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QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO

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Francisco Imbernón
Q U A L I D A D E 
□ 0 EN S IN O E 
FORMAÇÃO DO 
PROFESSORADO
uma mudança necessária
/2iCORT€Z
*&€DITORfl
Este livro tem como objetivo ajudar o leitor 
a refletir sobre questões relacionadas com a 
educação. Está dividido em duos partes. Na 
primeira, sáo analisadas a figura do professor, 
a escola e a qualidade do ensino. A segunda 
trata dos professores e sua formação como 
elemento essencial na qualidade da educação 
em todos os âmbitos, para ser conduzida até 
os novos aspectos, como a criação de redes 
de formação. Sâo intercaladas ideias, quadros, 
motérias da internet, citações, filmes, livros, 
rostos etc. com o intuito de refletir sobre as 
mudanças na educação. 0 leitor pode adi­
cionar aspectos que o ajudem a aprimorar e 
ampliar aquilo que o livro desenvolve. Porque 
já nâo servem conceitos antigos paro proble­
mas novos. Temos de buscar soluções para os 
problemas e desafios atuais da educação; te­
mos de amplior nossos conhecimentos sobre 
a educação. Por isso, oferecemos aqui pistas 
para que se encontrem instrumentos para 
poder mudar a educação, ou, pelo menos, que 
nos permitam refletir sobre como a educação 
pode nos levar a melhorar a humanidade.
ISBN 978-85-249-2430-9
9 7
00oo 5 2 4 9 2 4 3 0 9 CORT€Z€DITORA
OBRAS DO AUTOR
FORMAÇÃO DOCENTE E 
PROFISSIONAL:
fo rm ar-se para □ mudança e 
a incerteza
Col, Questões da Nossa Época 
vol, 14 
128 pags.
ISBN 978-85-249-1630-4
INOVAR O ENSINO E 
A APRENDIZAGEM 
NA UNIVERSIDADE
Col, Questões da Nossa Época 
vol, 40 
128 págs,
ISBN 978-85-249-1863-6
FORMAÇÃO PERMANENTE 
DO PROFESSORADO:
novas tendências
120 págs,
ISBN 978-85-249-1494-2
QUALIDADE 
DO ENSINO E 
FORMAÇÃO DO 
PROFESSORADO
'Q s s
EDITORA AFILIADA
Coordenador do Conselho Editorial de Educação 
Marcos Cezar de Freitas
Conselho Editorial de Educação 
José Cerchi Fusari 
Marcos Antonio Lorieri 
Marli André 
Pedro Goergen 
Terezinha Azeredo Rios 
Valdemar Sguissardi 
Vitor Henrique Paro
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Imbemón, Francisco
Qualidade do ensino e formação do professorado: uma mudança necessária 
/ Francisco Im bem ón; [tradução Silvana Cobucci Leite]. - São Paulo : Cortez, 
2016.
Título original: Calidad de la ensenanza y formación dei profesorado : Un 
cambio necesario.
Bibliografia.
ISBN 9978-85-249-2430-9
1. Ensino - Finalidades e objetivos 2. Ensino - Qualidade 3. Professores - 
Formação profissionais I. Título.
16-01028 CDD-370.71
índices para catálogo sistemático:
1. Docentes : Formação profissional: Educação 370.71
2. Professores : Formação profissional: Educação 370.71
Francisco Imbemón
QUALIDADE 
DO ENSINO E 
FORMAÇÃO DO 
PROFESSORADO
uma mudança necessária
Tradução
Silvana Cobucci Leite
6DITORA
Título original: Calidad de la ensenanza yformación dei profesorado. Un cambio necesario 
Francisco Imbernón
Capa: de Sign Arte Visual 
Preparação de originais: Solange Martins 
Revisão: Maria de Lourdes de Almeida 
Composição: Linea Editora Ltda.
Coordenação editorial: Danilo A. Q. Morales
Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou duplicada sem autorização expressa do 
autor e do editor.
© 2013 Ediciones Octaedro, S. L., Barcelona, Espana
Direitos para esta edição 
CORTEZ EDITORA 
Rua Monte Alegre, 1074 - Perdizes 
05014-001 - São Paulo - Brasil 
Tels.: (55 11) 3864 0111 / 3611 9616 
Site: www.cortezeditora.com.br 
e-mail: cortez@cortezeditora.com.br
Impresso no Brasil - maio de 2016
http://www.cortezeditora.com.br
mailto:cortez@cortezeditora.com.br
íDITORO 5
SUMÁRIO
Introdução. O que significam a qualidade e a mudança 
no ensino? Dois conceitos multifacetados, para não dizer
confusos................................................................................................ 11
A mudança na educação.................................................................. 13
PRIMEIRA PARTE
O p r o f e s s o r a d o , 
a e s c o la , a c o m u n id a d e e 
a q u a lid a d e d a e d u c a ç ã o
Capítulo 1. O início: a função e a imagem social do professor.
Sem qualidade docente não existe qualidade educacional.... 25
1.1 O duro ofício de ensinar........................................................ 33
1.2 Diferentes professores, diferentes épocas.......................... 35
1.3 As mudanças nas funções do professor e da professora
durante o século XX................................................................. 40
1.4 A tarefa e a imagem social. Muito trabalho a ser feito.... 46
1.5 Velhas e novas funções. Rumo ao futuro........................... 50
6 FRANCISCO IMBERNÓN
Capítulo 2. Qualidade e fragmentação curricular na escola.
Fragmentação ou globalização?..................................................... 54
2.1 Fragmentar ou não fragmentar? Eis a questão................. 57
2.2 Ensinar e aprender o saber para aumentar a qualidade
da educação............................................................................... 59
2.3 Aprender a aprender, sim, mas também aprender a
integrar (e a desfragmentar).............................. 62
Capítulo 3. Escola, qualidade, inclusão, multiculturalidade e
interculturalidade.............................................................................. 67
3.1 Somos todos diferentes, não?................................................ 73
3.2 Algumas reflexões sobre a mudança na educação e a
multiculturalidade................................................................... 78
3.3 A multiculturalidade se transforma nas escolas.............. 79
3.4 O espaço educativo multicultural ou intercultural......... 82
Capítulo 4. A qualidade da educação não está apenas na escola... 86
4.1 A necessária mudança na organização da escola............. 88
4.2 Alguns pontos de vista nas comunidades de
aprendizagem........................................................................... 90
SEGUNDA PARTE
O p r o f e s s o r a d o e s u a f o r m a ç ã o 
c o m o f e r r a m e n t a s i m p r e s c in d í v e i s 
d a q u a lid a d e d a e d u c a ç ã o .
C a m in h a n d o r u m o a o f u t u r o
Capítulo 5. A profissão docente do ponto de vista internacional.
O caso da Europa............................................................................... 95
5.1 Aspectos gerais........................................................................ 98
5.1.1 A docência como carreira atrativa........................... 98
5.1.2 Políticas destinadas ao professorado....................... 98
5.1.3 Formação permanente do professorado................. 99
5.1.4 Selecionar para o exercício do professorado.......... 100
5.1.5 A eficiência do professorado...................................... 101
5.2 Aspectos de política específica.............................................. 102
Capítulo 6. A profissão docente no atual contexto da educação
para além dos relatórios................................................................... 105
6.1 A profissão docente do presente para o futuro................. 107
6.2 A profissão docente em um contexto incerto.................... 117
6.3 Mesmo assim, não podemos cair em um ingenuísmo
pedagógico................................................................................. 121
6.4 Possíveis alternativas.............................................................. 125
Capítulo 7. A formação que o professorado recebe na
universidade....................................................................................... 128
7.1 A universidade e a formação inicial do professorado
nas etapas de educação infantil e primária. A estrutura. 129
7.2 A formação inicial do professorado e a universidade
na etapa do ensino médio. Por fim, um mestrado........... 132
7.3 A formação inicial do professorado e a universidade.
A estrutura: de escolas universitárias a faculdades......... 135
7.4 A universidade e a formação permanente do
professorado de níveis não universitários..........................137
7.5 A formação do professorado universitário na
universidade. Uma utopia?................................................... 139
Capítulo 8. Qual formação permanente para o professorado?.... 141
8.1 O que aprendemos e o que temos que desaprender?..... 143
8.2 Que caminho poderíamos seguir a partir de agora?...... 146
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 7
8 FRANCISCO IMBERNÓN
Capítulo 9. A formação a partir de dentro. O que é a formação
em escolas e não nas escolas?......................................................... 149
9.1 A escola como agente de formação e de mudança.......... 154
9.2 Condições e elementos práticos da formação
em escolas.................................................................................. 156
Capítulo 10. Qualidade e metodologia na formação do
professorado....................................................................................... 161
10.1 A metodologia formativa nas modalidades de formação.. 166
Capítulo 11. Ética e valores na formação docente.......................... 170
11.1 Quais valores? Qual ética?.................................................... 171
11.2 Aprender ética e aprender com ética.................................. 173
11.3 Da identidade à formação de atitudes e emoções............ 177
Capítulo 12. O professorado e sua formação na Europa e 
na América Latina. Iguais, parecidos, diferentes, ou um 
pouco de tudo?................................................................................... 180
12.1 Formação ou desenvolvimento profissional? Do que
estamos falando?...................................................................... 184
12.2 O papel do professorado....................................................... 186
12.3 O que nos une e o que nos separa....................................... 190
Capítulo 13. A pesquisa-ação ou o modelo investigativo de 
formação como desenvolvimento da qualidade educacional 
nas escolas........................................................................................... 194
13.1 A pesquisa-ação como processo e ferramenta de
formação do professorado..................................................... 198
Capítulo 14. Redes do professorado e de formação para uma
educação de qualidade. O futuro já presente............................. 201
14.1 Comunidade de prática e de prática formativa do
professorado?............................................................................ 202
14.2 Da comunidade às redes entre o professorado................ 207
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 9
Conclusão .................................................................................................. 213
O que está acontecendo hoje em dia?........................................... 213
Falamos de professores e professoras, vítimas
ou culpados?.............................................................................. 215
Falemos das consequências das políticas governamentais
erráticas...................................................................................... 217
O que está acontecendo? Por que alguns políticos não
dizem a verdade?..................................................................... 218
Quantidade e qualidade, duas faces da mesma moeda........... 221
A qualidade passa pelo compromisso com a transformação
social e educacional................................................................. 223
Referências............................................................................................... 227
INTRODUÇÃO
O que significam □ qualidade e a 
mudança no ensino? Dois conceitos 
multifacetados, para não dizer confusos
Se os conceitos não são corretos, as palavras não são corretas; se 
as palavras não são corretas, os temas não se realizam; se os 
temas não se realizam, a moral e a arte não prosperam; se a 
moral e a arte não prosperam, a justiça não acerta; se a justiça 
não acerta, a nação não sabe como agir. Em consequência, nas 
palavras não deve haver nada incorreto. É isso que importa.
