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Crescimento e Desenvolvimento Aplicados à Educação Física Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Ms. Eric Leal Avigo Revisão Textual: Prof. Ms. Luciano Vieira Francisco Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência • Aspectos gerais sobre crescimento e desenvolvimento no fim da infância e início da adolescência • Crescimento e maturação na adolescência • Período das Habilidades Específicas ao Contexto • Avaliação do Desenvolvimento Motor · Permitir ao aluno conhecer as principais mudanças decorrentes do crescimento e desenvolvimento do ser na infância e adolescência. · Permitir ao aluno compreender a importância da prática de atividade física nesses períodos da vida, relacionando a uma possível intervenção profissional. · Introduzir ao aluno algumas possibilidades de avaliação e inferência da performance e do desenvolvimento motor nessas idades. OBJETIVO DE APRENDIZADO Saiba que esta Disciplina tem como propósito o estudo das alterações das estruturas e funções dos sistemas orgânicos decorrentes do crescimento e alterações do processo de maturação biológica, bem como os efeitos e importância da atividade física para promoção dessas alterações nas várias faixas etárias ao longo do ciclo vital, e isso lhe oferecendo contato com as discussões mais recentes dessa área; além de lhe proporcionar momentos de leitura – textual e audiovisual – e reflexão sobre os temas que serão aqui discutidos, contribuindo com sua formação continuada e trajetória profissional. Esta Disciplina está organizada em seis unidades, cujo eixo principal é as mudanças que ocorrem no ser desde a concepção até a morte, ou seja, que dê conta de conceituar a terminologia utilizada; diferenciar idade cronológica e biológica e sua relação com crescimento; estudar os principais conceitos e teorias no estudo do desenvolvimento motor; aplicar conhecimentos adquiridos pensando nas possíveis intervenções do educador físico nas diferentes fases da vida, seja ainda na primeira infância, na infância, na adolescência, na vida adulta e no envelhecimento. Isso é o que você encontrará nesta e na próxima Unidade. Está preparado(a) para embarcar nesta viagem de estudos sobre o ciclo de vida do ser? ORIENTAÇÕES Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Contextualização Caro(a) aluno(a), Você já ouviu falar nas habilidades motoras específicas ao contexto? E nos fundamentos desportivos? Gestos técnicos de algum esporte em específico? Você conhece ou sabe realizar alguma dessas habilidades? Observe as figuras abaixo e veja se alguns dos movimentos lhe são familiares: Figura 1: Enterrada no basquete: após quicar a bola enquanto anda ou corre, realizar dois passos – saltitos –, seguidos de um salto e um arremesso na cesta. Fonte: iStock/FGetty Images Figura 2: Finalização – arremesso – no handebol: após quicar a bola enquanto anda ou corre, realizar dois passos – saltitos –, seguidos de um salto e um arremesso no gol. Fonte: iStock/FGetty Images 6 7 Figura 3: Cortada no voleibol: após correr e/ou andar até a posição da bola, saltar e volear – bater com a palma da mão – a bola para o outro lado da rede. Fonte: iStock/FGetty Images Com certeza, se você não se lembrava de ou imaginava ao que se referem as habilidades específicas ao contexto, agora você se lembrou! Ademais, repare que os movimentos desses gestos esportivos lembram muito os movimentos das habilidades motoras fundamentais, só que realizadas em sequência e/ou de alguma forma combinada. Isso porque, na verdade, não existem habilidades específicas ao contexto, o que existe são as habilidades motoras fundamentais combinadas e aplicadas ao contexto específico de uma modalidade esportiva, como nos exemplos aqui ilustrados – basquete, handebol e voleibol. Chegou o momento de você entender melhor ao que se refere esses fundamentos e/ou gestos esportivos, porque são importantes e como você, futuro(a) professor(a) de Educação Física, deve planejar suas práticas para o ensino dessas habilidades. 7 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Aspectos Gerais: Fim da Infância e Início da Adolescência Em nossa última Unidade de estudo, discutimos acerca de algumas mudanças no crescimento e desenvolvimento humano na primeira infância e parte da infância – até por volta dos sete anos de idade. Vimos que diferentemente da primeira infância, que é o período que, proporcionalmente, o ser mais cresce na vida e mudanças são perceptíveis em um curto período de tempo, a infância é marcada por um crescimento que, apesar de ainda considerado rápido, ocorre de forma menos abrupta, ou seja, mudanças no tamanho vão ocorrendo mais gradualmente. É como se, entre o primeiro e o segundo ano de vida, o organismo da criança trabalhasse de forma acelerada para garantir condições mínimas de sobrevivência, e após certa “independência” concedida conforme o ser se adapta ao “novo mundo”, o ritmo de crescimento começasse a diminuir. Aos poucos, esse ritmo desacelera, mas uma série de mudanças continua ocorrendo, as quais só são perceptíveis para as pessoas mais próximas – como a família – ao longo de anos, e não mais em meses como antes. Somente na adolescência esse ritmo é novamente acelerado, onde a partir do conhecido por todos como “estirão de crescimento”, mudanças abruptas de tamanho – e também maturação – voltam a ser nitidamente perceptíveis, mesmo que se passando apenas alguns meses. Conforme é apresentado no quadro de classificação da idade cronológica (Quadro 1), o qual também já foi apresentado em unidades anteriores, a infância abrange dos dois aos dez anos de idade. Ao longo da infância, período razoavelmente extenso em anos, o indivíduo chega a ganhar, em média, 60 cm em altura. Apesar dos valores médios de massa corporal na infância variarem um pouco mais nos últimos anos, até pelos altos índices de sobrepeso e obesidade não apenas no Brasil, mas no mundo, crianças costumam ganhar em torno de 20 a 25 kg até os dez anos de idade. Não precisamos de muitas outras informações desse tipo para entendermos que mudanças consideráveis acontecem no crescimento ao longo da infância. Nessa fase mudanças de maturidade são ainda mais evidentes, os diversos sistemas corporais – ósseo, muscular, endócrino, sensorial, nervoso etc. – contribuem para se ter aos dez anos de idade um ser com suas capacidades físicas – tais como força, resistência aeróbia, flexibilidade e agilidade, entre outras – e cognitivas – tais como memória, raciocínio lógico etc. – desenvolvidas. Dessa forma, pode-se iniciar novas etapas de aprendizagem um pouco mais desafiadoras, com estímulos mais específicos, como na escola, que nessa idade, remete-se ao ingresso no Ensino Fundamental 2. 