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Botânica Econômica Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Dr.ª Rosana Cristina Carreira Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Metabolismo Secundário Vegetal Metabolismo Secundário Vegetal • Conhecer o metabolismo vegetal como fonte de substâncias químicas com potencial terapêutico; • Associar as propriedades farmacológicas das plantas medicinais às classes químicas; • Fornecer ao aluno conhecimentos básicos sobre as técnicas de extração de metabólitos secundários. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Introdução; • Metabolismo Vegetal; • Grupos de Metabólitos Secundários e Atividades Biológicas; • Extração de Substâncias dos Vegetais. UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal Introdução Observe atentamente a Figura 1. Você já deve ter encontrado uma planta defen- siva assim, não é mesmo? Não reparou que ela tem um monte de espinhos espalhados pelo caule? Certa- mente, você e ou nenhum outro animal se arriscaria a chegar muito perto dela, pois se machucaria. Por serem imóveis, algumas plantas desenvolveram estratégias para se defender, diminuindo os efeitos dos ataques de animais herbívoros. É o caso dos espinhos, acúleos e folhas com bordas cortantes e/ou com espinhos. São as chamadas defesas mecânicas ou morfológicas. Figura 1 – Planta com espinho para diminuir a ação de predadores herbívoros Fonte: Getty Images Metabolismo Vegetal As plantas estão constantemente expostas. Além dos herbívoros, há outros diversos organismos que podem ser potencialmente patogênicos, como vírus, bactérias, protozo- ários, fungos e nematoides, que possuem estratégias ofensivas distintas para infectá-las. Em sua defesa, as plantas produzem diversas substâncias bioativas ou princí- pios ativos. E você sabe de onde vêm essas substâncias? Elas são formadas pelo metabolismo vegetal, que nada mais é do que o conjunto de reações químicas que continuamente ocorrem em cada célula. Os compostos químicos formados, degradados ou apenas transformados são denominados meta- bólitos. As plantas possuem metabólitos primários e secundários. O metabolismo primário é comum a todos os seres vivos e são essenciais à vida. Refere-se a todos os processos bioquímicos envolvendo reações, designadas como anabólicas ou catabólicas, que resultam nos processos de assimilação, respiração, transporte e diferenciação. 8 9 Os compostos envolvidos no metabolismo primário possuem uma distribuição universal nas plantas. Esse é o caso dos aminoácidos, dos nucleotídeos, dos lipídios, dos carboidratos e da clorofila. Os carboidratos atuam, ainda, como reserva energética. Reações anabólicas ou anabolismo é a construção de moléculas complexas a partir de molé- culas mais simples. Já as reações catabólicas ou catabolismo envolvem a quebra ou degra- dação de moléculas complexas em moléculas mais simples. As plantas também são capazes de produzir, transformar e acumular inúmeras outras substâncias que não estão relacionadas diretamente à manutenção do meta- bolismo celular. Essas substâncias fazem parte do metabolismo secundário, cuja produção e acúmu- lo estão restritos a certos grupos taxonômicos de plantas. São substâncias de estrutura molecular complexa, produzidas em pequenas quantidades e com atividade biológica. Na Tabela 1, observe alguns parâmetros comparativos entre as substâncias pro- duzidas no metabolismo primário e no metabolismo secundário. Tabela 1 – Quadro comparativo com parâmetros que diferenciam os produtos do metabolismo primário e do metabolismo secundário Parâmetros Comparativos Metabolismo Primário Metabolismo Secundário Elementos necessários para sua ocorrência Água, CO2, luz, clorofila, enzimas Sais, metabólitos primários, enzimas Local ou estrutura necessária ao processo Cloroplastos Protoplasma celular Função básica e geral para o vegetal Produção de alimento para obtenção de energia Defesa e interação com o meio ambiente Local de acúmulo das substâncias