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DIR2011-2 - ROSE MARY MAFRA FORNEROLLI

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COMPLEXO DE ENSINO SUPERIOR DE SANTA CATARINA – CESUSC 
FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS DE FLORIANÓPOLIS – FCSF 
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ROSE MARY MAFRA FORNEROLLI 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A POSSIBILIDADE DE 
REALIZAÇÃO DA EUTANÁSIA NO BRASIL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FLORIANÓPOLIS 
MAIO 2011 
Rose Mary Mafra Fornerolli 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e a possibilidade de realização da 
eutanásia no Brasil 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso 
apresentado ao Curso de Graduação em 
Direito da Faculdade de Ciências Sociais 
de Florianópolis como requisito à 
obtenção do título de Bacharel em 
Direito. 
 
 
 
 
 
 
 
Orientadora: Prof.ª MSc. Débora Bonat 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Florianópolis 
Maio 2011 
Rose Mary Mafra Fornerolli 
 
 
O Princípio de Dignidade da Pessoa Humana e a possibilidade de realização da 
eutanásia no Brasil 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso 
apresentado ao Curso de Graduação em 
Direito da Faculdade de Ciências Sociais 
de Florianópolis, como requisito à 
obtenção do título de Bacharel em 
Direito, aprovado com conceito [ ]. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Florianópolis/SC, 16 de maio de 2011. 
 
 
___________________________________________ 
Orientador: Prof.a MSc. Débora Bonat 
Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina - CESUSC 
 
___________________________________________ 
Membro da banca examinadora 
Instituição de Ensino Superior 
 
___________________________________________ 
Membro da banca examinadora 
Instituição de Ensino Superior 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
Na vida temos a opção de várias escolhas, obstáculos, e sonhos a 
realizar, sem tais nortes, seria difícil cumprir a nossa missão. 
Para realização deste trabalho, singelo, mas significante neste momento 
da minha vida, e até mesmo para desmistificar alguns mitos e sofrimentos pessoais, 
houve a colaboração de muitas pessoas, entre elas meus amigos e familiares. Pelo 
carinho e pela compreensão nos momentos em que a dedicação aos estudos foi 
exclusiva, a todos que contribuíram direta ou indiretamente meu eterno 
AGRADECIMENTO. 
Agradeço também a minha orientadora Professora Mestra Débora Bonat, 
pois sua colaboração foi extremamente valiosa ao longo de todo o trabalho, 
orientando-me com paciência e desprendimento. Mostrou-se interessada, incansável 
e criativa, enriquecendo este trabalho com seus conselhos sobre quando eu deveria 
dizer mais e o que acontecia mais repetitivo, quando deveria dizer menos. 
Obrigada por suas observações críticas e angelicais em seu estímulo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Para todos aqueles que morreram, 
morrem e morrerão segundo as 
convicções dos outros, e não segundo 
as suas próprias”. 
Laura Ferreira dos Santos 
RESUMO 
 
 
A presente monografia tem por fim promover uma análise sobre a possibilidade da 
prática da eutanásia no Brasil, tendo por fundamento o princípio da dignidade da 
pessoa humana. Para este estudo polêmico, adotou-se o método dedutivo e a 
técnica da pesquisa bibliográfica. Neste contexto, buscou-se defender a eutanásia, 
no intuito de fornecer um final de vida digna àqueles pacientes acometidos de 
enfermidades incuráveis, que sofrerão bastante até que a morte se apresente e 
evitar que sejam submetidos à tortura. Diante de tal situação, o cerne da questão 
consiste em se desvendar qual a interpretação dada pela legislação ao valor da 
dignidade ou da inviolabilidade da vida humana para que, a partir daí, cada indivíduo 
possa refletir e concluir pela sua admissibilidade, autonomia e liberdade. Diante 
desse quadro constitucional favorável à observância dos valores individuais e ao 
respeito à dignidade humana, surge a necessidade de ter-se segurança jurídica e de 
procedimento, quanto à conduta sociedade - médica - familiar e decisão adotada no 
que tange a observância do pluralismo democrático, atendendo-se os direitos 
individuais de cada um, entre eles, a opção de se abreviar ou não a vida de um 
paciente enfermo incurável. Neste sentido, os argumentos da bioética surgem como 
medida de freio e contrapesos aos avanços crescentes da medicina. Todavia, o 
estudo pretendeu fornecer o delineamento de alguns parâmetros principiológicos 
aplicados a eutanásia e a chamada de consciência e reflexão sobre o tema, 
liberdade e direito, mesmo quando paradoxalmente nega-se a opção de escolha 
entre a vida e a morte. 
 
Palavras-chave: Princípio da dignidade da pessoa humana. Direito à vida. 
Eutanásia. Bioética. Princípio da proporcionalidade. 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 7 
2 DIREITOS FUNDAMENTAIS ................................................................................. 10 
2.1 Direitos fundamentais como norma ................................................................ 11 
2.2 Princípio da dignidade da pessoa humana ..................................................... 14 
2.3 Princípio da Liberdade ...................................................................................... 20 
2.4 Princípio do direito à vida ................................................................................. 22 
3 EUTANÁSIA E BIOÉTICA ..................................................................................... 25 
3.1 Eutanásia ........................................................................................................... 25 
3.1.1 Classificação da eutanásia ............................................................................... 28 
3.1.2 Distinção entre Eutanásia, Distanásia, Ortotanásia e Suicídio Assisitido ......... 29 
3.1.3 Requisitos para a prática da eutanásia ............................................................ 32 
3.2 Ética e Moral ...................................................................................................... 32 
3.3 Bioética .............................................................................................................. 34 
3.3.1 Princípios da Bioética ....................................................................................... 37 
4 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A POSSIBILIDADE DE 
EUTANÁSIA NO BRASIL ......................................................................................... 43 
4.1 Direito à vida, Eutanásia e os argumentos da Bioética ................................. 44 
4.2 Princípio da Proporcionalidade ....................................................................... 47 
4.2.1 Máximas da proporcionalidade ......................................................................... 49 
4.3 A colisão entre o princípio da vida e da dignidade ........................................ 51 
4.4 A operacionalização do princípio da proporcionalidade e sua aplicação 
direta ........................................................................................................................ 55 
5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 59 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 62 
 
 
7 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
 
A presente monografia consiste em demonstrar os direitos que o paciente 
adquire, ao se encontrar em fase terminal de uma doença incurável e sem qualidade 
de vida, de optar por um caminho consciente que reflita uma escolha informada 
(autonomia) para o término de uma vida antecipada pela eutanásia mostrando-se 
agente digno até o fim. 
Por esse motivo, o problema apresentado no presente trabalho tem por 
objetivo geral contribuir para uma reflexão, considerando serem especiais às 
circunstâncias do ato eutanásico, porquanto se pode questionara eventual 
desconsideração da dignidade do ser humano condenado ao sofrimento e à espera 
da morte certa. É relevante salientar que todas as argumentações se darão sob a luz 
do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, visto que é este um dos 
fundamentos no qual a Constituição Federal de 1988 foi erigida e sem o qual não 
haveria sentido suscitar debates e polêmicas a respeito do tema em pauta. 
Seus objetivos específicos são: conceituar direitos fundamentais e o 
nexo de interdependência com a Constituição do Brasil de 1988; examinar a questão 
dos direitos fundamentais, especificamente o princípio fundamental da dignidade da 
pessoa humana; analisar os conceitos e formas de eutanásia e bioética; interpretar a 
prática da eutanásia com fulcro no princípio constitucional da dignidade da pessoa 
humana e demonstrar o entendimento e a possibilidade da legislação brasileira em 
aceitar a prática da eutanásia. 
Inicialmente, no primeiro capítulo, serão abordados conceitualmente 
direitos fundamentais. A Constituição da República Federal Brasileira de 1988 
elencou uma lista de direitos fundamentais e definiu objetivos fundamentais do 
Estado. Conceituar os direitos fundamentais, como expressão de valores ou 
decisões axiológicas de uma determinada sociedade, consagra a normativa 
constitucional ao conformar todo ordenamento jurídico. 
Ressaltem-se, ainda, os direitos fundamentais como norma e a distinção 
lógica entre regras e princípios. Com efeito, a consagração do princípio da dignidade 
humana, como valor e fundamento constitucional do estado Democrático de Direito 
brasileiro, traduz-se na obrigação não só jurídica, mas também no compromisso 
ético, moral e político de respeitar e garantir condições mínimas de existência 
8 
 
humana. Com base nessas premissas, delinear a dignidade e seus dois pilares 
importantes: igualdade entre os seres humanos e a liberdade, a qual permite ao 
homem exercer os seus direitos existenciais. O término deste capítulo propõe uma 
abordagem do direito à vida e, consequentemente, à morte, para repensar a ideia de 
disponibilidade do bem jurídico ‘vida’ pelo próprio indivíduo, e isso somente se 
alcança conferindo eficácia à dignidade humana. 
Já no segundo capítulo é relevante uma abordagem conceitual sobre a 
eutanásia e bioética, bem como a classificação e requisitos de ambas. 
Cumpre esclarecer que mesmo diferentes, as classificações apontadas e 
reconhecidas pelos doutrinadores quanto à conceituação e classificação, o termo 
eutanásia igualmente não representa tema pacífico, suscitando, portanto, 
controvérsias com a mesma força que o tema central sugere. Na bioética, variando 
sua intensidade na medida em que mudam valores morais e éticos, o que interessa 
é sua ocupação referente à vida humana à luz dos valores aceitos em sociedade. E 
diante desse quadro constitucional favorável à observância dos valores individuais e 
o respeito à dignidade humana, é que será analisado o contexto da bioética, 
debruçado no avanço tecnológico, cabendo aceitar e afastar algumas possibilidades. 
Por fim, no terceiro capítulo, adentra-se ao estudo específico do tema em 
pauta deste trabalho, abordagem do princípio da dignidade da pessoa humana e o 
direito à liberdade de conceber a ideia de uma morte digna através da eutanásia. 
Sendo toda pessoa considerada um ser racional e dotado de liberdade, por sua 
natureza, possui um rol de direitos fundamentais e inalienáveis, em vista de sua 
dignidade, direitos que decorrem dos valores consagrados em função da própria 
natureza e que devem ser respeitados e garantidos pelo próprio Estado. 
 Pretende-se operacionalizar a aplicabilidade do princípio da 
proporcionalidade e suas máximas, onde o controle se dará à medida que o fim 
desejado tem legitimidade constitucional, propiciando o entendimento de que a 
referida transformação social começa a admitir a possibilidade da morte denominada 
como digna, porque preserva, em relação ao doente terminal que vivencia intenso 
sofrimento, a dignidade de morrer em paz e sem sofrer em demasia. 
Assim, a presente pesquisa se encerra concluindo que o princípio 
constitucional da dignidade da pessoa humana, sendo um princípio base do 
ordenamento jurídico, autoriza o entendimento de que também a morte sem 
9 
 
