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abril - 2022 BOLETIM TÉCNICO CIENTÍFICO EXPEDIENTE: EDITORIAL Com a palavra, o presidente: É c o m e n o r m e p r a z e r q u e entregamos a vocês, mais um BOLETIM TÉCNICO da ABFel. Como é do seu conhecimento, essa publicação tem por objetivo trazer o que há de mais atual na medicina felina, adaptado às condições brasileiras. Nessa edição, o BOLETIM TÉCNICO, abordará o linfoma alimentar felino. Essa neoplasia gastrointestinal é bastante prevalente e pode ocorrer tanto em gatos jovens, com infecção progressiva pelo vírus da leucemia felina (FeLV), quanto em p a c i e n t e s f e l i n o s m a i s v e l h o s , antigenicamente negativos para FeLV. Outra nuance importante desse tema é a semelhança entre sinais clínicos e achados ultrassonográficos entre o l infoma alimentar de baixo grau e a doença i n fl a m a t ó r i a i n t e s t i n a l , s e n d o a d i f e r e n c i a ç ã o e n t r e e s s a s d u a s enfermidades um verdadeiro desafio clínico. Não tenho dúvidas que esse assunto será de grande valia para você que adora os gatos e a medicina felina. Tenha uma excelente leitura e que você consiga aprender os segredos da nutrição em gatos. Como nunca é tarde para lembrar: se você gosta de gatos e da medicina felina, não deixe de se associar a Academia Brasileira de Clínicos de Felinos – ABFel. Só a ABFel tem um mundo de vantagens para você, amante dos gatos. Visite o nosso site www.abfel.org.br e veja o universo de opções que preparamos para você. Um grande abraço e ótima leitura!!! Cristiano Nicomedes - Presidente DIRETORIA Priscila Malta Jácome - Vice-presidente Paula Cristina Magnani - Primeiro Secretário Fabiana Lima - Tesoureiro Marcelo Zanutto - Diretor Científico Heloísa Justen - Diretor Social Romeika Herminia - Diretor de Comunicação Carla Santos - Diretor de Relações Internacionais Maria Elvira de Almeida - Presidente do Conselho Fiscal Carlos Gabriel Dias - 1° Conselheiro Fiscal Rochana Fett - 2° Conselheiro Fiscal Fernanda Barony - Suplente Fiscal Myrian Iser - Presidente Conselho Científico Mariana Jardim - 1° Conselheiro Científico Reginaldo Pereira - 2° Conselheiro Científico Monytchely Vieira - Suplente Científico Patrocinador oficial: abfelinos Graduado pela UFMG / Mestre em Medicina Veterinária pela UFMG / Doutorando pela UFMG /Pós-graduado em Ortopedia de Pequenos Animais pela Universidade Cruzeiro do Sul / Pós-graduado em Medicina Felina pela Universidade de Salta / Pós-graduado em Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais pela PUC–Minas / Professor da disciplina de técnica cirúrgica do Instituto Newton Paiva / Professor de pós-graduação na área de Medicina Felina / Autor de capítulos de livros e artigos científicos na área de Medicina Felina / Presidente atual da Academia Brasileira de Clínicos de Felinos - ABFel Olá, prezado gateiro e gateira!!! Cristiano Nicomedes Presidente da Academia Brasileira de Clínicos de Felinos - ABFel O linfoma alimentar é uma neoplasia gastrointestinal frequentemente diagnosticada na clínica de felinos domésticos, e sua incidência tem aumentado nos últimos anos. Trata-se de uma forma anatômica do linfoma caracterizada pela infiltração focal, difusa ou multifocal de células linfoides neoplásicas no trato gastrointestinal, com ou sem o envo lv imento dos l in fonodos mesentéricos (HARDY, 1981; MAHONY et al., 1995; VALLI et al., 2000; COUTO, 2001). Os linfomas gastrointestinais podem ser classificados de acordo com sua morfologia (células pequenas e grandes), distribuição dentro da mucosa (epiteliotropismo), imunofenótipo (células B, T ou natural killer), localização anatômica, aparência histológica e comportamento biológico (baixo e alto grau) (MARSILIO, 2021). Introdução LINFOMA ALIMENTAR FELINO DR. ROCHANA