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Neurologia DOENÇAS DESMIELINIZANTES INTRODUÇÃO . Conjunto de doenças cujo mecanismo comum de lesão é a desmielinização de SNC ● Natureza autoimune ● Influenciadas por gatilhos ambientais ● Principais representantes: - Esclerose múltipla - Neuromielite óptica - Encefalomielite disseminada aguda ESCLEROSE MÚLTIPLA (EM) . ● Doença neuro degenerativa, inflamatória (pois há caráter autoimune) e crônica ● Variados graus de degeneração axonal e neuronal ● Recorrente, subaguda, com sinais e sintomas neurológicos que melhoram no decorrer de semanas ou meses ● Risco populacional 0,1 a 0,2% (norte europeu) - Por que? Porque há baixa exposição solar e, consequentemente, maior incidência de hipovitaminose D. ● Mulher 2:1 homem, com exceção da forma progressiva primária, que não tem dominância entre os sexos. Etiologia ------------------------------------------------------------------------------------------ ● Etiopatogenia complexa, multigênica. Entretanto, é principalmente autoimune, apresentando relação genética e ambiental. ● Susceptibilidade ambiental: - Baixa exposição solar - Deficiência de vitamina D: pois a vitamina D tem propriedades imunomoduladoras. “Vários estudos demonstraram uma correlação inversa entre exposição à luz solar (fonte mais 2 comum de vitamina D) e ingestão dietética de vitamina D e risco de desenvolver EM. A relação com a exposição à luz solar pode ajudar a explicar a variação latitudinal da prevalência da doença” (Merrit) - Obesidade na adolescência: pois o obeso é um apessoa inflamada e, portanto, mais susceptível a doença autoimune - Microbiota intestinal: depois da pele, o intestino é o maior órgão do corpo. Ele está em contato com o ambiente por meio do que foi ingerido - Infecção prévia a EBV (maioria dos pacientes com IgG +): a maioria tem história prévia de mononucleose - Trabalho em turno: a mudança do ciclo circadiano traz como consequência a baixa exposição solar OBS: Os fatores a seguir tem risco desconhecido - Tabagismo: inclui a forma passiva e o tabaco oral (goma e charuto). Charuto não traga, fica na cavidade oral, por isso aumenta a chance de câncer de língua - Etilismo - Cafeína - Álcool Fisiopatologia ------------------------------------------------------------------------------------ ● Linfócitos se tornam auto reativos infiltram a BHE (barreira hematoencefálica). Desencadeiam uma cascata inflamatória, que culmina na desmielinização, degeneração axonal, oligoendrogliopatia “dying-back” (morre primeiro o axônio e, numa fase crônica, pode haver morte do corpo celular neuronal) ● Oligodendronopatia: pois quem produz a substância branca no SNC é o oligodendrócito, que é a célula afetada na doença Quadro clínico ----------------------------------------------------------------------------------- ● É variável, pois pode existir qualquer sintoma neurológico. Ex: Paraparesia, vertigem que não é vestibular nem periférica, alterações sensitivas, neurite óptica… Os sinais clássicos segundo o Tratado de Neurologia (Merrit) estão na tabela abaixo. 3 ● Fases clínicas EM: 1. EM alto risco 2. EM remitente-relapsante 3. EM progressiva EM ALTO RISCO ● Único surto clínico + alteração de imagem. ● Talvez não encontre bandas oligoclonais, mas posso começar a tratar mesmo sem fechar todos os critérios e o considero síndrome clínica de alto risco EM REMITENTE RELAPSANTE (EMRR) ● Forma mais comum ● Déficit neurológico focal + depois de tratado, tem um novo déficit 4 ● Quando é tratado o paciente consegue voltar ao basal se tratado de maneira rápida e eficiente, porém geralmente com sequela da lesão → tem déficit por um período e um período assintomático ● Surto sintomático: caracterizado por sintomas neurológicos novos de caráter agudo ou subagudo ● Surto assintomático: lesões novas na RNM. É um paciente que precisa fazer RNM anualmente, porque as lesões podem se desenvolver de maneira assintomática!! Isso é muito importante pois muda o tratamento ● Remissão: fase de recuperação sintomática. Quanto mais grave o surto, mais tempo demora para se recuperar. Geralmente dura 3-6 meses. EM PROGRESSIVA ● No lugar da evolução em surtos, não tem período assintomático, e sim uma piora progressiva do quadro neurológico. ● É um quadro mais grave. ● Progressão por pelo menos 1 ano ● Primária: RM com lesão confluindo + e progressão sintomática lenta (desde o início e sempre evolutiva) ● Secundária: EMRR com progressão entre surtos, não retorna basal o basal entre cada surto SÍNDROME CLÍNICA ISOLADA (SIS) ● 1 evento único ● Precisamos avaliar a imagem