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1 LITERATURA INFANTOJUVENIL FERNANDA LIMA MAIA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIAFACULDADE ÚNICA 1 LITERATURA INFANTOJUVENIL FERNANDA LIMA MAIA 1 © 2021, Faculdade Única. Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem Autoriza- ção escrita do Editor. FACULDADE ÚNICA EDITORIAL Diretor Geral:Valdir Henrique Valério Diretor Executivo:William José Ferreira Ger. do Núcleo de Educação a Distância: Cristiane Lelis dos Santos Coord. Pedag. da Equipe Multidisciplinar: Gilvânia Barcelos Dias Teixeira Revisão Gramatical e Ortográfica: Izabel Cristina da Costa Revisão/Diagramação/Estruturação: Bruna Luíza mendes Leite Carla Jordânia G. de Souza Guilherme Prado Design: Aline De Paiva Alves Bárbara Carla Amorim O. Silva Élen Cristina Teixeira Oliveira Taisser Gustavo Soares Duarte Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Melina Lacerda Vaz CRB – 6/2920. NEaD – Núcleo de Educação a Distância FACULDADE ÚNICA Rua Salermo, 299 Anexo 03 – Bairro Bethânia – CEP: 35164-779 – Ipatinga/MG Tel (31) 2109 -2300 – 0800 724 2300 www.faculdadeunica.com.br 2 LITERATURA INFANTOJUVENIL 1° edição Ipatinga, MG Faculdade Única 2021 3 Fernanda Lima Maia Doutoranda em Teoria da Literatura e mestra em Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Pernambuco, (UFPE) (2017). Licenciada em Letras Português/Inglês pela Facul- dade São Miguel (2011). Em 2018 integrou o Time de Autores da Nova Escola, contribuin- do para a produção de quinze planos de aula de Língua Portuguesa em torno do gênero ?meme?, que pode ser encontrado no site da organização. Em 2017, atuou como tutora de educação a distância, por um período curto, no curso de graduação em Letras da UFPE, na área de Teoria da Literatura I. Ainda na área de docência, atuou como Professora de Português pela Secretaria do Estado de Pernambuco, para alunos do Ensino Básico, Fun- damental II e Médio. 4 LEGENDA DE Ícones Trata-se dos conceitos, definições e informações importantes nas quais você precisa ficar atento. Com o intuito de facilitar o seu estudo e uma melhor compreensão do conteúdo aplicado ao longo do livro didático, você irá encontrar ícones ao lado dos textos. Eles são para chamar a sua atenção para determinado trecho do conteúdo, cada um com uma função específica, mostradas a seguir: São opções de links de vídeos, artigos, sites ou livros da biblioteca virtual, relacionados ao conteúdo apresentado no livro. Espaço para reflexão sobre questões citadas em cada unidade, associando-os a suas ações. Atividades de multipla escolha para ajudar na fixação dos conteúdos abordados no livro. Apresentação dos significados de um determinado termo ou palavras menciaonadas no decorrer do livro. FIQUE ATENTO BUSQUE POR MAIS VAMOS PENSAR? FIXANDO O CONTEÚDO GLOSSÁRIO 5 SUMÁRIO UNIDADE 1 UNIDADE 2 UNIDADE 3 1.1 Introdução .........................................................................................................................................................................................8 1.2 Definição de literatura infantil ...........................................................................................................................................8 1.3 Literatura infantil e a escola ...............................................................................................................................................10 FIXANDO O CONTEÚDO ..............................................................................................................................................................12 2.1 Introdução ......................................................................................................................................................................................17 2.2 O letramento literário ............................................................................................................................................................18 2.3 O contador e a contação de história ..........................................................................................................................19 2.4 O mediador e a mediação de leitura ........................................................................................................................20 FIXANDO O CONTEÚDO .............................................................................................................................................................22 3.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................27 3.2 A Base Nacional Comum Curricular e a educação moderna ..................................................................27 3.3 A literatura no ensino de português .........................................................................................................................29 3.4 Uma proposta de formação literária ..........................................................................................................................30 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................................................................................31 A LITERATURA INFANTIL E JUVENIL LITERATURA INFANTOJUVENIL EM DEBATE A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E A FORMAÇÃO LEITORA UNIDADE 4 4.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................36 4.2 Tipos de relação palavra-imagem ...............................................................................................................................38 4.3 Os níveis de relação entre texto imagem ...............................................................................................................43 4.3.1 Relação de redundância ....................................................................................................................................................43 4.3.2 Relação de colaboração ....................................................................................................................................................43 4.3.3 Relação de disjunção ..........................................................................................................................................................43 4.4 A linguagem visual no livro sem texto .....................................................................................................................44 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................................................................................46 A PALAVRA E A IMAGEM NA LITERATURA INFANTIL E JUVENIL UNIDADE 5 5.1 Introdução ......................................................................................................................................................................................52 5.2 O contexto no livro Infantojuvenil .................................................................................................................................53 5.3 Especificidades do livro ilustrado .................................................................................................................................55 5.3.1 Tipos de diagramação do livro ilustrado ......................................................................................................................55 5.4 Livro: Expressãoartística e literária ..............................................................................................................................57 FIXANDO O CONTEÚDO .............................................................................................................................................................59 O LIVRO ILUSTRADO NA LITERATURA UNIDADE 6 6.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................65 6.2 Sensibilidades do livro ilustrado ....................................................................................................................................67 6.2.1 Despertando sensibilidades com o livro-brinquedo ...............................................................................................67 6.2.2 Proposta de jogo com o livro-brinquedo ....................................................................................................................68 6.3 Tipos de livro-objeto na literatura infantil .............................................................................................................70 6.4 Papel do lúdico na aprendizagem ..............................................................................................................................74 FIXANDO O CONTEÚDO .............................................................................................................................................................76 RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO .................................................................................................................80 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................................................................................81 O LIVRO ILUSTRADO: OBJETO DE EXPRESSÃO ARTÍSTICA E LITERÁRIA 6 UNIDADE 1 Na primeira unidade são discutidas a noção de infância, o termo literatura infantil e juvenil, bem como uma definição em torno desse conceito. Também é abordado o papel da literatura na Educação Básica e propostas de ensino que visam compreender duas vertentes: da função e da fruição. UNIDADE 2 Na segunda, compilamos alguns tópicos importantes na abordagem da LIJ, tais como: o olhar discriminatório que inferioriza a literatura destinada para crianças e jovens; a FNLIJ; o letramento literário; a figura do mediador e do contador de histórias ou ato de mediar e contar narrativas. UNIDADE 3 Na terceira unidade focamos nos tópicos em que a BNCC trata