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ALGODÃO ORGÂNICO NO BRASIL: SUSTENTABILIDADE E PERSPECTIVAS PRODUTIVAS Larissa Duarte; Júlia Baruque-Ramos; Lais Kohan; Luciano Pinheiro Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, (EACH-USP); 03828-000, São Paulo/SP, Brasil; larissaoliveiraduarte @ hotmail.com Resumo O Brasil é o 5o maior produtor e 3o maior exportador de algodão convencional do mundo. O país possui um grande potencial agrícola, favorável para desenvolver o cultivo e a produção de algodão orgânico, devido a condições climáticas ideais e qualidade do solo, que podem possibilitar o plantio em diferentes regiões. Há também crescente demanda para o algodão orgânico no mercado nacional e internacional. O tema do vestuário orgânico ganhou notoriedade nos últimos anos dada à intensificação da presença de consumidores conscientes no mercado, atentos às causas ambientais e sociais. Dessa forma, objetivo deste estudo é apresentar as perspectivas da produção de algodão orgânico no Brasil sob o ponto de vista da sustentabilidade e de potencial produtivo, o qual é de interesse para o setor têxtil. A cultura orgânica de algodão pode ser utilizada para manter e recuperar a qualidade nutricional do solo, de modo a elevar a produção local. Os principais estados produtores de algodão orgânico no Brasil são Paraíba, Ceará, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte. O sistema é sustentável, pois é realizado em pequenas propriedades, com fixação do homem no campo, a conservação ambiental, a viabilidade econômica, a justiça social e o comércio justo. Ainda podem haver outras formas de cultivo, que sejam economicamente mais viáveis e eficientes, como é o caso da Agricultura Sintrópica. No entanto, o algodão orgânico poderia ter mais visibilidade se organizasse e ampliasse a produção para atender as demandas do mercado. Assim é importante compreender os benefícios do algodão orgânico, as formas e regiões de cultivo, os números de produção e a utilização no mercado, para incentivar sua comercialização a nível nacional e internacional. Palavras-chave: Algodão orgânico. Sustentabilidade. Produção. ORGANIC COTTON IN BRAZIL: SUSTAINABILITY AND PRODUCTIVE PERSPECTIVES Abstract Brazil is the 5th largest producer and 3rd largest exporter of conventional cotton in the world. The country has a great agricultural potential, favorable to develop the cultivation and the production of organic cotton, due to ideal climatic conditions and soil quality, that could make possible the cultivation in different regions. There is also growing demand for organic cotton in the domestic and international market. The topic of organic clothing is gaining visibility in the last years related to the increasing presence of conscious consumers, aware of social environmental issues. Therefor the objective of this study is to present the perspectives of the production of organic cotton in Brazil from the point of view of sustainability and productive potential, which is of interest for the textile sector. The organic cotton crop may be used to maintain and recover the nutritional quality of the soil in order to increase local mailto:larissaoliveiraduarte@hotmail.com production. The main organic cotton producing states in Brazil are Paraíba, Ceará, Pernambuco, Piauí and Rio Grande do Norte. The system is sustainable, since it is carried out in small properties, maintaining people on the land and concerning environmental conservation, economic viability, social justice and fair trade. There may still be other forms of cultivation that are economically more viable and efficient, such as in the case of Syntropic Agriculture. However, organic cotton could have more visibility if it could organize and expand the production to meet the demands of the market. Thus, it is important to understand the benefits of organic cotton, the forms and regions of cultivation, the production numbers and the use in the market, to encourage its commercialization at national and international level. Keywords: Organic cotton. Sustainability. Production. 