RODRIGUES FETT Linfoma de células T associado à enteropatia tipo I (LTAE-I): Antigamente chamado de linfoma alimentar “de grau intermediário/alto”, é formado por células T imaturas e pouco diferenciadas, com altas taxas de mitoses, com casos de infiltrados transmurais. São tumores agressivos, de rápida progressão, que podem se espalhar além do trato alimentar e resultar em quadros clínicos agudos e, muitas vezes , graves (RICHTER, 2003; MOORE; RODRIGUEZ-BERTOS; KASS, 2012; KRICK; SONREMO, 2016; MARSILIO, 2021). O linfoma de células granulares (LCG) é uma forma um pouco distinta, pois suas células possuem grânulos intraplasmáticos azurófilos e seu imunofenótipo é caracterizado pela presença de células T e, ocasionalmente, células natural killer (NK) (FINOTELLO et al., 2017). Linfoma de células T associado à enteropatia tipo II (LTAE-II): Ant igamente chamado de l in foma alimentar “de baixo grau” ou “de pequenas células”, é constituído por linfócitos T pequenos, maduros e bem diferenciados, com baixas taxas de mitoses, que se originam na mucosa do intestino mas não costumam invadir a submucosa. Tipicamente, fica contido no trato alimentar e tende a progredir lentamente. Esse tipo de linfoma alimentar é o mais diagnosticado em felinos (MOORE; RODRIGUEZ-BERTOS; KASS, 2012; KRICK; SONREMO, 2016). Linfoma difuso de grandes células B (LDGB): Ant igamente chamado de l infoma alimentar “de grandes células”, é composto por linfócitos B grandes, com altas taxas mitóticas e infiltrados transmurais. Tem rápida progressão e pode se espalhar além do trato alimentar (MOORE; RODRIGUEZ-BERTOS; KASS, 2012). Fatores de risco para o desenvolvimento do linfoma alimentar Vírus da leucemia felina (FeLV): O papel do FeLV no linfoma alimentar ainda não é totalmente esclarecido, mas acredita-se que, como o genoma do FeLV possui o potencial de transformar o linfoblasto infectado em uma célula neoplásica, gatos que já tenham sido expostos ao vírus podem desenvolver linfoma alimentar, ainda que não sejam virêmicos (HARDY, 1981; COSTA; SOUZA; DAMICO, 2017). Vírus da imunodeficiência felina (FIV): A função do FIV no desenvolvimento do linfoma a l imentar pode ser tanto i n d i r e t a , d e v i d o à imunossupressão que o vírus causa, como direta, pela maior proliferação de linfócitos logo a p ó s a i n f e c ç ã o , o q u e a u m e n t a r i a o r i s c o d e a p a r e c i m e n t o e desenvolvimento de uma célula neoplásica (CALLANAN et al., 1996 ; ENDO et a l . , 1997 ; MAGDEN; QUACKENBUSH; VANDEWOUDE, 2011). A inflamação intestinal crônica é frequentemente MMédica Veterinária graduada na UFRGS em 2004. Mestre no ano de 2007 e doutora no ano de 2021 em ciências veterinárias. Especialização em medicina de felinos pelo QUALLITAS no ano de 2010. Membro da diretoria da ABfel. Membro da AAFP e ISFM. Professora e coordenadora da pós-graduação em medicina de felinos do IBM VET. Atendendo exclusivamente a felinos desde 2007. Sócia proprietária da Chatterie Centro de saúde do gato.édica veterinária graduada na UFRGS em 2004. Mestre no ano de proposta como um fator de risco para o desenvolvimento de linfoma alimentar, visto que alguns estudos descrevem a doença inflamatória intestinal (DII) prévia ou concomitante ao linfoma (MOORE et al., 2005; BRISCOE et al., 2011). Hemograma – pode apresentar anemia, linfoblastos, neutrofilia (KISELOW et al., 2008; KRICK et al., 2008; SCHMIDT, 2018). Albumina – pode estar diminuída (KRICK et al., 2008; LINGARD et al., 2009). B ioqu ímicos hepát icos – podem esta r aumentados (KRICK et al., 2008; LINGARD et al., 2009). Cobalamina – pode estar diminuída (BRISCOE et al., 2011). Folato – pode estar diminuído, normal ou aumentado (BARRS; BEATTY, 2012a). Manifestações clínicas Gatos com linfoma alimentar geralmente apresentam