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Farmacologia Aplicada à Farmácia Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª M.ª Queli Defaveri Varela Cabanellos Revisão Textual: Prof. Me. Claudio Brites Farmacologia do Sistema Nervoso Central Farmacologia do Sistema Nervoso Central • Apresentar a fisiologia e a bioquímica dos principais neurotransmissores que modulam diversas funções vitais do sistema nervoso central; • Apresentar as principais classes farmacológicas dos fármacos que atuam no sistema nervoso central. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Neurotransmissão Gabaérgica e Glutamatérgica; • Classes e Agentes Farmacológicos que Afetam a Neurotransmissão Gabaérgica; • Fisiologia da Neurotransmissão Glutamatérgica; • Fisiopatologia e Farmacologia da Neurotransmissão Glutamatérgica; • Classes e Agentes Farmacológicos Precursores da Dopamina; • Classes e Agentes Farmacológicos Agentes Antipsicóticos Típicos e Atípicos; • Classes e Agentes Farmacológicos; • Fisiopatologia das Convulsões. UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Neurotransmissão Gabaérgica e Glutamatérgica Fisiologia da Neurotransmissão Gabaérgica; Metabolismo do GABA; Receptores da GABA, Receptores Ionotrópicos de GABA: GABAA e GABAC; Receptores Metabotrópicos de GABA - GABAB A forma como o nosso cérebro desempenha funções acerca do raciocínio, memória, sentimentos, reações, criatividade, cognição ainda instiga estudiosos do mundo todo. Compreender o funcionamento desse complexo sistema é um desafio intrigante, prin- cipalmente quando estamos diante de patologias cujos tratamentos ainda permanecem incertos e obscuros. Assim, o papel da farmacologia nesses casos vai muito além da terapia medicamentosa. Restabelecer o funcionamento das atividades desses sistemas no paciente garante a ele um retorno ao convívio social, desempenho de atividades pro- dutivas e uma significativa melhora na qualidade de vida. Quando estudamos as sinapses nervosas, a produção, o armazenamento e a liberação dos neurotransmissores, bem como a sua concentração, inativação e recaptação, entendemos que esses são processos bioquímicos que se relacionam à Farmacologia, à Fisiologia e à Patologia. Os aminoáci- dos desempenham um importante papel no nosso organismo. Além da síntese proteica, o metabolismo de aminoácidos está intrinsecamente relacionado a muitos neurotrans- missores. O glutamato é fonte de grupos aminos para a maior parte dos aminoácidos. A partir da descarboxilação do glutamato, tem-se o ácido ϒ-aminobutírico (GABA). Essas reações são apresentadas na Figura a seguir. Figura 1 – Biossíntese de alguns neurotransmissores a partir de aminoácidos Fonte: NELSON; DAVID L, 2019, p. 888 8 9 Alguns aminoácidos estão presentes no SNC em concentrações relativamente altas. Tanto o GABA quanto o glutamato podem alterar a descarga de neurônios. Após inú- meros estudos por meio do uso inclusive de antagonistas seletivos de aminoácidos, constatou-se que os aminoácidos GABA, Glicina e glutamato são transmissores do SNC. O glutamato e o aspartato são encontrados em concentrações muito altas no cérebro e exercem efeitos potentes excitatórios nos neurônios de praticamente todas as regiões do SNC. Atualmente, admite-se que o glutamato e, possivelmente, o aspartato sejam os principais transmissores excitatórios rápidos em todo o SNC. Os receptores do glutamato classificam-se funcionalmente como canais iônicos con- trolados por ligantes receptores ionotrópicos, ou GPCR, metabotrópicos. Os canais iô- nicos controlados por ligantes podem ainda ser classificados em receptores do N-metil- -D-aspartato (NMDA) e receptores não NMDA. A ativação dos receptores NDMA é fundamental para a indução de um tipo de potencialização a longo prazo, que ocorre no hipocampo. Em geral, os receptores NDMA são bloqueados por Mg+2 nos potenciais de membrana de repouso. Assim, a ativação do receptor também depende da despolariza- ção simultânea da membrana pós-sináptica. Altas concentrações de glutamato levam à morte das células neuroniais por meca- nismos que ainda estão sendo esclarecidos. Os receptores do glutamato tornaram-se alvos importantes de inúmeras estratégias terapêuticas, tendo sua possível participação apontada por pesquisadores em doenças neurodegenerativas crônicas e esquizofrenia. Verifique esse artigo da Revista Brasileira de Neurologia e Psiquiatria sobre “Mecanismo de Ação do Glutamato no Sistema Nervoso Central e a Relação com Doenças Neurodegenerati- vas” pelo link. Disponível em: https://bit.ly/3BZMh2r Estudos indicam que o GABA, outro aminoácido que atua como neurotransmissor, age em ações inibitórias dos interneurônios cerebrais e pode mediar a inibição pré- -sinaptica na medula espinal. O GABA é formado a partir do glutamato pela ação da descarboxilase do ácido glutâmico. Sua ação é finalizada principalmente por captura, pode ocorrer também reação de desaminação que é catalisada pela enzima GABA- -transaminase. O GABA também atua na inibição no córtex cerebral e entre o núcleo caudado e a substância negra. O GABA é o principal transmissor inibidor no cérebro. Na medula espinhal e no tronco cerebral, a glicina também exerce um papel impor- tante. O fato de antagonistas como a bicuculina induzirem convulsões e, além disso, a tiagabina, que inibe seu transporte, e a vigabatrina, que inibe seu metabolismo, serem utilizadas no controle da epilepsia ilustra a importância do papel inibitório contínuo do GABA no cérebro. Ainda estão em estudo os possíveis efeitos terapêuticos úteis com substâncias que reproduzem a ação do GABA, inibem sua receptação ativa ou alteram a quantidade de material metabolizado. 9 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Receptores do GABA Os receptores do GABA foram divididos em A, B e C, ou seja, três tipos de recepto- res principais. As proteínas das subunidades do receptor GABAA são abundantes, este também é o sítio de ação de inúmeros fármacos neuroativos, como benzodiazepínicos, barbitúricos, etanol, esteroides anestésicos, anestésicos voláteis. O receptor GABAA deve ser pen- tamérico ou tetramérico em sua estrutura com subunidades reunidas em volta de um poro central, típico de outros receptores inotrópicos. A estrutura principal apresenta três subunidades diferentes: α, β e ϒ, com provável proporção: 2α, 2β 1ϒ. Com o perfil esperado de um receptor GABA A, todas as três subunidades são necessárias à interação com os benzodiazepínicos. Tabela 1 – Composição, Distribuição e Principais Funções dos Receptores GABAA Composição da Subunidade Localização Função Comentários α1β2γ2 Neurônios GABA disseminados Sedação, atividade anticonvulsivante Adulto, sensível a BZ, reduzido em tolerância ao fármaco? α2β3γ2 Cérebro anterior, medula espinal Ansiedade, relaxante muscular Elevação do axônio em algumas células, sensível a BZ α2β1γ1 Glia Embrionário e adulto sensível a BZ α3β3γ2 Córtex Atividade anticonvulsivante α4β2γ2 Tálamo Insensível a agonista BZ α4β2/3γ2 Giro dentado Elevado na abstinência de fármaco? α4β2δ Tálamo Inibição tônica Extrassináptico, insensível a BZ em adultos α4β2/3δ Giro dentado Extrassináptico, insensível a BZ α5β3γ2 Hipocampo CA1 Inibição tônica α6β2/3γ2 Gânglios sensoriais Insensível a agonista BZ α6β2/3δ Células do grânulo cerebelar Inibição tônica Extrassináptico, insensível a BZ, adulto γ3, θ, ε Poucas informações BZ, benzodiazepínicos. Fonte: Adaptada de BRUNTON; CHABNER; KNOLLMANN, p. 378 O receptor GABAB ou metabotrópico interage com a Gi e inibe a adenililciclase, ativa os canais de potássio e reduz a condutância do íon cálcio. Como inibem a liberação do GABA, os neurônios pré-sinapticos GABAB atuam como autorreceptores, podem ainda desempenhar a mesma função nos neurônios que liberam outros transmissores. Os