sofrimento representa ‘viver’ com dignidade, ao menos até os últimos instantes em 
que esse ‘viver’ é possível. 
Quanto à metodologia empregada, será utilizado o método dedutivo, e, 
nas diversas fases da pesquisa, as técnicas bibliográficas, tendo em vista que a 
fonte de consulta é a descrição do objeto/realidade já realizada por outras pessoas e 
constante de livros e periódicos. 
Ressalte-se que, sem a menor pretensão de esgotar o assunto, tentar-se-
á estabelecer qual é, em linhas gerais, em face da Constituição Brasileira de 1988, 
em suas múltiplas relações e possibilidades, o alcance e sentido do princípio 
fundamental da dignidade da pessoa humana na realização da eutanásia no Brasil. 
 
 
 
10 
 
2 DIREITOS FUNDAMENTAIS 
 
 
Os direitos fundamentais são direitos constitucionais na medida em que 
se inserem no texto de uma constituição, nascem e se fundamentam no princípio da 
soberania popular. 
Canotilho (2000, p. 387), comenta: 
as expressões ”direitos do homem” e “direitos fundamentais” são 
frequentemente utilizadas como sinônimas. Segundo a sua origem e 
significado, poderíamos distingui-las da seguinte maneira: direitos do 
homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos 
(dimensão jusnaturalista-universalista); direitos fundamentais são os direitos 
do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espaço-
temporalmente. Os direitos do homem arrancariam da própria natureza 
humana e daí o seu caráter inviolável, intemporal e universal; os direitos 
fundamentais seriam os direitos objetivamente vigentes numa ordem 
jurídica concreta. 
 
Neste sentido, Silva (2004) reforça que a expressão ‘direitos 
fundamentais do homem’ são situações jurídicas, objetivas e subjetivas, definidas no 
direito positivo, em prol da dignidade, igualdade e liberdade de pessoa humana. 
Os direitos fundamentais têm como finalidade conferir aos indivíduos uma 
posição jurídica de direito subjetivo, em sua maioria de natureza material, mas 
algumas vezes de natureza processual e, consequentemente, limitar a liberdade de 
atuação dos órgãos do Estado. Assim, cada direito fundamental constitui, na 
definição de Georg Jellinek (apud LEITE; SARLET, 2009, p. 123), um “direito público 
subjetivo”, isto é, um direito individual que vincula o Estado. A relação entre o Estado 
e cada indivíduo deve-se imaginar como uma relação entre duas esferas em 
interação. Os direitos fundamentais garantem a autonomia da esfera individual e, ao 
mesmo tempo, descrevem situações nas quais é obrigatório determinado tipo de 
contato. 
Perez Luño (1995) sintetiza os direitos fundamentais como a expressão 
de valores ou decisões axiológicas de uma determinada sociedade, consagrada na 
normativa constitucional ao conformar todo o ordenamento jurídico 
infraconstitucional. 
 
 
 
11 
 
2.1 Direitos fundamentais como norma 
 
 
A Constituição é norma fundamental do ordenamento jurídico. Como 
qualquer outra norma, prescreve condutas, autoriza atos, limita e protege direitos de 
que são titulares os cidadãos a quem ela é destinada. As normas constitucionais 
dispõem não apenas de força moral, mas também de força jurídica-normativa, cuja 
função é constituir padrões axiológicos e teleológicos, utilizados pelos operadores 
jurídicos na concretização e construção do ordenamento jurídico. Canotilho (1998, p. 
63), na clássica obra ‘Direito Constitucional’, aponta que o sistema jurídico “é um 
sistema de regras e princípios, pois a norma tanto pode revelar-se sob a forma de 
princípios como sob a forma de regras”. 
Há entre regras e princípios uma distinção lógica:os princípios não se 
aplicam de forma automática quando presentes as condições necessárias para sua 
incidência; ao passo que as regras são aplicadas de modo absoluto, ou não 
aplicadas. Uma vez presentes as condições fáticas para sua incidência, as regras, 
sendo válidas, devem necessariamente ser aplicadas, não comportando qualquer 
exceção. 
A Constituição é a Lei Fundamental e por isso Suprema. Destarte, é a 
base e o topo da legislação. Neste sentido, expõe Silva, (1996, p. 48) “todas as 
normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se 
conformarem com as normas da Constituição Federal”. No entender de Barroso 
(1999, p. 156), “por força da supremacia constitucional, nenhum ato jurídico, 
nenhuma manifestação de vontade pode subsistir validamente se for incompatível 
com a Lei Fundamental”. 
O constitucionalismo moderno encontra-se embasado no equilíbrio entre 
os poderes transferidos para as mãos do Estado e o respeito e consequentemente a 
realização dos direitos fundamentais. 
O princípio da dignidade da pessoa humana ocupa o epicentro do 
ordenamento jurídico e o ser humano é o seu mais importante protagonista da 
dignidade humana e esta, para ser efetiva, exige o respeito aos direitos 
fundamentais e impõe a exclusão de qualquer espécie de coação ilegal externa que 
impeça o desenvolvimento da personalidade. É íntima a relação entre direitos 
fundamentais e dignidade da pessoa humana, porque essa é “a medida dos direitos 
12 
 
(fundamentais) de tal sorte que, em regra, a violação de um direito fundamental 
estará sempre vinculada à ofensa da dignidade da pessoa” (FLÓREZ-VALDÉS, 
1990, p. 149). 
Nesse sentido, o constituinte brasileiro de 1988 foi categórico ao 
inscrever, no inciso III, do art.1º, da Constituição brasileira de 1988, o princípio da 
dignidade da pessoa humana na categoria de um dos fundamentos da República 
Federativa do Brasil, além de estatuir que a existência digna é vetor da ordem 
econômica, no caput do art. 170. 
Sendo complexo o sistema de direitos fundamentais, Mendes (2004, p. 2) 
afirma que são necessários esforços para precisar os elementos essenciais dessa 
categoria e esclarece que: 
Os direitos fundamentais são, a um só tempo, direitos subjetivos e 
elementos fundamentais da ordem constitucional objetiva. Enquanto direitos 
subjetivos, os direitos fundamentais outorgam aos titulares a possibilidade 
de impor os seus interesses em face dos órgãos obrigados. Na sua 
dimensão como elemento fundamental da ordem constitucional objetiva, os 
direitos fundamentais – tanto aqueles que não asseguram, primariamente, 
um direito subjetivo quanto àqueles outros, concebidos como garantias 
individuais – forma a base do ordenamento jurídico de um Estado de Direito 
democrático. 
 
Canotilho (1991, p. 507) assevera que os direitos fundamentais são 
aqueles que encontram vigência num determinado momento histórico, quando 
afirma que “são direitos do homem, jurídicos institucionalmente garantidos e 
limitados espaço-temporalmente”. 
Todos os direitos elencados no catálogo do Título II, da Constituição, 
dizem respeito aos ‘Direitos e Garantias Fundamentais’, trazem consigo a nota da 
fundamentalidade formal. É, porém, importante ressaltar que há outros espalhados 
por todo o texto constitucional. Por força do §2º do artigo 5º da CF, os direitos e 
garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e 
dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República 
Federativa do Brasil seja parte. É, então, forçoso reconhecer que existem inclusive 
direitos fundamentais implícitos e até mesmo fora do texto da Constituição. Além 
disso, o constituinte reconheceu que os direitos fundamentais são elementos 
integrantes da identidade e da continuidade da Constituição, considerando, por isso, 
ilegítima qualquer forma constitucional tendente a suprimi-los (art.60, § 4º). 
Com efeito, se normalmente os direitos fundamentais atuam em 
diferentes graus de intensidade, em casos excepcionais tal característica fica 
13 
 
acentuada, pois pode ocorrer que determinados direitos fundamentais mantenham-
se íntegros, alguns restritos e outros com a eficácia completamente suspensa. 
Os atos emanados do Estado que visem suspender a eficácia dos direitos 
fundamentais, devem ser excepcionais e estar condicionados ao preenchimento de 
todos os requisitos formais e substanciais necessários à manutenção do estado de 
Direito. 
Como já mencionado, a sociedade se organiza, transfere os poderes para 
o Estado e legitima o texto constitucional, com a função principal de salvaguardar a 
dignidade da pessoa humana, o que significa que os direitos subjetivos devem ter 
ampla margem de efetividade e proteção. 
Nesse sentido, Alexy (2008) apresenta os direitos fundamentais como 
subjetivos, correspondendo a posições jurídicas ocupadas pelo indivíduo de fazer 
valer suas pretensões frente ao Estado, não podendo esse eliminar tais posições do 
titular de Direito. Contudo, a garantia das liberdades individuais previstas no texto 
constitucional não é absoluta, no sentido de que essas garantias dizem respeito ao 
indivíduo e estariam livres de afetação. É importante destacar que são necessárias 
restrições, objetivando garantir os direitos fundamentais de terceiros e isso resulta 
numa relativização do conceito de incompatibilidade com os direitos fundamentais, 
conforme ensina o citado autor. 
Direitos fundamentais têm certamente o objetivo de garantir um estado 
global de liberdade do qual todos se beneficiem. Nesse sentido, eles têm uma 
relação com a situação de outros titulares de direitos fundamentais. 
Em complementação, a definição de Bastos (2002, p. 258) também segue 
a mesma linha: 
Dá-se o nome de liberdades públicas, de direitos humanos ou individuais, 
àquelas prerrogativas que tem o indivíduo em face do Estado constitucional 
ou Estado de Direito. Neste, o exercício dos seus poderes soberanos não 
vai ao ponto de ignorar que há limites para a sua atividade além dos quais 
se invade a esfera jurídica do cidadão. Há como que uma repartição da 
tutela que a ordem jurídica oferece: de um lado ela guarnece o Estado com 
instrumentos necessários à sua ação, e de outro protege uma área de 
interesses do indivíduo contra qualquer intromissão do aparato oficial. 
 