hiporexia ou anorexia e perda de peso crônica. Outros sinais clínicos incluem vômitos, diarreia, letargia, poliúria, polidipsia e polifagia (MAHONY et al., 1995; KISELOW et al., 2008). E m b o ra o s s i n a i s c l í n i co s s e j a m semelhantes entre gatos com LTAE-IIe LTAE- I/LDGB, a cronicidade e a gravidade costumam ser diferentes. Gatos com LTAE-I/LDGB tendem a ter um início mais grave e mais rápido dos sinais clínicos, enquanto gatos com LTAE-II costumam ter sinais clínicos menos graves, com uma história indolente (KRICK; SONREMO, 2016). Gatos com LTAE-I/LDGB tendem a formar massa abdominal palpável e envolvimento estomacal, já gatos com LTAE-II normalmente apresentam espessamento de alças intestinais e envolvimento de intestino delgado (BARRS; BEATTY, 2012a). Diagnóstico A abordagem diagnóstica primária do linfoma alimentar felino visa descartar outras afecções que possam acometer o trato gastrointestinal. Para isso, devem ser realizados alguns exames, como hemograma, bioquímicos renais e hepáticos, sorologia para FIV e FeLV, T4 tota l , l ipase pancreát ica fe l ina , exame parasitológico de fezes e PCR para Giárdia spp. A lém disso, podem ser fe i tas t r iagens t e ra p ê u t i c a s , c o m a n t i p a ra s i t á r i o s e antimicrobianos, e alimentares, com dietas de eliminação (BARRS; BEATTY, 2012a; BARRIGA, 2013; JUNIOR; PIMENTA; DANIEL, 2015). Hematologia e bioquímica Ultrassonografia abdominal Permite a avaliação do trato gastrointestinal por meio de análise do espessamento de paredes, estratificação de camadas, motilidade, linfonodos mesentéricos e conteúdo luminal (GOGGIN et al., 2000). A s a l t e r a ç õ e s c o m u m e n t e encontradas em gatos com LTAE-I/LDGB são espessamento da parede intestinal, perda da estratificação de camadas, ecogenicidade d iminu ída , h ipomot i l idade loca l izada e linfoadenomegalia. Também é comum encontrar evidência ultrassonográfica de envolvimento extraintestinal (PENNICK et al., 1994; MAHONY et al., 1995). No LTAE-II as paredes podem apresentar espessura dentro da normalidade ou aumentadas, com preservação da estratificação de camadas e os l infonodos mesentéricos podem estar aumentados (LINGARD et al., 2009; STEIN et al., 2010). A espessura normal da parede intestinal e a ausênc ia de a l te rações nos l in fonodos mesentéricos não excluem a possibilidade de LTAE-II (BARRS; BEATTY, 2012a). As características ultrassonográficas encontradas no LTAE-II são frequentemente semelhantes às alterações encontradas em gatos com doença inflamatória intestinal e outras enteropatias. A realização apenas do exame ultrassonográfico abdominal não é suficiente para diferenciar essas doenças (EVANS et al., 2006; DANIAUX et al., 2014). Radiografia A radiografia do abdômen pode evidenciar a presença de massa abdominal, espessamento da parede estomacal, perda do detalhe das serosas e obstrução gastrointestinal (MAHONY et al., 1995; FONDACARO et al., 1999). Apesar de não serem comuns, radiografias torácicas podem ser realizadas na procura de envolvimento pulmonar (MAHONY et al., 1995). Muitos felinos não apresentam alterações radiográficas, por isso, é preferível a ultrassonografia abdominal (MOORE et al., 1996). A capacidade citológica de detectar neoplasias intestinais depende da extensão da infiltração e da presença de ulcerações. A característica esfoliativa do linfoma facilita seu diagnóstico citológico (FRANKS et al., 1986). A CAAF de massas intestinais ou linfonodos mesentéricos aumentados geralmente ajuda a diagnosticar linfomas de células grandes (como o LTAE-I e LDGB) (Figura 1), mas pode não contribuir para o diagnóstico de linfoma de células pequenas (como LTAE-II), já que essas podem aparecer normais ou reativas. Isso resulta na impossibilidade de diferenciação entre hiperplasia linfoide benigna e linfócitos neoplásicos (BARRS; BEATTY, 2012b; SCHMIDT, 2018). Também é importante ressaltar que os grânulos nas células do LCG só podem ser o b s e r va d o s n a c i to l o g i a , e n q u a n to n a h i s t o p a t o l o g i a i s s o n ã o s e r á p o s s í ve l (ANDREASEN et al., 2012). 