1. Introdução O presente estudo pretende reunir e analisar dados sobre o algodão orgânico no país, a fim de compreender como se organiza a produção e comercialização dessa fibra, para identificar os desafios do mercado. O algodão é a principal fibra natural utilizada na indústria têxtil, porém, muitas questões referentes ao seu cultivo precisam ser contempladas e aprimoradas, para motivar sistemas de produção sustentáveis. Para De Carli e Manfredini (2010), muitas são as marcas de vestuário que estão buscando se reinventar nos valores da sustentabilidade. Um dos mais relevantes desafios para essas marcas, no entanto, é o de encontrar fornecedores locais, que sejam transparentes e comprometidos em relação às questões socioambientais envolvidas em seus processos de produção. De acordo com dados do UniEthos (2013), o cultivo tradicional do algodão está relacionado ao uso excessivo de agroquímicos, tais como corretivos, pesticidas, fertilizantes e defensivos, também ao uso excessivo de água, além de condições degradantes do trabalhador rural e a geração de resíduos tóxicos. O cultivo orgânico passa a ser então, uma oportunidade bastante viável. Segundo Organic Trade Association (2015), a venda de algodão orgânico cresceu significativamente nos últimos anos; mais clientes passam a buscar produtos sustentáveis. Fibras naturais orgânicas são agora, a maior categoria de produtos orgânicos com demanda crescente no mercado, depois dos alimentos. Para Cardoso (2017), organizar o cultivo do algodão orgânico para produção em escala econômica, é ainda um desafio no Brasil. Os próprios agricultores podem ser a resistência para o aumento da produção, sem a aplicação das técnicas e do manejo orientados, a escassez de mão-de-obra jovem e a falta de compromisso com a gestão ambiental rural. Suprir a demanda dos compradores pelo algodão orgânico é um desafio, pois a oferta geralmente é insuficiente. O Brasil possui grande potencial agrícola, contudo tanto a produção quanto a comercialização de insumos orgânicos, precisam ser aprimoradas. Esta investigação não pretende esgotar todos os aspectos que intervém nesse tema, mas faz-se uma tentativa de observá-los indicando um panorama sob o ponto de vista do setor têxtil. 2. Problema de Pesquisa e Objetivo Segundo Cotton Market Fundamentals & Price Outlook (2018), o Brasil é o quinto maior produtor e terceiro maior exportador de algodão convencional do mundo, contudo o mesmo não ocorre para o cultivo de algodão orgânico. O país possui um grande potencial agrícola, favorável para desenvolver o cultivo e a produção de algodão orgânico, devido a condições climáticas ideais e qualidade do solo, que podem possibilitar o plantio em diferentes regiões. Há também crescente demanda para o algodão orgânico no mercado nacional e internacional. Mas faltam informações para que os produtores possam compreender o mercado, incrementar a produção e a logística, permitindo mais acessibilidade, transparência, proximidade entre produtores e compradores. O objetivo deste estudo é apresentar as perspectivas da produção de algodão orgânico no Brasil sob o ponto de vista da sustentabilidade e de potencial produtivo, o qual é de interesse para o setor têxtil. 3. Revisão Bibliográfica 3.1. A Sustentabilidade no Setor Têxtil O mercado atual está se especializando em criar e desenvolver produtos e serviços com novos enfoques, enfatizando na transparência da produção. Aspectos como design para eficiência de processos e recursos, design para biodegradabilidade, produção local com fontes renováveis, boa ética trabalhista, reciclagem e reuso de matéria prima, trabalhos colaborativos, recebemcrescente atenção (FLETCHER; GROSE, 2011). Ainda são desafios para a indústria têxtil utilizar recursos naturais com critério, minimizar o uso de água, utilizar fontes renováveis de energia, aumentar o rendimento das matérias-primas, diminuir os resíduos e custos de produção, além dos ganhos quanto à saúde do meio ambiente e da população (DE CARLI; MANFREDINI, 2010). Outros problemas são os fluxos de recursos extrativistas e tóxicos, a produção agrícola em monocultura provocando alto índice de infertilidade do solo e a contaminação de solos e rios. A sustentabilidade pode ser vista hoje como parte integrante de todo e qualquer processo. De acordo com dados do relatório anual da Textile Exchange (2016), devido à escassez de recursos naturais, mudanças climáticas, aumento populacional e demanda por processos e produção transparente, stakeholders querem ser informados sobre a procedência dos produtos. Serão necessários investimentos crescentes em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias sustentáveis, que minimizem os danos ao meio ambiente, além da adaptação da produção a padrões internacionais de sustentabilidade e a utilização de tecidos orgânicos. 