recep- tores funcionais são heterodímeros formados por subunidades de GABABR1 e GABABR2. Para saber mais, verifique a função da proteína G: Verifique esse artigo de revisão. Disponível em: https://bit.ly/3DYJw3z 10 11 Figura 2– Estrutura dimérica do receptor GABAB Fonte: RANG et al. 2016, p. 1086 O GABAC tem um uma distribuição menos ampla do que os demais subtipos. Os recep- tores GABAC são encontrados na retina, medula espinal, colículo superior e na hipófise. A compreensão sobre a estrutura do GABA é um elemento chave no desenvolvi- mento de fármacos mais seletivos e com menos efeitos colaterais. O GABA é um neu- rotransmissor inibidor, indivíduos com baixa produção de GABA têm sido associados com crises epiléticas. Há evidências cada vez maiores de que substâncias com ações em diferentes subtipos de receptores diferem nas propriedades farmacológicas. Classes e Agentes Farmacológicos que Afetam a Neurotransmissão Gabaérgica Inibidores do Metabolismo do GABA, Agonistas e Antagonistas dos Receptores GABAA; Moduladores dos Receptores GABAA O GABA ocorre no tecido cerebral, porém não em outros tecidos de mamíferos, ex- ceto em quantidades muito pequenas. O seu metabolismo ocorre a partir do Glutamato pela ação da enzima descarboxilase do ácido glutâmico, enzima essa presente apenas nos neurônios com a capacidade de produzir GABA. Os neurônios GABAérgicos e os astrócitos capturam o GABA após a sua liberação por transportadores específicos. Guvacina, ácido nipecótico e tiagabina inibem o transporte de GABA. O GABA pode sofrer a ação da GABA-transaminase, essa enzima está localizada principalmente nos astrócitos e é inibida pela vigabatrina (fármaco utilizado no controle de epilepsia) Pesquise e escreva um esquema que represente o metabolismo do GABA com as respectivas enzimas e produtos. 11 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Os benzodiazepínicos, os barbitúricos, o zolpidem, a zaleplona, a eszopiclona, dentre outros fármacos, ligam-se a componentes moleculares do receptor de GABAA, presente nas membranas neuronais do SNC. Os fármacos que atuam nos receptores GABAA podem agir em diferentes locais, como o canal iônico; o ponto de ligação do GABA; e ainda vários pontos moduladores. Figura 3 – Principais locais de ação dos fármacos nos receptores NMDA e GABAA Fonte: RANG et al. 2016, p. 1073 Um poderoso agonista do GABAA é o muscimol, um derivado de um cogumelo aluci- nógeno que apresenta uma estrutura química semelhante ao GABA. O gaboxadol é um agonista parcial que foi desenvolvido como fármaco hipnótico, porém já foi retirado do mercado. Já a bicuculina é um antagonista específico, de origem natural que bloqueia o 12 13 potencial sináptico inibitório rápido na maioria das sinapses do SNC e trata-se de um com- posto convulsivante. A gabazina é um composto sintético, análogo ao GABA. Essas subs- tâncias não possuem aplicação terapêutica, sendo consideradas recursos experimentais. Agonista O grupo dos benzodiazepínicos, que apresenta efeitos sedativos, ansiolíticos e an- ticonvulsivantes potencializa seletivamente os efeitos do GABA em alguns receptores GABAA, dependendo da composição da subunidade do receptor. Se ligam com alta afinidade ao receptor benzodiazepínico no receptor GABAA de modo que a ligação ao GABA é facilitada e seu efeito agonista é estimulado. Os benzodiazepínicos constituem um grupo de fármacos fantástico! Sua síntese e introdu- ção no mercado revolucionou a terapia da ansiedade. No entanto, seu uso descontrolado tem levado a sérios comprometimentos na saúde. Verifique essa reportagem e conheça um pouco mais sobre essas substâncias. Disponível em: https://bit.ly/3yTDMEd Já os agonistas inversos reduzem a ligação do GABA e são geradores de ansiedade e pró-convulsivantes, não tendo aplicação terapêutica. Também possuem ação de forma a reforçar a ação do GABA outros depressores do SNC barbitúricos, agentes anestésicos e neuroesteroides. Neuroesteroides são com- postos que se relacionam com os hormônios esteroides, porém atuam para reforçar a ativação de receptores GABA. Estão nesse grupo os metabólitos da progesterona e dos andrógenos formados no SNC. Os sintéticos incluem a alfaxalona, que foi desenvolvida como um agente anestésico. Um produto fitoterápico, a picrotoxina, é um convulsivante que bloqueia o receptor GABAA do canal de cloro, bloqueando o efeito inibitório pós-sináptico do GABA, tam- bém bloqueia os receptores de glicina e não possui ação terapêutica. Como o GABA não atravessa a barreira hematoencefálica, análogos mais lipofílicos foram procurados, como o baclofeno. Ao contrário do GABA, as suas ações não são bloqueadas pela bicuculina. Esse comportamento levou ao reconhecimento do receptor GABAB, o receptor onde o baclofeno atua como agonista seletivo. A indicação terapêu- tica do baclofeno consiste no tratamento de espasticidade e alterações motoras relacio- nadas, bem como no tratamento da dependência de drogas. Os receptores GABAB são receptores heterodiméricos acoplados à proteína G. Cau- sam inibição pré e pós-sináptica inibindo a abertura do canal de cálcio e aumentando a condutância do K+. Os antagonistas competitivos do GABAB incluem inúmeros com- postos experimentais. Experimentos mostraram que eles possuem apenas efeitos leves na função do SNC (Antagonistas GABAA possuem fortes efeitos convulsivantes). Essas avaliações não resultaram em nenhum produto de ação farmacológica. 13 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Fisiologia da Neurotransmissão Glutamatérgica Metabolismo do Glutamato, Receptores do Glutamato, Receptores Ionotrópicos de Glutamato, Receptores Metabotrópicos do Glutamato O glutamato está distribuído de forma ampla e uniforme no SNC, tendo no SNC uma concentração mais elevada do que em outros sítios. Apresenta uma importante função no metabolismo. As enzimas transaminases catalisam a interconversão de glutamato em α-oxoglutarato. O metabolismo do glutamato no SNC deriva principalmente da glicose por intermedi- ários do Ciclo de Krebs ou da glutamina, que é sintetizada pelas células gliais e captada pelos neurônios. Este é um momento para rever o Ciclo de Krebs! E a importante integração metabólica! A ligação entre as vias para a síntese de aminoácidos excitatórios e inibitórios (GABA e glicina) dificulta a aplicação de manipulações experimentais na síntese do transmissor, pois alterações poderão afetar tanto mediadores excitatórios como inibitórios. O glutamato é armazenado em vesículas sinápticas e liberado por exocitose depen- dente de Ca+2, a captação e o acúmulo em vesículas sinápticas são realizados por prote- ínas transportadoras específicas. O glutamato liberado é encaminhado para os terminais nervosos e para os astrócitos vizinhos por transportadores dependentes de Na+/ H+/ K+ e transportado para as ve- sículas sinápticas por um transportador diferente conduzido pelo gradiente de prótons através da membrana. O transporte de glutamato pode atuar em reverso e consistir em fonte de liberação de glutamato. Situação observada em isquemia cerebral, por exemplo. O glutamato captado pelos astrócitos é convertido em glutamina e reciclado a par- tir de transportadores de volta aos neurônios, que convertem a glutamina de volta em glutamato. A glutamina escapa dos astrócitos por intermédio de um transportador e os neurônios a captam e sintetizam o glutamato. 14 15 Figura 4 – Metabolismo dos aminoácidos transmissores no cérebro Fonte: RANG et al. 2016, p. 1066 Figura 5 – Transporte de glutamato (Glu) e glutamina (Gln) pelos neurônios e pelos astrócitos Fonte: RANG et al. 2016, p. 1067 São conhecidos poucos fármacos e nenhum com uso clínico que interfira especifica- mente no metabolismo do glutamato. 