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COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA Me. Paula Denari GUIA DA DISCIPLINA 2022 1 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 1. AS PESQUISAS EM COMUNICAÇÃO Objetivo Diferenciar o conceito de comunicação a partir das pesquisas da área Uma maneira convincente para descrever um ato de comunicação consiste em responder às seguintes perguntas: Quem Diz o quê Em que canal Para quem Com que efeito [N. R. Santee] Introdução Antes de falarmos sobre a Semiótica, a ciência foco de nossa disciplina, comecemos por falar sobre seu maior objeto de estudo: o processo de comunicação. Grande parte dos estudos semióticos surgem a partir do ato comunicativo. Então, vamos entender o que seria essa comunicação. A comunicação representa um dos fenômenos mais importantes da espécie humana. `Para compreendê-la é preciso, algumas vezes, voltar no tempo, buscar as origens da palavra e as pesquisas que se modificaram ao longo da história. Definir comunicação não é uma tarefa simples, podemos pensar na etimologia da palavra ou no seu significado dicionarizado, porém podemos estudar o processo comunicativo sob a luz da sociologia, linguística e até da psicologia. Na internet, a definição de comunicação é ação de transmitir uma mensagem e, eventualmente, receber outra mensagem como resposta1. Observamos que o sentido desse substantivo está ligado a ação, algo que normalmente se relaciona aos verbos. O teórico da comunicação Klaus Merten identificou 160 definições possíveis ao termo. Diante da complexidade desse termo, não vamos nos preocupar aqui em definir comunicação, é mais importante compreendê-la por meio das inúmeras pesquisas acadêmicas na área. 1 h t tps : / /www.dic io .com.br / 2 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Há vertentes acadêmicas que veem o estudo da comunicação abrangendo todo ato social comunicativo. Há os que o relacionam com as mídias e há, ainda, os que enxergam o ato como um processo socio-histórico. Para nós, nesse momento, interessa pensar no processo comunicativo. E, para que ele ocorra, é preciso que existam duas entidades e um meio de conexão entre ambas. Ou seja, é necessário a tríade EMISSOR – MENSAGEM – RECEPTOR. ‘ Antes de se chegar a esse esquema, um longo caminho foi trilhado nas pesquisas. Vamos estudar as principais: 1.1. Teoria Hipodérmica da Comunicação A Teoria Hipodérmica da Comunicação foi baseada principalmente em uma teoria da ação elaborada pela psicologia comportamentalista (também chamada de behaviorista). Essa teoria é estudada mais profundamente na disciplina Psicologia da Educação. De maneira geral, a psicologia comportamentalista lançada por J. B. Watson, em 1913, tinha como objetivo teórico prever e controlar o comportamento. Para ele, cada comportamento, seja humano ou animal, é disparado por um estímulo, de maneira direta. Assim, temos: E → R (Estímulo → Resposta). Segundo os pensamentos de Watson, o objetivo final do comportamentalismo é ser capaz de prever uma resposta conhecendo o estímulo ou vice-versa. O comportamento humano, assim, pode ser eficazmente previsto e controlado. 3 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Este pensamento foi estendido para o estudo da comunicação, no qual se acreditava que, mediante o estímulo correto, qualquer audiência poderia ser levada a uma resposta planejada. 1.2. Teoria Informacional da Comunicação A partir de uma base teórica que previa a comunicação a partir de um controle comportamental, Claude Shannon e Warren Weaver, ambos engenheiros de uma empresa de telefone, formularam o modelo teórico-matemático da comunicação, que acabou se tornando um dos mais influentes na pesquisa em comunicação. Era uma teoria de extrema simplicidade, aplicabilidade e fácil compreensão, sendo esses uns dos motivos de seu sucesso. Neste modelo, uma fonte de informação envia uma mensagem que é codificada por um transmissor, transmitida por um canal, descodificada por um receptor, recuperando a mensagem original que é recebida pelo destinatário. No meio do caminho o sinal pode ser afetado por uma fonte de ruído, que distorce e atrapalha o entendimento correto da mensagem. Por ser um modelo da engenharia da comunicação, ele pressupõe uma comunicação meramente transmissora, como no modelo da Teoria Hipodérmica. Uma das maiores inovações conquistadas por este modelo foi a inclusão do ruído no processo de comunicação, o reconhecimento de algo que possa atrapalhar a mensagem. Este modelo também trouxe um conceito que foi muito adotado posteriormente: o código. No modelo de Shannon e Weaver, o significado do que é transmitido pouco importa. Em 1960, David King Berlo tentou adicionar a esse modelo uma dimensão sociológica. Ele reconhece que o emissor é aquele que possui algum conhecimento – 4 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância enviado pela mensagem –, mas o receptor necessita fazer algum reconhecimento. Ele afirma que o quadro sociocultural deve ser partilhado por ambos. Wilbur Schramm também retomou o modelo de Shannon e Weaver, mas excluiu o transmissor e o receptor, considerando o emissor = fonte de informação + transmissor e destinatário = receptor + destinatário. Os ruídos, que antes eram somente físicos, passam a ser entendidos como semânticos também, como por exemplo, uma palavra inapropriada ou desconhecida. Ele também trouxe a questão de interação no processo comunicativo. 1.3. Estruturalismo O estruturalismo opera no sentido de descobrir as estruturas que sustentam todas as coisas que os seres humanos fazem, pensam, percebem e sentem. O principal teórico foi Saussure, cujo pensamento ainda é a base da Linguística. Para o linguista suíço, a língua é uma ‘instituição social’, enquanto a palavra é um ato individual. Enquanto instituição social, a língua é um sistema organizado de signos que exprimem ideias. Saussure volta sua atenção principalmente aos aspectos pragmáticos da língua, e seu uso enquanto atividade social. Finalmente, chegamos ao Funcionalismo e as teorias de Roman Jakobson. Para essa teoria, no entanto, precisaremos de um capítulo inteiro, já que essa será nossa base de estudo, estudaremos esse ponto no próximo capítulo. Apesar das inúmeras variações que ocorrerem ao longo do tempo e das muitas críticas, é difícil imaginar qualquer estudo na área que não englobem os termos abaixo. 5 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Nosso objetivo não é decorar todas as teorias sobre a comunicação, mas entender sua evolução e perceber a comunicação como a relação entre dois entes. É importante deixar essa opção clara já que há outros inúmeros estudos que veem o processo além da questão humana e entendem que há comunicação em toda troca de calor, de força ou de energia entre objetos. Há, ainda, os estudos químicos e também os biológicos. Afinal, você não acharia absurdo dizer que há comunicação celular. Atualmente, também falamos muito da comunicação entre as máquinas, mas esses são estudos complexos e específicos que não nos cabe nesse momento. Pensamos sempre na comunicação humana, que pressupõe um diálogo, em que os papeis de emissor e receptor se alternam no processo conversacional. Apesar de a comunicação nem sempre ser simétrica, com falantes em igualdade de direitos, ainda em situações assimétricas, há possibilidades de alternância nos papeis. Também não podemos pensar que, em uma palestra, os ouvintes não produzam mensagem. O simples bocejar diante de uma fala monótona, comunica bastante ao palestrante. Por outro lado, a interação entre dois organismos é assimétrica e reversível em alguns casos bemespecíficos. Você já conversou com seu cachorro ou com uma planta? E se estamos falando em comunicação, podemos