8 9 Quadro 1 – Classificação da idade cronológica Período Idade aproximada Vida Pré-Natal Concepção ao nascimento Primeira infância Nascimento aos 24 meses Infância 2-10 anos Adolescência 10-20 anos Idade adulta jovem 20-40 anos Meia-idade 40-60 anos Terceira idade Acima de 60 anos Fonte: adaptado de Gallahue (2003) Ainda sobre desenvolvimento, o que dizer então das mudanças que ocorrem no comportamento motor? Como já enfatizado nesta Disciplina, a infância é uma fase da vida onde muitas mudanças no repertório motor acontecem, prova disso é que uma criança que mal conseguia se equilibrar ao correr ou realizar um simples salto perto dos dois anos de idade, agora, no fim da infância, já pode ser competente para participar efetivamente de atividades e práticas pré-desportivas. Essas práticas envolvem o uso de movimentos fundamentais refinados e combinados, para atender à demanda da tarefa que é específica ao contexto de uma determinada modalidade esportiva. Essa será uma das discussões centrais nesta Unidade, o desenvolvimento de habilidades motoras específicas ao contexto que, conforme a torre desenvolvimental apresentada a seguir(Figura 1) – já abordada nas últimas unidades –, tem como seu período sensível dos sete até os treze ou quatorze anos de idade, momento que marca justamente o fim do Ensino Fundamental 2. Figura 4: Modelo de desenvolvimento motor de Avigo e Barela (2015) Fonte: Avigo e Barela, 2015 9 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Assim, primeiramente discutiremos ao longo desta Unidade de estudo as principais mudanças no crescimento – e também maturação – do ser no início da adolescência, especificamente o “estirão do crescimento”. Em um segundo momento, ater-nos- emos ao estudo do desenvolvimento motor, partindo da segunda metade da infância e avançando até o início da adolescência, o que engloba justamente o período das habilidades específicas ao contexto – dos sete aos quatorze anos de idade. Crescimento e Maturação na Adolescência Apesar do início da adolescência ser definido, cronologicamente, como a partir dos dez anos de idade – conforme nosso referencial teórico apresentado no Quadro 1 –, o início dessa fase se dá individualmente, de acordo com o relógio biológico de cada indivíduo. Por exemplo, se contar pelas mudanças estruturais, o início da adolescência ocorre a partir da aceleração na taxa de crescimento em estatura, algo já conhecido popularmente como “estirão de crescimento”. Do ponto de vista da funcionalidade humana, a adolescência é iniciada a partir de alterações fisiológicas e/ou neuroendócrinas específicas, as quais desencadeiam em mudanças físicas notórias, denominadas características secundárias. São exemplos dessas características o aumento das mamas nas meninas e o aparecimento de pelos pubianos nos meninos. As características secundárias já foram abordadas na Unidade II. A melhor estimativa da transição entre a infância e a adolescência se dá na combinação da maturação do sistema reprodutivo, aparecimento das características secundárias e o crescimento acelerado. A esse período de transição atribui-se o nome de puberdade. Assim como o início, o fim da adolescência também acontece a partir do organismo de cada ser, individualmente. É um consenso que o encerramento dessa fase acontece com o alcance da função reprodutiva madura. Importante! Como já apontado, o “estirão de crescimento” está relacionado a um aumento repentino na velocidade de crescimento, que resulta em um ganho rápido de peso corporal e estatura. Apesar de ocorrer tanto em meninos quanto em meninas, a idade de ocorrência e os valores de ganho nas medidas antropométricas são diferentes. Importante! Para as meninas, o “estirão em estatura” inicia por volta dos nove ou dez anos de idade, tem seu pico de velocidade por volta dos onze ou doze anos, o qual se estabiliza perto dos treze anos, de forma que por volta dos dezesseis anos, meninas já estão bem próximas de sua estatura adulta, apesar de que em alguns casos pequenas mudanças ainda podem ocorrer por até seis anos após essa idade. 10 11 Já nos meninos, o “estirão em estatura” inicia um pouco mais tarde, por volta dos doze anos de idade. O pico de velocidade ocorre perto dos quatorze anos, o qual se estabiliza por volta dos quinze ou dezesseis anos, sendo que por volta dos dezessete ou dezoito anos, meninos já estão bem próximos de sua estatura adulta, podendo também acontecer um pequeno crescimento até por volta dos 22 anos de idade. Essas informações podem ser observadas no gráfico com curvas típicas de velocidade de crescimento em estatura, que é apresentado a seguir (Figura 2): 24 23 22 21 20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 Aceleração Desaceleração Desaceleração Termino do crescimento Meninas Meninos Pico de velocidade em estatura Início do estirão adolescente Idade (anos) Ga nh o e m es ta tu ra (c m /a no ) Figura 5: Curvas típicas de velocidade de crescimento em estatura para meninos – linha contínua – e meninas – linha pontilhada. Fonte: www.scielo.mec.pt No caso dos efeitos do “estirão do crescimento” nos valores de massa corporal – peso –, assim como para estatura, o aumento na velocidade de ganho de peso acontece primeiro para meninas, por volta dos dez anos de idade, e para meninos cerca de dois anos mais tarde, perto dos doze anos de idade. Essas informações podem ser observadas no gráfico com curvas típicas de velocidade de crescimento em massa corporal, que é apresentado a seguir (Figura 3). Enquanto meninas aumentam principalmente em massa adiposa – gordura corporal – e, em menor grau, massa muscular, meninos têm seu ganho principal em massa muscular e esquelética. 