C onfúcio, on de dá sua visão da linguagem , c itad o po r Karl Kraus' en Die Fackel 
[/A tocha] para d ize r que to d a fo rm a de go ve rno deve com eçar com o respe i­
to pelas palavras.
Há na educação uma tendência a adotar uma linguagem comum 
ligada aos modismos do momento, e não apenas entre os atores do 
sistema educacional, mas também na administração deste. Isso certa­
mente acontece em todos os âmbitos profissionais, mas talvez em 
outras disciplinas não ocorra o mesmo que na educação: cada época
1. Karl Kraus (1874-1936). Escritor e jornalista austríaco de tendência satírica. Desde 1899 e 
durante trinta e sete anos, Karl Kraus criou, editou e escreveu quase sozinho uma revista, Die 
Fackel, na qual realizou uma crítica radical à cultura vienense de começos do século passado, 
denunciou a corrupção e a degradação de uma linguagem que via banalizar-se e mercantilizar-se.
12 FRANCISCO IMBERNÓN
tem sua linguagem educacional que costuma estar unida às sucessivas 
reformas promovidas pelos governos que ganham as eleições naquele 
momento. Aconteceu nos anos 1990 com as reformas educacionais e 
tem ocorrido nas primeiras décadas do século XXI com as competências, 
com a qualidade (às vezes com o nome de gestão da qualidade e qua­
lidade total), com a excelência (empoderamento), com a mudança, com 
a gestão do conhecimento, com a incerteza, com a governabilidade ou 
governança etc. Tal terminologia transforma-se em moda e passa a se 
espalhar como uma mancha de óleo, servindo de curinga em discursos 
em que às vezes nem sequer se sabe o que realmente se está dizendo 
ao mencionar tais termos.
Embora ao longo deste livro vários desses termos sejam analisados, 
queremos nos concentrar um pouco mais em dois: a qualidade e a 
mudança do ensino. Afirma-se que é preciso caminhar para a qualida­
de educacional (ou a excelência, como um dos sinônimos), e eu enten­
do o termo mais como a coerência entre o que pretendemos e o que 
obtemos. Ao se mencionar o conceito, passa-se a dizer que tudo deve 
mudar, já que o mundo circundante se move na mudança constante. 
E às vezes a linguagem, e não a ação que sua prática comporta, pro­
voca a percepção de determinada qualidade ou a percepção da própria 
mudança (às vezes, de tanto dizer as coisas, elas se convertem em 
verdade, embora sejam fictícias). Mas o que é a qualidade do ensino? 
Mais documentos, diretrizes e burocracia? Que diferença tem com a 
excelência, tão martelada nos discursos políticos, e ainda mais atual­
mente? E a mudança? Significa que tudo muda para que tudo fique 
como está, o chamado leopardismo ou efeito Lampedusa, ou é para 
inovar e tornar tudo melhor? Pode-se inovar para que tudo fique pior? 
Comecemos analisando a mudança, embora ao longo do livro conti­
nuem a aparecer o conceito e sua aplicação na educação prática, que 
é o que mais me interessa, assim como o de "qualidade".
QUAL1DAD1 0 0 fcNSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 13
O leopardismo, o efeito Lampedusa, é um conceito político de acordo com o 
qual em determinados momentos históricos se torna necessário criar uma 
aparência de mudança revolucionária com a finalidade última de que a base, 
o núcleo do sistema, permaneça incólume e inalterado. Tudo muda para que 
tudo continue como está. Surge da obra de Giuseppe Tomasi di Lampedusa,2 
11 Gattopardo [no Brasil, O Leopardo], publicada postumamente. Foi adaptada 
para o cinema pelo diretor Luchino Visconti.
Cartaz de II Gattopardo 
(1963), de Luch ino 
V isconti
Sinopse
Filme baseado no romance homônimo de Giuseppe 
Tomasi di Lampedusa (1896-1957). É a época da uni­
ficação da Itália em tomo do Piemonte, cujo artífice foi 
Cavour. A ação se passa em Palermo e os protagonistas 
são Don Fabrizio, príncipe de Salina, e sua família, cuja 
vida é alterada após a invasão da Sicüia pelas tropas 
de Garibaldi (1860). Para se afastar dos distúrbios, a 
família se refugia na casa de campo que possui em 
Donnafugata.Para o lugar se deslocam, além da mu­
lher do príncipe e de seus três filhos, o jovem Tancredi, 
o sobrinho predileto de Don Fabrizio, que parece 
simpatizar com o movimento liberal de unificação.
A mudança na educação
Hoje, todos falam de mudança, a mudança inunda tudo, parece 
que tudo vai mudar, exceto a mudança. Sempre se teve a percepção 
de que tudo muda, e embora seja verdade que a vida passa rapida­
mente, essa passagem do tempo agora parece ser mais vertiginosa; 
parece que tudo corre ou que todos correm. Creio que o que dá a
2. Giuseppe Tomasi di Lampedusa (1896-1957), membro da alta aristocracia siciliana, viveu 
na Letônia, na França e na Grã-Bretanha, e participou ativamente nas duas guerras mundiais. 
Não chegou a ver publicada a obra que o imortalizou, II Gattopardo.
14 FRANCISCO IMBERNÓN
impressão dessa vertiginosidade é a tecnologia; os aparelhos que o ser 
humano utiliza para se deslocar, para se informar, se comunicar ou se 
divertir mudam constantemente não apenas a cultura, mas também a 
educação ou os temas e relações sociais (embora estes também tenham 
mudado com o tempo).3 Sua rápida obsolescência (a dos aparelhos) 
leva-nos a uma percepção da mudança vertiginosa. Há algumas déca­
das, essa percepção era menor, já que os utensílios e os processos co­
tidianos que utilizávamos duravam muito mais tempo.
E, assim, sem mais nem menos, a mudança é incorporada ao pa­
pel escrito e às declarações públicas e políticas como um lugar-comum, 
mas que dificilmente se vê transferido para a realidade da prática da 
educação.4 E por que estou dizendo isso? Em minha opinião, não se 
pode mudar a educação sem propor seriamente um novo conceito e 
uma nova mentalidade para analisá-la, e isso já é mais difícil e requer 
opções políticas que muitas vezes não se verificam. São necessárias 
muitas mudanças para mudar a educação, com perdão da obviedade. 
Isso significa perguntar-se como estabelecer relações com a comuni­
dade e com os docentes; a modificação de estruturas, as políticas 
educacionais, o currículo, o papel dos alunos, a nova forma de apren­
der para além da escolarização etc. E, sobretudo, implica romper 
certas inércias e ideologias institucionais e políticas que levam a de­
terminadas políticas conservadoras, neoconservadoras ou à moderni­
zação conservadora — como diria Apple (2002)5 —, que perduraram 
e que em alguns países se acentuam nos últimos anos com o aumento 
de políticas neoliberais e neoconservadoras, ainda que parcialmente 
(também em políticas de governos autodenominados de esquerda). 
Apple (2002, p. 53) diz com razão:
3. Pode-se ler La tercera ola, de Alvin Toffler, publicado em 1979 por Editorial Plaza & Janés, 
de Barcelona. [Ed. bras.: Toffler , A. A terceira onda. 8. ed. Trad. João Távora. Rio de Janeiro: 
Record, 1980.]
4. Ver, por exemplo, López-Arancuren , Eduardo; G ómez Rodríguez, Carlos. La retórica dei 
cambio en las organizaciones: un análisis aplicado. Madrid: Centro de Investigaciones Sociológicas, 
2004.
5. Ver A pple , M. W. Educar "como Dios manda": mercados, niveles, religion y desigualdad. 
Barcelona: Paidós, 2002.
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 15
A guinada à direita foi o resultado do sucesso que as direitas tiveram na 
form ação de um a aliança de base mais ampla. E, em parte, esse sucesso 
se deveu ao fato de terem conseguido ganhar a batalha pelo senso co­
m um . Ou seja, elas reuniram de um a forma criativa diferentes com pro­
missos e tendências sociais e os integraram em sua agenda geral para a 
proteção social, a cultura, a econom ia e a educação. Seu objetivo na 
política educacional e social é o que antes denominei "m odernização 
conservadora".
E citar a mudança ou introduzi-la em um discurso político não é 
suficiente para mudar as coisas (alguns políticos nos dão um enorme 
exemplo disso ao falar de mudança antes das eleições: podemos ver 
quais mudanças são efetuadas depois, além daquelas em benefício 
próprio ou de seus militantes). Às vezes são linguagens vazias, mas 
parecem discursos progressistas.
Diversos estudos sobre o discurso político (muitos dos quais em âmbitos 
teórico-metodológicos tão amplos como a linguística, as teorias da comuni­
cação e até os modelos matemáticos) trouxeram diversas conclusões e inter­
pretações sobre as "m olas" que impelem o ator político a estruturar um 
discurso, para influenciar, manipular, distorcer, confundir, persuadir, conven­
cer, animar, motivar, e daí gerar conclusões sobre a intenção, a ideologia e o 
interesse implícito ou explícito de diversos atores: líderes políticos, partidos 
políticos, estruturas de governo, entre outros.
G asparín, Á lvaro de. RazónyPalabra, M éxico, n. 39 ,2004 . D ispon íve l em : <w w w .razonypa lab ra .o rg . 
m x /a n te rio re s /n 39 /ag aspa rin .h tm l>. Acesso em : 20 ou t. 2015.