sobre a literatura ensinada para crianças e jovens, a formação leitora na educação moderna e, por fim, as leis que oficializaram o ensino da história e cultura afro-brasileira, africana e indígena no contexto educacional brasileiro e no ensino de literatura. UNIDADE 4 Na quarta unidade tratamos sobre a relação palavra-imagem na literatura infantil e seus níveis de relação, tais como o de redundância, colaboração e disjunção. Também da literatura infantil nos textos mutimidiáticos e a linguagem visual no livro sem texto. UNIDADE 5 Na quinta, abordamos o livro ilustrado na literatura infantojuvenil, a partir da ótica do contexto e de suas especificidades, além das narrativas infantis na prática pedagógica e a importância da adequação do texto artístico e literário. UNIDADE 6 No sexto e último capítulo, mergulhamos no livro ilustrado enquanto objeto de expressão literária e artística e suas sensibilidades, assim como os elementos da narrativa literária e mais variados tipos de livros, incluindo os digitais e interativos. C O N FI R A N O L IV R O 7 LITERATURA INFANTIL E JUVENIL UNIDADE 01 8 1.1 INTRODUÇÃO 1.2 DEFINIÇÃO DE LITERATURA INFANTIL Zilberman (2012) contextualiza que a noção de “infância” não existia até o final do sé- culo XVII. Logo, não havia uma produção literária voltada para esse público. Só a partir da Idade Moderna é que se passou a desenvolver um interesse em classificar uma literatura segundo a faixa etária, com objetivos e formação específicos para as crianças e jovens. A mudança de perspectiva ocorreu com o surgimento da burguesia, quando a noção de fa- mília e a preocupação com a privacidade passaram a ser o centro de interesse dessa nova constituição social. Nesse mesmo período, houve uma evolução nas técnicas de industriali- zação, ampliando a produção, a distribuição e consumo de produtos em grande quantidade: a chamada cultura de massa. A autora ainda explica que se o laço familiar contribuiu para separar as crianças dos adultos, a partir da valorização da infância, por outro lado, o desenvolvimento das crianças e de suas emoções passaram a ser mais controlados. Papéis estes assumidos primeiro pela Literatura Infantil, em seguida, pela instituição escolar. De tal modo, Zilberman (2012) pon- tua que foram os pedagogos e professores os autores dos primeiros textos infantis. Por seu surgimento está relacionado com a ascendência da família burguesa, da constituição da infância e da reorganização da escola, à literatura infantil foi contestado o seu valor artístico e estético. Se por um lado a relação da literatura produzida para crianças e jovens com a pedago- gia permite uma maior propagação da literatura infantil e juvenil, por outro, a função didáti- ca a qual ela passou a ser vinculada quando inserida na educação formal, fez com que fosse desconsiderada enquanto obra literária ou considerada de qualidade inferior. Literatura infantil e juvenil: um termo necessário? A Literatura Infantil é classificada como aquela que é destinada para as crianças. Porém, con- forme vimos, a infância é uma invenção da Idade Moderna, época quando se passou a pensar uma literatura e uma escola voltadas para esse novo universo oriundo da burguesia. Por sua vez, Meireles (2009, p. 22) traz a proposta de que “Seria mais acertado, talvez, assim classificar o que elas [as crianças] leem com utilidade e prazer”. Assim, para a escritora, não há uma Literatura Infantil a priori (isto é, que antecede a experiên- cia de leitura dessa literatura), mas a posteriori (após a experiência de leitura). Você concorda com essa visão de Cecília Meirelles? Na sua opinião, de que maneira classificar um texto como VAMOS PENSAR? “infantil” ou “infantojuvenil” é capaz limitar ou orientar o ensino de literatura, a literatura em si e a noção de infância? Para melhor embasar esse debate e sua resposta, busque mais informações sobre a relação entre a criança, o livro e a escola, assim como o estatuto da Li- teratura Infantil em obra clássica, na abordagem desses temas, escrito por Re- gina Zilberman (2012) e disponível em: https://bit.ly/3ffu1tD. Acesso em: 18 mar. 2021. 9 Ensino de literatura na educação básica: função ou fruição? Conforme vimos, a literatura era pensada somente do ponto de vista educativo. Postura que ainda hoje é encontrada na educação formal, destituindo a literatura de seu caráter artístico ou da fruição, para fins exclusivamente pragmáticos (a exemplo dos textos literários classi- ficados como “paradidáticos”). Contribuindo, assim, mais para a dominação da criança do que para a fruição ou constituição do pensamento crítico desse público. Por isso, Zilberman alerta: “De um lado, o vínculo de ordem prática prejudica a recepção das obras; o jovem pode não querer ser instruído por meio da arte literária; e a crítica desprestigia globalmente a produ- ção destinada aos pequenos, antecipando a intenção pedagógica, sem avaliar os casos es- pecíficos. De outro, a sala de aula é um espaço privilegiado para o desenvolvimento do gosto pela leitura, assim como um campo importante para o intercâmbio da cultura literária, não podendo ser ignorada, muito menos desmentida sua utilidade” (ZILBERMAN, 2012, p. 16). FIQUE ATENTO Ao se voltar sobre o termo “Literatura”, Hunt (2010, p. 82) propõe a distinção entre oque se pensa dela e o que ela pode ser, do ponto de vista lógico. Por isso, observa também que acabam sendo feitas colocações que visam hierarquizá-la como mais elevada, densa, carregada ou até mesmo especial ou à parte, quando comparadas a demais produções ar- tísticas. Tal pensamento não apenas favorece o posicionamento discriminatório da literatura em relação a outras formas de conhecimento e criação artística, galgando-a como “melhor”, como contribui para o discurso equivocado de que a literatura infantil ou juvenil caracteriza um tipo de produção “menor” em relação a textos canônicos ou formas literárias historica- mente mais consagradas, como aquelas que se valem apenas do texto verbal escrito, por exemplo. De modo que Hunt (2010) caracteriza como esquizofrênica a visão – assimilada por alguns profissionais que atuam com o livro infantil – de que a “literatura” não é adequada para crianças. Esta perspectiva, explica o pesquisador, distancia a literatura do universo infantil e ignora a potencialidades que esse público é capaz de desenvolver quando em contato com o texto literário. Ou seja, a divisão da literatura em literatura infantil ou infantojuvenil, quan- do serve para criar relações hierárquicas, ignora que “As definições de literatura podem ser convenientemente separadas em características, normas culturais e segundo os usos que os indivíduos dão ao texto” (HUNT, 2010, p. 83-84). Isto é, em uma sociedade que normatiza a fala discriminatória contra o negro, o índio, o homossexual e outros recortes sociais não dominantes, é inevitável que o texto literário, seja ele classificado como infantil ou não, traga marcas do discurso racista ou homofóbico, por exemplo, de maneira mais ou menos cons- ciente ou perceptível. Para Zilberman (2012), por sua vez, a atividade com literatura infantil é um processo de compreensão, em que, durante a recepção da obra, são captados os sentidos, como o texto se relaciona com o leitor e o contexto histórico. De modo que a autora considera que o professor deve não apenas concretizar e expandir a alfabetização (ensinar o aluno a dominar os códigos de leitura), mas também para a compreensão do texto, estimulando os alunos a falarem sobre o texto e a pensarem sobre a temática e a(s) linguagem(ns) aplicada(s) no gênero textual abordado. 10 1.3 LITERATURA INFANTIL E A ESCOLA Assim, no ensino de literatura infantil, o educador deve ponderar seu caráter prático (da formação do leitor, por exemplo) com o da fruição. Ou seja, manter-se em constante diá- logo com as propostas pedagógicas da escola e sua própria prática em sala de aula, sem negligenciar o interesse dos alunos. Pois, à medida que a literatura é recorrida apenas para exercer uma função (de explicar regras gramaticais, por exemplo, ou de passar mensagens moralizantes), o texto é esvaziado, esquecendo-se que a leitura permite abrir novos horizon- tes, e que para isso a leitura não precisar ser um ato de desprazer, nem para o educador, nem para o educando. Entenda a literatura infantil e a leitura a partir do olhar de professores, responsáveis, crianças e empresários do setor a partir do documentário “Ler Para Sonhar: o mundo da Literatura Infantil”, lançado pela TV Justiça. O curta, que está disponível no Youtube, propõe compreender o momento em que a criança deve come- çar a interagir com a leitura, assim como o quê e como abordar a literatura infantil. Acesse o conteúdo no link https://bit.ly/2TaiZNz. Acesso em: 18 mar. 2021. Independente da faixa etária, o leitor traz consigo uma bagagem cultural e experiên- cias de vida ou base de conhecimento que influenciam na interação que desenvolve com o livro e com o processo de leitura. Ou seja, a produção de sentido passa pelo leitor, pela obra e pelos contextos em que ambos estão inseridos. Por isso, Hunt (2010) considera alguns dos aspectos que são trazidos pelo leitor: a atitude para com o livro e com a vida; o conhecimen- to e a experiência com livros e também com a vida; a formação e os preconceitos culturais; os recortes raciais, de classe, idades e sexualidade. “O que de fato queremos dizer quando afirmamos que uma criança pode ler e ‘entender’ uma história?” provoca Hunt (2010, p. 112), ao nos propor pensar sobre o tipo de significado que é produzido por um leitor criança a partir da leitura de um livro e, ainda, se este significado é similar ao que é produzido por um leitor adulto. “É possível descobrir?” (HUNT, 2010, p. 112). Para Meireles (2009, p. 77), “a Literatura Infantil, em lugar a de ser a que