pensar também nos meios de comunicação. Nós vimos que Shannon & Weaver foram os primeiros que conceituaram a expressão canal de comunicação. Segundo eles, este seria um meio físico ou técnico de transmissão. Estudos posteriores romperam com essa questão física e, a partir do conceito 6 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância de mídia de massa (mass media), o sentido de meio (canal) passou a significar meio de comunicação massiva, ou seja, rádio, cinema, televisão etc. De lá pra cá, esses estudos muitas vezes corroboram essa perspectiva, outras vezes a refutaram. No Brasil, há ainda a falta de discussão sobre a enorme complexidade do funcionamento das mídias. Para Sodré (2002) “sempre existiram recursos ou meios de comunicação, mas a ‘mídia’, tal como a definimos, é dispositivo recente [...] é preciso salientar que diversas abordagens teóricas vêm incorrendo no engano fundamental de confundir a realidade midiática com a realidade sócio histórica” SANTEEA, Nellie Rego. A Linguística de Roman Jakobson: Contribuições para o Estudo da Comunicação. Londrina: UNOPAR, 2011. SODRÉ, Muniz. Televisão E Psicanálise. São Paulo: Ática, 2002 Comunicação Humana – Zigmunt Baumman por Leandro Karnal Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=mjiTr6cXmCo 7 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 2. A TEORIA DA COMUNICAÇÃO DE ROMAN JAKOBSON Objetivo Conhecer e compreender as funções da linguagem propostas por Jakobson “A poesia é linguagem em sua função estética. Deste modo, o objeto do estudo literário não é a literatura, mas a literaridade, isto é, aquilo que torna determinada obra uma obra literária” (R. Jakobson) Introdução A forma de a linguagem transmitir ideias de maneira coerente tanto ao emissor quanto ao receptor fascinou filósofos, linguistas e psicólogos. Uma das mais célebres teorias da comunicação foi proposta pelo linguista Roman Jakobson (1896-1982). Coube a ele desenvolver uma teoria e método de crítica literária para narrativas e poesia conhecido como formalismo. Em 1929, por ocasião do Primeiro Congresso Internacional de Slavistas em Praga foi divulgado o grupo do Círculo Linguístico de Praga. Muitas ideias que eram discutidas no Formalismo Russo foram aprimoradas e desenvolvidas. A principal característica do Círculo de Praga é a combinação do estruturalismo com o funcionalismo, sendo sua ideia geral a de que a estrutura das línguas é determinada por suas funções, conceito muito trabalhado por Jakobson. Roman Jakobson tem uma vasta e extremamente diversa área de estudo. Este capítulo focará em sua pesquisa relacionada com a área da comunicação, exatamente sobre as funções das unidades linguísticas ou, como são mais conhecidas, as funções da linguagem. O linguista buscava compreender a finalidade com que a língua é utilizada, ou seja, a sua função na comunicação estabelecida entre o remetente (falante/codificador) e o destinatário (ouvinte/decodificador). Seu principal objetivo era definir o lugar da função poética em relação às demais funções da linguagem. O formalismo russo, que deu início ao pensamento de Jakobson acerca da linguagem, voltava sua atenção para a substancialidade da arte escrita, tanto poesia quanto literatura. Interessava ao grupo investigar quais elementos formais tornavam um texto artístico. Por se oporem completamente ao estudo da literatura partindo da historicidade e biografia do autor, foram depreciativamente apelidados de formalistas pelos que apoiavam o sociologismo no campo dos estudos literários. 8 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Para Jakobson, qualquer dado ato de comunicação verbal é composto de seis fatores: EMISSOR: orador, narrador, autor. RECEPTOR: ouvinte, leitor, telespectador, usuário, destinatário. CÓDIGO: o sistema linguístico ou comunicativo, um conjunto de signos e regras linguísticos. MENSAGEM: texto, discurso, o conteúdo, o que está sendo dito. CONTEXTO: o referente, a situação. CANAL DE COMUNICAÇÃO: o contato ou conexão psicológica ou física. Além desses fatores, há RUÍDO, ou seja, qualquer coisa que interfira na comunicação. Esses fatores ou elementos exercem seis funções: FUNÇÃO REFERENCIAL OU DENOTATIVA: foco no referente, objeto ou situação da mensagem trata, com informações objetiva. Típicos de textos descritivos, científicos e jornalísticos. FUNÇÃO EMOTIVA OU EXPRESSIVA: foco no emissor com suas emoções e opiniões. Típico de frases de interjeições e poesias subjetivas. FUNÇÃO CONATIVA OU APELATIVA: foco no receptor com objetivo de persuadi- lo. Típico de mensagens publicitárias. FUNÇÃO FÁTICA: foco no canal. Visa estabelecer contato entre os sujeitos. Um exemplo é uma saudação entre duas pessoas que se encontraram. FUNÇÃO METALINGUÍSTICA: foco no código, ou seja, na própria linguagem. Típico de dicionários e gramáticas. FUNÇÃO POÉTICA: foco na mensagem. Típico de obras literárias e publicitárias. Estabelecendo a relação entre os fatores e as funções da linguagem temos: 9 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância [https://ensaiosenotas.com/2014/11/16/funcoes-da-linguagem-e-a-construcao-do-sentido-para-jakobson/] Vale ressaltar que uma mensagem apresenta mais de uma função da linguagem, sendo que uma prevalece e as demais são secundárias. A mensagem organiza-se tendo como referência a função predominante. Nas palavras do teórico, Embora distingamos seis aspectos básicos da linguagem, dificilmente lograríamos, contudo, encontrar mensagens verbais que preenchessem uma única função. A diversidade reside não no monopólio de alguma dessas diversas funções, mas numa diferente ordem hierárquica de funções. A estrutura verbal de uma mensagem depende basicamente da função predominante (JAKOBON, 2010, p. 157). Vamos entender mais detalhadamente cada uma dessas funções. 2.1. Função referencial Quando a mensagem tiver o foco no contexto, haverá a Função Referencial, ou denotativa, cognitiva... A Função Referencial é a linguagem que reflete o mundo com mensagens claras e sem ambiguidade. Linguisticamente se caracteriza pela 3ª pessoa do verbo, de quem ou do que se fala. Encontramos a Função Referencial nos noticiários de rádio e televisão, definindo a estrutura da mensagem como o mais objetiva possível. Abaixo um exemplo de linguagem referencial. 10 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância [Folha de S. Paulo, 30 de nov de 2018] 2.2. Função emotiva Toda mensagem centrada no remetente possui uma Função Emotiva (ou expressiva). Ela visa a uma expressão direta de quem fala, suscita certa emoção, verdadeira ou simulada (JAKOBSON, 2008). Linguisticamente ela é marcada pela 1ª pessoa, por interjeições, adjetivos, advérbios e sinais de pontuação. O poema abaixo de Alberto Caeiro (Fernando Pessoa) exemplifica bem essa função. Observe como ele é construído a partir do EU. 11 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 2.3. Função Conativa ou Apelativa Na mensagem orientada para o destinatário existe a Função Conativa. Linguisticamente, ela é caracterizada por frases no vocativo e imperativo, dando ordens ou conselhos ao destinatário, e pela 2ª pessoa do verbo. Há a intenção de convencer o destinatário de algo, a mensagem carregará argumentos para a persuasão, utilizados especialmente na linguagem da propaganda. Abaixo um exemplo de Função Conativa. 12 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília- Educação a Distância 2.4. Função Fática A função fática tem mensagens orientadas para o canal utilizadas para prolongar ou interromper a comunicação, verificando se o canal funciona. Ela atrai a atenção do interlocutor e procura confirmar sua atenção continuamente. Nos meios de comunicação de massa, a Função Fática está continuamente presente, principalmente na mídia televisiva, pela rapidez dos cortes e curta duração das matérias, que busca sempre manter a atenção do telespectador, mesmo durante os intervalos comerciais. Garfield com muito humor nos mostra um exemplo de função fática. 