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Aula 4: A Oligarquia Agrária e o DNOCS 1. Qual é o processo de reprodução do capital que emerge o Nordeste pecuário? O Nordeste pecuário surgiu antes do Nordeste algodoeiro, juntamente com o Nordeste açucareiro e o Nordeste cafeeiro do Centro-Sul. Baseia-se na produção de gado, como uma cultura de subsistência com exportação intranacional, relações de produção livre com salário de subsistência. A pecuária penetrou sertões adentro, em caráter extensivo, movida pelas relações que se estabeleceram entre o fornecimento de animais de trabalho tanto para as atividades da zona açucareira quanto para a região de mineração que se estabeleceu sobretudo no interior de Minas Gerais; em outro sentido, o fornecimento de carne às populações litorâneas do chamado Nordeste Oriental, e também à referida zona de mineração pode ter constituído aliciante para a fundação da economia pecuária típica dos sertões. 2. Qual é o caráter de acumulação do Nordeste pecuário? O Nordeste pecuário tinha caráter de acumulação primitiva, ou seja, sem aumento da produtividade, pois a cultura era de subsistência. 3. Qual é o processo de acumulação do capital nacional e internacional do surgimento do Nordeste algodoeiro? Como sequela da Revolução Industrial, e principalmente, do avanço da indústria têxtil na economia inglesa, a demanda mundial de algodão começa a crescer exponencialmente. O Nordeste semiárido é ecologicamente propício à produção do algodão de fibra longa, conhecido ali como algodão-mocó ou Seridó, sendo esta última denominação o próprio nome de batismo de uma vasta zona que se estende desde o Rio Grande do Norte até a zona central do Estado da Paraíba; dado o nível de desenvolvimento da tecnologia têxtil, sobretudo da fiação, o algodão de fibra longa pôde ser melhor aproveitado industrialmente, devido às suas características físicas. Várias regiões do globo passam a ser “regiões” algodoeiras: o Egito, o Peru, a Índia - de milenar tradição têxtil, destruída pelo capitalismo inglês - o Sul dos Estados Unidos e o Nordeste do Brasil. Inclusive na brecha propiciada pela eclosão da Guerra de Secessão norte-americana, a cultura do algodão no Nordeste experimentará sensível avanço, sobretudo nos Estados do Maranhão e do Ceará, no primeiro desenvolvendo-se um tipo de algodão muito semelhante ao que era produzido pelo Sul dos Estados Unidos. O Nordeste agrário não-açucareiro converte-se num vasto algodoal, desde o Maranhão à Bahia. Não é a “plantation”, porém, a estrutura de produção dessa nova mercadoria; esse vasto algodoal é na verdade constituído pela segmentação sem fim de pequenas e isoladas culturas. A rapina internacional encontra terreno propício à constituição de uma estrutura de produção em que o capitalismo internacional domina a esfera financeira de circulação. 4. Quais eram as relações de produção do Nordeste algodoeiro? A produção era entregue aos cuidados de fazendeiros, sitiantes, meeiros, posseiros. Emerge aqui a estrutura fundiária típica do latifúndio: o fundo de acumulação é dado pelas “culturas de subsistência” do morador, do meeiro, do posseiro, que viabilizam, por esse mecanismo, um baixo custo de reprodução da força-de-trabalho e, portanto, um baixo valor que é apropriado à escala de circulação internacional de mercadorias, sob a égide das potências imperialistas. 4.1 E como se diferenciam as relações de produção entre o Nordeste algodoeiro e o Nordeste açucareiro? No “Nordeste” algodoeiro, a produção era entregue aos cuidados de fazendeiros, sitiantes, meeiros, posseiros, enquanto que, no “Nordeste” açucareiro, a produção era inteiramente feita pela a força-de-trabalho escrava, os quais também se dedicavam, marginalmente, ao serviço pessoal dos “barões” do açúcar. 4.2 Em qual fase do processo produtivo se dá a apropriação do produto pelos fazendeiros? O fazendeiro apropria parte desse valor, tanto sob a forma de sobre-produto, resultado da partilha do algodão entre ele e o meeiro, quanto sob a forma de sobre-trabalho, no “cambão”, uma forma muito similar à clássica corveia da economia camponesa europeia; sob as duas formas oculta- se uma terceira, a renda da terra que raramente é explícita. O proprietário quase nunca exige um pagamento do meeiro pela utilização da terra. O fazendeiro, em sua ideologia, “dá” a terra de graça para seus moradores. 