3.2- Vestuário Orgânico e Compra Consciente O tema do vestuário orgânico ganhou notoriedade nos últimos anos (MATTHEWS; ROTHENBERG, 2017a) dada à intensificação da presença de consumidores conscientes no mercado, considerando causas de justiça e ética, ambientais e sociais. Consumidores conscientes, conforme definido por Roberts (1996), são aqueles que adquirem bens e serviços que acreditam ter um impacto positivo ou menos negativo sobre o meio ambiente e a sociedade, têm um interesse favorável em produtos que são orgânicos, energeticamente eficientes, biodegradáveis, produzidos por grupos ou comunidades desfavorecidas, utilizando técnicas tradicionais, artesanais e promovendo o comércio justo. Consequentemente, a medida que esses clientes se tornam mais sofisticados e conscientes, eles esperam que as empresas sejam mais responsáveis em suas atitudes. Esse movimento em direção ao vestuário orgânico cria uma necessidade para entender melhor as preferências de grupos de consumidores de moda. E se as motivações e comportamentos desses grupos são compreendidos, então as demandas podem ser previstas e melhor atendidas (MATTHEWS; ROTHENBERG, 2017a). 3.3- O Algodão Segundo a pesquisa de fibras vegetais de Dong Hua University (2015, p. 31): O algodão é a fibra natural mais popular, representando cerca de 90% de todas as fibras naturais. Sendo uma das mais importantes culturas de fibras têxteis naturais, relevante ao setor agrícola e industrial (DONG HUA UNIVERSITY, 2015, p. 31). Além disso, é a principal matéria prima para a produção de tecidos, usado para produzir vestuário, mobiliário doméstico, e produtos industriais. Existem muitas variedades de algodão, e cada variedade tem características diferentes na plantação e processamento de desempenho. 3.4- O Algodão no Mundo Os principais países que produzem algodão no mundo são a China, Estados Unidos, Índia, Paquistão, Uzbequistão, Turquia e Brasil, que juntos representam mais de 80% da produção mundial de algodão. De acordo com a pesquisa de mercado feita mensalmente pela instituição americana Cotton Market Fundamentals & Price Outlook (2018), a Índia segue liderando a produção da fibra no mundo. Os dados da Tabela 1, a seguir, relatam a posição e participação internacional do Brasil, tanto na produção quanto na exportação de algodão, na medida em libras e considerando a pluma comprimida. Tabela 1. Produção e exportação de algodão orgânico no mundo. Fonte: Cotton Market Fundamentals & Price Outlook, Monthly Economic Letter, 2018. 3.5- O Algodão no Brasil A cultura algodoeira demostra grande importância econômica no Brasil, devido a sua multiplicidade, a fibra pode ser cultivada em várias condições de clima e solo. Cultivares de algodoeiro arbóreo e herbáceo são os mais comuns no Brasil, sendo que a melhoria da qualidade da fibra é uma das estratégias da rede produtiva nacional para garantir competitividade. O algodão tem perdido mercado para as fibras sintéticas derivadas de petróleo e uma aposta para garantir a sustentabilidade da cultura é investir em fibras naturais de qualidade diferenciada e que remunere melhor o produtor (EMBRAPA, 2015). 4- Metodologia Para este trabalho, foi realizada a revisão de literatura baseada, fundamentalmente, em dados sobre algodão orgânico relevantes para indústria têxtil. Para a pesquisa bibliográfica acerca do tema tratado, foram utilizadas fontes tais como livros conceituados sobre o assunto, dissertações e teses, artigos científicos relevantes no universo acadêmico. Em bases internacionais, tais como Web of Science, Scopus, Scielo e Emerald, também utilizando o Banco de Teses da USP e demais análises documentais. Além disso, foi realizada uma pesquisa de campo na Fazenda Caminho das Pedras, em Itaúna, Minas Gerais, onde é realizado o cultivo teste de algodão em sistema de agricultura sintrópica. 