15 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Receptores de glutamato O glutamato e os aminoácidos relacionados ativam tanto os receptores ionotrópicos quanto os metabotrópicos. Para lembrar: qual a diferença entre receptor ionotrópico e metabotrópico? Receptores de glutamato ionotrópicos Consistem em três tipos os receptores ionotrópicos do glutamato, determinados em função dos seus agonistas específicos: NMDA, AMPA e cainato. Esses canaisdependentes de ligantes podem ser homoméricos ou heteroméricos, compostos de quatro unidades, cada uma com uma estrutura de alça com poro. Existem ainda cerca de dezesseis subunidades de receptores diferentes. Os receptores NMDA são montados com sete tipos de subunidades (GluN1, GluN2A, GluN2B, GluN2C, GluN2D, GluN3A, GluN3B). As subunidades que compreendem o receptor AMPA (GluA1-4) e cainato (GluK1-5). Os receptores que possuem diferentes subunidades possuem características fisiológicas e farmacológicas distintas. Os receptores AMPA e os receptores cainato, estes em algumas regiões, servem para mediar a transmissão excitatória rápida no SNC. Já os receptores NMDA, que coexis- tem frequentemente com os receptores AMPA, contribuem com um componente lento no potencial sináptico excitatório, a sua magnitude varia conforme a via. Os receptores de cainato e NMDA também são expressos nas terminações nervosas, onde podem estimular ou reduzir a liberação do neurotransmissor. Os receptores AMPA ocorrem tanto nos astrócitos quanto nos neurônios e essas células desempenham importante papel na comunicação do cérebro. Os receptores de glutamato são mais abundantes no córtex, nos núcleos da base e vias sensitivas. Receptores NMDA e AMPA estão geralmente co-localizados, já os recep- tores de cainato possuem localização muito mais restrita. Receptores NMDA São altamente permeáveis ao Ca+2 e outros cátions (ativação é particularmente efe- tiva na promoção da entrada de Ca+2. Bloqueados por Mg+2 dependendo da voltagem. Existem em concentrações fisiológicas de Mg+2, quando a célula está polarizada, mas desaparecem se a célula for despolarizada. A ativação dos receptores exige glicina e glutamato; os antagonistas competitivos no ponto da glicina inibem indiretamente a ação do glutamato. A D-serina ativa o receptor NMDA via ponto da glicina, sendo liberada pelos astrócitos. A abertura do canal pode ser mediada por algumas poliaminas endógenas (espermina, espermidina). Essa ação é bloqueada por ifenprodil e eliprodil (fármacos experimentais). Quetamina e fenciclidina, bem como alguns outros anestésicos psicotomiméticos, são agentes bloqueadores seletivos dos canais dos receptores NMDA. 16 17 Receptores Metabotrópicos do Gutamato São oito os receptores metabotrópicos do glutamato mGlu1-8. Encontram-se am- plamente distribuídos ao longo do SNC, nos neurônios onde regulam a excitabilidade celular e a transmissão sináptica e na glia. O grupo neuronal 1 é claramente excitatório e localizado pós-sinapticamente, ao elevar o Ca+2 intracelular, eles modificam as respostas pelos receptores ionotrópicos de glutamato. Já os receptores do grupo 2 e 3 são pre- dominantemente pré-sinapticos e sua ativação tende a reduzir a transmissão sináptica e a excitabilidade neuronal. Podem atuar como autorreceptores envolvidos na redução da liberação de glutamato ou hetererreceptores, quando presentes nos terminais que contém GABA, por exemplo. Para saber mais e complementar seus conhecimentos pesquise sobre a plasticidade sinápti- ca e potencialização de longo prazo, você vai gostar! Fisiopatologia e Farmacologia da Neurotransmissão Glutamatérgica Doença de Alzheimer A Doença de Alzheimer é uma demência que não apresenta causa antecedente, sua incidência aumenta conforme o aumento da idade, cerca de 5% com 65 anos para 90% com idade de 95 anos ou mais. Estudos tem revelado mecanismos genéticos e molecula- res que aumentam as esperanças de tratamentos mais eficazes. A Doença de Alzheimer está associada ao encolhimento do cérebro e perda neuronal localizada principalmente no hipocampo e parte basal do prosencéfalo. As intervenções terapêuticas na Doença de Alzheimer são apenas paliativas e oferecem modestos benefícios de curta duração. A demência do tipo Alzheimer apresenta aspectos distintos: acúmulo de placas senis (acúmulo β-amiloide), formação de numerosos entrelaçados neurofibrilares e perda de neurônios corticais, particularmente colinérgicos na parte basal do presencéfalo. As placas amiloides consistem em agregados de fragmentos Aβ do precursor da proteína amiloide (PPA), uma proteína normal da membrana neuronal produzida pela ação das βe ϒ-secretases. A doença de Alzheimer familial (rara) resulta de mutações no gene PPA ou nos genes do pré-senilina. Mutações na ApoE4 aumentam o risco do desenvolvimen- to da doença. Vamos falar de genética: se você tivesse antecedentes em sua família com essa patologia, seria interessante realizar a pesquisa desses marcadores? 17 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Os agregados neurofibrilares compreendem agregados intracelulares de uma forma altamente fosforilada de uma proteína neuronal normal (Tau). Assim, a Tau hiperfosfori- lada e a Aβ atuam para causar a neurodegeneração. Acredita-se que a perda de neurônios colinérgicos seja a resposta para as deficiências de aprendizado e memória apresentadas. Os atuais tratamentos objetivam melhorar a transmissão colinérgica no SNC ou evi- tar as ações da superestimulação dos receptores NMDA glutamato em certas áreas do cérebro. Neste tópico, abordaremos o antagonismo dos receptores NMDA. A estimulação de receptores de glutamato no SNC tem apresentado um relevante papel para a formação de certas memórias, entretanto a superestimulação dos receptores de glutamato, especialmente os NMDA, parece ser um dos mecanismos de processos neu- rodegenerativos ou apoptóticos. Quando ligado ao receptor NMDA, o glutamato provoca a abertura de canal iônico associado, o que permite a entrada de Na+ e Ca+2. O excesso de Ca+2 intracelular ativa inúmeros processos que podem resultar em lesão nos neurônios e apoptose. Assim, os antagonistas dos receptores NMDA-glutamato são frequentemente neuroprotetores, evitando a perda de neurônios após lesões como as isquêmicas. A memantina é um fármaco aprovado para o tratamento da doença de Alzheimer. É um antagonista oralmente ativo dos receptores de NMDA. Inicialmente, foi apresen- tado como um fármaco antiviral e representado como um inibidor da excitotoxicidade, atua bloqueando fisicamente o canal iônico associado ao receptor NMDA. No entanto, quando usadas as dosagens terapêuticas, somente uma fração desses receptores são efe- tivamente bloqueados, essa ação permite limitar o influxo de Ca+2 nos neurônios, como consequência, não são atingidos os níveis intracelulares tóxicos e permite-se a entrada de Ca+2 suficiente para preservar os processos vitais que dependem do influxo de Ca+2 (diferente do que ocorre com a feciclidina, que ocupa e bloqueia praticamente todos estes canais). Apresenta uma meia-vida plasmática longa. O fármaco é geralmente bem tolerado, com poucos efeitos adversos e doses dependentes. Os efeitos adversos espe- rados podem acabar se confundindo com os efeitos da própria doença como confusão, agitação e intranquilidade, além de dores de cabeça, tontura e sonolência, constipação, falta de ar e hipertensão. Vamos conhecer mais sobre esse fármaco? Pesquise a sua bula, e as apresentações farmacêuticas. Na prática, tem-se observado que a memantina diminui a velocidade da perda de memória em pacientes com perdas cognitivas moderadas a graves, mas não existem evidências de que ela seja capaz de impedir ou retardar a neurodegeneração em pacien- tes com a doença de Alzheimer ou que seu tratamento seja mais eficaz do que com os inibidores de Acetilcolinesterase. Como podemos inibir a neurodegeneração? Quais são os apontamentos das atuais pesquisas? 