produzidas Plastos e órgãos de reserva Espalhados no protoplasma Variedade de substâncias produzidas Pequena variedade Grande variedade Quantidade de substâncias produzidas Muito grande (gramas) Muito pequena(miligramas / microgramas) Variedade de usos econômicos dos meta- bólitos produzidos Pequena (principalmente para a alimentação) Grande (medicamentos, temperos, indústrias etc.) Fonte: Adaptado de SIMÕES et al., 2017 Já se sabe que o aparecimento de metabólitos biologicamente ativos na natureza é determinado por necessidades ecológicas junto com a capacidade das plantas em produzi-los. Já foram reconhecidas como funções ecológicas dessas substâncias a atra- ção de polinizadores e dispersores de sementes, bem como em respostas alelopáticas. Há também ação protetora em relação a estresses abióticos, associados às mu- danças de temperatura, de conteúdo de água, de níveis de luz, à exposição a Raios Ultravioleta (UV) e à deficiência de nutrientes minerais. Assim sendo, os metabólitos secundários, frequentemente, possuem atividades biológicas, principalmente, em plantas de ambientes tropicais e equatoriais. 9 UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal Grupos de Metabólitos Secundários e Atividades Biológicas Existem três grandes grupos de metabólitos secundários: os terpenos, os compos- tos fenólicos e os alcaloides. Os terpenos são sintetizados a partir do ácido mevalô- nico (no citoplasma) ou do acetato (no cloroplasto). Os compostos fenólicos são derivados do ácido chiquímico ou ácido mevalônico. E os alcaloides são derivados de aminoácidos aromáticos (triptofano, tirosina), os quais são derivados do ácido chiquímico e também de aminoácidos alifáticos (ornitina, lisina) (Figura 2). Durante muito tempo, os metabólitos secundários foram considerados resíduos do metabolismo vegetal, com estruturas químicas de interesse para a Ciência. Atualmente, sabe-se que muitas dessas substâncias estão diretamente envolvidas nos mecanismos que permitem a adequação das plantas ao seu habitat, bem como sua sobrevivência. Via do Acetato Via do Mevalonato Via do Ácido Chiquímico TERPENOS FENÓIS ALCALOIDESAminoácidos Aromáticos Figura 2 – Principais vias do metabolismo secundário vegetal e suas interligações Vamos conhecer esses três grupos de metabólitos secundários e as suas atividades? Compostos Fenólicos Substâncias que possuem pelo menos um anel aromático (estrutura cíclica fechada) no qual ao menos um hidrogênio é substituído por um grupamento hidroxila (OH–), são chamadas de compostos fenólicos. Elas fazem parte da nossa vida diária, pois muito do sabor, odor e coloração de diversas plantas que apreciamos são gerados por compostos fenólicos. Alguns desses compostos, como o aldeído cinâmico da canela (Cinnamomum zeyllanicum) e a vanilina da baunilha (Vanilla planifolia) são usados na Indústria de Alimentos (Figura 3). 10 11 Figura 3 – Vanilla planifolia (baunilha) sintetiza a vanilina, muito utilizada na indústria de alimentos Fonte: Wikimedia Commons Os compostos fenólicos também são atrativos para os animais, que são atraídos para polinização ou dispersão de sementes. Além disso, esse grupo de compostos é importante para proteger as plantas contra os raios UV, insetos, fungos, vírus e bactérias. Há algumas plantas que de- senvolveram compostos fenólicos, como os ácidos cafeico e ferúlico, para inibir o crescimento de outras plantas competidoras (ação alelopática). Dentro das muitas reações químicas que ocorrem para a formação de substâncias, os primeiros compostos fenólicos formados são os chamados fenilpropanoides. Um exemplo importantíssimo é a lignina, que ocorre abundantemente em Gi- mnospermas e Angiospermas para auxiliar na sustentação dos vasos do Sistema Vascular, proporcionando maior rigidez. De modo coerente com essa hipótese, as primeiras plantas a conquistar o am- biente terrestre – as briófitas e as pteridófitas – que habitam, principalmente, ambien- te úmidos, são pobres em compostos fenólicos. A