se escreve para crianças, seria a que as crianças leem com agrado”. A partir desta colocação e dos ques- tionamentos trazidos por Hunt (2010), tente identificar (evitando o juízo de valor) por meio da observação de diferentes leitores, crianças e adultos ou de sua própria experiência leitora: I. Quais semelhanças você identifica entre o leitor criança e o leitor adulto? II. Agora, quais são as diferenças entre esses leitores? Realmente há diferenças? III. Você considera que a sua experiência de vida, opinião e preconceitos são capazes de interferir na sua experiência com o texto? IV. Você considera que a sua experiência de vida, opinião e preconceitos são capazes de interferir na experiência de outro leitor? V. Quais interferências o leitor adulto é capaz de gerar na experiência do leitor-criança? VI. Quais contribuições o leitor criança é capaz de fornecer ao leitor adulto? Tais questionamentos nos ajudam a nos situar, enquanto adultos, tanto como leitor quanto como mediador ou responsável de leitores crianças sobre como nossas experiências e conhecimento previamente adquiridos geram impactos não apenas na nossa relação lei- tora com o texto artístico ou literário, mas também nas crianças e jovens que são interme- 11 diados por nossas decisões. Zilberman (2012) contextualiza que a burguesia ascendente dos séculos XVIII e XIX foi a patrocinadora da ampliação e melhoria da escola enquanto um sistema de estrutura claustral e pela sua pedagogia ou organização do pensamento que visa justificar o valor da educação, bem como suas concepções e atividades. A valorização da infância, assim, é desencadeada e propagada sob um conceito moderno, dotando-a de uma imagem de de- pendência e fragilidade, reforçando a necessidade de proteção da criança. Por isso a autora critica a ideia de que a transmissão de conhecimento e seus modos de expressão deve ser regida conforme a visão do adulto, impedindo, com isso, o direito de expressão das crianças e jovens. De maneira que a menoridade, a fragilidade física e moral, a imaturidade intelectual e afetiva são os atributos representativos da criança e da infância. Então, para Zilberman (2012), a escola, ao alimentar tal noção, participa do processo de ma- nipulação dos menores, para que cumpram à norma que são impostos a eles, formulada pela classe dominante, historicamente desenhada pela burguesia. Logo, a literatura infantil também pode ser submetida a essa “missão”: “Transmitindo, em geral, um ensinamento conforme a visão adulta do mundo, ela se compromete com padrões que estão em desa- cordo com os interesses do jovem” (ZILBERMAN, 2012, p. online). Igualmente, complementa Zilberman: […] a obra literária pode reproduzir o mundo adulto: seja pela atuação de um narrador que bloqueia ou censura a ação de suas personagens infantis; seja pela veiculação de conceitos e padrões comportamentais que estejam em consonância com os valores sociais prediletos; seja pela utilização de uma norma linguística ainda não atin- gida pelo seu leitor, devido à falta de experiência mais complexa na manipulação com a linguagem (ZILBER- MAN, 2012, p. online). Em outras palavras, além da responsabilidade da educação em sentido amplo, o adul- to mantém relação de poder – a econômica é uma delas – sobre as crianças (seja ela filho ou filha; sobrinho ou sobrinha; aluno ou aluna etc.), que precisam estar em constante processo de autocrítica, de modo que nema criança tenha seus desejos anulados (tornando-os de- pendentes ou acríticos), nem o adulto se iniba da necessidade de orientação sobre os pe- quenos em uma importante fase de formação a personalidade. BUSQUE POR MAIS A literatura na prática da sala de aula No primeiro capítulo da obra em que trata sobre a Literatura Infatojuvenil, Minu- zzi et al. (2019) aborda sobre a leitura e a literatura: histórico e prática em sala de aula, em que é possível ter uma visão histórica de como a literatura vem sendo abordada nas escolas. Acesse o capítulo no livro que está disponível em: https:// bit.ly/3oIMmSZ. Acesso em: 14 mar. 2021. 12 1. (CONSULPLAN, 2013 - Adaptado) Leia a citação a seguir a respeito da noção do universo infantil e juvenil: “Tanto a criança à qual se destina a literatura infantil, quanto o jovem ao qual se destina a literatura juvenil são construções, ambas sociais. E, na condição de satélites de construções sociais, tanto o infantil de uma quanto o juvenil de outra são conceitos instáveis: o que é literatura infantil, em determinado contexto, pode ser juvenil em outro e vice-versa” (Lajolo, 2008, p. 24) No que concerne à relação entre texto e leitor infantil/juvenil, Lajolo afirma que: a) A boa literatura para crianças envolve narrativas com forte apelo moral, enquanto que, para os jovens, envolve histórias que tenham por pano de fundo a questão da sexualidade, pois esses são os contextos relacionados a essas faixas etárias. b) Os temas que contribuem com a formação moral do leitor devem ser priorizados, tendo em vista a faixa etária do público para o qual se dirige, pois o principal valor da literatura está no caráter educacional e formador dos livros. c) A literatura de qualidade para as crianças e para os jovens é aquela que envolve os clássicos definidos para um e outro grupo, pois vêm participando da formação de crianças e jovens há várias gerações. d) A literatura voltada ao público infantil e juvenil está vinculada a uma realidade social e, por isso, tem caráter mutante, a depender dos valores em voga em determinada comunidade em certo tempo. e) Tanto a Literatura Infantil como a Juvenil são narrativas que dependem de construções sociais, tais como a faixa etária, o contexto e público-alvo, na condição de satélites. 2. Segundo Zilberman (2012), a literatura infantil surge durante o século XVIII, período no qual mudanças na estrutura social influenciaram o fazer artístico. Nessa época, os gêneros clássicos, como a tragédia e a epopeia, perderam importância, com a ascensão do drama, melodrama o romance, entre outras formas de manifestações artísticas que passaram a expressar os interesses da burguesia. Sabendo disso, é correto afirma, sobre a Literatura Infantil: a) Que seu nascimento surge também com a ascensão de uma nova estrutura social e literária interessada em personagens aristocráticas e assuntos mitológicos. b) Que ela concedeu o status de infância para a sociedade burguesa, assim como reorganizou o espaço escolar e a cultura de massa. c) Que surge em decorrência da burguesia e a noção de núcleo familiar, da constituição da “infância” na sociedade e da reorganização escolar. d) Que sempre foi reconhecida por seu valor estético e artístico, enquanto um produto literário de cunho pedagógico. e) Que foi associada a gêneros clássicos devido à sua relação com a vida burguesa e cotidiana. FIXANDO O CONTEÚDO 13 3. A Idade Moderna ascendeu a escola e o gênero literário direcionado para a juventude (Zilberman, 2012). No mesmo período, a infância passa a ser valorizada por meio da criação de uma faixa etária, base da estrutura doméstica que passa a surgir nessa época. Diante disso, é correto afirma que a literatura infantil advém a) da necessidade de construção da imagem da criança como um indivíduo que merece atenção diferenciada, colocando-a no centro da estrutura familiar. b) do novo contexto social industrializado, gerando matéria-prima em grande quantidade para a produção dos livros infantojuvenis. c) do poder do Estado que passou a usar a figura da criança contra a nobreza feudal. d) da divisão entre a instituição social e a instituição escolar, em que a criança só é reconhecida pelo sistema da educação formal. e) da necessidade de impedir o direito de expressão dos jovens, por da concepção de que a criança é uma tábula rasa. 4. Sobre a relação entre a literatura infantil e a escola, com o advento da infância, a verdadeira criança foi apartada do ambiente social, à medida que passaram a ser controladas pelos adultos. Por isso, Regina Zilberman pontua alguns atributos que passaram a qualificar a criança e, com isso, contribuíram para a sua diminuição social. Assim, os atributos iniciados pelo fortalecimento da vida burguesa que ainda podem ser percebidos na contemporaneidade em torno da criança e da infância são: a) Detentora de razão e poder, capaz de reagir à estrutura hegemônica do núcleo familiar. b) A menoridade, a fragilidade física e moral, a imaturidade intelectual e afetiva. c) Solidárias aos adultos, de modo que desde o surgimento da burguesia, a relação entre a criança e o adulto sempre se deu de forma harmônica e igualitária. d) A falta de experiência, a necessidade de proteção e de imaturidade intelectual, presentes em período anterior à ascensão da burguesia e do núcleo familiar. e) A independência e o fortalecimento de valores individuais, em harmonia com os valores sociais da autonomia. 5. (UFMT, 2010 – Adaptado) Uma professora que acredita na literatura como algo prazeroso para a criança deve estar voltada ao gosto e apreciação. Assinale a ação coerente a essa concepção de trabalho com a literatura. a) Adotar mensalmente um título da literatura infantil para que todos os alunos façam a mesma leitura, pois assim haverá maior aproveitamento nas discussões e atividades sobre o mesmo. b) A partir do momento que os alunos dominarem a escrita, sempre solicitar o preenchimento de questionários e fichas de leitura para verificar a capacidade de interpretação textual. c) Promover situações em que os alunos possam ter contato com diversos títulos de livros, permitindo-lhes a livre escolha de suas leituras. d) Criar momentos em que os alunos possam olhar e folhear vários tipos de livros, mas, no momento da escolha, indicar o que é mais adequado para aquela idade evitando que alunos do 5.