Somente uma Constituição aberta e repleta de princípios é capaz de 
adequar-se à rapidez com que as modificações do mundo ocorrem. Tais mudanças, 
presentes no seio da sociedade necessitam ser minimamente reguladas pelo direito. 
Mesmo tendo consciência de que o ordenamento não será capaz de prever todas e 
14 
 
quaisquer condutas humanas, espera-se que, no mínimo, o ordenamento possua 
algumas válvulas que permitam a adequação da norma à vida social. 
O Poder Constituinte originário, ante o trauma decorrente do momento 
histórico que precedeu a Assembleia Nacional Constituinte, no intuito de assegurar 
que as atrocidades cometidas pelo regime militar não viessem a se repetir, adotou a 
mesma concepção teleológica da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 
1948, que definiu no que consistia o princípio da dignidade da pessoa humana. 
A Declaração Universal de 1948, objetiva delinear uma ordem pública 
mundial, fundada no respeito à dignidade humana, ao consagrar valores 
básicos universais. Desde seu preâmbulo, é afirmada a dignidade inerente a 
toda pessoa humana, titular de direitos iguais e inalienáveis. Vale dizer, 
para Declaração Universal a condição de pessoa é o requisito único e 
exclusivo para titularidade de direitos. [...] A dignidade humana como 
fundamento dos direitos humanos é concepção que, posteriormente, vem 
ser incorporada por todos os tratados e declarações de direitos humanos. 
(PIOVESAN, 2002, p. 146). 
 
Portanto, os direitos fundamentais objetivam assegurar a liberdade do 
indivíduo, o que só terá sucesso diante de uma sociedade livre,na qual os cidadãos 
estejam conscientes para participar das decisões acerca de seus interesses e da 
comunidade. Para Alexy (2008), é essencial entender o conceito de competência 
para a compreensão da estrutura dos direitos fundamentais, tanto em relação ao 
cidadão quanto em relação às competências do Estado e isso só é alcançado na 
análise da relação das competências com direitos a algo e às liberdades. 
 
 
2.2 Princípio da dignidade da pessoa humana 
 
 
Historicamente, a partir do cristianismo, tem lugar o conceito de pessoa 
como categoria espiritual, dotada de valor em si mesma, um ser de fins absolutos, 
possuidor de direitos fundamentais e, portanto, de dignidade. (PRADO, 2002). 
Surge com o cristianismo o conceito de pessoa: o homem deixa de ser 
considerado apenas como cidadão e passa a valer como pessoa, 
independentemente de qualquer ligação pública ou jurídica. 
O reconhecimento do valor do homem como homem, implica o 
surgimento de um núcleo indestrutível de prerrogativas que o Estado não pode 
deixar de reconhecer, verdadeira esfera de ação dos indivíduos que delimita o poder 
15 
 
estatal. Observa-se então “um deslocamento do Direito do plano do Estado para o 
plano indivíduo, em busca do necessário equilíbrio entre liberdade e autoridade” 
(PRADO, 2002, p. 114). 
Da concepção jusnaturalista - que vivenciava seu apogeu justamente no 
século XVIII -, indubitavelmente, a constatação de que uma ordem 
constitucional que – de forma direta ou indireta – consagra a ideia da 
dignidade da pessoa humana, parte do pressuposto de que o homem, em 
virtude tão – somente de sua condição humana e independentemente de 
qualquer outra circunstância, é titular de direitos que devem ser 
reconhecidos e respeitados por seus semelhantes e pelo Estado. (SARLET, 
2009, p. 40). 
 
A concepção jusnaturalista consagrou a dignidade humana, partindo da 
ideia de que os direitos do indivíduo devem ser respeitados e reconhecidos por 
todos, bem como pelo Estado. 
Mais tarde, opondo-se à metafísica do pensamento jusnaturalista (os 
princípios ocupavam uma função meramente informativa) e instituindo-se a fase 
positivista, os princípios passaram a ser concebidos como fontes do Direito, sendo 
utilizados apenas na ausência da lei, como forma de suprir as lacunas do 
ordenamento e resolução dos conflitos de normas. Nessa fase, os princípios 
ocuparam posição secundária e de subsidiariedade à lei, não podendo sobrepor-lhe, 
tampouco proceder-lhe. Atuavam somente como fonte supletiva no caso de 
ausência da lei e como forma de integração do direito, ou seja, não dispunham de 
autonomia normativa. (BOBBIO, 1995). 
Na era Pós-positivista, na fase em que hoje ainda se experimentam, os 
princípios representam tema que centraliza as discussões no âmbito da teoria e da 
filosofia do direito, refletindo, na esfera do Direito Constitucional. Segundo Farias 
(2000, p. 54), “a moderna teoria constitucional descobriu que os princípios 
(notadamente aqueles com respaldo na Lei Maior) formam o ‘coração das 
constituições contemporâneas’ e, portanto, são instrumentos valiosos para uma 
adequada interpretação constitucional”. 
Para Dworkin (1997), o positivismo é extremamente normativo, uma vez 
que identifica somente as normas, deixando à margem, as diretrizes (fazem 
referência aos objetivos sociais a serem alcançados) e os princípios (estes se 
referem a justiça e à equidade). Será o conteúdo material, o determinador da 
aplicação de um princípio em uma situação particular/específica. 
Mello (2002, p. 808) observa: 
16 
 
Princípio [...] é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, 
verdadeiro alicerce de disposição fundamental que se irradia sobre 
diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua 
exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a 
racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá 
sentido harmônico. 
 
Promulgada no dia 5 de outubro de 1988, A ‘Constituição Cidadã’ como 
ficou conhecida, foi a primeira Constituição a reconhecer de forma expressa em seu 
texto, o princípio da dignidade humana. “A República Federativa do Brasil, formada 
pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se 
em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento: (...) III - a dignidade da 
pessoa humana” (BRASIL, 1999, p. 8). 
Reconhecendo a existência da dignidade da pessoa humana e sua 
eminência, a Constituição transformou-a em um valor supremo da ordem jurídica, ao 
declará-la como um dos fundamentos. 
Além disso, a Constituição de 1988, ao instituir um amplo sistema de 
direitos e garantias fundamentais, buscou não só preservar, mas, acima de tudo, 
promover a dignidade da pessoa humana. 
Observe-se que concebido como fundamento do Estado, o princípio da 
dignidade humana não é unicamente uma disposição legal a ser respeitada e, sim, 
uma imposição normativa, o que significa dizer que todas as ações estatais, que de 
alguma forma incorrerem em violação a esse princípio não são legítimas porque 
contrárias aos próprios valores que a Constituição pretende concretizar. 
Significa dizer que a consecução dos Direitos fundamentais só é possível 
num Estado Democrático de Direito. Dessa forma, não se pode falar em qualquer 
outro Direito e garantia constitucional sem aludir à dignidade humana, razão pela 
qual é denominado princípio unificador (PELEGRINI, 2004). 
Esse princípio constitui um atributo intrínseco de todo indivíduo, ainda que 
tenha cometido qualquer ação que não seja dotada de dignidade, pois “todos os 
seres humanos nascem livres e iguais em dignidades e direitos. Dotados de razão e 
consciência, devem agir uns para com os outros em espírito e fraternidade”, 
conforme o exposto no artigo 1o da Declaração Universal da ONU de 1948 
(ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948, p. 1). 
Farias (2000, p. 63) destaca que: 
o respeito da dignidade humana constitui-se em um dos elementos 
imprescindíveis para a legitimação da atuação do estado brasileiro. 
17 
 
Qualquer ação do Poder Público e seus órgãos não poderão jamais, sob 
pena de ser acoimada de ilegítima e declarada inconstitucional, restringir de 
forma intolerável ou injustificável a dignidade humana. 
 
José Afonso da Silva (1996) destaca que o princípio da dignidade da 
pessoa humana mostra-se como referencial ao conteúdo de todos os direitos 
fundamentais. Referindo-se aos doutrinadores José Joaquim Gomes Canotilho e 
Vital Moreira, o constitucionalista brasileiro acentua: 
O conceito de dignidade humana obriga a uma densificação valorativa que 
tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não 
qualquer ideia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da 
dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-
a nos casos dos direitos sociais, ou invocá-los para construir “teoria do 
núcleo da personalidade” individual, ignorando-a quando se trate de direitos 
econômicos, sociais e culturais. Daí decorre que a ordem econômica há de 
ter por fim assegurar a todos existência digna (art.270), a ordem social 
visará a realização da justiça social (art.193), a educação, o 
desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania 
(art.250) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores 
do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana. 
(CANOTILHO; MOREIRA apud SILVA, 1996, p. 39). 
 