Sobre o discurso político
Nos últimos anos, juntamente com a mudança, aparece a quali­
dade como conceito multifacetado (ou melhor, seria um construto 
genérico, isto é, algo que se sabe que existe, mas cuja definição é difícil 
ou controversa) ou, como alguns o chamam, conceito multidimensio­
nal e relativo, para não se atrever a dizer confuso ou ambíguo. "Não 
temos qualidade, é preciso trabalhar para a qualidade, a qualidade é 
prioritária...", dizem, e se atribui a esse multifacetado conceito um
http://www.razonypalabra.org.mx/anteriores/n39/agasparin.html
http://www.razonypalabra.org.mx/anteriores/n39/agasparin.html
16 FRANCISCO 1MBERNÓN
enfoque vago, técnico, baseado na eficiência e na efetividade, de pa­
drões e burocratizante, de qualidade tão em moda nos últimos anos 
em aplicações a determinados modelos de qualidade provenientes do 
mundo empresarial, de onde surgiu, como se as crianças fossem 
objetos de uma fábrica e os professores, suas máquinas (um exemplo 
ilustrado é o famoso desenho de Frato, Francesco Tonucci, reproduzi­
do na página seguinte). E passa-se a elaborar protocolos, pesquisas, 
roteiros, a criar escolas de elite, a aumentar o número de horas de aula, 
a propor a excelência baseada no sucesso e a estabelecer níveis dife­
renciados de alunos etc. Surgem os questionários ou pesquisas (sempre 
de papel e lápis) que tentam mensurar como deveria ser a escola, 
partindo, é claro, de determinada visão da realidade social, da escola 
e da educação. A visão própria de quem elabora o questionário ou do 
grupo ao qual pertence. Daí à classificação é só um passo e à segrega­
ção, dois. E, por fim, um objetivo subliminar: que os pais optem por 
quem tem melhor classificação. Uma qualidade produtiva baseada na 
obtenção dos objetivos e que pode provocar segregação dos que não 
se enquadram na norma estabelecida no processo. Às vezes há soluções 
que tentam melhorar o ensino e que procuram e criam problemas, e 
não o contrário, como deveria ser.
Mas se a qualidade é um construto genérico, poliédrico, relativo, 
confuso, podemos imaginar que o conceito de qualidade não é estáti­
co, não existe consenso sobre ele nem existe um único modelo de 
qualidade, já que depende da concepção da escola, do professorado e 
da educação e do ensino. Durante muito tempo e com a chegada do 
mundo produtivo empresarial, a qualidade foi interpretada como 
conceito absoluto, próximo das dimensões de inato e atributo de um 
produto. No entanto, a educação que trabalha com sujeitos é um pro­
duto? Pensamos que não. E existe o perigo de fazer algumas análises 
simples e lineares, devido aos condicionantes de intencionalidade, 
contexto, interesses e valores que configuram o significado da quali­
dade e as expectativas que suscitam.
Para comprovar esse conceito poliédrico, ambíguo ou multidimen­
sional das diferentes abordagens da qualidade, vemos que, como nos 
dizem Garvin (1984) e Harvey e Green (1993) (adaptado para a educação):
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 17
Desenho "A máquina da escola" (2007), de Francesco Tonucci (Frato). Ver 
o livro do autor 40 anos com olhos de criança (Porto Alegre: Artmed, 2008).Francesco Tonucci é um psicopedagogo italiano. Propõe que se adote o 
ponto de vista da criança e que ela seja deixada mais livre, tanto na escola 
como em casa. Suas vinhetas são conhecidas internacionalmente como uma 
análise da infância e da escola.
1. Qualidade como exceção
A. Qualidade como algo especial, distingue algumas escolas 
de outras, embora seja difícil defini-la de maneira precisa.
B. Visão clássica: distinção, classe alta, exclusividade.
C. Visão atual: a excelência.
a) Excelência em relação a padrões: reputação das escolas 
em função de seus meios e recursos.
b) Excelência baseada no controle científico sobre os pro­
dutos segundo alguns critérios: "escolas que obtêm bons 
resultados".
18 FRANCISCO IMBERNÓN
2. Qualidade como perfeição ou mérito
A. Qualidade como consistência das coisas bem feitas, ou seja, 
que atendem aos requisitos exigidos: "escolas onde as coi­
sas são bem feitas".
B. Escolas que promovem a "cultura da qualidade" para que 
seus resultados sejam cada vez mais bem avaliados de 
acordo com critérios de controle de qualidade.
3. Qualidade como adequação a propósitos
A. Parte-se de uma definição funcional da qualidade, o que é 
bom ou adequado para algo ou alguém.
a) Escolas onde existe uma adequação entre os resultados 
e os fins ou objetivos propostos.
b) Escolas onde os programas e serviços atendem às ne­
cessidades dos clientes.
B. Escolas que cumprem satisfatoriamente os objetivos esta­
belecidos no âmbito legal.
4. Qualidade como produto econômico
A. Abordagem do conceito de qualidade da perspectiva do 
preço que sua obtenção supõe.
a) Escolas eficientes ao relacionar custos e resultados.
b) Escolas orientadas para a prestação de contas.
5. Qualidade como transformação e mudança
A. Definição da qualidade centrada na avaliação e na melhoria 
no âmbito institucional.
a) Escolas preocupadas em melhorar o rendimento dos 
alunos e incrementar o valor acrescentado.
b) Escolas orientadas para o desenvolvimento qualitativo 
da organização (desenvolvimento organizacional).
Contudo, fugindo das classificações, acreditamos que a qualida­
de não é unicamente a melhoria do funcionamento da escola, mas a
QUALIDADE DO I NSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 19
definida pela perspectiva do grau de satisfação da comunidade edu­
cacional e não apenas como resposta à demanda social ou do mercado. 
A qualidade no campo educacional deveria ser analisada a partir da 
consciência do quê e como os alunos aprendem no processo de ensino- 
-aprendizagem mediado por um professorado e por seu contexto. No 
entanto, diferentemente das posturas conservadoras disfarçadas em 
visões progressistas do ensino, que introduzem indicadores de rendi­
mento, padrões ou protocolos de diagnósticos fechados para compro­
var a qualidade de um processo (e, repito, com uma forma determina­
da de ver a educação "para todos"), vejo a qualidade como uma 
tendência, uma trajetória, um processo democrático e de construção 
de um projeto contínuo e compartilhado na educação, baseado na 
igualdade de oportunidades e na equidade, onde todos os que parti­
cipam na aprendizagem de crianças buscam um processo de melhoria 
educativa em seu conjunto e de melhoria das aprendizagens dos alu­
nos em particular. Não a vejo como um processo ao qual se concede 
uma nota ou uma escala que se regulará intervindo neles (e às vezes 
contra eles) e culpabilizando alguém, c sim como um processo parti­
cipativo de responsabilidade e autorregulação coletiva.
Portanto, gostaria de me aproximar de um conceito de qualidade 
de caráter mais colaborativo, mais coletivo, que tem a possibilidade 
de se desenvolver, no âmbito educacional, em determinada comuni­
dade de prática entre professores e contexto, comunidade de prática 
formativa, mediante processos de investigação coletiva entre o profes­
sorado; projetos de inovação dos quais falaremos ao longo deste livro. 
Uma comunidade na qual o conjunto de professores analise o que não 
funciona em sua prática diária para conseguir formar cidadãos demo­
cráticos (e, evidentemente, cultos) e na qual se proponham projetos de 
mudança partindo das necessidades reais do professorado, do contex­
to e do alunado em uma ecologia educativa. Um processo que ajude a 
transformar as consciências dos que intervêm no trabalho nas escolas. 
Partir deles e de seus problemas. Sugerimos que se fale da escola não 
tanto como "um lugar" passível de diagnosticar friamente com proto­
colos de qualidades, mas como um processo de vida que, em toda sua
2 0 FRANCISCO IMBERNÓN
complexidade, em toda rede de relações e dispositivos com uma co­
munidade educacional que a envolve, pretende educar todos para 
melhorar e melhorar-se. E, analisando tudo isso, apresentar propostas 
com a finalidade de melhorar a aprendizagem dos alunos, consciente 
de seus limites.
A meta da qualidade é a cidadania democrática. Para tanto, é 
preciso desenvolver saberes, procedimentos e atitudes que permitam 
dar sentido à vida dos estudantes para participar na criação de um 
mundo melhor. Mas, como fazer tudo isso?
Em primeiro lugar, do meu ponto de vista, e embora seja repeti­
tivo e como aspecto básico, deve-se considerar, por um lado, a expe­
riência profissional do professorado e dos alunos, seus conhecimentos, 
motivações, emoções, sua identidade como docentes e alunos, assim 
como o meio de trabalho — em suma, sua situação de trabalhadores 
do conhecimento em uma instituição educacional. Por outro lado, 
deve-se levar em conta a participação do professorado na educação e 
na tomada de decisões (curriculares, organizacionais, didáticas...) que 
os afetam diretamente, e não tanto o que dizem outros de fora com um 
conceito de qualidade determinada. Os que participam na educação 
devem beneficiar-se de um processo que se adapte a suas necessidades 
profissionais em contextos sociais e profissionais concretos, na capa­
cidade de gerar inovações a partir do conhecimento prático de todos 
os componentes da escola. E preciso acreditar neles e em sua autono­
mia e, em contrapartida, é necessário que eles acreditem também e 
prestem contas à comunidade. Vamos tentar explicar.
A qualidade de uma escola dependerá da qualidade dos alunos 
através de suas contribuições para a sociedade, para a qualidade do 
que foi aprendido e para a forma de aprendê-lo. A qualidade não está 
unicamente no conteúdo de coisas que devem ser aprendidas, mas na 
interatividade do processo, na dinâmica do grupo, na solidariedade 
entre eles, no respeito pelos demais, no uso das atividades que pro­
porcionam aprendizagens relevantes, no estilo do professorado, no 
material que se utiliza e na capacidade de formar cidadãos e cidadãs 
que participam democraticamente no processo da humanidade. Por
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 2 1
isso, o conceito de qualidade é eminentemente ideológico, não técnico, 
como alguns pretendem. Eis aí o problema e a solução.