2000; RICHTER, 2003; MOORE; RODRIGUEZ- BERTOS; KASS, 2012); extensão desse infiltrado linfocítico em camadas profundas da mucosa (BRISCOE et al., 2011; KIUPEL et al., 2011); ruptura grave da arquitetura das vilosidades e criptas (BRISCOE et al., 2011); infiltrados linfocíticos intravasculares (KIUPEL et al., 2011); e presença de infiltrados celulares neoplásicos em linfonodos mesentéricos (VALLI et al., 2000). A avaliação histológica das amostras de biópsia intestinal é essencial para diagnosticar corretamente a maior parte dos linfomas alimentares. Diferente dos LTAE-I/LDGB, o diagnóstico de LTAE-II não é tão direto, pois é difícil diferenciar morfologicamente os linfócitos pequenos neoplásicos dos linfócitos presentes no trato gastrointestinal de gatos saudáveis, ou, em particular, de gatos com enterite linfoplasmocitária (BRISCOE et al., 2011). Os critérios histológicos para diagnóstico de linfoma alimentar se baseiam na ausência relativa de ambas células linfoides e granulocíticas e sua substituição por camadas monomórficas de células linfoides neoplásicas, que envolvem a lâmina própria da mucosa (Figura 2) (VALLI et al., Tanto as amostras coletadas em biópsia por endoscopia quanto as coletadas por laparotomia (Figura 3) têm sido utilizadas para diagnosticar linfoma alimentar em gatos, e há vantagens e desvantagens em ambas as técnicas. As principais vantagens da laparotomia são a possibilidade de colher amostras de todas as regiões intestinais, bem como de outros órgãos, e a retirada de fragmentos contendo todas as camadas intestinais. Dessa forma, as células neoplásicas infiltradas em camadas mais profundas que a mucosa podem ser visualizadas pelo patologista (RICHTER, 2003; EVANS et al., 2006; WILSON, 2008; SMITH et al., 2011). Citologia Figura 1 - Fotomicrografia de CAAF de massa intestinal de felino com LTAE-I. Linfócitos grandes (maiores que neutrófilos). Fonte: Wright et al. 2018 Histopatologia Figura 2 – A. Fotomicrografia de infiltrado de linfócitos em lâmina própria da mucosa do intestino do felino com linfoma gastrointestinal. B. Intestino do mesmo gato, em visão aumentada. Fonte: Wright et al. 2018 Como a clonalidade nem sempre é específica para malignidade, essa técnica não deve ser utilizada como teste diagnóstico único para LTAE-II. Uma a b o rd a g e m d i a g n ó s t i c a d eve combinar a avaliação de características histológicas, imunofenótipo e análise de clonalidade (KIUPEL et al., 2011). Figura 3 - Biópsia de todas as camadas intestinais por meio da laparotomia. Fonte: própria autora (2022) Imuno-histoquímica A imuno-histoquímica é indicada nos casos em que o exame histopatológico foi inconclusivo, uma vez que irá destacar padrões distintos de infiltração de linfócitos, como a colonização epitelial. Além disso, determinará o fenótipo da neoplasia, ou seja, o tipo celular predominante (MOORE; RODRIGUEZ-BERTOS; KASS, 2011; BARRIGA, 2013), podendo ser utilizada para fator prognóstico e avaliação da terapêutica instituída (PATTERSON-KANE; KUGLER; FRANCIS, 2004; AMORIM; NETO; KIUPEL, 2016). O uso de imuno-histoquímica para avaliar a uniformidade fenotípica de um infiltrado de mucosa ou para testar a c lona l idade é complemento útil para a histopatologia (WALY et al., 2005). Uma população linfocítica monomórfica dá suporte ao diagnóstico de linfoma, enquanto uma população de linfócitos e plasmócitos dá suporte ao diagnóstico de inflamação (BARRS; BEATTY, 2012b). PARR Diagnóstico diferencial