Observa-se que, além de um compromisso jurídico, o princípio da 
dignidade da pessoa humana tem responsabilidade no campo ético, moral e político 
de respeitar e garantir condições básicas de existência humana, pois nenhum 
Estado pode pretender assegurar a dignidade ao ser humano sem a implementação 
eficaz de condições mínimas de sobrevivência. 
No entender de Canotilho (1991), o princípio da dignidade da pessoa 
humana é um princípio estruturalmente aberto, onde o conteúdo a ele atribuídoé 
dado pelos operadores do direito no momento de sua interpretação e aplicação ao 
caso concreto. Farias (2000) define como uma categoria axiológica aberta, sendo 
inadequada conceituá-la de forma fixista. 
Exige-se dos operadores jurídicos a compreensão de que o princípio da 
dignidade humana constitui fundamento autônomo à solução de conflitos. 
Nesse sentido, Alves (2001, p. 135) ressalta que o princípio da dignidade 
humana, 
[...] como tantos outros princípios fundamentais inscritos na Constituição, 
não é apenas ‘fonte de solução jurídica enquanto elemento de interpretação 
e integração das normas’. Entendemos que é preciso admitir que os 
princípios constitucionais, como o que consagra a dignidade da pessoa 
humana, podem servir de fonte autônoma de solução jurídica – ‘ou como 
juízos concretos do dever ser’, na conhecida expressão de Alexy – para 
determinar casos, onde, apesar da ausência de regras específicas, se 
depare com uma situação concreta submetida à decisão judicial que deva 
18 
 
ser regulada de modo a salvaguardar a proeminência dos valores 
existenciais da pessoa humana. 
 
O princípio da dignidade da pessoa humana mostra-se como sendo um 
princípio estruturante, colocando-se, portanto, em uma posição de superioridade 
relativamente aos demais, uma vez que estabelece os vetores axiológicos sobre os 
quais se alicerça o estado Brasileiro. 
A esse respeito assevera Sarlet (2001, p. 112): 
o princípio da dignidade humana não apenas impõe um dever de abstenção 
(respeito), mas também condutas positivas tendentes a efetivar e proteger a 
dignidade do indivíduo. [...] a concretização do programa normativo do 
princípio da dignidade humana incumbe aos órgãos estatais, especialmente, 
contudo, ao legislador, encarregado de edificar uma ordem jurídica que 
corresponda às exigências do princípio. 
 
Com efeito, a consagração do princípio da dignidade humana, como valor 
e fundamento constitucional do Estado Democrático de Direito brasileiro, traduz-se 
na obrigação não só jurídica, mas também no compromisso ético, moral e político de 
respeitar e garantir condições mínimas de existência humana, visto que nenhum 
Estado pode pretender assegurar dignidade ao ser humano sem a implementação 
eficaz de condições mínimas de sobrevivência. 
É importante ressaltar a importância da atividade judicante na construção 
do conteúdo jurídico do princípio da dignidade humana, porquanto o juiz não só 
protege a dignidade das pessoas mediante aplicação da lei, mas importa também a 
sua participação nos casos em que há ausência da lei reguladora, quando, então, 
possivelmente, irá valer-se de princípios, dando a esses o conteúdo resultante da 
sua interpretação ao caso concreto. 
A dignidade é qualidade intrínseca do indivíduo, sendo irrenunciável e 
protegida pelo ordenamento jurídico. Além dessas qualidades, esse princípio merece 
profundo respeito da sociedade e do Estado, devendo ser garantido e protegido até 
o último dia da vida do ser humano, que tem o direito de possuir uma morte digna. 
Para Moraes (2002a), a dignidade da pessoa humana representa 
significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor fonte que conforma e inspira o 
ordenamento jurídico dos Estados de Direito, traduzindo-se, inclusive, como um dos 
fundamentos do Estado brasileiro. 
De forma mais ampla, pode-se afirmar que a consagração expressa do 
princípio da dignidade da pessoa humana, no rol dos princípios fundamentais da 
19 
 
República Federativa do Brasil, constitui-se importante decisão do Legislador 
constituinte a respeito do sentido, finalidade e justificação do Estado. Canotilho 
(2000) coloca que, a partir daí reconhece-se que é o Estado que existe em função 
da pessoa humana, e não o contrário. Sarlet (2001) completa afirmando que a 
pessoa passa a ser o fim a que se destina o exercício do poder estatal, e nunca um 
meio para que o Estado alcance seus objetivos. Significa dizer que o exercício do 
poder somente será legítimo caso se paute pelo respeito ao princípio da dignidade 
da pessoa humana, que passa a ser uma condição para o próprio exercício da 
democracia. 
Para Kant (2003), concepção de dignidade prevalece até os dias atuais 
impregnada no pensamento filosófico-constitucional. O homem é concebido como 
sujeito do conhecimento e, por isso, é capaz de ser responsável por seus próprios 
atos e de ter consciência de seus deveres. Assim, mais do que respeitar um dever, 
tem o homem que se tornar um ser moral. Kant (2003, p. 74), então elaborou o 
seguinte imperativo categórico “age apenas segundo uma máxima tal que possas 
querer que ela se torne uma lei universal”. Dessa fórmula o doutrinador conclui que 
“o homem existe como fim em si mesmo, nunca como meio para realização das 
vontades”. (KANT, 2003, p. 74). 
A Declaração Universal dos Direitos humanos proclama, em seu 
preâmbulo, que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da 
família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, 
da justiça e da paz no mundo e, em seu artigo 1º, que todos os homens nascem 
livres e iguais em dignidade e direitos. 
Saber em que consiste essa dignidade, e em que se funda, é de inegável 
importância, a fim de que tais afirmações não pareçam mero jogo de 
palavras, ou discurso vazio de sentido prático. 
Para descobrimos a dignidade da pessoa humana não basta reconhecer no 
homem atributos só encontráveis nele [...]. Se o fizermos, estaremos 
situando o homem no plano da animalidade e retirando-o do plano da 
personalidade. 
Cumpre, pois, avançar para além das explicações puramente naturalistas, 
que situam esses atributos na corporalidade do homem, se se quiser 
construir uma sociedade que [...] veja nele um ser que transcende de sua 
animalidade para os planos superiores do espírito para ser pessoa. Só 
assim, compreenderemos o sentido de sua dignidade, que, sendo-lhe 
inerente, é inalienável, inviolável. (OLIVEIRA, 2000, p. 11). 
 
O princípio fundamental da dignidade humana, enquanto expressão 
positiva do valor fonte do ordenamento constitucional brasileiro acaba por funcionar 
20 
 
como um operador deôntico especial, pois, mesmo quando não esteja diretamente 
envolvido na solução jurídica do caso concreto, o valor que ele traduz será chamado 
a conformar, orientar e limitar a opção realizada. 
Nesse sentido, surge o entendimento de José Afonso da Silva (1998), 
advogando que a dignidade da pessoa constitui bem mais do que princípio jurídico, 
já que se cuida de valor supremo e fundante de toda ordem jurídica, social e política, 
base de toda a vida nacional. 
Constitui a dignidade um valor universal: “mesmo aquele que já perdeu a 
consciência da própria dignidade merece tê-la considerada e respeitada”. (SARLET, 
2002, p. 60). 
A dignidade da pessoa humana se apresenta como uma fonte aberta de 
proteção jurídica, não sendo casual o fato de que temas polêmicos sejam discutidos 
sob a ótica de seu conteúdo protetivo. (SARLET, 2002, p.60). 
Diante do exposto, a dignidade possui dois pilares importantes, tais como: 
igualdade entre os seres humanos e a liberdade, permitindo ao homem exercer 
plenamente os seus direitos existenciais. 
 
 
2.3 Princípio da Liberdade 
 
 
Os direitos de primeira geração passaram, na ordem institucional, a 
manifestar-se em três gerações sucessivas, que traduzem um processo cumulativo 
e qualitativo, tendo por bússola uma nova universalidade, material e concreta, em 
substituição da universalidade abstrata e, de certo modo, metafísica, relativa aos 
direitos humanos no jusnaturalismo do século XVII (BONAVIDES, 2000). 
Acrescenta Mello (2002) que os direitos fundamentais de primeira 
geração (direitos civis e políticos) compreendem as liberdades clássicas, negativas 
ou formais, realçando o princípio da liberdade. 
Dos múltiplos conceitos para o direito à liberdade, partindo-se de uma 
perspectiva superficial, a liberdade é uma qualidadeque pode ser atribuída a 
pessoas, ações e sociedades. 
21 
 
Para Alexy (2008), a base do conceito de liberdade é constituída por uma 
relação triádica entre um titular de uma liberdade (ou de uma não-liberdade), um 
obstáculo à liberdade e um objeto da liberdade. 
A liberdade limita-se até onde não prejudique outrem; todos têm direito à 
liberdade, desde que assegurem ao próximo o exercício dos mesmos direitos. 
Em relação aos direitos de primeira geração, mencionamos as afirmações 
feitas por Spitzcovsky e Tura (1993, p. 8): “a liberdade sofre restrições sempre que 
estiver em jogo a preservação da sociedade e da vida alheia”. 
Fazem parte do conteúdo jurídico do princípio da dignidade humana uma 
gama de direitos que a Constituição Federal expressamente tratou de referir ao 
longo do seu texto, tais como as liberdades: liberdade de expressão, liberdade de 
locomoção, liberdade religiosa, liberdade de associação, dentre outras. 
Qualquer ato, seja do poder público ou do próprio particular, que implique 
limitação ou violação a essas liberdades, atenta certamente contra a dignidade 
humana. 
Nesse sentido, Farias (2000, p. 81) acrescenta: 
o princípio da dignidade humana constitui o fundamento material não 
apenas à liberdade, mas a todos os direitos fundamentais, representando 
um ‘consenso axiológico normativo’ da sociedade brasileira acerca de 
certos valores básicos, isto é, os direitos fundamentais, que devem orientar 
a conduta de todos, que se trate de órgãos estatais ou de cidadão. 
 