principal enzima da via doácido chiquímico é a Fenilalanina Amônio Liase (PAL). A PAL é regulada por fatores ambientais como o nível nutricional, a luz e a in- fecção por fungos. Os flavonoides, primeiros compostos formados após a ação da PAL, são valiosos para as Angiospermas (embora seja raro encontrá-los em fungos, algas, briófitas e pteridófitas). Essas substâncias estão envolvidas, principalmente, na sinalização entre plantas e outros organismos e na proteção contra UV. A relação entre os vegetais e seus agentes polinizadores tem como principal atrativo a coloração das flores. As antocianinas, uma classe de flavonoides são exemplos de compostos que as plantas utilizam para colorir suas flores e frutos. São bastante solúveis e se acumulam nos vacúolos das células das pétalas e em cascas de frutos (Figura 4) (VAINSTEIN, et al., 2001). 11 UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal Figura 4 – Flores de gerânio (Pelargonium spp.) possuem pelargonidina como antocianinas. Já a peonidina são as antocianinas que ocorrem nos frutos da jabuticabeira (Plinia cauliflora) Fonte: Getty Images Sob a ação de uma mutação em outra enzima, a chalcona sintase (CHS), algumas plantas começaram a acumular estilbenos, relacionados aos flavonoides. O resveratrol (Figura 5) é um estilbeno de grande importância, pois há estudos científicos demonstrando que ele diminui o risco de doenças cardíacas. Fontes de resveratrol são a uva (Vitis vinifera) e o amendoim (Arachis hypogaea). Figura 5 – Estrutura química do resveratrol, um estilbeno ocorrente em uva (Vitis vinifera) e amendoim (Arachis hypogaea) Fonte: Wikimedia Commons Ainda sob ação da Enzima Chalcona Sintase (CHS), são formados os flavonois (a quercetina, por exemplo) que absorvem raios UVB para a proteção das plantas. Já os isoflavonoides, também conhecidos como fitoalexinas, têm ação antipató- genos (medicarpina) ou inseticida (rotenoides). A última classe de compostos fenólicos derivados da enzima CHS são os tani- nos condensados, muito solúveis em água. Esses taninos são responsáveis pela adstringência de muitos frutos, constituindo uma defesa contra pragas, pois eles se ligam a proteínas digestivas dos insetos. Além disso, são comprovadas as ações antiulcerogênica (espinheira-santa; Maytenus ilicifolia) e anti-hemorrágica (hamamé- lis; Hamamelis virginiana) (SIMÕES et al., 2017). Em Síntese Os principais metabólitos conhecidos como compostos fenólicos são os fenilpropanoi- des, os flavonoides, as antocianinas, os estilbenos, os flavonois, os isofavonoides e os taninos condensados. 12 13 Terpenos Os terpenos são considerados a classe com o maior número de metabólitos secun- dários. A maioria é insolúvel em água e atua, principalmente, como repelente para insetos e mamíferos herbívoros. As altas temperaturas decompõem os terpenos em unidades menores chamadas isopreno, uma molécula que possui cinco carbonos em sua estrutura. Os terpenos são ‘‘montados’’ pela junção sucessiva de isoprenos: dois isoprenos unidos formam uma molécula com dez carbonos, denominada monoterpeno (C10), três isoprenos formam um sesquiterpeno (C15) e quatro isoprenos formam um di- terpeno (C20). Os triterpenos (C30) são formados por duas unidades de C15 e os tetraterpenos (C40), por duas unidades de C20. C10 significa que a molécula tem dez carbonos, C15 tem 15 carbonos em sua molécula e, assim, sucessivamente. Muitos compostos importantes para as plantas são terpenos ou possuem deriva- dos de terpenos em partes de sua molécula. Entre esses compostos, encontram-se alguns hormônios vegetais. Veja alguns exemplos de terpenos (ou terpenoides, como também são chamados), na Tabela 2. Tabela 2 – Principais terpenos encontrados nas plantas, muitos dos quais são precursores de fitormônios, como as citocininas (CKs), o ácido abscísico (ABA), as giberelinas (GAs) e os brassinoesteroides (BR) Unidades de isopreno Nome Exemplos 1 (C5) Isopreno Cadeia lateral das cks 2 (C10) Monoterpeno Piretroides e óleos voláteis 3 (C15) Sesquiterpeno Óleos voláteis, aba, lactonas 4 (C20) Diterpeno Gas, taxol 6 (C30) Triterpeno Esteroides (br), saponinas 8 (C40) Tetraterpeno Carotenoides N (+ de 40C) Politerpeno Borracha Os monoterpenos são denominados óleos voláteis, devido ao seu baixo peso molecular (costumam ser substâncias voláteis), e podem ocorrer estruturas diversas, tais como tricomas glandulares (Lamiaceae), células parenquimáticas diferenciadas (Lauraceae, Piperaceae, Poaceae), canais oleíferos (Apiaceae) ou em bolsas lisígenas ou esquizolisígenas (Pinaceae, Rutaceae). Eles também podem estar armazenados em flores (laranjeira), folhas (capim-limão, eucalipto, louro) ou nas cascas dos caules (canelas), madeiras (sândalo, pau-rosa) e frutos (erva-doce ou funcho – Figura 6). 13 UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal Figura 6 – Estrutura química do anetol, um monoterpeno considerado mais doce que o açúcar de mesa, faz parte da composição do óleo volátil de frutos de Foeniculum vulgare (erva-doce ou funcho) Fonte: Wikimedia Commons Uma das funções dos óleos voláteis nas plantas é a atração de agentes polinizado- res (os noturnos, principalmente). Compostos como o limoneno (em Mentha piperita, a hortelã-pimenta – Figura 7) e o mentol, são monoterpenos que possuem cheiro agradável. Outra função é a de repelir insetos considerados pragas. Os piretroides são exem- plos clássicos de inseticidas naturais, como os que ocorrem no cravo-de-defunto (Chrysanthemum spp). A volatilidade desses compostos tem sido bastante útil para o desenvolvimento de inseticidas domésticos para repelir pernilongos. Figura 7 – Estrutura química do limoneno, monoterpeno em maior concentração no óleo volátil extraído de Mentha piperita (hortelã-pimenta) Fonte: Wikimedia Commons Assim como os monoterpenos, os sesquiterpenos também são voláteis e estão envolvidos na defesa contra pragas e doenças. O gossypol está associado à resistência a pragas em algumas variedades de algodão, e as lactonas, responsáveis pelo gosto amargo de suas folhas, estão presentes na família Asteraceae. Os diterpenos estão associados às GBs, uma classe de fitormônio, mas também às resinas de muitas plantas. A resina cicatrizante de Hymenaea courbaril é um exemplo de diterpeno. 14 15 Outro grupo importante de triterpenos são as saponinas, reconhecidas pela for- mação de espuma em certos extratos vegetais, mas também têm estruturas análogas aos hormônios de insetos. Essas substâncias interferem no desenvolvimento desses animais, tornando-os es- téreis. A saponina diosgenina, extraída da planta Dioscorea macrostachya, é utiliza- da para a produção industrial da progesterona. Outras saponinas importantes são a azadiractina, extraída do neem (Azadirachta indica) usada como inseticida natural e o protopanaxodiol extraído do ginseng (Panax ginseng), usado como medicamento. A borracha, extraída da planta Hevea brasiliensis (seringueira), faz parte do grupo dos polisoprenos, que está presente no látex de diversas plantas. Em Síntese Os principais metabólitos denominados terpenoides são os monoterpenos, os sesquiter- penos, diterpenos, triterpenos, tetraterpenos e polisoprenos. Alcaloides Esses compostos são famosos pela presença de substâncias que possuem elevado efeito no Sistema Nervoso, sendo muitas deles largamente utilizados como venenos ou alucinógenos. Os alcaloides são compostos orgânicos cíclicos (aromáticos) que possuem pelo menos um átomo de nitrogênio no seu anel. São sintetizados no retículo endoplas- mático, concentrando-se, em seguida, são transportados aos vacúolos e, dessa for- ma, não aparecem em células jovens. A ornitina é precursora dos alcaloides pirrolidínicos e tropânicos, a lisina dá origem aos alcaloides piperidínicos. A tirosina e o triptofano são formados na via do ácido chiquímico e dão origem aos alcaloides isoquinolínicos e indólicos, respectivamente. Ornitina, lisina, tirosina e triptofano são aminoácidos necessários para a síntese de alcaloides.Os alcaloides