2.5. Função Metalinguística A Função Metalinguística acontece sempre que o discurso tem necessidade de verificar se o remetente e destinatário estão usando o mesmo código, retornando a ele. A função metalinguística da linguagem ocorre quando o código comunicativo é utilizado para explicar o próprio código comunicativo. Tem, assim, uma função explicativa. A função metalinguística está presente em dicionários, gramáticas e aulas de línguas, mas também em qualquer conversa em que haja a explicação de um conceito, em qualquer assunto que seja explicado pelas próprias palavras do emissor, em qualquer poesia que fale sobre a poesia, em qualquer filme que ensine a fazer filmes etc. 13 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 2.6. Função Poética Para Jakobson (2008), o estudo da poesia inclui reconhecer que Função Poética é a predominante na estrutura de sua construção, sendo que todas as outras funções ficam subordinadas a ela. Na Função Poética, a mensagem está voltada para si mesma, suas características físicas, sonoras e visuais no seu modo peculiar de mostrar-se. Vale relembrar que muitas dos exemplos que demos possuem mais de uma função, é importante perceber a mais evidente delas. JAKOBSON, Roman. Linguística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 2007 SANTEEA, Nellie Rego. A Linguística de Roman Jakobson: Contribuições para o Estudo da Comunicação. Londrina: UNOPAR, 2011. WINCH, Paula Gaida & NASCIMENTO, Silvana Schwab. A teoria da comunicação de Jakobson: suas marcas no ensino de Língua Portuguesa. In Revista Estudos da Linguagem – volume 10 – n. 02. Vitória da Conquista, 2012 Funções da linguagem e a construção do sentido para Jakobson - https://ensaiosenotas.com/2014/11/16/funcoes-da-linguagem-e-a- construcao-do-sentido-para-jakobson/ 14 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 3. SEMIÓTICA – CIÊNCIA E HISTÓRIA Objetivo Compreender os aspectos que definem a Semiótica como ciência e conhecer a trajetória de estudo. Introdução O século XX viu nascer duas ciências da linguagem. Uma delas é a Linguística ciência da linguagem verbal. A outra é a Semiótica, ciência de toda e qualquer linguagem. No entanto, a semiótica propriamente dita tem seu início com filósofos como John Locke. Alguns atribuem sua origem a Platão. O fato é que Locke desenvolveu uma doutrina dos signos que englobava todas as investigações sobre a natureza dos signos, da significação e da comunicação. A semiótica propriamente dita encontra seus percursores na Medicina. Tanto que essa relação ainda se encontra nos dicionários. Como Teoria dos Signos, a semiótica recebeu outros nomes, sendo o principal: semiologia. Atualmente, semiologia refere-se aos estudos de Saussure e seus seguidores. Alguns autores postulam diferenças entre os termos, as quais não são relevantes nesse momento. Definir Semiótica não é uma tarefa simples. Uma definição comum seria: semiótica é a ciência dos signos e dos processos significativos (semiose) na natureza e na cultura. Se a definição por si, não resolve o problema do entendimento da área, ela também não é aceita por todos os estudiosos. 3.1. Um pouco de etimologia Poderíamos começar esse panorama em Platão, já que o filósofo tratou de vários aspectos da teoria dos signos. No entanto, o tema ficaria por demais extenso e não é esse nosso objetivo. Vamos nos concentrar na semiótica a partir dos séculos XVII. A Semiótica teve três origens ou sementes lançadas quase simultaneamente: uma nos EUA, outra na União Soviética e a terceira na Europa Ocidental. Esse surgimento em 15 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância lugares diferentes, mas quase ao mesmo tempo, pode ser explicada pela proliferação crescente das linguagens e códigos a partir da Revolução Industrial. Essa consciência sobre a linguagem gerou a necessidade do aparecimento de uma ciência que questionasse o universo multiforme e diversificado dos fenômenos de linguagem. Se maneira geral, a Semiótica é uma das ciências humanas e sociais que, se define “como a Ciência da Significação”, cujo objeto de estudo são os sistemas semióticos (verbais, não verbais). A palavra semiótica (originalmente semeiótica) vem do grego antigo, onde seméion significa “signo”. Desde o século XVIII, semiótica e semiologia (ou semeiologia) eram termos alternativos para a mesma ciência dos signos em várias línguas europeias. Dos dois termos, o termo semiologia predominava na semiótica dos países de língua romana, especialmente na França. Hoje, a palavra semiótica entrou em uso mais comum. No entanto, é importante ressaltar que para alguns teóricos os termos apresentam distinções bem evidentes. Para Greimas, por exemplo, semiótica é um sistema de signos em estruturas hierárquicas análogas à linguagem. Já a semiologia seria uma teoria geral que trataria dos aspectos comuns a todos os sistemas semióticos. Passemos agora da etimologia à história da ciência 3.2. Um pouco de história Se formos analisar a teoria dos signos verbais e não-verbais, a história da Semiótica começaria (se é que podemos precisar um começo) em Platão. O filósofo definiu signo verbal, significação e contribuiu com ideias críticas para a teoria da escritura. O modelo platônico era composto por nome, ideia e a coisa a qual o signo se refere. Aristóteles traçou uma definição entre signo incerto e signo certo e discutiu a teoria dos signos no âmbito da lógica e da retórica. Os estóicos, epicurista e Santo Agostinho também formularam suas definições sobre sino linguístico. Na Idade Média, a semiótica desenvolveu-se no âmbito da teologia e posteriormente, da lógica. Já nos séculos XVII muitas ideias de interesse para o futuro da semiótica se desenvolveram sob a luz do racionalismo francês e do empirismo britânico. Os gramáticos de Port Royale seguiram o caminho trilhado por Aristóteles. Descartes, com a teoria das idéias inatas, priorizou o intelecto sobre a experiência. 16 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância No século XIX, a biologia tornou-se o modelo de todas as ciências. A concepção darwiniana sobre a origem das espécies foi estendida às línguas, permitindo distinguir línguas mortas e vivas (teoria bastante criticada posteriormente). Estudo revelaram as a diferença entre signo e símbolo e Humboltdt estabeleceu a relação entre a substância e forma; com sistema e uso da linguagem. O final do século XIX e início do XX fizeram surgir dois vultos de grande valor na discussão sobre o signo: Charles Sanders Peirce (a quem dedicaremos o próximo capítulo), ainda no âmbito dos estudos filosóficos e Ferdinand Saussure, o pai da lingüística científica. O contributo de Peirce se faz sentir, sobretudo, em três aspectos: na definição de signo, na definição da semiose e na visão pansemiótica do mundo. Pierce concebeu o signo de forma triádica (como muitos o fizeram desde Platão), só que constituído de um elemento perceptível ao receptor. A interpretação do signo é um processo dinâmico na mente do receptor: cada signo gera um interpretante que,por sua vez, funciona como representamen de um novo signo. A semiótica deixa de ser o estudo do signo para sê-lo da semiose, definida como o processo durante o qual o signo atua sobre o interpretante, isto é, o processo de interpretação do signo pelo interpretante e sem o qual aquele não existiria. Falaremos mais adiante sobre a essa teoria. Não se assuste se não a compreendeu completamente. Saussure, considerado o pai da Lingüística científica, exerceu grande papel no desenvolvimento do