5- Resultados 5.1- O Algodão Colorido O algodão naturalmente colorido possui uma fibra pigmentada, podendo ser encontrado em tons de vermelho, verde e vários tons de marrom, bem como a cor amarelada, típica das fibras comerciais de algodão. A cor natural é devido às propriedades genéticas inerentes da planta. Os tons de algodão colorido variam em estações e localização geográfica devido ao clima e variações do solo (DONG HUA UNIVERSITY, 2015). Segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa, 2017), a partir do ano 2000, a Embrapa Algodão iniciou suas pesquisas com cultivo de algodão colorido orgânico e agroecológico. Hoje, é utilizado por agricultores familiares da região Nordeste para produzir uma fibra ecologicamente correta. Nesse sistema de cultivo, os adubos químicos são substituídos por adubos naturais e o controle de insetos e doenças é feito utilizando-se extratos vegetais. Esse sistema de cultivo aumenta a biodiversidade e a segurança alimentar do homem do campo. O algodão é plantado com outras culturas alimentares tradicionais, como milho, gergelim, amendoim, feijão, coentro, abóbora e outras. Consórcio é o nome que se dá para esse tipo de plantio. Marcas nacionais e internacionais têm procurado o algodão colorido orgânico para desenvolver linhas sustentáveis (EMBRAPA, 2017). 5.2- O Algodão Orgânico Para Cevheri e Yilmaz (2017) o algodão é a matéria-prima mais importante para a indústria têxtil no mundo de hoje, contudo é a cultura industrial para a qual os fertilizantes e pesticidas químicos são mais utilizados. O excesso de produtos químicos causa poluição do solo e de recursos hídricos e destruição da biodiversidade com a monocultura intensiva. Um dos tópicos mais discutidos no mundo de hoje é agricultura sustentável e o maior obstáculo para a agricultura sustentável é o uso desses produtos químicos. Logo a questão mais importante quando se trata de agricultura sustentável é, sem dúvida, a agricultura orgânica. Produtores orgânicos possuem terrenos com solo de melhor qualidade, melhor acesso a irrigação, retenção de água nos solos e qualidade da água. Considerando os menores gastos com insumos, a produção orgânica fica mais barata que a convencional, melhora a qualidade de vida dos produtores rurais e pequenos agricultores. Além disso, entre os benefícios do cultivo do algodão orgânico está a conservação da biodiversidade, harmonização das intervenções agrícolas com os processos vitais dos ecossistemas locais, sistemas de cultivos sucessivos, tecnologias de baixo nível energético e de baixos insumos (CARDOSO, 2017). De acordo com Lima (2006), grupos de produtores orgânicos nomundo começaram sua produção a partir de 1940. O cultivo de produtos orgânicos no Brasil iniciou-se em meados da década de 80 e a partir da década de 90, surge a produção do algodão orgânico em resposta ao crescente mercado de produtos orgânicos, constituindo-se assim um excelente negócio. A cultura orgânica foi utilizada para manter e recuperar a qualidade nutricional do solo, de modo a elevar a produção local. Segundo dados do Textile Exchange (2017), os principais estados produtores de algodão orgânico no Brasil, são Paraíba, Ceará, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte. Informações da ABIT e CNI (2012, p.58) referentes à produção de algodão orgânico no Brasil, afirmam que “as iniciativas do setor ainda são pequenas em quantidade, porém seguras, ou seja, todo o produto tem destino certo e qualidade assegurada, todas com certificação do IBD – Instituto de Biodinâmica acreditado pelo Inmetro.” Acrescentam ainda que o sistema é absolutamente sustentável, pois é realizado em pequenas propriedades e incentiva o comércio justo. 5.3- O Algodão Agroecológico No Nordeste do Brasil, o cultivo de algodão agroecológico, em sistemas de policultivo tem resultado em produções interessantes, mas ainda em volumes insuficientes para atender à crescente demanda pela fibra orgânica (LIMA; SOUZA, 2006). Além de não utilizar agrotóxicos, outros aspectos positivos desse cultivo são o fim das práticas de queimadas, que contribuem para empobrecimento do solo, e o desmatamento. A agroecologia retrata uma agricultura menos agressiva ao meio ambiente, que promove a inclusão social e proporciona melhores condições econômicas para os agricultores. O cultivo de algodão agroecológico, propõe um cultivo integrado mesclando o algodão com espécies alimentícias, como feijão, milho, abóbora e ainda a mamona. Também não utiliza insumos artificias, logo trata do cultivo com implementos e adubos naturais (CARDOSO, 2017). Ainda para Cardoso (2017), a produção do algodão agroecológico permite que a diversificação no cultivo sirva como uma barreira contra a dispersão de pragas. A percepção geral é que o cultivo do algodoeiro agroecológico, além de favorecer a fixação do homem no campo, garante melhores condições socioeconômicas e promove a segurança alimentar e nutricional das famílias. O algodão produzido pelos agricultores familiares é colhido manualmente, o que proporciona, quando esta operação é bem feita, a obtenção de um produto de elevada qualidade, com baixa contaminação da fibra por impurezas. Segundo Lima e Souza (2006), o cultivo agroecológico é uma opção eficiente e consciente, representa uma contribuição para enfrentar a crise ambiental (recuperar solos, aumentar a biodiversidade, não usar fogo ou veneno), econômica (ampliar a geração de renda em áreas rurais), energética e alimentar (ofertar caroço do algodão para a produção de biodiesel, sem afetar a segurança alimentar). 