11 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Meninas Meninos Idade (anos) Ga nh o e m pe so (k g/ an o) Figura 3 – Curvas típicas de velocidade de crescimento em massa corporal para meninos – linha contínua – e meninas – linha pontilhada Fonte: www.efdeportes.com Perceba que, tanto para estatura quanto para peso corporal, meninos apresentam maiores ganhos em centímetros e quilogramas, respectivamente, do que meninas. Assim, enquanto na infância diferenças nessas medidas não são tão evidentes, sendo os meninos apenas ligeiramente mais altos e pesados, com o “estirão de crescimento” na adolescência, meninos passam a apresentar valores consideravelmente maiores em estatura e massa corporal. Isso pode ser exemplificado a partir dos quadros pôndero-estaturais para estatura, onde meninos crescem, em média, cerca de 30 a 35 cm ao longo dessa fase de estirão, enquanto meninas em torno de 25 a 30 cm, em média. Tais diferenças podem também ser observadas através do pico de velocidade de crescimento, tanto para estatura quanto para peso corporal, que para meninos é consideravelmente maior. A adolescência, que também é definida como a passagem da infância para a vida adulta, pode ser caracterizada a partir de vários indicadores de crescimento, tais como a maturidade esquelética, sexual e somática. O aparecimento das características sexuais femininas, por exemplo, a menarca, geralmente acontece por volta dos onze ou doze anos de idade, mais ou menos seis meses após o início do “estirão de crescimento”. Já o início da maturidade reprodutiva masculina, como as ejaculações noturnas, costuma ocorrer a partir dos treze anos de idade. Mais uma vez, apesar dessas idades estimadas tanto para maturação sexual quanto para maturação somática – estatura e peso corporal –, a adolescência é pela individualidade do relógio biológico do ser. 12 13 Importante! Por conta da individualidade nas mudanças associadas à maturação e crescimento na puberdade, adolescentes podem ser classificados a partir da velocidade de variação na maturidade – esquelética, sexual e somática. Existem os maturadores rápidos e/ou precoces, os maturadores médios e os maturadores lentos, com variações que chegam a atingir, mais ou menos, um ano de diferença do esperado para a idade cronológica. Importante! Por exemplo, um adolescente identificado como maturador rápido, pode ter sua idade biológica – estimada, por exemplo, a partir da avaliação de maturidade esquelética – um ano ou mais à frente de sua idade cronológica. Especificamente para a variação entre os tipos de maturadores para o tamanho do corpo, pode- se dizer que, inicialmente, maturadores precoces, independentemente do gênero, são mais altos e pesados. Entretanto, esses maturadores rápidos param de crescer antes de os maturadores médios e lentos, não havendo relação, em média, entre a velocidade de ocorrência do estirão e a estatura ou peso na vida adulta. Importante! Pensando agora na influência do crescimento e a maturação com o desempenho dos adolescentes na prática de atividades físicas. Será que essas diferenças entre esses adolescentes, já não mais crianças, mas agora rapazes e moças, podem influenciar de alguma forma na prática de atividadefísica? Em rapazes, o aumento nos ganhos de força e resistência muscular, além do aumento da capacidade aeróbia, tendem a aumentar o interesse em realizar as práticas corporais, até pela maior facilidade que encontram, por exemplo, na aprendizagem de habilidades esportivas. Já nas moças, o efeito é um pouco contrário, principalmente pela sua imagem corporal alterada. Trocando ideias... Meninas costumam diminuir o interesse e a motivação pelas práticas corporais. Isso decorre, principalmente, entre os diversos fatores envolvidos, pelas mudanças abruptas advindas da maturação sexual, como o crescimento das mamas, a consequente modificação das curvas corporais mais delineadas, o desconforto pela menarca, sem contar os aspectos psicológicos envolvidos – tais como atração entre os sexos, a busca pela imagem corporal atraente, o incômodo com a transpiração decorrente da prática. Todos esses são exemplos de fatores que contribuem para o afastamento e desinteresse da prática. Assim, a adolescência também é caracterizada pela diferença nos interesses e expectativas entre os gêneros. A partir do exposto, um dos desafios do professor de Educação Física nesse período de idade é propor práticas desafiadoras que atendam tanto às expectativas e interesses dos meninos, como também organizar práticas estruturadas e motivadoras que respeitem, inclusive, a imagem corporal das meninas, despertando o interesse destas em participar efetivamente das atividades propostas. 13 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Discussões acerca do papel docente serão retomadas ao longo dos próximos tópicos desta Unidade. Cabe-nos agora, conhecer um pouco mais sobre o desenvolvimento motor na segunda metade da infância e o início da adolescência, que engloba, justamente, a fase da torre desenvolvimental (Figura 4) denominada período das habilidades motoras específicas ao contexto. Período das Habilidades Específicas ao Contexto Seguindo pelos períodos da torre desenvolvimental já estudados, o próximo a ser destacado é o período das habilidades motoras específicas ao contexto, o qual é classificado cronologicamente dos sete aos quatorze anos de idade. Temporalmente, esse período é considerado longo e amplo até por sua diversidade motora. Pode- se dizer que o mesmo se inicia imediatamente após o alcance de proficiência nas habilidades motoras fundamentais por parte da criança – que deveria ocorrer por volta dos sete anos de idade –, seguindo com seu envolvimento em tarefas um pouco mais complexas e que exigirão a combinação e/ou adaptação das habilidades motoras básicas às especificidades do contexto dessas tarefas. Para entender a dimensão de habilidades motoras que podem ser adquiridas no período das habilidades específicas ao contexto, e que até justificam sua longa duração, basta pensarmos nas diferentes influências que atuam em nossa cultura corporal de movimento. Danças e atividades rítmicas, esportes em geral, como ginástica, atletismo, lutas, natação ou modalidades coletivas mais proeminentes em nossa cultura, como futebol, vôlei, basquete, handebol e, ainda, até mesmo jogos pré-desportivos, são todos exemplos da diversidade cultural existente e que influencia o repertório motor das crianças. Importante! Pode-se dizer que o grande objetivo desse período é permitir ao aprendiz adaptar os movimentos fundamentais ao maior número possível de experiências motoras específicas dessas modalidades e atividades, possibilitando ao mesmo tempo, alcançar um repertório motor amplo. Importante! Crianças engajadas e proficientes na execução das mais variadas habilidades motoras tendem a ser fisicamente ativas e saudáveis não apenas no decorrer da infância e adolescência, mas ao longo de toda a vida. Por sua longa duração e algumas características que diferenciam o início e o fim desse período, pode- se dividir o mesmo em duas fases desenvolvimentais que, inclusive, facilitam o entendimento de algumas peculiaridades: a fase de transição e a fase de aplicação. 