18 19 Classes e Agentes Farmacológicos Precursores da Dopamina Agonistas dos Receptores de Dopamina: Inibidores do Metabolismo da Dopamina, Farmacologia não-dopaminérgica A dopamina está envolvida em inúmeras alterações comuns da função cerebral como a Doença de Parkinson, a esquizofrenia, distúrbio do déficit de atenção, dependência de fármacos e alterações endócrinas. A distribuição da dopamina é mais restrita que a da norepinefrina. A sua síntese segue a mesma rotaque a da norepinefrina, a conversão de tirosina para DOPA (passo limitador da velocidade da reação), seguida de descarboxilação para formar dopamina. Os neurônios dopaminérgicos não possuem dopamina β-hidroxilase e assim não conver- tem dopamina em norepinefrina. Figura 6 – Síntese de dopamina a partir do levodopa na ausência e na presença de carbidopa, um inibidor da dopamina-descarboxilase nos tecidos periféricos Fonte: WHALEN et. al. 2016, p. 111 Precursor de Dopamina Levodopa: é um precursor metabólico da dopamina. Restabelece a neurotransmis- são dopaminérgica no corpo estriado aumentando a síntese de dopamina nos neurônios ainda ativos da substância nigra. A levodopa faz parte do tratamento de primeira linha para a doença de Parkinson e é combinada com um inibidor da dopa-descarboxilase, ou carbidopa ou benserazida, que reduz a dose necessária em até dez vezes e diminui o aparecimento de efeitos secundários periféricos. É bem absorvida no intestino delgado, depende de transporte ativo, embora grande parte acabe sendo inativada pela MAO (monoamina oxidase) do intestino. A meia-vida plasmática é curta, cerca de 2 horas. Foram desenvolvidos compostos orais e subcutâneos de liberação lenta. 19 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Nos pacientes com a doença inicial, o número de neurônios dopaminérgicos residu- ais, cerca de 20%, é adequado para a conversão de levodopa em dopamina. No entanto, com a progressão da doença, o número de neurônios diminui e a captação e conversão de levodopa em dopamina passa a ser insuficiente, resultando em flutuações no controle motor. O alívio do tratamento é sintomático e corresponde somente ao tempo em que o fármaco se encontra no organismo. Mecanismo de ação da levodopa: como a doença de Parkinson resulta da falta de dopamina em regiões específicas do cérebro e a própria dopamina não atravessa a barreira hematoencefálica, seu precursor, a levodopa, é transportado ativamente para o SNC e transformado em dopamina no cérebro. Como ocorre grande descarboxilação da levodopa na periferia à dopamina, tem-se os efeitos colaterais que incluem náusea, êmese, arritmias cardíacas e hipotensão. O efeito da levodopa, precursor de dopamina, é potencializado pela coadministração com carbidopa. A carbidopa é um inibidor da enzima dopa-descarboxilase que não atra- vessa a barreira hematoencefálica. Ela diminui a conversão da levodopa em dopamina no TGI (trato gastrointestinal) e tecidos periféricos. Dessa forma, mais levodopa fica disponível para atravessar a barreira hematoencefálica e poder ser convertida em dopa- mina. Essa associação diminui a dose de levodopa administrada em quatro a cinco vezes e diminui os efeitos colaterais da dopamina periférica. A levodopa reduz a rigidez, tremores e outros sintomas da doença de Parkinson. A associação da levodopa com carbidopa reduz substancialmente a gravidade da doença nos primeiros anos, no entanto os pacientes tendem a diminuir a resposta entre o ter- ceiro e o quinto ano de tratamento. A ingestão de refeições, em particular as ricas em proteínas, interfere no transporte da levodopa ao SNC. Aminoácidos como a leucina, isoleucina, por exemplo, competem com a levodopa para a absorção intestinal e transporte da barreira hematoencefálica. Assim, o fármaco deve ser consumido em jejum, geralmente 45 minutos antes das refei- ções. A sua retirada deve ser gradual. A urina e a saliva do paciente podem vir a apresentar uma coloração marrom devido à produção de melanina produzida pela oxidação da catecolamina. Podem ser observa- das alucinações, depressão, alteração de humor e ansiedade. Interações importantes: A vitamina B6 (piridoxina) aumenta sua hidrólise periférica e diminui a sua eficácia, administração concomitante com inibidores da MAO, como a fenelzina, podem causar uma crise hipertensiva pelo aumento de catecolaminas. Nos pacientes com glaucoma, podem causar aumento da pressão intraocular, enquanto nos pacientes cardíacos podem levar à arritmias. Inibidores da Monoamina oxidase Já foram encontrados dois tipos de monoamina oxidases no sistema nervoso. A monoa- mina oxidase A, que metaboliza norepinefrina, serotonina e dopamina, e a monoamina oxidase B, que metaboliza seletivamente a dopamina. 20 21 Selegilina e rasagilina A selegilina é um inibidor seletivo irreversível da monoamina oxidase B. Em baixas dosagens, inibe a MAO tipo B (que metaboliza a dopamina), mas não a MAO tipo A (que metaboliza norepinefrina e serotonina), quando utilizadas as dosagens recomendadas, assim a inibição do metabolismo da dopamina aumenta a sua concentração no cérebro. Ela tem baixo potencial de causar crises hipertensivas, no entanto, em doses elevadas, ela perde a seletividade. A selegilina é biotransformada em metanfetamina e anfetami- na, seus efeitos estimulantes podem resultar em insônia, conforme o horário de admi- nistração. A rasagilina é um inibidor seletivo e irreversível da MAO tipo B cerebral e tem cinco vezes a potência da selegilina, além disso, não é biotransformada em substâncias anfetaminas. Devem ser verificadas as possíveis interações medicamentosas. É fundamental que o farmacêutico conheça melhor as interações medicamentosas e as interações fármaco-alimento envolvendo IMAOS, pesquise mais sobre este tema e descubra qual a razão do receio na prescrição de IMAOS. A administração combinada de levodopa e um inibidor de ambas as formas de MAO deve ser evitada pois pode levar à crise hipertensiva, em virtude do acúmulo periférico de norepinefrina. Inibidores da catecol-O-metiltransferase Quando ocorre a inibição da dopa descarboxilase, ocorre uma ativação compensató- ria de outras vias do metabolismo da levodopa, em especial a catecol-O-metiltransferase (COMT). A metilação de levodopa pela catecol-O-metiltransferase (COMT) resulta em 3-O-metildopa, geralmente é uma via de menor transformação, no entanto, quando ocorre a inibição da dopa-descarboxilase, por exemplo pelo uso da carbidopa, ocor- re uma produção significativa de 3-O-metildopa, que compete com a levodopa pelo transporte ativo no SNC. A inibição da COMT pela entacapona ou tolcapona reduz a concentração plasmática de 3-O-metildopa, aumentando a concentração cerebral de dopamina. Entacapona e tolcapona inibem a COMT de modo seletivo e reversível. A tolcapona penetra a barreira hematoencefálica e inibe a COMT no SNC. Está disponível uma preparação farmacêutica com levodopa, carbidopa e entacapo- na, as vantagens do seu uso ainda estão sendo avaliadas. Figura 7 – Efeito do entacapona na concentração de dopa no SNC Fonte: WHALEN et al. 2016, p. 113 21 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Agonistas dos Receptores Dopaminérgicos Esses fármacos atuam diretamente sobre os receptores de dopamina, não possuem metabólitos tóxicos e não competem com outras substâncias para o transporte ativo no sangue através da barreira hematoencefálica. Diversos agonistas da dopamina podem ser utilizados no tratamento do Parkinson. Os exemplos mais antigos derivam da ergo- lina (bromocriptina e pergolida) e raramente são utilizados no tratamento do Parkinson. Os mais atuais possuem menos efeitos adversos (pramipexol e ropinirol). A apomorfina também