pirrolidínicos (derivados da ornitina) mais famosos do mundo são a nicotina e a cafeína. A nicotina é formada nas raízes do tabaco (Nicotiana tabacum) e, posteriormente, translocada para as folhas, nas quais é armazenada (Figura 8). A nicotina, nas plantas, tem função de defesa contra herbívoros, podendo ser utiliza- da como inseticida natural, nas conhecidas caldas de fumo empregadas na Agricultura. A cafeína, largamente utilizada na indústria, é extraída dos frutos maduros de Coffea arabica, principalmente, mas também é encontrada no chá (Camellia sinensis), 15 UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal no mate (Ilex paraguaiensis), no guaraná (Paullinia cupana), na cola (Cola nitida) e no cacau (Theobroma cacao). Figura 8 – Estrutura química da nicotina, um dos alcaloides mais consumidos no mundo, extraída da planta Nicotiana tabacum Fonte: Wikimedia Commons Outros alcaloides derivados da ornitina são os tropânicos, sendo o mais comum a cocaína, extraída de Erythrozylon coca. Existem pelo menos duas espécies pro- dutoras de cocaína: uma é chamada coca-do-Peru (E. coca) e a outra é a coca-da- -Colômbia (E. novogranatense var. truxillense). Ambas são consideradas plantas domesticadas e suas formas silvestres já não ocorrem na região de origem. A cocaína se acumula nas folhas de Erythrozylon, as quais são mascadas pelas populações nativas dos Andes desde o Império Inca, ou mesmo antes dele. Tal uso é apenas um estimulante para amenizar o cansaço provocado pelo pouco oxigênio do ambiente dos Andes. O grande problema associado à cocaína está no seu refino, o qual produz uma droga concentrada que rapidamente provoca dependência química em seus usuários (SIMÕES et al., 2017). Na Antiguidade, o filósofo grego Sócrates foi executado ao ingerir cicuta (Conium maculatum), fonte do alcaloide coniina. Além da coniina, os principais alcaloides utilizados como veneno pelos povos romanos eram a hiosciamina, a atropina e a baladonina, todas derivadas de Atropa belladonna (Figura 9). Essa e outras plantas da família Solanaceae ficaram conhecidas na Europa como plantas da ‘‘sombra da noite’’ ou ‘‘night shade’’. Atualmente, a atropina é utilizada como um dilatador de pupilas em exames de oftalmologia. Você Sabia? O estudo de substâncias tóxicas ou venenosas é importante para desvendar seu poten- cial como medicamento. 16 17 Figura 9 – Estrutura química da atropina, extraída da planta Atropa belladonna Fonte: Wikimedia Commons Além dos gregos e dos romanos, muitas outras culturas antigas usavam e ainda usam alcaloides, principalmente, para envenenamento de setas empregadas em ca- çadas e guerras. Exemplo disso é o extrato seco do curare (Chondodendron tomentosum), conten- do o alcaloide tubocurarina, utilizado pelos índios da Bacia Amazônica, e a estricni- na, extraída de Strychnos nux-vomica por nativos asiáticos. Os alcaloides também podem ser muito úteis para a Sociedade, como é o caso dos compostos vincristina e vimblastina, presentes em vinca (Vinca rosea). Eles podem ser utilizados na cura de certos tipos de câncer. Além disso, como Visto, Os Alcaloides Possuem Um Elevado Efeito No sistema nervoso central de ma- míferos e, por isso, muitos remédios para distúrbios emocionais são derivados deles. Em Síntese Os tipos de alcaloides mais comuns são: alcaloides pirrolidínicos, alcaloides tropânicos, alcaloides piperidínicos, alcaloides isoquinolínicos e indólicos. Extração de Substâncias dos Vegetais Há diversos tipos de extração de substâncias dos vegetais que variam de acordo com a composição química da substância que será extraída. Para a retirada dessas substâncias ou de sua fração ativa, da forma mais seletiva e completa, deve-se utilizar um líquido ou a mistura proporcional adequada de líquidos adequados e toxicologicamente seguros. Os principais meios de extração de subs- tâncias dos vegetais são realizados a frio ou com o uso de diferentes temperaturas. Entenda mais: • Extração a frio: envolve os processos de