14 15 Fase de Transição Importante! A fase de transição engloba a faixa etária dos sete até por volta dos dez ou onze anos de idade, que é quando deve ocorrer a combinação das habilidades motoras fundamentais nas mais variadas situações de realização. Importante! Vale lembrar que até por volta dos sete anos de idade as crianças adquirem proficiência na realização das habilidades motoras fundamentais, porém de forma “isolada”, sendo o passo seguinte buscar a “coordenação combinada”. Assim, as habilidades motoras fundamentais, adquiridas e refinadas no período anterior, são agora utilizadas para a aprendizagem e desenvolvimento de habilidades motoras específicas às atividades mais proeminentes, aquelas mais utilizadas na sociedade. Não significa praticar uma determinada modalidade esportiva, com toda sua complexidade técnica e tática, suas regras oficiais e materiais ou equipamentos profissionais, mas sim que a criança/adolescente comece a aprender e a tornar- se competente na realização das formas básicas de movimento que mais tarde comporão essas atividades mais elaboradas. Dessa forma, nessa fase crianças e/ou adolescentes devem “adaptar” as habilidades motoras fundamentais em contextos específicos, por exemplo, executar ritmos, saltos, manchetes, chutes e arremessos, agora, com objetivos de ir aproximando a realização dessas habilidades para as atividades de dança, lutas e modalidades esportivas praticadas no local onde a criança ou adolescente vive. Crianças e adolescentes devem praticar atividades que contenham as mais diversas combinações motoras possíveis, como chamadas por Gallahue e Donnelly (2008) de frases motoras. Essas combinações são necessárias quando, por exemplo, mais tarde, busca-se a aprendizagem de um gesto esportivo, por exemplo, o driblar no basquetebol, que envolve quicar uma bola enquanto se desloca pela quadra, andando ou correndo, podendo ser realizadas até fintas com o corpo na tentativa de ultrapassar o marcador. Perceba que há uma grande diferença em driblar ou quicar parado, considerado uma habilidade motora fundamental, e o gesto desportivo que envolve não só controlar a bola enquanto é quicada, mas também em se deslocar andando, correndo, realizando fintas com o corpo, e além de tudo, preocupando- se com o marcador. Veja a importância dessa fase de transição. Realizar cada gesto desportivo não é tarefa fácil, dado que é necessário, ao menos, uma mínima proficiência na combinação das habilidades básicas que formam esse gesto desportivo para que, posteriormente, o aprendiz consiga efetivamente participar da prática esportiva. 15 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência No caso exemplificado, participar de modalidades como o basquetebol ou também o handebol, esportes os quais envolvem as combinações citadas. Daí a necessidade de os praticantes vivenciarem a maior possibilidade de combinações possíveis, sem ainda se preocupar, por exemplo, com marcadores tentando roubar a bola, ou com ter de realizar fintas com o corpo etc., somente se preocupando em coordenar o quicar com o andar, depois com o correr, para somente depois realizar fintas com corpo enquanto quica, e assim sucessivamente, até chegar ao gesto desportivo. Assim como o professor era importante no período das habilidades motoras fundamentais, orientando sobre os movimentos, organizando práticas de maneira estruturada para as crianças adquirirem proficiência na coordenação isolada, agora, a atuação docente também é considerada importantíssima. O professor deve planejar a prática, preparar atividades que exijam que os alunos combinem as diferentes habilidades motoras fundamentais em situações diversas, mais uma vez, orientando sobre os movimentos, instruindo sobre o que corrigir e como corrigir caso seja necessário, além de motivar para que haja um real envolvimento de seus alunos com a prática. Para aprender é necessária prática – e práticaenvolve repetição. A repetição de uma mesma tarefa por muito tempo ou, ainda, tarefas simplificadas ou muito básicas que não tenham um componente desafiador, pode se tornar cansativas e desmotivantes. Por isso, cabe ao professor ampliar o repertório de atividades. Para exemplos de atividades, acesse o manual de práticas para iniciação esportiva. Disponível em: http://goo.gl/9YRzCXEx pl or Isso a fim de que possa criar diferentes possibilidades de prática para seus alunos, que sejam desafiadoras e criativas e faça com que a prática repetitiva ocorra de maneira interessante, em alguns casos até de forma prazerosa – e não de forma desgastante. Fase de Aplicação A fase de aplicação acontece entre os onze e os treze ou quatorze anos de idade. Após tornar-se proficiente na combinação das habilidades motoras fundamentais em variadas possibilidades, deve ocorrer a aprendizagem propriamente dita dos jogos, danças, lutas e modalidades esportivas mais proeminentes na sociedade como, por exemplo, buscando proficiência nos fundamentos e gestos esportivos. Assim, nesse período os adolescentes devem “aplicar” as habilidades motoras fundamentais em contextos específicos, por exemplo, executando ritmos, saltos, manchetes, chutes e arremessos, agora, com objetivos de ir aproximando as mesmas para as atividades de dança, lutas e modalidades esportivas praticadas no local onde a criança ou adolescente vive 16 17 Como o próprio nome sugere, a fase de aplicação refere-se justamente à aplicação das frases motoras em situações das próprias modalidades esportivas ou jogos pré-desportivos. No exemplo dado – de driblar no basquetebol e/ou handebol –, a criança se preocupava com as partes isoladas do gesto esportivo, que nada mais eram que as habilidades motoras fundamentais, buscando combiná-las com a maior proficiência possível. Agora, não basta apenas combinar, mas aplicá-las justamente em condições próximas do jogo ou esporte pronto, por exemplo, com a presença de um marcador. Observe que o foco ainda não é a prática do esporte de forma completa, com competição e regras oficiais, mas sim a participação em situações que costumeiramente ocorrem no esporte. Por exemplo, ainda não frisando a competitividade, participar de situações de ataque e defesa no basquete, seja um contra um, dois contra dois etc., onde o objetivo é ultrapassar a última linha do campo adversário, ou até mesmo realizar um arremesso no gol – como no handebol – ou na própria cesta, simulando uma situação dessa