com cuidado e estratificar risco - Ex: jovem mora na Noruega, com baixa incidência de sol, e já apresenta mais de uma lesão. Vou esperar um surto para tratá-la? Não, pois ela tem alto risco → Alto risco - Ex: Paciente mora nos trópicos, não tem deficiência de vitamina D e a RNM só mostra neurite óptica. Qual a conduta? Observar a paciente, fazendo exame de imagem a cada 6 meses. --. Baixo risco ● Analisar imagem (preenche ou não ¾ critérios) ● Investigar para ver se não vai evoluir para EM Posso começar como uma EM progressiva? Sim, mas é mais raro e obviamente mais grave PSEUDO SURTO (muito importante!) Paciente tem exacerbação de sintoma prévio. Causa comum: infecção - Obrigatório excluir infecções, distúrbios hidroeletrolíticos, desidratação, estresse, calor e fadiga 5 - Se houver ausência de melhora após tratamento da causa básica, devemos excluir novas lesões - Pseudo Surto geralmente melhora após tratamento. Se não melhorar, devemos fazer exame de imagem (RNM). Pode ter sido uma nova lesão perto da antiga. - Tratamento: tratar a causa base. Ex: se suspeitamos que foi desencadeado por infecção urinária, a conduta é tratar a infecção urinária. Se for realmente pseudo surto, o quadro vai melhorar ao tratar a infecção OBS: Na época que não havia RNM, o diagnóstico era feito colocando o paciente numa banheira quente e, caso os sintomas piorassem, o diagnóstico seria confirmado. Por que pode existir surto assintomático? Porque apenas o axônio foi lesado, ou seja, o “corpo” da célula ainda funciona, só uma parte dela que se foi. A pessoa não recupera o axônio perdido Diagnóstico -------------------------------------------------------------------------------------- ● Diagnóstico de exclusão, pois há vária doenças que podem desmieliniza o axônio, como lúpus e vasculite ● Preciso documentar a disseminação no tempo e no espaço - Tempo: É documentada pelo surgimento de novos sintomas ou novas alterações em exames de imagem - Espaço: é documentada pelas localizações das lesões ● Líquor: - Bandas oligoclonais: são um marcador inflamatório muito típico de atividade de linfócito. Quando positivas, indicam inflamação ● Imagem → Critérios de McDonald (revisado em 2017): São critérios clínicos, laboratoriais e radiológicos que auxiliam no diagnóstico de EM Apresentação clínica Dados adicionais necessários para o diagnóstico ≥ 2 surtos evidência clínica de ≥ 2 lesões Nenhum 6 ou ≥ 2 surtos história clínica objetiva de lesão em sítio anatômico distinto ≥2 surtos evidência clínica de 1 lesão Disseminação espacial demonstrada por: ≥1 lesão T2 em pelo menos 2 de 4 regiões típicas de EM no CNS (periventricular, justacortical, infratentorial, ou medula espinhal); ou Evento clínico adicional sugestivo de lesão em outro local do sistema nervoso central 1 surto evidência clínica de ≥ 2 lesões Disseminação no tempo demonstrada por: Presença simultânea de lesões assintomáticas captantes e não captantes de gadolínio;ou Nova lesão em T2 e/ou presença de lesões captantes de gadolínio em RM de seguimento realizada em qualquer altura e comparada com a RM de base ou Detecção de bandas oligoclonais específicas no líquor 1 surto evidência clínica de uma lesão (CIS) Disseminação no espaço e no tempo, demonstradas por: Disseminação no espaço: ≥1 lesão T2 em pelo menos 2 de 4 regiões típicas de EM no CNS (periventricular,justacortical, infratentorial, ou na medula espinhal); ou Aguardar pela ocorrência de um surto que afete uma área diferente no SNC Disseminação no tempo: Presença simultânea de lesões assintomáticas captantes e não 7 captantes de gadolínio;ou Nova lesão em T2 e/ou presença de lesões captantes de gadolínio em RM de seguimento realizada em qualquer altura e comparada com a RM de base ou Detecção de bandas oligoclonais específicas no líquor Progressão neurológica insidiosa sugestiva de EM (EMPP) 1 ano de progressão de doença (retro e prospetivamente determinada) mais 2 de 3 dos seguintes critérios: Evidência de disseminação espacial no cérebro, com base em ≥1 lesão em T2, nas regiões típicas de EM (periventricular, justacortical ou infratentorial) Evidência de disseminação espacial na medula espinhal, com base em ≥2 lesões em T2 na medula espinhal Evidência de bandas oligoclonais por focalização isoelétrica e/ou aumento do índice IgG ● É OBRIGATÓRIO fazer RNM + líquor + análise de disseminação RNM corte sagital Dedos de Dawson: ● Lesões ovoides, 1-2cm diâmetro, perpendiculares a direção do corpo caloso ● Hipersinal (mais claro) ● Indica inflamação 8 Fatores de pior prognóstico --------------------------------------------------------------------- ● Homem ● Idade de início mais precoce --. quanto mais jovem, mais tempo vai viver com a doença ● Deficiência de vitamina D ● Presença de lesões cervicais → fator de risco para doença mais grave Tratamento -------------------------------------------------------------------------------------- Há dois tratamentos: um para fase aguda e outro modificador de doença, que é realizado entre os surtos. 