é um potente agonista da dopamina. Nos tratamentos, em geral, a resposta a um agonista da dopamina em pacientes que nunca receberam levodopa costuma ser em geral decepcionante. • Bromocriptina: é um D-2 agonista já foi muito utilizado no tratamento da doença de Parkinson, no entanto foi superado por agonistas mais recentes da dopamina, devido a seus efeitos adversos; • Pergolida: estimula os receptores D1 e D2. Já foi muito utilizado no tratamento da Doença de Parkinson, mas, nos EUA, não está mais disponível devido à associação ao desenvolvimento de doença cardíaca valvar; • Pramipexol: possui afinidade preferencial pelos receptores D3, é efetivo no trata- mento de doença de Parkinson leve e avançada, possibilita redução das dosesde levodopa. Foi sugerido um possível efeito protetor pela eliminação de peróxido de hidrogênio e aumento da atividade neurotrófica em culturas celulares. Está disponí- vel no mercado em preparações de liberação prolongada, sendo uma boa alternativa para evitar flutuações nos níveis sanguíneos do fármaco ao longo do dia. Ropinirol Agonista do receptor D2, relativamente puro, efetivo como monoterapia em pacien- tes com doença leve e em conjunto com a levodopa. É metabolizado pela CYP1A2, deve-se atentar para interações metabólicas. Está disponível em formas de liberação prolongada, garantida apenas uma administração ao dia. Rotigotina É um agonista da dopamina administrado diariamente por meio de um adesivo trans- dérmico para tratamento do Parkinson no seu estágio inicial. Essa forma proporciona uma estimulação dopaminérgica mais contínua do que a medicação oral no início do tratamento. No entanto, podem ocorrer reações locais graves. Seu uso foi interrompido nos EUA pela formação de cristais nos adesivos, mas permanece na Europa. De forma geral, os efeitos colaterais dos agonistas de dopamina incluem: efeitos gas- trintestinais (anorexia, náusea, vômito, constipação, sangramento de úlcera péptica), efei- tos cardiovasculares (hipotensão postural, arritmias, edema periférico), discinesias, trans- tornos mentais, bem como alguns relacionados aos derivados da ergolina (esporão do centeio), cefaleia, congestão nasal, infiltrados pulmonares, fibrose pleural e retroperitonial, eritromelalgia. Pesquise o que é eritromelalgia. 22 23 São contraindicados para pacientes com história de doença psicótica, infarto do mio- cárdio recente ou com ulceração péptica ativa. Apomorfina É um potente agonista da dopamina e mostra-se efetiva no resgate de períodos de acinesia em pacientes em tratamento com terapia dopaminérgica otimizada. Seu uso torna-se restrito devido às complicações e potenciais interações. Amantadina Sua descoberta deu-se ao acaso. Trata-se de um agente antiviral com ação antipa- rkinsoniana. Seu modo de ação ainda carece de compreensão, no entanto, a amanta- dina influencia a síntese, a liberação ou a receptação de dopamina. Verificou-se que ela antagoniza os efeitos da adenosina nos receptores de adenosina A2A, passíveis de inibir a função dos receptores D2, assim como foi constatada também a liberação de cateco- laminas a partir de suas reservas periféricas. Trata-se de uma substância menos potente do que a levodopa, com benefícios de curta duração. Pode influenciar favoravelmente a bradicinesia, a rigidez e o tremor do parkinsonismo. A amantadina exerce vários efeitos indesejáveis no Sistema nervoso central, todos os quais podem ser revertidos com a interrupção do fármaco. Deve ser utilizada com cautela em pacientes com história de convulsões ou insuficiência cardíaca. Para saber mais, consulte a bula desse medicamento! Classes e Agentes Farmacológicos Agentes Antipsicóticos Típicos e Atípicos Os agentes antipsicóticos possuem a capacidade de reduzir os sintomas psicóticos e uma ampla gama de condições, inclusive esquizofrenia, transtorno bipolar, depres- são psicótica, psicoses senis, psicoses orgânicas e psicoses induzidas por substâncias. Também possuem outras ações, como melhora do humor, diminuição de ansiedade e transtornos do sono. Ficou curioso? Quer conhecer melhor a esquizofrenia? Verifique esse artigo. Disponível em: https://bit.ly/2VtDVRa Os fármacos associados às propriedades antipsicóticas podem ser classificados de várias formas. Os antipsicóticos atípicos são hoje os mais utilizados. 23 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Antipsicóticos Típicos e Atípicos Antipsicóticos típicos são inibidores competitivos em vários receptores, mas seus efeitos antipsicóticos refletem o bloqueio competitivo dos receptores de dopamina. Já os antipsicóticos atípicos apresentam menos efeitos adversos extrapiramidais e parecem dever sua ação ao bloqueio dos receptores de dopamina e serotonina, e talvez outros. O tratamento atual geralmente consiste no emprego de fármacos atípicos para minimi- zar o risco de distúrbios debilitantes do movimento devido ao bloqueio dos receptores D2 de dopamina. Os antipsicóticos não curam a doença, diminuem a intensidade de alucinações e ilusões. Quadro 1 – Resumo dos fármacos antipsicóticos Antipsicóticos de primeira geração (baixa potência) • Clorpromazina; • Proclorperazina; • Tioridazina. Antipsicóticos de primeira geração (alta potência) • Flufenazina; • Haloperidol; • Pimozida; • Tiotixeno. Antipsicóticos de segunda geração • Aripiprazol; • Asenapina; • Clozapina; • lloperidona; • Lurasidona; • Olanzapina; • Quetiapina; • Paliperidona; • Risperidona; • Ziprasidona. Fonte: Adaptado de CLARK et al. 2013, p. 161 24 25 Figura 8 – Ações bloqueadoras da dopamina dos fármacos neurolépticos Fonte: CLARK et al. 2013, p. 162 Mecanismo de Ação Todos os antipsicóticos típicos e a maioria dos atípicos bloqueiam receptores de do- pamina no cérebro e na periferia. Cinco receptores de dopamina foram identificados: D1 e D5 ativam adenililciclase em geral, excitam os neurônios, enquanto D2, D3 e D4 inibem a abertura de canais de K+, causando hiperpolarização neuronal. Os antipsicó- ticos ligam-se a esses receptores em graus variados, no entanto, a eficácia clínica de antipsicóticos típicos baseia-se no bloqueio de receptores D2 no sistema mesolímbico do cérebro. As ações dos fármacos antipsicóticos são antagonizadas por fármacos nos quais a concentração de dopamina na sinapse mimetiza a ação da dopamina nos locais de ligação pós-sinápticos. A maioria dos antipsicóticos atípicos parece exercer parte de sua ação singular pela inibição de receptores 5-HT, em particular 5-HT2A. A maioria dos antipsicóticos tem afinidades pelos receptores dopaminérgicos D2 proporcionais à potência clínica. A clozapina se diferencia dos antipsicóticos típicos por apresentar afinidade semelhante pelos receptores dopaminérgicos D1 e D2. As ações antipsicóticas parecem dever-se ao bloqueio de receptores de dopamina e/ou serotonina, no entanto, vários fármacos bloqueiam inúmeros outros receptores de histamina, colinérgicos, adrenérgicos, embora não se tenha conhecimento sobre as 25 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central ações antipsicóticas resultantes desses bloqueios, já a maioria dos efeitos adversos são resultados da ação do bloqueio desses outros receptores. Os efeitos extrapiramidais, distonia, sintomas tipo Parkinson, acatisia, discinesia tar- dia ocorrem com tratamento crônico. O bloqueio dos receptores de dopamina da via nigroestriatal provavelmente causa esses movimentos indesejados. Os antipsicóticos atí- picos apresentam esses efeitos com menor frequência. Efeito antiemético deve-se ao bloqueio dos receptores D2 –dopaminérgicos da zona quimiorreceptora disparadora bulbar. Aripiprazol e tioridazina não apresentam esse efeito. Alguns antipsicóticos podem apresentar efeitos anticolinérgicos, como visão borrada, confusão, xerostomia (a clozapina aumenta a salivação), retenção