modalidade. Perceba que, na verdade, os fundamentos ou gestos técnicos esportivos, chamados pelos estudiosos de habilidades específicas ao contexto, nada mais são do que habilidades motoras fundamentais combinadas e aplicadas em situações específicas. Por exemplo, a cortada no voleibol nada mais é que a combinação das habilidades motoras fundamentais em correr, saltar e volear – bater – uma bola, entre outras habilidades de equilíbrio que são bases para essas habilidades citadas. Exemplos de finalização no handebol, basquete ou no futebol, todos envolvem quicar uma bola, ou conduzir com o pé – no caso do futebol –, enquanto corre até o chute ou um salto e arremesso em um alvo, seja um gol ou uma cesta. Desnecessário ser apresentados mais exemplos, pois fica evidente, mais uma vez, a importância das habilidades motoras fundamentais, as quais servem de bases para a aprendizagem de novas habilidades mais complexas e específicas. Importante! Cabe ressaltar que no período das habilidades específicas ao contexto, seja na fase de transição ou aplicação, é mais importante à criança ou ao adolescente vivenciar diferentes experiências do que simplesmente se especializar em uma única modalidade esportiva ou qualquer outra atividade específica. Na verdade, tal especialização apenas deveria ocorrer após os quatorze anos de idade. Importante! Aulas de Educação Física nesse período desenvolvimental devem buscar oferecer ao aluno as mais variadas possibilidades de prática, sempre respeitando as especificidades do contexto do aprendiz. O professor deve evitar uma especialização precoce do seu aluno em uma única modalidade que venha afastá-lo do enriquecimento de seu repertório motor. 17 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Se no período anterior o professor orientava e propiciava a oportunidade necessária para a aquisição da potencialidade das habilidades motoras fundamentais, agora, da mesma forma, por meio de atividades bem programadas e sistematizadas, acompanhadas de instrução, o professor deve mirar que seu aluno alcance o ápice da torre desenvolvimental. Esse ápice no desenvolvimento se refere ao alcance de um repertório motor rico e que permitirá ao aluno a autonomia para praticar, mais tarde, aquilo que mais lhe agradar e, consequentemente, alcançar um desenvolvimento motor pleno. Discussões como essas, acerca de um desenvolvimento pleno, remetem-se à segunda metade da adolescência – a partir dos quatorze anos de idade –, quando se alcança o topo da torre desenvolvimental, algo denominado período habilidoso – essas discussões serão mais bem exploradas posteriormente, na próxima Unidade de estudo. Por agora, cabe destacar que, uma vez que as oportunidades de práticas variadas que as crianças vivenciam são providenciais para prosseguir em seu desenvolvimento – sendo então as mudanças governadas principalmente pelo ambiente que o ser está inserido, e não mais por seu organismo, como acontecia nos anos iniciais de vida –, crianças e adolescentes podem ter seu desenvolvimento prejudicado por barreiras de proficiência, caso não tenham oportunidades adequadas aos seus potenciais de idade. Essas barreiras serão abordadas no tópico a seguir. Barreiras de Proficiência Como mencionado, uma das características mais importantes no processo desenvolvimental é a cumulativa: novas aprendizagens decorrem e são possíveis com base nas experiências anteriores. No caso de desenvolvimento motor, caso alguma deficiência desenvolvimental venha a ocorrer, aquisição e competência motora futura podem ser comprometidas. Diferentemente, desenvolvimento motor proficiente, rico em possibilidades e experiências, amplia e possibilita que o ser em desenvolvimento prossiga com sucesso seu aprimoramento motor no estágio subsequente. Do contrário, se a criança ou adolescente não tem oportunidade apropriada e condizente com as suas possibilidades e experiências, pode ficar retido no presente estágio de desenvolvimento, sem possibilidade de avançar nos períodos subsequentes. Portanto, qualquer prejuízo no desenvolvimento motor vivenciado nos anos iniciais pode ser desastroso e impeditivo para aquisições motoras futuras. Novamente, voltamos ao exemplo apresentado do correr e quicar uma bola, condição necessária para uma atividade de basquete. Se a criança não tiver facilidade em realizar o correr e o quicar e, mais ainda, tiver dificuldades de realizar ambos simultaneamente, a participação da mesma em uma atividade de basquete será dificultada ou até mesmo comprometida.. 18 19 Em algumas idades e períodos desenvolvimentais específicos, essa característica cumulativa do processo de desenvolvimento ao longo da vida é ainda mais evidente. Esse é o caso da transição do período de habilidades fundamentais para o período das habilidades mais específicas ao contexto, onde a dependência das experiências anteriores assume importância ainda maior. A maior importância dessa transição decorre do fato de que, como já destacado, no período de habilidades motoras fundamentais as habilidades são realizadas de forma isolada e a partir de então as mesmas devem ser realizadas de forma combinada. Caso essa transição não venha a ser realizada apropriadamente, o avanço no processo desenvolvimental é prejudicado de forma a criar dificuldades para a realização de habilidades específicas das modalidades esportivas, recreativas, rítmicas e de dança e, consequentemente, as crianças,muito provavelmente, apresentarão desinteresse em se envolver nessas atividades. Tal desinteresse, neste caso, decorreria da dificuldade em realizar as habilidades e ações motoras pela falta de competência motora. Ainda, a criança poderá ser “discriminada” pelos próprios colegas e, muitas vezes, até mesmo pelo professor, considerando as dificuldades que a mesma apresenta em realizar as tarefas. Assim, “autoexclusão” e/ou “exclusão”, quanto ao envolvimento e engajamento em atividades de Educação Física, decorrem, na maioria dos casos, da falta de habilidade motora compatível com o grau de dificuldade e exigência em realizar a atividade proposta. Importante! A dificuldade em aprender e realizar habilidades motoras específicas e, por decorrência, desistir de praticar ou de se envolver em práticas motoras, é denominada “barreira de proficiência motora” e apontada como um dos maiores problemas relacionados ao processo de aquisição motora. Na Figura 4 pode-se observar uma representação dessa barreira de proficiência como impeditiva para a sequência do desenvolvimento nos períodos posteriores. Importante! Se uma criança vivencia o problema de “incompetência motora”, tornando-se uma barreira para a prática de atividades futuras, a situação tende a complicar cada vez mais. Com dificuldades na realização de atividades, a criança passa a ser excluída dessas, diminuindo sua possibilidade de desenvolvimento e entrando em um círculo vicioso: faz menos, pois tem dificuldades; passa a ter mais dificuldades, pois faz menos, de modo que o desfecho é amplamente conhecido: falta de interesse em praticar atividade física! 