estruturalismo que concebeu a língua como um todo cujas partes, solidárias e interdependentes, exercem uma função em relação ao todo. Cada elemento só tem valor em oposição a outro. Retomou a concepção diádica de signo dos antigos, propondo para ele uma dupla face: o Significado que seria o conceito e o Significante, a imagem acústica. Esta “não é o som material, coisa puramente física, mas a impressão psíquica desse som” (utilizando-se a expressão do autor). O termo Semiologia passou a ser adotado pelos lingüistas da linha saussureana (sobretudo os latinos) para designar a mesma ciência que ingleses e alemães conceberam com o nome de Semiótica. Começou-se, então, a pensar numa diferença entre as duas ciências. Uma das propostas seria considerar a Semiótica como ciência geral dos signos, incluindo os verbais e não-verbais, ao passo que Semiologia serviria, unicamente, para os 17 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância signos humanos, culturais e sobretudo os textuais. Esta distinção foi oficializada pela Associação Internacional de Semiótica, em 1969. Dessa forma, a lingüística seria um ramo da semiótica. Foi, no entanto, o lingüista dinamarquês Louis Hjelmslev que, reinterpretando o pensamento saussureano, permitiu a outros o estabelecimento dos limites da Semiótica em oposição à Semiologia. Esta seria o estudo do signo, enquanto que Semiótica seria o estudo da significação, entendida como a função semiótica e somente perceptível no interior de um sistema de signos, verbais, não- verbais e compósitos ou sincréticos. Como ciência da significação, a Semiótica passa a ser confundida não mais com a Semiologia e sim com a Semântica. Quando falamos em Semiótica, não poderíamos deixar de abordar os trabalhos de Greimás. Algirdas Julien Greimas foi um linguista lituano de origem russa que contribuiu para a teoria da semiótica e da narratologia. De 1965 em frente, encabeçou a pesquisa semiótico-linguística em Paris, estabelecendo as fundações da Escola de Semiótica de Paris. Esse grupo ampliou o campo da semiótica à descrição dos sistemas não lingüísticos, reformulou a idéia saussureana de sincronia/diacronia e ainda apresentou propostas para o estudo dos níveis de estudos semióticos. Greimas estudou a relação entre o plano de expressão e o plano de conteúdo através do texto, o foco não é o signo em si, mas as relações através dele e de todas as formas de linguagem. Segundo afirmação de Greimas, o signo é: “ a parte material, visível, de uma realidade espiritual mais vasta, invisível. ” (1978: 215). O pós-estruturalismo proposto por Greimás é bastante complexo e seria impossível os estudos em apenas alguns parágrafos. Entre os discípulos de Pottier e Greimas, encontrase o brasileiro Cidmar Teodoro Pais, cujos trabalhos dão uma visão ampla do que seja a ciência semiótica na atualidade. Nos próximos capítulos, vamos nos desbubraçar sobre a teoria de Peirce e os conceitos de signo linguístico. BATISTA, Maria de Fátima B. de M. A SEMIÓTICA: CAMINHAR HISTÓRICO E PERSPECTIVAS ATUAIS. Rev. de Letras - N0 60 . 25 - Vol. 1/2 - jan/dez. 2003 Winfried Noth. Panorama da Semiótica de Platão a Peirce.: Annablume 18 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 4. A SEMIÓTICA DE SAUSSURE E PIERCE Objetivo: Apresentar um pouco da biografia de Charles Peirce e Ferdinand Saussure bem como sua teoria na área da Semiótica Introdução: Ferdinand de Saussure (1857-1913) era natural de Genebra na Suíça. Aos 24 anos, defendeu sua tese de doutorado. Em 1891 passa a atuar como professor na Universidade de Genebra e entre os anos de 1907 e 1911 ministra cursos sobre linguística geral que lhe renderiam a fama póstuma. Em 1913, aos 55 anos de idade, Saussure morre prematuramente. Seu Curso de Linguística Geral contempla, além das considerações sobre a linguística, dados pertinentes relativos à semiologia e os signos. A semiologia enquanto ciência ainda não existia, e que em virtude disso, provavelmente ele desconhecia outros estudos relacionados aos signos que já tinham sido desenvolvidos desde Platão até Peirce. Essa nova ciência, a semiologia, tinha lugar predeterminado no ramo das ciências humanas, mais precisamente no campo da psicologia social e a linguística era uma parte da semiologia. Charles Sanders Peirce é, sem dúvida, o mais importante dos fundadores da moderna semiótica geral. Ele era matemático, físico, astrônomo. Era ainda um estudioso da Biologia e da Geologia. No entanto, não estudou apenas as ciências exatas e naturais. Ele se devotou particularmente à Linguística e conhecia mais de uma dezena de línguas. Conhecedor profundo de Literatura, fez elaborados estudos de dicção poética. Peirce deu importantes contribuições para a filosofia, para a matemática e para a lógica. Mas foi principalmente para esta última que a maior parte de seus estudos se voltou. Sua teoria geral dos signos, ou semiótica, foi desenvolvida como uma tentativa de descobrir a lógica que fundamenta as nossas concepções do real e como o conhecimento cresce a partir do compartilhamento e debate de opiniões no interior de uma comunidade. O filósofo investigava a relação entre objetos e o pensamento. Em sua perspectiva seria impossível compreender objetos externos ao sujeito de forma acurada e de maneira universalmente aceitas entre diferente sujeitos. Essas críticas epistemológicas 19 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância remontam de Locke, Hume e Kant, para quem um mero empirismo ou um racionalismo isolado não seria capaz de compreender a realidade. Peirce aproveitou o conhecimento e reflexões adquiridos em sua formação como físico e matemático para formular sua teoria da semiótica, o estudo dos signos. 4.1. Uma visão da teoria de Saussure Em sua teoria sígnica, embora Saussure tenha se debruçado sobre a natureza dos signos linguísticos, o modelo elaborado por ele também foi transferido para signos não linguísticos. Os principais fundamentos da teoria do signo são “[...] sua estrutura bilateral, sua concepção mentalista, a exclusão da referência e a concepção estrutural da significação” (NÖTH, 1996, p. 28). Outro fundamento consistia na arbitrariedade do signo linguístico. Por meio das características acima citadas, a teoria de Saussure passa a ser oposta a modelos unilaterais e triádicos, como a teoria de Peirce, por exemplo. A estrutura bilateral ou diádica do signo faz referência aos seus constituintes: significante (imagem acústica) e significado (conceito). O significado é a expressão material do signo, como o som da palavra ou a imagem da palavra escrita no papel. O significante é a imagem acústica que é projetada na mente quando o indivíduo está em contato com o significado. Para Saussure, “o signo linguístico é fruto da associação entre uma imagem acústica – o chamado significante – e um conceito – chamado significado”. 4.2. Uma visão da teoria de Pierce Neste capítulo, nossa ideia é mostrar superficialmente as teorias propostas por Peirce já que iremos abordar o conceito de signo linguístico no capítulo seguinte. Para Peirce, o conhecimento, as ideias e até o homem são essencialmente entidades semióticas. “O fato de que toda ideia é um signo junto ao fato de que a vida éuma série de ideias prova que o homem é um signo”. Essa interpretação semiótica do homem e do conhecimento fica ainda mais evidente no seguinte trecho: O homem denota qualquer objeto de sua atenção num momento dado. Conota o que conhece ou sente sobre o objeto e é também a encarnação desta forma ou espécie inteligível; o seu interpretante é a memória futura dessa cognição, o seu “eu” futuro ou uma outra pessoa à qual se dirige ou uma frase que escreve, ou um filho que tem”. 