5. Qual é o papel dos fazendeiros não relações de produção, além de dá a terra? O fazendeiro era um intermediário comercial que desempenhava a tarefa de recoletar, das milhares de pequenas plantações de algodão, os resultados da colheita: os fazendeiros, principalmente os grandes, convertem-se nesse intermediário comercial, que faz as vezes também de intermediário- financeiro, por conta própria ou com recursos das fábricas “três irmãs” (Sanbra, Clayton e Machine), para financiar as entressafras, ou o período morto que medeia entre uma e outra colheita. Os fazendeiros se desempenhava com os mecanismos das “três irmãs” nessa operação: compra na “folha”, isto é, fixa de antemão o preço que irá pagar ao meeiro pelo algodão que ele colherá, independentemente das variações para cima que esse preço possa experimentar no mercado internacional; mas não independentemente das variações para baixo: se as “três irmãs” fixarem um preço mais baixo, ele descontará do meeiro a diferença entre o valor ou o preço ajustado na “folha” e o preço que será efetivamente pago por ocasião da colheita. Aduzirá a esse mecanismo, também um de invenção própria: financiará, em espécie, as poucas mercadorias que o próprio meeiro não produz: o parco sal, o querosene que alumiará a miséria, a roupa e o calçado dominical. Descontará na colheita, cobrando preços exorbitantes, esse fornecimento em espécie: no fim, restará ao meeiro tão- somente sua própria força-de-trabalho e a de sua família, com a qual recomeçará o círculo infernal de sua submissão. 6. Qual é o caráter da estrutura produtiva do Nordeste algodoeiro-pecuário em relação ao comércio internacional? Caráter de submissão aos caprichos do capital internacional comercial e financeiro, inglês e norte-americano. Ao capital internacional comercial e financeiro pouco interessa a produtividade, o incremento da produtividade do trabalho; sua rapina ocorre no mecanismo da circulação, não no da produção. A estrutura produtiva do “Nordeste” algodoeiro-pecuário subordinada à circulação internacional de mercadorias. 7. Qual foi o processo de eclosão das Ligas Camponesas? Funda-se o Brasil, na época da República Velha, uma federação oligárquica, com a “política dos governadores”, sob a égide da coligação “café-com-leite” substituindo o chamado Poder Moderador. Tal reiteração da sustentação do café e do controle da escala internacional das mercadorias café e algodão abortará a emergência do modo de produção de mercadorias no país, no sentido de fazer avançar a divisão social do trabalho no rumo da indústria. São seus agentes internos, na “região” do café, os “barões” paulistas, e na “região” do algodão-pecuária, os “coronéis”. Até mesmo no apelido que receberam, tanto por sua própria iniciativa quanto pela sabedoria popular, anotava-se a diferenciação na produção e apropriação do valor, na hierarquia da estrutura do poder. Barões sem nobreza e coronéis sem exércitos? Decididamente, não: “barões” com a nobreza que a rapina sempre conferiu e “coronéis” com exércitos de cangaceiros e jagunços que realizavam a apropriação das terras e reafirmavam, pela força, contra os camponeses recalcitrantes, o preço na “folha”, as obrigações do “cambão”, o pacto da “meia” e da “terça”, o “foro” da terra. 8. Qual é o objetivo da estratégia DNOCS? Tinha como objetivo o “combate às secas”, como a primeira manifestação do planejamento da atividade governamental para resolver os problemas da economia regional. Após um consenso entre estudiosos do Nordeste brasileiro considerar-se a intervençãodo Estado no combate às secas. 9. Do que se trata a captura do Estado pela oligarquia regional? O DNOCS era um departamento nacional, concebido para atuar no combate às secas onde quer que ela se apresentasse no território do país. O fato de nunca ter realizado nenhuma obra fora do Nordeste, é um resultado de sua captura pela oligarquia regional. 10. Por que a política do DNOCS vai de encontro à política praticada no Brasil e no mundo após a crise de 1929? À pressa e leviandade em considerar o DNOCS como a primeira manifestação do planejamento em escala regional não leva em conta alguns aspectos fundamentais para a emergência de um padrão “planejado” da reprodução econômica e social. Convém, em primeiro lugar, não desconsiderar o fato de que sequer havia, na época de criação da IFOCS e do DNOCS, uma teoria de planejamento ou, num sentido mais amplo, teorizações sobre planejamento num sistema capitalista. 