19 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Figura 6: Representações da barreira de proficiência motora, entre o período das habilidades motoras fundamentais e o período das habilidades motoras específicas ao contexto – fase de transição Importante! Como a barreira de proficiência pode ser evitada? A resposta, pelo menos na teoria, é fácil: promovendo o desenvolvimento motor pleno das crianças nos respectivos níveis desenvolvimentais. Considerando a importância das habilidades motoras fundamentais para as aquisições futuras e que crianças estão cada vez mais tendo o espaço e interesse reduzido – principalmente pelo envolvimento desde cedo em atividades e/ou jogos eletrônicos –, além da falta de incentivo – pais sedentários –, há a necessidade de que atividades sejam implementadas para as crianças desde cedo. Trocando ideias... Leia o artigo sobre aulas de Educação Física desde o Ensino Infantil,. Disponível em: http://goo.gl/wdUthS. Ex pl or Ou seja, mesmo nos anos iniciais, para que as habilidades motoras fundamentais sejam realizadas por todas as crianças e adquiridas de forma “natural”. Posteriormente, as crianças necessitam se tornarem proficientes na realização dessas habilidades fundamentais, combinando-as nas situações mais variadas de atividade física: jogos, danças, lutas, brincadeiras, esportes etc. Finalmente, os adolescentes precisam aprender a praticar as atividades mais proeminentes na sociedade, de modo que essas possam ser utilizadas ao longo da vida em um hábito de prática de atividade física. 20 21 Importante! Vale também alertar que especializar-se precocemente em uma determinada modalidade esportiva antes do período indicado – após os quatorze anos de idade –, não dando atenção a outras vivências motoras, pode, de alguma forma, desencadear também em uma barreira de proficiência motora. Importante! Especializar-se antes do tempo pode impedir a aprendizagem de outras manifestações corporais que também são importantes de serem aprendidas, limitando a criança ou o adolescente em suas possibilidades de prática ao longo da vida. Até os quatorze anos de idade, o objetivo traçado deve ser buscar adquirir um repertório motor amplo e proficiente, vivenciando o maior número de combinações motoras possíveis e aplicando-as aos fundamentos técnicos das atividades e/ou modalidades mais proeminentes na sociedade. Mais tarde, sim, com o repertório rico adquirido, será o momento de especialização naquilo que mais satisfazer o interesse de seu praticante. A Importância da Atuação do Professor Ao longo das discussões, diversos aspectos ressaltando o papel do professor de Educação Física já foram abordados. Assim, o objetivo desta seção é enfatizar a importância docente na aquisição e refinamento das habilidades motoras específicas ao contexto que, como já destacado, nada mais são do que as habilidades motoras fundamentais combinadas e aplicadas ao contexto das atividades e/ou modalidades mais proeminentes na sociedade. Considerando que nos dias atuais têm ocorrido mudanças drásticas no repertório motor, tanto de crianças, como de adultos, porquanto das facilidades advindas da tecnologia e, ainda, que isso é acrescido pelos efeitos deletérios de sobrepeso e obesidade em nossa população, o envolvimento com a prática de atividade física é crucial. Portanto, a Educação Física, entre outras áreas, tem um papel fundamental na vida das crianças, devendo, dessa forma, ter como um de seus objetivos evitar que a barreira de proficiência motora ocorra, promovendo desenvolvimento motor proficiente em todos os períodos desenvolvimentais, ou pelo menos aqueles condicionados pelo contexto ambiental. 21 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Nesse fenômeno complexo e dinâmico chamado desenvolvimento motor, cabe ao professor de Educação Física atuar como um manipulador de restrições. Especificamente, deve buscar atuar diretamente nas restrições do ambiente e da tarefa, fazendo com que seus alunos aprendam com proficiência as diferentes e diversas habilidades motoras, atuando, dessa forma, indiretamente no organismo do ser. Assim, o professor interfere diretamente nas restrições externas – ambiente e tarefa – para provocar, indiretamente, mudanças internas no aluno, pois a aprendizagem é inerente ao praticante. E como o professor pode manipular tais restrições? A resposta já foi dada algumas vezes: oferecendo oportunidades de práticas estruturadas e instrução apropriada. É papel docente organizar suas aulas com objetivos definidos e compatíveis com o nível desenvolvimental esperado para a respectiva idade das crianças e adolescentes. Além disso, é o responsável por fornecer instrução apropriada para que os objetivos pretendidos sejam alcançados. Como assim, “instrução apropriada”? Como já enfatizado, após a realização das atividades, o aluno deve receber informação sobre os movimentos realizados e, caso seja necessário, deve receber instrução sobre o que e como corrigir seus movimentos para se tornar competente motoramente. A partir do exposto, podemos definir alguns objetivos gerais mais importantes para o trabalho com crianças e adolescentes na escola – ou também fora da escola –, até por volta dos quatorze anos de idade: · Fase de transição (Ensino Fundamental 1) – refinar e combinar as habilidades motoras fundamentais nas mais variadas condições possíveis, aproximando- se de situações de fundamentos e/ou gestos das atividades mais proeminentes da sociedade; · Fase de aplicação (Ensino Fundamental 2) – aplicar as habilidades motoras fundamentais em situações próprias das atividades mais proeminentes na sociedade – modalidades esportivas, lutas e danças –, buscando competência e proficiência motora na realização dos fundamentos e gestos que compõem as mesmas; bem como a aprendizagem das regras, técnicas e táticas que compõem essas atividades. Assim, ao final desse período, as crianças sairiam competentes em diferentes habilidades específicas, inclusive, adquirindo proficiência para participação em diferentes atividades, tendo um ótimo repertório a ser utilizado nos anos posteriores, adquirindo autonomia para escolher, por exemplo, uma, duas, três ou até mais modalidades esportivas para se tornarem habilidosas. Como consequência, pode- se terum executante competente, motivado e confiante para práticas corporais diversas, seja para simples prática habitual de atividade física, seja para o envolvimento em atividades recreativas e/ou, ainda, se preferir, para a participação em atividades competitivas. 