5.4- A Utilização do Algodão Orgânico na Moda Ramasamy (2015) avaliou o desempenho do algodão orgânico em comparação com tecidos de malha de algodão não orgânico. Especificamente, o autor procurou entender a qualidade e os atributos técnicos de ambos tecidos de malha orgânicos e não-orgânicos, e testou o desempenho de cada tipo de tecido no que diz respeito ao tingimento, resistência à abrasão e solidez da cor (RAMASAMY, 2015). O resultado do estudo mostrou um desempenho superior no algodão orgânico comparado ao algodão não orgânico. Esse resultado sugere que sim, existem benefícios em relação ao vestuário orgânico, o que poderia justificar um preço mais alto para sua comercialização. O estudo de Ellis et al. (2012) revelou em sua pesquisa com consumidores que, em média, os entrevistados estavam dispostos a pagar um valor adicional de 25 por cento por uma camiseta de algodão orgânico em relação a camisetas feitas com algodão produzido convencionalmente. Esses dados são de grande importância, já que o custo para produzir produtos orgânicos pode ser mais alto, o que pode justificar os preços mais altos das peças finais (MATTHEWS; ROTHENBERG, 2017b). Para Cardoso (2017) a Cooperativa Central Justa Trama é uma das compradoras do algodão agroecológico produzido pelos agricultores do Ceará, apoiados pela ADEC (Associação de Desenvolvimento Educacional e Cultural de Tauá) e pelo ESPLAR (Centro de Pesquisa e Assessoria). A Justa Trama reúne associações, cooperativas, tecelagens, artesãos e fabricantes de roupas e acessórios, comercializando desde o tecido até as roupas confeccionadas de algodão agroecológico (Figura 1). A cooperativa possui conduta positiva de valorização da agricultura familiar e do trabalho das organizações locais na colaboração para gestão da rede do algodão orgânico e fortalecimento do comércio justo. Ao mesmo tempo, age com transparência na compra do algodão, repassando aos agricultores informações sobre o destino, custos e remunerações envolvidos nos produtos beneficiados no Brasil e comercializados interna ou externamente (CARDOSO, 2017). Além de empregar práticas que beneficiam diretamente os agricultores, como preço de compra diferenciado e adesão de contratos para garantir mercado e transparência na comercialização do algodão em compras futuras. Figura 1- Estampa de camiseta confeccionada com algodão agroecológico pela Cooperativa Central Justa Trama. Fonte- Fotografia realizada pela pesquisadora na Feira Nacional da Reforma Agrária, realizada em São Paulo (06 Mai. 2018). A produção e uso de tecidos orgânicos para fabricação de vestuário, sugere o incentivo à utilização de matéria-prima biodegradável, que motiva a produção e economia circular, reciclagem, maior durabilidade dos materiais e enfatiza a eficácia em se tratando de ciclo de vida dos produtos. Considerando também todo o processo, desde o cultivo do algodão, por exemplo, a fiação, a tecelagem, a manufatura do vestuário, até chegar ao usuário, que após o uso poderá direcionar o produto para o descarte adequado (WAGNER et al., 2017). A rede de produção e comercialização do algodão orgânico revela um potencial significativo para todos os integrantes dela e para criação de valor coletivo e o fortalecimento de relacionamentos produtivos e comerciais no país. 5.5- Desafios para a Produção de Algodão Orgânico Segundo informações da Embrapa (2017), o Brasil ainda apresenta uma participação muito pequena na produção e mercado dessa fibra natural. Em 2016 foram reconhecidos 112 produtores de algodão certificado, numa área de 160 hectares, que produziram 22 toneladas de fibra. Algo pouco significante se comparado ao mercado global. Para Cardoso (2017), alguns dos principais desafios da produção da fibra, giram em torno