20 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância De uma maneira bastante simplista, poderíamos dizer, portanto, que o homem apreende qualquer objeto e o evoca aquilo que já conhece ou sente daquele objeto a partir de seus conhecimentos prévios. Ao fazer essa interpretação ele cria um novo conhecimento, uma memória futura e ele também é outro a partir dessa experiência. De uma outra forma, Peirce compreende como signo ou representação qualquer coisa que esteja em qualquer relação com outra coisa. Surge numa determinada pessoa e dirige-se a uma outra, em cujo espírito cria um signo equivalente ou até mais desenvolvido. O signo criado é "interpretante" do primeiro. E assim sucessivamente. Para o teórico, o mundo inteiro está permeado de signos, mais ainda, o mundo se compõe exclusivamente de signos linguísticos. Nessa visão, a semiótica abarcaria uma universalidade em todas as ciências que também são signos. O homem, segundo Pierce, significa tudo que o cerca numa concepção triádica (primeiridade, secundidade e terceiridade). Nestes pilares que sua teoria se baseia. Primeiridade é a categoria do sentimento imediato, sem nenhuma relação com outros fenômenos, “aquilo que é tal como é, sem referência a outra coisa qualquer.” Secundidade começa quando um fenômeno primeiro é relacionado a um segundo fenômeno qualquer. É a categoria da comparação, da ação, do fato. “Ela nos aparece em fatos tais como o outro, a relação, compulsão, efeito, dependência, independência, negação, ocorrência, realidade, resultado” Terceiridade é a categoria que relaciona um fenômeno segundo a um terceiro. “É a categoria da mediação, do hábito, da memória, da continuidade, da síntese, da comunicação, da representação, da semiose e dos signos”. A base do signo é, portanto, uma relação tríade entre três elementos, dos quais um deve ser o fenômeno da primeiridade, outro de secundidade e o último de terceiridade. Sistemático para uns e não sistemático para outros, o pensamento de Peirce tem dado motivo a várias interpretações, mas com unânime reconhecimento de seu pioneirismo 21 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância na lógica e na semiótica. Sua influência é profunda no pensamento americano, chegando ao operacionismo lógico e às correntes contemporâneas da filosofia da ciência. Se já quiser adiantar nosso próximo assunto, que tal procurar na internet o conceito de SIGNO linguísito? Ele é a base para o conhecimento da Semiótica O signo: elementos semióticos de Peirce. In https://ensaiosenotas.com/2016/11/08/o-signo-elementos-semioticos-de- peirce/ SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2003. NOVAK, Franciele Isabelita Lopes. A semiótica de Peirce e Saussure, contributos e limites para a teoria das representações semióticas de Raymond Duval e a análise da forma e conteúdo em matemática. REVEMAT. Florianópolis (SC), v.12, n. 2, p. 1-15, 2017 https://ensaiosenotas.com/2016/11/08/o-signo-elementos-semioticos-de-peirce/ https://ensaiosenotas.com/2016/11/08/o-signo-elementos-semioticos-de-peirce/ 22 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 5. O SIGNO LINGUÍSTICO Objetivo Compreender e refletir sobre o conceito de signo linguístico a partir das definições de seus principais teóricos. Introdução Roman Jakobson atribui aos medievais a definição do signo como “algo que está por algo”: Tal definição reduz o signo a um dualismo, que consiste do signo e de algo indefinido no lugar do qual ele se coloca. Mais completa é a definição antiga do signo de Aurélio Agostinho (345-430): O signo é, portanto, uma coisa que, além da impressão que produz nos sentidos, faz com que outra coisa venha à mente como consequência dele. Essa definição é mais completa, pois nela encontramos o terceiro elemento, que conecta o signo com aquilo que ele representa à mente do usuário. O signo não se define, portanto, como uma relação diádica, mas como uma relação triádica. Evidentemente, “estar no lugar de” não quer dizer que o signo substitui completamente o objeto ao qual ele se refere. Pelo contrário, o signo nunca pode estar, de fato, no lugar do objeto, seja este presente ou ausente. Na definição do signo acima, “estar por ou para” significa representar. Poder estudar, especular, ou ao menos refletir sobre signos é uma característica fundamental da espécie e da cultura humana. Todos os seres vivos, inclusive as plantas, usam signos para se comunicar, porque a comunicação e os signos são essenciais para sobreviver. As abelhas têm um sistema bem complicado, mas muito bem-sucedido, para sinalizar às suas colaboradoras de onde elas estão trazendo a sua nutrição e onde as colegas podem também encontrar essa mesma fonte. Ao encontrar o pólen, as abelhas fazem uma espécie de dança que é apreendida pelas demais. 23 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Voltemos para os signos humanos. Embora, assim como os outros animais, também faça uso dos sinais sensórios para se comunicar, o humano é o único animal que fala. Essa comunicação verbal se manifesta pela audição e por sua forma escrita visualizável. Mas o signo pode também ser representado por um signo não verbal, como a imagem. Ao falar a panela ou desenhar uma panela, você tem uma representação, mas não pode com esse papel cozinhar o seu almoço, entendeu? 5.1. Um conceito e algumas definições Signo foi a teoria explicativa criada por Saussure ao tentar responder à questão que havia entre os linguistas, ou seja, a relação que poderia haver entre o 'nome dado às coisas existentes' e 'a coisa em si'. Para o pesquisador, tudo que é existente e conhecido é representado por um signo e este é composto por duas partes: significante e significado. O significante é a imagem acústica, ou seja, quando se pensa em algo conhecido, é como se o som ressoasse no cérebro - é um som não articulado. O significado corresponde, não ao objeto, a coisa em si, mas à imagem criada pelo significante. Não há, portanto, significado sem significante. Os dois elementos - significante e significado - constituem o signo "estão intimamente unidos e um reclama o outro". São interdependentes e inseparáveis, pois sem significante não há significado e sem significado não existe significante. Para Saussure, o signo linguístico, sendo de caráter puro e exclusivamente psíquico, se caracteriza por: - Arbitrariedade na união significado e significante, sendo esta relação entre o significado (conceito) e o significante (som) quase sempre convencional. Salvo raras exceções, não existe uma razão concreta para que um significante esteja associado a um significado. Isto explica o fato de que cada língua use diferentes significantes para um mesmo significado. - Linearidade: Os componentes que integram um determinado signo se apresentam um após o outro, tanto na fala como na escrita. O principio da linearidade que se aplica às unidades do plano das expressões (fonemas, sílabas, palavras), por serem estas emitidas 24 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância em ordens linear ou sucessiva na cadeia da fala, sendo o principio das relações sintagmáticas.- Articulação: As maiores unidades lingüísticas podem dividir-se em partes menores, reconhecíveis e intercambiáveis. Essa característica é própria e exclusiva do código linguístico e, graças a ela, podemos obter um número infinito de mensagens partindo de um número reduzido de unidades. Temos ainda as seguintes características, além destas, que são: Impositividade, onde significado, em relação ao significante, é imposto socialmente, e Mutabilidade, onde os signos se alteram com o passar dos tempos - fonética e semanticamente. O significado do signo lingüístico é, pois, o conceito, a ideia ou sentido, enfim, é o plano do conteúdo. O significante do signo lingüístico é, então, a imagem acústica - cadeias de sons. Entretanto, estes conceitos se tornam diferenciais e negativos, pois um signo só tem o seu valor na medida em que ele não é outro signo qualquer - um signo é aquilo que os outros signos não são. Peirce, como dissemos no capítulo anterior, diferentemente de Saussure, possuía uma visão tríade de signo. Além disso, ele defendia que toda ideia é um signo, ele pretendia configurar conceitos sígnicos tão gerais que pudessem servir de alicerce a qualquer ciência aplicada, ou seja, considerava que para exprimir qualquer conhecimento se recorre ao uso de signos e, assim, a Semiótica consiste no estudo das leis gerais desses signos existentes em qualquer ciência. 