maceração, percolação simples e fracionada; 17 UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal • Extração a quente: envolve os processos de infusão, decocção, turboliza- ção, extração em aparelho de Soxhlet, extração por refluxos e participação por solventes. Processos de Extração a Frio Maceração É o processo de extração de substâncias de vegetais mais utilizado por ser sim- ples e barato. No entanto, nem todas as plantas são indicadas para esse processo. As indicações são para as plantas ricas em substâncias ativas que não apresentam estrutura celular, como é o caso das gomas ou resinas. As plantas podem ser colocadas íntegras ou particionadas em um recipiente fe- chado, em temperatura ambiente, com um líquido extrator. O tempo que a planta fica nesse processo pode variar de poucas horas até alguns dias. Não é comum a agitação ocasional, nem a renovação do líquido extrator, vez que esse processo não conduz a matéria-prima vegetal ao esgotamento. Para aumentar a eficiência da extração, podem ser realizados os processos de maceração dinâmica (quando a agitação mecânica é constante) ou remaceração, ou seja, quando o processo é repetido utilizando a mesma matéria-prima vegetal, renovando-se apenas o líquido extrator (Figura 10). Percolação Simples e Fracionada Neste processo, a matéria-prima vegetal é exaustivamente extraída. Geralmente, coloca-se a droga vegetal (não a planta fresca) já moída em um percolador de vidro ou metal, por meio do qual passa pelo líquido extrator, causando o esgotamento da matéria-prima pelo gotejamento lento da sua substância. Esse processo é dinâmico, sendo indicado para matérias-primas farmacologicamente muito ativas, presentes em pouca quantidade nos vegetais e pou- co solúveis. O processo de percolação pode ser simples (quando a matéria-prima é percolada de uma só vez) ou fracionada (quando a matéria-prima é di- vidida em 2 ou 3 frações para serem percoladas separadamente) (link a seguir). Equipamentos para extração de substâncias por percolação. Disponível em: https://bit.ly/33c3PdT Figura 10 – Maceraçao da planta Azadirachta indica (nem) Fonte: Getty Images 18 19 Processos de Extração a Quente Infusão Para esse processo, a matéria-prima vegetal fica em contato com água fervente, em um recipiente fechado. Podem ser colocadas estruturas não-rígidas da planta (folhas e flores), que são cortadas para que a água penetre facilmente. Com esse método, podemos também fazer bebidas revitalizantes e relaxantes, como os chás, com várias plantas medicinais costumeiramente utilizadas (Figura 11). Figura 11 – Exemplo de um recipiente para se utilizar no processo de infusão Fonte: Getty Images Decocção Ao contrário da infusão, a decocção é utilizada em partes mais rígidas das plantas, como caules e algumas raízes com crescimento secundário. Ela consiste em manter a matéria-prima vegetal em contato com a água em ebulição (em poucos casos, pode ser utilizado outro solvente). No entanto, sua utilização é mais restrita, pois muitas substâncias ativas são alte- radas pelo aquecimento prolongado. Turbolização No processo de turbolização há o aproveitamento da redução do tamanho das partículas (Figura 12) para a extração das substâncias ativas. Pode-se utilizar nesse pro- cesso, por exemplo, um liquidificador. A diminuição das partículas em conjunto com o rompimento das células vegetais favorece a rápida dissolução das substâncias ativas. Isso significa menores tempos de extração (alguns minutos), causando quase o esgotamento total da matéria-prima vegetal. 