1. Surtos (corticóide) ● Indicação: quando o paciente tem déficit focal ● Pulsoterapia com Metilprednisolona 3-5g IV, 3-5 dias, infusão matinal ● Caso refratário: é possível repetir a pulsoterapia. Entretanto, se ainda for refratário, é possível utilizar plasmaférese (filtrar o plasma e tirar os autoanticorpos para tentar resgatar o paciente do surto) E se for HIV positivo? Tratamento é o mesmo, associado ao tratamento do HIV 9 2. Tratamento modificador de doença (imunomodulador) ● Injeção subcutâneo, intramuscular ou venosa, atualmente há terapia oral ● Considerar agressividade da doença, aderência do paciente, custo, disponibilidade, comorbidades, gestação ou desejo de gestação, puerpério, infusão, etc. ● Medicamentos disponíveis: - Interferon alfa e beta - glatiramer - dimetil fumarato - natalizumab: aplicado 1vez/ mês. Importante saber que pelo mecanismo de ação pode favorecer JC vírus, com chances de desenvolver leucoencefalopatia multifocal progressiva. É uma situação muito delicada pois esta infecção pelo JC vírus pode agravar ainda mais a desmielinização. Por isso, ao prescrever natalizumab, é preciso investigar se o paciente é positivo para JC vírus e estratificar o risco dele. - ocrelizumab (único com diminuição comprovada da progressão) NEUROMIELITE ÓPTICA (NMO) . ● Inflamação mais às custas de macrófagos, células T e B, neutrófilos e eosinófilos (inflamação celular, lesão mais irreversível) ● Diferenças entre EM e NMO: - EM é mais humoral e NMO é mais celular (lesão irreversível). Ou seja, NMO é uma doença às custas da auto-imunidade celular - EM atinge 1 segmento vertebral e NMO > 3 - Pior prognóstico quando comparado à EM ● Chama-se assim pois os principais locais lesionados são: nervo óptico e medula ● Investigar anti-AQP4 e anti-MOG ● Adultos e jovens (20-40 anos) ● Surtos: neurite óptica, mielite transversa (> 3 segmentos vertebrais, longa, principalmente cervicais) e área postrema no assoalho do IV ventrículo (vômitos irreversíveis) ● Marcadores sorológicos: - Anti-AQP4 + em 80% dos pacientes - Anti-MOG + em 20% dos pacientes 10 ● Progressão secundária é rara (já é uma lesão grave, tetraplegia). Muitas vezes os pacientes não vivem muito tempo por conta das sequelas ● Associação com outras doenças autoimunes (LES, Sjögren, SSAF, Miastenia Graves) Tratamento -------------------------------------------------------------------------------------- 1. Surtos (corticóide) ● Pulsoterapia com Metilprednisolona 3-5g IV, 3-5 dias, infusão matinal ● Caso refratário: plasmaférese (mais frequente que EM). Muitas vezes é recomendado já começar a plasmaférese, pois a doença é muito agressiva 2. Tratamento modificador de doença (imunossupressor) ● Injeção subcutâneo, intramuscular ou venosa, atualmente há terapia oral ● Medicações utilizadas: Azatioprina, micofenolato e rituximabe ● Considerar agressividade da doença, aderência do paciente, custo, disponibilidade, comorbidades, gestação o desejo de gestação, puerpério, infusão, etc. ENCEFALOMIELITE DISSEMINADA AGUDA (ADEM) . ● Geralmente tem curso monofásico → muito relacionada a uma gatilho que a desequilibra. Ex: antecedente de vacinação ou infecção ● Investigar se anti-AQP4 e anti-MOG negativos caso lesões de medula. Geralmente estão negativos ● Tratamento: metilprednisolona 3-5g IV (responde bem ao tratamento) ● Imagem - RNM: lesões maiores, pegam substância branca, poupam o córtex, podem ter forma pseudotumorais 11 GESTAÇÃO E DOENÇAS AUTOIMUNES NEUROLÓGICAS . ● 1° trimestre: risco aumentado, pois o concepto é imunogênico ● 2° e 3° trimestre: o risco se estabiliza ● Puerpério: risco aumentado. Há risco de piora, crise miastênica, surto de esclerose múltipla ● O ideal é que a paciente programe a gravidez para que seja possível ajustar a dose dos medicamentos. No puerpério o médico deve estar de sobreaviso e, em caso de necessidade, realizar pulsoterapia ou plasmaférese REFERÊNCIAS Merritt tratado de neurologia / Elan D. Louis, Stephan A. Mayer, Lewis P. Rowland ; tradução Carlos Henrique de A. Cosendey ... [et al.]. 13. ed. Rio de Janeiro : Guanabara Koogan, 2018. : il.
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