º ano, por exemplo, escolham livros de imagem ou de textos muito curtos. e) Reforçar, por meio da leitura de textos ficcionais, a imagem da criança como um ser dependente, frágil e que necessita da proteção dos adultos. 14 6. Compreende-se que a formação do professor impacta na formação do aluno. Por isso, MInuzzi (2019) acredita que pensar a prática de leitura literária na escola envolve compreender a concepção de leitura que o professor adota. Nesse sentido, é correto afirmar que a) o processo de leitura e escrita não afeta diretamente as formas de agir. Isto é, a didática de ensino de literatura em situação da prática pedagógica. b) o professor que entende o processo de leitura como uma ação mecânica de decodificação do código linguístico, essa concepção será transferida na didática emprega pelo professor no ensino de literatura. c) a prática docente raramente é afetada por uma perspectiva redutora do texto literário, como perguntas genéricas que se limitam a respostas gerais, como: O quê? Quem? Quando? Onde? Porquê? Como? d) o acesso ao código linguístico é a única e essencial ferramenta para decodificação e interpretação do texto literário, associando-o ao seu contexto. e) a leitura literária é uma prática social que deve ser trazida pelo professor com o objetivo de analisar textos literários disponíveis no livro didático. 7. Entende-se que o ensino de literatura deve capacitar o aluno para ampliar a busca e o conhecimento em torno dos textos literários. De modo que, por meio da leitura, o professor atue como um mediador tanto no processo de aquisição da linguagem como na capacidade da leiturae escrita na prática cotidiana. Assim sendo, é correto afirma que a) No ensino de literatura o professor deve desenvolver a autonomia, mas controlando os temas abordados, com a finalidade de restringir as obras abordadas conforme seu gosto pessoal. b) O professor deve priorizar abordar o texto literário a partir do didatismo e pedagogismo, integrando a leitura como uma prática rotineira da formação educacional. c) O ensino de literatura na educação formal envolve transmitir uma moral e ensinamentos, através de textos de ficção, como os contos de fada e as fábulas, para que as crianças sejam educadas conforme a moral do professor, da escola ou da família. d) O professor deve mediar a leitura, ao passo que precisa estimular a independência do aluno no processo de descoberta de novos textos. Fazendo da leitura de textos literário uma prática efetiva na sala de aula. e) O professor deve utilizar os textos literários exclusivamente para a aplicação de atividades de interpretação, de modo que a literatura será aplicada como um produto paradidático, e não de fruição. 8. A leitura é um importante recurso para a formação do indivíduo, seja na educação formal ou informal. Por sua vez, na instituição escolar, o professor necessita considerar algumas estratégias, com a finalidade de chamar a atenção do leitor nos anos iniciais, como a ludicidade, por exemplo (MIZZUINI, 2019). Com isso, também pode ser considerada uma estratégia de incentivo à leitura literária por meio do desfrute: 15 a) A abordagem de textos literários mais avançados para que os alunos evoluam mais rapidamente tanto na aquisição da linguagem formal como na interpretação crítica das obras. b) Optar pela seleção de textos literários que façam parte do universo do professor, cabendo apenas ao docente determinar a melhor obra para o processo de leitura, sem considerar o contexto histórico ou social dos alunos. c) A realização de rodas de leituras, por meio da utilização de brinquedos, fantasias que materializem a leitura para a criança. d) Solicitar que os alunos façam um resumo ou respondam fichas pedagógicas sobre as obras literárias abordadas durante a aula. e) Evitar a abordagem de textos literários de modo precoce. Por isso as crianças só devem iniciar o processo de interação com o texto literário apenas quando adquirirem total aquisição dos códigos linguísticos. 16 LITERATURA INFANTOJUVENIL EM DEBATE UNIDADE 02 17 2.1 INTRODUÇÃO A Literatura Infantojuvenil é uma literatura menor? Tal pergunta é trazida aqui como uma provocação e revela o lugar em que o texto literário pensado para crianças e jovens é usualmente colocado: como uma criação inferior. Este preconceito é denunciado pela re- petição acrítica de frases que servem mais à manutenção de uma literatura canônica tra- dicional de elite do que à análise das diferentes formas de escrita e de público que o texto literário é capaz de impactar. Não é raro encontrar tanto licenciandos e professores como pesquisadores, escritores, editores e demais profissionais da Literatura ou da Educação que, de alguma forma, coadunam com esse tipo de segregação. De modo que esse discurso resume a qualidade do texto literário resume a obra li- terária-artística a critérios arcaicos, tais como: (i) à quantidade de páginas do livro (“Livro bom é aquele que fica em pé”); (ii) ao desprezo da linguagem informal em relação à formal (“Esse texto não é literatura, só tem gírias”; “Não se escreve mais como antigamente”); (iii) à forma invariável ou incompreensão de uma dada linguagem ou gênero literário (“Poesia tem que ter verso e rima”); (iv) à supervalorização de uma dada linguagem (“Só a palavra é capaz de expressar algo poeticamente”; “Texto com ilustração não é literatura”). Quando repetimos frases reducionistas como as que exemplificamos aqui, não apenas realizamos comparações mal embasadas, mas também contribuímos para a visão de que a Literatura Infantojuvenil é de qualidade inferior, negando as suas qualidades literárias, bem como a sua importância social e histórica. Assim, Hunt (2010) considera que se a decisão cultural determina as características (superficiais) da literatura, logo os livros infantis serão rejeitados do sistema de juízo de valor, considerando que tais regras margeiam gêneros que não atendam a seus critérios unívocos e centralizadores, conforme exemplificamos anteriormente por meio de frases reproduzidas sem que suas origens sejam criticamente avaliadas. Então, se um professor ou responsável de um aluno, por exemplo, acredita que a criança é uma tábula rasa, logo ela será vista como incapaz de produzir conhecimento ou de realizar apreciação estética. Isso impactará negativamente seja no conceito em torno da literatura infantojuvenil (sendo historicamente classificada como de menor qualidade literária tanto na Academia como na cadeia produtiva do livro); quanto nos critérios de seleção de textos literários para o público infantil e juvenil e, consequentemente, implicará em restrições feitas pelos adul- tos, que impedirá o acesso da criança e do jovem a linguagens e temáticas diversas. Isto é, quanto mais quem tem o poder de seleção do texto se volta para seus preconceitos, medos ou gosto de forma acrítica, menor será a possibilidade de crianças e jovens ampliarem seu conhecimento de mundo. Quanto menos somos estimulados a pensar ou a desfrutar o tex- to literário ou artístico, mais restrito será nosso horizonte. Durante o processo de curadoria de obras infantojuvenis para serem abordadas na sala de aula, você pode buscar por instituições que atuam na área. Há órgãos que oferecem premia- ções reconhecidas em todo o país e também no mundo, de modo que as obras selecionadas já passam por critérios prévios de curadoria. Servindo, assim, como um filtro ou referência inicial para a sua pesquisa de textos que serão abordados no ambiente escolar. FIQUE ATENTO 18 Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) A Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil é uma instituição privada, sem fins lucrativos, de utilidade pública federal e estatual, sendo a seção brasileira do “International Board on Books for Young People” (IBBY). Tem como objeti- vo técnico-educacional a promoção e a divulgação de livros para crianças e jovens, assim como democratizar o direito pela leitura por meio de bibliotecas escolares, públicas e comunitária. Acesse o site da Fundação através do link: https://bit.ly/3oJWJ92. 16 mar. 2021. Biblioteca da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) A Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil oferece acesso a dados do seu acervo de livros publicados no Brasil, destinados a crianças e jovens. Nela, ain- da é possível encontrar textos informativos e teóricos a respeito do tema da literatura infantil e juvenil, leitura e áreas correlatas. Acesse o acervo da Biblio- teca em: https://bit.ly/2SqvgNm. Acesso em: 16 mar. 2021. 2.2 O LETRAMENTO LITERÁRIO Introduzido no Brasil na década de 1980, período em que o ensino de literatura pas- sou a ser repensado, quando se percebeu que mesmo passando pelo processo de alfabe- tização, os alunos não adquiriam habilidades e competências escritas, de modo que tinha dificuldades em compreender o texto em suas diferentes formas, o que o impossibilitavam de ter autonomia no âmbito social. A partir daí, o processo de alfabetização foi distinguido do de letramento. Enquanto o primeiro se trata da capacidade de decodificação (interpretar os códigos linguísticos) das letras do alfabeto, o segundo se refere à decodificação, à inter- pretação do texto e ao seu uso na vida cotidiana. Por isso, Minuzzi (2019, p. 23) explica que “o letramento não considera o leitor e a leitura como atos isolados e individuais, mas sim como inseridos em um contexto social muito maior”. Meireles (2009) considera que a Literatura infantil é marcada por três fatores: o mo- ral, o instrutivo e o recreativo. Contudo, ela pontua que nem sempre os limites entreessas qualidades são fáceis de reconhecer, ao passo que não aparecem apartados um do outro, à medida que interagem entre si, numa mesma obra literária. Por outro lado, pondera a es- critora, “sempre se pode discernir entre um livro que ensina a não roubar e o que ensina as quatro operações [...]” (MEIRELES, 2009, p. 93). Embora os limites nem sempre sejam claros, o entendimento moderno da literatura dialoga com uma noção transformadora da literatura. Seja da formação crítica ou da experiência pessoal do leitor em relação com a obra, seja no reconhecimento artístico do texto literário. Para Zilberman (2012, p. 25), a literatura infantil precisa ser pensada enquanto sua fun- ção formadora, esta que não deve ser confundida com a missão pedagógica, mas que “pro- picia os elementos para uma emancipação pessoal, o que é a finalidade implícita do próprio saber”. Assim, o projeto da escola com a literatura infantil precisa ser libertadora, ou seja, se desvincular da sua gênese moralista ou do “bom comportamento”, devendo-se, pois, rom- per a sua relação com a educação contraditória e tradicional em prol de uma proposta de apreensão de conhecimentos de mundo, por meio da ficção. 