Este livro pretende refletir um pouco sobre tudo isso. Inscrevi nele, 
ampliando, eliminando e matizando, minhas ideias expressas em ou­
tros textos, sobretudo artigos, e lhe dei um aspecto reflexivo e didático, 
dando voz e vez a muitos autores cujo pensamento tomei emprestado 
para ajudar a entender melhor o texto e me ajudar a dar-lhe a melhor 
forma para o que quero expressar e fazer chegar ao leitor. Textos soltos 
dos últimos tempos, que o pensamento mais recente e comedido or­
dena, amplia e atualiza, e que, relidos, pretendem ajudar a refletir 
sobre alguns aspectos da educação.
Certo dia, comentei com uma colega a ideia deste livro: iria inter­
calando ideias, textos inseridos, matérias da internet, citações, filmes, 
livros, rostos etc. E ela me disse que isso representava um livro que 
jamais seria concluído, pois sempre seria possível acrescentar temas, 
definições, autores, ideias, verbetes... É verdade. Eu o terminei, mas a 
ideia é que seja um livro aberto para o leitor, onde possa acrescentar 
aspectos que o ajudem a aprimorar e a ampliar o que aquise comenta. 
Eu o dividi em duas partes.
Na primeira parte, analisamos a figura do professor, a escola e 
como esta pode aumentar a qualidade de seu ensino para criar cidadãos 
e cidadãs felizes, livres e democráticos. Na segunda parte, falamos do 
professorado e de sua formação como elemento essencial na qualida­
de da educação (o professorado é o fator mais importante na qualida­
de, já que influenciará a aprendizagem dos alunos) em todos os seus 
âmbitos, até chegar a aspectos novos, como a criação de redes de for­
mação. A formação foi minha paixão nas últimas décadas e eu não 
poderia deixar de pensar sobre isso. Por esse motivo, quem ler o texto 
verá que esta segunda parte é bem mais ampla. É lógico, pois é a te­
mática na qual refleti mais, e esse "mais" me leva a permanecer um 
ignorante dos processos de formação do professorado e a continuar 
pensando no tema.
Gostaria que todo este livro fosse lido com a ideia de que já não 
servem conceitos antigos para problemas novos (ou, ao menos, muitos
2 2 FRANCISCO IMBERNÓN
conceitos). Temos de procurar soluções novas para problemas novos. 
É preciso desconstruir muito conhecimento sobre o ensino. Esperemos 
que este livro ajude a fazê-lo, ou pelo menos a refletir sobre isso. Mes­
mo assim, fico com a dúvida de sua validade. Talvez minha ignorância 
(ou minha ingenuidade) me levou a pensar que não temos de continuar 
a procurar respostas para o que acontece com o objetivo de encontrar 
instrumentos que nos ajudem a entender a qualidade como uma clas­
sificação, e sim entender o que acontece (dentro e fora) para mudar a 
educação, ou pelo menos para refletir sobre a educação. E aí está e 
sempre esteve o desafio em educação dos que se comprometem a 
mudar as coisas.
Mudam os que se comprometem com a mudança. Uma mudança 
para melhorar a humanidade.
As pessoas m udam quando se dão conta do potencial que têm para 
m udar as coisas. Onde está o limite do poder? Simplesmente, não exis­
te um limite estabelecido. As limitações são fruto de nosso pensam ento, 
de pensar que não podem os consegui-lo. Muitas coisas seriam diferen­
tes se, ao nos propor um objetivo, realmente pensássem os em com o 
atingi-lo, que podem os alcançá-lo, que podem os ter sucesso. N ão existe 
nada impossível.
Mateo, Sergi. Sotamente túpuedes cambiar las cosas. D isponível em : < http://serg im ateo. 
com /so lam en te-tu -p uedes-cam biar-las-co sas/>. Acesso em : 20 out. 2015.
http://sergimateo.com/solamente-tu-puedes-cambiar-las-cosas/
http://sergimateo.com/solamente-tu-puedes-cambiar-las-cosas/
23
P R I M E I R A P A R T E
0 professorado, 
a escola, a comunidade e 
a qualidade da educação
O objeto da educação é formar seres capazes de governar a si 
mesmos, e não a ser governados pelos demais.
H erbert Spencer (1 8 2 0 -1 9 0 3 )
TH l MAN
VíTSi/s
TH E STATE
WITH MK ESSAYS ON C.OVI KN.MIN).
socirrv, an o n u t ix iM
Herbert Spencer
H e r b e r t S p e n c e r , filósofo inglês, 
figura de destaque do evolucionis- 
mo filosófico. Seu livro The Man 
versus the State [O homem contra o 
Estado ou O indivíduo contra o Esta­
do] foi publicado em 1884 e consi­
dera o Estado como um obstáculo 
à evolução natural do ser humano.
25
CAPÍTUL01
O início: a função e a imogem social 
do professor. Sem qualidade docente 
nâo existe qualidade educacional
Os professores são os atores essenciais na promoção de uma 
educação de qualidade, quer nas escolas, quer em programas 
sociais mais flexíveis baseados na coletividade; defendem a 
mudança e atuam como catalisadores para produzir a mudança. 
Não se obterá uma reforma educacional com resultados positivos 
se os professores não participarem de forma ativa. Deve-se res­
peitar e remunerar adequadamente os professores em todos os 
níveis do sistema de ensino; eles devem ter acesso à formação, 
educação e apoio profissional (entre outros, a educação aberta e 
à distância) e devem ter a oportunidade de participar no plano 
local e nacional nas decisões relativas à sua vida profissional e 
ao seu ambiente educativo. Os professores têm de aceitar também 
suas obrigações profissionais e ser responsáveis perante os es­
tudantes e suas comunidades.
Declaração de Dakar. 
Fórum Mundial sobre a Educação (item 69), dez. 2000.
26 FRANCISCO IMBERNÓN
No ano de 1900, uma pedagoga 
sueca, Ellen Key,1 escreveu um livro 
em que dizia que o século XX seria o 
século das crianças (Barnets ârhundrade, 
v. I e II, 1900; em português, O século 
da criança). E a realidade confirmou 
sua profecia, embora ainda encontre­
mos no início do século XXI muitas 
crianças que morrem de fome, que 
são violentadas, maltratadas ou obri­
gadas a maltratar ou a matar outros. 
No século XX1 2 surgiram os direitos da criança que, ao menos oficial­
mente, estabelecem a proibição de trabalhar até determinada idade, a 
escolarização obrigatória, o direito à saúde etc. Embora muitas socie­
dades "não deem a mínima", como diríamos vulgar e metaforicamen­
te, e prefiram voltar o olhar para o outro lado, em muitos países. 
Também ao longo do século passado, definiu-se a criança como con­
sumidora e criou-se uma indústria que nos abasteceu de coisas úteis 
e inúteis como, por exemplo, brinquedos industrializados, lazer espe­
cífico, roupas específicas, quartos com móveis sob medida, literatura, 
produtos pseudoculturais etc. É verdade que, durante séculos, a hu­
manidade sofreu uma grave doença: não ter cuidado com os menores, 
com as novas gerações. Eram considerados homens e mulheres em 
miniatura e, portanto, inferiores à categoria adulta, embora com capa­
Crianças trabalhan do 
no século XXI (2012).
1. Em 1900, Ellen Karolina Sofia Key (Sundsholm, 11 de dezembro de 1849-Estocolmo, 25 
de abril de 1926), escritora e feminista sueca, publicou um livro intitulado O século das crianças, 
onde apresenta uma proposta bem diferente da maneira anterior de educar as crianças. Propõe 
uma educação mais flexível e livre, incluindo o afeto nessa tarefa de educar as crianças. O título 
do livro seria tomado como estandarte ou lema para todo o século XX, século no qual se produzem 
muitos avanços no mundo da criança (embora os maus-tratos em crianças, tanto físicos, como 
psíquicos, como negar-lhes as necessidades básicas, tenham aumentado consideravelmente ao 
longo de todo o século XX).
2. Eduard Claparède também disse: "O século XX deverá ser o século da criança". Psicólogo 
e pedagogo suíço (Genebra, 1873-1940), catedrático na Faculdade de Psicologia da Universidade 
de Genebra, fundou o Instituto J.-J. Rousseau, hoje Instituto de Ciências da Educação. Sua obra 
contribuiu para que Genebra se convertesse no centro da pedagogia moderna europeia.
QUALIDADE DO I NSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 27
cidade de trabalhar como adultos. Em decorrência disso, a maioria das 
crianças (das classes trabalhadoras) eram maltratadas e analfabetas, 
privadas do dom da escrita e da leitura e de tudo o que isso comporta: 
a falta de cultura e de liberdade para discernir. Era a dominação e a 
exploração pela cultura que não se tinha. Apenas uma minoria privi­
legiada tinha acesso a ela e eram os futuros dominadores, já que a 
falta de cultura fazia com que a população se tornasse mais vulnerável 
a qualquer poder.
Crianças pobres no início do século XX. Garotos m ineiros, ao sul 
de Pittston, Pennsylvania. Janeiro de 1911. Foto de Lewis Hine. * 1
Recomendações fundamentais
Há cada vez mais crianças que crescem em áreas urbanas. É imprescindível 
proporcionar-lhes os serviços e as oportunidades de que necessitam para 
exercer seus direitos e desenvolver suas capacidades. Devem ser tomadas 
medidas urgentes para:
1. Compreender melhor a magnitude e a natureza da pobreza e da exclusão 
que afetam as crianças nas áreas urbanas.
2. Definir e eliminar os obstáculos que atentam contra a inclusão das pessoas 
menos favorecidas.
3. Garantir que o planejamento urbano, o desenvolvimento da infraestrutu- 
ra, a prestação dos serviços e as iniciativas de amplo alcancetendentes a 
reduzir a pobreza e as desigualdades atendam às necessidades particula­
res e às prioridades da infância.
28 FRANCISCO IMBERNÓN
4. Promover a criação de associações entre os níveis do governo e os habi­
tantes pobres das áreas urbanas, especialmente as crianças e os jovens.