25 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Examinando fenômenos diversos, Peirce descreveu suas três categorias universais de toda a experiência e pensamento. Essas categorias foram denominadas: Qualidade; Relação; Representação. Algum tempo depois, o termo RELAÇÃO foi substituído por REAÇÃO e o termo REPRESENTAÇÃO recebeu a denominação mais ampla de MEDIAÇÃO. Para fins científicos, Peirce preferiu fixar-se na terminologia de Primeiridade, Secundidade e Terceiridade, os quais foram apresentados na aula anterior. Vamos entender mais profundamente cada um deles. PRIMEIRIDADE - a qualidade da consciência imediata é uma impressão (sentimento) frágil. É pré-reflexivo, sensorial. É presente e imediato, ele é original, espontâneo e livre, precede toda síntese e toda diferenciação. Primeiridade é a compreensão superficial de um texto. O eu. É o sentimento não analisado. Ex.: O céu é azul (primeiridade) SECUNDIDADE - a existência cotidiana, estamos continuamente esbarrando em fatos que nos são externos, coisas reais, factivas que não cedem ao sabor de nossas 26 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância fantasias. O simples fato de estarmos vivos, existindo, significa, a todo momento, que estamos reagindo em relação ao mundo. Existir é sentir a ação de fatos externos resistindo a nossa vontade. Onde quer que haja um fenômeno, há uma qualidade, isto é, sua primeiridade. Mas a qualidade é apenas uma parte do fenômeno, visto que, para existir, a qualidade tem que estar encarnada numa matéria. O fato de existir (secundidade) está nessa corporificação material. Ex.: Pedro bateu no Carlos (fato – secundidade) Pedro bateu no Carlos por causa do José (intenção – não é secundidade) A secundidade engloba ação e reação, causa e efeito, impacto. É manifestação, fim, o outro. TERCEIRIDADE - primeiridade é a categoria que da à experiência sua qualidade distintiva. Secundidade é aquilo que dá à experiência seu caráter factual, de luta e confronto. Finalmente, terceiridade corresponde à camada de inteligibilidade, ou pensamento em signos, através da qual representamos e interpretamos o mundo. Ou seja, o indivíduo conecta à frase a sua experiência de vida, fornece à oração, um contexto pessoal. A terceiridade é precisão, conexão entre qualidade e fato. Ex.: Pedro é forte (qualidade) – primeiridade Pedro bateu no Carlos (fato) – secundidade Carlos está ferrado (previsão) – terceiridade Ana vê algo na vitrine (princípio, presente) – primeiridade Ana decide entrar na loja (meio, futuro) – terceiridade Ana entra na loja (fim, passado) – secundidade “Considerar algo como um terceiro é considerar algo como signo. Entretanto um terceiro incui um primeiro e um segundo.”. De maneira sintética, temos: 27 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância PRIMEIRIDADE SECUNDIDADE TERCEIRIDADE ABSTRAÇÃO PURA CORRELATO COMPARAÇÃO PRESENTE PASSADO FUTURO SER EXISTIR REPRESENTAR PRINCÍPIO FIM MEIO EU ELE TU NOVAK, Franciele Isabelita Lopes. A semiótica de Peirce e Saussure, contributos e limites para a teoria das representações semióticas de Raymond Duval e a análise da forma e conteúdo em matemática. REVEMAT. Florianópolis (SC), v.12, n. 2, p. 1-15, 2017 28 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 6. ÍCONE, ÍNDICE, SÍMBOLO Objetivo Entender a relação do signo linguístico de Peirce com os conceitos de ícone, símbolo e índice. Introdução A segunda tricotomia de Peirce descreve os signos sob o ponto de vista das relações entre o objeto e a forma como ele é representado. Peirce considera essa tricotomia como “a divisão mais importante dos signos”. Os três elementos que a compõem são determinados conforme as três categorias fundamentais. São eles: ícone, índice e símbolo. Tente pesquisar sobre as TRICOTOMIAS de Peirce. Veja como o autor desenvolveu essa teoria. ÍCONE: mantém uma relação de proximidade sensorial ou emotiva entre representação do objeto e o objeto em si - exemplo: pintura, fotografia, o desenho de um boneco. É importante falar que um ícone não só pode exercer esta função como é o caso do desenho de um boneco de homem e mulher que ficam anexados à porta do banheiro indicando se é masculino ou feminino, a priori é ícone, mas também é um simbolo, utilizado para mostrar que é um banheiro. Assim seria, então ele é ícone e símbolo. De acordo com J. Texeira Coelho Netto, ícone é um signo que tem semelhança com o objeto representado. Exemplos de signo icônico: a escultura de uma mulher, uma fotografia de um carro, e mais genericamente, um diagrama, um esquema.” – Ícone é caracterizado por Peirce, em uma de suas muitas definições, como aquele signo que é determinado por seu objeto, por compartilhar das características dele. (...) Essa semelhança com o objeto, contudo, não é necessariamente especular, como numa fotografia, embora possa sê-lo. É suficiente uma única propriedade monádica com o objeto, 29 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância um traço, para que possa ser visto pelo sujeito como ícone daquele objeto. De qualquer maneira, existe na identidade do ícone uma relação de analogia, qualquer seja ela, fazendo de qualquer imagem, (visual, auditiva, olfativa, etc.) um ícone em potencial que depende, para sua atualização, da interferência do sujeito ÍNDICE: ou parte representada de um todo anteriormente adquirido pela experiência subjetiva ou pela herança cultural - exemplo: onde há fumaça, logo há fogo. Quer isso dizer que através de um indício (causa) tiramos conclusões. A principal característica do signo indicial é justamente a ligação física com seu objeto, como uma pegada é um "indício" de quem passou. A fotografia, por exemplo, é primeiramente um índice, pois é um registro da luz. Índice é um signo que se refere ao objeto denotado de virtude de ser diretamente afetado por esse objeto determinado momento. Ele indica algo - nuvem (chuva), pegadas (passagem de alguém). SÍMBOLO: de forma arbitrária estabelece uma relação convencionada entre o signo e o objecto - exemplo: o termo cadeira. O fundamento do símbolo é um legi-signo, é um signo que representa o objeto através de uma lei, de uma convenção, possuindocaráter geral e não singular como no caso do índice. Seu objeto imediato é a forma como o signo irá representar seu objeto dinâmico, o significado. Um ícone pode se tornar um símbolo por convenções socioculturais, ao ser carregado de significados simbólicos. Como já dissemos, as palavras são símbolos porque foram convencionadas. 