19 BUSQUE POR MAIS Entenda o debate em torno da presença e ausência de temas na literatura infantil a partir do texto escrito por Paiva (2008) “A produção literária para crianças: oni- presença e ausência das temáticas”, a autora debate sobre a questão temática na produção de textos literários para o público infantil, a partir da pergunta “Do que fala a literatura infantil”. Consulte o texto que está no livro a seguir, disponível em: https://bit.ly/3vtG244. Acesso em: 19 mar. 2021. 2.3 O CONTADOR E A CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS Na África Ocidental há uma figura importante para a transmissão de conhecimento e preservação da memória das variadas culturas do continente: são os griots ou as griottes. Contadores de histórias reconhecidos por suas habilidades artísticas e pela sabedoria que compartilham por meio da narrativa oral. Assim, a oralidade é para eles sagrada e transmis- sora de paz, explica a Associação Mawon, que fala da trajetória de Pape Babou Seck, sene- galês que migrou para o Brasil em 2018: “Ele é griot e diz que no país dele não há guerras porque as pessoas se comunicam fazendo brincadeiras, evitando conflitos e escutando as palavras dos griots, que transmitem segurança e esperança para seu povo” (ASSOCIAÇÃO MAWON, 2020, online). Por isso, esses sábios são respeitados em suas comunidades, onde partilham ensinamentos e mantêm vivo o conhecimento ancestral de seus povos. Na visão da autora, “Todo professor pode se tornar um contador de histórias” (GROSSI, 2021, online) e apresenta algumas dicas importantes para quem se interessa em se tornar um contador: É recomendável uma leitura prévia minuciosa do con- to, buscando apreender o seu sentido mais profundo, ou seja, buscando compreender a sua essência; é interes- sante, também, que se faça uma divisão do conto em cenas ou partes principais, e que se identifique a estru- tura da narrativa; por fim, é bom conhecer bem os perso- nagens e as situações que eles vivenciam na sequência narrativa (GROSSI, 2021, online). Grossi (2021) ainda explica que contar é diferente de ler uma história, embora sejam duas práticas que podem ser exercidas no ambiente escolar. De modo que o contador re- escreve o conto junto com a sua plateia. Mesmo conservando partes do texto, explica a au- tora, modifica-o ao passo que a interação com o público acontece. Por sua vez, o leitor faz um empréstimo de sua voz para a leitura do texto, sem modificar a estrutura linguística da narrativa ou o léxico optado por quem escreveu a narrativa. Portanto, Grossi (2021) conside- ra que, na maioria das vezes, o ato de contar histórias permite que muitos caminhos, isto é, outras leituras e interpretações ocorram no processo de recepção do texto literário. 20 BUSQUE POR MAIS Leitura, oralidade e escrita No capítulo “Leitura, oralidade e escrita”, de Spesatto (2019) trata sobre as diferentes manifestações da linguagem, bem como o conceito de língua em uso, fala e escrita, gêneros e tipos textuais, o texto literário enquanto mani- festações linguísticas e a aplicação da linguagem em diferentes contextos. Todos são temas relevantes para a aprofundar as noções de literatura, am- pliando-a para além da manifestação escrita, passando a incluir a narrativa oral. Texto disponível em: https://bit.ly/3vhI2wt. Acesso em: 14 mar. 2021. 2.4 O MEDIADOR E A MEDIAÇÃO DE LEITURA O Glossário CEALE (Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita), que traz termos de al- fabetização, leitura e escrita para educadores, define o Mediador de leitura, segundo Reyes (2021), como a ponte entre o livro e o leitor, visto que são pessoas que possibilitam que os livros cheguem aos leitores. De modo que a experiência de leitura bem-sucedida permitirá a formação gradual de leitores. Isto é, contribuirá para o interesse de leitura e para a cons- tituição de novos leitores. Reyes observa que não é possível especificar uma metodologia para a mediação de leitura. Seja pela presença com maior ou menor expressão, o mediador influencia na formação de leitores desde a infância. São aqueles difíceis de definir, mas fáceis de encontrar nas nossas vidas: o professor, o pai, a mãe, avós, o amigo, entre outras figuras que nos incentivam ou incentivaram, direta ou indiretamente, para nos aventurar na leitura de textos literários, por exemplo. Por isso que “Os mediadores de leitura, consequentemen- te, não estão somente na escola, mas no lar, nas bibliotecas e nos espaços não convencionais como os parques, os hospitais e as ludotecas, entre outros” (REYES, 2021, online). Meireles (2009, p. 77) acredita que a literatura tradicional é a primeira a acessar a me- mória da criança. Logo, “Ela representa o seu primeiro livro, antes mesmo da alfabetização, e o único, nos grupos sociais carecidos de letras”. Por isso, ainda na primeira infância, fase em que a criança não adquiriu compreensão sobre os códigos linguísticos da sua língua mater- na, será a presença dos mais experientes que concretizará essa primeira etapa de formação leitora. De modo que Reyes (2021)também considera que o ofício do mediador de leitura consiste em ler de muitas formas: primeiro, ler para si mesmo, pois “um mediador de leitura é um leitor sensível e perspicaz, que se deixa tocar pelos livros, que desfruta e que sonha em compartilhá-los com outras pessoas” (REYES, 2021, online). [...] um mediador cria rituais, momentos e atmosferas propícias para facilitar os encontros entre livros e leito- res. Às vezes, pode fazer a Hora do Conto e ler em voz alta uma ou várias histórias a um grupo, mas, outras vezes, propicia leituras íntimas e solitárias ou encontros em pe- quenos grupos. Assim, em certas ocasiões, conversa ou recomenda algum livro; em outras permanece em silên- cio ou se oculta para deixar que livro e leitor conversem (REYES, 2021, online). 21 Terceiro, além da leitura de livros, também realizada uma “leitura” dos seus leitores, isto é, busca compreender as necessidades do outro, que podem ser percebidas através de perguntas como, propõe Reyes (2021, online) “[...] Quem são, o que sonham, o que temem e quais são esses livros que podem criar pontes com suas perguntas?” Assim, ao exercer o nosso papel de mediador de leitura, seja com familiares, amigos, alunos ou colegas de profissão, o papel de curador de texto vai além da simples escolha de textos determinados exclusivamente pelo nosso gosto pessoal. Para Cosson (2009, p. 36), “[…] a leitura é uma competência individual e social, um processo de produção de sentidos que envolve quatro elementos: o leitor, o autor, o texto e o contexto”. Por sua vez, embora nosso juízo de valor e interesses influenciem na seleção do que consideramos adequado o não, interessante ou não para a formação leitora, é importante considerar que a leitura pre- cisa estar inseridana realidade do leitor, seja trazendo outras realidades seja apresentando outros pensamentos, de uma forma crítica e/ou prazerosa. Ao tratar sobre o leitor, Hunt (2011) aponta que é comum professores renomados de literatura infantil iniciarem as aulas solicitando para que os alunos (geralmente, adultos) apresentem uma história de leitura. Em seguida, o escritor traz alguns questionamentos que adaptamos abaixo, com o intuito de lançar luz sobre sua experiência leitora: • Qual a sua atitude para com os livros que você leu ou lê? • Os livros que integram a sua leitura contribuem para a sua formação cultural? • A leitura é, para você, como um comportamento normal? • A leitura faz parte do seu cotidiano? • Quantos livros você costuma ler no ano? • Quais tipos de leitura ou de livros você costuma ler? A partir das perguntas levantadas acima, tente respondê-las com o objetivo de compreender de que modo a leitura está presente em seu cotidiano e quais impactos ela terá na sua vida pessoal e como educador. Agora, pense: de que forma essas perguntas podem contribuir para a curadoria de livros para crianças e adolescentes? Seja você enquanto professor, mediador de leitura ou contador de histórias, para seus alunos; seja você responsável pela educação leitora de seus familiares, por exemplo. VAMOS PENSAR? 