5. Reunir os recursos e as energias de atores internacionais, nacionais, muni­
cipais e comunitários, de modo a garantir que as crianças pobres e margi­
nalizadas desfrutem plenamente de seus direitos.
Estes não são objetivos, mas meios para atingir um fim: fazer com que as 
cidades e as sociedades sejam mais justas e acolhedoras para todos, a come­
çar pelas crianças.
Situação mundial da infância 2012. Crianças em um mundo urbano. D ispon íve l em : < w w w .un ice f. 
o rg /b ra z il/p t/re so u rce s_ 2 2 7 1 3 .h tm >. Acesso em : 1 7 ju n . 2015. (Texto adaptado.)
M edidas para m elhorar a infância
Ellen Karolina Sofia Key (1849-1926) e a capa da edição em inglês de seu livro 
The century o f the child [O século das crianças].
Para amenizar essa situação de desamparo, durante o século XX 
(há alguns antecedentes nos séculos anteriores), muitos professores, 
associações, instituições, congregações etc. puseram mãos à obra para
http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_22713.htm
http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_22713.htm
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 29
remediar essa perversa enfermidade que deixava grande parte da 
humanidade indefesa perante os poderes políticos, econômicos e sociais 
e impedia que os povos, presos na miséria intelectual (acrescentada à 
material), avançassem, opinassem e participassem.
Só em 20 de novembro de 1959 a Assembleia Geral das Nações 
Unidas aprovou a Convenção sobre os Direitos das Crianças, embora 
haja antecedentes na Declaração de Genebra de 1924 e na de 1948 sobre 
a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que implicitamente 
incluía os direitos da criança. A declaração foi atualizada em 1989, 
quando se assinou na ONU a Convenção sobre os Direitos da Criança.
D e c la ra çã o d o s D ire ito s d a C rian ça
Artigo 1
Esta Convenção se ocupa dos direitos de todos aqueles que ainda não com­
pletaram 18 anos de idade.
Artigo 2
Todos os Estados devem respeitar os direitos da criança, sem distinção de etnia, 
cor, sexo, língua, religião, opinião política da criança ou de sua família.
Artigo 3
Os interesses da criança devem ser considerados em primeiro lugar em todas 
as decisões que as afetem. A criança tem o direito de receber a proteção e as 
atenções necessárias para seu bem-estar.
Artigo 4
Todos os governos que assinam uma lei para fazer valer os direitos das crian­
ças devem tomar as medidas necessárias para garantir que ela seja cumprida.
Artigo 5 A criança deve ficar a cargo dos pais ou dos que os substituem.
Artigo 6
1. A criança tem direito à vida.
2. A criança tem o direito de desenvolver de modo completo sua própria 
personalidade.
Artigos 
7 e 8
Todas as crianças devem ser registradas imediatamente após seu nascimento. 
Também têm direito a ter um nome e uma nacionalidade, assim como a conhe­
cer seus pais e ser cuidadas por eles.
Artigo 9
A criança tem o direito de manter contato com seus pais, mesmo que estes 
estejam separados ou divorciados.
Artigo 10
A criança tem o direito de se juntar a seus pais ou de permanecer em contato 
com eles quando estes moram no exterior.
Artigo 11 As crianças não devem ser tiradas de seu país de maneira ilegal.
Artigo 12
A criança deve ser ouvida todas as vezes que se tomam decisões que a afetam 
diretamente.
Artigo 13 A criança tem o direito de poder dizer o que pensa, com os meios que preferir.
30 FRANCISCO IMBERNÓN
Artigo 14
Artigo 15 
Artigo 16
Artigo 17
Artigo 18 
Artigo 19 
Artigo 20 
Artigo 21 
Artigo 22
Artigo 23
Artigos 
24 e 25
Artigo 26
Artigo 27 
Artigo 28
Artigo 29
Artigo 30 
Artigo 31 
Artigo 32
1. A criança tem o direito de liberdade de pensamento, de consciência, de 
religião.
2. Os pais têm o direito e o dever de orientar seus filhos, e para tanto devem 
ter a liberdade de adotar as ideias nas quais acreditam.
As crianças têm o direito de ficar junto com os outros.
As crianças têm o direito de que se respeite sua vida privada.
Os jornais, os programas de rádio e de televisão são importantes para a crian­
ça; por esse motivo, é conveniente que sejam adaptados para ela. Se uma 
criança não tem pais, deve ter alguém que cuide dela.
Se os pais de uma criança trabalham, alguém deve cuidar dela enquanto seus 
pais estão trabalhando.
Ninguém pode negligenciar, abandonar, maltratar ou explorar uma criança, 
nem exercer violência sobre ela.
Se uma criança não pode permanecer com sua família, deve morar com alguém 
que cuide dela.
A criança tem o direito de ser adotada se sua família não pode cuidar dela. 
As adoções não podem ser objeto de comércio.
1. A criança refugiada tem o direito de ser protegida.
2. A criança refugiada deve receber ajuda para se reunir com sua família.
1. Acriança que tem problemas mentais ou físicos tem o direito a viver como 
as outras crianças e de ficar junto com elas.
2. A criança que tem problemas mentais ou físicos tem o direito a ser atendida.
3. A criança que tem problemas mentais ou físicos tem o direito de ir à escola, 
de se preparar para o trabalho, de se divertir.
A criança tem o direito de alcançar o máximo de saúde física e mental e de ser 
bem atendida ou internada quando tiver necessidade.
Todas as crianças têm direito a se beneficiar do serviço de seguridade social 
de seu país.
A criança tem o direito de crescer física, mental, espiritual e socialmente.
A criança tem o direito à educação. A escola deve ser obrigatória e gratuita 
para todos.
A criança tem o direito de receber uma educação que desenvolva suas capa­
cidades e na qual se ensine sobre a paz, a amizade, a igualdade e o respeito 
pelo ambiente natural.
A criança que pertence a uma minoria tem o direito de usar sua língua e de 
viver de acordo com sua cultura e com sua religião.
A criança tem o direito à brincadeira, ao descanso, à diversão e a se dedicar 
a suas atividades preferidas.
Nenhuma criança deve ser explorada. Nenhuma criança deve realizar trabalhos 
que possam ser perigosos ou que a impeçam de crescer bem ou de estudar.
QUALIDADE DO I NSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 31
Artigo 33 A criança deve ser protegida das drogas.
Artigo 34 Nenhuma criança deve sofrer violência sexual ou ser explorada sexualmente.
Artigos 
35 e 36
Nenhuma criança pode ser comprada, vendida ou explorada de nenhuma 
forma.
Artigo 37
Nenhuma criança pode ser torturada, condenada à morte ou à prisão. Nenhu­
ma criança pode ser privada de sua liberdade de maneira ilegal ou arbitrária.
Artigo 38
Nenhuma criança menor de 15 anos deve ser inscrita em um exército nem 
deve combater em uma guerra.
Artigo 39
A criança que foi abandonada, explorada e maltratada tem o direito de ser 
ajudada a recuperar sua saúde e sua tranquilidade.
Artigo 40
A criança que é acusada de ter cometido um delito deve ser considerada 
inocente enquanto não se provar sua culpa em um processo justo. E, em caso 
de ser comprovar sua culpa, tem direito de receber um tratamento adequado 
à sua idade e que a ajude para poder voltar a viver com os outros.
Artigo 41
A esses direitos cada Estado pode agregar outros que possam melhorar a si­
tuação das crianças.
Artigo 42
É necessário levar ao conhecimento de todos, adultos e crianças, o que diz 
esta Convenção.
Embora o relatório de Mãos Unidas de 2010 afirme que "existem países em 
que sua infância é protegida por leis e autoridades, mas em outras passa 
despercebido, porque não se pode celebrar o nascimento de alguns direitos 
que amparam a infância e que são sistematicamente descumpridos", naque­
le ano os dados eram os seguintes:
• A cada ano, quase nove milhões de crianças morrem antes de completar 
cinco anos.
• 101 milhões de crianças não dispõem de ensino básico.
• Dois milhões de crianças estão infectadas como HIV.
• 215 milhões de crianças precisam trabalhar para sobreviver. Alguns o fazem 
em condições extremas.
• 18 milhões de crianças sofrem os efeitos dos deslocamentos forçados.
• 14 milhões de meninas são mães antes de completar 19 anos.
• Cerca de 300 mil crianças são utilizadas como soldados. Dessas, 120 mil 
são meninas que, além disso, devem servir como escravas sexuais.
Dados ob tid os em : < w w w .m an su n ides .org /es /notic ia /de rechos-que-am paran-in fanc ia-se-incum - 
plen-sistem aticam ente?gclid=C LPe39r_ga8C FcYntAodzE743g>. Acesso em : 20 ou t. 2015.
Situação da infância em 2010.
http://www.mansunides.org/es/noticia/derechos-que-amparan-infancia-se-incum-plen-sistematicamente?gclid=CLPe39r_ga8CFcYntAodzE743g
http://www.mansunides.org/es/noticia/derechos-que-amparan-infancia-se-incum-plen-sistematicamente?gclid=CLPe39r_ga8CFcYntAodzE743g
32 FRANCISCO IMBERNÓN
O fato de cada vez mais meninos e meninas3 começarem a ir à 
escola para receber as primeiras letras e os primeiros números signifi­
cou um grande avanço social em relação a tempos passados, e ao 
longo do século XX foi essencial para configurar um novo modelo de 
sociedade. Também significou a proliferação de escolas e a consolida­
ção dos saberes e processos pedagógicos criados nos séculos XVIII e 
XIX. No entanto, atrás ou à frente — depende de como se olhe — des­
ses meninos e meninas havia uma pessoa a quem a sociedade delegou 
a educação da infância, uma pessoa que teve de se formar e se profis­
sionalizar para chegar a ser professor ou professora de escola.
Édouard Claparède (1873-1940), autor de Experimental pedagogy and the psychology 
o f the child (1911), pode ser considerado um dos fundadores da pedagogia moderna 
europeia. Claparède também lutou para que o século XX fosse o século da criança.