O mesmo autor destaca que o princípio da dignidade humana exerce 
papel de fonte jurídico-positiva dos direitos fundamentais, dando-lhes unidade e 
coerência (FARIAS, 2000). 
Sarlet (2009, p. 115) afirma que: 
não se pode desconsiderar [...] que a liberdade e a igualdade são noções 
indissociáveis da dignidade de cada pessoa, justificando, o reconhecimento 
de direitos fundamentais diretamente vinculados à proteção das liberdades 
pessoais e da isonomia. 
 
Ao referir-se à liberdade jurídica, que é uma manifestação especial do 
conceito amplo de liberdade, está a se falar do objeto da liberdade como uma 
alternativa de ação, o que significa dizer uma ‘liberdade negativa’. 
Assim sendo, distinguir liberdade positiva e negativa está no fato de na 
primeira, o objeto da liberdade ser uma única ação; já na segunda, o objeto consiste 
em uma alternativa de ação. Desta forma, para criação de uma situação de 
22 
 
liberdade jurídica é necessária apenas uma abstenção estatal, quer seja, uma ação 
negativa. 
[…] segundo o Tribunal Constitucional Federal, o direito geral de liberdade 
pode, para além da proteção de ações, ser estendido à proteção de 
situações e posições jurídicas do titular de direitos fundamentais. Portanto, 
esse direito não protege apenas o seu “fazer”, mas também o seu “ser” 
fático e jurídico. Somente após essa ampliação é que o direito geral de 
liberdade se torna um direito exaustivo à liberdade geral contra 
intervenções. (ALEXY, 2008, p. 343-344). 
 
A liberdade assegura que o indivíduo é livre para ir e vir, sempre 
respeitando os direitos fundamentais regidos pela lei. Ao ser resguardada, ela 
garante um bem fundamental da pessoa, não somente ao que se refere às ações do 
indivíduo, como de igual forma na esfera jurídica. 
É importante analisar se o bem protegido pelo direito de liberdade é uma 
ação ou um estado do titular de direitos fundamentais. Ao se tratar de um estado, é 
possível determinar uma proibição. 
A liberdade limita-se até onde não cause danos a outra pessoa, todos tem 
direito à liberdade, desde que assegurem ao próximo o exercício dos mesmos 
direitos. A realidade e a materialidade devem estar presentes na liberdade e na 
igualdade, pois não há igualdade formal sem liberdade real. 
 
 
2.4 Princípio do direito à vida 
 
 
No que se refere à vida, é importante ressaltar seu fundamento jusnatural, 
apesar das disposições positivadas. A justificativa buscada no direito natural reside 
no aspecto de que não pode o direito atribuir à pessoa o direito à vida, mas apenas 
reconhecê-lo, pois a vida é um direito que existe ‘desde sempre’, e independente de 
positivação para existir. Diniz (2007, p. 22), reforça: 
Ainda que não houvesse tutela constitucional ao direito à vida, que, por ser 
decorrente de norma de direito natural, é deduzida da natureza do ser 
humano, legitimaria aquela imposição erga homnes, porque o direito natural 
é o fundamento do dever-ser, ou melhor, do direito positivo, uma vez que se 
baseia num consenso, cuja expressão máxima é a Declaração Universal 
dos Direitos do Homem, fruto concebido pela consciência coletiva da 
humanidade civilizada. 
 
23 
 
Não obstante, isso não impede que o direito à vida se torne uma norma 
positiva. Pelo contrário, a positivação é salutar e imprescindível para bem defender a 
vida, porquanto garante a coercibilidade e a imponibilidade, características de que 
carece o direito natural. 
A Constituição de 1988 não se limitou a garantir “os direitos concernentes 
à vida”, indo além e defendendo a vida em si, e não apenas seus desdobramentos. 
Essa Constituição vigente traz, em seu artigo 5º, o seguinte trecho: 
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, 
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a 
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à 
propriedade, nos termos seguintes: [...]. 
 
Em sendo direito fundamental, a vida é também um direito absoluto, ou 
seja, imodificável, visto que o teor do artigo 60, § 4º, IV, da Constituição não pode 
ser objeto de proposta de emenda, constituindo-se cláusula pétrea. Este direito 
absoluto a vida, deverá ser interpretado por certo, em proteção ao seu “núcleo 
essencial”: aqui posto, o caso em concreto. 
É dever de o Estado assegurar o direito à vida, e este não consiste em 
manter-se vivo, mas se ter vida digna quanto a subsistência. 
Moraes (2000, p. 87): “O Estado deverá garantir esse direito a um nível 
adequado com a condição humana respeitando os princípios fundamentais de 
cidadania, dignidade da pessoa humana e valores sociais do trabalho e da livre 
iniciativa”. 
No mesmo sentido, Irany Novah Moraes (1987, p. 47): “A constituição 
Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao estado assegurá-lo em sua 
dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a 
segunda de ter a vida digna quanto à subsistência”. 
A Constituição ainda é o único instrumento competente para promover a 
justiça e democracia onde o indivíduo ativo e participativo exerça autonomia optando 
sobre sua vida ou morte digna. 
Entende-se então que o direito à vida é obrigação do Estado e não uma 
imposição do Estado, sendo que a questão relacionada à dignidade é fator 
obrigatório para a manutenção da vida humana. 
Para delinear melhor o entendimento quanto ao valor da dignidade da 
pessoa humana, Sarlet (2001, p. 110-111) afirma: 
24 
 
o que se percebe em última análise, é que onde não houver respeito pela 
vida e pela integridade física do ser humano, onde as condições mínimas 
para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e 
identidade do indivíduo forme objeto de ingerências indevidas, onde sua 
igualdade relativamente aos demais não forma garantidas, bem como onde 
não houver limitação do poder, não haverá espaço para a dignidade da 
pessoa humana, e esta não passará de mero objeto de arbítrio e injustiças. 
A concepção do homem-objeto, como visto, constitui justamente a antítese 
da noção da dignidade da pessoa humana. 
 
Nota-se assim, que não se pode privilegiar apenas a dimensão biológica 
da vida humana, negligenciando a qualidade de vida do indivíduo, pois um indivíduo 
que se encontra em estado terminal irreversível e com sofrimentos físicos 
insuportáveis, não apresenta mais vida. Isso porque que não goza mais do direito à 
vida, nem sequer apresentadignidade, estando privado de liberdade e do exercício 
de muitos de seus direitos, não podendo usufruir das próprias funções vitais. 
O direito à vida retrata o próprio direito ao respeito à vida, e isso somente 
se alcança ao se conferir eficácia à dignidade humana. 
 
 
 
 
25 
 
3 EUTANÁSIA E BIOÉTICA 
 
 
Neste capítulo, far-se-á uma abordagem conceitual sobre eutanásia e 
bioética, bem como a classificação de ambas. A prática da eutanásia constitui-se 
uma relação entre indivíduos diferentes, com valores morais distintos, construídos a 
partir de uma relação simbólica, particular com o mundo. Decorrendo deste fato, há 
necessidade de encontrar um ponto de partida, para a reflexão bioética que seja 
comum a todos os seres racionais. É evidente que o tema está intimamente ligado 
aos campos da ética e moral, portanto uma rápida abordagem sobre os seus 
conceitos. 
 
 
3.1 Eutanásia 
 
 
A Eutanásia sempre foi um instituto presente ao longo das gerações. Por 
toda sua complexidade e acaloradas discussões que o tema suscita, a conceituação 
e o estudo da origem do vocábulo eutanásia são aspectos importantes a serem 
abordados. 
Como primeiro registro, tal prática consta do ‘Livro de Samuel’, no Antigo 
Testamento bíblico, apesar do termo ter sido criado pelos gregos, que adotavam o 
que se chama ‘falsa eutanásia’, pois o sentido verdadeiro da palavra é ‘morte 
piedosa’, e eles praticavam a eutanásia basicamente em sua forma eugênica. 
(JUNGES, 1999). 
Junges (1999) informa que a palavra foi usada pela primeira vez por 
Suetônio, na obra ‘A vida dos Doze Césares’ (século II, d.C.), quando narra a morte 
suave do Imperador Augusto, expressando a ideia de que se pode ser autor da 
morte, assim como se é da vida. 
O termo Eutanásia foi criado no século XVII, pelo filósofo inglês Francis 
Bacon (1561-1626), em sua obra ‘Historia vitae et mortis’, (História da Vida e da 
Morte). Sustentou a tese de que, nas enfermidades consideradas incuráveis, era 
absolutamente humano e necessário proporcionar uma morte ‘boa e honrosa’, 
26 
 
cessando dessa forma o sofrimento dos enfermos, considerado por Bacon o 
“tratamento adequado às doenças incuráveis”. (Santos, 1992, p. 209) 
Originário do grego, o termo eutanásia remete à ideia de ‘boa morte’ ou 
‘morte apropriada’. A esse respeito, Pessini cita Francis Bacon: 
O ofício do médico não é somente restaurar a saúde, mas também mitigar 
as dores e tormentos das enfermidades; e não somente quando tal 
mitigação da dor [...] ajuda e conduz à recuperação, mas também quando, 
esvaindo-se toda esperança de recuperação, serve somente para conseguir 
uma saída da vida mais fácil e equitativa [...]. Em nossos tempos, os 
médicos fazem questão de escrúpulo e religião o estar junto ao paciente 
quando ele está morrendo [...], devem adquirir habilidades e prestar atenção 
em como o moribundo pode deixar a vida mais fácil e silenciosamente. A 
isso eu chamo a pesquisa sobre a “eutanásia externa” ou “morte fácil”. 
(BACON apud PESSINI, 2004, p. 105). 
 