O principal diagnóstico diferencial do linfoma alimentar felino é a doença inflamatória intestinal (DII), caracterizada por um infiltrado difuso de células inflamatórias na lâmina própria da mucosa intestinal. Assim como no linfoma, a etiologia da DII também não é amplamente conhecida, e acredita-se que ela ocorre como consequência de um desequilíbrio entre o ambiente, o sistema imunológico e o microbioma de um hospedeiro geneticamente suscetível (MARSILIO, 2021). A DII tambémpode evoluir para um linfoma alimentar, já que alguns gatos têm evidências de inflamação multifocal simultânea e linfoma em todo o intestino (KIUPEL et al., 2011). Outros diagnósticos diferenciais incluem n e o p l a s i a s q u e p o d e m a f e t a r o t ra t o gastrointestinal, principalmente adenocarcinomas e mastocitomas (WILSON, 2008; BARRS; BEATTY, 2012a). A PCR para rearranjo de receptor do antígeno (PARR) é uma técnica cuja a finalidade é a detecção de clones de células T ou B, e pode ser utilizada como método adicional para aumentar as c h a n c e s d e d i s t i n ç ã o e n t r e e n t e r i t e linfoplasmocitária e LTAE-II (AVERY, 2012). Após o d iagnóst ico de linfoma alimentar, o estadiamento d o p a c i e n t e d e v e s e r f e i t o determinando a extensão da doença no seu local primário, além da presença ou ausência de metástases regionais ou distantes (BILLER et al., 2016). Estadiamento O tratamento de escolha para o linfoma alimentar felino é a quimioterapia, que acontece primeiro com a indução da remissão neoplásica e, posteriormente, com a manutenção do paciente livre da neoplasia. O protocolo quimioterápico irá variar de acordo com o tipo de l infoma diagnosticado (WILSON, 2008). Em geral, os gatos são bastante resistentes aos e fe i tos co latera i s ma is graves dos quimioterápicos e os tutores aceitam bem o tratamento, pois notam uma melhora significativa na qualidade de vida dos seus animais após o início da quimioterapia (TZANNES, 2008). O tratamento prévio com corticosteroides, antes do início do protocolo quimioterápico, deve ser realizado com cautela. Existem especulações de que o uso p rév io e p ro longado de corticosteroides pode induzir resistência a múltiplas drogas quimioterápicas, afetando negativamente a resposta ao tratamento (BERGMAN, 2003; HLAVATY et al., 2021). É incomum que o linfoma alimentar se restrinja ao trato intestinal sem o envolvimento de linfonodos ou outros órgãos e, por essa razão, apenas a ressecção cirúrgica não define o tratamento de escolha (RICHTER, 2003). A ressecção de massa intestinal será indicada nos casos de obstrução ou risco de perfuração, e a combinação com a terapêutica quimioterápica pode resultar em melhor prognóstico (KRICK et al., 2008; SMITH et al., 2011). Os principais fármacos quimioterápicos usados no t ra tamento de l i n foma são : ciclofosfamida, clorambucil, prednisolona, vincristina, doxorrubicina, L-asparaginase, lomustina e metotrexato (BILLER, et al., 2016). 1 Localizado somente em uma área antômica Estágio Extensão da doença 3 Tumor gastrointestinal primário difuso não passível de ressecção cirúrgica. 2 Tumor gastrointestinal primário, passível de ressecção cirúrgica, com ou sem envolvimento de linfonodos mesentéricos associados. 4 Estágios 1, 2 ou 3 com envolvimento de baço e/ou fígado. 