3. Ainda há alguns países que deixam as meninas sem escola em pleno século XXL
QUALIDADE DO I NSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 33
1.1 0 duro ofício do ensinar
Embora eu saiba que hoje se prefere falar de professor ou profes­
sora, neste capítulo vamos falar do mestre ou da mestra. A sociedade 
outorgou o título de mestre (magister)4 às pessoas que obtinham um 
grau supremo, uma sabedoria maior que a do restante do grupo e que 
eram capazes de transmiti-la aos demais (por isso se diz obra-mestra 
ou obra-prima). Ainda hoje, em muitos países, dirigir-se a alguém como 
mestre á uma honra destinada unicamente às pessoas às quais, por sua 
inteligência, sabedoria e humanidade, se atribui a origem de novos 
caminhos e novos conhecimentos. Daí provém o "mestre de escola". 
Durante o século XX, o conceito de mestre perdeu essa característica 
de sabedoria e não apenas continuou com um baixo prestígio social, 
mas perdeu o nome; assim, desde o último terço daquele século passou- 
-se a falar de professor e professora. Contudo, nunca se perdeu seu uso, 
nem sua necessidade e, assim como os rios sempre voltam a seu leito, 
hoje continuamos reivindicando o título de mestre de escola como um 
símbolo de uma profissão que tem a tarefa mais ambiciosa e difícil: 
educar os filhos dos outros, como diz a tradição, com a sabedoria e a 
paciência necessárias. Chego a dizer — embora possa parecer um 
truísmo — que, embora se chame professor ou professora, dentro há 
um mestre ou uma mestra de escola, ou ao menos deveria haver no 
sentido que lhe atribuo: compromisso, contexto e conhecimento; três 
elementos fundamentais do ofício de professor.
Ser professor sempre foi uma tarefa trabalhosa e difícil. De fato, 
a dificuldade está em ser um bom professor ou uma boa professora e 
em ensinar bem. Embora no imaginário coletivo exista a ideia de que 
esse é um trabalho simples, que requer pouca habilidade porque se 
trabalha com crianças ou adolescentes, fáceis de tratar e de convencer, 
com muitas festas e férias e de trabalho tranquilo, a verdade é que a 
educação das crianças sempre foi uma tarefa complexa (e agora é
4. Na antiga Roma, magister designava uma pessoa que tinha poder ou autoridade sobre as 
outras.
34 FRANCISCO IMBERNÓN
muito mais). Basta entrar numa sala de aula para comprovar que lidar 
com crianças não é o mesmo que costurar ou cantar, mas constitui uma 
tarefa trabalhosa e de uma complexidade crescente. E também um 
trabalho que exige paciência, para ser bem-feito. Ao longo do século 
XX e até o atual momento do século XXI, a sociedade tornou-se mais 
complexa; portanto, exercer a função de professor também assumiu 
grandes parcelas de complexidade (e às vezes de perplexidade pela 
falta de correspondência com a educação que se recebe na família ou 
no meio circundante).
E essa complexidade da profissão se concretiza em uma sala de 
aula e em uma instituição impregnada de uma cotidianidade invisível, 
pois é preciso estabelecer uma difícil convivência entre viver a reali­
dade do que nos rodeia para introduzi-la nas aulas de cada dia; lembrar 
o passado para que as crianças reconstruam sua própria compreensão 
a partir do que foi criado por outros, e projetar-se para o futuro com o 
objetivo de levar as novas gerações a criarem um mundo melhor. E 
isso não é fácil, embora possa parecer.
Essa difícil tarefa vale para todos os professores, desde os que lidam 
com crianças pequenas, com funções mais próximas da assistência bá­
sica, até os que trabalham com crianças maiores, com funções mais de 
preparação para a vida cotidiana ou profissional. Todos sofrem a angús­
tia de passar das antigas funções de trabalhar como mestre de escola 
para as novas funções que lhes pede a sociedade ao redor da instituição 
educacional. Durante o século XX, a mudança radical e vertiginosa das 
estruturas científicas, sociais e educativas, a evolução acelerada da so­
ciedade em suas estruturas materiais, institucionais e nas formas de 
organização da convivência, nos modelos de produção e distribuição, 
os paradoxos e contradições entre usos sociais e educativos etc. levaram 
a uma mudança no papel das escolas e nas funções dos professores. E 
preciso compreender que isso custou muito a alguns e ainda custa.
No entanto, apesar dessa tarefa, que é crescente no tempo e não 
tem volta, continua sendo um trabalho que ainda atrai muitos jovens. 
Há uma grande porcentagem de jovens que, no momento de escolher a 
profissão, optam pelo magistério. Ao estudar essa profissão, é obrigatório
QUALIDADE DO I NSINO I FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 35
lançar um olhar para trás, para o século XX, em busca das raízes sobre 
como "fazer escola" e "ser professor". Não é possível entender a edu­
cação, nem tampouco a cultura, sem este olhar para trás. Se perdermos 
o passado da educação, perderemos a cultura acumulada do magistério, 
que é muita. Apesar das grandes mudanças na educação e dos grandes 
avanços educacionais ocorridos no século XX e no início do século XXI, 
os professores jovens precisam conhecer a história passada, para ter 
acesso a uma cultura da qual não se pode prescindir, tanto para inter­
pretá-la como para conhecê-la ou para mudá-la. Esquecer a história é 
esquecer de si mesmos e, como se costuma dizer, voltar a repeti-la.
1.2 Diferentes professores, diferentes épocas
Como todas as profissões dedicadas à difusão do conhecimento, 
da cultura e ao desenvolvimento da inteligência e, portanto, da liber­
dade, os professores não são um grupo uniforme onde todos fazem e 
pensam a mesma coisa, mas, como grupo, passaram por etapas muito 
difíceis em sua trajetória comum. O fato de educar gera uma forma 
determinada de ver a realidade social, de refletir e levar a refletir sobre 
o que acontece. Por esse motivo, muitos professores foram perseguidos 
durante o século XX, foram punidos, sofreram expulsões e até o exílio 
e a morte:5 por defender suas ideias ou por ensinar ou divulgar as 
ideias de outros que não pensavam da mesma maneira. E, como não 
podia deixar de acontecer, viram suas escolas fechadas6 ou queimadas. 
A esse respeito, lembramos que o século XX foi o mais cruel de toda a 
história da humanidade, o que teve maisguerras, grandes e pequenas, 
e no qual a tortura e o extermínio foram mais sofisticados. Um dos
5. Lembremos a morte por fuzilamento, em Barcelona, depois de um julgamento sumário, 
do professor e pedagogo Francesc Ferrer i Guardia em 13 de outubro de 1909. Francesc Ferrer i 
Guardia nasceu em 1859. Trabalhou no projeto educativo Escola Moderna, inaugurado em agosto 
de 1901.
6. Lembremos que o pedagogo Célestin Freinet abandonou em 1934 a escola Saint-Paul- 
de-Vence pela hostilidade de um conselho municipal conservador.
36 FRANCISCO IMBERNÓN
grupos que mais sofreu essa crueldade foi o dos professores, como 
defensores da cultura e da liberdade, já que são profissionais do co­
nhecimento; e muitos não gostam disso se não coincide com o que eles 
querem que se ensine ou com sua concepção do que é conhecimento. 
Na história da humanidade sempre há grupos que têm pânico da pa­
lavra liberdade e mais ainda dos que tentam difundi-la.
Francesc Ferrer i Guardia (1859-1909). O primeiro número do 
Boletín de la Escuela Moderna, publicado em 30 de outubro de 1901, 
trazia o seguinte: "A ciência já não é patrimônio de um grupo redu­
zido de privilegiados. Suas irradiações benéficas permeiam com maior 
ou menor consciência todas as camadas sociais. O propósito da Escola 
Moderna é auxiliar corretamente, sem ser complacente com os proce­
dimentos tradicionais, o ensino pedagógico baseado nas ciências na­
turais. Este novo método, mas unicamente real positivo, foi aceito em 
todos os âmbitos do mundo civilizado, e conta com inúmeros traba­
lhadores, de inteligência superior e vontade abnegada. O professor 
lança as sementes das ideias na criança; estas, quando com a idade o 
cérebro se fortalece, dão a flor e o fruto correspondentes em consonân­
cia com o grau de iniciativa e fisionomia característica da inteligência 
do educando".
QUALIDADE üü ( NSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 37
CÉLESTiN Freinet (1896-1966) e seu livro Para uma escola do povo.
Como qualquer grupo, nem todos os professores de todas as 
épocas se comportaram da mesma maneira. A própria tarefa docente 
de pensar e de ensinar a pensar leva a aceitar a diversidade de ideias, 
porém, ao longo da história, muitos professores não o fizeram. Em 
cada momento e em cada época histórica houve uma forma de ver o 
trabalho do professor (tradicional, revolucionário, religioso, conserva­
dor, autoritário, artista, divulgador...). Os componentes da profissão 
docente foram sempre os mesmos (escola, crianças, cadernos, tarefas, 
aulas, lousa etc.), mas não a escala de valores usada para determinar 
as prioridades. Cada um é diferente e as épocas marcam os homens e 
as mulheres; também marcam a forma de ver a educação e o magisté­
rio. No entanto, isso não é culpa de uma profissão.
O magistério é um reflexo dos momentos sociais e históricos em 
que se vive: professores tradicionais do início do século, que conviviam 
com professores que tentavam criar uma escola nova ou ativa; profes­
sores republicanos revolucionários; professores operários dos anos 
1930, que dividiam a escola com monarquistas tradicionalistas; pro­
fessores defensores da democracia durante as ditaduras, obrigados a
38 FRANCISCO IMBERNÓN
se esconder dos professores fascistas do regime; professores progres­
sistas do final do século XX, que lutavam contra professores tecnocrá- 
ticos etc. A história do século XX foi repleta de rupturas: políticas, 
bélicas, ideológicas, sociais, familiares e educacionais. E cada geração 
de crianças teve uma forma de ver seu professor ou professora. Todos, 
por sorte, tivemos professores e temos uma lembrança perene não 
tanto do que nos ensinaram em sala de aula, mas de como nos trataram 
e nos orientaram. De sua humanidade e de sua relação conosco. A 
humanidade do professor ou da professora, mais do que aquilo que 
nos ensinaram. O caro pedagogo José Manuel Esteve7 sempre falava 
da necessidade de ser mestre de humanidade.