30 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Signos por Lucia Santaela - https://www.youtube.com/watch?v=lomcJvKGy10. Winfried Noth. Panorama da Semiótica de Platão a Peirce.: Annablumeo https://www.youtube.com/watch?v=lomcJvKGy10 31 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 7. A SEMIÓTICA DISCURSIVA Objetivo Conhecer a teoria da semiótica discursiva de Greimas Introdução Podemos falar, cronologicamente, em duas fases que caracterizaram as origens da Semiótica Discursiva: a primeira ocorreu nas décadas de 1920 a 1930 em que os primeiros estudos formalistas foram publicados. A segunda ocorreu nas décadas de 1960 a 1980 e foi quando esses trabalhos foram retomados e Lévi-Strauss, Barthes e A. J. Greimas criaram modelos baseados no pensamento estruturalista. Nosso foco, nesse capítulo será essencialmente os estudos deste último. O semioticista Algirdas Julien Greimas (1917-1992) permaneceu mais fiel aos princípios da análise estrutural que tem por base Saussure e a relação de estrutura significante/significado = signo. Greimas analisava os planos de linguagem onde os signos estão inseridos. Em meados dos anos 1960, marcou o desenvolvimento da teoria Semiótica especialmente no que diz respeito à sua dimensão narrativa, que é a primeira dimensão de articulação do sentido e um dos níveis de análise mais explorados na reflexão greimasiana, sobretudo até meados dos anos 1980. 7.1. O início O Greimas quer analisar o plano inteiro de linguagem, ele prevê que toda linguagem tem expressão e conteúdo. A partir de Greimas nós não vemos mais os signos. Tudo estará em conjunto para expressar o conteúdo. Seu objetivo central é estudar o discurso com base na ideia de que uma estrutura narrativa se manifesta em qualquer tipo de texto (verbal ou não verbal). Para Greimas, o signo é chamado "aspecto textual", portanto a semiótica é a teoria da significação e seu objeto não é o signo, mas os Sistemas Semióticos. Sua principal preocupação é explicar as condições da apreensão e da produção do sentido, mais 32 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância especificamente, a intenção da semiótica é tornar explícitos os mecanismos que estão implícitos de estruturação e interpretação de texto. Segundo Barros (1990, p.7), a semiótica tem por objeto o texto, ou melhor, procura descrever e explicar o que o texto diz e como ele faz para dizer o que diz. A semiótica quer descobir o que há por trás dos textos. Como podemos descobrir aspectos históricos e sociais por meio dos discursos? Para Greimas, o social e o histórico não são transcendentes, são imanentes, ou seja, são contruídos no e pelo texto. Ou seja, toda a realidade como conhecemos, seja ela, social ou histórica, foi construída por textos e não são aspectos fora dele. E, quando falamos em textos, não estamos nos referindo apenas aos textos verbais, mas também às imagens, às músicas, todas as diferentes formas de expressão de cultura. Você já deve ter estudado que a Semântica é a ciência que estuda a significação dos termos. Particularmente para Greimas, a Semântica deve ser gerativa, ou seja, gerar modelos para que seja possível a análise de vários elementos que podem ter o mesmo significado. O autor vai criar categorias de análise para que possamos compreender como há várias formas de representar a mesma situação. Por exemplo, para que eu diga: Estou cansada, há várias formas de explicar esse sentimento. Dependendo da forma que eu escolher, eu vou conseguir uma verdade mais verossímel e posso conseguir determinada resposta da pessoa. Posso, inclusive, conseguir persuadir meu interlocutor a tomar uma atitude. A semiótica, para Greimas, também precisa ser sintagmática, ou seja, ela não deve explicar as unidades lexicais das frases, não deve preocupar-se com a forma como a frase é construída, mas deve focar na produção e interpretação do discurso. O que há por trás do conteúdo. Finalmente, a semiótica deve ser geral, ter uma unidade de sentido que pode ser manifestado por diferentes formas de expressão. Segundo Fiorin (2013, p.17-44), a grande contribuição da Semiótica Discursiva refere-se a uma metodologia direcionada para a leitura e análise de textos em que, segundo 33 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância sua proposta, é possível analisar um texto a partir de níveis. Ainda, segundo o autor, o conjunto desses níveis é chamado de Percurso Gerativo de Sentido. A partir dessa metodologia, a Semiótica Discursiva proporciona subsídios para análise dos enredos narrativos, o que auxiliará o sujeito a compreender os efeitos produzidos pelo texto. Percurso Gerativo de Sentido O percurso gerativo de sentido vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto. A primeira etapa do percurso, a mais simples e abstrata, recebe o nome de nível fundamental ou das estruturas fundamentais e, nele, surge a significação como uma oposição semântica mínima. No segundo patamar, denominado nível narrativo, ou das estruturas narrativas, organiza-se a narrativa, do ponto de vista de um sujeito. O terceiro nível é o do discurso ou das estruturas discursivas em que a narrativa é assumida pelo sujeito da enunciação. 1º NÍVEL: FUNDAMENTAL OU DAS ESTRUTURAS FUNDAMENTAIS: O Nível Fundamental é o mais complexo e abstrato. Temos nele oposições semânticas de valores (contrariedade). Ex.: vida x morte, certo x errado. Para que se tenha uma construção de opostos (de valores) temos que ter traços em comum. Esses valores ou categorias opostas não possuem uma valoração fixa, ou seja, o texto é quem irá mostrar se “riqueza” é um conceito positivo ou negativo. Os valores positivos são denominados “atraentes ou eufóricos”, já os negativos são intitulados de “repulsivos ou disfóricos”. Em discursos cristãos, a “riqueza” tem valor disfórico. No meio empresarial, eufórico. Já a contraditoriedade, explica-se pelas palavras contraditórias como alto x não alto, feio x não feio. Por exemplo, nem todo mundo que não é herói, é o vilão. E, por último, a questão de complementariedade. Por exemplo, eu posso dizer que o João não é bonito (e também não é feio). A complementariedade seria o não bonito e o feio, pois são palavras que tem carga semântica próximas. 34 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Para Greimas, os significantes são “os elementos ou grupos de elementos que tornam possível o aparecimento da significação ao nível da percepção”. Liga- se ao mundo sensorial por meio: do visual (gestos, mímica), do táctil (alfabeto braile), o auditivo (música). O significado é a “significação ou significações que são abrangidas pelo significante” e o conjunto significante é a reunião de significante e de significado. A estrutura elementar da significação se dá pela articulação de dois semas contrários, através do eixo semântico... É importante ressaltar que o discurso na semiótica não vai depender de quem está lendo. A semiótica vai fazer um estudo do que o discurso “quis dizer”, do que está manifestado. . QUADRADO SEMIÓTICO: revela as oposições dos eixos semânticos, apresentando dois tipos de relações. 2º NÍVEL: NARRATIVO OU DAS ESTRUTURAS NARRATIVAS: A narratividade é uma transformação situada entre dois estados sucessivos e diferentes(sujeito de estado e sujeito de fazer). Também devemos ressaltar o conceito de conjunção e disjunção. Quando o sujeito entra em conjunção com o objeto eufórico. Por exemplo, no meio empresarial, se alguém se torna rico, ele está em 35 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância estado conjunto. Por outro lado, se uma pessoa estava bem financeiramente e empobreceu, ela passa a um estado disjunto Uma narrativa complexa possui quatro fases: Manipulação, Competência, Performance e Sanção 3º NÍVEL – DISCURSIVO OU DAS ESTRUTURAS DISCURSIVAS: No nível narrativo, percebemos formas mais abstratas, por exemplo, quando um sujeito entra em conjunção com a liberdade. Entretanto, no nível discursivo, essas formas abstratas são revestidas de termos que lhes dão concretude. O nível discursivo pode produzir variáveis de conteúdos narrativos invariantes, ou seja, no nível narrativo sempre teremos, por exemplo, em uma novela, uma estrutura narrativa fixa: X quer entrar em conjunção com o amor de Y, X não consegue (existe um obstáculo), X passa a poder fazê-lo (o obstáculo é removido), o amor realiza-se. Já, no nível