22 1. Sabe-se que é preciso diferenciar a leitura do letramento, e o sujeito alfabetizado do sujeito letrado. Sendo o letramento, além do ato de ler, referente às competências e habilidades da leitura e escrita em situação prática. É correto afirma que a) tanto a leitura como o letramento podem ser entendidos como um ato individual, enquanto e isolado do indivíduo. b) o letramento resume-se à decodificação do texto, isto é, dos códigos linguísticos. c) No letramento, o texto é pensado em seu contexto, tanto no processo de leitura quanto de escrita. d) o diferencial do letramento para a leitura é que o primeiro se trata de uma aquisição individual de habilidades imprescindíveis para a leitura e escrita estrutural de qualquer texto literário. e) no processo de letramento literário são analisadas apenas a estrutura gramatical e de estilo do texto, desconsiderando a sua relação com as diferentes realidades de recepção da obra. 2. O griots, referência na mediação de leitura, representam a preservação da memória e ancestralidade de seu povo, em terras africanas. Em contexto brasileiro, a mediação pode ser feita tanto pelo professor como por qualquer outra pessoa que possibilite que o livro chegue ao público leitor. A noção de leitura por Cosson (2014) que melhor se adequa tanto à prática do griot quanto do professor-mediador é a) “quando leem literatura, o texto selecionado é o best-seller do momento, seguido pela leitura indicada pela escola, como se supõe pela presença de obras canônicas e de literatura infantil na lista dos preferidos.” b) […] ler é um diálogo com o passado que cria vínculos, estabelece laços entre leitor e o mundo e os outros leitores. Por meio da leitura, tenho acesso e passo a fazer parte de uma comunidade, ou melhor, das várias comunidades de leitores, porque na leitura nunca estou sozinho […]” c) a leitura é, assim, um processo de compartilhamento, uma competência social. Daí que uma das principais funções da escola seja justamente constituir-se como um espaço onde aprendemos a partilhar, a compartilhar, a processar a leitura” d) “e como desenvolvemos a nossa capacidade de leitura? Lendo. Lendo qualquer texto e de qualquer modo? Não. Lendo de maneira formativa. E como leio formativamente?” e) “ao longo dessa tradição, a aliança entre escola e literatura era de mútuo benefício. À escola cabia preservar e transmitir os textos considerados relevantes, que hoje denominamos cânones, por meio do ensino sistemático, assim como formar leitores competentes para consumi-los.” 3. Ao tratar sobre o tema da apropriação no círculo de leitura, Cosson (2014, 25), afirma que: Por ser apropriação, permite que seja individualizado ao mesmo tempo em que demanda interação social, pois só podemos tornar próprio o que nos é alheio. Apropriação que não é FIXANDO O CONTEÚDO 23 apenas de um texto, qualquer que seja a sua configuração, mas sim de um modo singular de construir sentidos: o literário. Com isso, podemos concluir que a apropriação a qual se refere Cosson é por parte: a) Do conhecimento de mundo, baseada na experiência de leitura tanto do professor quanto do aluno, seja na educação formal, seja na mediação dos griots. b) Da capacidade do leitor de interpretar textos em geral, assim como o literário, conforme seu conhecimento de mundo, de forma arbitrária. c) Da habilidade do leitor de apropriação da interação verbal, única ferramenta linguística capaz de possibilitar a leitura e o letramento literário. d) Da leitura enquanto um ato de apreensão do conteúdo, por meio da decodificação do conteúdo linguístico. e) Do letramento literário, enquanto processo, um fenômeno dinâmico, que não se restringe a um saber ou prática. 4. O conto popular e o conto literário são gêneros textuais pertencentes ao universo tanto do contador de histórias quanto do mediador de leitura. Segundo Terra (2014), a transformação da forma simples do conto popular para a forma literária está associada à passagem do contador de histórias para o narrador ficcional, alterado, assim, a recepção da obra. Assim, pode-se afirmar que essa mudança é assim caracterizada porque a) no conto popular a narrativa é direcionada ao auditor por meio da transmissão oral, enquanto no texto escrito a narrativa é voltada para um leitor. b) nos contos orais, a recepção é em tempo real, já no conto escrito o tempo verbal está sempre no passado. c) a principal mudança entre o conto da narrativa oral e escrito está na aplicação da linguagem, que é direcionada a apenas um público: os que passaram por letramento literário ou pela educação formal. d) a autoria distingue o conto popular do conto literário: enquanto o primeiro é utilizado pelos contadores de histórias e são anônimos, o segundo fazem parte da educação formal do professor-mediador. e) no conto popular a narrativa é direcionada somente ao público que já tenha passado por uma educação formal, visto que a compreensão da gramática da narrativa é essencial para atuação tanto do mediador de leitura quanto do contador de histórias. 5. (IFPB, 2019) Segundo Zaponne (2008), o conceito de letramento aplicado ao estudo da literatura mostra-se bastante fértil, pois permite uma compreensão do literário situada fora dos domínios estritamente ligados ao texto e abre perspectivas para o estudo de variados aspectos relacionados ao modo como se constroem os padrões sociais de letramento literário que levam à efetuação de diferentes práticas em diferentes contextos. Conhecer as práticas de letramento literário presentes na escola, bem como as práticas de letramento literários presentes em diferentes âmbitos sociais, têm seu contributo para que se possa pensar nas relações entre: a) Texto e contexto, fazendo-os convergir para a compreensão de textos situados e reais com interpretações cada vez mais acessíveis. 24 b) Ensino e aprendizagem, fazendo-os convergir para formação de indivíduos com uma formação cidadã situada em seu contexto social. c) Escola e vida social, fazendo-as convergir para formação de indivíduos com graus de letramento e de letramento literário cada vez maiores. d) Alfabetização e letramento, fazendo-as convergir para formação de indivíduos capazes de desfazer os índices de analfabetismo funcional. e) Autor e leitor, fazendo-os convergir para interpretação de textos reais com interesse na humanização das ações comunicativas. 6. Zilberman (2012) acredita que a literatura infantil deve ser pensada a partir da sua função formadora, e não com uma missão pedagógica, pois deve possibilitar a emancipação de cada leitor. Nesse sentido, selecione a alternativa sobre o papel do mediador de leitura que melhor se aplicaao conceito da autora, a partir do texto “Mediação de leitura’: o encontro entre livro, leitura e leitor” (REIS; ROGERIO, 2021): a) “Esta poderia ser, no entanto, a premissa do papel do mediador de leitura: gostar de ler e gostar de contagiar o outro com a sua paixão por determinado livro.” b) “O professor que tem o objetivo de mediar, de apresentar uma leitura como projeto pedagógico naquele lugar, tem um plano, é uma tarefa educativa, mesmo que seja a de formação literária, formar repertório, observar linguagens.” c) Mesmo em um espaço profissional de leitura, como uma biblioteca pública, por exemplo, a mediação pode acontecer de forma muito diversa. Assim como as vitrines e os espaços atrativos (ou não) das livrarias, os espaços físicos das bibliotecas já são mediação. d) “Com a prática de dessacralização do livro, de transformá-lo em algo comum, que se pode pegar, montar castelo, pular página, tem de vir a figura de alguém que tem experiência leitora acumulada e que, na hora que está conversando com leitor, traz elementos.” e) “Oralidade e literatura são coisas muito diferentes. Para justificar a oralidade, se criou esse vínculo. De alguma forma, os contadores de história encontraram aí uma possibilidade de trabalho. Tem contadores que fazem efetivamente o trabalho com o livro, com a narração literária.” 7. A relação entre literatura e pedagogia, para Minuzzi (2019, p. 101), se vinculam a partir do entendimento de que a educação necessita formar cidadãos críticos e atuantes na sociedade, para quem a literatura desemprenha papel essencial. A afirmação da autora está de acordo com qual alternativa a seguir: a) A literatura permite aos estudantes diferentes leituras de realidade e a compreensão de distintas formas de viver. Também perceberão as verdades humanas. Assim como poderão debater sobre questões sociais e refletir sobre a sua própria identidade e a identidade do outro. b) A literatura, por se tratar de textos ficcionais, não é capaz de ser pensada como uma forma de arte, já que não trata das verdades humanas, nem se integra à sociedade, nem a nenhum indivíduo, grupo ou nação. c) A literatura não tem relação com a pedagogia, pois, por se tratar de um fazer artístico, a literatura só deve servir a fruição, isto é, para o desfrute estético da obra. d) A literatura falha ao formar cidadão críticos, visto que não estabelece qualquer vínculo com o mundo real. Por isso, não é possível estabelecer relação com a propostas pedagógica 25 da instituição escolar. e) Como toda manifestação artística, a literatura é uma arte. Por isso, não pode atuar dentro de uma proposta didática, considerando que a pedagogia não é considerada um produto artístico, mas sim educacional. 8. Leia a citação a seguir a respeito da cultura oral: Numa cultura oral, para se resolver efetivamente o problema de retenção do pensamento, já que não temos a presença da escrita, é necessário que ele surja através de padrões fortemente rítmicos, equilibrados, em repetições ou antíteses, em aliterações e assonâncias, em expressões epitéticas ou outras expressões formulares, em conjuntos temáticos padronizados (TETTAMANZY; TORRES, 2008). Considerando que o fragmento trata da cultura oral como uma forma de rentenção do pensamento, em um contexto de não presença da escrita, é correto afirma que o texto faz referência: a) Ao papel do professor como leitor e mediador da leitura, assim como o seu posicionamento diante de um texto literário e seus diferentes modos de leitura. b) Aos sons, gestos e construções imagéticas que são expressos na performance de textos literários nas grandes mídias, como a televisão e o cinema. Isto é, da língua atuando na dinâmica social. c) Ao modo que a educação informal tem de conceber a alfabetização como um processo discursivo próprio da narrativa oral. d) Ao contador de histórias ou aos griots que se utilizam da memória e das suas experiências, em que há a valorização do conhecimento compartilhado pela narrativa oral para transmitir o valor das experiências coletivas. e) À dicotomia entre os textos oral e escrito, já que nas sociedades letras, o registro verbal escrito atua como uma forma de retenção do pensamento e da memória de um povo, além de propagar temas históricos que se repetem na sociedade. 