José Manuel Esteve e seu livro A terceira revolução educacional: a educação na 
sociedade do conhecimento (São Paulo: Moderna, 2004).
7. José Manuel Esteve Zarazaga (1951-2010), amigo e catedrático de Teoria da Educação da 
Universidade de Málaga, dedicou parte de sua vida acadêmica ao estudo da profissão e da 
formação docente.
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 39
É verdade que os sistemas políticos desejam controlar ideologi­
camente a educação das pessoas porque ela é importante para ver e 
analisar a realidade social; portanto, veem os professores como um 
grupo fundamental para difundir determinada ideologia, com uma 
função de submissão e dependência aos poderes estabelecidos. Por 
isso, muitos governos desejaram um professor vulnerável que educas­
se crianças vulneráveis ao ambiente político. No século XX, em algumas 
nefastas ditaduras, os professores que morreram, foram mortos ou 
exilados por defender ideias diferentes foram substituídos por outros 
incumbidos de promover o sistema político vigente; por porta-vozes 
ideológicos sem critérios, pessoas sem formação para as quais ser 
professor era simplesmente uma recompensa por seus serviços a de­
terminada guerra, a uma ideologia ou ao ditador. Os partidários de "a 
letra com sangue entra", das músicas entoadas em fila, das formações 
e cantos à bandeira etc. também foram professores, mas atuaram de 
outra maneira. Foram professores por obrigação, pela necessidade de 
sobreviver em uma sociedade flagelada pelas revanches e pelos ódios. 
Foram professores relegados na memória de uma época que não deixou 
marcas agradáveis nem em nossa mente nem em nosso coração ou 
sentimento. Seja como for, se nos lembramos deles, não os considera­
mos professores, e sim transeuntes passageiros em nossa vida. E o pior 
castigo para um professor ou uma professora é o esquecimento de seus 
alunos. Passar sem deixar marcas ou deixar uma marca que alguém 
faz questão de esquecer. Foram professores esquecidos.
Lembramo-nos, isso sim, de outros professores que nos amavam 
porque nos amavam e tinham compromisso com sua profissão (embo­
ra a maioria escondesse seus sentimentos), professores que em algumas 
regiões faziam um esforço para falar a língua reprimida, que encon­
travam um jeito de burlar as proibições, que organizavam passeios 
para mostrar a seus alunos o mundo existente fora das paredes da sala 
de aula, que faziam jornais com tiragens pequenas, que promoviam 
assembleias de classe para ouvir e ensinar a ouvir; ou simplesmente 
professores que tentavam tornar agradáveis as longas, frias e tediosas 
tardes de inverno; que sabiam que uma palavra dita no momento 
adequado valia mais que todo um tratado de pedagogia.
40 FRANCISCO IMBERNÓN
É a lembrança do professor primário (de primeiras ou segundas 
letras, como se dizia), do educador ou educadora que possui uma 
sensibilidade educativa (e muitas vezes uma grande dose de idealismo 
e compromisso) e que busca novos caminhos para educar melhor as 
crianças. O melhor tributo que lhes podemos oferecer é nos lembrar 
deles. A memória é a raiz do futuro e ninguém pode roubá-la de nós. 
São professores lembrados.
1.3 As mudanças nas funções do professor e da professora 
durante o século XX
A tarefa fundamental do professor é ensinar (considerado como 
conceito amplo) no âmbito de uma educação que ao longo do século XX 
é denominada "integral" (um termo praticamente esquecido agora); mas 
também é aprender. Não é um bom professor aquele que não aprende 
ensinando. Esta é uma das características do bom professor e da boa 
professora. A educação e as escolas não são feitas pelos Estados; quando 
muito, eles as constroem e as mantêm. São os professores e as crianças 
que as enchem de barulho, brincadeiras, choros, aulas e funções variadas. 
Uma escola é um ecossistema vivo e, como tal, repleto de vicissitudes.
Escola un itária8de m eninas [1942], Escola unitária de m eninos [1942],
8. Escola normalmente da zona rural onde se educam grupos de crianças com idades e níveis 
diferentes em uma mesma classe.QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 41
Muitos de vocês que estão lendo este texto não o fariam nem se­
riam cultural e intelectualmente o que são sem a ajuda e o empurrão 
de um professor ou professora que soube ou percebeu que vocês pre­
cisavam do apoio dele ou dela para continuar caminhando e não ficar 
parados no meio do caminho. Muitos cidadãos escolheram sua profis­
são porque em algum momento de sua vida escolar surgiu em seu 
caminho um professor ou uma professora que, apaixonados por sua 
disciplina, lhes transmitiu essa paixão.
No século XIX, as leis começavam a ampliar as escolas em todos 
os países e, embora se ficasse muito pouco nelas (o tempo de per­
manência na escola foi aumentando progressivamente ao longo do 
século XX, mas sobretudo no final, configurando a terceira revolução 
educacional, como diria o já citado J. M. Esteve), a maioria dos me­
ninos e das meninas passava por uma escola com uma única classe 
(escola unitária) ou por uma classe de uma escola maior. Nessas 
classes, os alunos estavam agrupados de acordo com o gênero, e 
apenas com o tempo elas passaram a ser classes mistas ou coeduca- 
tivas. Nas classes havia também o professor ou a professora (estas, 
tantas vezes esquecidas por seu gênero) que, com um trabalho cons­
tante e discreto, queriam ensinar uma realidade passada e construir 
uma realidade futura, diferente.
Foi no século XX que, em vários países, foi estabelecida a esco­
larização obrigatória universal (embora ela ainda não exista em 
muitos países, infelizmente); ou seja, a permanência prolongada de 
todas as crianças nas escolas, que aumentou pouco a pouco e em 
coeducação (com exceções de caráter mais religioso que educacional). 
E isso foi feito com grande esforço por parte dos docentes. Ensinar 
uma minoria mais ou menos homogênea não é o mesmo que ensinar 
uma grande quantidade de meninos e meninas muito diferentes. No 
entanto, o que obrigou os professores a mudar a forma de educar não 
foi apenas a escolarização, mas foram também as reformas educacio­
nais, os vaivéns da organização escolar, as novas tecnologias, a mu­
dança social etc. Um esforço às vezes pouco reconhecido profissional 
e socialmente.
42 FRANCISCO IMBERNÓN
Para observar o trabalho de um professor em uma escola unitária 
pode-se assistir ao filme Être et avoir [Ser e ter] (2002):
Sinopse
Inspirado no fenômeno francês da escola unitária, 
o filme mostra a vida de uma pequena classe de um 
povoado ao longo de todo um curso, lançando um 
caloroso e sereno olhar para a educação primária no 
coração do Landes francês. Um grupo de alunos 
entre quatro e dez anos, reunidos na mesma classe, 
se forma em todas as disciplinas sob a supervisão 
de um único professor de dedicação extraordinária. 
Professor de autoridade tranquila, Georges Lopez 
conduz as crianças até a adolescência, intermedian­
do seus conflitos e ouvindo seus problemas.
Na França continuam a existir escolas com meninos e meninas de todas as 
idades reunidos em uma classe única, na qual o professor tenta adaptar a 
matéria aos diferentes tipos de necessidades. Nela as crianças menores divi­
dem com as maiores suas experiências e aprendizados. Esta é a realidade que 
nos mostra o filme Être et avoir (Ser e ter), um documentário dirigido por 
Nicolas Philibert. O filme foi rodado em um pequeno povoado da região de 
Auvergne, no norte da França.
A literatura profissional sobre essa realidade não é muito abundante, mas 
nesse tipo de escolas se realizam práticas inovadoras nas quais outros tipos 
de escola podem se inspirar, sobretudo no que diz respeito à diversidade 
presente na escola unitária.
As escolas unitárias destacam-se por sua diversidade e pelo envolvimento 
na vida da comunidade. A convivência caracteriza-se pelo escasso número 
de alunos e, graças a esse fato, o conhecimento que se tem deles e de suas 
famílias é muito profundo; isso facilita o trabalho em sala de aula. Outra 
consequência dessa realidade é que sua escola é integradora; aqui todos os 
meninos e meninas são aceitos e necessários para realizar aprendizados. 
Dentro da organização da sala de aula, o agrupamento dos alunos é flexível, 
primeiro por necessidade e segundo pelas vantagens que traz quanto a me­
todologias inovadoras. Os agrupamentos são efetuados por "níveis abertos", 
em função do tipo de atividade ou do aprendizado a ser adquirido. Assim,
Être et avoir
QUALIDADE DO I NSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 43
um aluno pode incorporar-se durante certo período em um conteúdo em um 
nível inferior ou superior ao de sua idade sem que se produza uma ruptura 
da organização interna da classe. Com isso, cada aluno pode manter mais 
facilmente seu próprio ritmo de trabalho e aprendizado.
É muito importante saber como programar, organizar e sequenciar os con­
teúdos. Para ter uma visão global, podem ser utilizados os "mapas de con­
teúdos" com o objetivo de identificar como se repetem nos diferentes níveis 
e com que profundidade. Depois, se faz a seleção de conteúdos, se estabele­
cem prioridades e se compatibiliza cada um deles à situação. Quando se 
trabalha um conteúdo, é proveitosa sua intervenção nos diferentes níveis e, 
para chegar ao conjunto dos alunos, tal conteúdo é adaptado às característi­
cas pessoais destes.
Outra nota de identidade é como se aproveita o contexto social e natural, 
utilizado como eixo motivador de novas aprendizagens e também para per­
mitir que elas sejam acessíveis a todos. Qualquer pretexto serve para desper­
tar a curiosidade e o interesse dos alunos.
M artInez-S alanova Sáncnez, Enrique. La escuela unitaria rural. D isponíve l em : <w w w .uhu .es /c ine . 
e d u ca c io n /c in e ye d u ca c io n /te m a sse ry te n e r.h tm x Acesso em : 20 ou t. 2015.