22 23 Importante! Após essas discussões, resta ainda abordarmos um ponto muito relevante, o qual pode ser identificado a partir de algumas perguntas: como reconhecer se meu aluno adquiriu, aprendeu e/ou refinou determinada habilidade motora? Como saber se meu aluno conseguiu aprender o que tentei ensiná-lo? Como saber se as atividades que propus em minha aula são realmente suficientes para atender aos meus objetivos? Como corrigir os movimentos dos meus alunos, com base em quais informações? Respostas para essas questões apenas são possíveis de serem alcançadas uma vez que o professor avalie seus alunos. Ou seja, somente a partir de uma avaliação, seja formal ou informal, que se torna possível tirar conclusões, fazer interpretações, tentar responder questões importantes como essas com propriedade. Trocando ideias... A seguir trataremos, sucintamente, acerca de avaliação do desenvolvimento motor. Avaliação do Desenvolvimento Motor Avaliar o desenvolvimento motor, sem dúvida, não é uma tarefa fácil. Tal dificuldade decorre principalmente da complexidade e da especificidade em que o desenvolvimento acontece para cada ser. Conforme exposto, desenvolvimento humano é um processo complexo, influenciado por um intricado relacionamento de muitos fatores inerentes ao ambiente, ao organismo e à tarefa a ser realizada. Justamente por essa característica multicausal, a definição de uma ferramenta confiável que possibilite avaliar o desenvolvimento motor parece ser um desafio não apenas entre os pesquisadores, mas também entre os professores. A principal questão levantada quando se faz necessário avaliar é o que avaliar? Ao pensar nisso, uma das características desenvolvimentais que merece destaque é a ocorrência de mudanças qualitativas e quantitativas no comportamento motor durante todo o curso da vida. Nesse sentido, duas facetas permeiam o que pode ser examinado: o produto e o processo. Apesar do reconhecimento da importância em ambas as maneiras de se avaliar, de certa forma, avaliação quantitativa, ao longo dos anos, tem sido priorizada, isso provavelmente advindo das facilidades da realização da mesma, quando comparada a uma análise qualitativa de movimento. É comum se avaliar desenvolvimento motor com base no desempenho da realização de certa habilidade motora puramente em termos da quantificação do produto, com medidas de tempo, distância e precisão, até pela facilidade da obtenção e análise dessas informações. Avaliamos a velocidade da corrida, o tempo para percorrer certa distância, o quão alto, o quão forte foi um arremesso. Desnecessário mencionar que esse tipo de avaliação é importante, contudo, é limitado aos aspectos de desempenho e restringe a obtenção de informações sobre como o movimento foi realizado. A utilização de avaliação quantitativa não permite a investigação do padrão de movimento utilizado e as especificidades do mesmo na realização de determinada tarefa motora. 23 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Uma avaliação qualitativa de movimento, por sua vez, permite fazer considerações sobre como o movimento foi realizado por uma criança, por exemplo, como o mesmo é coordenado, no sentido de como os diversos segmentos corporais são organizados para a realização de uma dada habilidade motora. Neste caso, a forma com que essa criança se configura no espaço e a relação dos segmentos corporais selecionados dentro do contexto ambiental para a realização da tarefa motora expressará a qualidade dos movimentos realizados, podendo ser ou não movimentos considerados biomecanicamente eficientes. Importante! Algumas questões podem ser apontadas: será que é importante avaliar a quantidade de movimento, se eu não sei como foi realizado? Como professor de Educação Física, terei mais informações relevantes sobre meus alunos com o valor da distância de um chute, ou a velocidade de um arremesso, ou com informações sobre como os segmentos foram posicionados na realização dessas habilidades, para que seja possível alguma correção, instrução ou sugestão? Talvez ambas as informações juntas, do processo e do produto, possam fazer mais sentido. Mas se eu não sei nada acerca do processo, o que me adianta tirar conclusões apenas a partir do produto? Ou seja, como corrigirei meu aluno, a fim de que consiga ter melhores resultados no produto, arremessar mais longe ou mais alto, se não sei qual padrão de movimento foi utilizado pelo estudante? Assim, antes de se importar com o produto do movimento, é fundamental se preocupar em saber a “forma” que o mesmo foi realizado. Trocando ideias... Importante! Diante de tais possíveis modos de avaliação, o que deve ficar claro é que na primeira década de vida, é mais importante avaliar os processos que permeiam a realização de uma dada habilidade motora, do que o produto final da mesma. Importante! Você pode até questionar o porquê dessa afirmação. A resposta você já sabe! Conforme já discutido, até por volta dos dez anos de idade, tem-se como objetivo, resumidamente, a aquisição e o refinamento das habilidades motoras fundamentais, bem como a combinação dessas em situações variadas. Assim, é mais importante a investigação do nível de execução dessas habilidades, como as mesmas são realizadas para que, como professor, seja possível orientar os alunos sobre como fazer, o que fazer, o que corrigir, na realização de determinada habilidade motora. Por exemplo, investigar em qual estágio de desenvolvimento uma criança nessa faixa etária está correndo ou arremessando uma bola, se a mesma realiza essas habilidades em um padrão inicial, elementar ou maduro de movimento. O quão distante, o quão forte ou o quão rápido, ou seja, quantificar a execução de determinada habilidade, é mais importante de ser realizado quando a mecânica do movimento já estiver relativamente bem dominada, algo que só acontece nos anos subsequentes à fase dos movimentos fundamentais. 