formas do capital: tanto se expande e consolida o capital industrial, quanto emerge o capital financeiro, e a intervenção do Estado na economia assume outro caráter, prejudicando a forma de reprodução da economia agroexportadora. A estrutura do poder sofre importantes mutações; depois de um breve período de transição, quando as necessidades da acumulação tornaram imperiosa a convivência do capital industrial com a oligarquia do café, tem início um período em que a hegemonia do capital industrial e seu controle sobre o aparelho produtivo, as relações de produção e o próprio Estado são claramente reconhecíveis. A “região” do café passa a ser a “região” da indústria: São Paulo é o seu centro, o Rio de Janeiro seu subcentro, Minas Gerais e o Paraná seus limites e a expansão da fronteira dessa “região” começa a capturar os espaços vazios do Centro-Oeste. 6. Qual é o papel do Nordeste na redefinição da divisão regional do trabalho no conjunto do território brasileiro? Para Oliveira (1977), a conversão da “região” do café em “região” da indústria começa a redefinir a própria divisão regional do trabalho em todo o conjunto nacional. Seu papel nessa divisão regional do trabalho no que respeita à “região” Nordeste passa a ser de um lado, sistematicamente, a reserva do exército industrial de reserva: as migrações Nordeste-São Paulo chegam a constituir um formidável contingente que vai suprir os postos de trabalho criados pela industrialização, e contribuir para manter baixos os níveis de salário real de toda a massa trabalhadora; por outro lado, os diferenciais da taxa de lucros começa a drenar o capital que ainda se formava no Nordeste; e ainda sob outro aspecto, a mudança da política econômica que se centrava agora na viabilização da reprodução do capital industrial, favorecendo sistematicamente uma taxa de câmbio subestimada, ao mesmo tempo que elevava nacionalmente as taxas alfandegárias para proteção da indústria de transformação, deu lugar a um mecanismo de triangulação das trocas de mercadorias Nordeste- Exterior-Centro-Sul-Nordeste que deprimia a taxa de realização do valor das mercadorias produzidas no Nordeste, inviabilizando ainda mais a reprodução do capital na região nordestina. 7. Qual é o período e o processo de desenrolo econômico entre o Sudeste e o Nordeste que marca o nascimento do planejamento regional e da SUDENE? Para Oliveira (1977), em meados do século XX, as contradições da reprodução do capital e das relações de produção em cada uma ou, pelo menos, nas duas principais “regiões” do país, sinal de uma redefinição da divisão regional do trabalho no conjunto do território nacional, começam a aparecer como conflito entre as duas “regiões”, uma em crescimento, outra em estagnação. É nesse contexto, e tendo por objetivo explícito a atenuação ou pelo menos a contenção da intensificação das disparidades regionais, a correção dos “desequilíbrios regionais”, que nasce o planejamento regional para o Nordeste, a SUDENE. 8. Por que Oliveira (1977) fala de falso conflito inter-regional entre o Sudeste e o Nordeste na década de 1950? Porque para Oliveira (1977), a SUDENE, sua forma institucional, é uma espécie de Revolução de 30 defasada de pelo menos duas décadas; seu surgimento, segundo um diagnóstico muitas vezes equivocado - matéria para discussão em outra parte deste trabalho - incorpora elementos do falso conflito inter-regional.
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