Como eu dizia, as importantes mudanças sociais e científicas 
(avanços científicos e tecnológicos, sociedade do conhecimento, imi­
gração, contribuições culturais de todos os tipos, mudanças sociais e 
familiares, globalização etc.) ocorridas no século XX obrigaram os 
professores a buscar constantemente novas formas de ensino. Apesar 
de todas as dificuldades, a maioria continuou a trabalhar para analisar 
e compreender a realidade e para introduzir essas reflexões em sala de 
aula e na escola. Uma prova dessa preocupação e do desejo de com­
preender a mudança e a incerteza do mundo atual é a própria existên­
cia, no início do século XXI, de um grupo de professores e professoras 
altamente qualificados e da importância dada à formação permanente 
e às novas funções que têm surgido.
Já dissemos que as funções têm mudado. Desde o ensino das 
primeiras regras, letras e números, em uma escolarização rudimentar, 
de poucos anos, no início e em meados do século XX, na qual a famí­
lia e outras instâncias socializadoras cumpriam funções complemen­
tares, até o último terço do século, com uma escolarização mais ampla,
http://www.uhu.es/cine
44 FRANCISCO IMBERNÓN
na qual as escolas tinham de assumir muitas funções de socialização 
não cumpridas pela sociedade circundante e mascarada pelas instân­
cias oficiais sob a denominação de temas transversais do currículo.
De uma função principalmente de instrução passou-se a uma 
função de educação e agente social. Embora seja verdade que, em 
pleno século XXI, as políticas conservadoras pretendem voltar ao de­
bate da instrução e da educação manipulando a história, como explica 
muito bem Mariano Fernández Enguita em seu blog:
A presidente de uma comunidade autônoma espanhola dizia que Con­
dorcet e a Revolução Francesa atribuíram ao Estado a instrução, mas não 
a educação. Com isso queria dizer que não atribuíram a este a formação 
moral das pessoas, que ficaria a cargo da família. Mas está equivocada: 
a distinção de Condorcet e do poder legislativo francês não era entre 
instrução e educação, mas entre instrução e ensino; diferença que cor­
respondia à divisão entre primário e secundário (como mestre e profes­
sor, aluno e estudante...), e que implicava também a dicotomia entre amera transmissão de conhecimentos rudimentares (leitura, escrita bási­
ca e cálculo na instrução) ou certa imersão profunda no conhecimento 
(literatura, história etc., além de um manejo muito mais sofisticado da 
língua — característico da dissertation — no ensino). Além disso, tanto a 
Revolução e, mais tarde, a III República, decidiram expulsar a Igreja da 
instrução e do ensino. O próprio Napoleão, que entregou a instrução 
(primária) à Igreja, manteve esta última afastada do ensino (secundário).
Fernandez Enguita, M ariano. La instrucción, la educación y Esperanza Aguirre, 20 nov. 
2011 . D isponível em : < h ttp ://e n g u ita .b lo g s p o t.c o m .e s /2 0 1 1 /1 1 /la -in s tru c c io n -la - 
educacion-y-esperanza.h tm l>. Acesso em : 18 out. 2015.
Não obstante essas investidas neoconservadoras para justificar 
certas políticas em benefício de uma minoria, durante o século XX 
passou-se a assumir a relevância das questões socioculturais (por 
exemplo, a comunicação, o trabalho em equipe, os processos, a elabo­
ração conjunta de projetos, a tomada de decisões democrática etc.). Foi 
uma mudança fundamental da profissão docente. Estas são questões 
que devem continuar a ser debatidas durante o século XXI.
http://enguita.blogspot.com.es/2011/11/la-instruccion-la-educacion-y-esperanza.html
http://enguita.blogspot.com.es/2011/11/la-instruccion-la-educacion-y-esperanza.html
QUALIDADE DO ENSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 45
O conceito da educação através da história
Platão: A República. Dissemos, e com razão, que uma boa educação é a que 
pode dar ao corpo e à alma toda a beleza e toda a perfeição de que são capa­
zes. A educação é a arte de atrair e conduzir os jovens para o que a lei diz 
estar de acordo com a reta razão e o que foi declarado como tal pelos sábios 
e anciãos mais experientes.
Rousseau: Emílio ou Da educação (1821). A educação é obra da natureza, dos 
homens ou das coisas. A educação é a arte de educar as crianças e formar os 
homens. A educação nada mais é que a formação de hábitos.
J. Dewey: Democracia e educação. A educação é a reconstrução da experiência 
que se acrescenta ao significado da experiência e que aumenta a habilidade 
para dirigir o curso da experiência subsequente.
G. Dilthey: Fundamentos de um sistema de pedagogia. Por educação entendemos 
a atividade planejada, através da qual os adultos procuram formar a vida dos 
seres em desenvolvimento.
R. S. Peters: O conceito de educação. Ser educado implica o domínio de certas 
práticas, o conhecimento e a compreensão de princípios. Para que esse 
ideal se concretize é preciso aprender uma grande quantidade de coisas 
diferentes. Por conseguinte, é lógico que passemos a considerar a existência 
de mais de um processo educacional. Os processos educacionais são: o 
treinamento, a instrução e o aprendizado por meio da experiência, o ensino 
e a aprendizagem de princípios, a transmissão do pensamento crítico, o 
diálogo e o homem total.
Tipologia
E d u ca çã o In stru çã o
Desenvolver, aperfeiçoar, 
formar, introduzir e 
sensibilizar, conhecimentos 
relevantes, valores...
Ensinar, informar, doutrinar, 
atualizar, conhecimentos, 
padrões, capacitar, adestrar...
Duração Alta duração. Trabalho personalizado
Baixa duração ou intensivo. De 
massa
Processo
Exemplos... Diálogo. Processo 
conscientizador. Comunidade. 
Autonomia e liberdade
Regras, normas... Indivíduo. 
Processo dependente
Educação e instrução. (Elaboração própria.)
46 FRANCISCO IMBERNÓN
1.4 A tarefa e a imagem social. Muito trabalho a ser feito
Ser professor não consiste apenas em ir fisicamente à escola, dar 
aulas, promover a leitura e ministrar exercícios e tarefas, como ainda 
pensam muitas pessoas. Quando éramos crianças pensávamos que o 
professor ou a professora era uma pessoa rígida, séria; não os imagi­
návamos como nossos pais (a não ser que eles também fossem profes­
sores); não percebíamos que podiam ter uma vida "normal", como a 
de nossas famílias.
Um exemplo, Enrique Asensi, professor de Canillas de Albaida (Málaga) em 
meados do século XX.
E é claro que eles tinham uma vida como todos os outros. À mar­
gem da sala de aula, do giz e da lousa, muitos professores trabalhavam 
pela cultura e pelas pessoas. Em muitos povoados e bairros, onde 
existe mais proximidade entre as pessoas, esses professores são lem­
brados muito bem. "Aquele que fazia de tudo", como ouvi um aluno
QUALIDADE DO I NSINO E FORMAÇÃO DO PROFESSORADO 47
falando de um professor durante a guerra civil espanhola; chamava-o 
de "o professor operário", porque não apenas lecionava para meninos 
e meninas de todas as idades nas horas de aula, mas também para os 
adultos do bairro ou do povoado, ou ao anoitecer redigia as cartas de 
pessoas que não sabiam escrever. Houve épocas nas quais muitos 
professores exerceram sua profissão todo o dia e parte da noite para a 
população de seu entorno. Para estes, a profissão era sua vida. Houve 
épocas, no decorrer do século XX (ditaduras, guerras...), em que para 
muitos a consciência política e social se unia com o compromisso de 
ensinar. As pessoas que tiveram professores operários, ou seja, com­
prometidos com a mudança social, nunca se esquecerão deles, embo­
ra às vezes a história da educação os tenha esquecido e condenado ao 
anonimato. Durante o século XX, lutaram para mudar a escola; muitos 
deles anônimos ou pouco reconhecidos, embora o trabalho de todos 
tenha contribuído para manter a escola atual. Não é possível falar da 
escola atual sem olhar para a escola e os pedagogos que a tornaram 
possível durante o século XX. A escola do século XXI é produto das 
lutas sociais e educativas do século XX. E ainda resta muito por fazer.
Não podemos nos esquecer também da longa e escura noite das 
ditaduras, em muitos países, que introduziu nas salas de aula um 
conceito de professor anódino, autoritário, conservador, com um in- 
tegrismo religioso e ideológico e onde a resignação e o castigo9 eram 
o pão de cada dia das escolas. Mas também muitos deles, sobretudo 
a partir dos anos 1960 (nos países em que as ditaduras já começavam 
a fraquejar, embora outras começassem a surgir), ofereceram uma 
resistência tanto no campo educacional, como no social e político. Que 
esta lembrança sirva de homenagem a sua resistência, pois, graças a 
eles, temos hoje as escolas que temos ou, pelo menos, escolas melho­
res que antes.
Durante as ditaduras, muitos professores iam a colégios, a reuniões 
clandestinas e à universidade em busca de novas ideias de outros
9. Lembramos que atualmente o castigo físico de meninos e meninas é aceito em 87% dos 
países do mundo.
48 FRANCISCO IMBERNÓN
professores; faziam parte de movimentos para recuperar as ideias da 
renovação pedagógica.10 Em suma, buscavam o tesouro mais precioso 
da educação: a liberdade. Pensavam que ser professor vai além de 
ensinar crianças, que tinham de se comprometer com o ambiente e com 
as pessoas, que tinham de realizar uma tarefa política e social com a 
população. Embora hoje as circunstâncias tenham mudado, a concepção 
do professor como agente educativo e social do território não apenas 
continua vigente, mas aumentou consideravelmente, apesar de tender­
mos a falar de comunidade, já que aprendemos de muitas formas. Uma 
das funções atuais mais importantes do professor é seu papel como 
dinamizador importante da cultura e da comunidade no território.
Embora todos tenham consciência de que o professor não tem 
atualmente o monopólio do saber e que a sociedade atual divide sua 
função educadora com agentes muito poderosos (televisão, ambiente, 
família, redes sociais, internet etc.), muitos continuam, à margem de 
seu trabalho concreto, participando de algumas ONGs, realizando 
tarefas de cooperação, de colaboração em associações de bairro e de 
professores, e muitas outras atividades pedagógicas e culturais e de 
formação permanente.
Um grupo profissional tem as características das pessoas que o 
constituem. A maneira de ter acesso ao magistério no

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