discursivo, podemos perceber uma variação, pois o obstáculo, por exemplo, ora pode ser a diferença social, ora pode ser a presença de outra mulher etc. GREIMAS. Semântica estrutural. Cultrix, 1973 FIORIN, José. Elementos de análise do discurso. Contexto 36 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 8. ENUNCIAÇÃO E ARGUMENTAÇÃO EM SEMIÓTICA - PROF. DR. J. L. FIORIN Essa aula é baseada em aulas online do Professor Dr. José Luiz Fiorin, cujos links das aulas deixarei disponível a vocês. O que é enunciação Saussure nos mostra que a língua humana tem um aspecto social, ou seja, o conhecimento internalizado que nós temos da língua e um aspecto individual, ou seja, a fala. A língua é composta pelas diferenças. Essas diferenças podem ser semâticas como o masculino e feminino, formação do plural, por exemplo. Como também podem ser fônicas, como a produção dos sons das vogais que são específicos do português e diferentes no inglês, no francês. No entanto, o aspecto mais importante é que a língua possui um sistema combinatório de formação das sentenças. Em português, por exemplo, nossas frases, normalmente, são compostas por artigo + substantivo+ verbo + complementos. A fala, por outro lado, é individual. Emile Benveniste questiona como nós passamos da língua para a fala. Segundo ele, esse processo ocorre por meio da enunciação. ENUNCIAÇÃO = DIZER ENUNCIADO = DITO ENUNCIAÇÃO É A PRODUÇÃO DA LÍNGUA POR UM ATO INDIVIDUAL . - é a instância de mediação entre a língua e a fala. O ego – hic – nunc (eu – aqui – agora) 37 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Quais seriam essas categorias entre a língua e a fala? Benvenieste afirma que são: o EGO – HIC – NUNC (eu – aqui – agora). A enunciação, portanto, tem um conteúdo linguístico: a pessoa, o espaço e o tempo. A opção por escrever as categorias em latim é para nos mostrar que tais categorias não são de determinada língua, mas pertence a todas as línguas. Por último, poderíamos afirmar que a enunciação é uma instância logicamente pressuposta pelo enunciado. Se existe um enunciado, obviamente existe aquele que produziu esse enunciado. No enunciado “O jogo foi ruim”, eu não precisaria enunciar a enunciação, ou seja, dizer, “Eu digo que o jogo foi ruim”, já que sempre há um eu prossuposto na enunciação. O “eu” pressuposto que não está no enunciado é chamado por Benveniste de enunciador. O eu explicitamente escrito é o narrador. Voltemos ao exemplo [Eu digo] O jogo foi ruim ENUNCIADOR Eu digo que o jogo foi ruim Enunciação enunciada - NARRADOR É importante separar os dois elementos, já que não podemos confundir enunciador e narrador. O enunciador é o autor, o narrador seria aquele que conta a história. Há, ainda, o INTERLOCUTOR. Imaginemos uma história narrada pela Maria. Em determinado momento há: João disse: Eu te amo! Esse EU refere-se não à Maria, mas ao João. Esse EU é o interlocutor. Também é importante entender que toda vez que um EU fala, ele fala para um TU (ou você). Para cada um desses EUs que explicamos acima, há um TU correspondente ENUNCIADOR (autor) ENUNCIATÁRIO (tu pressusposto – leitor) NARRADOR NARRATÁRIO INTERLOCUTOR INTERLOCUTÁRIO 38 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Quando falamos que o ENUNCIADOR é o autor, temos que lembrar que não é a pessoa, mas a imagem que temos desse autor a partir de sua obra. Por exemplo, ao lermos O Sítio do Pica Pau Amarelo, o enunciador não é Lobato, mas um Lobato construído por sua obra. Greimas nos traz a ideia do enunciado, enunciado, que seria o enunciado despido das marcas de enunciação. Por exemplo, quando eu digo: A rosa é uma flor, eu não tenho as marcas de enunciação (eu digo...) Ele quer deixar evidente que nada escapa à enunciação. Ao falar, a rosa é uma flor, eu crio um efeito de verdade. Já que temos a impressão de que o fato ‘fala’ por si. No jornal, por exemplo, é fundamanetal se criar o efeito de verdade, já que, na notíca, o jornalista não pode se colocar. Por outro lado, em eu digo que a rosa é uma flor, temos menos efeito de verdade. Greimas retoma a teoria de Benveniste, mas nos traz algumas reflexões sobre a ordem da estrutura e a ordem do acontecimento presentes no discurso. No nível da estrutura, temos as generalizações e na ordem do acontecimento temos as singularidades. Para Greimas, a enunciação é a instância entre a cultura e o acontecimento. A enunciação pode ocorrer em três níveis: fundamental, narrativo e discursivo, que nós vimos na aula anterior. Entre o nível narrativo e o discursivo está a enunciação. A enunciação é a passagem da estrutura para o acontecimento. https://www.youtube.com/watch?v=0FmN3h6GM80 FIORIN, José. Elementos de análise do discurso. Contexto 39 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 9. UMA ANÁLISE SEMIÓTICA Objetivo Propor a análise de alguns textos sob a visão Semiótica Introdução Como vimos o Percurso Gerativo de Sentido nos ajuda a compreender como o sentido é produzido, como um discurso de um jornal ou de uma revista, por exemplo, é produzido. Vamos seguir os caminhos do Percurso Gerativo de Sentido em uma revista e compreender como ela “vende” seu discurso. Relembrando, os três níveis: fundamental, narrativo e discursivo. 9.1. Revista Boa Forma A análise abaixo foi feita pelo professor Claudio Rabelo, da Universidade Federal do Espírito Santos. De acordo com Rabelo, em sua análise semiótica2, na revista abaixo o valor MAGREZA é apresentado como um valor eufórico. Não só pelo texto verbal, como pelo não-verbal. 2 h t tps : / /www.youtube.com/watch?v=bMyZBKvHbGg Marina Ruy Barbosa Pernas e bumbum desenhados com 5 movimentos https://www.youtube.com/watch?v=bMyZBKvHbGg 40 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O discurso que claramente se apresenta é um discurso de venda da revista e está manifestado nesse discurso a magreza como um fator positivo, ou seja, eufórico. O nome da revista e Boa Forma (há, portanto, uma má forma) e também identificamos na revista outros textos tais como: dieta clean, apaixone-se pela corrida, derrete gordura, temperos que ajudam a queimar quilinhos. Esses títulos corroboram o discursoda magreza como eufórico. Podemos representar esse valor expresso pela revista por meio do quadrado semiótico. Assim, teríamos: Nesse quadrado, temos um valor de magreza e seu contrário gordura. Temos um subcontrário magreza / não magreza, gordura /não gordura. O quadrado também nos mostra valores de complementariedade: magreza/não gordura, gordura/não magreza. A própria revista nos mostra que se você tem magreza, mas tem gordura, há um risco (portanto você deve comprar a revista). Se você é magra, e não tem gordura, você está com boa forma. De forma mais complexa, o que a revista nos coloca, analisando a sintaxe: - A atriz é magra e tem boa forma - A atriz se tornou “desenhada” em cinco movimentos que a revista ensina - Se o leitor não seguir os conselhos da revista terá gordura (não será magra, nem terá boa forma). Percebemos que a revista afirma que você (leitora) tem gordura e precisa seguir os exercícios propostos para ficar igual a atriz. 41 Comunicação e Semiótica Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Um dos aspectos que podemos ressaltar do nível narrativo é que há a junção do sujeito com a magreza (fator eufórico), e disjunção com a gordura. Também a revista se coloca como aquela que vai resolver o problema da gordura. Se você segue o que a revista propõe terá a performance, irá se transformar. No final, no nível discursivo podemos perceber a “roupagem” colocada de que a magreza está associada à beleza e ao sucesso. GREIMAS. Semântica estrutural. Cultrix, 1973 FIORIN, José. Elementos de análise do discurso. Contexto
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