5 Estágios 1, 2,3 ou 4 com envolvimento inicial do sistema nervoso central e/ou medula óssea. Adaptado de Vail et al.,2007 Tratamento Indução da Remissão A maior parte dos gatos com LTAE-II respondem muito bem à quimioterapia oral com agentes alquilantes lentos e prednisolona (FONDECARO et al., 1999; KISELOW et al., 2008; LINGARD et al., 2009; STEIN et al., 2010; MOORE, RODRIGUEZ-BERTOS, KASS, 2012). A associação do clorambucil com prednisolona é recomendada como terapia de primeira linha e possui taxas de resposta entre 69% e 96% e durações médias de resposta de 567 a 1078 dias (FONDECARO et al., 1999; KISELOW et al., 2008; LINGARD et al., 2009; STEIN et al., 2010). Efeitos colaterais ao clorambucil são raros, mas podem ocorrer sinais de toxicidade g a s t r o i n t e s t i n a l , m i e l o s s u p r e s s ã o e hepatotoxicidade. É recomendado realizar leucograma antes do início do tratamento, semanalmente no primeiro mês de tratamento e, depois disso, a cada 3 meses para avaliar a contagem de células brancas (LINGARD et al., 2009). Clorambucil + Prednisolona Clorambucil Prednisolona Adaptado de Barrs, Beatty, 2012b. FONDECARO et al., 1999 15 mg/m�, VO, SID, por 4 dias, a cada 3 semanas 10 mg/gato, VO, SID KISELOW et al., 2008 2 mg/gato, VO, EDA 5 mg/gato, VO, SID ou BID LINGARD et al., 2009 15 mg/m�, VO, SID, por 4 dias, a cada 3 semanas 3 mg/kg, VO, SID STEIN et al., 2010 20 mg/m�, VO, a cada 2 semanas 2 mg/kg, VO, SID Lomustina + Prednisolona Outro protocolo é a lomustina associada à prednisolona (SCHMIDT, 2018). A lomustina em dose de 30-60 mg/m� a cada quatro semanas foi utilizada em gatos com linfoma, incluindo o a l i m e n t a r , e n ã o c a u s o u t o x i c i d a d e gastrointestinal, renal ou hepática (RASSNICK et al., 2001). Em um estudo, a lomustina em doses de 30- 60 mg/m�, VO, a cada 4-6 semanas, em 8 ciclos, demonstrou remissão completa ou parcial em cerca de 50% dos animais com LTAE-I/LDGB, que é semelhante à resposta obtida em protocolos de múltiplos fármacos. Assim, ela se torna uma alternativa viável, especialmente em pacientes que não toleram a administração de quimioterapia semanal (RAU, BURGESS, 2017). O protocolo COP pode ser empregado em felinos com LTAE-I/LDGB. Porém, alguns trabalhos apontaram baixo índice de remissão e baixa expectativa de vida (MAHONY et al., 1995; KRICK et al., 2008). Esse protocolo tem como efeito colateral comum sinais de intoxicação gastrointestinal (como vômitos, diarreia e anorexia), mas normalmente é possível controlar com terapia de suporte. Uma avaliação periódica do leucograma também é necessária, já que tanto a vincristina quanto a c ic lo fos famida podem causar mielossupressão. Além disso, em raros casos, a ciclofosfamida pode levar a um quadro de cistite hemorrágica estéril (GROVER, 2005; MOORE, FRIMBERGER, CHAN, 2018; CHAN et al., 2020). O protocolo CHOP é um tratamento mais agressivo, indicado nos casos de LCG e alguns LTAE-I/LDGB. A doxorrubicina pode prolongar os tempos de remissão em gatos com linfoma de grandes células quando usado em combinação ao tradicional COP, mas não é eficaz quando usado como agente ún ico (VAIL e t a l . , 1998 ; OBERTHALER et al., 2009). O tratamento consiste no protocolo COP (descrito anteriormente), e ao ocorrer a remissão completa, a doxorrubicina é introduzida (25 mg/m�, IV, a cada 3 semanas) durante 6 meses (JUNIOR, PIMENTA, DANIEL, 2015). Ciclofosfamida + Vincristina + Prednisolona (COP) Vincristina 0,75 mg/m�, IV, a cada 7 dias, durante 1 mês. Após, a cada 3 semanas, durante 1 ano. Ciclofosfamida 300 mg/m�, VO, a cada 3 semanas Prednisolona 10 mg/gato, VO, SID Adaptado de Mauldin et al., 1995. Ciclofosfamida + Vincristina + Doxorrubicina + Prednisolona (CHOP) L-asparaginase + Vincristina + Ciclofosfamida + Doxorrubicina + Metotrexato + Prednisolona Esse protocolo também pode ser utilizado no tratamento do linfoma alimentar felino. Entretanto, em estudo de Milner et al. em 2005, não foram observados índices de remissão completa maiores quando comparados a estudo anterior que utilizou COP (TESKE et al., 2002). Semanas Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) + L-Asparaginase (400 U/kg, SC, uma vez) + Prednisolona (2 mg/kg, VO, SID) 00 mg/m�, VO, a cada 3 semanas Fármacos e Doses 1 2 