Em seus estudos, o filósofo inglês Francis Bacon demonstra que a 
eutanásia seria um marco precursor de uma visão diferenciada e próxima da atual, 
em que o médico tinha como função não apenas e puramente aplicar seus 
conhecimentos para curar, mas igualmente para diminuir as dores de uma doença 
incurável e mortal. Proporcionar aos seus pacientes uma morte indolor, calma e 
doce, abreviando o seu sofrimento. 
Etimologicamente, conclui-se que o termo encontra berço na língua grega 
‘eu’ + ‘thantos’ podendo-se conceituar como a morte boa, a morte calma, a morte 
piedosa e humanitária, ou seja, a morte que afasta o ser humano de um sofrimento 
físico maior, abrandando, portanto essa dor com abreviação do resultado já 
aguardado (a própria morte). 
Inicialmente, a prática da eutanásia era vista não como morte, e sim como 
cuidados paliativos do sofrimento, como acompanhamento psicológico do doente e 
outros meios de controle da dor, bem como a interrupção de tratamentos inúteis ou 
que prolongassem a agonia, ou seja, não visaria à morte, porém, deixar que esta 
ocorresse da forma menos dolorosa possível. (GOMES, 2007). 
Com a evolução dos tempos, a eutanásia adquiriu variadas definições, 
como por exemplo: “é a morte que alguém proporciona a uma pessoa que padece 
de uma enfermidade incurável ou muito penosa, e a que tende a extinguir a agonia 
demasiada cruel ou prolongada”. (ASÚA, 2003, p. 185). 
Em outras palavras, o sentido do vocábulo eutanásia, se aproxima da 
dignificação do sentido da vida, do valor da vida humana e expressar que deve 
prevalecer o bem estar do ser humano, que tenha uma vida digna por toda sua 
27 
 
existência, até o ponto em que por sacrifício ou sofrimento descomunal, essa vida 
vegetativa não tenha mais sentido. 
De acordo com Menezes citando Pinam y Malvara 
a eutanásia é aquele ato em virtude do qual uma pessoa dá morte a outra, 
enferma e parecendo incurável, ou a seres acidentados que padecem dores 
cruéis a seu rogo ou requerimento e sob impulsos de exacerbado 
sentimento de piedade e humanidade. (PINAM Y MALVAR apud 
MENEZES, 1977, p. 39-40). 
 
Foi somente a partir do século XIX que o termo começou a ser 
empregado no sentido de procurar a morte com doçura. E é exatamente nesse 
sentido que o termo é usado atualmente. A troca de significado aconteceu 
justamente quando a morte passou a ser vista como um evento antinatural. Sua 
assepsia não mais permite a experiência de vivenciar as dores e o sofrimento da 
terminalidade, tanto pelos moribundos quanto pelos familiares. Então, se ela não 
chega suave, deve ser procurada. (GOMES, 2007). 
Conceituação moderna e sintetizada pode-se estabelecer que eutanásia, 
seja pela origem etimológica da palavra, ou pela definição que o termo alcançou na 
evolução dos tempos, visa minorar o sofrimento daquele ser humano que padece 
ante uma enfermidade incurável, buscando, antes de causar-lhe um mal, dar-lhe 
algo que possa ao menos reduzir o sofrimento vivenciado. 
É importante esclarecer que não é suficiente a enfermidade ser incurável, 
dolorosa e também não o sentimento de piedade do agente ativo diante do 
sofrimento do próximo. Faz-se necessário que o enfermo consinta, peça e até rogue, 
querendo a morte, na medida em que visa pôr termo a dor e sofrimento, para que se 
tenha a eutanásia. 
É necessário, elencar os elementos específicos para a constatação de 
ocorrência de eutanásia: a morte deve acontecer sem dor ou sofrimento para o 
enfermo ou, quando muito, com dor ou sofrimento rápido; o fim pretendido com o 
procedimento deve ser exclusivamente o de pôr fim à dor e ao sofrimento 
experimentado pelo enfermo, e a realização do procedimento deve ter sido solicitada 
pelo enfermo ou por familiares capazes de demonstrar que esse teria sido o desejo 
do paciente caso estivesse consciente. 
Assim, para Carnevalli (2003), o conceito de eutanásia é o de uma ação 
ou omissão, com a finalidade de causar a morte em um ser humano, com o intuito 
de pôr fim ao seu sofrimento, sempre a pedido deste ou de seus familiares, tendo 
28 
 
em vista que a vida que levam não se encontra dotada de nenhuma qualidade, 
tratando-se aqui, de forma explícita, de “Eutanásia Voluntária”. 
A vida para ser humana tem que ser digna, como digna deverá ser a 
morte, pois do contrário também ela não será humana. 
 
 
3.1.1 Classificação da eutanásia 
 
 
Em virtude à grande diversidade e classificações encontradas na doutrina, 
foi feita uma reunião de determinadas espécies. 
Quanto ao tipo de ação: 
a) Ativa/comissiva ou positiva: ato deliberado de provocar a morte sem 
sofrimento do paciente, por fins humanitários, misericordiosos (como no 
caso da utilização de uma injeção letal); terceira pessoa, ou seja, o 
médico ministra substância capaz de provocar a morte instantânea e 
indolor, pondo fim à vida do enfermo diretamente. 
b) Passiva/omissiva/negativaou ortotanásia: palavra derivada do grego, 
é (orto o mesmo que correto e thanasia , igual à morte). Aparece como o 
limite certo da vida. Quando a morte ocorre por omissão em se iniciar 
uma ação médica que garantiria a perpetuação da sobrevida (por 
exemplo, deixar de se acoplar um paciente em insuficiência respiratória 
ao ventilador artificial); não mata diretamente, apenas deixa de prolongar 
a vida irreversivelmente condenada. É a oportunidade da morte correta, 
sem ultrapassar barreiras e sem motivar debates com princípios Éticos, 
Teológicos ou Jurídicos. 
c) Duplo Efeito: quando a morte é acelerada como consequência de ações 
médicas não visando ao êxito letal, mas sim ao alívio do sofrimento de um 
paciente terminal (por exemplo, emprego de uma dose de 
benzodiazepínico para minimizar a ansiedade e a angústia, gerando, 
secundariamente, depressão respiratória e óbito). 
A propósito dessa teoria do duplo efeito, esclarece Leo Pessini (2001, p. 
120): 
29 
 
a distinção ética entre prover cuidados paliativos que podem ter como efeito 
colateral a morte e provocar a eutanásia é sutil, porque em ambos os casos 
a ação que causa a morte tem o objetivo de aliviar o sofrimento. O objetivo 
dos primeiros é aliviar apesar do efeito colateral fatal, enquanto a intenção 
da última é causar a morte como um meio para aliviar o sofrimento. 
 
Quanto ao consentimento do paciente: outra maneira de se classificarem 
as várias modalidades de eutanásia leva em conta não só as consequências do ato, 
mas também o consentimento do paciente (MARTIN, 1998): 
a) Eutanásia Voluntária: a qual atende uma vontade expressa do doente – 
o que seria um sinônimo do suicídio assistido. Esta se subdivide em 
autônoma e heterônoma. A primeira, por se constituir modalidade de 
suicídio (promoção da própria morte sem intervenção de terceiros), não 
punível pelo direito penal pátrio; 
b) Eutanásia Involuntária: que ocorre se o ato é realizado contra a vontade 
do enfermo – ou seja, sinônimo de ‘homicídio’; 
c) Eutanásia não Voluntária: quando a morte é provocada sem que o 
paciente tivesse manifestado sua posição em relação ao assunto. 
 
 
3.1.2 Distinção entre Eutanásia, Distanásia, Ortotanásia e Suicídio Assisitido 
 
 
A eutanásia, como já mencionado, é a morte dada àquelas pessoas que 
sofrem de moléstias incuráveis e dolorosas, próximas ao fim, com intuito de 
abreviar-lhes o sofrimento, inspirada no sofrimento da compaixão e solidariedade 
humana. A eutanásia ou ‘boa morte’ ou eutanásia ativa, de acordo com Costa, 
Garrafa e Oselka (1998), tem como proposta induzir a morte precoce de uma 
maneira suave e sem dor, ou seja, ela tem como fim eliminar o sofrimento do 
paciente com a morte do mesmo, enquanto portador da dor, como meio para atingir 
esse fim. 
Outro termo relacionado à eutanásia é a distanásia. Cumpre esclarecer 
que essa forma é o oposto da eutanásia. A distanásia é o prolongamento artificial do 
processo de morte, com sofrimento e angústia do doente, mesmo sabendo-se que 
não existem, até o presente momento, chances de cura ou melhora no quadro 
clínico. Conforme Diniz (2007, p. 316), “trata-se do prolongamento exagerado da 
30 
 
morte de um paciente terminal ou tratamento inútil. Não visa prolongar a vida, mas 
sim o processo da morte”. 
A eutanásia e a distanásia, como procedimentos médicos, têm em comum 
a preocupação com a morte do ser humano. A primeira, porém, se preocupa com a 
qualidade de vida humana na sua fase final, eliminando o sofrimento, enquanto a 
segunda se dedica ao prolongamento ao máximo a quantidade de vida, por meios 
artificiais. 
A ortotanásia surge em oposição à distanásia. Em 28 de novembro, o 
Conselho Federal de Medicina publicou a Resolução 1.805 /2006, que pôs fim a 
qualquer dúvida a respeito da ausência de obrigação médica no caso em tela. Tendo 
em vista sua importância, transcrevemos seu conteúdo: 
Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e 
tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de 
enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu 
representante legal. 
§ 1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou a seu 
representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada 
situação. § 2º A decisão referida no caput deve ser fundamentada e 
registrada no prontuário. 
§ 3º É assegurado ao doente ou a seu representante legal o direito de 
solicitar uma segunda opinião médica. 
Art. 2º O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para 
aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência 
integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual, inclusive 
assegurando-lhe o direito da alta hospitalar. (MOREIRA, 2008, p. 2). 
 