26 BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E A FORMAÇÃO LEITORA UNIDADE 03 27 3.1 INTRODUÇÃO Em página do Ministério da Educação (MEC) que traz reflexões e práticas acerca da li- teratura no processo de escolarização, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) considera a Literatura Infantil como a porta de entrada para o universo da literatura e de papel funda- mental para o a formação do ser humano. Porém, alerta sobre a aplicação de atividades pós- -leitura que estimulam apenas a compreensão mais literal que criativa do texto literário, que se limitam a perguntas padronizadas, tais como: O quê? Quem? Quando? Onde? Porquê? Como? Perguntas estas, pondera o MEC, que são válidas quanto ao estímulo da compreen- são textual por parte dos pequenos leitores, mas que desestimulam o exercício imaginativo do leitor por se tratarem de perguntas e respostas únicas. Por isso, nesta unidade, alguns conceitos básicos da Base Nacional Comum Curricular são trazidos para compreendermos como se dá a concepção moderna de educação, para além das perguntas e respostas fechadas. Nesse sentido e em diálogo com as recentes trans- formações sociais que ocorrem em vários países, abordaremos duas leis (Lei n. 10.639/03 e Lei n. 11.465/08) que determinaram a obrigatoriedade da abordagem temática da história e cultura africana e indígena na formação do povo brasileiro dentro do ambiente escolar. Ini- ciativa que permite, gradativamente, o resgate, preservação e reconhecimento do índio e do negro na história, cultura e literatura brasileira. Em seguida, tratamos o ensino de Literatura em conjunto com o ensino de Língua Portuguesa, ainda do ponto de vista da Base Nacional Comum Curricular. Por fim, resumimos como esse importante documento propõe que o campo artístico literário seja trazido para a instituição de ensino. 3.2 A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E A EDUCAÇÃO MODERNA A Base Nacional Comum Curricular defende que a literatura é uma arte e tem “a fun- ção de exercitar o nosso pensamento poético – relacionado com o imaginar que é uma ou- tra forma de pensar, sentir, perceber e conhecer o mundo e a nós mesmos” (BRASIL, 2021). Portanto, para a Base Nacional Comum Curricular, a linguagem artística permite diversas leituras e olhares, não havendo uma reposta correta, mas diversos caminhos possíveis. Em outras palavras, uma proposição de leitura aberta do texto literário é capaz de trazer o be- nefício de permitir diversas interpretações, à medida que se põe em prática a capacidade criativa, imaginativa e sensível e se estimula as diferentes formas dos diversos leitores de usufruir o texto literário. Isto é, superando o mito de que a criança ou o estudante é uma tábula rasa, a Base Nacional Comum Curricular dialoga com concepções modernas de educação, ao considerar que a cultura escrita precisa ser desenvolvida, na Educação Infantil, a partir do conhecimen- to e curiosidades expressos pelas próprias crianças. De maneira que o pensamento com- portamentalista (de visão empirista) do aluno como um puro receptor de conhecimento é substituída, no ensino da leitura e da escrita, pela orientação de que, por meio do convívio de textos escritos, as crianças são capazes de construir suas hipóteses sobre a escrita, por exemplo. Igualmente, a experiência com a literatura infantil incentiva a leitura, o exercício da imaginação e amplia o conhecimento de mundo. Sendo, o educador, um mediador na rela- ção que as crianças desenvolvem com o texto. 28 Aprofundando esse debate, em tópico em que trata sobre as práticas de linguagem contemporâneas no ensino de Língua Portuguesa, também é proposta da Base Nacional Comum Curricular que após a leitura de um livro ou depoisde assistir a um filme, o educa- dor pode incentivar o alunado a postar uma apreciação em forma de comentários nas redes sociais, ou acompanhar os profissionais envolvidos na produção artística. Ou estimular que os alunos busquem e acompanhem temas ou personalidade de interesse, a partir do que foi abordado na sala de aula. Assim como a produção autoral para publicação na internet. Por isso, sobre a prática de linguagem, a Base Nacional Comum Curricular entende que os estudos teóricos e metalinguísticos (incluindo-se a literatura), não devem ser tomados como um fim em si mesmos, mas sim precisam estar envolvidos em práticas que possibilitem a reflexão, com o objetivo de ampliar a capacidade de uso da língua e das linguagens, seja na leitura ou produção de texto, em situações práticas e ancoradas na realidade do discente. Segundo a Base Nacional Comum Curricular, a prática de linguagem “oralidade, leitura/es- cuta, produção (escrita e multissemiótica) e análise linguística/semiótica (que envolve conhe- cimentos linguísticos – sobre o sistema de escrita, o sistema da língua e a norma-padrão –, textuais, discursivos e sobre os modos de organização e os elementos de outras semioses)” (BRASIL, 2021). FIQUE ATENTO O ensino da história e cultura afro-brasileira, africana e indígena Em suas diretrizes para o ensino de Língua Portuguesa, Literatura e demais expressões ar- tísticas, a BNCC expõe a necessidade que os direitos humanos integrem os diversos campos educacionais, sob variadas formas, tanto na discussão de um tema, quanto na “organização de formas de defesa dos direitos humanos (campo jornalístico-midiático e campo de atu- ação na vida pública)”ou “no exercício desses direitos – direito à literatura e à arte, direito à informação e aos conhecimentos disponíveis” (BRASIL, 2021). A formação do leitor brasileiro precisa estar em diálogo com o seu povo. É o que garante a Lei 10.639, aprovada em 2003. O direito ao resgate e preservação das memórias ancestrais, que passaram a entrar no debate da produção, da pesquisa e do ensino de Literatura na contem- poraneidade, apoiada pela lei que determina a abordagem da cultura, história e literatura africana e descendentes nas escolas. Igualmente com sua raiz afro-brasileira, o ambiente es- colar tem a responsabilidade de respeitar seus habitantes nativos, os indígenas, e reconhecer seus símbolos, aspectos culturais, suas crenças e sua história como originárias (e não como um ser exótico, visão esta que ainda se propaga na instituição escolar, onde são feitas repre- sentações que tiram a dignidade do índio (por meio de “fantasias de índio”, por exemplo). Com isso, a partir da Lei 11.465/08, a presença indígena também passa a ser obrigatória no currículo oficial da rede de ensino. Assim, ambas as leis (10.639/03 e 11.465/08) determinam a abordagem da história e cultura afro-brasileira e indígena no Ensino Básico (Ensino Fun- damental e Médio), em escolas públicas e privadas. Principalmente no campo da educação artística, literatura e história. Logo, as manifestações culturais populares também passaram a ser vista com mais atenção e, gradativamente, começam a ganhar espaço no ambiente escolar. Aos poucos, ganham o FIQUE ATENTO 29 status de linguagem e temática relevante para o processo de formação leitora e do cidadão brasileiro, considerando as características de formação do seu povo, bem como sua impor- tância social, política e econômica. 3.3 A LITERATURA NO ENSINO DE PORTUGUÊS Sobre o ensino de Língua Portuguesa (do 6º ao 9º ano), no campo artístico-literário, em relação à adesão às práticas de leitura, a Base Nacional Comum Curricular também orienta que os alunos devem demonstrar interesse ou estarem abertos a textos que quebrem suas expectativas e desafiem as experiências anteriores de leitura, tendo como apoio nas marcas linguísticas, no seu conhecimento sobre gêneros e temáticas, bem como nas orientações do professor. Ao passo que a demanda cognitiva deve ocorrer de forma gradual, dos anos iniciais do Ensino Fundamental ao Ensino Médio. Dentre os aspectos que devem ser consi- derados na progressividade dessa demanda cognitiva, a Base indica que se deve levar em consideração a diversidade cultural e englobar produções e formas de expressões diversas, tal como “a literatura infantil e juvenil, o cânone, o culto, o popular, a cultura de massa, a cul- tura das mídias, as culturas juvenis etc., de forma a garantir ampliação de repertório, além de interação e trato com o diferente” (BRASIL, 2021). Para tanto, a participação do alunado nas atividades de leitura precisa ser feita de modo crescente, a fim de ampliar o repertório sobre as experiências, práticas, gêneros e conhecimentos. Estes que funcionarão, posteriormente, como conhecimento prévio de leituras futuras. Em tópico que trata sobre o ensino de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental e anos finais, sobre as práticas de linguagem, objetos de conhecimento e habilidades, a Base Nacional Comum Curricular também prega que no campo artístico-literário, as manifes- tações artísticas devem ser apresentadas dando um panorama geral, isto é, evitando-se privilegiar uma expressão em prejuízo de outra. O mesmo deve ocorrer na arte literária, de maneira que as aulas possibilitem o reconhecimento, a valorização e a fruição das diferentes manifestações abordadas no ambiente escolar. Por isso, a Base Nacional Comum Curricular considera, pois, que a formação do leitor de textos literários deve, especialmente, permitir o desfrute, mas também lançar luz sob estética dessas manifestações, isto é, pensar o texto literário enquanto fenômeno artístico e sensível. Como, por exemplo, propor debates em torno do que pode ser considerado artístico ou não, literário ou não, quais as qualidades que os definem, entre outras propostas que visão a percepção crítica ou familiarização com as diferentes produções literárias. Você já parou pra pensar que a Base Nacional Comum Curricular demonstra, em suas orien- tações, a necessidade de que o ensino de Português e de Literatura não apenas aborde obras canônicas (como tradicionalmente acontece), mas também as de origem popular e as de cultura de massa? Lançar luz sobre a diversidade cultural brasileira e também da localidade onde a escola se encontra motiva tanto alunos como professores a se reconhecerem no ambiente escolar. Por isso, a Base também expressa uma transformação social que vem sendo sentida em vários âmbitos da sociedade: grupos antes silenciados passaram a lutar pelo seu reconhecimento, VAMOS PENSAR? 