urinária e constipação. Outros efeitos incluem ainda hipotensão ortostática poiquilotermia, sedação, aumento da liberação de prolactina. É importante observar também reações alérgicas, reações tóxicas (agranulocitose com a clozapina), complicações oculares (clorpromazina e tiori- dazina), toxicidade cardíaca. Os antipsicóticos são utilizados no tratamento da esquizofrenia, prevenção de náusea e êmese graves, tranquilizantes, tratamento do soluço intratável (clorpromazina), tiques fônicos e motores da doença de Tourette, irritabilidade do autismo (risperidona). Verifique os inúmeros filmes que abordam o tema da esquizofrenia, uma boa dica é “Uma mente brilhante”. Disponível em: https://youtu.be/q8vUMD1f0ss Síndrome Neuroléptica Maligna Consiste num transtorno potencialmente fatal em pacientes extremamente sensíveis aos efeitos extrapiramidais dos antipsicóticos. Apresenta como sintomasiniciais rigi- dez muscular, febre, leucocitose, instabilidade autônoma, alteração da pressão arterial e frequência do pulso. Níveis de creatinocinase muscular geralmente elevados indicam a lesão muscular. Acredita-se que a causa da síndrome seja um bloqueio excessivamente rápido dos receptores pós-sinápticos de dopamina, que tem como consequência uma forma grave de síndrome extrapiramidal. Relaxantes musculares como o diazepam po- dem ser úteis. Indica-se a troca por um fármaco atípico após a recuperação. As pesquisas atuais estão voltadas ao desenvolvimento de compostos antipsicóticos atípicos mais seletivos quanto ao sistema mesolímbico (redução dos efeitos sobre o sis- tema extrapiramidal) ou com efeito sobre receptores dos neurotransmissores centrais. A toxicidade extrapiramidal parece estar associada a uma alta potência D2. 26 27 Classes e Agentes Farmacológicos Inibidores do Armazenamento da Serotonina; Inibidores da Degradação da Serotonina Inibidores da Recaptação; Antidepressivos Tricíclicos (ATC); Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS); Inibidores da Recaptação de Serotonina –Noradrenalina (IRSN); Antidepressivos Atípicos; Agonistas dos Receptores de Serotonina; Antagonistas dos Receptores de Serotonina; Estabilizadores do Humor – Lítio A depressão é um distúrbio psiquiátrico que afeta inúmeras pessoas no mundo todo. Ainda se encontra cercada de incertezas e preconceitos, o tratamento da depressão pode compreender inúmeras estratégias além da terapia medicamentosa. O insucesso do tratamento pode muitas vezes levar ao suicídio. Assim, pacientes em tratamento de- vem ter uma atenção especial, visto que o tratamento farmacológico pode levar algumas semanas para atingir a resposta máxima. Antidepressivos Tricíclicos (ATC) Os antidepressivos tricíclicos foram inicialmente propostos com função anti-hista- mínica, sedativa, analgésica e fármacos antiparkinsonianos. Devido ao potencial para provocar efeitos colaterais graves, seu uso acabou ficando mais restrito ao tratamento da depressão maior. Também são empregados em alguns tratamentos de insônia e condições dolorosas. Seu mecanismo de ação deve-se ao antagonismo da serotonina e transportadores de serotonina e norepinefrina. Em concentrações terapêuticas, eles não bloqueiam os transportadores de dopamina. Como bloqueiam a principal via de remoção de neurotransmissor, eles causam um aumento na concentração de monoa- minas, resultando no efeito antidepressivo. São exemplos aminas terciárias imipramina (protótipo), clomipramina, amitriptilina, doxepina, timipramina e as aminas secundárias: nortriptilina e desipramina. • Aplicação terapêutica: depressão moderada a grave, distúrbio do pânico, enurese noturna (imipramina), enxaqueca e síndrome de dor crônica (amitriptilina). Também bloqueiam os receptores serotoninérgicos, histamínico, muscarínica e α-adrenérgico. Desconhece-se se essas ações teriam algum papel no efeito tera- pêutico, no entanto, sabe-se que provavelmente esses bloqueios são responsáveis por muitas ações indesejadas; • Os efeitos adversos mais comuns: xerostomia, constipação, retenção urinária, visão borrada, taquicardia, arritmias, náuseas, sonolência ; • Precauções: cuidado com pacientes suicidas, possuem índice terapêutico estreito. Uso com cautela em pacientes maníaco-depressivos. Antidepressivos Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRSs) Inibem de forma potente e seletiva a recaptação de serotonina, aumentando a concen- tração na fenda sináptica e, consequentemente, gerando maior atividade neural pós-sináp- tica. São tão eficazes quanto os antidepressivos tricíclicos, mas com perfil mais tolerável aos 27 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central efeitos colaterais, entre eles, hipotensão ortostática, sedação, xerostomia e visão borrada. Substituíram os antidepressivos tricíclicos e os Inibidores da Monoamina oxidase. São representantes do grupo: fluoxetina (protótipo), citalopram, escitalopram, flu- voxamina, sertralina e paroxetina. O citalopram e a fluoxetina são misturas racêmicas e o escitalopram é o S-enantiômero puro do citalopram. Essa é uma boa oportunidade para lembrar dos conceitos de isomeria da Química Orgânica, o que é racemato e enantiômeros? O tempo de tratamento para benefício máximo pode demorar até doze semanas ou mais. Sua indicação primária é a depressão e vários outros distúrbios psiquiátricos, como distúrbio do pânico, ansiedade generalizada, bulimia nervosa(fluoxetina), entre outros. Os principais efeitos adversos incluem cefaleia, sudoração, ansiedade e agitação, efei- tos gastrintestinais, fraqueza e cansaço, disfunções sexuais, alterações de massa corpo- ral, distúrbios do sono. O uso em crianças e adolescentes deve ocorrer com muita cautela, pois observa-se que em torno de 2% das crianças em uso tornam-se suicidas. Todos os antidepressivos podem reduzir o limiar convulsivo. Podem induzir a Síndrome da serotonina, que pode incluir sinais de hipertermia, rigidez muscular, sudoração, mioclonia, alterações no estado mental e dos sinais vitais quando usado em presença de IMAO ou outro fármaco serotoninérgico. Fármacos com meia-vida menores e metabólitos inativos tèm maior propensão de causar síndrome de interrupção. A fluoxetina tem o menor risco (tempo de meia-vida de 50 horas). Inibidores da Recaptação de Serotonina – Noradrenalina (IRSN) Esse grupo é formado pela venlafaxina e pela duloxetina. Estes constituem alter- nativas terapêuticas aos IRS. Algumas vezes são eficazes no tratamento de alívio da dor neuropática. Possuem pouca atividade entre os receptores adrenérgicos, muscarí- nicos ou histamínico. Possuem menos efeitos adversos mediados por receptores quan- do comparados aos antidepressivos tricíclicos. Deve-se atentar à interrupção brusca do tratamento pois podem apresentar síndrome da interrupção. O mecanismo de ação inclui indução da ativação de autorreceptores de 5-HT1A e 5-HT1D. Essa ação diminui a neurotransmissão serotoninérgica por mecanismo de feedback negativo até que ocorra dessensibilização dos receptores serotoninérgicos. Agora, a concentração aumentada de serotonina na sinapse pode interagir com receptores pós-sinápticos 5-HT. A venlafaxina é um potente inibidor da captação de serotonina e em doses maiores, de médias à altas, inibe a receptação de norepinefrina. Também é um inibidor fraco da captação de dopamina em dosagens elevadas. Em doses elevadas, pode ser observado aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca. A duloxetina é capaz de inibir a captação de serotonina e norepinefrina em todas as dosagens. Sofre intensa metabolização hepática, sendo administrada com cautela em 28 29 pacientes com insuficiência hepática pacientes com doença renal terminal. Também apresenta disfunção sexual, risco de aumento da pressão arterial ou da frequência car- díaca. Além do uso