Esse sintético normativo deixa claro que não há obrigação do médico em 
prolongar a vida do paciente a qualquer custo e que cabe a este ou a seu 
representante legal decidir a respeito da continuação do tratamento, contando com 
todas as informações disponíveis sobre as alternativas terapêuticas. Consegue-se 
preservar a autonomia individual e a dignidade do paciente, que receberá os 
cuidados necessários ao alívio de seu sofrimento. 
Para Cabette, (2009, p. 25), em verdade, “o fundamento principal da 
ortotanásia é a absoluta ineficácia de uma intervenção médica extremada para evitar 
a morte do paciente”. 
Já o suicídio assistido ocorre quando alguém ajuda a pessoa que não 
dispõe de meios para consumar, por si mesma, o próprio óbito, a se matar 
oferecendo-lhe meios idôneos para tal. A vítima é quem provoca, por atos 
voluntários, sua própria morte. Para que a ação de auxílio a suicídio tenha valoração 
de eutanásia, é necessário que o paciente tenha solicitado a ajuda para morrer, 
31 
 
diante do fracasso dos métodos terapêuticos e dos paliativos contra dores, o que 
acaba por retirar a dignidade do paciente, segundo seu próprio entendimento. 
Nas palavras de Cabette (2009, p. 20): 
Nesses casos pode-se falar no chamado suicídio assistido, que se aproxima 
da eutanásia, mas não é sinônimo. Freire de Sá esclarece em sua obra a 
distinção entre essas figuras, lançando mão do escólio de Ribeiro: Na 
eutanásia, o médico age ou omite-se. Dessa ação ou omissão surge 
diretamente a morte. No suicídio assistido, a morte não depende 
diretamente da ação de terceiro. Ela é consequência de uma ação do 
próprio, que pode ter sido orientado, auxiliado ou apenas observado por 
esse terceiro. 
 
Tem-se como exemplo o caso retratado pelo filme ‘Mar Adentro’ (MAR..., 
2004): a solicitação ou consentimento partindo do ofendido não afastam a ilicitude 
da conduta. 
Diferentes sejam as classificações apontadas e reconhecidas pelos 
doutrinadores, à conceituação e a classificação do termo igualmente não representa 
tema pacífico, suscitando, portanto controvérsias com a mesma força que o tema 
central suscita, variando sua intensidade à medida que variam os valores morais e 
éticos defendidos pela sociedade local. 
Observa-se, que os autores que “defendem” a prática apontam para a 
necessidade de que seja respeitada a liberdade de escolha do homem que padece e 
que decide, como agente competente e autônomo, pôr fim aos seus dias, além de 
argumentar que a eutanásia se reveste de um genuíno caráter humanitário, 
propiciando que se livre o enfermo de um sofrimento insuportável, encurtando uma 
vida considerada sem qualidade, pelo próprio paciente, não vislumbrando mais 
nenhum sentido para ser vivida. 
Não se pode propor a prática da eutanásia deliberadamente, quando não 
há a promoção de uma morte impulsionada pela compaixão em relação ao enfermo. 
É a motivação humana, aliada a um quadro de doença incurável e mal 
irrepreensível, que indicará a verificação da prática da eutanásia, pois, caso 
contrário falar-se-á de um crime. 
Para que haja o procedimento da eutanásia, é necessário se levar em 
conta os requisitos básicos, onde estesgiram em torno da preservação da atividade 
médica de responsabilidades penais, e buscam o respeito à autodeterminação do 
ser humano, prestigiando a autonomia da vontade do enfermo. 
 
32 
 
3.1.3 Requisitos para a prática da eutanásia 
 
 
Para a prática da eutanásia, nos países em que ela é permitida, deve ser 
observada uma série de requisitos para que não se verifique a figura do homicídio, 
tais como: a) a solicitação voluntária bem pensada, repetida e explícita do paciente, 
b) relação de confiança entre o médico e o paciente, a ponto do profissional poder 
constatar, de fato, se o pedido foi voluntário e pensado, c) sofrimento sem 
perspectiva de melhora e insuportável, segundo opinião médica existente, d) 
discussão entre médico e paciente de alternativas para a eutanásia, e) consulta do 
médico a outro médico, f) execução médico-técnica esmerada da eutanásia (SÁ; 
NAVES, 2009). 
Neste ponto, diferencia-se a ‘Eutanásia Ativa’, caracterizada pela ação do 
médico, e a ‘Eutanásia Passiva’, chamada ortotanásia, caracterizada pela omissão 
do profissional. 
 
 
3.2 Ética e Moral 
 
 
Ética é um conjunto de regras, princípios e formas de pensar, direcionada 
a realizar o bem em si mesmo, sendo contrário a tudo que for contaminado de 
indignidade. (VÁSQUEZ, 2000) 
Portanto, a ética não se aplica como forma de agir, essa fica a cargo da 
moral, que é determinante na forma do agir. A ética é a designação filosófica sobre a 
moral, isto é, sobre as regras e os códigos morais que norteiam a conduta humana. 
Assim sendo, cabe atribuirmos à ética como a ciência da conduta humana. 
(VÁSQUEZ, 2000). 
A ética pode ser entendida como reflexão dos costumes e ações 
humanas, sendo importante analisar-se sob o prisma da sociedade em que se situa 
o estudo, devendo sempre ser respeitado o costume, o direito e qualquer outro 
modo indicativo referente a tal grupo ou camada social. 
33 
 
Por ser parte da filosofia, a ética tem como objetivo a ação humana, 
fixando-se não no que o homem é de fato, mas sim no que ele deve ser e fazer de 
sua vida. (VÁSQUEZ, 2000). 
Expressa a reflexão filosófica sobre a conduta moral dos indivíduos, ou 
seja, acerca das regras e códigos morais que norteiam a conduta humana. Tem 
como pretensão definir as bases do fato moral e determinar as diretrizes e os 
princípios abstratos da moral. (SÁ, 2005). 
Resumindo, a ética é o estudo das ações e dos costumes humanos ou 
análise da própria vida considerada virtuosa. 
Da necessidade de conviver-se em sociedade, surge a moral, tida como a 
reunião de regras que são determinantes para o relacionamento dos indivíduos. 
Assim, quando se indaga o que é correto, aborda-se a ética; a seguir, quando há a 
ação, questiona-se a moral, uma vez que é referente ao ato em si. 
Moral quanto as suas raízes etimológicas, tem-se que: mos igual a moral, 
(mos igual a mores), por sua vez, mores é igual a costume. 
A moral possui a capacidade de discernir entre o bem e o mal, e de 
interpretar o valor das condutas e de agir em conformidade com os padrões morais, 
tornando-se responsável pelas ações, emoções e consequências. (GOLDIM, 2000). 
Embora sejam usadas frequentemente como sinônimos, a ética e a moral 
não o são. Pois, a ética estuda, aconselha e até ordena, mas a moral é coexistente, 
sendo ambas relacionadas a valores e a decisões que levam as ações com todas as 
suas abrangências para o próprio indivíduo e a coletividade. (ADONI, 2001). 
Tanto a moral como o Direito baseiam-se em regras que visam 
estabelecer certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém, se 
diferenciam. A moral estabelece regras assumidas pela pessoa como uma forma de 
garantir o seu bem-viver. A moral independe das fronteiras geográficas e garante 
uma identidade entre pessoas que sequer se conhecem, mas utilizam este mesmo 
referencial moral comum. O Direito busca estabelecer o regramento de uma 
sociedade delimitada pelas fronteiras do Estado. As leis possuem uma base 
territorial e valem apenas para aquela área geográfica onde uma determinada 
população ou seus delegados vivem. 
Portanto, a ética objetiva desvendar aquilo que o homem ‘deve fazer’. Seu 
campo é o do juízo de valor e não o do juízo de realidade, ou da existência. Desse 
modo, o estudo desse comportamento, no que se refere aos profissionais médicos, 
34 
 
vai representar o estudo da atuação do profissional médico no que se refere aos 
seus deveres e direitos, disciplinados de forma exaustiva, no Código de Ética 
Médica (BRASIL, 1996). 
 
 
3.3 Bioética 
 
 
A bioética, segundo Jean-Jacques Israel (1998) se propõe a estabelecer a 
conexão entre a vida biológica e a ética. A manipulação dos instrumentos científicos 
e o seu consequente emprego na vida humana permitem construir um conhecimento 
“interdisciplinar, ligado à ética, que investiga, na área das ciências e da saúde, a 
totalidade das condições necessárias à administração responsável da vida humana, 
em geral, e da pessoa humana, em particular”. (SAUWEN; HRYNIEWICZ, 2000, p. 
21). 
O biodireito se utiliza, metodologicamente, dos estudos da bioética e da 
biogenética e constrói um estatuto jurídico regulador das ações que afetem a vida ao 
privilegiar a ética na condição de vetor primordial da atuação científica. As regras 
jurídicas devem preservar a dignidade humana contra a ‘coisificação’ do ser 
humano. Por conseguinte, o estudo da ciência deixa de ser ‘um fim em si mesmo’ e 
se transfigura um instrumento a favor da integridade dos valores sociais. (SÉGUIN, 
2001). 
A bioética surge como uma preocupação ética aos avanços tecnológicos, 
especialmente na área da biotecnologia (ciências médico-biológicas), objetivando 
trazer critérios éticos e morais a cientistas e investigadores, propondo limitações ao 
progresso científico de sorte a preservar-se a dignidade e a vida humana como 
prioridades absolutas. 
Para essas descobertas científicas que relacionam a relação do Homem 
com a vida, é forçosa a existência de normas que regulamentem a própria liberdade 
e os limites daquelas condutas que podem ou não ser praticadas. 
Nesse sentido, Dall’Agnol (2005) observa a necessidade da reflexão 
sobre o valor da vida para se pensar mais profundamente os problemas da bioética. 
Por um lado, a ciência não pode ser mitificada como a detentora única da verdade. 
Por outro, não pode ser condenada como malévola; obscurantismo deve ser evitado. 
35 
 