Ciclofosfamida (200 mg/m�, IV, uma vez) + Prednisolona (2 mg/kg, VO, SID) 3 Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) + Prednisolona (1 mg/kg, VO, SID) 4 Doxorrubicina (25 mg/m� ou 1 mg/kg, IV, uma vez, como infusão durante 20 minutos) + Prednisolona (1 mg/kg, VO, EDA) 6 7 8 9 13 15 17 21 23 25 11 19 Adaptado de Milner et al., 2005 Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) Ciclofosfamida (200 mg/m�, IV, uma vez) Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) Doxorrubicina (25 mg/m� ou 1 mg/kg, IV, uma vez, ~ como infusão durante 20 minutos) Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) Clorambucil (1,4 mg/kg, VO, uma vez) Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) Metotrexato(0,5 a 0,8 mg/kg, IV, uma vez) Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) Clorambucil (1,4 mg/kg, VO, uma vez) Vincristina (0,5 a 0,7 mg/m�, IV, uma vez) Doxorrubicina (25 mg/m� ou 1 mg/kg, IV, uma vez, ~ como infusão durante 20 minutos) Resgate Nos casos em que não ocorre resposta ao tratamento, ou surge recidiva da neoplasia, protocolos quimioterápicos de resgate são implantados com o intuito de atingir uma segunda remissão. Normalmente, são utilizados diferentes fármacos ou diferentes conjugações de fármacos que ainda não foram utilizados (ANTELO, 2021). Clorambucil + Prednisolona Um estudo mostrou que a reintrodução do clorambucil e prednisolona em gatos com LAET-II que necessitam de terapia de resgate é eficaz e pode ser considerada como primeira escolha para pacientes que saem da remissão (POPE et al., 2015). Ciclofosfamida + Prednisolona A ciclofosfamida, em combinação com a prednisolona, tem sido utilizada como protocolo de resgate para gatos com LAET-II que saem da remissão clínica (FONDECARO et al., 1999; BARRS, BEATTY, 2010; STEIN et al., 2010; KIM et al., 2021). As doses de tratamento com ciclofosfamida ainda não são bem estabelecidas, porém o principal efeito colateral relatado em gatos é a mielossupressão, a f e t a n d o p r i n c i p a l m e n t e o s neutrófilos (MOORE, FRIMBERGER, CHAN, 2018; MOORE et al., 2018; CHAN et al., 2020). Ciclofosfamida Prednisolona 2 mg/kg, VO, SID ou 10 mg/kg, VO, SID Adaptado de Chan et al., 2020. 225 mg/m�, VO, a cada 3 semanas 200 – 250 mg/m , VO, nos dias 1 e 3, a cada 2 semanas Lomustina A lomustina em protocolo de resgate demonstrou um aumento significativo no tempo de remissão em gatos com LAET-II, comparado a gatos com LAET-I. No entanto, deve-se considerar os aumentos nos efeitos colaterais (DUTELLE et al., 2012; POPE et al., 2015). 10 mg/kg, VO, a cada 3-4 semanas Prognóstico O principal fator prognóstico no linfoma alimentar felino é a resposta inicial à quimioterapia e se ocorre ou não remissão. Gatos que alcançam remissão completa ou que apresentam tempo de remissão maior após tratamento quimioterápico tem expectativa de vida maior em relação àqueles que obtêm remissão parcial ou não atingem (LINGARD et al., 2009). De modo geral, felinos com LTAE-II tem uma expectativa de vida maior, melhor resposta à quimioterapia e maior tempo de remissão em relação à LTAE-I/LDGB (FONDACARO et al., 1999; VALLI et al., 2000; RICHTER, 2003; LINGARD et al., 2009). ENDO, Y. et al. Molecular characteristics of malignant lymphomas in cats naturally infected with feline immunodeficiency virus. Veterinary Immunology and Immunopathology, [S.l.], v. 57, n. 3-4, p. 153-167, july 1997. DOI: 10.1016/s0165-2427(97)00004-4 EVANS, S. E. et al. Comparison of endoscopic and full- thickness biopsy specimens for diagnosis of inflammatory bowel disease and alimentary tract lymphoma in cats. Journal of the American Veterinary Medical Association, [S.l.], v . 2 2 9 , n . 9 , p . 1 4 4 7 - 1 4 5 0 , n o v . 2 0 0 6 . 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