de como levar assistência técnica sobre o manejo adequado da cultura para um número maior de produtores e o maior envolvimento dos agricultores em todas as etapas na organização e gestão da rede do algodão. Desse modo tem-se que: (...) percebe-se ainda a necessidade de políticas públicas que incentivem a aplicação de técnicas fundamentadas na agroecologia para o cultivo do algodão, uma cultura que possui um valor histórico-cultural ligado a essa região (CARDOSO, 2017, p. 71). De acordo com dados da Embrapa (2017), contudo, um dos problemas referente à produção do algodão, é a escassez de mão-de-obra no campo, apontada como um dos principais entraves para aumentar as áreas de produção. “Com a colheita manual, um produtor não consegue plantar mais que dois hectares. A Embrapa está trabalhando no desenvolvimento de uma máquina colheitadeira para pequenas propriedades que poderá contribuir para superar esse gargalo”. (EMBRAPA, 2017). 5.5 -Novas Perspectivas De acordo com Oliveira e Oliveira-Filho(2014), uma das principais dificuldades do cultivo de algodão orgânico é educar e mostrar aos agricultores, os benefícios de se cultivar sem o uso de agrotóxicos e fertilizantes artificiais. Com a utilização de novas formas de cultivo, que sejam economicamente mais viáveis e que podem ampliar a produção. Como é o caso da Agricultura Sintrópica, desenvolvida no Brasil pelo produtor rural e pesquisador suíço Ernst Gotsch. Trata-se de um policultivo integrado e sistémico (AGENDA GOTSCH, 2018), que visa aumentar a produtividade e eficácia da produção, uma importante opção à monocultura que pode empobrecer o solo e logo os recursos hídricos. Diferente do cultivo em monocultura, esse formato de cultivo visa incrementar a biodiversidade e potencializar o desenvolvimento das espécies através de consórcios inteligentes, complexos e estratégicos, incorporando conceitos ecológicos ao manejo de agroecossistemas para aumentar a qualidade dos solos. Além da regulação do micro-clima, o favorecimento do ciclo da água e a recuperação os recursos, ao invés de explorá-los. Nesse modelo, o plantio é orientado pela sucessão natural e pela estratificação das espécies, respeitando a função ecofisiológica de cada componente (AGENDA GOTSCH, 2018). O algodão sintrópico, por exemplo, poderia ser uma opção para se cultivar a fibra independente de insumos externos, com possíveis economias de recursos hídricos. Contudo, experimentos e estudos avançados precisam ser realizados. Nas Figuras 2a e 2b, o cultivo teste de algodão plantado em agricultura sintrópica, na Fazenda Caminho das Pedras em Minas Gerais. Nesse sistema, o algodoeiro mocó está sendo cultivado integrado em consórcios com plantas tintureiras (que podem fornecer pigmentos naturais) como eucalipto, pau-brasil, bananeira e açafrão. As sementes de algodão plantadas foram fornecidas pela EMBRAPA Algodão. (a) (b) Figura 2- (a) (b) Cultivo teste de algodoeiro plantado em agricultura sintrópica. Fonte- (a) (b) Fotografias realizadas pela pesquisadora na Fazenda Caminho das Pedras (30 Abr. 2018). 6- Conclusão Padrões de produção e consumo sustentáveis nunca foram tão bem-vindos no contexto agrícola mundial quanto nos dias de hoje. Novas diretrizes são enfatizadas, não só para a rede produtiva do algodão, mas aplicáveis a todos os demais setores, pautadas nos princípios da dignidade humana, relações mais justas de trabalho e na sinergia entre a capacidade produtiva do homem e o meio ambiente. O mercado brasileiro e a própria indústria têxtil precisam de mais pesquisas, a fim de criar materiais e processos eficientes para fortalecer a produção têxtil sustentável e apoiar pequenos agricultores e a produção local. O mercado de fibras naturais orgânicas está se expandindo e o Brasil possui estrutura e capacidade para aumentar e incentivar a produção. Nesse contexto, algodão orgânico poderia ter mais visibilidade se organizasse e ampliasse a produção para atender as demandas do mercado. Assim sendo é importante compreender os benefícios do algodão orgânico, as formas e regiões de cultivo, os números de produção e a utilização no mercado, para incentivar sua comercialização a nível nacional e internacional. 7- Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA TÊXTIL E DE CONFECÇÃO (ABIT) e CONFEDERACÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA (CNI). Têxtil e Confecção: Inovar, Desenvolver e Sustentar - Encontro da indústria para a sustentabilidade . 