11. Por que, para Oliveira (1977), o DNOCS não constituiu uma ação de planejamento? Porque, para Oliveira (1977), o planejamento em um sistema capitalista é sobretudo, conforme sugerido na introdução deste trabalho, uma forma de reposição transformada dos pressupostos da produção; isto é, uma forma transformada da mais-valia que se repõe no processo produtivo: a ação do Estado, para ser planejada, deve ocorrer essencialmente na passagem entre os resultados do produto e a reposição do ciclo produtivo. Ainda para Oliveira (1977), ainda que se aceite que os gastos do DNOCS eram investimentos do Estado, não significavam eles em absoluto transformação das formas do ciclo produtivo; não tiveram, sob nenhuma circunstância, o condão de transformar as condições da produção social do Nordeste algodoeiro-pecuário. Significaram simplesmente um reforço das condições da própria estrutura produtiva, tanto na esfera da produção quanto na esfera da circulação e da apropriação. 12. Quando e por que, de acordo com Oliveira (1977), existe uma ação transformadora do Estado sobre o Ne? Para Oliveira (1977), a ação “planejada” do Estado, no sentido aqui proposto, ocorre somente quando a luta de classes chega a um ponto de ruptura, em que não apenas a estrutura existente não tem mais condições de continuar a reproduzir-se, como se vê seriamente ameaçada pela emergência política dos agentes que lhes são contrários. Não é a estagnação que força ao planejamento, nem apenas a situação de miséria das massas camponesas e trabalhadoras do “Nordeste” algodoeiro- pecuário. Essa estagnação era, na maioria dos casos, apenas a aparência das transformações que se operavam na hierarquia do poder entre as classes dominantes: no Nordeste como um todo, essa estagnação refletia sobretudo a submissão da burguesia industrial aos interesses da oligarquia agrária algodoeira-pecuária e portanto a dinâmica dessa oligarquia, sua expansão. Quanto à miséria, essa era e é secular; o que existiu de novo em tal miséria, transformando o conflito de classes - matéria que se tratará de explicitar em outra parte deste trabalho - é sua politização: é a sua insolubilidade nos mesmos termos de reprodução da estrutura produtiva do “Nordeste” algodoeiro-pecuário. 13. Quais os elementos socioeconômicos mantêm a mesma política de combate à seca do DNOCS? A dialética da oposição “Nordeste” algodoeiro-pecuário versus “Nordeste” açucareiro, a reiteração da economia agroexportadora da “região" do café e sua coincidência, do ponto de vista de realização externa do valor, com as formas de reprodução do “Nordeste” algodoeiro-pecuário; a própria divisão regional do trabalho no território nacional, que se redefinia conforme o andamento da expansão da “região” do café; a estrutura de classes e de poder que emergiu numa e noutra “região”: “barões” do café e “coronéis” do algodão-pecuária; o estado da luta de classes no Nordeste algodoeiro-pecuário, que se caracterizava por “rebeldias primitivas” cuja base era a própria ambiguidade da inserção das várias classes, dominantes e dominadas, na estrutura produtiva. 14. Por que Oliveira (1977) considera as relações de produção das políticas do DNOCS típicas da acumulação primitiva? Porque recrutava-se a mão-de-obra desocupada pela estiagem, apenas depois que os magros recursos de pequenos sitiantes, meeiros, parceiros, haviam-se esgotado em duas ou três semeaduras, à espera das chuvas, e empregava-se na construção das barragens e das estradas; o pagamento dessa mão-de-obra dava-se, na maioria das vezes, sob a forma de espécie, isto é, fornecendo-se os alimentos - farinha, feijão e a indefectível carne-seca, esta nem sempre presente -; os resultados desse trabalho concretizavam-se nas barragens feitas nas propriedades dos grandes fazendeiros e nas estradas, às vezes estradas privadas no interior dos grandes latifúndios. 15. Quais outras formas de apropriação ilegal dos recursos do DNOCS pela oligarquia do Nordeste? Tal acumulação primitiva utilizava os recursos do Estado para a implantação de benfeitorias nas grandes propriedades, e sua forma de financiamento chegou a constituir-se em outro pilar da força e do poder político dos “coronéis”, da oligarquia algodoeira-pecuária. Chegando quase sempre atrasados os recursos fiscais que a União devia fornecer para as “emergências”, o DNOCS utilizava o crédito junto aos grandes fazendeiros e comerciantes do Nordeste semiárido, quase sempre as duas formas do capital reunidas numa só pessoa, personae dessa forma de reprodução, para adiantamentos. O dinheiro passava imediatamente, com a chegada dos recursos, às mãos desses fornecedores. 16. Qual oligarquia estadual comandou o DNOCS? A Oligarquia do Estado do Ceará.
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