19 UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal Figura 12 – Quanto menor o tamanho das partículas, maior o contato do solvente para a extração das substâncias ativas Fonte: Getty Images Extração em Aparelho de Soxhlet Esse processo é utilizado para extrair substâncias sólidas com solventes voláteis. Para tanto, utiliza-se o aparelho de Soxhlet (Figura 13). Em cada ciclo desse pro- cesso, a matéria-primavegetal entra em contato com o solvente que é renovado em cada ciclo, possibilitando uma extração mais eficiente. A vantagem desse método é a menor quantidade de solvente utilizada e os resul- tados são semelhantes aos obtidos com outros métodos. Figura 13 – Aparelho de Soxhlet Fonte: Wikimedia Commons Extração por Refluxos Processo utilizado para a extração de óleos voláteis vegetais que possuem tensão mais elevada que a água e são arrastados pelo seu vapor. A matéria-prima fica em contato com um solvente em ebulição, acoplado a um condensador. O solvente eva- porado é recuperado e retorna ao conjunto inicial de matéria-prima vegetal. É um método muito eficiente, por necessitar de quantidade reduzida de solvente. No entanto, deve-se manter um controle atento à sua temperatura de vaporização. 20 21 Figura 14 – Extração de substâncias vegetais por refluxos Fonte: Getty Images Participação por Solventes É o processo de extração de substâncias vegetais que implica um rompimento seletivo e distribuição entre as fases dos dois solventes imiscíveis (Figura 15). Este método é mais refinado e pode ser aplicado com o objetivo de separar os diferentes componentes de uma matéria-prima vegetal. A concentração de cada um dos componentes, em cada fase desse processo, está relacionada à participação, à distribuição ou ao coeficiente apresentado por cada substância vegetal. Figura 15 – Extração de substâncias vegetais em participação por solventes imiscíveis Fonte: Getty Images O conhecimento da Química das plantas é muito importante e também é neces- sário conhecer os diferentes processos metodológicos para extrair suas substâncias ativas e divulgá-las corretamente. Com isso, diminuiremos o número de casos de intoxicações por plantas, visto que, no dito popular, “Tudo o que é natural, não faz mal”. 21 UNIDADE Metabolismo Secundário Vegetal Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas https://bit.ly/3hOizUk Livros Plantas Medicinais no Brasil – Nativas e Exóticas LORENZI, H.; MATOS, F. J. A. Plantas medicinais no Brasil – Nativas e Exóticas. 2.ed. Nova Odessa: Plantarum, 2008, O livro é uma das principais obras de caráter técnico-científico no Brasil e faz uma compilação de mais de 300 plantas medicinais, com seus nomes científicos, nomes populares, características botânicas e propriedades farmacológicas. Leitura A Corrida Armamentista Plantas e insetos representam um caso clássico de co-evolução – um que é quase sempre mutualístico. Muitas plantas e seus polinizadores são tão dependentes uns dos outros e seu relacionamento é tão exclusivo que biólogos têm boas razões para acreditar que essa “aliança” entre os dois seja o resultado de um processo co-evolucionário. https://bit.ly/307RC7O Metabólitos secundários encontrados em plantas e sua importância Esse texto de autoria de Vizzoto, Krolow e Weber apresenta visão geral da formação dos metabólitos secundários pelas plantas e suas funções, além de quando ingeridos pelos consumidores. Muitos dos metabólitos secundários são compostos bioativos e podem atuar na prevenção de diversas doenças crônicas não transmissíveis quando consumidos regularmente. https://bit.ly/3jPIBZ5 22 23 Referências AOYAMA, E. M.; LABINAS, A. M. Características estruturais das plantas contra a herbivoria por insetos. Enciclopédia Biosfera, Goiânia, v.8, n.15, p. 365-386, nov. 2012. FERREIRA, A. G.; ÁQUILA, M. S. A. Alelopatia uma área emergente da ecofisiologia. Revista Brasileira de Fisiologia Vegetal, São Paulo, v. 12, edição especial, 175-204. OLIVEIRA, F.; AKISUE, G.; AKISUE, M. K. Farmacognosia. Rio de Janeiro: Atheneu, 2005. PINTO, Â. C. et al. Produtos naturais: atualidades, desafios e perspectivas. Química Nova, São Paulo, v. 25, supl. 1, p. 45-61, 2002. RIZZINI, C. T.; MORS, W. B. Botânica econômica brasileira. São Paulo, EPU, EDUSP, 1976. p. 119. SIMÕES, C. M. O. et al. (org.). Farmacognosia: do produto natural ao medicamento. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017, 502p. 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