24 25 De forma geral, identificar os níveis de desenvolvimento de crianças através de uma avaliação qualitativa é essencial, pois permite, por exemplo: realizar uma triagem de um grupo desconhecido e/ou identificar características de uma população específica; elaborar programas interventivos com as finalidades de potencializar, impedir ou remediar atrasos ou dificuldades na realização de novas habilidades; verificar a eficiência de um programa motor; diagnosticar atrasos e impedir os efeitos catastróficos dos mesmos; organizar dados normativos, entre outros. Outro exemplo é um diagnóstico inicial de desenvolvimento motor, o mesmo permite aos profissionais identificarem os fatores que tornam o movimento limitado, possibilitando a tomada de decisão sobre qual habilidade e/ou critérios motores devem ser enfatizados na elaboração de um programa, o tempo necessário de prática para cada habilidade e estabelecer metas de desempenho, possibilitando o desenvolvimento das crianças. Diante da importância de se avaliar, alguns testes motores são propostos buscando responder a questões de diferentes áreas do conhecimento acerca do curso desenvolvimental. Podemos destacar a Educação Física escolar que, desde tempos, alimenta discussões que se atentam à importância de seu objeto de atuação – o movimento – e discute, inclusive, o que avaliar, porque avaliar e para quê avaliar. De certa forma, essa área ainda necessita de definições de objetivos e de procedimentos de avaliações claros. Perceba que não é objetivo desta seção propor como avaliar seus alunos em suas aulas de Educação Física para passá-los ou não de ano, para reprová-los caso não atinjam um desenvolvimento “modelo”. Na verdade, o interesse aqui é que você, enquanto professor, entendaque precisa planejar e organizar sua prática e que, para tal, é necessário se partir de algum ponto ou diagnóstico, o qual só é possível de se ter uma vez que se tenha avaliado. Para então planejar suas aulas buscando o desenvolvimento de habilidades motoras, você precisa avaliar habilidades motoras. Diversos testes motores são desenvolvidos a fim de atender às expectativas de uma avaliação fidedigna do desenvolvimento na realização das habilidades motoras. Entre esses, podemos aqui destacar três: · A escala de desenvolvimento motor de Rosa Neto é composta de uma bateria de testes para avaliar o desenvolvimento motor de crianças dos dois aos onze anos de idade; Acessando este link: http://www.motricidade.com.br/kit-edm.html. Ex pl or · O Instrumento de Avaliação de Padrão Motor Fundamental (FMPA), proposto Gallahue e Donnelly (2008), é encontrado nos capítulos 12, 18 e 20 do livro apresentado em nossas Referências, nesta Unidade. É um instrumento informal para classificar indivíduos nos estágios inicial, elementar e/ou maduro de desenvolvimento em várias habilidades motoras fundamentais, até ao redor dos dez anos de idade; 25 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência · Já o Teste de Desenvolvimento Motor Geral II (TGMD-2) permite a avaliação de crianças entre os três e dez anos de idade, a partir de doze habilidades motoras fundamentais que são comuns entre as crianças, por meio de critérios de desempenho – padrões de movimento – específicos para cada uma das habilidades. O TGMD-2 é utilizado não apenas no Brasil, mas no mundo – em cerca de 150 países –, destacando-se por sua possibilidade de se quantificar o nível de desenvolvimento motor, além de sua fácil aplicação. Esse teste é considerado no meio acadêmico como um dos mais importantes para a avaliação de habilidades motoras. Assista ao vídeo com um exemplo de aplicação do TGMD-2. Disponível em: http://goo.gl/hG1Oep Ex pl or Mais exemplos de testes para avaliação qualitativa, bem como diversos exemplos para avaliação quantitativa do movimento, deverão ser apresentados ao longo do curso de Educação Física, em uma disciplina específica para o ensino de testes, medidas e avaliação. Importante! Por agora, cabe ressaltar a importância de se utilizar a avaliação como parte do planejamento das aulas, como meio para o professor identificar as dificuldades de seus alunos e também – por que não dizer? – como forma de o professor verificar a qualidade de seu trabalho, por exemplo, avaliando se as atividades aplicadas são suficientes para os alunos desenvolverem com proficiência as habilidades motoras fundamentais. Em Síntese 26 27 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Vídeos FULL TGMD-2 http://goo.gl/ueKPF2 Leitura Movimento na infância: combustível para o desenvolvimento AVIGO, E. L.; BARELA, J. A. Movimento na infância: combustível para o desenvolvi- mento. Revista Por Escrito: Corpo em Movimento, v. 10, p. 48-53, 2015. http://goo.gl/FHqQ2a Crescimento e desenvolvimento na adolescência COUTINHO, M. F. G. Crescimento e desenvolvimento na adolescência. Revista de Pediatria Soperj. [20--]. http://goo.gl/T1Vx48 Manual de práticas para iniciação esportiva no programa Segundo Tempo GRECO, P. J.; CONTI, G.; PEREZ MORALES, J. C. Manual de práticas para inicia- ção esportiva no programa Segundo Tempo. Maringá, PR: Eduem, 2013. http://goo.gl/iVWngI Avaliação do desenvolvimento das habilidades motoras fundamentais em alunos da 5ª série dos anos finais MINIKOWSKI, R. D. M.; XAVIER FILHO, E. Avaliação do desenvolvimento das habi- lidades motoras fundamentais em alunos da 5ª série dos anos finais. In: O professor PDE e os desafios da escola pública paranaense. v. 1. Secretaria de Educação do Governo do Estado do Paraná, 2010. http://goo.gl/uVFRLv Development of fundamental motor skills in children of a public school in the city of Sao Paulo RODRIGUES, D.; AVIGO, E. L.; BARELA, J. A. Development of fundamental mo- tor skills in children of a public school in the city of Sao Paulo. BJMB, v. 9, n. 1, p. 1-10, 2015. http://goo.gl/ZJ5Dom 27 UNIDADE Crescimento e desenvolvimento: infância e adolescência Referências AVIGO, E. L.; BARELA, J. A. Movimento na infância: combustível para o desenvolvimento. Revista Por Escrito: Corpo em Movimento, v. 10, p. 48- 53, 2015. Disponível em: <http://www.fundacionarcor.org/es/detalle/635/--- movimiento-en-la-infancia--combustible-para-el-desarrollo--->. GALLAHUE, D. L. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. 2. ed. São Paulo: Phorte, 2003. ________.; DONNELLY, F. Educação Física desenvolvimentista para todas as crianças. 4. ed. São Paulo: Phorte, 2008. MALINA, R. M.; BOUCHARD, C. Growth, maturation and physical activity. 2th ed. Champaign: Human Kinetics, 2004. 28
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