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Fashion design solutions for environmentally conscious Consumers. 17th World Textile Conference AUTEX 2017- Textiles - Shaping the Future. 2017. http://textileexchange.org/wp-content/uploads/2017/02/TE-Organic-Cotton-Market-Report-Oct2016.pdf http://textileexchange.org/wp-content/uploads/2017/02/TE-Organic-Cotton-Market-Report-Oct2016.pdf https://ciorganicos.com.br/wp-content/uploads/2013/09/algodao_agroecologico.pdf https://textileexchange.org/downloads/2017-preferred-fiber-materials-market-report/ https://textileexchange.org/downloads/2017-preferred-fiber-materials-market-report/ https://ota.com/sites/default/files/indexed_files/OrganicCottonFacts2015_0.pdf Resumo O Brasil é o 5o maior produtor e 3o maior exportador de algodão convencional do mundo. O país possui um grande potencial agrícola, favorável para desenvolver o cultivo e a produção de algodão orgânico, devido a condições climáticas ideais e qualidade do solo, que podem possibilitar o plantio em diferentes regiões. Há também crescente demanda para o algodão orgânico no mercado nacional e internacional. O tema do vestuário orgânico ganhou notoriedade nos últimos anos dada à intensificação da presença de consumidores conscientes no mercado, atentos às causas ambientais e sociais. Dessa forma, objetivo deste estudo é apresentar as perspectivas da produção de algodão orgânico no Brasil sob o ponto de vista da sustentabilidade e de potencial produtivo, o qual é de interesse para o setor têxtil. A cultura orgânica de algodão pode ser utilizada para manter e recuperar a qualidade nutricional do solo, de modo a elevar a produção local. Os principais estados produtores de algodão orgânico no Brasil são Paraíba, Ceará, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte. O sistema é sustentável, pois é realizado em pequenas propriedades, com fixação do homem no campo, a conservação ambiental, a viabilidade econômica, a justiça social e o comércio justo. Ainda podem haver outras formas de cultivo, que sejam economicamente mais viáveis e eficientes, como é o caso da Agricultura Sintrópica. No entanto, o algodão orgânico poderia ter mais visibilidade se organizasse e ampliasse a produção para atender as demandas do mercado. Assim é importante compreender os benefícios do algodão orgânico, as formas e regiões de cultivo, os números de produção e a utilização no mercado, para incentivar sua comercialização a nível nacional e internacional. ORGANIC COTTON IN BRAZIL: SUSTAINABILITY AND PRODUCTIVE PERSPECTIVES Abstract Brazil is the 5th largest producer and 3rd largest exporter of conventional cotton in the world. The country has a great agricultural potential, favorable to develop the cultivation and the production of organic cotton, due to ideal climatic conditions and soil quality, that could make possible the cultivation in different regions. There is also growing demand for organic cotton in the domestic and international market. The topic of organic clothing is gaining visibility in the last years related to the increasing presence of conscious consumers, aware of social environmental issues. Therefor the objective of this study is to present the perspectives of the production of organic cotton in Brazil from the point of view of sustainability and productive potential, which is of interest for the textile sector. The organic cotton crop may be used to maintain and recover the nutritional quality of the soil in order to increase local production. The main organic cotton producing states in Brazil are Paraíba, Ceará, Pernambuco, Piauí and Rio Grande do Norte. The system is sustainable, since it is carried out in small properties, maintaining people on the land and concerning environmental conservation, economic viability, social justice and fair trade. There may still be other forms of cultivation that are economically more viable and efficient, such as in the case of Syntropic Agriculture. However, organic cotton could have more visibility if it could organize and expand the production to meet the demands of the market. Thus, it is important to understand the benefits of organic cotton, the forms and regions of cultivation, the production numbers and the use in the market, to encourage its commercialization at national and international level. Keywords: Organic cotton. Sustainability. Production.