contra depressão e ansiedade, também é aprovada para tratamento da fibromialgia e dor neuropática associada à neuropatia periférica. Inibidores da Degradação da Serotonina A monoamina oxidase (MAO) é uma enzima que participa da oxidação de monoaminas, no neurônio, ela atua desaminando e inativando o excesso de moléculas de neurotransmis- sor que possam vazar das vesículas sinápticas quando o neurônio está em repouso. Substâncias podem inativar essa enzima de forma reversível ou irreversível. Essa inibição faz com que os neurotransmissores se acumulem no neurônio pré-sináptico e passem para o espaço sináptico. A selegilina e a tranilcipromina apresentam efeito estimulante tipo anfetamina. Dessa forma, acredita-se que, devido a esse mecanismo, sejam ativados receptores de norepinefrina e serotonina. Constituem exemplos dessa categoria fenelzina, tranil- cipromina, iproniazida, selegilina. Seu uso exige dietas rigorosas e muita atenção nas possíveis interações medicamentosas. Antidepressivos Atípicos São um grupo misto de fármacos que têm ação em vários locais diferentes.A bupro- piona é um fraco inibidor da captação de dopamina e norepinefrina. Auxilia no combate à compulsão por nicotina, sendo utilizada por pacientes para atenuar os sintomas da abstinência do fumo. Pode apresentar xerostomia, sudoração, nervosismo, entre outros. Em doses mais elevadas, pode induzir convulsões. Antagonistas dos Receptores de Sserotonina Pertencem a esse grupo trazodona e nefazodona, mirtazapina e mianserina. Mianserina (que pode causar depressão da medula óssea) e mirtazapina (que pode levar a aumento do apetite e da massa corporal) são muito sedativas. A mirtazapina e a mianserina bloqueiam os receptores de histamina H1 e possuem afinidade sobre os recep tores α2-adrenérgicos. Têm alta afinidade pelos receptores 5-HT2A, 5-HT2C e 5-HT3. Não se sabe com precisão qual é o receptor responsável pelos seus efeitos. A nefazodona apresenta risco de hepatotoxicidade e a trazodona foi associada ao priapis- mo. São inibidores fracos da captação de serotonina, bloqueiam receptores 5-HT2 pós- -sinápticos. A trazodona também apresenta propriedades bloqueadoras α-adrenérgicas pré-sinápticas fracas a moderadas e atua como antagonista modesto do receptor H1. O antagonismo do receptor 5-HT3 é o mecanismo de drogas usadas para impedir a náusea e o vômito após a cirurgia ou após o uso de drogas citotóxicos. Os exemplos incluem a ondansetrona. O estudo dos agonistas 5-HT1B/1D é utilizado por agentes que aliviam dores de cabeça da enxaqueca, este é o mecanismo dos triptans tal como o sumatriptano. 29 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Estabilizadores de humor: Lítio Os sais de lítio são aprovados para a profilaxia de pacientes maníaco depressivos e nos episódios de mania. Embora vários processos celulares sejam alterados pelo lítio, o seu mecanismo de ação é desconhecido. Seus mecanismos bioquímicos são complexos e as possíveis rela- ções entre esses papeis e seu real mecanismo de ação frente aos casos de tratamento de pacientes com distúrbio bipolar acaba sendo especulativo. Acredita-se que a inibição de algumas enzimas desempenhe esse papel: inibe a inositol monofosfatase, que bloqueia a via fosfatidilinositol; inibição também das isoformas de glicogênio sintase quinase 3. Apresenta baixo índice terapêutico, seu uso exige controle de toxicidade por meio de monitoração da concentração plasmática e função renal e interações medicamento- sas. Pode também interferir na função tireoideana, sendo também recomendado o seu acompanhamento. Não causa efeitos observáveis em indivíduos normais, não é um sedativo, euforizante ou depressor. Fisiopatologia das Convulsões Classes e agentes farmacológicos: fármacos que aumentam a inibição mediada pelos canais de sódio; fármacos que inibem os canais de cálcio; fármacos que aumentam a inibição mediada pelo GABA; fármacos que inibem os receptores de glutamato As convulsões são episódios de duração limitada de disfunção cerebral que resultam da descarga anormal de neurônios cerebrais. As causas das convulsões podem ser bem heterogêneas e incluem uma variedade de doenças. A epilepsia é o segundo transtorno neurológico mais comum depois do acidente vascular encefálico. A epilepsia trata-se de um transtorno complexo caracterizado por convulsões recorrentes. A classificação clínica da epilepsia é feita conforme as características das crises convulsivas. As crises podem ser parciais (localizadas em uma região do cérebro) ou generalizadas (envolvem todo o cérebro). O tipo de crise interfere nos sintomas, por exemplo, nas crises parciais, a despolarização inicia-se localmente e geralmente permanece assim. Os sintomas de- pendem da região envolvida. Nos exames como o EEG, a despolarização está restrita a um hemisfério. Já nas crises generalizadas, envolvem ambos os hemisférios. A perda de consciência imediata é característica das convulsões generalizadas. Existem inúmeros tipos de crises generalizadas, as categorias principais incluem as tônico-clônicas e as de ausência. As convulsões podem ainda ser de origem febril ou como parte de uma doen- ça aguda como a meningite, distúrbio metabólico, tóxico ou agudo. Você conhece o Dia Roxo? Você conhece todos os tipos de convulsões e como proce- der ao presenciar uma crise? Pesquise. 30 31 A seguir, serão apresentados os três principais mecanismos dos fármacos utilizados no tratamento das convulsões: Fármacos que Aumentam a Inibição Mediada pelo GABA Os fármacos eficazes nas formas mais comuns de convulsões epiléticas. A poten- cialização da ativação dos receptores GABAA facilita a abertura dos canais de cloreto mediados pelo GABA. São exemplos desse grupo: fenobarbital e benzodiazepínicos. Com níveis superiores às concentrações terapêuticas, o fenobarbital também reduz as deflagrações repetitivas persistentes. A sedação é o efeito adverso mais frequente, ocorre em praticamente todos os pa- cientes no início do tratamento. Nistagno e a ataxia ocorrem com doses superiores. As concentrações de fenobarbital podem aumentar até 40% durante a administração con- comitante com ácido valproico. Consiste numa droga de baixo custo, eficaz nas crises tônico-clônicas, parciais e ge- neralizadas, mas tem efeito sedativo e tendência a prejudicar o comportamento infantil e não se mostrou eficaz no controle das crises de ausência. Benzodiazepinas são utilizadas no tratamento como sedativos e ansiolíticos. Vários fármacos desse grupo apresentam ação anticonvulsivante ampla, mas apenas o clonaze- pam oral e clorazepato foram aprovados para tratamentos de convulsões a longo prazo. Diazepam e Lorazepam são utilizados no tratamento do estado epiléptico. Aumentam a inibição sináptica mediada pelo GABA. O aumento das secreções salivares e brônquicas pode causar problemas em crianças. A interrupção repentina pode desencadear convul- sões. Os principais efeitos relatados são a sedação e letargia. A tiagabina inibe o transportador de GABA, reduz a captação desse neurotransmis- sor pelos neurônios e pela glia. Seu uso foi associado à ocorrência de convulsões em pacientes sem epilepsia. Seu uso off-label foi interrompido. Você sabe o que é uso off-label? A vigabatrina inibe irreversivelmente a enzima GABA transaminase responsável pela inativação do GABA nos astrócitos e terminas nervosos gabaérgicos. A tiagabina inibe a remoção do GABA das sinapses. Potencializa e prolonga as respostas sinápticas me- diadas pelo GABA no cérebro. Seu uso pode levar à perda visual bilateral progressiva e irreversível, seu uso é limitado. Inibição Mediada pelos Canais de Sódio Muitos fármacos que atuam como antiepiléticos afetam a excitabilidade das membra- nas por ação sobre os canais de sódio dependentes de voltagem que possuem a