A prática da eutanásia é milenar e conceituada como a morte que alguém 
proporciona a uma pessoa que padece de uma enfermidade incurável ou muito 
penosa, e que tem como objetivo abreviar o sofrimento do paciente, ou seja, não 
visa exterminar humanos, e sim, o respeito ao ser humano, evitando sofrimentos e 
tortura ao término de sua vida. Além disso, apoia-se nos princípios norteadores da 
bioética, Autonomia, Beneficência e Justiça, os quais reconhecem a autonomia do 
paciente terminal e de sua escolha ou não, por uma morte digna. 
Neste contexto, surge a questão de até quando prolongar a vida de um 
indivíduo que sofre de uma doença incurável, já no seu estágio final, sem chance de 
cura? Seria moralmente condenável abreviar essa vida? 
Com a evolução assustadora das técnicas científicas, a humanidade se 
viu diante de problemas que ultrapassam os valores fundamentais de utilidade. 
Em virtude dessa problemática, a Bioética surge como um ramo da 
filosofia destinado a questões referentes à vida do homem. É a ética da vida, 
refletindo sobre questões surgidas com o progresso científico. 
Por não se tratar de uma disciplina isolada, torna-se difícil conceituar o 
vocábulo bioética, pelo fato de ser interdisciplinar “na medida em que congrega 
esforços de profissionais ou pensadores de todos os campos do conhecimento 
humano, no intuito de clarificar até que ponto uma descoberta e suas aplicações 
podem ou não ferir valores fundamentais”. (SAUWEN; HRYNIEWICZ, 2000, p. 9).Não obstante a natural dificuldade de se estabelecer um conceito unívoco 
para um termo que se imiscui com outros campos do conhecimento, foi o 
oncologista norte-americano Van Rensselaer Potter o primeiro a referir-se à bioética 
quando da publicação, em 1971, de seu livro ‘Bioethics: a bridge to the future’. E o 
fez com o objetivo de propor um nome “para uma nova disciplina que, ao unir os 
valores éticos aos fatores biológicos, servisse como ligação entre ambas as 
culturas”. (CARVALHO, 2001, p. 74). Daí a explicação para a composição grega do 
neologismo: ‘bio’ representa a ciência dos sistemas viventes, e ‘ethike’, o 
conhecimento dos sistemas de valores humanos. 
Etimologicamente, a palavra bioética significa: bio (vida) e ethos (ética), 
modo de ser. Bioética é o ato correto de lidar com a vida, ou o que deveria ser o 
correto, podendo, ainda, ter a compreensão das relações do homem com a vida, sob 
o enfoque das escolhas boas e más, do ponto de vista ético: a reflexão ética do 
‘bem’ e ‘mal’, do ‘justo’ e do ‘injusto’. A definição etimológica se apresenta como um 
36 
 
elemento fundamental, para esclarecer o que significa bioética enquanto disciplina 
que estuda questões referentes à vida, a busca pela compreensão sobre o que se 
entende por bioética atualmente. (GOLDIM, 2000). 
Maria Berenice Dias (2004) resume bioética em ‘ética da vida’ e 
apresentando como principal característica, o fato de ser uma ciência interdisciplinar. 
A bioética, considerada como ponte de encontro entre a medicina e os 
valores fundamentais de moral e de direito. A bioética impulsiona inúmeras 
mudanças de paradigmas, até então considerados invulneráveis. A discussão sobre 
a eutanásia seja jurídica ou não, envolve diretamente a bioética, como medida de 
freio e contrapeso aos avanços crescentes da medicina. 
A bioética, em resumo, trata da vida, da natureza, da fauna, e da vida 
humana à luz dos valores humanos aceitos em uma sociedade democrática, 
pluralista, secular e conflitiva. Assim sendo, para este trabalho, o que interessa é 
aquela que se ocupa com o tema referente à vida humana à luz dos valores aceitos 
em sociedade. 
A Bioética surgiu em virtude da preocupação da utilização dos 
conhecimentos médicos na vida dos pacientes. Instituiu-se em 1974 uma Comissão 
norte-americana visando à proteção dos direitos humanos na pesquisa biomédica 
que culminou com a publicação, após quatro anos de exaustivos trabalhos, debates 
e discussões, do chamado Relatório Belmond, que se tornou um verdadeiro guia 
para a ética da experimentação humana. Esse relatório, com publicação em 1978, 
estabeleceu pela primeira vez, a utilização sistemática dos princípios vetores da 
bioética (Autonomia, Beneficência e Justiça). (SANTOS, 1998). 
Em 1979, o Professor David J. Roy, diretor do Centro de Bioética da 
Universidade de Montreal, acrescenta uma nova característica ao instituto da 
Bioética reconhecendo seu caráter interdisciplinar, o que significa a interação de 
diferentes áreas de conhecimento na procura de soluções. Dela participam 
diferentes visões atuando profissionais das áreas de saúde, filósofos, teólogos, 
juristas, sociólogos, economistas, administradores, etc. Além disso, no processo de 
decisão participam não só médico e paciente, mas sim, toda generalidade de 
sujeitos e segmentos da sociedade envolvidos, médico, paciente, familiares, outros 
profissionais, a justiça, a comunidade, etc. (CARNEIRO et al, 1998). 
37 
 
Em 1995, aprimorando sua definição de 1978, o professor Waren Reich 
inclui aspectos de sistematização, interdisciplinaridade e pluralismo como 
característicos da bioética. 
Lucilda Selli (1998, p. 43), define os princípios da autonomia, beneficência 
e da justiça “como princípios éticos básicos que deveriam nortear a experimentação 
em seres humanos, tanto nas ciências do comportamento quanto na biomedicina”. 
 
 
3.3.1 Princípios da Bioética 
 
 
Levando-se em consideração a relevância das questões surgidas com o 
avanço tecnológico das ciências em relação à vida, conclui-se que essa mesma 
tecnologia não é suficiente para responder a muitos questionamentos éticos e 
morais. De forma sintética, esses princípios elementares da bioética serão 
abordados a seguir, lembrando, que devem funcionar de forma harmônica, e é a 
circunstância da ação que decide qual deles deverá ser aplicado. 
a) Princípio da Autonomia: ou princípio do respeito às pessoas que está 
intimamente ligado ao conceito de dignidade humana. 
Diz respeito à capacidade de as pessoas decidirem por si próprias o que 
lhes parecer melhor. A autonomia, no âmbito da relação médico-paciente, traduz-se 
no respeito daquele à vontade deste, “bem como a seus valores e crenças. è 
reconhecido, destarte, o domínio do paciente sobre a própria vida e o respeito à sua 
intimidade”. (CARVALHO, 2001, p. 77). 
A formulação de tal princípio foi influenciada pela ética do filósofo alemão 
Immanuel Kant (1724-1804): as pessoas jamais devem receber tratamento na 
qualidade de meios para fins de outras pessoas, pois ao homem é legítimo ter direito 
às suas autonomias. Ser autônomo e escolher autonomamente não é a mesma 
coisa do que ser respeitado como agente autônomo. Ser respeitado significa ter 
reconhecido seu direito de autogovernar. O sujeito está autorizado a determinar-se 
autonomamente, livre de limitações e interferências, onde o sujeito é capaz de 
deliberar sobre seus objetivos pessoais. O princípio da autonomia expressa este 
respeito. (JUNGES, 1999, p. 41). 
38 
 
Kant (apud MORENTE, 1980, p. 257-258) em sua doutrina distinguindo 
autonomia de heteronomia pregava: “a vontade é autônoma quando dá a si mesma 
sua própria lei [...] Age de tal maneira que o motivo, o princípio que te leve a agir, 
possas tu querer que seja uma lei universal.” Vai ao encontro da concepção de que 
a pessoa deve ter liberdade no sentido de isenção de qualquer influência na tomada 
de decisão e volitividade no sentido de capacidade de agir intencionalmente. Ser 
compreendida e tratada como ente autônomo, exasperando-se o dever de cuidado, 
zelo, diligência e efetiva proteção às pessoas que tenham sua autonomia diminuída. 
A heteronomia é exemplificada por Kant como o funcionamento da natureza 
segundo leis alheias à nossa vontade. 
Nesse mesmo sentido, Rachel Sztajn (1997, p. 28) 
Para bioética a ideia é que a autonomia significa que um ser humano, 
exatamente por sua humanidade, não tem poder, e nem deve tê-lo, para 
impor sua vontade sobre outro ser humano; em outras palavras, segundo os 
princípios da bioética ninguém, notadamente o médico, deve coagir outrem, 
o paciente, limitar suas atividades ou impor sobre outrem sua vontade. Essa 
liberdade e respeito à privacidade estão na raiz da dignidade humana, pois 
a manifestação autônoma da pessoa, por dispor e regrar os próprios 
interesses deve estar livre de influências, coação ou pressão externa para 
produzir os regulares efeitos previstos no ordenamento jurídico. 
 
Tal respeito à pessoa é defendido no Relatório Belmont de 1979, afirma 
Dall’Agnol (2005), onde uma pessoa tem valor, não preço. Aplicando-se esse 
princípio a uma questão ampla da bioética, ele significa, por exemplo, que qualquer 
agente é autônomo para decidir se quer continuar a viver em certas circunstâncias 
ou não. 
Em suma, as teorias acerca da autonomia concordam quanto à essência 
que envolve um conceito de liberdade aliado ao de volitividade: Liberdade no sentido 
de isenção de qualquer influência na tomada de decisão e volitividade no sentido de 
capacidade de agir intencionalmente. 
b) Princípio da Beneficência: beneficência, do latim ‘bonum facere’ 
(fazer o bem), é o princípio ético que remonta ao juramento de Hipócrates (apud 
VASCONCELOS, 1974, p. 198) (o pai da medicina), que consagra implicitamente 
esse princípio: “Usarei o poder para ajudar os doentes com melhor de minha 
habilidade e julgamento; abster-me-ei

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