30 representados por seus movimentos, como o movimento negro, o feminista, o LGBTQIA+, entre outros. 3.4 UMA PROPOSTA DE FORMAÇÃO LITERÁRIA A Base Nacional Comum Curricular reflete que a função utilitária da literatura (bem como das demais manifestações artísticas), isto é, do texto literário enquanto um produto de uso, seja substituída por uma proposta “[…] humanizadora, transformadora e mobilizadora […]” (BRASIL, 2021). Para tanto, é necessário que a formação de um leitor-fruidor. Em outras palavras, de um leitor que busque se envolver seja nas suas leituras ou nas leituras propostas pelo educador, que seja estimulado a descobrir novas camadas de sentido (interpretações) e que consiga identificar os seus desejos enquanto leitor. Ou seja, que saiba identificar e bus- car textos literários conforme suas necessidades. Por isso, ao passo que os alunos avançam em sua formação leitora, progressivamente, do Ensino Fundamental ao Médio, as habilida- des exigidas na formação do leitor, segundo a Base, incluem: • Conhecer os gêneros narrativos e poéticos. Na narrativa literária, por exemplo, abordar elementos básicos, tais como: o espaço, o tempo e os personagens presentes no texto; • Compreender como o estilo do texto se desenvolve, a partir de como a construção do tempo, do espaço e dos personagens é feita na produção do texto; • Identificar as variadas maneiras de se narrar uma história. Porexemplo, se a narrativa está em escrita em primeira ou segunda pessoa e como isso interfere na construção de sentido do texto e na interpretação do leitor. Seja por meio de um narrador mais ou menos distanciado do enredo; se há um jogo entre esses modos de contar a história (de que modo o narrador interage com a narrativa? Ele pode ser considerado um narrador- -personagem?) • Tomar conhecimento sobre a polifonia textual e de que modo ocorre. Ou seja, quando diferentes níveis de narrativa se imbricam entre si; • Abordar os efeitos de sentido, no que se refere à poesia, que são alcançados pelos dife- rentes recursos (sejam eles linguísticos, estilísticos, narrativos etc.) que contribuem para a construção da dimensão imagética, por meio de recursos metafóricos ou metonímicos da linguagem de proposta poética. Brasil e África em diálogo na Literatura Infantil e Juvenil Aprofunde-se nesse debate através da obra de Cagneti e Silva (2013) que traz um diálogo entre o Brasil e a África, abordando, ainda, o protagonismo negro nas ori- gens da Literatura Infantil e Juvenil brasileira e o tema da africanidade. Disponível em: https://bit.ly/3bNZuRo. Acesso em: 16 mar. 2021. BUSQUE POR MAIS A literatura na prática da sala de aula Além da Base Nacional Comum Curricular, é possível encontrar obras que forne- cem orientações de análise de textos na Literatura Infantojuvenil. Portanto, confi- ra o tópico “Critérios para a seleção de textos de literatura infantojuvenil”, em que Mariana Terra Teixeira (2019) faz um aprofundamento do que abordamos na pre- sente unidade, diferenciando o critério formal do subjetivo. Disponível em: https:// bit.ly/2SoufW8. Acesso em 14 mar. 2021. 31 1. A literatura infantil é considerada a porta de entrada para o universo da literatura durante o processo de escolarização. Por isso a BNCC pontua que as atividades de pós-leitura do texto literário devem exercitar: a) A habilidade do aluno no que se refere à produção escrita quanto à compreensão do gênero resumo. Logo, o professor deve se concentrar em formas de sintetizar o texto literário. b) A compreensão gramatical em torno da produção poética e literárias, em que os aspectos formais dos textos devem ser priorizados durante a análise literária. c) O lado imaginativo do leitor por meio do desfrute. Estimular o pensamento através do texto poético. Ativar o sentir, formas distintas de pensar, de perceber e de conhecer o mundo e a nós mesmos. d) A compreensão poética e histórica dos textos clássicos para a consolidação da literatura durante o processo da formação leitora no Ensino Básico. e) O lado imaginativo do leitor a partir do preenchimento de fichas pedagógicas com perguntas fechadas que buscam ajudar o leitor a identificar informações mais literais no texto. 2. Sobre as práticas de linguagem contemporâneas no ensino de Língua Portuguesa, a BNNC possui um posicionamento mais moderno em torno do tema. Por isso, após a leitura de um livro, é recomendado que o professor: a) Transmita todo o seu conhecimento em torno das práticas da linguagem encontrada na obra, com a finalidade de apontar diferentes manifestações artísticas durante o processo de letramento literário. Visto que, por se tratar de uma tábula rasa, o aluno é desprovido de capacidade crítica ou criativa. b) Incentive a produção e divulgação de textos para além da instituição escolar, estimulando a interação e apreciação com conteúdos que propiciem a produção autoral de textos em situações práticas na vida do aluno, como por exemplo, a internet. c) Possua uma prática de linguagem voltadas para o próprio ambiente escolar, não devendo ser compartilhadas em situações de uso fora da instituição, com o intuito que a linguagem adquirida (como a escrita de redação) seja mais formal que coloquial. d) Tenha como objetivo ampliar a capacidade de uso da língua e das linguagens, a partir da apreciação estética de obras canônicas, sem necessariamente estarem relacionados com a realidade dos alunos. e) Se concentre na prática de leitura de textos literários diversos na sala de aula e desenvolva como atividade de práticas de linguagem a exposição de seminários sobre a vida e obra do autor do livro abordado. 3. No que se refere ao campo artístico-literário, relativo ao o ensino de Língua Portuguesa (do 6º ao 9º ano), a Base recomenda a demanda cognitiva dos textos devem ocorrer de forma gradativa: FIXANDO O CONTEÚDO 32 a) No Ensino Fundamental, dada a baixa demanda cognitiva dos alunos do 6º ao 9º ano. b) No Ensino Fundamental, em conjunto com a literatura juvenil, por meio da abordagem de textos canônicos da cultura popular. c) No Ensino Fundamental e Médio, de modo a quebrar as expectativas ou até mesmo desafiar as leituras anteriores dos alunos, considerando a variedade cultural e as diferentes produções e formas de expressões. d) Para ampliar o repertório por meio do contato com diferentes formas de expressão artística, exceto a cultura popular ou as culturas das mídias. e) A demanda e a diversidade cultural, exceto no que se refere à literatura infantojuvenil, que deve focar nos gêneros textuais dedicados à infância. 4. Sabe-se que parte da formação do povo brasileiro inclui os negros escravizados trazidos do continente africano no período da escravatura, época em que o Brasil era uma colônia. No entanto, o estudo de literatura na instituição escolar sempre foi pautado pelos interesses da classe dominante, branca e burguesa. Somente no ano de 2003 é que a abordagem da cultura, história e literatura africana e descendentes passou a se fazer presente no currículo escolar, pois: a) As instituições escolares passaram a se conscientizar, espontaneamente, da importância de reconhecer a descendência africana na cultura, história e literatura brasileiras, motivando, assim, uma transformação em massa no conteúdo programático de escolas públicas. b) A aprovação da Lei 10.639/03 tornou facultativa a inserção da cultura africana em terras brasileiras, mas fez obrigatório o estudo da cultura negra brasileira, reconhecendo, dentro do ambiente escolar, as manifestações artísticas de origem popular. c) A História da África e dos Africanos passou a ser exigida somente no Ensino Básico, na disciplina de História, sendo um ramo diferente da literatura infantojuvenil. d) A partir da aprovação da Lei 10.639/03, o conteúdo programático das escolas, obrigatoriamente, passou a incluir o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, com o intuito de resgatar a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. e) Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira passaram a ser ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, a partir da aprovação da Lei 10.639/03, sendo facultativa a aplicação nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras. 5. Em 2008, a aprovação da Lei 11.465/08 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional passa a incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Assim sendo, com a aprovação da nova lei: a) Passou a ser obrigatório, nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. Assim como, os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas. b) A abordagem histórica e cultural que caracterizam a formação da população brasileira, a partir do estudo da história da África e dos africanos e da luta dos negros, de modo facultativo. Sendo obrigatório o estudo da história dos povos indígenas no Brasil. c) O conteúdo programático passou a incluir, de modo optativo, as contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil do índio e do negro na formação 33 da sociedade brasileira.
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