corrente de entrada necessária para a geração de um potencial de ação. 31 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central A fenitoína tem atividade anticonvulsivante sem causar depressão geral do SNC. Li- mita as deflagrações repetitivas dos potenciais de ação provocados por despolarização persistente dos neurônios da medula espinal mediado pela diminuição da velocidade de recuperação da inativação dos canais de Na+ ativados pela voltagem, efeitos observados em animais e nos seres humanos. Em concentrações terapêuticas, os efeitos nos canais de Na+ são seletivos. Já em concentrações mais altas, observam-se vários efeitos respon- sáveis pelas respostas tóxicas, inclusive. O mais importante mecanismo de ação da fenitoína é a interferência no transporte de sódio através da membrana neuronal. Acredita-se que o maior efeito antiepiléptico da fenitoína venha de sua capacidade em bloquear o recrutamento de células neuronais vizinhas do foco epiléptico, evitando a propagação das descargas. Outras indicações da fenitoína incluem neuralgias, como a do trigêmeo e arritmias cardíacas. A carbamazepina produz resposta em pacientes maníaco-depressivos e apresenta efei- tos antidiuréticos. Seu metabólito também reduz deflagrações repetitivas, o 10,11-epo-xicarbamazepina, em concentrações terapêuticas relevantes. A frequência das crises pode aumentar principalmente quando ocorre overdose. Durante seu uso é importante monitorar a função renal, hepática e os fatores hematológicos. Deve-se ficar atento às interações com fenobarbital, fenitína e valproato, que podem aumentar o seu metabo- lismo por indução da CYP3A4; a carbamazepina pode aumentar a biotransformação da fenitoína e a administração conjunta pode reduzir as concentrações de valproato, lamitrigina, tiagabina e topiramato. Reduz também o efeito terapêutico e concentração plasmática do haloperidol. Por apresentar inúmeras outras possíveis interações, antes de seu uso, sugere-se importante verificação das mesmas caso a caso. Também pode ser útil no tratamento da neuralgia do trigêmeo e transtornos afeti- vos bipolares. Foram sugeridos vários mecanismos de ação para a carbamazepina. No entanto, dois mecanismos básicos são importantes: alteração da condutância dos canais de sódio neuronais, reduzindo os potenciais de ação de alta freqüência; e a ação na transmissão sináptica e em receptores para neurotransmissores, incluindo purinas, monoaminas, acetilcolina e NMDA. Oxcarbamazepina é um pró-fármaco com mecanismo semelhante à carbamazepina, mas trata-se de um indutor enzimático menos potente. Como induz a CYP3A, reduz os níveis plasmáticos dos anticoncepcionais orais esteroides. A lamotrigina também atua sobre os canais de Na+, no entanto, seu uso em demais dis- túrbios convulsivos sugere outras ações, ainda desconhecidas. Ela inibe a despolarização da membrana pré-sináptica glutamatérgica, levando a uma inibição da liberação do glutamato. O topiramato consiste numa molécula multifacetada, além de ter seu uso aprovado na profilaxia da enxaqueca em adultos. Seu mecanismo de ação no controle de crises convulsivas deve-se à redução nas correntes de Na+ regulados por voltagem nas células granulosos cerebelares e pode atuar no estado inativo deste canal de forma semelhante à fenitoína. Também ativa uma corrente de K+ hiperpolarizante, aumenta as correntes no receptor GABAA pós-sináptico e limita a ativação dos subtipos AMPA-cainato de re- ceptores de glutamato. É um inibidor fraco da anidrase carbônica. Seu uso geralmente é bem tolerado, foi associado à deficiência cognitiva. Devido a seus múltiplos mecanismos de ação com função neuroestabilizadora, muitos de seus efeitos farmacológicos ainda estão sendo estudados. 32 33 Fármacos que atuam sobre os canais de Ca+2 Inibição dos canais de cálcio ativados por voltagem que são responsáveis pelas corren- tes de cálcio do tipo T. A etossuximida é um fármaco para tratamento das crises de au- sência. Reduz as correntes de Ca+2 de limiar baixo nos neurônios talâmicos. Esse fármaco atua sobre as crises de ausência, mas não apresenta ação sobre as crises tônico-clônicas. O ácido valproico produz efeitos semelhantes à fenitoína e à etossuximida. Sua ação é semelhante à da fenitoína e da carbamazepina e parece ser mediada pela recupera- ção prolongada da inativação dos canais de sódio regulados por voltagem, também produz reduções discretas de correntes de Ca+2 do tipo T, mas em concentrações um pouco mais altas. Esse mecanismo conjunto faz com que o ácido valproico seja eficaz na inibição das convulsões em vários modelos. O valproato também aumenta a quanti- dade do GABA, no entanto, esse mecanismo ainda não foi elucidado. Há evidências de que poderia influenciar os sistemas de neurotransmissores excitatórios (subtipo NMDA de receptores de glutamato), monoaminas, catecolaminas e nucleotídeos cíclicos. Uma complicação rara é a hepatite fulminante que frequentemente é fatal. Inibe o metabolis- mo dos fármacos que são substratos do CYP2C9, inibe UGT (uridina-difosfato-glicuro- nosiltransferase). É um anticonvulsivante de amplo espectro. Outros Fármacos Gabapentina e pregabalina possuem estruturas químicas derivadas do GABA, por sua ligação com um anel cicloexano ou isobutano. A gabapentia foi desenvolvida como um agonista do GABA de ação central. No entanto, ainda não está claro a que se devem seus efeitos anticonvulsivantes e analgésicos. É importante salientar que existem inúmeras pesquisas para a compreensão dos mecanismos envolvidos nas crises convulsivas. Novas drogas promissoras, inclusive com avaliação de substâncias canabinóides, despertam interesse, no entanto, sua aplicação clínica ainda necessita de cautela até que todos os riscos potenciais sejam investigados e minimizados em formulações terapêuticas adequadas. 33 UNIDADE Farmacologia do Sistema Nervoso Central Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Farmacologia Básica e Clínica KATZUNG, B. G.; MASTERS, S. B.; TREVOR, A. J. Farmacologia Básica e Clínica. 12ª edição. Rio de Janeiro: McGraw-Hill, 2014. Princípios de bioquímica de Lehninger NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011. Farmacologia SILVA, PENILDON. Farmacologia. 8 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. Farmacologia ilustrada WHALEN, K.; FINKEL, R.; PANAVELIL, T. A. Farmacologia ilustrada. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016. 34 35 Referências BRUCKI, S. M. D. et al . Cannabinoids in neurology – Brazilian Academy of Neurology. Arq. Neuro-Psiquiatr., São Paulo , v. 73, n. 4, p. 371-374, Apr. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004- -282X2015000400371&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 18/05/2021. BRUNTON, L. L; CHABNER. B. A; KNOLLMANN. B. C. As Bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman & Gilman. 12° Ed. Porto Alegre: McGraw-Hill, Artmed, 2012. KARAPINAR, E. et al. A depressão é o principal determinante das anormalidades do sono em pacientes com epilepsia. Arq. Neuro-Psiquiatr. São Paulo, v. 78, n. 12, pág. 772-777, dezembro de 2020. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0004-282X2020001200772&lng=en&nrm=iso>. Aces- so em: 18/05/2021. Epub 14 de dezembro de 2020. RANG, H. P; DALE, M. M. Farmacologia. 8 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. RIGO, A. P.; LEVANDOVSKI, R. M.; TSCHIEDEL, B. Protocolo Clínico do Ministério da Saúde/Brasil para Doença de Parkinson: adesão e percepção do médico prescritor. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 26, n. 1, p. 197-208, Jan. 2021. Disponível em: <http:// www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232021000100197&lng=en &nrm=iso>. Acesso em: 18/05/2021. Epub Jan 25, 2021. 35
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